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Afinação mesotônica
Mediante ao prejuízo que o sistema baseado no ciclo de quintas causou às
terças maiores, surgiu um novo modelo que privilegia este intervalo (e devolve o
problema às quintas). O sistema mesotônico foi descrito por teóricos italianos
no séc. XVI e surgiu numa época em que os instrumentos de tecla começaram
a ganhar mais importância. Neste sistema, todas as terças devem ser puras e
sem batimentos, com 386 cents. As quintas são diminuídas em ¼ de coma e, de
uma maneira geral, são mais aceitáveis do que as terças do ciclo de quintas,
com exceção de uma quinta do lobo, considerada abominável, com seus 738
cents (uma quinta natural tem 701,96 cents e uma temperada, 700 ¢). A maior
característica desta escala é a ausência da enarmonia, pois para que todas as
terças soem perfeitas, o LÁ sustenido, por exemplo, que é a terça maior do FÁ
sustenido, tem uma frequência diferente do SI bemol, terça maior do SOL
bemol. Uma curiosidade é que a sequência das notas é LÁ, SI b, LÁ # e SI, pois
a sensível de SI é LÁ # e não SI bemol.
Cabe salientar que somente no séc. XVIII, surgiria o conceito de série
harmônica. Estudando o comportamento de cordas vibrantes, D’alembert
sugere que um som natural não era puro e único, mas com grande
complexidade e obtido através da superposição de diversos harmônicos de uma
série resultante do som principal (6, p. 35).
Além de Pitágoras, Arquitas, Zarlino e D’alembert, gênios da humanidade como
Filolaus, Eratóstenes, Aristoxeno, Aristóteles, Mersenne, Galileu, Darezzo,
Descartes e tantos outros, ainda fizeram muitas descobertas importantes sobre
a música, que colaboraram para a formação de escalas, divisão de intervalos
utilizando cálculos aritméticos ou de razão, intervalos melódicos e harmônicos,
relação de som com frequência, Série harmônica, Séries de Fourier, etc.
O sistema de cents
O sistema de cents surgiu por volta de 1880, desenvolvido por Alexander J.
Ellis, como uma forma de quantificar intervalos do sistema temperado igual.
Ganhou adeptos rapidamente graças à sua simplicidade e objetividade.
No sistema temperado igual, a oitava é dividida em 1200 partes iguais,
chamadas de Cents, ou ¢. Os semitons simétricos possuem 100 ¢ cada
Este sistema facilitou as pesquisas e a comparação de outros sistemas tonais
com o temperado igual.
CONCEITO DE TEMPERAMENTO
Genericamente, temperar significa fazer ajustes nos intervalos, desviando-os
dos intervalos naturais. A aplicação do temperamento como sistema é uma
medida que visa suprir necessidades ou resolver problemas apontados em um
sistema entendido como deficiente (realidade de todo sistema tonal temperado,
pois um intervalo sempre se beneficia em detrimento do prejuízo de outro ou
outros).
Diferentes temperamentos surgiram com o passar do tempo, quase todos
buscando uma solução para o mais conhecido enigma musical: a transposição
e modulação.
Até antes do advento do temperamento igual, as escalas eram assimétricas,
baseadas em referências harmônicas, aritméticas ou geométricas. Por mais que
um sistema fosse dividido em quintas, terças ou semitons, seus intervalos
possuíam uma relação de frequência desigual. Porém, a noção de sonoridade
que se tinha há até 4 séculos atrás era diferente do que estamos acostumados
a ouvir atualmente e aceitar como correto.
Não há um sistema de afinação que seja válido universalmente. A educação e a
cultura dos povos é que lhes familiariza com determinado sistema sonoro.
É importante salientar que, sob certos aspectos, aquilo que parece puro e
correto aos nossos ouvidos pode não ter o mesmo significado para outros
povos e vice-versa, pois sempre há a dependência do momento cultural ao qual
determinada população se encontra e de quão difundido foi determinado
sistema para promovê-lo à principal importância da época e do local.
Por exemplo, em muitos países, a música folclórica utiliza instrumentos que só
tocam os harmônicos naturais. A trompa é um destes instrumentos, onde a
quarta soa impura, pois o décimo primeiro harmônico está entre o FÁ e o FÁ#.
Nas regiões onde estes instrumentos são tocados, as pessoas estão habituadas
a cantar este intervalo “impuro”, que pode soar muito estranho para nós,
ocidentais. Ainda, se ouvíssemos uma música com a afinação do séc. XVII,
executada por Monteverdi, teríamos a sensação de que tudo está soando
terrivelmente desafinado.
Correto, do ponto de vista quase absoluto, é corresponder às exigências do
sistema tonal vigente. Quase absoluto porque, em se tratando de música, as
maiores transgressões, quando bem utilizadas, podem se tornar fundamentais
para a beleza de determinada obra musical. Sobre esse assunto, não há uma
verdade única. Só podemos discutir afinação se estivermos conscientes do
contexto e dos limites de determinado sistema.
TEMPERAMENTO IGUAL
Após tantos séculos e tantos cérebros dedicados às escalas musicais, um
problema fundamental (muitos autores não concordam com o termo “problema”,
além de sugerirem várias alternativas para o assunto) ainda não tinha sido
resolvido: a transposição e modulação num instrumento.
O estudo que obteve maior aceitação sugere distribuir a diferença da Quinta do
lobo entre todos os intervalos, numa relação logaritmicamente equivalente. Este
estudo foi apresentado em 1686, quando o organista alemão Andreas
Werckmeister publicou seu “Musikalische Temperatur”, com a teoria do
temperamento igual.
A afinação temperada foi desenvolvida, inicialmente, para instrumentos de tecla.
O processo conhecido como temperamento igual consiste dividir a oitava em 12
semitons rigorosamente iguais, impondo sempre o mesmo intervalo de
frequência entre dois sons vizinhos quaisquer.
Nesta construção totalmente simétrica, todos os intervalos, com exceção da
oitava, são um pouco impuros.
Cada semitom possui 100 ¢. A soma dos 12 semitons resulta em 1200 ¢, que
equivale a uma oitava.
Nesta afinação, todas as tonalidades
soam idênticas, diferenciando-se
apenas na altura .
É indiscutível a quantidade de
benefícios que a afinação temperada
trouxe: facilidade de afinação, a ideia de
inversões de acordes, surgimento de
novas linguagens musicais, etc., no
entanto, existe um preço a ser pago:
abrir mão da afinação específica e
perfeita (do ponto de vista acústico) de
cada tonalidade em troca da facilidade,
assim como, analogamente na luthieria,
um instrumento perde nuances e
sutilezas de timbre e dinâmica em troca de maior projeção sonora.
TEMPERAMENTO NO INSTRUMENTO
O arco musical, primeiro instrumento musical de corda, datado de
aproximadamente 13.000 a. C., é um instrumento puro, pois sua única corda
não gera intervalos.
A flauta de Divje Babe, de 43.000 anos a. C., possui orifícios que, pela distância
e diâmetro, sugerem que tenha sido construída para soar uma escala
pentatônica. Porém, é improvável que seus intervalos sejam naturais. Estes são
mistérios difíceis de ser desvendados
A afinação temperada, aplicada em instrumentos, se torna mais usual a partir do
séc. XVI, devido à crescente popularidade dos cravos e clavicórdios e à
evidente dificuldade de transposição nestes instrumentos.
Apesar de ter sido um processo de transição lento, hoje sabemos que foi
irreversível, a despeito da quantidade de pensadores e músicos que criticavam
duramente tal sistema. Mesmo nos dias de hoje, muitos profissionais da música
lamentam a forma como o sistema temperado igual foi amplamente
disseminado e tomado como sistema perfeito.
Não é raro encontrar pessoas que se deparam com as imperfeições deste
sistema e atribuem a causa do problema ao que imaginam ser a baixa
qualidade de seus instrumentos.
Ao que parece, a quantidade de benefícios não supera a quantidade de
deficiências oferecidas por este sistema. Mas por outro lado, esta parece ser a
única solução (a mais simples e acessível) para o dilema da modulação.
Seguindo por essa linha de pensamento, o temperamento igual se torna
imbatível.
O sistema temperado, por si só, atraiu muitos simpatizantes, que buscavam a
modulação e que, graças ao novo sistema, finalmente conseguiram realizar
maravilhosos trabalhos musicais e escritos. Talvez, o mais célebre de todos
tenha sido Johann Sebastian Bach (1685-1750). Este esplêndido compositor e
instrumentista compôs a obra “O cravo bem temperado” ou “Das
Wohltemperierte Klavier”.
Esta é a primeira obra que compreende as 24 tonalidades, mas trabalhos
menos abrangentes já haviam sido realizados antes, que também serviram de
inspiração para Bach. É, originalmente, uma coleção de 48 prelúdios e fugas,
divididos em 2 livros: o primeiro, composto em 1722 e o segundo em 1744.
Hoje, são obras conhecidas como “Livro 1” e “Livro 2” de “O cravo bem
temperado”.
O sistema tonal vigente na época de Bach era o mesotônico. Ainda há uma
dúvida se Bach buscava realmente um sistema temperado igual ou apenas um
sistema menos complicado (bem temperado), que lhe permitisse compor e tocar
suas ideias musicais com maior fluidez.
APLICAÇÃO DO TEMPERAMENTO IGUAL
No temperamento igual, a oitava é dividida em 12 intervalos de semitons
rigorosamente iguais, com as seguintes razões de frequência (9, p. 46):
f0, f, f2, f3, f4, f5, f6, f7, f8, f9, f10, f11, f12, onde f12 = 2.
A ideia é considerar f0, ou 1, como a fundamental e f12, ou 2, como sua oitava.
Lembrando que a oitava é representada por 2/1 = 2.
O que a relação de proporções de tamanhos vê como sobreposição de
intervalos (ciclo de quintas, por exemplo), a álgebra considera como cálculos de
potências. Assim, dividir uma oitava em partes significa trabalhar com a raiz de
2 (uma oitava), cujo índice é a quantidade de intervalos em questão. Neste
caso, 12.
Logo, a divisão de uma oitava em 12 partes iguais é representada,
aritmeticamente, como
= 1,059463094.