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EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO

Apresentação
Disciplina: Evolução Histórica do Direito Série: 1º semestre
Docente: Prof.a. Ms. Jane Bueno de Camargo
Carga horária semanal: 02 horas/aula
Carga horária semestral: 40 horas/aula

1. Introdução: O homem e a formação do Direito. Evolução cultural

Os primeiros hominídios apareceram por volta de 4,2 milhões de anos atrás,


sendo que, através da evolução, chegou-se ao homo sapiens por volta de 500 mil
anos atrás. Desse, duas ramificações surgira: homo sapiens neanderthalensis
(desaparecido) e homo sapiens sapiens . Esse último datando de mais ou menos
120 mil anos atrás e constituindo a nossa espécie.

O Período Paleolítico (pedra lascada) caracterizou-se pela subsistência na


dependência da caça, pesca e da coleta de frutas e raízes. Também aparece
nesse períodos os primeiros utensílios confeccionados com pedra lascada, ossos
e dentes de animais.

Os seres humanos viviam em grupos nômades sendo que, antes mesmo do


aparecimento do homo sapiens, os hominídeos já conheciam o fogo (cerca de 500
mil anos).

Com o decorrer de centenas de milhares de anos, o homem foi criando o arco e a


flecha, as lanças, utensílios de argila, além dos já mencionados, de ossos e
dentes de animais. Com o controle do fogo, o homem passou a cozinhar seus
alimentos, o que lhe garantiu uma melhoria em seus hábitos alimentares e esses
em aumento de sua capacidade cerebral,

Por volta de 100 mil anos atrás novas atividades humanas são encetadas. A
característica fundamental desse período pode ser atribuída às transformações
acelaradas nas relações entre o homem e o ambiente. A prática da agricultura e a
domesticação dos animais permitiu às sociedades primitivas o controle da
produção de alimentos , a sedentarização e, assim, o aumento da população.
Essas modificações são conhecidas como revolução neolítica ou revolução
agrícola e marcaram o domínio do homem sobre a natureza.

A sedentarização do homem exigiu o aparecimento de regras de convivências, as


quais, no futuro, se constituíram em um dos veios para a formação das primeiras
leis citadinas.

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Os homens da Pré-história se organizavam sob a forma de grupos tribais, onde


não havia uma hierarquia acentuada, a relação de poder e a dominação dos
homens de forma exacerbada, como vamos encontrar posteriormente. O chefe
não tinha poder de coerção sobre a comunidade, sendo que os problemas eram
resolvidos de forma comunitária. A função do chefe estava ligada à solução de
conflitos que pudessem surgir entre os membros do grupo através do prestígio
que ele tinha entre os seus e não através do poder e da força. Tais homens eram
escolhidos a partir da competência em oratória, habilidade como caçador ou
capacidade de coordenar as atividades guerreiras. Tais povos primitivos jamais
permitiam que seu chefe se transformasse em um tirano, pois se consideravam
iguais entre si.

2. Antigüidade (surgimento das primeiras civilizações)

Por volta de 6.000 a . C., iniciou-se o emprego de metais na confecção de armas e


outros instrumentos. Esse período, que teve seu auge em torno de 2.000 a . C,
com o desenvolvimento da civilização.

A Idade dos Metais ocorreu ao mesmo tempo que a revolução urbana, com a
transformação das aldeias agrícolas auto-suficientes em aglomerados urbanos. Os
instrumentos de pedra foram substituídos pelos de metal: primeiro cobre (6.000 a .
C), depois bronze e, finalmente, ferro. Com o uso do metal, o homem transformou-
se em artesão, além de coletor, agricultor e pastor. Essa nova atividade ocasionou
uma divisão de trabalho entre os membros das aldeias e a organização social
tornou-se mais complexa. Outra conseqüência do uso do metal foi o
aprimoramento das táticas de guerra, possibilitando a maior dominação de um
povo sobre o outro, já que as guerras e aprisionamento de outro ser humano foi
praticada ainda mesmo no estado tribal

3. Mesopotâmia

3.1 Suméria e Acádia

As primeiras civilizações por nós conhecidas tiveram seu início na região do


Oriente Médio conhecido como Crescente Fértil. Foi nessa região que surgiram os
mesopotâmicos e os egípcios.

Os primeiros povos mesopotâmicos foram os sumerianos e acadianos que, por


volta de 3000 a . C, habitaram a região entre os rios Tigre e Eufrates, cercados
pelas montanhas do Irã e Armênia por um lado e pelo deserto da Arábia de outro.
Tais povos vindos do Irã fundaram as cidades de UR, Uruk, Nipure Lagash. Tais

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cidades se constituíam em cidades-estado e eram governadas por uma patesi, ou


seja, um rei-sacerdote.

Os sumerianos foram os responsáveis pelo aperfeiçoamento das técnicas de


irrigação, arquitetura, escrita cuneiforme, artes e comércio. Liderados pelo rei
Sargão I, os acadianos fizeram a unificação política do centro e sul, assimilando a
cultura sumeriana (anterior).

Devidos às constantes guerras e a presença maciça de povos estrangeiros


levaram ao enfraquecimento do império, que desapareceu por volta de 2100 a .
C. .

Direito sumério

O sistema de lei sumeriano foi produto de uma evolução gradual dos usos locais,
tendo sido compilados pelo rei Dungi, depois dos meados do terceiro milênio.
Sobreviveram em sua forma original somente alguns fragmentos. Hamurabi,
agregou parte desse sistema de leis ao código que recebeu o seu nome, que se
tornou base do direito de quase todos os povos semitas: babilônios, assírios,
caldeus e hebreus.

Eis o que se deve considerar como sendo os característicos principais do direito


sumério:

a) A lei do talião – “olho por olho, dente por dente, braço por braço e etc.”

b) Administração da justiça em caráter semiprivado. Impunha à própria vítima ou


à sua família trazer o ofensor á justiça. O tribunal funcionava principalmente
como árbitro na disputa entre o queixoso e o réu e não como um agente do
estado para manter a segurança pública, embora os agentes da lei pudessem
auxiliar a execução da sentença.

c) Desigualdade perante a lei. O código dividia a população em três classes:


aristocratas, cidadão comuns e escravos. As penalidades eram aplicadas de
acordo com a classe da vítima, mas também, em alguns casos, de acordo com
a classe do ofensor. A morte ou a mutilação de um aristocrata era um ofensa
muito maior do que um crime semelhante cometido contra um cidadão ou um
escravo. Por outro lado, sendo um aristocrata o ofensor, era ele punido mais
severamente do que seria um homem de situação inferior pelo mesmo crime.
Talvez tal prática tivesse sua origem na disciplina militar, uma vez que os
aristocratas eram os defensores da cidade e, assim sendo, do estado, o que
não dava margem a deixar-se levar pelo curso das paixões.

d) Distinção insuficiente entre o homicídio acidental e o intencional. O acusado


não era punido com a pena de morte, mas tinha que pagar uma multa á família

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da vítima, baseando-se isso, aparentemente, na teoria de serem os filhos


propriedade dos pais e as esposas propriedades dos maridos.

A invasão dos amoritas, povo originário do deserto da Arábia deu origem ao


Império Babilônio (2.000 a 1.750 a . C)

3.2 A Babilônia e o Código do rei Hamurabi (lei do talião)

Apesar de estrangeiros, os babilônios tiveram longo contato com os sumerianos e


desses herdaram muito de sua cultura. Porém, alguns progressos e mudanças
foram efetuados por esses povos, principalmente no que tange ao Direito.

Direito babilônio

Os babilônios acabaram com a instituição das cidades-estado e fundaram uma


civilização centrada na capital – Babilônia. Adotou-se, assim um sistema de
tributação régia e a obrigatoriedade do serviço militar.

Quanto ao Direito:
a) Aumentou a lista de crimes contra o estado.
b) Os funcionários do rei desempenharam um papel mais ativo na apreensão e
punição dos infratores, ainda que fosse impossível ser qualquer criminosos
perdoado sem o consentimento da vítima ou de sua família.
c) Aumentou a severidade das penas, em especial contra crimes que
envolvessem sinais de traição ou sedução.
d) Infrações aparentemente triviais como “vadiagem” e “desordem numa taberna”
tornavam-se puníveis de morte, sem dúvida pela crença de que poderiam
alimentar atividades desleais ao rei.
e) Enquanto sob a lei suméria o açoitamento de escravos fugitivos era punível
somente com uma multa, a lei babilônia transformou-o em crime capital.
f) De acordo com a lei suméria, o escravo que contestasse os direitos do amo
sobre sua pessoa devia ser vendido. ; o código de Hamurabi prescrevia que
fosse cortada a orelha.
g) O adultério também foi transformado em infração grave, ao passo que na lei
sumperia não levava necessariamente ao divórcio.
h) Apresentaram progresso às leis sumérias ao não mais permitir que mulheres e
crianças vendidas por dívida não podiam ser conservadas sob escravidão por
mais de quatro anos.
i) A escrava que tivesse um filho com o amo não mais podia ser vendida.
j) Comprador que se acautele.

Os legisladores babilônios também fizeram leis às transações bancárias e a


indústria era submetida a uma regulamentação cuidadosa pelo estado. Haviam
leis concernentes à sociedade comercial, ao armazenamento e à mediação, leis
referentes a escrituras, testamentos, empréstimos de dinheiro a juros e, ainda,
uma grande quantidade de outras leis, dente as quais destacamos:

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a) Quem negociasse sem contrato escrito ou testemunha podia ser punido com a
morte.
b) Penas severas a quem não cultivo das terras que possuía e negligência na
manutenção de diques e canais.
c) Era permitido tanto a propriedade pública como a privada, mas o rendeiro tinha
a obrigação de pagar, como aluguel, dois terços de tudo que produzisse.

Para que ninguém alegasse desconhecimento das leis, Hamurabi mandou gravar
seu código em uma enorme pedra de basalto azul, que ficava no centro da cidade.

3.3 Os assírios

O período de supremacia assíria deu-se por volta de 1.300 a 612 a . C.. Esses
povos destacaram-se pelo caráter militar e ficaram famosos pelas crueldades
praticadas.

Direito assírio

Nunca se comprovou se os assírios adotaram ou não o código de Hamurabi mas,


certamente, foram por ele influenciados. Dentre suas leis destacamos:

a) Conservação da Lei do talião.


b) Conservação do sistema de graduação das penas de acordo com a classe das
vítimas e do ofensor.
c) As maiores penalidades eram infligidas ao aborto e perversões, talvez para
impedir a diminuição da natalidade (necessidade de gente para as guerras).
d) As esposas eram bens do marido.
e) O direito ao divórcio era permitido somente ao marido.
f) O homem tinha direito á poligamia.
g) As mulheres casadas eram proibidas de aparecer em público sem o uso de
véu.

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4. Egito

4.1 União entre o estado e a religião

Não havia separação entre religião e estado. Consequentemente, as regras


sociais eram pautadas por essas, sendo o próprio faraó considerado, muitas
vezes, um deus. Os principais subordinados do faraó eram, em primeiro lugar, os
sacerdotes, sendo ele próprio o sumo sacerdote. Mas possuía, também, outros
agentes: um “primeiro ministro”, um tesoureiro real, um arquiteto-chefe, um
superintendente de obras públicas, um juiz supremo e quarenta e dois monarcas.
Esses últimos eram os governadores das províncias. A esses últimos cabia a
execução das ordem do faraó em suas respectivas províncias mas, se nos
primeiros tempos era um cargo atribuído pelo faraó, com o tempo passou a ser
hereditário.

4.2 Responsabilidades do faraó

Como o cargo era hereditário, o príncipe herdeiro fazia o aprendizado com o pai e
como superintendente de obras públicas, o que tornava familiar o conhecimento
das ocorrências e das necessidades das províncias.
Ao faraó cabia a administração do Egito, inspecionando as obras públicas
de mineração, construção de obras públicas e irrigação e etc. Apesar da aura de
divindade, o faraó estava repleto de trabalho em prol do bem público, mesmo
porque, havia a identificação do Egito com o próprio faraó.

4.3 Sistema social

A lei egípcia sugere a conclusão de que se deveria observar regularmente


uma administração de justiça de alta qualidade. Ainda que durante o Antigo
Império não possuísse uma classe bem definida de juizes profissionais, os
funcionários administrativos que serviam, em dadas ocasiões, no caráter de juizes,
eram instruídos em direito e gloriavam-se de sua justiça imparcial na decisão dos
casos.
Compunha a divisão judiciária do governo um conjunto de seis tribunais, para
os quais eram designados de tempos em tempos.
Acima de todos eles estava o juiz supremo que, às vezes, ocupava,
simultaneamente, o cargo de primeiro ministro. Em certas ocasiões podia-se
recorrer ao próprio faraó.
Nenhuma espécie de causa, ao que parece, era excluída da jurisdição regular
dos tribunais. Assentamentos mostram que mesmo os casos de traição na família
do faraó erma examinados com o mesmo escrupulosos respeito pelo processo
legal demonstrado nos casos de ofensas de menor importância.
Os faraós do Antigo Império não tinham, ainda, aprendido a distinção entre
crimes políticos e crimes comuns, que foi estabelecida pelos governantes de
alguns estados modernos.

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4.4 Uma lei maior

Os egípcios acreditavam piamente na vida após a morte, inclusive na


reencarnação. Após a morte, o ser humano era obrigado a passar por um teste,
que constituía na pessoa de sua alma em comparação a um pena. Quem presidia
esse julgamento era a deusa Maat, a deusa da verdade. O morto deveria,
inclusive, declinar a Confissão a Maat:

Eu, por ti, destruí a maldade.


Eu, por ti, não tenho feito mal à humanidade.
Eu, por ti, não tenho oprimido os membros de minha família.
Eu, por ti, não tenho praticado o mal, em vez do direito e da verdade.
Eu, por ti, não tenho convivido com pessoas indignas.
Eu, por ti, não tenho buscado um consideração especial.
Eu, por ti, não tenho exigido que trabalho excessivo me seja prestado.
Eu, por ti, não tenho indicado meu nome para glorificação.
Eu, por ti, não tenho espoliado os oprimidos de suas propriedades.
Eu, por ti, não tenho feito qualquer pessoa passar fome.
Eu, por ti, não tenho feito qualquer pessoa chorar.
Eu, por ti, não tenho cooperado para que seja infligida dor ao homem ou animal.
Eu, por ti, não tenho despojado o templo de suas oblatas.
Eu, por ti, não tenho adulterado s medidas padrão.
Eu, por ti, não tenho me apropriado de terras.
Eu, por ti, não tenho invadido os campos de outros.
Eu, por ti, não tenho aumentado os pesos da balança para enganar o vendedor..
Eu, por ti, não tenho feito leitura errada do fiel da balança para enganar os
compradores.
Eu, por ti, não tenho tirado o leite para alimentação das crianças.
Eu, por ti, não tenho fechado a água por ocasião em que ela deveria correr.
Eu, por ti, não tenho extinguido a chama quando ela deveria queimar.
Eu, por ti, não tenho repelido a Deus em suas diferentes manifestações.

Afirmações:
Eu sou puro! Eu sou puro!
Minha pureza é a pureza da Divindade do Templo Sagrado.
Portanto, não me acontecerá mal nesse mundo, porque eu, mesmo eu, conheço
as leis de Deus, que são o próprio Deus.
Cro-Maat!

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5. Índia

5.1 Aspectos históricos

A imagem hollywodiana que temos da Índia está associada a duas


dicotomias: o fausto dos marajás em oposição à gritante pobreza da grande
maioria das pessoas. Via de regra, a explicação sustenta-se na ignorância de um
povo que vive sob o domínio da religiosidade. De fato, para nós ocidentais, a
Índia ou nos causa repugnância ou nos causa mudança total de nossos
comportamentos pela contemplação de uma diferente cosmovisão. De fato, com
relação á Índia não há meio-termo: ou se apaixona ou a odeia, pois são muito
diferentes de nós, o que não significa inferioridade. Pelo contrário, a Índia possui
uma milenar tradição cultural que, sob muitos aspectos, podemos, até, considerar
superiores à nossa. Por exemplo, a descrição dos Cosmo feita na Bagavda Gita
em muito se assemelha às maravilhas trazidas pelo Hubble. Aliás, não de fala de
um único Cosmo, mas de infinitos e, se somente no século XX chegamos à cifra
de bilhões de anos, isso já é encontrado na obra mencionada.
A civilização indiana é tão antiga quanto às do Egito e Mesopotâmia
(Suméria). O passado que delas sabemos é encontrado nos Vedas, uma
coletânea de textos sagrados de autores desconhecidos. Não se sabe, com
certeza, a idade dessa obra, mas alguns autores calculam a tradição oral em 7000
anos antes de Cristo, sendo a tradição escrita de 3.000 anos antes de Cristo.
Vedas (em sânscrito significa sabedoria) está dividido em: Rig-Veda (o
considerado mais antigo), Sama-Veda, Jagur-Veda e Atharva-Veda.
A tradição védica teria chegado à Índia por volta de 7.000 a .C., quando os
povos de origem ariana desceram o Cáucaso e ocuparam a região que,
anteriormente, já era ocupada pelas etnias amarela e negra. Tal concepção é
reforçada pelo estudo lingüístico do sânscrito, onde muitas palavras se
assemelham às de origem germânica, inglesa, dinamarquesa e etc.
Um aspecto da Índia tradicional (pois hoje isso está mudando) é o sistema
de casta., que, à primeira vista, nos causa horror. Contudo, temos que ter em
mente que tal sistema não está associado ao poder econômico da pessoa, mas da
origem da família. Assim, um mendigo pode ser um brâmane, ou seja, pertencer a
mais alta casta. O casamento entre castas diferentes é proibido. As castas são:
- brâmanes: constituída pelos sacerdotes.
- Xátrias: militares ou nobres guerreiros
- Vaixás: grandes agricultores e comerciantes.
- Sudras: operários e camponeses
Os fora de casta são chamados de párias.

6.2 O Código de Manu

Reza a lenda que Sarasvati foi a primeira mulher criada por Brahma, advinda
de sua própria substância. O próprio Brahma se casou com Sarasvati e com ela
teve um filho, o pai da humanidade, a quem deu o nome de Manu, a quem se

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atribui o mais antigo código de leis reguladoras da convivência social. Observe-se


que os Códigos de Dungi e Hamurabi eram compilações das tradições locais.
A data da promulgação do Código de Manu é incerta, isto é, entre 1.300 e 800
a . C. (Dungi e Hamurabi são mais antigos). É escrito em forma de versos,
dispostos em 12 livros, sendo os mais importantes, para nós, o oitavo (que vai do
artigo 1º ao 417º) e nono (do artigo 418 º ao 752º). Eis uma síntese dos temas
abordados em cada um dos livros:
- Livro Primeiro: criação do mundo; hierarquia celeste; divisão do tempo
e vida e morte.
- Livro Segundo: deveres a serem cumpridos pelos homens virtuosos; a
vida sacramental dos brâmanes e membros das mais altas castas hindu.
- Livro Terceiro: casamento e vida familiar.
- Livro Quarto: sobre a importância de não prejudicar aos demais
(qualquer meio de subsistência é bom desde que não prejudique outra
pessoa); honestidade e honradez n vida e nos negócios .
- Livro Quinto: sobre a alimentação (alimentos que devem e não devem
ser ingeridos e forma de preparação); normas de purificação do corpo e
do espírito e submissão da mulher ao homem.
- Livro Sexto: regula a vida dos anacoretas.
- Livro Sétimo: diz respeito aos deveres do rei (proteção e justiça aos
súditos) e às normas de sua conduta. Também fala sobre a diplomacia,
quando da necessidade de recorrer às armas. O princípio romano “se
queres a paz prepara-te para a guerra” já é aqui encontrado: o rei, cuja
armada mantém-se eficiente e constantemente em exercício, é temido e
respeitado pelo mundo inteiro.
- Livro Oitavo: I – Da administração da Justiça – Dos ofícios dos juizes; II
– Dos meios de provas; III- Das moedas; IV – Das dívidas; V – Dos
depósitos; VI - Da venda de coisas alheias; VII- Das empresas
comerciais; VIII – Da reivindicação das coisas doadas; IX – Do não
pagamento da parte do fiador; X – Do inadimplemento em geral das
obrigações; XI – Da anulação de uma compra e venda; XII – Questões
entre patrão e servo; XIII – Regulamento dos confins; XIV – Das injúrias;
XV – Das ofensas físicas; XVI – Dos furtos; XVII – Do roubo – XVIII – Do
adultério.
- Livro Nono: XIX – Dos deveres do marido e da mulher; XX – Da
sucessão hereditária; XXI – Dos jogos e dos combates de animais;
Disposições finais.
- Livro Décimo: hierarquia das castas; a possibilidade de matrimônio e
os direitos que têm os filhos desse nascidos; conduta para aqueles que
não conseguem ter filhos; sobre a conduta de acordo com a casta.
- Livro Décimo Primeiro: enumera um longa série de pecados e
estabelece as respectivas penitências.
- Livro Décimo Segundo: enfoca a recompensa suprema das ações
humanas: o bem eterno nas várias transmigrações da alma; quem faz o
mal receberá a devida punição em outra encarnação. As transmigrações
da alma são descritas com riquezas de detalhes, tanto para aquelas que

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decaem como para as que evoluem e chegam á perfeição, quando,


então, são reabsorvidas por Brahma.

6. Os hebreus

Muitas concepções judaicas não só serviram de substrato à religião cristã


como, também, economia e política dos povos de fé calvinista, que foram
profundamente por eles influenciados. Contudo, a religião hebraica não é de um
purismo absoluto, uma vez que esses povos tiveram contato com muitos outros e
foram, assim, por eles também influenciados. A história do Éden, do Dilúvio, de Jó
são exemplos da tradição suméria que migraram para a hebraica. O próprio
monoteísmo hebraico, por sua vez, é fruto do monoteísmo de Akenaton.

6.1 O Direito hebraico

O Direito estava intimamente ligado à religião e seu mais belo exemplo é o


Código de Deuteronômico, encontrado no livro de mesmo nome na Bíblia. A
despeito de suas origens, é tida como profética. Baseava-se, em parte, em uma
Lei do Pacto, bastante anterior que, por sua vez, derivava das leis dos cananeus e
antigos babilônios. Suas disposições eram, em geral, mais esclarecidas que as do
Código de Hamurabi como, por exemplo:
- Recomendação à liberalidade para com o pobre e o estrangeiro.
- Recomendação à libertação do escravo hebreu que havia servido por
seis anos e Insistia para que não fosse mandado embora com as mãos
vazias.
- Os juizes e outros funcionários deveriam ser eleitos pelo povo e era
proibido aceitarem presentes ou mostrassem qualquer forma de
parcialidade.
- Condenação da feitiçaria, adivinhação e necromancia.
- Denunciava a punição de crianças pela culpa dos pais e afirmava o
princípio da responsabilidade individual pelo pecado.
- Era proibida a cobrança de juros a empréstimo feito de um judeu para
outro.
- Ao fim de cada 7 anos deveria haver um remissão das dívidas.
- Era proibida a construção civil em terras estrangeiras.
- Era concedida a isenção militar para quem construísse uma casa nova,
plantasse um vinha, se casasse com uma nova esposa ou, até mesmo,
ao homem que fosse medroso ou tímido “... a fim de que seu coração de
seus irmãos não se derreta como o seu coração.” (Deuteronômio; 20, 5-
8)
O fim do Código Deuteronômico era infundir na sociedade judaica um
caráter mais democrático e igualitário. Seus autores não estavam

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interessados em princípios abstratos do tipo Justiça, Liberdade, Bem etc.


Não condenavam a escravidão como um mal em si mesmo, mas procuram
inibir a escravidão do judeu por outro judeu. O rei, por sua vez, não deveria
acumular riqueza e nem deveria mostrar ostentação. Também não estava
acima da Lei, mas a ela submetido. O poder dos funcionários também era
limitado e, via de regra, a justiça era deixada nas mãos do povo. No caso
de controvérsia, a decisão era deixada para os membros mais velhos da
comunidade.

6.2 Torá – O livro da sabedoria

Nele estão contidos dos vastos conceitos da Torá e do Talmude, sintetizados


por Maimônides. Embora não seja um código jurídico, nele estão os 248
preceitos a serem seguidos pelo povo judeu, bem como as 365 proibições. A
divisão do livro se faz em 14 partes:
- Livro da sabedoria:
- Livro do amor
- Livro dos períodos
- Livro das mulheres
- Livro da santidade
- Livro da magnificência
- Livro das sementes
- Livro dos serviços divinos
- Livro dos sacrifícios
- Livro da pureza
- Livro dos danos
- Livro das aquisições
- Livro dos julgamentos
- Livro dos juizes

7. Grécia clássica

7.1 Divisão dos períodos

A Grécia clássica viveu sob a égide de diferentes tipos de governos:


monarquia, tirania, aristocracia, oligarquia e democracia. Para o presente estudo
nos deteres nos modelos vivenciados por Atenas, uma vez que é sobre ela que

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os filósofos e juristas se detêm. É em Atenas que ocorre a laicização do direito e a


idéia de que as leis podem ser revogadas pelos mesmos homens que a fizeram.

7.1.1 Período arcaico: século VIII a . C a 480 a . C.: nesse período ocorre as
invasões persas, o qual termina com a batalha de Salaminas, com a vitória
dos gregos (principalmente atenienses) sobre aqueles. O primeiro
enfrentamento entre gregos e persas (juntamente com os medas) em solo
grego se dá em Termópilas, famosa pela lenda dos 300 de Esparta e seu
grande general Leônidas

7.1.2 Período clássico: de 480 a . C. até 338 a . C., quando os gregos são
vencidos pelos macedônios, primeiramente na figura de Felipe I e, logo em
seguida, seu filho Alexandre, o Grande.
A população ateniense, por volta do 480 a . C era constituída de
(aproximadamente):
. 30.000 cidadãos (homens adultos livres)
. 90.000 mulheres e crianças
. 30.000 estrangeiros e escravos
150.000 no total

Já em 430 a . C. a população sofre significante transformação:


. 40.000 cidadão (homens adultos livres)
. 120.000 mulheres e crianças
. 20.000 estrangeiros residentes
. 60.000 escravos
250.000 no total

7.1.3 Período helenístico: a Grécia cai nas mãos dos romanos e, se morrendo
para os gregos, nasce para o mundo, pois nesse período se tanto a
helenização tanto do ocidente como do oriente próximo, sendo que, porém,
as influências orientais sobre os gregos também se torna maior.
Em 321 a . C., a população ateniense decai para:
. 21.000 cidadãos
. 60.000 mulheres e crianças
. 10.000 estrangeiros
. ? escravos
+/- 100.000 no total

Nesse período surgem as escolas Epicurismo e Estoicismo

7.2 Contexto político às leis /Principais legisladores / A formação da


democracia

No decorrer de sua expansão econômica, muitos gregos foram feitos


escravos dos próprios gregos, por haverem contraído dívidas para se aventurarem
na agricultura e no comércio sem, contudo, obterem êxito nesse empreendimento.

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Isso acabou por ocasionar a primeira revolta social da História, com os escravos
se rebelando contra seus donos, dando origem, assim, a uma guerra civil dentro
da Grécia.
A revolta dos escravos foi aliciada, em grande parte, pela classe dos
armadores, que haviam enriquecido com as Guerras Greco-Persas, sem, contudo,
alcançar o poder através desse enriquecimento.
A fase sangrenta foi superada e cada cidade-estado grega assumiu
uma postura diante de tal situação: Esparta, por exemplo, firmou-se em uma
tirania militar; Mégara e Corinto procuraram uma conciliação com os armadores,
oferecendo-lhes parte do poder através da oligarquia, onde os mais ricos,
aristocratas ou não, tinham poder de voto; Atenas, por sua vez, criou a
democracia, onde todo cidadão ateniense tinha poder de voto na assembléia.
Contudo, a democracia não surgiu de uma hora para outra: em um
primeiro momento, Atenas ficou submetida às leis severíssimas de Drácon. O
poder foi tomado por Psístrato que, apesar de tirano, fez um bom governo.
Posteriormente, Sólon edificou um Código de Leis baseado, sob muitos aspectos,
no código de Hamurabi, porém de uma forma muito mais branda. Tais leis
permitiram que Clístenes assumisse o poder, mas este passou a assembléia para
as mãos do povo, dando origem, assim à democracia, com o espírito das leis de
Sólon.
Coube a Sólon, eleito arconte em 594 a . C., redigir novas leis para Atenas
onde:
- Determinou a libertação dos escravos por dívida e proibia empréstimos
sujeitos à escravização do devedor e de sua família.
- Procurou estabelecer uma relação entre a fortuna do cidadão e seus
direitos de acordo com o rendimento anual e individual, privando, dessa
maneira, o monopólio dos cargos públicos à aristocracia.
- Aos de primeira e Segunda classe, era permitido p acesso às
magistraturas mais altas. Aos de terceira, o acesso às magistraturas
mais baixas e à Quarta um voto na Assembléia Popular, ou Eclésia
(órgão de representação dos cidadãos)
- Criou também a Boulé, composto de cidadãos maiores de 30 anos, à
razão de 100 para cada uma das quatro tribos jônicas tradicionais de
Atenas.
As reformas de Sólon diziam respeito somente aos cidadãos nascidos
em Atenas. Além disso, não rompeu com o poder exercido pela aristocracia,
visto que não houve uma melhor distribuição das terras. Por outro lado, já
que a escravização de atenienses era proibida, intensificou a utilização do
escravo-mercadoria obtido no comércio com os bárbaros e nas guerras
entre as cidade ou através de pirataria.

7.3 O século de Péricles

A democracia ateniense alcançou seu auge no decorrer do governo de


Péricles. É durante seu governo que Atenas assume a hegemonia sobre a Grécia,
após a vitória contra os persas.

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Outras conquistas desse período:


- A assembléia adquiriu autoridade par apresentar projetos de lei, sem
prejuízo de seus poderes de ratificar ou rejeitar propostas do Conselho.
- Foi formado o Conselho dos dez Generais, posição essa análoga a de
senadores atualmente. Os generais eram escolhidos pela assembléia
pelo prazo de um ano e podiam ser reeleitos indefinidamente. O próprio
Péricles ocupou o cargo de estratego durante 30 anos. Os generais não
eram formados somente por comandantes de guerra, mas também de
funcionários legislativos e executivos. Embora dispusessem de grande
poder, não podiam se tornar tiranos.
- Criação de tribunais populares com autoridade para julgar toda espécie
de causas.
É durante seu governo, também, que Atenas se envolve em guerra
contra Esparta, sem conseguir, contudo, a vitória contra esses. Isso foi um balde
de água fria sobre os atenienses, que se julgavam superiores, por seu avanço
intelectual, não só em relação aos espartanos como, também, em relação a todo
o resto da Grécia.
Para piorar a situação de Atenas, essa foi afligida por uma peste que
matou quase dois terços da população, inclusive o próprio Péricles.
A democracia ateniense não era como esta que conhecemos. Somente
tinha direto de participação os cidadãos atenienses, excluindo-se as mulheres, os
metecos (estrangeiros) e os escravos. Assim sendo, somente uma pequena parte
da população de Atenas participava das assembléias. Esta, no entretanto era um
local de iguais (isonomia), ou seja, todos os que dela participavam eram
considerados iguais (mulheres, estrangeiros e escravos eram inferiores) e,
também, na assembléia era exercido tanto o poder político como o Direito. Aliás,
para os gregos não havia separação entre as coisas áreas. Daí a necessidade de
excelência na arte da oratória como da persuasão.
Com a democracia à deriva, alguns aristocratas tentaram, e de algumas
feitas conseguiram, a volta da tirania. Ao mesmo tempo, pessoas ricas mas sem
postura política, estavam fazendo da assembléia um patamar para obtenção de
favores pessoais, enriquecimento ilícito e não pensando mais do bem comum. A
democracia estava nas mãos dos brutos, interesseiros e mau intencionados.

7.4 O papel da filosofia nos debates sociais

É com a entrada dos sofistas no debate filosófico que essa passa a se


debruças sobre as questões humanas: liberdade, política, ética e etc. Embora
tenhamos dos sofistas uma idéia um tanto quanto pejorativa, herança dos
filósofos, foram muito importantes par a filosofia pois abriram os olhos dos
filósofos sobre a questão da verdade. Adeptos do relativismo epistemológico,
influenciaram a concepção de lei, colocando em pauta questões sobre “quem faz a
lei; portanto, a quem interessa a lei?”; “como se fazem as leis?”

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Dessa maneira, fazendo coro aos sofistas, Sócrates, Platão e Aristóteles, ao


fazerem a crítica sobre as questões éticas, políticas referente às leis, e acabam o
sentimento de lei enquanto tradição conhecida por todos de caráter simplista.
Para que isso acontecesse, os gregos tiveram que abandonar a concepção
de que as leis eram reveladas pelos deuses.
Convém lembrar que se o centro da vida ateniense era a família, no período
clássico desloca-se para a pólis. Assim sendo, as decisões judiciais não são mais
levadas a cabo pelos anciões e sábios de aldeia e, pelo aumento da complexidade
da pólis, a busca de regras universais que valham para todos os casos e que não
sejam a simples aplicação da prudência. A busca por princípios universais
jurídicos passam a ser uma das questões trabalhadas pelos filósofos, nesse caso
em nítida oposição aos sofistas (relativistas).
Com os estóicos (século IV a . C.), dá-se um novo salto em busca de
axiomas jurídicos universais: se antes houve a ampliação do universo familiar para
o universo da pólis, com os estóicos essa questão assume o caráter cosmopolita.
Para tanto, construíram tanto o processo de helenização iniciada pelos
macedônios como sua consumação pelos romanos.
Os gregos, enquanto povo mediterrâneo, voltado para o comércio e, assim
sendo, acostumado a entrar em contato com diferentes etnias e civilizações, terão
dos estrangeiros uma visão de diferentes e iguais ao mesmo tempo: iguais
enquanto homens, mas diferentes enquanto culturas. Assim se pergunta: haveria
um direito igual a todos os povos, um direito das gentes ou um direito natural? As
diferentes escolas de filosofia gregas irão polemizar sobre essa questão, dando
origem a diferentes pontos de vista: para Platão a justiça em si só existe enquanto
princípio, não sendo encontrada, a não ser parcialmente, na pólis;
para Aristóteles, a justiça será considerada como “um tipo de mediania entre o
excesso e a falta, de acordo com a necessidade, para se alcançar a excelência.”,
sendo que a felicidade civil é encontrada nas relações de amizade: amizade
cívica. O conflito entre opção pela família ou pela pólis é encontrada na peça
Antígona, de Sófocles, onde a personagem é colocada entre o dever para com o
irmão e o dever para com a cidade.

7.5 Dos julgamentos

Existiam dois tipos de órgãos de jurisdição em Atenas:


- Assembléia: para os casos de crimes públicos e participação de todos
os cidadãos.
- Demos: é um tipo de subdistrito da assembléia, onde se elegia o grande
conselho de supervisão: Aerópago.

Contudo, existiam três sub-órgãos em função dos casos:


- Boulé: conselho de 400 pessoas que exercia o governo.
- Aerópago : julgava os que haviam subvertido a constituição.
- Heliastas: para julgamentos menos importantes.

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Embora todos pudessem ter participação na assembléia, nem todos


poderiam, ocupar todas as magistraturas, pois os cidadãos, para este efeito,
haviam sido divididos em classes de renda. Por outro lado, dada a importância de
um tipo de julgamento sobre outro, desenvolveu-se uma arte da retórica, onde
havia a disputa entre o "discurso belo” e o “discurso verdadeiro”, temas muito
debatidos tanto por Platão como por Aristóteles.
A ausência de leis, a ausência de juristas, a facciosidade levava a usar
tribunais freqüentemente com fins políticos.
Nos tribunais era preciso provar o direito (a lei, o costume) além dos fatos.
Por sua vez a Constituição de Sólon tenha sido gravada no Pórtico dos
Arconte e todos os eleitos deviam jurar cumpri-la, havia outras deliberações e leis
que tinha efeito de lei efetiva. É lógico que havia escritos a respeito, mas não uma
burocracia propriamente dito e o sistema de cartório não era bem aquele que
conhecemos atualmente.
Também não execução judicial: o queixoso recebia o julgamento e se
encarregava de executá-lo, em princípio, ou passava a uma fase de ação penal.
Nada de polícia judiciária como hoje conhecemos.
Os discursos perante os tribunais, feitos pelos defensores, não podiam ser
pagos (embora fossem), pois julga-se que, se uma pessoa precisava pagar era
porque sua causa não era boa. A idéia era que o queixoso devia se apresentar
perante o tribunal e expor seus interesses e pontos de vista mas, na prática, os
logógrafos acabavam não só por redigir as peças judiciais como o discurso e
também, apresentá-lo perante os juizes. Para isso, cobravam, o que, como já
dissemos, não era bem, visto. Muitas vezes eram os sofistas que faziam esse
papel e, dessa maneira, acabaram se transformando nos primeiros advogados.
Contudo, esse “advogado” não bem como nós concebemos atualmente, pois essa
forma somente foi efetivada no Direito Canônico. Era, mais ou menos, um tipo de
cúmplice do queixoso. Por exemplo: no julgamento de Sócrates, não só o próprio
Sócrates falou em ser favor como, também, seus amigos.
As respostas sempre eram sim ou não, culpado ou inocente. Em 403 a . C.
criou-se a obrigatoriedade do recurso aos árbitros em matéria “civil” e “comercial”
sempre que envolvesse mais de 10 dracmas.
Havia árbitros públicos e privados. Caso não fosse aceita a decisão, podia-
se apelar para os heliastas que, por não se ocuparem das questões mais
importantes, era considerado mais maleável.
As provas nos tribunais populares poderiam fazer-se por escrito ou
pessoalmente. Nos arbitrais eram informais e os juizes, visto que leigos e
membros de uma assembléia, podiam testemunhar sobre o próprios fatos, quando
deles tivessem conhecimento. Sua decisão não precisa, necessariamente,
fundamentar-se em provas trazidas pelas partes, julgando de acordo com sua
consciência. Os depoimentos de escravos deviam ser precedidos pela tortura pois
acreditava-se que, sem essa, os escravos mentiriam, a fim de vingarem-se do
senhor. Em últimas instâncias, a eloqüência, o poder de persuasão é que acabava
levando a melhor.
Distinguia-se o próprio (privado) do público, bem como a associação
voluntária, ou seja, o contrato, o qual gerava uma espécie de responsabilidade de

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ambas as partes envolvidas. No caso de Aristóteles, esse vai fazer a distinção


entre justiça comutativa, distributiva e reparadora.
Os crimes públicos podiam ser denunciados por qualquer pessoa, já que
não existia um órgão público de acusação. Pretendia-se que a democracia
dependia de todos e, assim sendo, qualquer pessoa que se sentisse atingidas por
ações delituosas podiam denunciar o caso ao tribunal. O ideal era que todo
cidadão se sentisse indignado tanto quanto o ofendido. Não existi, portanto, a
promotoria.
A denúncia era considerada uma petição e um início de processo. Os
denunciantes tinham parte da multa e penas aplicadas aos culpados e, assim
sendo, o processo acabou se tornando uma praga em Atenas. Tanta assim é que,
por motivos políticos ou pela cobiça de obter parte da condenação e dos bens do
acusado, começaram a surgir os sicofantas, ou seja, pessoas que denunciavam
falsamente alguém a fim de obter uma vantagem ilícita. Porém, caso fosse
descoberto, o sicofanta respondia pelo crime de infâmia e perda dos direitos
políticos.
Para que não caísse na banalidade, ou seja, mover-se um processo por
qualquer coisa, todo aquele que não alcançasse 1/5 da votação era obrigado a
pagar uma multa e estava proibido de abando nar a acusação no meio do
processo.
O medo da impunidade era grande. Considerava-se que uma pequena
ofensa não punida poderia desarranjar toda a cidade, gerando vingança por parte
do ofendido e etc. Também está presente a concepção de quebra da hybris, isto
é, equilíbrio natural. Dessa maneira, muitas vezes, as penas eram
desproporcionais aos delitos cometidos (pelo menos segundo nossos padrões).
As penas, em geral, eram: castigos, multas, feridas, mutilações, morte e
exílio.
A pena de morte era aplicada de maneira variada, dependendo do tipo de
delito. Tinha um caráter ritual e sagrado.
O ostracismo dependia do julgamento por um tribunal popular e era
aplicado ao demagogo, para que esse perdesse o controle sobre a população. Era
uma válvula de escape para se livrar dos indesejosos. Com o tempo, a idéia de
ser exilado foi ficando menos insuportável e, assim sendo, acabou caindo em
desuso.

Leis de Licurgo - Esparta

Legendário legislador militar espartano, fundador da maior parte das


instituições políticas e militares de Esparta, que fez desta cidade-estado um
modelo único entre as cidades da antiga Grécia, porém provavelmente pode ter

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sido mais uma figura lendária da cidade-estado erguida pelos dóricos no


Peloponeso. Influenciado pelo oráculo de Delfos, ou pelas leis de Creta, pouco se
sabe seguramente sobre a existência desta personagem. Era desejo do povo,
retornar à severidade e segurança civil dos tempos passados. Consta que depois
de transformar Esparta em um estado militar, auto exilou-se depois de fazer com
que os espartanos jurassem que não mudariam suas leis. Partiu então para Creta,
onde pouco depois teria cometido um suicídio premeditado.

Leis de Drácon

Após a revolução dos escravos, cada pólis assumiu uma diretriz para
impedir outras revoluções. Algumas pólis adotaram um istema de leis que
abarcavam a oligarquia, ou seja, todas os homens por uma posição social
elevada, poderiam fazer parte da assembleia. Esparta continua com seu sistema
militarista e Atenas adotou as lei de Drácon, que puniam com a morte qualquer
tentativa de oposição ou mesmo inúmeros tipos de delitos. Daí o termo que ainda
usamos “leis draconianas”. Com o passar do tempo e o abrandamento dos
costumes, Sólon promulga um novo código de leis.

Leis de Sólon

.
As leis de Sólon permitiram com que Clístenes, algum tempo depois, pudesse
criar um sistema político que revolucionária o mundo: a democracia.
Sua obra como legislador ou "árbitro da constituição", como o define Aristóteles,
se articula em três pontos principais:
1. abolição da escravidão por dívidas;
2. reforma timocrática ou censitária: a participação não era mais por nascimento,
mas censitária, através do Conselho de 400 (Bulé).
3. reforma do sistema ático de pesos e medidas

Na sua reforma, Sólon proibiu a hipoteca da terra e a escravidão por


endividamento através da chamada lei Seisachtheia; dividiu a sociedade pelo
critério censitário (pela renda anual) e criou o tribunal de justiça. Suas atitudes, no
entanto, desagradaram a aristocracia, que não queria perder seus privilégios
oligárquicos, e o povo, que desejava mais que uma política censitária, e sim a
promoção de uma reforma agrária.
Sólon também modificou o código de leis de Drácon, que já não era mais seguido
por causa de sua severidade.1 A punição do roubo, que era a morte, passou a ser
uma multa igual ao dobro do valor roubado.
Por ocasião da entrada de Pisístrato na cena política ateniense, Sólon se retirou
em exílio voluntário.

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8 Direito Romano

8.1 O desenvolvimento inicial do Direito Romano

Há uma geral concordância em afirmar que o legado mais importante


deixado pelos romanos às culturas que os sucederam foi o seu sistema de direito.
Esse sistema resultou de uma evolução gradual, que podemos considerar como
tendo começado com a proclamação da Lei das Doze Tábuas, aproximadamente
em 445 a . C.
Nos últimos anos da República, a Lei das Doze Tábuas foi modificada e
praticamente invalidada pelo desenvolvimento de novos precedentes e princípios.
Estes se originaram de várias fonte: das modificações dos costumes, dos
ensinamentos dos estóicos, das decisões dos juizes , mas, especialmente, dos
editos dos pretores.
Os pretores romanos eram magistrados que tinham autoridade para definir
e interpretar a lei em cada processo e emitir instruções ao júri para a decisão de
cada caso. O júri decidia somente questões de fato.; todas as questões de direito
eram decididas pelo pretor e, geralmente, suas interpretações tornavam-se
preceitos firmados para decisões futuras de casos semelhantes.

8.2 O direito romano no Principado: os grandes juristas

Foi sob o Principado, no entanto, que o direito romano atingiu seu mais alto
desenvolvimento. Este último progresso deveu-se, em parte, à expansão do direito
num campo mais amplo de jurisdição, abrangendo as vidas e propriedades dos
estrangeiros, bem como dos cidadãos da Itália. Mas a razão primordial foi o fato
de Augusto e seus sucessores terem dado a certos juristas eminentes o direito de
opinar ou responsa, como eram chamadas, nos processos em julgamento nos
tribunais.
Os mais ilustres desse homens nomeados periodicamente foram Gaio,
Ulpiano, Papiniano e Paulo. Embora muitos deles ocupassem altos postos da
magistratura, tinham originalmente ganho reputação como advogados e autores
de obras jurídicas.
As responsa desses juristas vieram a formar uma ciência e uma filosofia do
direito e foram aceitas como bases da jurisprudência romana. Exemplo típico do
respeito do romano pela autoridade foi o serem as idéias desses homens
adotadas prontamente, mesmo quando destruíam crenças consagradas pela
tradição, como ás vezes acontecia,

8.3 As divisões do direito romano

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O direito romano, tal como se desenvolveu sob a influência dos juristas e


compreendia três grandes divisões:

- Jus Civile: era essencialmente a lei de Roma e de seus cidadãos. Como tal existia
tanto na forma escrita como na não escrita. Incluía estatutos do senado, os
decretos do Príncipes, os editos dos pretores e também alguns costumes antigos
que tinham força de lei.

- Jus Gentium: era a lei considerada comum a todos os homens, sem levar
em conta a sua nacionalidade. Era ele que autorizava as instituições da
escravidão, da propriedade privada e definia os princípios da compra e venda, das
sociedades e do contrato. Não era superior ao direito civil, mas completava,
aplicando-se especialmente aos habitantes estrangeiros do impérios.

- Jus Naturale: em muitos aspectos era a parte mais importante do direito


romano. Não era absolutamente um produto da prática jurídica, mas um filosofia.
Os estóicos tinham desenvolvido a idéia de uma ordem racional da natureza, que
é a corporificação da justiça e do direito. Afirmavam que todos os homens são por
natureza iguais e detentores de certos direitos que os governos não têm
autoridade para transgredir. O que fazia de todos homens iguais era a razão, aliás,
a mesma razão que dirigia a natureza. O pai do direito natural como princípio legal
não foi, no entanto, nenhum dos estóicos helenísticos, mas Cícero; “O verdadeiro
direito é a razão justa, consoante à natureza, comum a todos os homens,
constante, eterna. Promulgar decretos contra esta lei é proibido pela religião, nem
pode ser ela revogada, ainda mesmo parcialmente, nem temos, quer pelo senado
quer pelo povo, o poder de nos livrar dela.” (Cícero, Da república, 111,22) .
Essa lei precede o próprio Estado e qualquer governante que a desafiar
torna-se automaticamente um tirano. Alguns dos últimos estóicos – Sêneca em
particular- desenvolveram a doutrina de um estado primordial da natureza em que
todos os homens eram iguais e nenhum deles era explorado por outro. Com o
tempo, a iniquidade e a cobiça de alguns fizeram nascer a escravidão e a
propriedade privada; por esse motivo, o governo tornou-se necessário para a
proteção do fraco. Com exceção de gaio, que identificou o Jus Naturale com o Jus
Gentium, todos os grandes juristas subscreveram concepções da lei da natureza
muito semelhantes às dos filósofos. Embora os juristas não considerassem essa
lei uma limitação automática da Jus Civile, pensavam, não obstante, que ela
constituía um grande ideal a que as leis e decretos dos homens eram obrigados a
se sujeitar. Constituiu uma das mais avançadas realizações da civilização romana
esse desenvolvimento do conceito de uma justiça abstrata como princípio legal.

8.4.1 Moral nos primórdios da República

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A moral dos romanos, nesse período como nos posteriores, não tinha
nenhuma relação com a religião. Os romanos não pediam a seus deuses que os
fizessem bons, mas que concedessem favores materiais à comunidade e à
família. A moral era um assunto de patriotismo e de respeito à autoridade e à
tradição. temperança, coragem, sabedoria, justiça, honra e lealdade para com os
deus, Roma e a família eram as virtudes cardiais dos romanos.
A lealdade para com o estado precedia tudo mais. Para o bem do estado,
os cidadãos deviam estar prontos a sacrificar não somente sua própria vida mas,
se necessário, as vidas das pessoas de sua família e as de seus amigos. Era
motivo de profunda admiração a coragem com que certos cônsules
obedientemente mandavam matar os próprios filhos, por infringirem estes a
disciplina militar.

8.5 Lei das Doze Tábuas


Tábua I (De in jus vocando - Do chamamento a juízo)
1. Se convocas alguém a presença do magistrado e ele se recusar,
testemunha essa recusa e obriga-o a comparecer.
2. Se ele tentar fugir, prende-o e leve-o à força.
3. Se a doença ou idade o impossibilitarem, fornece-lhe condução, mas nunca
uma carruagem, a não ser que queiras ser benevolente.
4. Que um rico somente responda por um rico; por um proletário responda
quem quiser.
5. Se as partes transigirem, que a demanda seja assim regulada.
6. Não havendo acordo, que o magistrado conheça a causa antes do meio-
dia, no comício ou no foro, depois da discussão dos litigantes.
7. Passado o meio-dia, que o magistrado se pronuncie perante as partes
presentes.
8. Depois do sol posto, nenhum ato mais de processo.
9. Inciso incompleto que  determinava ao magistrado a tomada de
compromisso dos litigantes para comparecimento em determinado dia, caso o
trabalho forense não fosse terminado.
Tábua II (De judiciis - Das instâncias judiciárias)
1. Inciso incompleto que determinava às partes o depósito de certa quantia,
denominada sacramentum.
2. Se o juiz, ou árbitro ou uma das partes se achar acometido de moléstia
grave, que o julgamento seja adiado.
3. Aquele que precisar do testemunho de alguém, vá a sua  porta e o
convoque em alta voz, para o terceiro dia de feira.
4. Quem procede sem dolo não comete furto.
Tábua III (De aere confesso rebusque jure judicatis
- Da execução em caso de confissão ou de condenação)

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1. Para o pagamento de uma dívida em dinheiro, confessada pelo devedor e


por ela condenado, tenha ele o prazo de trinta dias para se desobrigar.
2. Decorrido esse tempo, seja preso o devedor e levado a presença do
magistrado.
3. Não sendo líquidada a dívida nesse momento e nem alguém oferecendo
caução pelo devedor, seja ele preso por meio de correias com ferros de quinze
libras aos pés, no máximo, podendo ser de menor peso, de acordo com o credor.
4. Viva, então, o devedor às suas expensas e, em caso de não o poder, que o
credor lhe dê uma libra de farinha por dia, no máximo.
5. Inciso incompleto que determinava que a dívida fosse apregoada após o
prazo de três feiras, no sentido de haver um meio de remissão.
6. Terminado esse prazo, o devedor seria morto, podendo ser cortado em
pedaços, na hipótese de existirem vários credores. Mas a lei admitia também, o
que era mais usual, a venda do devedor a um estrangeiro, para além do Tibre.
Tábua IV (De jure patrio - Do pátrio poder)
1. Que seja morta, segundo a Lei das XII Tábuas, a criança monstruosa.
2. Se o pai vendeu  por três vezes o seu filho, que o filho seja libertado de seu
pai.
3. Segundo a Lei das XII Tábuas (em caso de divórcio) que ele ordene a sua
mulher que leve os seus trastes, e que ela entregue as chaves.
4. Inciso que determinava o tempo da gestação, dispondo que a viúva poderia
ter legalmente um filho até o décimo mês da morte do marido.
Tábua V (De haereditatibus et tutelis - Da tutela hereditária)
1. Inciso que declarava a mulher sob tutela perpétua.
2. Proibia o usocapião das coisas pertencentes às mulheres, pois sob tutela
dos seus agnatos.
3. Aquilo que o pai de família houver testado relativamente aos seus bens, ou
à tutela, terá força de lei.
4. Se alguém morre sem ter feito testamento, sem herdeiro necessário, que o
agnato mais próximo recolha a sucessão.
5. Se ele não tem agnato, que a sucessão se defira a estranhos.
6. Não havendo tutor nomeado por testamento, os agnatos são os tutores
legítimos.
Tábua VI (De dominio et possessione - Da propriedade e da posse)
1. Quando alguém cumprir a solenidade do nexo e da emancipação, o que
sua língua declarar, isto será direito.
2. Este inciso determinava o pagamento de uma dupla multa àquele que
relegar as suas palavras pronunciadas.
3. Adquiri-se a propriedade do solo pela posse de dois anos e das outras
coisas, pela de um ano.
4. Interrompe-se o usocapião da mulher se ela dormir durante três noites
seguidas fora do domicílio conjugal.

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5. Contra o estrangeiro, eterna vigilância.


6. Se duas pessoas lutam pela posse de uma coisa diante do magistrado [...] o
magistrado dará a posse a quem julgar conveniente.
7. Que não sejam arrancadas as traves empregadas nas construções, nem os
esteios que sustentam as vinhas alheias.
8. Cabe uma ação de pagamento duplo contra aquele que emprega materiais
de outrem.
9. Se os materiais forem arrancados imediatamente... (o proprietário os
poderá reivindicar).
10. A propriedade de uma coisa vendida entregue, não é adquirida por aquele
que  a comprou enquanto o adquirente não pague o preço.
11. Este inciso determinava que o magistrado confirmasse a cessão feita em
sua presença, bem como a emancipação.
Tábua VII (De jure aedium et agrorum - Do direito relativo aos edifícios e às
terras)
1. Entre os edifícios vizinhos deve existir um espaço de dois pés e meio,
destinado a circulação.
Todos os demais incisos recuperados são referentes ao direito de vizinhança.
Tábua VIII (De delictis - Dos delitos)
1. Pena capital ao autor de injúrias ou ultrajes públicos difamatórios.
2. Contra aquele que destruiu o membro de outrem e não transigiu com o
mutilado, seja aplicada a pena de talião.
3. Pela fratura de um osso de um homem livre, pena de trezentos "as"; de um
escravo, pena de cinqüenta "as".
4. Pela injúria feita a outrem, pena de vinte e cinco "as".
5. Se o prejuízo é causado por acidente, que seja reparado.
6. Pelo prejuízo causado por um quadrúpede, deve-se reparar o dano ou
abandonar o animal.
7. Cabe ação de dano contra aquele que faz pastar o seu rebanho no campo
de outrem
8. Aquele que por encantamentos, faz murchar a seara de outrem, atraindo-a
para o seu campo...
9. Aquele que causa, à noite, furtivamente, destruição, ou apascenta o seu
rebanho sobre colheitas, seja votado a Ceres e punido de morte; sendo impúbere,
será vergastado ao critério do magistrado e condenado a reparar o dano em
duplos.
10. Aquele que causa incêndio num edifício, ou num moinho de trigo próximo
de uma casa, se o faz conscientemente, seja amarrado, flagelado e morto pelo
fogo; se o faz por negligência, será condenado a reparar o dano; se for muito
pobre, fará a   indenização parceladamente.
11. Contra aquele que  corta injustamente as árvores de outrem, aplique-se a
pena de vinte e cinco "as" sobre cada árvore cortada.
12. Se alguém cometeu furto à noite e foi morto, seja o causador da morte

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absolvido.
13. Mesmo que o ladrão esteja roubando a pleno dia, não terá o direito de se
defender com armas.
14. O ladrão confesso (preso em flagrante) sendo homem livre, será vergastado
por aquele a quem roubou; se é um escravo, será vergastado e precipitado da
Rocha Tapéia; mas sendo impúbere, será apenas vergastado ao critério do
magistrado e condenado a reparar o dano.
15. Inciso não recuperado
16. No caso de um furto manifesto, que a pena contra o ladrão seja do duplo do
objeto furtado.
17. É proibido o uso capião sobre as coisas roubadas, não valendo, no caso, o
uso ou a posse do detentor.
18. O juro de empréstimo de dinheiro não poderá exceder de uma onça, isto é,
de um por cento ao mês.
19. Aquele que for infiel num contrato de depósito, deverá pagar uma pena
dupla.
20. Que o patrono que enganar o seu cliente seja devotado aos deuses.
21. Serão afastados da tutela os cidadãos suspeitos, que a exercerem.
22. Se o porta-balança ou alguém foi testemunha de um ato e recusa dar seu
testemunho, seja considerado infame, incapacitado para testemunhar e indigno de
que testemunhem para ele.
23. Seja precipitado da Rocha Tarpéia aquele que prestou falso juramento.
24. Pena de morte para o homicídio
25. Aquele que prendeu alguém por palavras de encantamento ou lhe deu
veneno, seja punido de morte.
26. Punia com a morte os ajuntamentos noturnos, de caráter sedicioso.
27. Os membros de um colégio ou de uma associação poderão estabelecer os
seus regimentos, desde que os mesmos não sejam contrários à lei geral.
Tábua IX (....)
Tábua X (De jure sacro - Do direito sagrado)
1. Que nenhum morto seja inumado ou queimado na cidade.
2. Que não seja  polida a lenha da fogueira funerária.
3. O morto não poderá ser amortalhado nem cremado em mais de três togas,
nem três faixas de púrpura e nem poderá ser acompanhado por mais de dez
tocadores de flauta.
4. Que as mulheres não arranhem o rosto e nem soltem gritos imoderados.
5. Que não se recolham os ossos dos mortos para se fazerem mais tarde
outros funerais (exceto em relação aos mortos em combate, no estrangeiro).
Tábua XI (...) - Perdida no maremoto romano.
Tábua XII (De pignoris capio - Da apreensão do penhor)
1. (...)
2. Se um escravo comete um roubo ou um outro delito prejudicial, será movida

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contra o seu dono uma ação indireta, isto é, uma ação noxal.
3. Se alguém simular posse provisória em seu favor, que o magistrado nomeie
três árbitros para a causa e que, em face da evidência, condene o simulador a
restituir os frutos em duplo.
4. É proibido consagrar-se a coisa litigiosa

8.5 Império Bizantino

8.5.1 Aspectos gerais históricos

No séc. IV, temendo a invasão dos bárbaros e a destruição da parte ocidental


do Império Romano, Constantino transfere a capital de Roma para Bizâncio, que
ele batiza com o nome de Constantinopla.
O padrão de vida era bem diferente da parte ocidental, uma vez que abrigava
características orientais. A maioria dos habitantes eram gregos e orientais
helenizados: sírios, judeus, armênios, egípcios e persas, bem como, da parte
ocidental, eslavos e mongóis.

8.5.2 Justiniano e o Corpus Juris Civilis

Depois da [época dos grandes juristas (séculos II e III), decaiu o gênio criador
dos jurisconsultos romanos e nada de novo foi acrescentado à filosofia e à ciência
do direito. Continuou, no entanto, a crescer o volume dos decretos.
No séc. VI, as leis romanas já continham numerosas disposições
contraditórias e obsoletas. Além disso, as condições tinham mudado tão
radicalmente, que muitos dos antigos princípios legais não tinham aplicação,
principalmente devido ao regime de despotismo oriental e à adoção do
cristianismo como religião oficial.
Quando Justiniano subiu ao trono, em 527, resolveu, imediatamente, fazer
uma revisão e uma codificação do direito existente para harmonizá-lo com as
novas condições, adotando-o como base legal do seu governo.
A fim de realizar trabalho de tal porte, nomeou uma comissão de juristas sob
supervisão de seu ministro Triboniano. Dentro de dois anos a comissão publicou
os primeiros resultados de seus trabalhos – o Código, um revisão sistemática de
todas as leis que tinham sido promulgadas desde o reinado de Adriano té o de
Justiniano.
O Código foi, depois, completado pela Novelas, que continham a legislação de
Justiniano e de seus sucessores imediatos.
Cerca de 532, a comissão completou o Digesto – um sumário de todos os
escritos dos grandes juristas. O produto final do trabalho de revisão foram as
Instituitas, um compêndio dos princípios legais que se refletiam tanto no Digesto
como no Código.
A combinação desses quatro produtos do plano de consolidação constitui o
Corpus Juris Civilis, isto é, Corpo do Direito Civil

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26

Do ponto de vista histórico, as duas mais importantes partes do Corpus Juris


foram, sem dúvida, as Institutas e o Digesto. Eram esses que continham a filosofia
do direito e do governo que viera a prevalecer no tempo de Justiniano.
Existe a crença de ser essa uma filosofia fundamentada em Ulpiano,
Papiniano e outros grandes juristas de três séculos anteriores.
Embora se conservasse, é verdade, grande parte da antiga teoria, foram
introduzidas algumas mudanças fundamentais:
1º O Jus Civile alcança uma completa desnacionalização e tornara-se
aplicável ao cidadãos das mais diversas nacionalidades.
2º O Jus Naturale era agora tido como divino e, portanto, superior a todos os
decretos dos homens – uma concepção que estava destinada a Ter larga
aceitação na filosofia medieval posterior.
Houve, também, uma tendência dos juristas de Justiniano a falar do imperador
como único legislador, na suposição de que o povo entregara todo o seu poder a
ele. Em outras palavras, o direito clássico romano estava sendo revisado para
atender às necessidades de um monarca oriental cuja soberania só era limitada
pela lei de Deus.

9 Idade Média

9.1 Aspectos gerais

Com a decadência do Império Romano ( início no séc. III), a Europa entre em


um novo período histórico que se estende até o séc. XV. È um período amplo e
pleno de acontecimentos, do qual fazemos um quadro para efeito didático:

9.2 Características do Direito na Idade Média

- Pluralismo de jurisdições – nenhum grupo controla todos os aspectos da


vida civil.
- Rejeição da legislação pelo desuso.
- Ideologia do Direito Natural como controle substancial das leis abusivas.
- Subordinação do superior aos direitos tradicionais dos inferiores.
- Costume como fonte de direito – a lei pode corrige os costumes não
racionais ou razoáveis.
- Bem comum – impedimento de interesses particulares como justificação
de decisões relativas a qualquer grupo.

9.3 A patrística

Tendo morrido os apóstolos, coube aos novos herdeiros do


evangelho fixarem o que havia de essencial os ensinamento do Mestre. Também,

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27

nessa época surgiu a necessidade de organizar a vida litúrgica e promover o


pensamento cristão.
A princípio os romanos não deram muita atenção à nova seita que
entrava em Roma através dos judeus, principalmente através dos que chegavam
com a diáspora ocorrida em 70 de nossa Era. Afinal, era mais uma dentre muitas
outras que chegavam à capital, vindas de todas as partes do Império Romano.
Com o passar do tempo, essa seita, que viria a se tornar na religião Cristã,
acabou por ganhar adeptos, inclusive entre os patrícios. Ao cabo de, mais ou
menos , trezentos anos, se tornou a religião oficial do Império Romano.
Os primeiros momentos vivenciados pela nova religião foi de confronto com
a Filosofia, pois essa sempre se confrontara com a busca do absoluto, para os
cristãos tal problema não era colocado. Muito estranharia um filósofo grego à
afirmação de Cristo: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida.” ou “O céu e a terra
passarão, mas as minhas palavras não passarão.”. Vemos, assim, que a verdade
é algo absoluto e não somente humana mas também divina, porque revelada.
Além disso, o Cristianismo pretendia possuir tanto a verdade teórica como a
verdade prática da vida.
Esse primeiro momento do cristinaismo é marcado por escritos apologéticos
tanto ao Evangelho como aos padres (do latim pater, pai), pela cuidadosa rejeição
ao pensamento gentio, por críticas à perseguição aos cristãos e pela construção
de códigos (doutrina) de moral.

9.3.1 Santo Agostinho ( 354 – 430)

No final da Antigüidade o confronto entre a religião cristã e a filosofia ainda


era pleno de viço, contudo, com o decorrer do tempo, a primeira acabou por
predominar sobre a primeira..
Roma, que dizia ser o Mediterrâneo o seu lago, está agora sendo invadida
pelos povos bárbaros, ao mesmo tempo que sofre com a política interna
interesseira e corrupta e, também, com a economia cambaleante originada pelo
excesso de gastos. Para continuação do Império, que acabaria fatalmente por
esfacelar-se, Constantino estabelece Bizâncio, cidade situada no estreito de
Dardanelos (atual estreito de Bósforo), às margens do mar Negro, a capital de
Roma, atribuindo-lhe o nome de Constantinopla, a fim de manter, no Oriente, parte
do império que estava deixando de existir no Ocidente. Para apoio político, institui
em 312, através do Édito de Milão,o Cristianismo, que nessa época já abarcava
também as elites, como religião oficial do Império Romano, com o nome de Igreja
Católica Apostólica Romana. É ainda dentro desta fase de transição e de grandes
transformações que nasce Agostinus Aurelius - Santo Agostinho.
Com a crescente invasão bárbara, temos a conquista de Roma em 410 por
Alarico e a invasão do norte da África pelos vândalo em 429. Dois anos depois da
morte de Agostinho (430), os vândalos tomam Hipona, cidade onde o filósofo era
bispo.
Embora em seu início o cristianismo fosse somente uma doutrina, com o
decorrer do tempo surgiu a necessidade de se embasar filosoficamente seus

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ensinamentos, a fim de serem aceitos pelas autoridades romanas e pela classe


mais elitizada. Nesta tarefa empenhara-se os primeiros padres da Igreja,
escrevendo textos sobre a fé e a revelação cristã, mas em sua maioria eram
textos apologéticos, isto é, de caráter elogioso à nova religião. Esta fase da
filosofia medieval recebeu o nome de Patrística, por serem os textos escritos,
principalmente, pelos grandes padres da Igreja: São Jerônimo, Santo Ambrósio,
entre outros.
Com Agostinho chegamos ao clímax da Patrística, sendo que alguns
comentadores, entre os quais E. Gilson 1, o considera a própria Patrística. Dono
de espetacular obra composta de mais de 900 sermões e 13 livros, sendo o mais
importante Cidade de Deus, Agostinho exerceu enorme influência na Idade Média
e, também, entre os protestantes da Reforma, que por ele optaram a fim de se
oporem à Escolástica.

9.3.1.1 Cidade de Deus

Nessa obra Agostinho trata da História da Mundo, sendo o ponto


culminante a explicação do porquê da queda de Roma.
Dentro de concepção inegavelmente de origem platônica, onde observamos
a transposição da concepção de Mundo Fenomênico e Mundo Noumênico,
Agostinho afirma a existência de duas cidades: a Cidade Terrena, ou Jerusalém
Terrestre, situada no mundo sub-lunar e a Cidade Celeste (Jerusalém Celeste),
situada no mundo supra-lunar. A Cidade de Deus está representada na Terra pela
Igreja.
A Cidade Terrena está submetida à materialidade, o que fornece um caráter
mutável e, portanto, sujeita ao processo de nascimento, vida e morte. Nela não
podemos encontrar a suprema justiça, suprema ordem, suprema beleza, enfim,
está sujeita à transitoriedade. Dessa maneira, não encontramos nela, também, a
felicidade. Roma faz parte desse mundo e, portanto, sua destruição e queda é
contingente à sua essência.
Quanto à Cidade de Deus, esta, por não ser corpórea e, assim, sujeita ao
acaso da matéria, manifesta exatamente o oposto da outra. Sua manifestação
terra, a Igreja, é formada por homens que não se entregaram às coisas externas,
para gozar delas ou de si mesmos, mas vivem uma ordem ideal, em Deus e de
Deus, que dá ao homem a paz e o descanso de Deus.
Entre ambas as cidades ocorre uma luta representativa da existente entre a
luz e as trevas. No final dos tempos a Cidade de Deus triunfará sobre a Terrena
pois, sendo o bem imortal, obterá a vitória de Deus.

9.3.1.2 Ética

- A Lei Eterna

As razões eternas, que se constituirão nas leis eternas, existentes na mente

1
GILSON, E. .Introduction à l’ étude de saint Augistin, em Revue des Études Augustiniennes. Paris, 1955

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divina são os fundamentos do conhecimento do ser e, também, da própria


moralidade.
A Lei eterna é a vontade de Deus, a qual manda que se observe a lei da
natureza . A lei eterna abrange a ordem todos os seres, ou seja, o mundo material
(les naturalis),o mundo ideal dos valores lógicos (lex rationes) e o mundo moral
das prescrições do dever (lex voluntatis ou ordo amoris). Muitas vezes, contudo,
Agostinho chama de lei moral a própria lei divina, se constituindo em um thélos a
ser alcançado através da razão e da vontade. Seu conteúdo coincide com a
essência de Deus, ou seja, com a própria sabedoria divina.

- O Direito

Encontramos em Agostinho o conflito entre a realidade bruta e a ideal,


onde procura examinar o problema de saber se o Direito Natural é um somente,
absoluto, eterno, ou se tolera algumas concessões quando de sua transposição
às condições humanas. As explicações se farão ora sob o aspecto filosófico e
ora sob o aspecto teológico.
A lei da conduta, e com ela o Direito, pode se constituir como a
expressão plena das idéias absolutas. Tal era a situação do homem quando de
seu estado de graça, ainda no Paraíso. Mas, quando a natureza humana foi
corrompida pelo pecado original, acabou por ser afetada pelos imperativos da
necessidade material que resultaram em tendências pecaminosas. O homem é
pecador. Dessa maneira, se faz mister estudar as leis divinas e sua adequação a
essa situação. A ordem jurídica deverá levar em conta essa característica do ser
humano, bem como as limitações por ela determinada, reduzindo, quando
possível, o mal. Disso deriva a concepção agostiniana de um direito duplo
natural: o primário e o secundário.
O primário é um Direito Natural absoluto, que corresponde, na natureza
humana, ao estado de graça.
O Direito Natural secundário é aquele a que pode aspirar o ser humano
em sua atual condição. Tal Direito contém tanto o aspecto racional como os
empíricos, organizados, no entanto, de forma racional. Em um estado de graça
perfeita, a natureza empírica não desempenharia nenhum papel para a
determinação dos ideais de justiça, porque o homem estaria submetido
inteiramente à vontade e razão divinas. Quando do pecado original, essa
submissão foi cortada e, assim sendo, agora as homens não conseguem mais
entender e se submeter à razão divina.
Contudo, Agostinho aponta variações para o Direito tornando esse
capaz de encontrar justificação nas próprias leis eternas, a qual exige que
distintas circunstâncias sejam reguladas congruentemente por normas de
conteúdo diferente, pois essa variedade de circunstâncias se coloca, de
antemão, prevista pela lei eterna, a qual, por imperativo próprio, se adapta ao
dinamismo da vida. Assim, o princípio eterno garante as leis observadas pelos
homens.

- A liberdade

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Seguindo os pressupostos acima, a liberdade pode ser atribuída ao


homem? Não seria ele somente conseqüência de uma causa primeira divina?
Agostinho resolve o problema atribuindo a determinação causal divina somente à
natureza irracional, sendo que o reino aos seres espirituais ela impõe uma
prescrição moral ideal que, muito pelo contrário, pressupõe a liberdade. Em
síntese, a aceitação da lei moral (ou divina) se faz através da razão e, assim
sendo, o homem continua a possuir o livre arbítrio.

9.4 Direito Canônico

O papa Gregório VII (papa no período de 1073 a 1085), nesse início de


expansão do ocidente, afirmara seu poder de legislar e criar novas leis de acordo
com as necessidades do tempo, o que iria levando a uma ampliação dos novos
cânones. Este, no entanto, deveriam encaixar-se na tradição da Igreja. Somente
ele, o papa, poderia explicar as antigas normas, ou seja, realizar a interpretação
autêntica das leis, de acordo com as Escrituras.
A tradição combinava-se progressivamente com o princípio monárquico. Os
canonistas viriam auxiliar este desenvolvimento.
Em 1075, Gregório VII emite o Dictatus Papae, que se tratava de uma série de
títulos ou princípios visando a liberdade e independência da Igreja. Destacamos:
a) A Igreja Romana foi fundada exclusivamente pelo Senhor.
b) Só o bispo de Roma pode ser chamado universal de direito.
c) Só ele pode depor e instalar bispos.
d) Seu legado precede a todos os bispos de um concílio, mesmo se tiver um
grau hierárquico inferior, e pode sentenciar qualquer um deles com a
deposição.
e) Só ele pode legislar de acordo com as necessidades do tempo.
f) Só seus pés podem ser beijados pelos príncipes todos.
g) Só seu nome deve ser recitado nas Igrejas.
h) Ele pode depor os imperadores.
i) Não se podem chamar sínodos gerais sem as suas ordens.
j) Nenhum capítulo ou livro pode ser considerado canônico sem a sua
autoridade.
k) Nenhum dos seus julgamentos pode ser revisto, mas ele pode rever os
julgamentos de todos.
l) Os casos mais importantes de todas as Igrejas podem ser levados à Sé
Apostólica (ele é ordinário em qualquer jurisdição).
m) A ele compete dissolver os laços de vassalagem e fidelidade para com o
homem injusto.
Assim a Igreja se afirmava, definitivamente, como poder absoluto, inclusive
sobre o Estado.

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Para se ter uma idéia da extensão desse direito, citamos o caso do celibato:
anteriormente, os senhores feudais (seculares) estavam acostumados a brindar
seus fiéis vassalos ou com cargos eclesiásticos, ou com direitos sobre terras da
igreja (paróquia, mosteiros). Indicar alguém para um benefício, era fazê-lo parte de
sua esfera de poder. Se o benefício era eclesiástico, se o indicado era um clérigo
ou sendo leigo fosse indicado para uma função clerical, o comprometimento da
Igreja era inevitável. Se os clérigos então se casassem e tivessem filhos, a
hereditariedade do cargo poderia ser firmada e afirmada. Podendo casar-se, os
clérigos também se uniam às famílias senhoriais, contraindo matrimônio com filhas
de príncipes e proprietários, etc. A imposição do celibato como regra geral era
uma tentativa de impedir o compromisso com os poderes seculares. Mesmo que,
de fato, os clérigos constituíssem família, o não reconhecimento oficial dos filhos e
das relações matrimoniais pelo menos dificultaria a hereditariedade.
A imposição de que o bispo deveria ser nomeada e confirmada pelo papa e
não pelo monarca era outra tentativa de romper com as relações de compadrio
estabelecida.
Aqui vale lembrar duas coisas:
a) Que a jurisdição no período medieval era mais do que a função do
judiciário, tal como concebida hoje em dia. A justiça não era apenas uma
das atividades do poder. Ela era a primeira, senão a única atividade do
poder. A justiça limitava o poder por cima (pela doutrina do direito natural e
pela tradição) e por baixo (direitos particulares e pela autonomia das
corporações de ofício, assim como pelos costumes), de modo que toda
decisão (administrativa, judicial ou legislativa, nos termos atuais) deveria
ser uma distribuição de justiça (dar o devido a cada um). Por isso, a
atividade legislativa não se separava totalmente da atividade judicial ou da
administrativa. A interpretação, a legalização e a aplicação do direito no
caso concreto se misturavam, de tal modo que um breve, um rescrito ou
uma resposta, em geral ligados a um caso concreto, tornavam-se
precedentes vinculados e normativos gerais.
b) O problema da hermenêutica demonstrava, nestas situações, sua primazia
sobre a vida do direito. sendo o cristianismo uma religião do livro central de
decidir de acordo com um texto normativo objetivo (as Escrituras) e uma
tradição anterior. O intérprete deveria vencer a distância temporal que o
separava dos fundadores da religião até o contexto em que o redator e
leitor se incluía.

9.4.1 Os canonistas

O desenvolvimento do direito canônico ligou-se ao surgimento de uma classe


nova: aqueles que na Igreja viriam dominar pelo seu particular saber de cânones.
Esses podiam fazer carreira por meio de uma ascensão profissional e já não mais
exclusivamente pela amizade ou pelo nascimento. Organizava-se a primeira
burocracia semelhante à moderna na Europa, na medida em que o cargo ou ofício
exigia um treinamento profissional. Rompia-se, assim, com o personalismo e o
governo foi separado relativamente das lealdades pessoais, substituído por um
sistema de competência definida em lei.

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Esses novos atores desempenharam um papel político relevante pois, com


seu saber especializado, serviram à nova autocracia romana. Ao mesmo tempo,
por outro lado, limitaram o poder do papa, por meio de suas muitas e sutis
interpretações. Discutiam e formulavam normas não apenas sobre assuntos tais
como em que condições um papa era eleito e legislava validamente. Também
definiam em que condições poderia ser deposto. Se, anteriormente, Graciano
havia afirmado que o papa somente poderia ser julgado e deposto quando se
desvia da fé, agora Huguccio considera que o papa pode ser julgado e deposto
em caso de notória fornicação, roubo, sacrilégio ou outros crimes notórios que
escandalizam a Igreja.
Foram os canonistas, também, que começaram a tirar do Direito Natural
conseqüências políticas. Segundo eles, cessavam as competências de papas e
concílios e todos deveriam se subordinar ao Direito Natural e ao Direito Divino.
Assim sendo, sempre havia quem contestasse juridicamente certas decisões
considerando-as incompatíveis com o direito natural, o que dava margem a uma
interminável discussão.
O Direito Natural a que se referiam era a razão legal, um princípio do
coerência interna. Era mais um processo de harmonização lógica, moral e política
e nada, ou pouco, tinha a ver com a dogmática ou com uma exegese de regras.
Era uma maneira de “controlar” os poderes absolutos do papa e da Igreja.

9.4.2 A Inquisição

Trata-se de uma triste herança de origem canônica, embora não somente.


O sistema inquisitorial já era conhecido dos normandos, sendo que
Guilherme I mandou fazer na Inglaterra um grande inquérito administrativo que
resultaria no temido Doomsday Book. (1085), ou seja, um registro de todas as
tendências de terra do reino, contra o qual não havendo prova possível, seria a
palavra final em todas as disputas de terra. Processos semelhantes ocorreram em
Portugal e na França. Essas inquirições tiveram origem na prática canônica, onde
o bispo era inquisidor ordinário de uma diocese.
Foi somente com Inocêncio III (1198 – 1216) que esse modelo passou a ser
exercido sobre os hereges, e Inocêncio IV (1252) permitiu o uso da tortura par
obter-se uma confissão do suspeito.

9.4.3 Contribuições da canônica para a teoria da pessoa jurídica.

No Direito Romano não havia pessoa jurídica. Havia, sim, as instituições


como o colégio, as universidades, as associações, mas não enquanto pessoa
jurídica.
Se a pessoa jurídica é um esquema de separação de patrimônio,
representação e responsabilidade para um atividade, o papel mais próximo disto é
o desempenhado em Roma pela família – responsável jurídico.
A Canônica introduziu alguns conceitos que fizeram distinguir a pessoa física
da jurídica, a saber:

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a) O princípio da autonomia da associação: qualquer grupo podia juntar-se


para formar uma pessoa jurídica (corporação)
b) Qualquer corporação detinha jurisdição sobre seus membros (não só as
corporações públicas ou políticas)
c) Havia casos em que o representante deveria ouvir os representados, sob
pena de invalidade de seus atos.
d) Solidariedade entre os membros da corporação: aquilo que pertencia à
sociedade pertencia aos seus membros, daí se originava o poder de
taxar os respectivos membros.
e) Quanto aos crimes e á pena imposta, o princípio era que o praticado pela
maioria dos membros era imputado a todos da sociedade, os praticados
pelos representantes apenas não se estendia á sociedade toda. Assim,
uma cidade poderia sofrer interdito (proibição de realização de cultos ou
festas) por crimes de seus cidadãos, mas não poderia , ou não deveria,
sofrer interditos por crimes exclusivos de seu governo.

9.4.4 Prática da Ordálio (ou Ordália)

Foi praticada desde a Antiguidade e em diversas civilizações, mas tornou-


se uma prática freqüente no início da Idade Média Europeia, quando, pela
perda da centralização do Império Romano em Roma, muitos costumes
tradicionais voltaram a ser aceitos.
Essa prática consistia em fazer o acusado, colocar os braços em água
fervente, segurar bolas incandescentes de ferro, caminhar sobre carvão em
brasa, sem sofrer nenhuma injúria.Muitas vezes, tratava-se de um conluio
entre o acusado e o padre encarregado de organizar a cerimônia, para
enganar a população crédula.4

10 O Direito Inglês

10.1 As principais fontes do Direito nos diferentes sistemas jurídicos do


ocidente:

- A Magna Carta da Inglaterra

Enquanto continuavam as cruzadas o absolutismo foi se firmando na Europa.

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No século XIII, o rei inglês, João 1º, considerado teimoso e descontrolado, era
ridicularizado pelo fato de seu pai tê-lo ignorado na partilha da herança. Assim,
ganhou o cognome de "João Sem Terra" (John Lackland).

Desde o início, sofrera por ser o sucessor de seu popular irmão Ricardo Coração
de Leão. Além disso, envolveu-se numa rixa constante com a Igreja. Porém a
rápida perda de prestígio do soberano deveu-se aos longos anos de disputas
com a França em torno das posses continentais da coroa inglesa no norte
francês.

No início de 1214, o soberano francês ameaçou atacar a Inglaterra e João Sem


Terra se antecipou, invadindo a França. Mas a invasão foi um lamentável
fracasso. A vergonha da derrota fez com que a nobreza inglesa se levantasse
definitivamente contra seu monarca. Em 63 artigos, os nobres estipularam quais
direitos queriam que o rei inglês garantisse a eles e a seus descendentes.

Algumas das exigências mais importantes eram o direito a que nenhum imposto
fosse mais criado sem a aprovação da nobreza, bem como que nenhum cidadão
livre poderia ser preso por funcionários reais sem que as razões de sua prisão
fossem investigadas. Além disso, os nobres estabeleceram para si privilégios
inalienáveis, os quais nem o rei nem o papa poderia revogar. A partir daí, pela
primeira vez, um rei inglês não reinaria mais pela "graça divina", com poderes
ilimitados.

Apesar disso, nada mais restou ao rei senão assinar a Carta Magna, naquele
histórico 15 de junho de 1215.

Não é demais lembrar que a Carta Magna era a carta de liberdades para os
senhores feudais. A massa principal da população não obteve benefício algum.
Ainda assim o documento é considerado de ímpar importância histórica, um
verdadeiro marco nos estudos de direito constitucional, no que se refere às
limitações do poder do Estado e na origem dos direitos do cidadão.

Isso porque, em forma modificada, a Carta Magna tornou-se parte e alicerce da


legislação britânica atual. Ademais, juntamente com a Declaração de Direitos

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(Bill of Rights) de 1791, formou a base de todas as leis dos Estados Unidos da
América. Não é um exagero considerar que tal documento criou as condições
para que liberdades e direitos civis pudessem se estabelecer, primeiramente na
Grã-Bretanha e, mais tarde, no mundo ocidental.

11 Idade Moderna e Contemporânea

11.1 O Iluminismo

O Iluminismo foi um movimento intelectual que surgiu durante o século XVIII na


Europa, que defendia o uso da razão (luz) contra o antigo regime (trevas)  e
pregava maior liberdade econômica e política.

Este movimento promoveu mudanças políticas, econômicas e sociais, baseadas


nos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade.

O Iluminismo tinha o apoio da burguesia, pois os pensadores e os burgueses


tinham interesses comuns.

As críticas do movimento ao Antigo Regime eram em vários aspectos como:


- Mercantilismo.
-Absolutismo monárquico.
- Poder da igreja e as verdades reveladas pela fé.
Com base nos três pontos  acima, podemos afirmar que o Iluminismo defendia:
- A liberdade econômica, ou seja, sem a intervenção do estado na economia.
- O Antropocentrismo, ou seja, o avanço da ciência e da razão.
- O predomínio da burguesia e seus ideais.

As idéias liberais do Iluminismo se disseminaram rapidamente pela população.


Alguns reis absolutistas, com medo de perder o governo - ou mesmo a cabeça -,
passaram a aceitar algumas idéias iluministas.
Estes reis eram denominados Déspotas Esclarecidos, pois tentavam conciliar o
jeito de governar absolutista com as idéias de progresso iluministas.
Alguns representantes do despotismo esclarecido foram: Frederico II, da Prússia;
Catarina II, da Rússia; e Marquês de Pombal, de Portugal.
Alguns pensadores ficaram famosos e tiveram destaque por suas obras e
idéias neste período. São eles:
John Locke
É considerado o “pai do Iluminismo”. Sua principal obra foi “Ensaio sobre o

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entendimento humano”, aonde Locke defende a razão afirmando que a nossa


mente é como uma tábula rasa sem nenhuma idéia.

Defendeu a liberdade dos cidadãos e Condenou o absolutismo.

Voltaire
François Marie Arouet Voltaire destacou-se pelas críticas feitas ao clero católico,
à inflexibilidade religiosa e à prepotência dos poderosos.

Montesquieu
Charles de Secondat Montesquieu em sua  obra “O espírito das leis”  defendeu a
tripartição de poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário.

No entanto, Montesquieu não era a favor de um governo burguês. Sua simpatia


política inclinava-se para uma monarquia moderada.

Rousseau

Jean-Jacques Rousseau é autor da obra “O contrato social”, na qual afirma que o


soberano deveria dirigir o Estado conforme a vontade do povo. Apenas um Estado
com bases democráticas teria condições de oferecer igualdade jurídica a todos os
cidadãos.
Rousseau destacou-se também como defensor da pequena burguesia.

Quesnay
François Quesnay foi o representante oficial da fisiocracia. Os fisiocratas
pregavam um capitalismo agrário sem a interferência do Estado.

Adam Smith
Adam Smith foi o principal representante de um conjunto de idéias denominado
liberalismo econômico, o qual é composto pelo seguinte:
- o Estado é legitimamente poderoso se for rico;
- para enriquecer, o Estado necessita expandir as atividades econômicas
capitalistas;
- para expandir as atividades capitalistas, o Estado deve dar liberdade econômica
e política para os grupos particulares.
A principal obra de Smith foi “A riqueza das nações”, na qual ele defende que a
economia deveria ser conduzida pelo livre jogo da oferta e da procura.

Texto

O que o Iluminismo defendia

Segundo o sociólogo Lucien Goldman, os princípios do Iluminismo estão


relacionados ao comércio, uma das principais atividades econômicas da
burguesia.

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37

Assim, o Iluminismo defendia:


1. Igualdade: no comércio, isto é, no ato de compra e venda, todas as
eventuais desigualdades sociais entre compradores e vendedores não
tinham importância. Na compra e venda, o que importava era a igualdade
jurídica dos participantes do ato comercial. Por isso, os iluministas
defendiam que todos deveriam ser iguais perante a lei. Ninguém teria,
então, privilégios de nascença, como os da nobreza. Entretanto, a
igualdade jurídica não significava igualdade econômica. No plano
econômico, a maioria dos iluministas acreditava que a desigualdade
correspondia à ordem natural das coisas.
2. Tolerância religiosa ou filosófica: na realização do ato comercial, não
importavam as convicções religiosas ou filosóficas dos participantes do
negócio. Do ponto de vista econômico, a burguesia compreendeu que seria
irracional excluir compradores ou vendedores em função de suas crenças
ou convicções pessoais. Fosse mulçumano, judeu, cristão ou ateu, a
capacidade econômica das pessoas definia-se pelo ter e não pelo ser.
3. Liberdade pessoal e social: a atividade comercial burguesa só poderia
desenvolver-se numa economia de mercado, ou seja, era preciso que
existisse o livre jogo da oferta e da procura. Por isso, a burguesia se opôs à
escravidão humana e passou a defender uma sociedade livre. Afinal sem
trabalhadores livres, que recebessem salários, não podiam haver mercado
comercial.
4. Propriedade privada: comércio só era possível entre os proprietários de
bens ou de dinheiro. O proprietário podia comprar ou vender porque tinha o
direito de usar e dispor livremente de seus bens. Assim, a burguesia
defendia o direito à propriedade privada, que característica essencial da
sociedade capitalista. 

11.2 A independência dos Estados Unidos e a Revolução Francesa

Quando adentramos o processo de constituição dos governos liberais e a crise


do absolutismo, costumamos compreender que a participação francesa na
emancipação das Treze Colônias teve grande importância na deflagração da
Revolução Francesa de 1789. Geralmente, o elo entre as duas experiências
históricas se explica pelo fato da França participar das Guerras de
Independência dos Estados Unidos com o envio de tropas que lutaram em
defesa dos colonos norte-americanos.

No entanto, seria satisfatório dizer que os soldados franceses teriam carregado


de volta à sua terra natal o sentimento de autonomia que inspirou as Treze
Colônias a lutarem contra a opressão inglesa? Apesar de não ser falsa, essa
premissa não contempla o fato de que o século XVIII assistia a disseminação
do ideário iluminista, que motivou a luta de várias nações contra a ação de
regimes monárquicos ou contrários ao mecanismo de representação política.

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Para que a proximidade ideológica entre as duas experiências históricas seja


melhor desenvolvida, sugerimos a exposição de dois documentos que podem
assinalar, de maneira bem clara, como o projeto político francês e o norte-
americano se assemelhavam. Como sugestão, recomendamos o trabalho com
a “Declaração de Independência dos Estados Unidos da América” (1776) e a
“Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” (1789).

No primeiro documento, temos a seguinte assertiva sobre o ideal de igualdade


e o funcionamento das instituições políticas:

“São verdades incontestáveis para nós; todos os homens nascem iguais; o


Criador lhes conferiu certos direitos inalienáveis, entre os quais os de vida, o
de liberdade e o de buscar a felicidade; para assegurar esses direitos se
constituíram homens-governo cujos poderes justos emanam do consentimento
dos governados; sempre que qualquer forma de governo tenda a destruir
esses fins, assiste ao povo o direito de mudá-la ou aboli-la”

Em contrapartida, o documento francês aborda a relação do indivíduo com o


Estado da seguinte forma:

“A lei é a expressão da vontade geral; todos os cidadãos têm o direito de


concorrer, pessoalmente ou por seus representantes, à sua formação; ela deve
ser a mesma para todos, seja protegendo, seja punindo. Todos os cidadãos,
sendo iguais a seus olhos, são igualmente admissíveis a todas as dignidades,
lugares e empregos públicos, segundo sua capacidade e sem outras distinções
que as de suas virtudes e de seus talentos.”

Por meio desses dois trechos, a semelhança ideológica desses processos


históricos fica mais clara. A ideia de que as instituições políticas têm origem
humana e devem ser moldadas de acordo com o interesse daqueles que são
controlados por elas fica evidenciada. Além disso, o imprescindível respeito à
vontade dos governados também convive com o ideal de que um governo só
poderia ser legítimo no momento em que garantia a felicidade daqueles que
representava.

Dessa forma, a visão simplista de que os soldados franceses apenas


transferiram o projeto político norte-americano para sua terra natal acaba
sendo resolvido. Ao mesmo tempo, podemos conferir, por meio da própria
leitura da documentação histórica existente, como se delineava as visões
políticas dos participantes de cada uma dessas experiências históricas do
século XVIII.

Por Rainer Sousa


Graduado em História

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Equipe Brasil Escola

11.3 Constituição dos Estados Unidos

São esses os artigos da Constituição americana:


 Artigo I – Poder Legislativo
 Artigo II – Poder Executivo
 Artigo III – Poder Judiciário
 Artigo IV – A relação entre os estados
 Artigo V – O processo de emenda da Constituição
 Artigo VI – Débitos anteriores à Constituição, Soberania da Constituição e
Compromisso das autoridades públicas de lealdade à Constituição
 Artigo VII – Ratificação e entrada em vigor.
A importância do artigo VII fica ainda mais clara quando olhamos o que teria
acontecido se ela não houvesse sido ratificada: ela não teria entrado em vigor. E
como sabemos disso? Simples: existe um exemplo real: a Emenda XXVII.
Vejamos:

Os direitos e garantias fundamentais só apareceram mais de um ano depois,


quando as emendas de 1 a 10 (também conhecidas como Bill of Rights, algo como
‘Carta de Direitos’), entraram em vigor em 15 de dezembro de 1789. Mas essas
não são todas as emenda à Constituição. No total, são 27 e elas tratam dos
assuntos mais variados. Elas estão listadas abaixo, e na frente de cada uma
colocamos as datas em que elas foram aprovadas pelo Congressso (‘p.’) e a data
na qual finalmente entraram em vigor ('r.'). Ao contrário do que ocorre no Brasil, o
Congresso americano não tem o poder de fazer uma emenda entrar em vigor.
Para que isso ocorra, ele primeiro precisa aprová-la por maioria de dois terços.
Mas essas aprovação funciona apenas como uma proposta (por isso 'p.'). A
entrada em vigor só acontece depois que os parlamentos estaduais ou uma
assembléia constituinte a ratificarem com no mínimo três quartos dos votos.
Apenas com a ratificação (‘r.’) é que ela finalmente entra em vigor.
 Emenda I – Liberdade de imprensa, de religião e de expressão
 Emenda II – Direito de portar armas 
 Emenda III – Direito de aquartelamento em propriedade privada
 Emenda IV – Busca e apreensão
 Emenda V – Produção de provas, julgamento e condenação
 Emenda VI – Direito a um julgamento célere e acareação entre
testemunhas
 Emenda VII – Julgamento por júri popular em causas civis
 Emenda VIII – Proibição de penas cruéis e não usuais
 Emenda IX – Manutenção de direitos individuais não mencionados pela
Constituição
 Emenda X – Reserva de poder às legislaturas estaduais e às pessoas
 Emenda XI – Limitação do poder de julgar (p. 1794, r. 1795)
 Emenda XII – Eleições presidenciais (p. 1803, r. 1804)

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 Emenda XIII – Abolição da escravidão (p. 1865, r. 1865)


 Emenda XIV – Direito à cidadania e políticos (p. 1866, r. 1868)
 Emenda XV – Direito de voto independente de raça ou cor (p. 1869, r.
1870)
 Emenda XVI – Poder de impor o imposto de renda (p. 1909, r. 1913)
 Emenda XVII – Votação de senadores (p. 1912, r. 1913)
 Emenda XVIII – Institui a ‘lei seca’ (p. 1917, r. 1919)
 Emenda XIX – Sufrágio feminino (p. 1919, r. 1920)
 Emenda XX – Mandato do presidencial e dos congressistas (p. 1932, r.
1933)
 Emenda XXI – Revogação da Emenda XVIII (fim da ‘lei seca’) (p. 1933, r.
1933)
 Emenda XXII – Proibição de mais de uma reeleição presidencial (p. 1947, r.
1951)
 Emenda XXIII – Votação na capital federal (p. 1960, r. 1961)
 Emenda XXIV – Desvinculação entre débitos tributários e direitos políticos
(p. 1962, r. 1964)
 Emenda XXV – Sobre o impedimento e a sucessão presidencial (p. 1965, r.
1967)
 Emenda XXVI – Direito de votação para aquelas com mais de 18 anos (p.
1971, r. 1971)
 Emenda XXVII – Limitação do aumento de salários dos congressistas (p.
1789, r. 1992)
Reparem que a última emenda – a XXVII – só foi ratificada 203 anos depois
de apresentada. Da mesma forma como a Emenda XXVII não entrou em
vigor por mais de dois séculos, a Constituição americana não teria entrado
em vigor se não houvesse sido ratificada de acordo com o artigo VII
esquecido na matéria acima.

12 Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789)

12.1 A Revolução Francesa

Por Cristiana Gomes

Pode se dizer que a Revolução Francesa teve relevante papel nas bases da
sociedade de uma época, além de ter sido um marco divisório da história dando
início à idade contemporânea.
Foi um acontecimento tão importante que seus ideais influenciaram vários
movimentos ao redor do mundo, dentre eles, a nossa Inconfidência Mineira.
Esse movimento teve a participação de vários grupos sociais: pobres,
desempregados, pequenos comerciantes, camponeses (estes, tinham que pagar
tributos à nobreza e ao clero).

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Em 1789, a população da França era a maior do mundo, e era dividida em três


estados: clero (1º estado), nobreza (2º estado) e povo (3º estado).
Clero
 Alto clero (bispos, abades e cônicos)
 Baixo clero (sacerdotes pobres)
Nobreza
 Nobreza cortesã (moradores do Palácio de Versalhes)
 Nobreza provincial (grupo empobrecido que vivia no interior)
 Nobreza de Toga (burgueses ricos que compravam títulos de nobreza e
cargos políticos e administrativos)
Povo
 Camponeses
 Grande burguesia (banqueiros, grandes empresários e comerciantes)
 Média burguesia (profissionais liberais)
 Pequena burguesia (artesãos e comerciantes)
 Sans-culottes (aprendizes de ofícios, assalariados, desempregados).
Tinham este nome porque não usavam os calções curtos com meias típicos
da nobreza.
O clero e a nobreza tinham vários privilégios: não pagavam impostos, recebiam
pensões do estado e podiam exercer cargos públicos.
O povo tinha que arcar com todas as despesas do 1º e 2º estado. Com o passar
do tempo e influenciados pelos ideais do Iluminismo, o 3º estado começou a se
revoltar e a lutar pela igualdade de todos perante a lei. Pretendiam combater,
dentre outras coisas, o absolutismo monárquico e os privilégios da nobreza e do
clero.
A economia francesa passava por uma crise, mais da metade da população
trabalhava no campo, porém, vários fatores ( clima, secas e inundações),
pioravam ainda mais a situação da agricultura fazendo com que os preços
subissem, e nas cidades e no campo, a população sofria com a fome e a miséria.
Além da agricultura, a indústria têxtil também passava por dificuldades por causa
da concorrência com os tecidos ingleses que chegavam do mercado interno
francês. Como conseqüência, vários trabalhadores ficaram desempregados e a
sociedade teve o seu número de famintos e marginalizados elevados.
Toda esta situação fazia com que a burguesia (ligada à manufatura e ao comércio)
ficasse cada vez mais infeliz. A fim de contornar a crise, o Rei Luís XVI resolveu
cobrar tributos ao povo (3º estado), em vez de fazer cobranças ao clero e a
nobreza.

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Sentindo que seus privilégios estavam ameaçados, o 1º e 2º estado se revoltaram


e pressionaram o rei para convocar a Assembléia dos Estados Gerais que
ajudaria a obrigar o povo a assumir os tributos.
OBS: A Assembléia dos Estados Gerais não se reunia há 175 anos. Era formada
por integrantes dos três estados, porém, só era aceito um voto para cada estado,
como clero e nobreza estavam sempre unidos, isso sempre somava dois votos
contra um do povo.
Essa atitude prejudicou a nobreza que não tinha consciência do poder do povo e
também porque as eleições para escolha dos deputados ocorreram em um
momento favorável aos objetivos do 3º estado, já que este vivia na miséria e o
momento atual do país era de crise econômica, fome e desemprego.
Em maio de 1789, após a reunião da Assembléia no palácio de Versalhes,
surgiu o conflito entre os privilegiados (clero e nobreza) e o povo.
A nobreza e o clero, perceberam que o povo tinha mais deputados que os dois
primeiros estados juntos, então, queria de qualquer jeito fazer valer o voto por
ordem social. O povo (que levava vantagem) queria que o voto fosse individual.
Para que isso acontecesse, seria necessário uma alteração na constituição, mas a
nobreza e o clero não concordavam com tal atitude. Esse impasse fez com que o
3º estado se revoltasse e saísse dos Estados Gerais.
Fora dos Estados Gerais, eles se reuniram e formaram a Assembléia Nacional
Constituinte.
O rei Luís XVI tentou reagir, mas o povo permanecia unido, tomando conta das
ruas. O slogan dos revolucionários era “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”.
Em 14 de julho de 1789 os parisienses invadiram e tomaram a Bastilha (prisão)
que representava o poder absoluto do rei, já que era lá que ficavam os inimigos
políticos dele. Esse episódio ficou conhecido como "A queda da Bastilha".
O rei já não tinha mais como controlar a fúria popular e tomou algumas
precauções para acalmar o povo que invadia, matava e tomava os bens da
nobreza: o regime feudal sobre os camponeses foi abolido e os privilégios
tributários do clero e da nobreza acabaram.
No dia 26 de agosto de 1789 a Assembléia Nacional Constituinte proclamou a
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, cujos principais pontos
eram:
 O respeito pela dignidade das pessoas
 Liberdade e igualdade dos cidadãos perante a lei
 Direito à propriedade individual
 Direito de resistência à opressão política
 Liberdade de pensamento e opinião

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Em 1790, a Assembléia Constituinte reduziu o poder do clero confiscando diversas


terras da Igreja e pôs o clero sob a autoridade do Estado. Essa medida foi feita
através de um documento chamado “Constituição Civil do Clero”. Porém, o
Papa não aceitou essa determinação.
Sobraram duas alternativas aos sacerdotes fiéis ao rei.
1. Sair da França
2. Lutar contra a revolução
Muitos concordaram com essa lei para poder permanecer no país, mas os
insatisfeitos fugiram da França e no exterior decidiram se unir e formar um exército
para reagir à revolução.
Em 1791, foi concluída a constituição feita pelos membros da Assembléia
Constituinte.
Principais tópicos dessa constituição
 Igualdade jurídica entre os indivíduos
 Fim dos privilégios do clero e nobreza
 Liberdade de produção e de comércio (sem a interferência do estado)
 Proibição de greves
 Liberdade de crença
 Separação do estado da Igreja
 Nacionalização dos bens do clero
 Três poderes criados (Legislativo, Executivo e Judiciário)
O rei Luís XVI não aceitou a perda do poder e passou a conspirar contra a
revolução, para isso contatava nobres emigrados e monarcas da Áustria e Prússia
(que também se sentiam ameaçados). O objetivo dos contra-revolucionários era
organizar um exército que invadisse a França e restabelecesse a monarquia
absoluta (veja Absolutismo na França).
Em 1791, Luís XVI quis se unir aos contra-revolucionários e fugiu da França, mas
foi reconhecido, capturado, preso e mantido sob vigilância.
Em 1792, o exército austro-prussiano invadiu a França, mas foi derrotado pelas
tropas francesas na Batalha de Valmy. Essa vitória deu nova força aos
revolucionários franceses e tal fato levou os líderes da burguesia decidir proclamar
a República (22 de setembro de 1792).
Com a proclamação, a Assembléia Constituinte foi substituída pela Convenção
Nacional que tinha como uma das missões elaborar uma nova constituição para a
França.
Nessa época, as forças políticas que mais se destacavam eram as seguintes:
 Girondinos: alta burguesia

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 Jacobinos: burguesia (pequena e média) e o proletariado de Paris. Eram


radicais e defendiam os interesses do povo. Liderados por Robespierre e
Saint-Just, pregavam a condenação à morte do rei.
 Grupo da Planície: Apoiavam sempre quem estava no poder.
Mesmo com o apoio dos girondinos, Luís XVI foi julgado e guilhotinado em janeiro
de 1793. A morte do rei trouxe uma série de problemas como revoltas internas e
uma reorganização das forças absolutistas estrangeiras.
Foram criados o Comitê de Salvação Pública e o Tribunal Revolucionário
(responsável pela morte na guilhotina de muitas pessoas que eram consideradas
traidoras da causa revolucionária).
Esse período ficou conhecido como “Terror”, ou "Grande Medo", pois os não-
jacobinos tinham medo de perder suas cabeças.
Começa uma ditadura jacobina, liderada por Robespierre. Durante seu governo,
ele procurava equilibrar-se entre várias tendências políticas, umas mais
identificadas com a alta burguesia e outras mais próximas das aspirações das
camadas populares.
Robespierre conseguiu algumas realizações significativas, principalmente no setor
militar: o exército francês conseguiu repelir o ataque de forças estrangeiras.
Durante o governo dele vigorou a nova Constituição da República (1793) que
assegurava ao povo:
 Direito ao voto
 Direito de rebelião
 Direito ao trabalho e a subsistência
 Continha uma declaração de que o objetivo do governo era o bem comum e
a felicidade de todos.
Quando as tensões decorrentes da ameaça estrangeira diminuiram, os girondinos
e o grupo da planície uniram-se contra Robespierre que sem o apoio popular foi
preso e guilhotinado em 1794.
Após a sua morte, a Convenção Nacional foi controlada por políticos que
representavam os interesses da alta burguesia. Com nova orientação política,
essa convenção decidiu elaborar outra constituição para a França.
A nova constituição estabelecia a continuidade do regime republicano que seria
controlado pelo Diretório (1795 - 1799). Neste período houve várias tentativas para
controlar o descontentamento popular e afirmar o controle político da burguesia
sobre o país.
Durante este período, a França voltou a receber ameaças das nações absolutistas
vizinhas agravando a situação.

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Nessa época, Napoleão Bonaparte ganhou prestígio como militar e com o apoio
da burguesia e do exército, provocou um golpe.
Em 10/11/1799, Napoleão dissolveu o diretório e estabeleceu um novo governo
chamado Consulado. Esse episódio ficou conhecido como 18 Brumário.
Com isso ele consolidava as conquistas da burguesia dando um fim para a
revolução.

Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão


Estes são os artigos tratados na declaração original de 1789:
Art.1.º Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais
só podem fundamentar-se na utilidade comum.
Art. 2.º A finalidade de toda associação política é a conservação dos direitos
naturais e imprescritíveis do homem. Esses direitos são a liberdade, a
propriedade, a segurança e a resistência à opressão.
Art. 3.º O princípio de toda a soberania reside, essencialmente, na nação. Nenhum
corpo, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane
expressamente.
Art. 4.º A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo:
assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão
aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos
direitos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei.
Art. 5.º A lei proíbe senão as ações nocivas à sociedade. Tudo que não é vedado
pela lei não pode ser obstado e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela
não ordene.
Art. 6.º A lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de
concorrer, pessoalmente ou através de mandatários, para a sua formação. Ela
deve ser a mesma para todos, seja para proteger, seja para punir. Todos os
cidadãos são iguais a seus olhos e igualmente admissíveis a todas as dignidades,
lugares e empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem outra distinção
que não seja a das suas virtudes e dos seus talentos.
Art. 7.º Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos
determinados pela lei e de acordo com as formas por esta prescritas. Os que
solicitam, expedem, executam ou mandam executar ordens arbitrárias devem ser
punidos; mas qualquer cidadão convocado ou detido em virtude da lei deve
obedecer imediatamente, caso contrário torna-se culpado de resistência.
Art. 8.º A lei apenas deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias
e ninguém pode ser punido senão por força de uma lei estabelecida e promulgada
antes do delito e legalmente aplicada.

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Art. 9.º Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se
julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa
deverá ser severamente reprimido pela lei.
Art. 10.º Ninguém pode ser molestado por suas opiniões , incluindo opiniões
religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida
pela lei.
Art. 11.º A livre comunicação das ideias e das opiniões é um dos mais preciosos
direitos do homem; todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir
livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos
previstos na lei.
Art. 12.º A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força
pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade
particular daqueles a quem é confiada.
Art. 13.º Para a manutenção da força pública e para as despesas de
administração é indispensável uma contribuição comum que deve ser dividida
entre os cidadãos de acordo com suas possibilidades.
Art. 14.º Todos os cidadãos têm direito de verificar, por si ou pelos seus
representantes, da necessidade da contribuição pública, de consenti-la livremente,
de observar o seu emprego e de lhe fixar a repartição, a coleta, a cobrança e a
duração.
Art. 15.º A sociedade tem o direito de pedir contas a todo agente público pela sua
administração.
Art. 16.º A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem
estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição.
Art. 17.º Como a propriedade é um direito inviolável e sagrado, ninguém dela pode
ser privado, a não ser quando a necessidade pública legalmente comprovada o
exigir e sob condição de justa e prévia indenização.

1. Direito Português
1.1. Lei das Sete Partidas
1.2. Ordenações do Reino

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1.2.1. Ordenações Afonsinas


1.2.2. Ordenações Manuelinas
1.2.3. Ordenações Filipinas
2. Direito Brasileiro
2.1. Antecedentes do Código Civil Brasileiro. Esboço de Augusto Teixeira
de Freitas
2.2. Clóvis Beviláqua e o Código Civil de 1916
2.3. Miguel Reale e o Código de 2002
2.4. Análise histórica das Constituições brasileiras
2.4.1. Constituição de 1824
2.4.2. Constituição de 1891
2.4.3. Constituição de 1934
2.4.4. Constituição de 1937
2.4.5. Constituição de 1946
2.4.6. Constituição de 1967
5.4.6.1. Emenda Constitucional n. 1 de 1969
Constituição de 1988

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