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de Lima.
Notas sobre entrevistas do compositor à Imprensa portuguesa e
críticas de concertos.
UNIDADE CURRICULAR
Investigação em
Musicologia
DOCENTE:
DOUTORA ELISA LESSA
TRABALHO DE:
PEDRO DINIS DA ROCHA
MEIRELES
Ano 2021/2022
1º Semestre
Índice
Nota Introdutória.......................................................................................................................3
1ª PARTE....................................................................................................................................5
1.1. PERFIL BIOGRÁFICO DE EURICO THOMAZ DE LIMA.................................................................6
2ª PARTE...................................................................................................................................12
2.1. ELENCO DE TEXTOS DA AUTORIA DE EURICO THOMAZ DE LIMA E ENTREVISTAS DO MESMO NA
IMPRENSA NACIONAL..................................................................................................................13
2.2. ELENCO DE CRÍTICAS AOS CONCERTOS E RECITAIS NA IMPRENSA NACIONAL E ESTRANGEIRA..............13 Página | 2
2.3. ALGUMAS TRANSCRIÇÕES DE TEXTOS DE VARIADAS FONTES........................................................15
2.3.1. Texto da autoria de Eurico Thomaz Lima................................................................15
2.3.2. Entrevista a Eurico Thomaz Lima.............................................................................17
2.3.3. Críticas na imprensa nacional e estrangeira...........................................................19
3ª PARTE..................................................................................................................................27
3.1. NOTAS SOBRE ENTREVISTAS DO COMPOSITOR À IMPRENSA PORTUGUESA E CRÍTICAS DE CONCERTOS - O
PENSAMENTO MUSICAL DE EURICO THOMAZ DE LIMA......................................................................28
4º PARTE...................................................................................................................................30
4.1. CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................................31
Bibliografia.................................................................................................................................33
Na capa: Retrato de Eurico Thomaz Lima, desenhado por Renato Torres, 1937 (Dias, 2016)
Nota Introdutória
1
Espólio doado à Universidade do Minho, em maio de 2000, por Eurico Adolfo Lapa Tomás de Lima, filho
de Eurico Thomaz de Lima. Fazem parte do mesmo: obras musicais impressas, manuscritos musicais,
partituras impressas de Eurico Thomaz de Lima e de outros compositores, livros, coleções de jornais e
revistas, álbuns de registo da sua vida artística, documentação diversa com programas de concertos,
fotografias, diplomas, correspondência, pequenos objetos de decoração, quadros, prémios em ouro e
prata, ofertas ao compositor, recordações, fitas gravadas e discos em vinil com obras suas e o seu piano
de estudo. (http://cehum.ilch.uminho.pt/eurico#espolio – acedido a 10 de junho de 2021).
publicado e bem assim, elencam-se e transcrevem-se várias críticas publicadas na
imprensa por ocasião de vários concertos do pianista.
Na terceira parte, tecem-se as notas sobre entrevistas do compositor à Imprensa
portuguesa e críticas de concertos, indo ao encontro do pensamento musical de Eurico
Página | 4
Thomaz de Lima.
Na quarta e última parte tecem-se as considerações finais, julgadas pertinentes,
procurando-se captar e caraterizar as notas essenciais do pensamento musical de Eurico
Thomaz de Lima.
Página | 5
1ª PARTE
2
Alexandre Jorge Maria Idalécio Raimundo Rey Colaço (Tanger, Marrocos, 30 de abril de 1854 - Lisboa,
11 de setembro de 1928) foi pianista, compositor e professor no Conservatório Nacional de Música de
Lisboa.
3
Vianna da Mota (São Tomé e Príncipe, 22 de abril de 1868 – Lisboa, 1 de junho de 1948) foi um
pianista, compositor, maestro, musicógrafo português, professor, escritor e conferencista. Entre 1918 e
1938, assume a direção do Conservatório Nacional de Música de Lisboa, formando em 1918, a
Sociedade de Concertos de Lisboa, da qual foi o primeiro diretor artístico. Esta sociedade permitiu ao
público entrar em contacto com as figuras cimeiras da música portuguesa.
4
Luís de Freitas Branco (Lisboa, 12 de outubro de 1890 - 27 de novembro de 1995) foi musicólogo,
compositor, pedagogo e professor português, tornando-se uma das figuras mais importantes da cultura
portuguesa do séc. XX. Em 1916, foi professor de Leitura de Partitura, Realização de Baixo Cifrado e
Acompanhamento no Conservatório Nacional de Lisboa e, em 1918, foi vogal da Comissão de Reforma
do Conservatório de Lisboa, propondo a criação de várias disciplinas. Após a reforma do mesmo,
tornou-se subdiretor até 1924 e, entre 1919 e 1930, foi o único professor de Ciências Musicais.
5
Hermínio José do Nascimento (Torres Vedras, 4 de janeiro de 1890 - Lisboa a 14 de outubro de 1972)
compositor, regente de coros, professor, crítico e musicólogo. Foi professor de composição no
Conservatório Nacional de Lisboa, a partir de 1919, tendo assumido o cargo de subdiretor entre 1924 e
1938. Autor prolífico no domínio do lied e da música de câmara (sonatas, quartetos, peças para piano),
uma boa parte do seu catálogo é preenchido com obras para coro e orquestra e para coro à cappella,
tendo também publicado diversos arranjos de melodias tradicionais e livros didáticos.
Em 1929, Eurico Thomaz de Lima termina o Curso Superior e de Virtuosidade
com Distinção e Louvor, obtendo a mais alta classificação até então concedida no
Conservatório Nacional e adquirindo o diploma de Professor particular de Piano.
O seu professor, Mestre Vianna da Motta, referindo-se ao jovem pianista,
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escreveu: “[...] Possui qualidades artísticas excepcionais, fina musicalidade que lhe
permite penetrar inteligentemente o sentido das obras que executa, perfeição técnica,
excelente sonoridade, maleabilidade de interpretação e a maior probidade artística
[...]”.6
No mesmo ano apresenta-se no 12º Concerto da Associação Académica do
Conservatório Nacional interpretando quatro obras da sua autoria: Valsa, Prelúdio e
Estudo de Concerto, para piano e Capricho, para piano e violino, marcando o início da
sua carreira como compositor. No dia 8 de dezembro dá-se a sua estreia com a orquestra
que interpretou a obra de L. V. Beethoven, Concerto em Dó Maior n.º 1 para piano e
orquestra, sob direção do Maestro Fernandes Fão.
Apresenta-se, em 1930, pela primeira vez em concerto com o seu pai, no Salão do
Conservatório Nacional e no ano seguinte (1931) realizam juntos novo concerto na
Academia Mozart no Porto onde assumiu, em 1932, o cargo de Diretor Artístico e
professor de piano, desempenhando as funções até 1934. No mesmo ano realiza
concertos nos Açores, Coimbra e Porto, marcando o início de uma próspera e intensa
carreira como pianista, realizando em todo o país inúmeros concertos, interpretando
obras de vários compositores e também interpretando frequentemente obras da sua
autoria, contribuindo para uma dinâmica divulgação da música portuguesa e dá a
conhecer mais duas das suas obras: Estudo em forma de Dança e Estudo de Execução
Transcendente em Mi bemol Maior, para piano.
Em 1931 é convidado pelo Professor Tomaz Borba, Diretor da Academia de
Amadores de Música de Lisboa, para a classe de piano, cargo que ocuparia até janeiro
do ano seguinte. Em 1932 realiza o primeiro recital só com composições da sua autoria,
consagrando-se como compositor. São deste ano as obras: Tema e Variações em Fá
Maior, Estudo n.º 1 (Staccato), Estudo em Sol bemol e Fantasia em Sol bemol para
piano; Prometeu Heróico para dois pianos.
Eurico Thomaz de Lima participa constantemente em Concertos, apresenta-se
regularmente em recitais na Rádio Difusão Portuguesa (ex-Emissora Nacional), no
6
Lisboa, Conservatório Nacional, 1929 apud DIAS, Victor, Eurico Thomaz de Lima (1908-1989), Pianista,
Compositor e Pedagogo adotado pela Maia in Revista da Maia – Nova Série, Ano I, Nº 2 julho/dezembro
2016, pp. 99-102.
Rádio Clube Português, na Rádio Renascença e na Radiotelevisão Portuguesa (RTP-
Estúdios do Porto).
Decorria o ano de 1934 e o compositor e pianista casa-se no Porto, com Ângela
Lapa nascendo-lhe um filho um ano mais tarde.
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É por esta altura que compõe as obras: Estudo n.º 2, 1.ª Sonata, Barcarola e
Minuete, para piano (1933); Canto de Amor para flauta e piano; Poema, para violino e
piano e Dança Portuguesa, para piano (1934).
Em 1934, quando deixa a Academia Mozart passa a viver apenas das aulas
particulares e dos seus recitais e concertos.
Decorria o ano de 1937 e abre a Academia Beethoven no Porto para a qual
Thomaz de Lima é convidado a lecionar, ficando responsável pela classe de Piano,
cargo que ocupa até 1939. É nestes anos que participa no sarau Noite da Figueira, na
Figueira da Foz, num recital no Primeiro Congresso Açoriano no Casino do Estoril,
num concerto no Clube Fenianos Portuenses, interpretando obras da sua autoria e
realiza dois recitais no Salão Orfeo um com obras de Chopin e outro com o
Violoncelista Celso Carvalho. São desta época as suas obras: Canção da Vida e da
Morte, para canto e piano (1936); Balada dos olhos tristes, para canto e piano (1937);
Sonatina n.º 1, para piano e Mors-Amor, para
canto e piano (1938); Marcha e Improviso sobre canções Populares Açoreanas, para
dois pianos (1939).
Nos anos de 1940/41, Eurico Thomaz de Lima, juntamente com outras figuras de
relevo da cultura musical portuguesa, nomeadamente Madalena Sá e Costa, Paulo
Manso e Leonor Vianna da Motta, apresentou-se em todo o país em Recitais de Música
de Câmara integrados nas Missões Culturais do Secretariado da Propaganda Nacional,
do qual era chefe. Dos programas faziam parte, frequentemente, obras inéditas
compostas por eles. Nestes anos compõe Dança Negra n.º 2 – Angola e Abelhas
Douradas, para piano e Canção, para canto e piano (1940); Fantasia à memória de
Chopin e Algarve, para piano e Canção7 e Senhora Quintaneira, para canto e piano
(1941).
7
Com esta obra (1940) – Canção, para canto e piano, é-lhe atribuída uma Menção Honrosa nos “Jogos
Florais da Primavera”, organizados pela Emissora Nacional de Radiodifusão, concorrendo à modalidade
de “Canção para canto e piano”. Concorrendo novamente no ano seguinte, obtém o Primeiro Prémio –
Papoila de Ouro – atribuído por um júri constituído pelos Maestros Pedro de Freitas Branco, Pedro
Blanch, Frederico de Freitas e o Professor Tomaz Borba, o que imprime novo folego à sua qualidade
como compositor.
Entre os anos de 1942 e 1945 Thomaz de Lima continua a participar em vários
concertos e compõe algumas das suas obras que continuam a evidenciar o seu
virtuosismo ao piano como instrumento de eleição e o seu cunho marcadamente
nacionalista: Ó Ribeira, ribeirinha e Vira, para canto e piano (1942); Dança Negra n.º 3
Página | 9
– Angola, Divertimento e Estudo n.º 3, para piano, Dorme, dorme, meu menino e Verde
Gaio, para canto e piano (1943); Marcha n.º 1, para piano; Fantasia Depois de uma
leitura de Camilo, para piano e orquestra8 e uma versão da mesma para dois pianos 9;
Triste Cantiga de Amor para canto e piano (1944); Samba e Buchenwald10 para piano
(1945).
Em 1945 iniciou uma classe de piano, na cidade de Guimarães, onde durante 18
anos, dirigiu cursos de aperfeiçoamento e interpretação pianística.
Em 1949 este pianista virtuoso de craveira internacional realizou uma importante
tournée no Brasil, apresentando-se com êxito nas salas de concertos mais importantes
daquele país feito que repetiu em 1952 em nova viagem ao Brasil consolidando o seu
prestígio como compositor e intérprete, chegando a receber do Liceu Literário
Português e da Casa do Porto do Rio de Janeiro diplomas de Sócio Honorário. Grava,
ainda no Brasil, aquando da segunda digressão, na Rádio Ministério da Educação e
Saúde na Escola Nacional de Música do Rio de Janeiro as obras – Morna nº 1, Três
Danças Negras e Coral Alentejano da Suite Portuguesa nº 1 – transmitidas
posteriormente pela Rádio Renascença do Porto.
Durante os anos que dirigiu os cursos em Guimarães, Thomaz de Lima continuou
uma intensa atividade artística, quer como compositor quer como interprete em
inúmeros recitais e concertos, onde teve a oportunidade de estrear algumas das suas
obras: Recital no Salão Nobre do Grémio do Comércio de Guimarães (1948) apresenta
as obras Sonata nº 2 e Suite Portuguesa nº 1 (composta em 1947); no dia 1 de dezembro
de 1948 estreia a Sonata nº 3, composta no mesmo ano, no Clube Fenianos Portuenses;
no dia 1 de junho de 1949 estreia na cidade de Guimarães as Variações Vimaranenses
(composta em 1948);
8
A versão para piano e orquestra teve a sua estreia a 25 de maio de 1962, no Teatro Cine da Covilhã,
com a Orquestra Sinfónica do Sindicato dos Músicos sob direção do Maestro Raul de Lemos e com a
colaboração do Orfeão da Covilhã.
9
A versão para dois pianos teve a sua primeira audição em maio de 1957 num recital realizado no
Conservatório de Música do Porto com Eurico Thomaz de Lima e o pianista José Neves.
10
Buchenwald é uma obra inspirada no drama dos campos de concentração alemães. Thomaz de Lima
estreou esta obra num concerto no Porto, em dezembro de 1946, onde foi grande a recetividade desta
obra, tendo sido executada diversas vezes em concertos posteriores.
no 218º Serão Cultural e Recreativo da FNAT, executa, a 5 de agosto de 1950 a obra O
Ferreiro para orquestra, composta no mesmo ano (neste ano compõe ainda a 2.ª
Sonatina, e Marcha n.º 2, para piano; em 24 de maio de 1954 no clube Fenianos
Portuenses, apresenta seis obras da sua autoria em primeira audição: Sonata n.º 4,
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Estudo n.º 6, Tocata n.º 3, Pirilampos, Polichinelozinho e a Suite Portuguesa n.º 2; Em
maio de 1956 no Conservatório de Música do Porto, realiza um recital com a cantora
Lucinda da Rocha Barbosa Henriques onde, mais uma vez, estreia composições suas:
Prelúdio e Scherzino e Brasil11. Estes são alguns dos exemplos, mas muitos outros
concertos e recitais poderiam ser enumerados e mais obras do compositor poderiam ser
referenciadas.
Em 1965, Eurico Thomaz de Lima é nomeado Diretor Artístico dos Cursos de
Música e Belas-Artes, na cidade do Funchal, Ilha da Madeira, regressando ao Porto em
1967. Durante este tempo na ilha da Madeira compôs uma Suite em seis quadros a qual
chamou Ilha do paraíso em homenagem ao arquipélago da Madeira e inspirada na
paisagem e folclore da ilha.
Decorria o ano de 1967 e é convidado para lecionar na Academia Parnaso, no
Porto, onde exerce funções até 1975. A partir de 1972, Eurico Thomaz de Lima também
é professor na Escola de Música Calouste Gulbenkian, em Braga, lecionando as classes
de Piano, cargo que ocupa até à sua jubilação, em 1978. Aos setenta anos de idade é
então homenageado no referido Conservatório, realizando a 17 de dezembro um recital
com obras da sua autoria.
As obras que se seguem, algumas das quais compostas entre 1956 e 1972
continuam a impor Eurico Thomaz de Lima na literatura para Piano, que constitui o
maior número de obras do compositor: Regresso dos Ceifeiros, para piano (1956); O
Bailador de Fandango, para piano; Suite para Violoncelo e Piano (1957); Barcarola e
Dança Cigana, para dois pianos (1958); Rondino, Marcha Humorística e Toadilha, para
piano a 4 mãos (1961); Vira, para coro (1965); A minha primeira valsa, para piano a 4
mãos (1967); Dança Portuguesa n.º 1, para dois pianos (1968); Canção sem palavras,
Profecia, para piano e Dança Portuguesa n.º 2 para dois pianos (1970); Dança do Pica-
Pau, para dois pianos (1972).
Algumas das suas obras são editadas pela Casa Moreira de Sá e pela Editorial
Franciscana. A sua discografia em vinil, é ainda editada no Brasil, França, Inglaterra e
Estados Unidos.
11
Com versos do poeta brasileiro Carlos Valle, que foi o responsável pelas suas digressões no Brasil.
Depois de uma vida dedicada intensivamente à Música como pianista,
compositor e pedagogo, Eurico Thomaz de Lima falece na Maia, cidade onde residiu
nos seus últimos vinte anos, a 8 de junho de 1989 e os seus restos mortais encontram-se
sepultados na Freguesia de Vermoim da mesma cidade.
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Em 2008, por ocasião da comemoração do centenário de nascimento a Câmara
Municipal da Maia atribuiu a uma das mais amplas avenidas novas da cidade, o nome
de Avenida Eurico Thomaz de Lima. Foi, igualmente, promovido um recital e o
lançamento de um álbum com as suas obras para piano e para piano e canto, com
interpretações da soprano Sara Braga Simões e do pianista Luís Pipa, tendo sido o
primeiro disco editado em formato CD, ao qual se sucederam outras edições com o
intuito de divulgar a obra do artista considerado um compositor de relevo na História da
Música Portuguesa do século XX.
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2ª PARTE
2.1. ELENCO DE TEXTOS DA AUTORIA DE EURICO THOMAZ DE LIMA E
ENTREVISTAS DO MESMO NA IMPRENSA NACIONAL.
Porque não se organiza no Porto a “Hora de Arte” para os operários? (Revista Sol Nascente,
Nº 11, p. 15, Porto, 15 julho de 1937)
- Que nos diz do recital que deu em - Já lhe digo: pelo meu caráter, admiro
Guimarães? aqueles com quem possa ainda aprender,
mas não suporto os bonzos – idólatras da
- Só lhe traduziria emoções que a minha “mentira em arte”! A esses a sua
alma de artista sentiu. Executei um impotência criadora se encarrega de os
programa sugestivo “Chopin - Liszt”. desmascarar.
Como vê, resumi no meu programa os dois
românticos do século XIX, que foram, como - Sei que na sua obra para canto e piano
é sabido, grandes amigos, que se estilizou motivos populares portugueses e,
admiraram mutuamente, sem invejas como já agora, vou fazer-lhe uma pergunta,
só os génios são capazes… cuja resposta pressuponho: o fado será
como pretendem, a canção nacional?
- Tem razão, a virtude contra a inveja
confunde-se quase sempre com a inveja… - Não! embora o queiram reconhecer como
diga-nos Thomaz de Lima, quais foram os tal, é uma espécie de morfina que
seus mestres de piano? adormenta quase um povo. Rey Colaço,
com mui bom gosto, tratou os seus fados
- Alexandre Rey Colaço, a quem devo a populares de uma forma superior,
minha formação pianística e intelectual, e eliminando a monotomia - da tónica á
Vianna da Mota, em virtuosidade! dominante - para o enriquecer com uma
- Quantos concertos já deu? Lembra-se? harmonia nova. O que lhe digo é uma mera
análise estética. O problema é difícil!
- Em números redondos, aí uns
quatrocentos concertos, por todo o país. - Posso apresentar-lhe cem opiniões a
favor e outras tantas contra … Só pondo-o
- O estrangeiro não o tenta? fora da lei…
- Gostaria imenso de ir a Paris e ao Brasil, - E quanto ao nosso rico folclore
a este último para levar aos meus irmãos português?
- É preciso resgatá-lo do abastardamento - Bethoven, Chopin, Liszt e todos os
das pseudo-canções revisteiras, a que o mestres da escola eslava.
povo inconscientemente se habituou. Urge
- Fechemos a entrevista: qual a obra dos
propagá-lo através de versões sérias, esse
compositores portugueses que mais
novo típico folclore, tão rico em ritmo e cor
admira?
nos seus “viras” “fandangos” e “toadas”. Página | 19
- A minha própria obra…
- Finalmente, quais são os seus autores
predilectos?
Cremos ser discípula de D. Cesariana Lira, Mas não é preciso essa bizarria. Thomaz
por sua escola que bem se revela, desde a de Lima é um compositor moderno que não
nítida articulação à macieza dos seus precisa de forçar-se em nada. A sua
transportamentos e pormenores “Rumba” é uma música de hoje, obra que
ornamentais da voz. Cantou com merece instrumentar-se para figurar nos
hieratismo Bach, com ternura hinária nossos grandes programas orquestrais.
Schumann com lirismo profundo Liszt, com
Julgamos sinceramente que Thomaz de
dramático poder Gretchmaninow e com
Lima pode ser um grande colaborador dos
fulgor os espanhóis Obradors e Falla.
Bailados Portugueses.
Na terceira parte Thomaz de Lima
O Estudo que tocou em extra-programa (e
apresentou-se como compositor, na sua
vá de dizer-se que ele conseguiu uma peça
linda suite, “Algarve”, numa Marcha na
de alto brilho com todas as características
Barcola, Rumba e (em extra-programa) um
dificultosas de um Estudo) bem como a
Estudo e Dança Negra.
Dança Negra, deviam ser entregues a quem
O “Algarve” que cremos estar já publicado as interpretasse coreograficamente. E
é uma obra que caracteriza o compositor e decerto resultariam dois magníficos
sublinha as suas qualidades de receção. bailados, o último ganhando rara e
Não traduz apenas em som os descritos portuguesíssima imponência.
exteriores, vai mais fundo: _ ao íntimo das
E aqui deixamos dito o que em rigor e
coisas, abrindo com “Aben-Afan” o
verdade a missão nos manda dizer.
cenário de um Algarve Mourisco e
cerrando com “Sagres uma epopeia do P.M.
Mar”.
Página | 21
Diário de Lisboa
13 de fevereiro de 1947
Por Francine Benoît
A série dos próximos feriados obriga-nos a segunda das “Duas Danças Negras”, em Página | 22
interromper, durante alguns dias, a que ecoa o interessantíssimo folclore dos
sequência de nossos “Flagrantes” indígenas de Angola.
consagrados ao teatro de “Eva e seus
Na segunda parte daquela noite, ouvimos
artistas”, adiando também tudo o que
encantados, seis peças de Chopin entre
estava em nossa intenção publicar logo
elas o grandioso Estudo que, á pouco já
depois sobre assuntos urbanísticos,
ouvimos executado pela grande artista
cinematográficos e sobre outros teatros, em
uruguaia, Fanny Ingold, execuções que
favor de dois saraus de alta arte do teclado
obrigaram o pianista a ceder às frenéticas
às quais, improvisamente, pudemos assistir
exigências de “bis” da numerosa
na noite de sábado passado, no
assistência, interpretando com idêntica
Conservatório e na do último domingo, no
perfeição e individualidade ainda duas das
auditório do Centro da Colónia
mais famosas obras do grande polonês.
Portuguesa.
Na terceira parte tínhamos ocasião de
Tocou em ambos os recitais o pianista-
admirar o pianista particularmente,
compositor português Eurico Thomaz de
quando executou o conhecido “Allegro
Lima, filho do compositor lusitano A.
bárbaro” de Bela Bartok, a famosa peça de
Thomaz de Lima. O recitalista evidenciou-
Debussy, “ Catedral submersa”, “ Três
se no Conservatório logo na execução da
danças fantásticas” de Schostakovitch,
primeira parte consagrada inteiramente a
incluindo uma conhecida “Polca” do
composições próprias, como um talento de
“modernista” russo, uma obra, antes
raras capacidades, seja no domínio da
sentimental, “Noite de Maio”, de
composição, seja no da própria arte do
Palmgreem e _ coisa raramente realizada
piano.
sob mãos tão “virtuosas” _ um “Estudo de
Dotado de uma técnica, cuja perfeição Concerto”, lembrando conhecidíssima
“virtuosa” nem por isso descuida da peça de Rimsky-Korsakoff, originando, com
profundeza do pensamento musical, toda razão, uma tempestade de palmas.
executou o solista da noite sua “Suite
No segundo concerto teve o pianista á sua
Algarve”, consistindo em 8 movimentos
disposição um piano menos próprio á sua
meio descritivos, meio folclóricos e sempre,
grande arte de solista. Chegando por força
ainda que não exageradamente, dominados
maior com pouco atraso, sentimos
por uma fatura de tendências “modernas”,
sinceramente que não pudéssemos assistir
de maneira raramente perfeita, mostrando-
á execução da “Suite portuguesa”, que
se simultaneamente como mestre do toque
precedeu músicas já executadas no
do teclado e no uso dos pedais.
concerto anterior. Na segunda parte deste
Gostando nesta “Suite” principalmente do programa ouvimos com satisfação
sexto movimento (Joardina de Estói) e do particular a repetição da peça
último (Sagres) ficamos mais ainda “Caminheiro saudoso do lar”, da autoria
convencidos pela parte seguinte dos do pai do compositor, (já executada como
trabalhos do artista, sobretudo pela um dos “bis” da primeira audição), obra
belíssima Barcarola, o Minueto e a em que o autor amavelmente emprega o
conhecido tema de um toque de repouso, Enormes aplausos de um público em que,
uma “Dança da Noite”, trabalho folclórico como no concerto precedente, se
do Ruy Coelho, uma composição adequada encontraram os mais assíduos dos nossos
de Óscar da Silva, “Dança Portuguesa”, círculos musicais e grande parte da colónia
um pequeno e interessante “opus” de Leça, portuguesa, encabeçada pelo próprio
do século XVIII, e de, Rey Colaço, uma cônsul do país irmão e sua esposa, Página | 23
peça de não menor interesse “Vira”. agradeceram também desta vez ao
eminente concertista, palmas de que pode
Na terceira parte encontrou-nos de novo
participar outra grande artista lusitana
“Estudo de concerto” de Marcel Ciampi,
presente na sala: a senhora Lucília Simões,
mas antes de tudo o “Polichinelo”, de Vila-
ilustre ensaiadora de “Eva e seus artistas”,
Lobos, cuja realização nunca antes
que ultimamente, e com grande interesse,
ouvimos de maneira simultaneamente tão
vimos participar na representação da peça
“virtuosa” e bela.
de Machado de Assis, “Helena”.
Notícias de Guimarães
13 de junho de 1948
Notícias de Guimarães
25 de junho de 1961
M.S.
3ª PARTE
Página | 27
Elogia o bom gosto de Rey Colaço que a seu juízo, com as suas novas
harmonizações, enriqueceu de forma superior a estética do fado popular, e pugna pela
imperiosa necessidade de «resgatar» o que designa de «abastardamento das pseudo-
canções revisteiras» do nosso rico folclore de viras, fandangos e toadas.
Confessa, sem falsas modéstias ou rodeios á parte, que a sua obra é, de entre a
dos compositores portugueses, aquela que mais admira, tal como já e, aliás, no inicio da
entrevista, e sem cerimónia, manifesta admiração por todos aqueles com quem ainda se
pode aprender, ao mesmo tempo, que diz depositar esperança que o tempo se
encarregue de desmascarar a «impotência criadora» daqueles que insuportavelmente
designa por «bonzos – idólatras da “mentira em arte”».
12
Entrevista transcrita no presente trabalho – pp. 17-19.
13
Jornal Diário da Braga.
Eurico Thomaz de Lima, reconhece-se nesta entrevista como um verdadeiro
compositor nacionalista, defendendo o nosso património musical folclórico genuíno -
viras, fandangos e toadas - não aceitando o fado como autêntica música nacional.
Além deste aspeto nacionalista (que bem se pode depreender dos títulos das suas obras), Página | 29
que também foi dominante em outros compositores da época, como é o caso de Fernando
Lopes-Graça, a critica aponta que Eurico Thomaz de Lima é “um compositor moderno”
referindo-se à sua obra A Marcha como uma “urdidura ultra-moderna”.14 Luís de Freitas
Branco15 refere, ainda, numa outra critica: “(…) são escritos com uma técnica que revela
conhecimento das tendências da moderna composição musical”.
14
Jornal de Notícias (Porto), 28 junho de 1944 (p. 20 do presente trabalho).
15
Jornal o Século de Lisboa – 2 fevereiro de 1947 (p. 20 do presente trabalho).
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4º PARTE
Eurico Thomaz de Lima foi sem dúvida um artista versátil e frutífero que se
espraiou pela composição em inúmeros e variados domínios: Música Sinfónica, Música
de Câmara, Música Coral, um vasto Repertório para Infância, e um igualmente vasto
repertório para Piano, instrumento que dominava em toda a sua plenitude, Música para
Canto e Piano, para Piano Solo, para piano a quatro mãos e para dois pianos.
Infelizmente não nos deixou registos discográficos da maioria das suas obras
para que delas pudéssemos usufruir e apreciar ao tempo das suas criações artísticas. Página | 31
Cremos que o seu pensamento musical não é dominado por qualquer corrente
estética de escola que o leve a colocar a sua música ao serviço da ideologia, do poder e
da política, e em particular, do Estado Novo.
Bibliografia
Geral
• GONÇALVES, César Luís Vila Franca, Obras para a Infância de Eurico Thomaz de Lima:
Os Duetos para Piano, Tese de Mestrado em Estudos da Criança – Especialização em
Educação Musical, Braga, outubro de 2005;
18
LESSA, Elisa Maria Maia da Silva, Música e expressão ideológica: a obra Buchenwald para piano solo
de Eurico Tomás de Lima (1908 -1989) in Música, Discurso e Poder, Colecção Hespérides Literatura 26,
Húmus, Universidade do Minho, Centro de Estudos Humanísticos, pp. 64 e 66.
• LESSA, Elisa (2007). Eurico Thomaz de Lima e a Imprensa Brasileira: Um Caso Feliz de
Recepção Musical in Revista Música, São Paulo, v. 12, pp. 165-174;
• LESSA, Elisa Maria Maia da Silva, Música e expressão ideológica: a obra Buchenwald
para piano solo de Eurico Tomás de Lima (1908 -1989) in Música, Discurso e Poder,
Colecção Hespérides Literatura 26, Húmus, Universidade do Minho, Centro de Estudos
Humanísticos, pp. 57-66. Página | 33
Sites
• https://www.editions-ava.com/pt/eurico-thomaz-de-lima-1908-1989 (consultado a 24
de junho de 20121);
• https://www.meloteca.com/portfolio-item/eurico-thomaz-de-lima/ (consultado a 24
de junho de 20121).
Fontes Primárias