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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

PSICOLOGIA
GESTALT-TERAPIA
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Bruna Moreira
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REFLEXÃO SOBRE O FILME
“K-PAX: O CAMINHO DA LUZ”
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Belo Horizonte
10 de Janeiro de 2016
O filme “K-PAX: O caminho da luz” é uma produção americana dirigida por Iain Softley
que conta a história de Prot, um homem misterioso que diz ser originário do planeta K-Pax
e só estar de visita na Terra. Por causa dessas alegações, Prot é internado em um
hospital psiquiátrico, onde é atendido pelo Dr. Mark Powell, que fica intrigado com a
inteligência e verossimilhança nos relatos “extraterrestres” de Prot, mas está convencido
de que ele, de fato, apresenta um distúrbio de personalidade. Enquanto Prot muda o
ambiente do hospital com suas promessas e espiritualidade, Powell faz uso do método da
hipnose para tentar descobrir mais sobre a história de vida do paciente.
Ao longo do filme, é possível estabelecer várias relações com alguns dos principais
conceitos da Gestalt-Terapia. Assim, aqui serão trabalhadas algumas delas.
A Gestalt-Terapia propõe que todo indivíduo tem potencial para realizar sua
autorregulação, ou seja, tem capacidade de reagir a qualquer alteração em seu meio de
modo a buscar sempre manter o equilíbrio, num movimento homeostático. Desse modo, o
indivíduo está sempre realizando o que é chamado de ajustamento criativo, uma tentativa
de se ajustar, de modo criativo, às mudanças que ocorrem no meio. No entanto, algumas
vezes, o ajustamento pode se tornar obsoleto e disfuncional, gerando um sintoma,
impedindo que a pessoa continue seu ciclo de autorregulação (FRAZÃO, FUKUMITSU,
2013).
Assim, é interessante notar, primeiramente, que o próprio Prot parece compartilhar da
concepção de autorregulação da Gestalt-terapia. Pois, em uma discussão com Powell
sobre ter prometido a outro paciente do hospital que este se curaria se seguisse alguns
simples passos, Prot diz que toda pessoa possui em si mesma o potencial para sua cura.
Depois, fazendo uma análise a partir do que se descobre sobre a história de Prot ao final
do filme, é possível especular que o surgimento dessa nova personalidade na pessoa de
Robert Porter tenha se iniciado como um ajustamento criativo à tragédia que acarretou na
perda de sua família, levando em consideração que uma das características mais
marcantes do planeta K-Pax é que lá os indivíduos não possuem família, dessa forma,
Porter cria uma justificativa para a ausência de sua família. Além disso, a própria criação
de um planeta que, em termos astrofísicos, parece perfeitamente verossímil, mostra um
uso criativo do conhecimento e da inteligência de Porter.
Dessa forma, pode-se conjecturar que a falta de autossuporte de Robert Porter para
encarar sua nova realidade (após a tragédia que ocorreu em sua vida) pode ter levado-o a
realizar um ajustamento criativo que se mostrou altamente disfuncional, ou seja, um
sintoma, visto que não permite que ele tenha uma vida de qualidade na sociedade em que
vive.
Quanto ao Dr. Mark Powell, apesar deste usar como seu principal método terapêutico a
hipnose, é possível perceber nele uma postura fenomenológica, visto que ele não se
contenta em apenas diagnosticar Prot como um psicótico, mas busca saber a origem de
seus delírios e sua história de vida. Assim, se, segundo Russel, existem duas atitudes de
ser no mundo, Powell assume a atitude fenomenológica: de ser aberto e de questionar, de
se propor a rever até aquilo que parece óbvio.
Também é possível identificar no filme algumas demonstrações da relação entre contato e
fronteira para a Gestalt-terapia. Por exemplo, quando percebe-se a maneira como a
chegada de Prot ao hospital altera o clima desse ambiente e afeta todos os pacientes,
tanto pessoalmente quanto em relação ao sofrimento mental de cada um, cabe trazer as
palavras de Polster e Polster (2011, p.114, citadas em FRAZÃO, FUKUMITSU, 2014):
“[…] o contato é implicitamente incompatível com permanecer o mesmo. A pessoa não
precisa tentar mudar por meio do contato; a mudança simplesmente acontece”.
No entanto, é preciso ressaltar que esse contato ocorre por meio de uma fronteira, que,
para a Gestalt-terapia, trata-se de uma fronteira que não pode ser transposta nem
atravessada: a fronteira de contato. Essa fronteira é dotada de permeabilidade, ou seja,
apesar de ser intransponível, permite trocas, e de plasticidade, ela pode se expandir ou
retrair de acordo com o que ocorre no ambiente: “em situações de conforto, segurança e
disponibilidade suficientes, a fronteira de contato sem amplia a fim de contatar o novo, o
diferente. Já em situações de ameaça ou perigo, ela se retrai com vistas a preservar o
indivíduo” (FRAZÃO, FUKUMITSU, 2014).
Um exemplo da plasticidade da fronteira de contato pode ser observado no filme, na
personagem Bess. Quando Prot chega ao hospital, Bess é apresentada a ele como uma
paciente que não fala nada desde que sua casa foi destruída em um incêndio. Bess não
se relaciona com ninguém e pode-se dizer que sua fronteira de contato está retraída, pois
o ambiente do hospital é, para ela, ameaçador. No entanto, como já foi apontado, a
chegada de Prot muda a atmosfera do hospital, o que faz com que, em certo ponto, Bess
volte a falar, expandindo sua fronteira de contato novamente.
Para concluir, é importante fazer uma última relação. O filme “K-PAX: O caminho da luz”
convida quem o assiste a repensar o modo como enxerga as pessoas portadoras de
transtorno mental, convida a olhar para elas com mais atenção e a não julgar que, por
elas possuírem limitações, são incapacitadas. Assim, é possível relacionar o filme como
obra com aquilo que a Gestalt-terapia propõe: um olhar para o todo.
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Referências
FRAZÃO, L. M.; FUKUMITSU, K. O. (orgs.). Gestalt-terapia: fundamentos epistemológicos
e influências filosóficas. São Paulo: Summus, 2013.
FRAZÃO, L. M.; FUKUMITSU, K. O. (orgs.). Gestalt-terapia: conceitos fundamentais. São
Paulo: Summus, 2014.

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