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Edição Virtual

Módulo
Nanotecnologia na pós-colheita de
frutas e hortaliças
2021. EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA - EMBRAPA
1ª EDIÇÃO – 2021

COORDENAÇÃO
EMBRAPA Instrumentação

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

MÓDULO NANOTECNOLOGIA NA PÓS-COLHEITA DE FRUTAS


E HORTALIÇAS

Coordenador Geral

• Marcos David Ferreira, pesquisador, Embrapa Instrumentação, São Carlos, SP.

Coordenadora Técnica

• Maria Alice Martins, pesquisadora, Embrapa Instrumentação, São Carlos, SP.

Conteudistas

• Caue Ribeiro de Oliveira, pesquisador, Embrapa Instrumentação, São Carlos, SP.

• Daniel Souza Corrêa, pesquisador, Embrapa Instrumentação, São Carlos, SP.

• Elaine Cristina Paris, pesquisadora, Embrapa Instrumentação, São Carlos, SP.

• enriette Monteiro C. de Azeredo, pesquisadora, Embrapa Agroindústria Tropical, Fortaleza,


H
CE.

• José Manoel Marconcini, pesquisador, Embrapa Instrumentação, São Carlos, SP.

• Luiz Henrique Capparelli Mattoso, pesquisador, Embrapa Instrumentação, São Carlos, SP.

• Marcos David Ferreira, pesquisador, Embrapa Instrumentação, São Carlos, SP.

• Odílio Benedito Garrido de Assis, pesquisador, Embrapa Instrumentação, São Carlos, SP.

• Rosires Deliza, pesquisadora, Embrapa Agroindústria de Alimentos, Rio de Janeiro, RJ.

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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO DO MÓDULO..........................................................................................................................................6
Objetivos do módulo................................................................................................................................................6
1. NANOTECNOLOGIA..........................................................................................................................................................7
1.1 Nanotecnologia: introdução ao tema.........................................................................................................8
1.2. O que são nanoestruturas?......................................................................................................................... 10
1.3 Aplicações........................................................................................................................................................... 12
1.3.1 Nanoestruturas com propriedades de reforço....................................................................... 12
1.3.2. Nanoestruturas com propriedades ativas............................................................................... 13
1.4. Nanoestruturas para absorção – incremento na ação do metabolismo das plantas............. 14
2. REVESTIMENTOS COMESTÍVEIS................................................................................................................................. 15
2.1 O que são e para que servem as coberturas comestíveis................................................................. 15
2.1.1 Revestimentos comestíveis........................................................................................................... 15
2.2 Como selecionar os materiais para as coberturas................................................................................ 17
2.2.1 Como isso ocorre?............................................................................................................................. 19
2.3 Aplicações comerciais.................................................................................................................................... 20
2.4 Como a nanotecnologia pode contribuir nos revestimentos comestíveis................................. 22
2.5 Aditivos: o que são e o que isso pode mudar?...................................................................................... 24
3.2. Aplicações.......................................................................................................................................................... 27
4. EMBALAGENS TECNOLÓGICAS................................................................................................................................. 29
4.1 Embalagens nanotecnológicas................................................................................................................... 29
4.1.1 Introdução ao tópico....................................................................................................................... 29
4.2. Conceito da nanotecnologia aplicada à embalagem........................................................................ 31
4.3 Embalagens Inteligentes............................................................................................................................... 31
4.3.1. Nanossensores.................................................................................................................................. 32
4.3.2. Embalagens ativas........................................................................................................................... 35
4.3.3. Embalagens reforçadas: melhor desempenho..................................................................... 36
5. PERCEPÇÃO DO CONSUMIDOR EM RELAÇÃO À NANOTECNOLOGIA.................................................... 37
5.1 Importância de investigar a percepção e o entendimento do consumidor.............................. 37
5.1.1 O consumidor e as novas tecnologias....................................................................................... 37
5.1.2 Riscos e benefícios percebidos pelo consumidor................................................................. 38
5.1.3 Métodos empregados para explorar a percepção do consumidor................................ 38

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6. FINALIZAÇÃO E CONCLUSÃO.................................................................................................................................. 39
6.1 Finalização.......................................................................................................................................................... 39
6.2 Comentários finais........................................................................................................................................... 41
REFERÊNCIAS....................................................................................................................................................................... 42
FONTE DAS FIGURAS......................................................................................................................................................... 45

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APRESENTAÇÃO DO MÓDULO
Bem-vindo (a) ao módulo Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças! Este módulo
está estruturado em 6 tópicos:

No Tópico 1 – Nanotecnologia: introdução ao tema, você estudará nanoestruturas com


propriedades de reforço, com propriedade ativas e para absorção – incremento na ação do
metabolismo das plantas.

No Tópico 2 – Revestimentos comestíveis, você aprenderá sobre o que são e para que servem
as coberturas comestíveis, como selecionar os materiais para as coberturas, como os revestimentos
comestíveis são formados, como a nanotecnologia pode contribuir nos revestimentos comestíveis, e
o que são aditivos e o que podem mudar.

No Tópico 3 – Filmes comestíveis, você estudará suas definições e aplicações.

O Tópico 4 – Embalagens nanotecnológicas tratará do conceito da nanotecnologia aplicada à


embalagem, embalagens inteligentes, sensores e nanossensores como dispositivos fundamentais
para uso em embalagens inteligentes, embalagens ativas e embalagens reforçadas.

No Tópico 5 – Percepção do consumidor em relação à nanotecnologia, você aprenderá sobre


a importância de investigar a percepção e o entendimento do consumidor, riscos e benefícios
percebidos pelo consumidor e métodos empregados para explorar a percepção do consumidor.

No Tópico 6 – Finalização e conclusão, você verá os comentários finais sobre nanotecnologia


aplicada no pós-colheita de frutas e hortaliças.

Objetivos do módulo
Ao final deste módulo, você será capaz de:

• Definir nanotecnologia;

• Listar as aplicações da nanotecnologia relacionadas à área de alimentação;

• ompreender as coberturas comestíveis protetoras como as tecnologias alternativas que


C
impactam no custo e no aumento da vida de prateleira;

• Identificar o papel dos nanossensores nas embalagens inteligentes;

• econhecer a importância da realização das ações de investigação sobre a percepção do


R
consumidor em relação à nanotecnologia.

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1. NANOTECNOLOGIA

Este módulo é dedicado a explorar o conceito de


nanotecnologia e suas aplicações na área de alimentos
(de forma abrangente) e, mais especificamente, em pós-
colheita, mostrando como ela pode contribuir para a
obtenção de alimentos mais seguros, mais estáveis e de
melhor qualidade.

A nanotecnologia tem revolucionado vários setores


do conhecimento e da indústria. As aplicações da
nanotecnologia abrangem diversas áreas, incluindo
materiais, alimentos, saúde e eletrônica. Ainda que seja
um tema recente na área de alimentos, ele deve crescer
muito rapidamente nos próximos anos. Produtos como
processadores, smartphones, entre outros, já contém
muita nanotecnologia e estão no nosso cotidiano.
Ela também está em tecnologias de pigmentos e de
impressão, que possibilitaram a produção de embalagens
mais atrativas, coloridas e com efeitos visuais.

A nanotecnologia é reconhecida como uma das


tecnologias chave que contribuem para a competitividade
sustentável e crescimento de diversos setores da
indústria (HENCHION et al., 2019). Na área de alimentos,
nanotecnologias podem ser usadas para obter produtos
com melhores propriedades sensoriais, potencial de
redução na quantidade de gordura e outros aditivos,
melhorias na absorção e biodisponibilidade de nutrientes
e suplementos. Além disso, ela pode ser usada para
auxiliar na preservação da qualidade e estabilidade
dos alimentos, além de melhorar a rastreabilidade e a

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segurança dos produtos pela aplicação em sistemas de


embalagem e sensores.

Para este módulo foram realizadas indicações de links de vídeos


hospedados no Youtube. Esses vídeos são ilustrativos para uma ou
algumas situações a que o assunto se refere, não contemplando
algum tipo de recomendação ou relação com os autores do material.

1.1 Nanotecnologia: introdução ao tema

A nanotecnologia está relacionada ao


desenvolvimento e aplicação de materiais numa
escala de tamanho muito reduzido, invisível
a olho nu, que vai de alguns nanômetros até
algumas centenas de nanômetros, sendo que 1
nm (10-9 m) equivale a 1 bilionésimo do metro.
Para entender melhor o assunto, veja o vídeo a
seguir.
Fonte: Acervo Embrapa

Para se ter uma ideia de quão pequeno são os materiais nesta escala
de tamanho, um fio de cabelo humano tem a espessura 50.000 vezes
maior que um nanomaterial de 2 nm de tamanho (que é a dimensão
típica de um ponto quântico). A figura 1 ilustra a escala de tamanho
que vai de 10⁸ nm (ou seja, 10 cm), equivalente ao diâmetro de uma
bola de tênis, até a escala de tamanho de 10-1 nm, que é equivalente
ao tamanho de uma molécula de água.

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Figura 1: Tamanho de objetos indo da macroescala até a nanoescala. Nanomateriais típicos


incluem nanopartículas, nanofibras etc., indo da escala de tamanho de alguns poucos
nanômetros até algumas poucas centenas de nanômetros.

Fonte: http://nano.cancer.gov/learn/understanding/

Como você leu, na apresentação, a nanotecnologia tem


estimulado diversas áreas, entre elas a agricultura, mas
como isso tudo começou?

Considera-se como nascimento da nanociência e da nanotecnologia a palestra seminal do físico


Richard Feynman proferida em 1959 no Caltech-USA. Nesta palestra foi hipotetizado que não
haveria impedimentos físicos para que fosse possível controlar e manipular átomos e moléculas
individualmente, e que isto poderia levar a confecção de dispositivos miniaturizados. Contudo, a
nanotecnologia foi realmente impulsionada na década de 80 com o advento de técnicas microscópicas
avançadas, incluindo as microscopias de força atômica e a microscopia de tunelamento, as quais
permitem “enxergar” e manipular átomos e moléculas individualmente.

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Uma das principais vantagens dos nanomateriais em relação aos


materiais na macro- e microescala é o enorme aumento na razão área
superficial/volume. Por exemplo, consideremos 1 cubo de 1 cm de
aresta mostrado na figura 2 (a), e que, portanto, tem um volume de
1 cm3 (tamanho similar a um torrão de açúcar) e uma área superficial
de 6 cm2. Se este mesmo cubo for “quebrado” em cubos menores
de 1 mm de aresta, como mostrado na fig. 2 (b), sua área superficial
aumentará para 60 cm2, Se este cubo for continuamente “quebrado”,
até que estes cubinhos atinjam 1 nm de aresta (fig. 2 (c)), a área
superficial total será de 60 milhões de cm2 (que é equivalente à área
de um campo de futebol oficial), lembrando que neste caso o volume
permanece o mesmo (ou seja, de um torrão de açúcar).

Figura 2: Ilustração do aumento da razão área superficial/volume de (a) um cubo de 1 cm de aresta (área superficial
e 6 cm2), o qual é “quebrado” em cubos menores de (b) 1 mm de aresta (área superficial de 60 cm2) e de (c) 1 nm de
aresta (área superficial de 60 milhões de cm2).
Fonte: National Nanotechnology Initiative, 2016. (adaptado)

1.2. O que são nanoestruturas?

Nanoestruturas são definidas como estruturas que possuem pelo menos uma dimensão na
nanoescala (< 100 nm). Existem diferentes tipos de nanoestruturas (fig. 3).

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Figura 3: Classificação de nanoestruturas quanto à morfologia

Materiais nanoestruturados contêm pelo menos um componente na forma de nanoestruturas.


Nanocompósitos, por exemplo, são formados por uma matriz – (podendo ser constituída por
polímeros, que são moléculas grandes constituídas por unidades repetidas, chamadas de meros -
contendo nanoestruturas dispersas nesta matriz (fig. 4)). A adição de nanoestruturas geralmente
é feita para reforçar o material ou conferir propriedades ativas que a matriz isoladamente não
possui.

Figura 4: Estrutura básica de um nanocompósito.


Fonte: Elaborada para o curso

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1.3 Aplicações

Os materiais na nanoescala, como partículas, fibras e filmes, apresentam características diferenciadas,


especialmente, pela elevada razão área superficial/volume, como previamente demonstrado, com
implicações em suas propriedades de solubilidade, de reatividade química, bem como nas suas
propriedades elétricas, de absorção de luz, etc.

Estes materiais encontram aplicações diversas como reforço em embalagens ativas para aumento do
tempo de prateleira de alimentos, miniaturização de circuitos eletrônicos (permitindo a fabricação
de dispositivos eletrônicos menores e mais potentes), como celulares, computadores, medicamentos
inteligentes que só são liberados quando chegam ao seu alvo (algum órgão humano com infecção,
por exemplo, etc.). Para este fim, podem ser produzidos nanomateriais de natureza metálica, cerâmica
ou ainda contendo a mistura destes materiais, originando os materiais compósitos ou híbridos.

1.3.1 Nanoestruturas com propriedades de reforço

Algumas nanoestruturas são adicionadas para melhorar as propriedades mecânicas dos materiais
(ex: nanocristais de celulose e nanoargilas).

Em termos de reforço, a vantagem das nanoestruturas é que por serem muito pequenas, elas têm uma
área superficial muito alta. Com isso, mesmo que adicionadas em pequena quantidade (tipicamente
por volta de 5% com relação ao polímero), o efeito de reforço é marcante, porque elas se dispersam
facilmente na matriz e formam uma rede que interage com o polímero.

Geralmente, as nanoestruturas de reforço também reduzem a permeabilidade dos materiais a gases


e vapor de água, melhorando, portanto, suas propriedades de barreira. É o caso de nanoargilas,
que criam um efeito de tortuosidade na matriz, fazendo com que os permeantes demorem mais a
atravessar o material (fig. 5). Isso pode ser útil, por exemplo, para embalagem de frutas e hortaliças
frescas, reduzindo a perda de umidade.

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Figura 5. Efeito de tortuosidade conferido por nanoargilas


Fonte: Elaborada para o curso

1.3.2. Nanoestruturas com propriedades ativas

Algumas nanoestruturas são responsáveis por conferir propriedades ativas, como antimicrobianas,
antioxidantes, absorvedoras de O2 ou de etileno. Como as nanoestruturas apresentam dimensões
diminutas e consequentemente, maiores áreas de interação, elas apresentam maior mobilidade e
capacidade de interação, o que potencializa sua ação.

No caso de nanoestruturas antimicrobianas, como nanopartículas de prata, o diminuto tamanho


pode facilitar a penetração na célula, o que potencializa a sua atividade. Além disso, a maioria das
ações antimicrobianas decorre de interações entre cargas presentes no agente antimicrobiano e
sítios com cargas opostas na superfície dos microrganismos.

As nanoestruturas, tendo maior área superficial, têm maior densidade superficial de cargas e maior
adesão sobre a membrana dos microrganismos, facilitando as interações eletrostáticas. Estas
interações resultam em alterações na permeabilidade da membrana, promovendo desequilíbrio
osmótico, podendo eventualmente haver ruptura da membrana com vazamento dos eletrólitos
intracelulares.

Adicionalmente, as nanopartículas podem se depositar sobre a superfície microbiana, formando


uma barreira que suprime a absorção de nutrientes. Uma vez no interior dos microrganismos, as

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nanoestruturas podem se ligar ao DNA, bloqueando o mRNA e a síntese de proteínas, o que impede
a replicação, levando à morte do microrganismo.

1.4. Nanoestruturas para absorção – incremento na ação do


metabolismo das plantas

Nanomateriais também têm sido muito utilizados na agricultura para desenvolvimento de insumos
inteligentes que podem melhorar a qualidade dos produtos bem como aumentar a produtividade
no campo. Os fertilizantes, por exemplo, têm um alto custo para os produtores rurais, e seu uso
indiscriminado pode gerar problemas ambientais incluindo desbalanço de minerais do solo, eventual
diminuição da fertilidade, além de ocasionar poluição de lençóis freáticos e rios devido à lixiviação
de fósforo e nitrogênio. Deste modo, a nanotecnologia tem sido utilizada para o desenvolvimento
de fertilizantes que empregam menor quantidade de insumo, evitam problemas de superdosagem,
aumentam a absorção de nutrientes do solo e a produtividade no campo, ao mesmo tempo reduzem
impactos ambientais.

Veja um exemplo de solução tecnológica nessa área, não diretamente


ligada à conservação pós-colheita, mas que contribui para o
agronegócio de frutas e hortaliças: o hidrogel (https://bit.ly/3wunwtT).

O hidrogel consegue economizar até 12% do uso de água na


produção de mudas de hortaliças. Acesse e veja como isso ocorre.

Em 2020, O Globo Rural, nos 40 anos do programa, fez uma reportagem


especial sobre a nanotecnologia. Aprenda um pouco mais sobre essa
tecnologia e como ela está cada vez mais presente na agricultura,
assistindo a Solução das tecnologias (https://bit.ly/3mYO0k3).

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2. REVESTIMENTOS COMESTÍVEIS

Fonte: Malu Tinoco.

2.1 O que são e para que servem as coberturas comestíveis

2.1.1 Revestimentos comestíveis

Frutas e hortaliças são organismos vivos sujeitos a processos metabólicos próprios decorrentes
de reações bioquímicas que resultam em alterações de cor, sabor, aroma e textura. Depois de
colhidos, os processos fisiológicos continuam, contudo, podem ser minimizados por meio de ações
e procedimentos que retardam ou reduzem a intensidade dessas reações.

A prática mais comum empregada na conservação de frutas e hortaliças é o controle da temperatura,


cuja condição ideal é que esta seja reduzida logo após a colheita, e a cadeia do frio seja mantida
até a comercialização e o consumo. Como sabemos, temperaturas mais baixas conservam mais os
alimentos. Contudo, a manutenção e o controle efetivo da temperatura em todas as etapas da cadeia,
desde a colheita até o consumidor, não é uma condição trivial encontrada, considerando também
que existem temperaturas apropriadas para a conservação de cada produto, demandando assim
uma estrutura complexa para que estas condições sejam observadas.

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Desta forma, as coberturas comestíveis protetoras surgem como tecnologias alternativas e de baixo
custo a serem utilizadas como um procedimento auxiliar na redução do metabolismo dos hortifrútis
e consequente aumento da vida de prateleira.

Os revestimentos comestíveis não têm como objetivo substituir o


uso dos materiais convencionais de embalagens ou mesmo eliminar
o emprego da cadeia do frio, mas sim o de apresentar uma atuação
funcional e coadjuvante que contribua para a conservação da
qualidade e na manutenção do valor nutricional, reduzindo as trocas
gasosas superficiais e a perda excessiva de água.

As coberturas protetoras ditas ‘comestíveis’ consistem em membranas ou películas de base


biopolimérica aplicadas ou, mais comumente, formadas diretamente sobre a superfície das frutas.
Essas coberturas normalmente são imperceptíveis a olho nu e envolvem o produto em toda sua
superfície. Como passam a fazer parte do alimento a ser consumido, os materiais empregados em
sua formação devem ser selecionados entre aqueles considerados atóxicos e seguros para o uso em
alimentos e ao consumo direto.

Cabe ressaltar que essas coberturas têm sido com frequência denominadas erroneamente de
“biofilmes”, termo este totalmente inapropriado a este tipo de material ou aplicação. Importante
que os constituintes desses revestimentos sejam considerados como GRAS (Generally recognized as
safe -Geralmente reconhecido como seguro). Para tanto recomenda-se acessar o site das agencias
reguladoras, como FDA (EUA) e ANVISA (Brasil).

SOBRE A LEGISLAÇÃO

Revestimentos comestíveis, aditivos, glaceantes, são regulados pela


Resolução RDC nº 8/2013 (https://bit.ly/2YzfkMu).

É importante que você saiba que todo novo aditivo, incluindo ceras,
deve ser previamente avaliado e aprovado pela Anvisa (no caso do
Brasil) para uso nas diferentes categorias de alimentos.

A legislação brasileira é positiva, ou seja, um aditivo ou coadjuvante somente pode ser utilizado
quando constar da legislação específica para a categoria de alimento, em suas respectivas funções

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e limites máximos. Ela está sujeita a atualizações, pois na medida em que o conhecimento avança
surgem demandas de órgãos regulatórios e do setor regulado.

Depois de avaliado e aprovado, o aditivo entra nas listas positivas. Assim, o processo de
fabricação do aditivo alimentar, ou coadjuvantes de tecnologia, está dispensado da obrigatoriedade
de registro na Anvisa. As empresas ficam apenas responsáveis em apresentar comunicado de início
de fabricação, junto ao órgão de vigilância sanitária onde está localizada a empresa, conforme
procedimentos definidos na Resolução nº 23/2000 (https://bit.ly/3n6ZPoB).

Observe que o item 5.1.6 desta Resolução isenta os aditivos


alimentares inscritos na Farmacopeia Brasileira e aqueles
utilizados de acordo com as Boas Práticas de Fabricação –
BPF.

2.2 Como selecionar os materiais para as coberturas

Fonte: Malu Tinoco.

As matérias primas empregadas na formação das coberturas e revestimentos comestíveis podem ter
origem animal ou vegetal, ou formarem um composto com a combinação de ambas. Polissacarídeos,
ceras (lipídeos) e proteínas são as classes de materiais mais empregados e a escolha depende
fundamentalmente das características do produto a ser revestido e do principal objetivo almejado

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com o revestimento aplicado. De uma forma geral os revestimentos podem ser classificados em duas
amplas categorias: hidrofílicos e hidrofóbicos.

• idrofílicos: são aqueles formados por materiais com estruturas nas quais há a predominância
H
de grupos amino ou hidroxila e carboxila que favorecem o acúmulo e rearranjo de moléculas
polares, e principalmente da água, em torno desses sítios. Polissacarídeos como a celulose, a
quitina, a goma xantana, a goma guar, a pectina e o amido são alguns exemplos. Os materiais
hidrofílicos normalmente apresentam boa solubilidade em meio aquoso, favorecendo uma
melhor dispersão do soluto e uma formação mais homogênea do filme.

• idrofóbicos: têm por base materiais caracterizados por moléculas nas quais predominam
H
estruturas cujas ligações tendem a ser eletricamente neutras, ou seja, não configuram regiões
polares definidas. Alguns exemplos destes materiais são as proteínas do milho, como zeínas,
do sorgo (kafirinas), lipídeos, como cera de carnaúba, de abelha, etc. Esses materiais não têm
afinidade com água e requerem solventes apolares para a sua solubilização (hidrocarbonetos
em geral) como, por exemplo, o álcool, a acetona e o hexano.

A escolha de uma formulação hidrofílica ou hidrofóbica depende dos objetivos almejados para a
proteção e das características fisiológicas do produto a ser revestido.

As coberturas à base de materiais hidrofílicos são mais indicadas para o revestimento de frutas
com aspectos brilhantes, pois elas tendem a ter baixa permeabilidade a O2 e CO2, reduzindo as taxas
de respiração. Por um lado, a redução da respiração é interessante para aumentar a estabilidade
(aumentar a vida útil), mas cuidado: a respiração não pode ser reduzida a ponto de induzir processos
anaeróbios (a chamada “fermentação”), que pode produzir etanol, prejudicando a qualidade sensorial
do produto.

As formulações hidrofóbicas são indicadas para o revestimento de frutas que tenham alta taxa
de transpiração, nas quais a degradação ocorre essencialmente por perda de água, levando a uma
rápida desidratação e alteração do aspecto superficial. Embora, de um modo geral, as coberturas
hidrofóbicas sejam mais foscas, estas reduzem, significativamente, a permeabilidade ao vapor de
água, sendo efetivas na redução de perda de massa e conservação da firmeza.

No caso de combinações entre os materiais, propriedades intermediárias podem ser obtidas elevando
a efetividade da cobertura. Contudo, haverá a predominância das características do composto que
estiver em maior proporção.

Essas indicações, contudo, são bastante genéricas e servem apenas como um indicativo inicial
para a escolha do material. Na prática, demais aspectos, tanto da estrutura polimérica quanto das

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frutas a serem revestidas, devem ser avaliados para que a seleção de uma formulação tenha um
resultado satisfatório.

Para saber mais sobre revestimentos comestíveis acesse os materiais


a seguir:

• Artigo - Revisão: coberturas comestíveis protetoras em frutas:


fundamentos e aplicações (https://bit.ly/3D2PlMe).

• Colheita e beneficiamento de frutas e hortaliças - Capítulo 6 -


Aplicação de ceras em frutas de hortaliças (https://bit.ly/3bSl4nD).

• Tecnologias pós-colheita em frutas e hortaliças – Capítulo 12


– Revestimentos comestíveis protetores em frutas e hortaliças
(https://bit.ly/3mUHVVL).

• Instrumentação pós-colheita em frutas e hortaliças – Capítulo


2 – Coberturas comestíveis sobre frutas e hortaliças: fundamentos
e práticas (https://bit.ly/3mUHVVL).

2.2.1 Como isso ocorre?

Uma fruta ou hortaliça, ao entrar em contato com uma solução filmogênica polimérica, promove
uma atração entre as espécies dissolvidas em solução e a superfície sólida. Ao se depositarem sobre
a superfície (epicarpo – casca - para os frutos intactos ou no pericarpo – polpa - nos fatiados), há o
estabelecimento de ligações de diversas origens, fracas e fortes, que geram o acúmulo do material
dissolvido, consolidando uma cobertura sobre toda a área exposta. A cinética que rege esse tipo
de deposição é dependente de diversos fatores além do solvente e da massa molar do polímero
dissolvido, tendo também papel importante a agitação do meio, temperatura, concentração e o pH
da solução. Ao imergir uma fruta em uma solução filmogênica, a cobertura se forma pela deposição
das espécies poliméricas dissolvidas no meio, estabelecendo ligações, fracas e fortes, com a superfície
da fruta, conforme esquematizado na figura 6.

Em laboratório, a imersão tem sido o procedimento mais empregado na formação de coberturas,


seja pela facilidade de processo ou por garantia de alcance de toda a superfície. Contudo, a utilização
de aspersão (por spray) tem sido a mais empregada em unidades de beneficiamento de frutas e
hortaliças (no módulo de beneficiamento desse curso, você encontrará mais informações), por ser
mais ágil e de rápida secagem.

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Figura 6: Sequência ilustrativa da formação de uma cobertura comestível. Em (a) temos a imersão do fruto em solução
filmogênica (polímeros em solução). Em (b) ocorre à atração entre o composto diluído na solução filmogênica e a
superfície. Após a consolidação das interações, o fruto é removido da solução e por meio da evaporação do solvente
ocorre a reticulação do polímero configurando a formação da cobertura (c).
Fonte: ASSIS; BRITTO, 2014.

2.3 Aplicações comerciais

Comercialmente, os revestimentos comestíveis, por muitos chamados de ceras, são mais utilizados
em frutas cítricas para mercado de produto fresco, como laranja e limão. Com exceção das frutas
produzidas em sistema orgânico, pode-se afirmar que a quase totalidade desses frutos, em especial,
aqueles que passam por unidades de beneficiamento, tem algum tipo de revestimento.

As chamadas ceras são emulsões com componentes principais, tensoativos, surfactantes, etc., que
permitem a aplicação dessas ceras na superfície dos frutos, e que depois de secas formam um
“revestimento invisível”, auxiliando na prevenção da perda de água e alterações no sistema de troca
gasosa, aumentando a conservação, pois retardam o processo metabólico. Outras frutas, como
manga e mamão são revestidas, mas as duas primeiras citadas se destacam.

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

Fonte: Embrapa

Brilhar ou não brilhar, essa é uma questão?

Hábitos de consumo são criados ao longo da história e persistem,


sem muitas vezes indicar uma razão lógica evidente. O consumidor
sempre opta, ainda que intuitivamente, pelas frutas (em especial, às
cítricas) que apresentam maior brilho, pois se assume que possuem
maior qualidade! Mas, não necessariamente. Ceras comerciais
empregadas para alcançar o brilho necessário usam diferentes
componentes, e entre esses alguns compostos sintéticos com o
único objetivo de proporcionar mais brilho! Com a nanotecnologia,
é possível, a partir de produtos de origem vegetal, desenvolver
revestimentos que prolonguem a vida pós-colheita, em até 15 dias,
como veremos a seguir e ao mesmo tempo conferir brilho ao produto.

Importante ressaltar, que se observa um forte movimento dos


consumidores por produtos de origem sustentável, ou seja, que
tenham esse apelo. Assim, é de esperar que transformações ocorram
nesse hábito ao longo dos anos.

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2.4 Como a nanotecnologia pode contribuir nos revestimentos


comestíveis

A Embrapa Instrumentação, em parceria com a iniciativa privada


(https://bit.ly/2Yudexe), e com a Universidade – Universidade Federal
de São Carlos (UFSCar), por meio de parceria público-privada,
desenvolveram em modelo de inovação aberta uma nanoemulsão
com base na cera de carnaúba – palmeira nativa da região nordeste,
da qual se extrai a cera. O produto reduz a perda de peso, aumenta
o tempo de prateleira dos frutos, além de também proporcionar
brilho. A utilização da cera de carnaúba na escala nanométrica traz
essas vantagens adicionais pelo fato da nanoemulsão ter maior
estabilidade à separação gravitacional e à agregação, comparadas às
emulsões convencionais.

Veja como pesquisadores


brasileiros usam a cera da
carnaúba para aumentar a
duração da frutas acessando
o link (https://bit.ly/3mWS18I).

Figura 7 - Imagem obtida por Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) de amostras de nanoemulsão de cera de
carnaúba,
Figura 8 - Imagem obtida por Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) de amostras de emulsão convencional de
cera de carnaúba.
Fonte: Miranda (2015).

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

Essa tecnologia foi licenciada para a empresa parceira QGP Tanquimica


(https://bit.ly/2Yudexe). Em 2021, a QGP Tanquimica firmou uma
parceria com a empresa Agrofresh (https://bit.ly/3019xj3), que hoje
comercializa no mercado interno e internacional.

Mas como funciona?

No ambiente, no ar que respiramos, temos uma maior concentração de oxigênio (O2) e uma menor
de dióxido de carbono (CO2). Com a inversão dessas proporções, até limites toleráveis, os quais não
comprometam a respiração dos frutos, o metabolismo regride, e assim mantendo a qualidade dos
frutos, conseguimos um maior tempo de prateleira. Por meio da nanoemulsão de cera de carnaúba
é possível a formação de um revestimento mais uniforme, influenciando positivamente essa troca
gasosa, e assim prolongando a vida pós-colheita.

• Acesse o link (https://bit.ly/3DfQaSh)e aprenda mais


sobre a tecnologia da cera de carnaúba e veja como
um produto de laboratório da Embrapa chega até a
mesa do consumidor brasileiro e de outros países.

• Assista o programa Dia de Campo TV da Embrapa sobre a


nanoemulsão de cera de carnaúba (https://bit.ly/30aE0Lq). A
reportagem inicia aos 4:17’ e termina em 14:57’ e mostra o
desenvolvimento da nanoemulsão de cera de carnaúba e
sua aplicação em unidades de beneficiamento de frutas no
Brasil. Veja a fala de um produtor de citros e das empresas
que desenvolvem e comercializam esse produto e como essa
tecnologia contribui para a preservação de frutas e hortaliças, e
pode auxiliar na redução de perdas pós-colheita. Veja também
um exemplo de inovação aberta – parceria público-privada e
como isso pode acelerar o desenvolvimento de tecnologias.

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

• Saiba mais sobre a pesquisa com nanoemulsões, consultando:


MIRANDA, Marcela et al. Emulsões de cera de nanocarnaúba
e microcarnaúba versus revestimentos protetores de goma
laca na qualidade cítrica pós-colheita (em tradução livre)
(https://bit.ly/3c2n4tf). Journal of the American Society for
Horticultural Science, v. 1, p. 1-10, 2020.

• Veja também: OLIVEIRA FILHO, Josemar G. et al. Nova abordagem


no desenvolvimento de filmes comestíveis: o uso de micro ou
nanoemulsões de cera de carnaúba em filmes à base de amido de
araruta (https://bit.ly/3mWOdEu). Food Packaging and shelf life,
v. 26, p. 100589-9, 2020.

2.5 Aditivos: o que são e o que isso pode mudar?

O interesse em ingredientes ativos aplicados a recobrimentos comestíveis tem aumentado devido à


possibilidade de se conferir propriedades antimicrobianas e antioxidantes ao produto, com especial
destaque aos óleos essenciais. Os óleos essenciais são constituídos de componentes aromáticos,
como compostos fenólicos, flavonoides, etc., produzidos por algumas plantas, por exemplo: cravo,
hortelã, tomilho, etc., que possuem ação antimicrobiana comprovada.

Os óleos são uma alternativa aos antimicrobianos sintéticos, atualmente com poucas opções no
mercado. Todavia, desafios para a sua utilização existem, como a estabilização desses nas emulsões
a serem aplicadas como revestimentos, assim como os sabores e aromas fortes – como mitigá-los,
mantendo a ação antimicrobiana. Por exemplo, o Eugenol, componente majoritário do óleo essencial
de cravo-da-índia é indicado para tratamento pós-colheita do cancro cítrico em frutos cítricos.

Saiba um pouco mais sobre a pesquisa com o uso de óleos essenciais


e seu potencial de uso:

• OLIVEIRA FILHO, Josemar G. et al. Composição química e


atividade antifúngica de óleos essenciais e suas combinações
contra Botrytis cinerea em morangos (https://bit.ly/3mV7MNj).
(Em tradução livre). Journal of Food Measurement and
Characterization, v. s/n, p. 1-11, 2021.

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

• OLIVEIRA FILHO et al. Óleos Essenciais como Fungicidas Naturais


para Controle de Morangos Estragados Induzidos por Rhizopus
stolonifer (https://bit.ly/3bU2RWD). (Em tradução livre).
Biointerface Research in Applied Chemistry, v. 11, p. 13244-
13251, 2021.

3. FILMES COMESTÍVEIS

Fonte: Embrapa

3.1. Definições

Filmes são películas que podem ser formadas a partir de polímeros, como os filmes plásticos. Os
filmes de PVC (policloreto de vinila), muito usados (juntamente com bandejas de isopor) para
embalar frutas e hortaliças frescas, são um bom exemplo cotidiano. Obviamente, um filme de PVC
não é comestível, mas ilustra a estrutura de um filme.

Filmes de PVC (assim como outros filmes plásticos convencionais) são geralmente baratos e eficazes
para as aplicações propostas. No entanto, muitos países têm proposto políticas para reduzir o uso
de plásticos não-biodegradáveis em aplicações descartáveis, como embalagem de alimentos. Para
essa substituição, geralmente são propostos filmes biodegradáveis, geralmente de origem natural
(biopolímeros).

Filmes comestíveis são uma subcategoria dos filmes biodegradáveis, sendo também formados a
partir de biopolímeros.

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

O diferencial é que para um filme ser considerado comestível, todos


os seus componentes precisam ter grau alimentício. As matrizes
de filmes comestíveis são geralmente polissacarídeos (ex: amido e
pectina) ou proteínas (ex: gelatina e proteínas do leite).

No entanto, essas matrizes tendem a formar filmes quebradiços,


prejudicando suas aplicações, o que pode ser contornado pela
adição de plastificantes (fig. 9). Além desses componentes, os filmes
podem conter outros, como compostos ativos (antimicrobianos,
antioxidantes, etc.) ou mesmo componentes para conferir sabor e
cor. Tudo depende das aplicações que se pretende dar aos filmes,
como veremos a seguir.

Figura 9: Principais componentes de um filme comestível


Fonte: Elaborada para o curso

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

3.2. Aplicações

Tradicionalmente, filmes comestíveis são propostos para uso como embalagem primária (diretamente
em contato com o alimento), com a principal função de proteger o produto contrafatores ambientais,
aumentando a vida útil de alimentos.

No entanto, nem sempre os filmes comestíveis são adequados como substitutos dos filmes plásticos
convencionais, por alguns motivos:

• São mais caros.

• ão têm um método de produção industrial bem definido, tendo limitações em termos de


N
processabilidade.

• Geralmente não possuem desempenho mecânico tão bom quanto dos filmes convencionais.

• ão são adequados para aplicações onde o filme fica exposto (não protegido por uma
N
embalagem secundária), por razões de higiene.

Sendo assim, os filmes comestíveis devem ser explorados no que eles têm de diferenciais: o fato
de serem comestíveis. Eles devem ser, portanto, desenvolvidos com base em características que os
tornem interessantes para comer, a saber: boas propriedades sensoriais, conveniência e benefícios
à saúde. Neste contexto, filmes à base de polpas de frutas e/ou hortaliças (que atendem aos três
critérios) são especialmente interessantes.

Além do alto apelo sensorial e dos conhecidos efeitos benéficos à saúde, polpas de frutas e hortaliças
têm outras vantagens para aplicações como filmes. O uso de polpas constitui uma forma de
aproveitamento de frutas e hortaliças ainda próprias para o consumo, mas não bem aceitas para
consumo de produtos frescos - in natura (ex: com injúrias superficiais). Além disso, frutas e hortaliças
contêm em sua composição polissacarídeos (que podem atuar como matrizes), assim como açúcares
e ácidos orgânicos (plastificantes). Dificilmente uma determinada polpa terá (por si só) teores
adequados desses compostos, daí a importância de se conhecer a composição de diferentes frutas
e hortaliças para combinar propriedades complementares (ou mesmo adicionar polissacarídeos ou
plastificantes à formulação).

Filmes comestíveis à base de polpas podem ser usados para várias aplicações, como em sushis e
temakis (em substituição a algas), filmes para dissolver em água produzindo bebidas, ou mesmo
como petiscos (snacks).

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

A formulação de um filme deve ser planejada com base na aplicação desejada. Veja os exemplos a
seguir:

Um filme para ser usado como substituto de algas em sushis e


temakis deve ter sabor compatível com os demais ingredientes.
Quanto às propriedades mecânicas, o filme deve ter boa resistência
e flexibilidade, de forma a manter a integridade do sushi/temaki,
sem se romper. Por outro lado, deve ser facilmente rompido durante
a mordida.

Um filme para produzir uma bebida deve ter uma matriz


rapidamente solúvel em água (fria ou quente, a depender do caso).

Por fim, para ser usado como snack, o filme deve ter seu
desenvolvimento pautado por propriedades sensoriais, tendo
sabores, cores e texturas que atraiam os consumidores-alvo.

Seja qual for o caso, é preciso sempre ter em mente a aplicação, as propriedades requeridas e o
público-alvo. A partir daí, resta usar os conhecimentos científicos e a imaginação.

• Conheça mais sobre como são filmes comestíveis, entender


a tecnologia e suas aplicações – aqui denominados
bionanocompositos (https://bit.ly/3n1A7kY).


Veja o vídeo Filmes comestíveis: uma forma criativa
de aproveitamento de polpas de frutas e hortaliças
(https://bit.ly/2YwvRkj) com a pesquisadora da Embrapa
Henriette Azeredo sobre essa tecnologia.

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

4. EMBALAGENS TECNOLÓGICAS

4.1 Embalagens nanotecnológicas

Fonte: Embrapa

4.1.1 Introdução ao tópico

A elevada demanda mundial por alimentos vem tornando a eficiência da cadeia produtiva cada vez
mais necessária. Desta maneira, além do aumento da quantidade de alimentos produzidos no campo,
faz se necessária a adoção de medidas que preservem a qualidade e minimizem perdas durante a
manufatura até a mesa do consumidor. Neste sentido, novas tecnologias em embalagens podem ser
aplicadas, permitindo a proteção dos alimentos.

As embalagens têm quatro funções básicas:

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

A nanotecnologia pode ser usada, especialmente, para melhorar


duas dessas funções: PROTEGER e INFORMAR.

O desenvolvimento de novas embalagens de alimentos visa a maior


proteção durante a distribuição e o armazenamento dos produtos
acondicionados internamente contra as adversidades externas, tais
como, vapor de água, gases, choques mecânicos e microrganismos.
Os tipos mais comuns de embalagens são as constituídas por filmes
poliméricos (plásticos) e são obtidas por diferentes processos, por
exemplo, extrusão, conformação e estiramento.

Para a comunicação eficiente dessas embalagens com os


consumidores de forma atrativa e dinâmica sobre a qualidade do
produto, podem ser empregadas embalagens inteligentes, que
possibilitam ao consumidor, visualmente, verificarem a presença
de contaminantes ou da perda das características intrínsecas do
produto, a partir de respostas colorimétricas.

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

4.2. Conceito da nanotecnologia aplicada à embalagem

Embalagens podem ser constituídas por nanocompósitos, contendo uma matriz com
nanoestruturas dispersas.

As nanoestruturas exercem diferentes funções na embalagem, podendo atuar como barreira (a


gases e/ou vapor de água), reforço mecânico, ou mesmo incorporando propriedades ativas (ex:
antimicrobiana), de modo a aumentar a estabilidade ou melhorar a qualidade do conteúdo.

As nanoestruturas podem ser classificadas em três grupos: orgânicos, inorgânicos e com superfície
funcionalizada.

As nanoestruturas orgânicas são de grande maioria proveniente de fontes naturais, tais como,
nanocristais de celulose e de amido.

As inorgânicas são constituídas por metais, sais e óxidos, destacando as nanopartículas de prata e
sílica.

No caso das nanoestruturas funcionalizadas, como por exemplo, argilas com superfície modificada
com compostos orgânicos, permitem uma interação com a matriz polimérica, favorecendo o uso
como barreira de gases, além da melhora das propriedades físico-químicas.

Assim, o uso de nanotecnologia em embalagens permite uma maior garantia de tempo de prateleira
e qualidade do produto, protegendo-o contra a exposição de gases e microrganismos, que podem
levar à degradação e perda das propriedades sensoriais.

Diversas empresas como Dow (EUA), Sciessent (EUA), Toyo (EUA), Sun Chemical (Holanda),
Bactiblock (Espanha), Asahi Kasei (Japão), Nanox Tecnologia (Brasil) vêm desenvolvendo produtos
com nanotecnologia para serem aplicados em embalagens de alimentos, no ramo farmacêutico,
beleza, automobilístico, agricultura e construção civil. Estes materiais na forma de filmes, sacolas
e caixas possibilitam um ganho de propriedades diante a degradação da embalagem e exposição
do conteúdo devido à passagem de vapor de água e gases, perda da resistência mecânica, radiação
solar e proteção antimicrobiana.

4.3 Embalagens Inteligentes

Embalagens inteligentes (do inglês smart packaging) visam fornecer novas funcionalidades
às embalagens convencionais utilizadas tanto para alimentos como também para produtos

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

farmacêuticos e insumos médicos e agrícolas. Entre as funções da embalagem inteligente estão o


monitoramento da qualidade do produto.

No caso específico de embalagens inteligentes para alimentos, elas podem auxiliar no monitoramento
do frescor e qualidade do alimento, como por exemplo, para indicar se uma fruta ou carne está
adequada para consumo, ou se está livre de contaminações por patógenos (bactérias, fungos, etc).

Deste modo, a embalagem inteligente visa detectar ou medir um atributo do produto, a atmosfera
interna da embalagem, como nível de etileno (no caso de fruto) ou nível de compostos derivados de
amina (no caso de carnes).

Mas como essas informações serão comunicadas aos


usuários?

Essas informações podem ser comunicadas aos usuários por meios visuais (por exemplo, através de
selos colorimétricos colados na embalagem) ou por sistemas mais complexos como TAGs que operam
por RFID (Identificação por Radiofrequência), que então encaminham o sinal coletado referente à
atmosfera da embalagem para um computador ou celular.

4.3.1. Nanossensores

Fonte: Embrapa

Os sensores e nanossensores são dispositivos fundamentais para uso em embalagens inteligentes.


Um sensor é um dispositivo que experimenta uma mudança de propriedade e a converte num sinal

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mensurável. Um sensor químico é um tipo de sensor que transforma uma informação química (que
pode ser a concentração de um componente específico da amostra ou a análise composicional total)
num sinal analítico mensurável, conforme ilustrado na figura a seguir.

( * ) analito: componente que está sendo analisado.


Figura 10: Esquema de funcionamento de um sensor químico, com seus diferentes componentes.
Fonte: CORREA, D. S et al. (2014).

Quando este sensor emprega um processo ou material nanotecnológico em seu processo de


fabricação, eles são chamados de nanossensores, os quais podem ser produzidos por métodos
diversos como automontagem molecular, métodos bottom-up e top-down.

Os nanossensores podem apresentar vantagens em relação aos sensores convencionais incluindo


possibilidade de miniaturização (menor tamanho), utilização de menor quantidade de amostra para
análise (aspecto importante no caso de biossensores que fazem análise de amostras fisiológicas
humanas, como o sangue), aumento de sensibilidade e melhora no limite de detecção do composto
de interesse.

Estes dispositivos têm enorme potencial de aplicação nas áreas de medicina, saúde humana,
agricultura e meio ambiente. Especificamente na área de agricultura, estes sensores podem ser
utilizados na avaliação da qualidade de água em relação à presença de contaminantes, na avaliação
da qualidade e de sabor de alimentos, de bebidas (cerveja, vinho, sucos, etc).

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

Sensores podem ser empregados para avaliar o nível de maturação


de frutos, permitindo que o consumidor possa fazer a escolha de
acordo com sua preferência, como por exemplo: comprar frutas para
consumo daqui alguns dias, ou se para consumo imediato.

Os nanosenssores devem conter uma camada ativa capaz de reagir com os voláteis emitidos pelos
frutos, mudando de cor e possibilitando a comparação com um padrão pré-estabelecido, conforme
ilustrado a seguir.

Figura 11: Esquema de uma embalagem


de fruta contendo um sensor colorimétrico
capaz de indicar o número de maturação
da fruta (imatura, pouco madura, madura e
sobremadura).
Fonte: Elaborada para o curso

A Embrapa Instrumentação em parceria com empresas tem


desenvolvido projetos nesta área. Um desses exemplos é o
Nanossensor YVA.

O que é isso?

O nanossensor Yva (“fruta” na língua tupi-guarani) é um sensor


colorimétrico que emprega nanotecnologia e é utilizado na avaliação
do grau de amadurecimento de frutos climatéricos, ou seja, aqueles
que amadurecem depois de colhidos, utilizando um aplicativo de
celular.

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

Acesse o link (https://bit.ly/3mXrqIu) para uma maior descrição da


tecnologia e entender um pouco mais sobre como a inovação
aberta, parceria público-privada, pode levar tecnologia ao setor
agrícola e ao consumidor. Não deixe de assistir ao vídeo até
o final da reportagem, é rapidinho! Você vai se surpreender!

Outra forma de indicação do grau de maturação é por meio de


sensores específicos para cada fruta ou hortaliça, que sejam capazes
de quantificar os níveis de algum composto volátil que sirva como
marcador de amadurecimento de uma determinada espécie. Já
existem alguns sensores comerciais, não necessariamente utilizando
nanotecnologia, para avaliar a qualidade de carne (no caso do sensor
Foodsniffer), ou no caso de outros produtos alimentícios (como
os sensores do tipo “nariz eletrônico” das empresas Alpha MOS,
AIRSENSE Analytics e SIENA).

4.3.2. Embalagens ativas

Enquanto as embalagens convencionais simplesmente atuam como proteção “passiva” ao alimento


(atuando como barreira entre o produto e o ambiente), embalagens ativas contêm componentes
que interagem com o alimento e/ou o ambiente, liberando agentes que auxiliam a conservação (ex:
agentes antimicrobianos) ou absorvendo compostos que favorecem a degradação (ex: absorvedores
de etileno) (fig. 12).

Figura 12: Exemplos de liberação e absorção no contexto de embalagens ativas para alimentos.
Fonte: Elaborada para curso

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

EXEMPLOS DE APLICAÇÕES E CASOS REAIS

Embalagens ativas

• Filmes ou sachês contendo zeólitas (aluminossilicatos


cristalinos), que absorvem etileno, podem ser usados para
aumentar a estabilidade de frutas e hortaliças climatéricas, já
que o processo de amadurecimento é retardado.

• Filmes poliméricos contendo nanopartículas de prata têm se


mostrado efetivos como materiais antimicrobianos, reduzindo
a taxa de deterioração microbiana de frutas e hortaliças.

4.3.3. Embalagens reforçadas: melhor desempenho

Como já abordado no tópico 4.1, algumas nanoestruturas têm efeito de reforço (ex: nanocristais de
celulose e nanoargilas), melhorando as propriedades mecânicas dos materiais, e frequentemente
diminuindo também a permeabilidade dos materiais a gases e vapor de água. Com isso, a função de
proteção das embalagens pode ser melhorada.

Convém ressaltar que, para embalagens destinadas a frutas e hortaliças in natura, a redução da
permeabilidade da embalagem a gases (O2 e CO2) diminui as taxas de respiração, com isso pode
aumentar a vida útil dos produtos. Por outro lado, se a permeabilidade se tornar muito baixa, a
via anaeróbia pode se estabelecer, gerando produção de etanol e acetaldeído, que prejudicam a
aceitação sensorial dos produtos.

A Embrapa Instrumentação tem feito diversos estudos referentes à


utilização de nanopartículas de prata para conservação de alimentos.
Acesse o link (https://bit.ly/3wDyKfO) e aprenda um pouco mais sobre
essa tecnologia aplicada em embalagens e também sobre parceiros
da Embrapa. Ah! Não deixe de assistir os vídeos dos pesquisadores
sobre essa tecnologia nesse mesmo link. Vale conferir!

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

5. PERCEPÇÃO DO CONSUMIDOR EM RELAÇÃO À


NANOTECNOLOGIA

Fonte: Freepik

5.1 Importância de investigar a percepção e o entendimento do


consumidor

O consumidor está cada vez mais consciente da importância dos alimentos para sua saúde e tem
estado atento em relação à segurança, associada à preocupação com a sustentabilidade e o meio
ambiente. Tal cenário aponta para um aumento no número de indivíduos interessados no emprego
de materiais renováveis e biodegradáveis.

Para atender essa demanda, a indústria de alimentos busca inovar e tem investido no desenvolvimento
de novas tecnologias, com produtos que, além de alimentar e nutrir, possam contribuir para uma
dieta adequada e equilibrada. Novos produtos são desenvolvidos a partir de novos processos e/ou
novas tecnologias visando tornar a comercialização mais competitiva e atender às exigências do
consumidor.

Entretanto, é necessário levar em consideração que, mesmo que um alimento seja nutritivo e traga
benefícios à saúde, se as características sensoriais (aparência, aroma, sabor e textura) não forem
agradáveis é improvável que seja aceito e, dessa forma, a comercialização é arriscada.

5.1.1 O consumidor e as novas tecnologias

Dado o complexo mecanismo que envolve as decisões relacionadas à escolha dos alimentos,
uma das questões investigadas nos últimos anos é a rejeição de algumas pessoas em relação

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

aos novos produtos ou àqueles desconhecidos, como por exemplo, os alimentos que utilizam a
nanotecnologia. Dessa forma, avaliar a aceitação do conceito do produto inovador (ex.: fabricado
com a nanotecnologia) pelo consumidor antes do seu desenvolvimento pode trazer maior segurança
ao investimento que será realizado. É importante investigar se o consumidor brasileiro está disposto
a experimentar alimentos produzidos ou que contenham ingredientes ou mesmo embalagens
utilizadas a partir dessa nova tecnologia.

5.1.2 Riscos e benefícios percebidos pelo consumidor

Estudos recentes realizados em diversos países mostram que a população não está familiarizada com
a nanotecnologia. Apesar disto, alimentos e embalagens, utilizando tal tecnologia, já estão sendo
comercializados no Brasil, e essas aplicações vêm crescendo a cada dia.

O consumidor tem revelado importante papel na consolidação destas tecnologias através do


julgamento e da aceitação dos novos produtos, determinando, pois, seu sucesso ou fracasso
comercial. Para aumentar a aceitação de alimentos obtidos por tecnologias não convencionais faz-se
necessário o investimento em programas de informação e educação dos consumidores, para reduzir
os possíveis “medos” e evitar o fracasso da inovação no mercado (CHEN; YADA, 2011; FREWER et al.,
2014)

5.1.3 Métodos empregados para explorar a percepção do consumidor

A percepção do consumidor em relação à nanotecnologia e às aplicações pode ser investigada por


meio de abordagens qualitativas direta e indireta. Exemplo de abordagem indireta é a Word Association
(Associação de palavras), onde é solicitado que os participantes anotem espontaneamente as quatro
primeiras palavras, sensações ou termos que vem à cabeça quando pensam em nanotecnologia. A
abordagem direta refere-se às questões que exploram aspectos relacionados ao uso da tecnologia.

Outro aspecto importante refere-se às características individuais dos consumidores, as quais têm
importante papel em todas as decisões envolvendo a escolha e o consumo de alimentos. Dessa forma,
deve-se dirigir o estudo para o público-alvo ou o potencial consumidor. Vários estudos examinaram
os benefícios e a percepção de riscos da nanotecnologia, mas faz-se necessário investigar os fatores
que influenciam a atitude do consumidor, assim como as aplicações da tecnologia que são aceitas. O
vídeo a seguir apresenta resultados de estudos realizados no Brasil e ilustra esse aspecto da pesquisa
sobre nanotecnologia.

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

6. FINALIZAÇÃO E CONCLUSÃO

Fonte: Marina Deliperi

6.1 Finalização

A partir do que já sabemos, como é ou será então nosso


contato com a nanotecnologia?

Normalmente, espera-se que os produtos da nanotecnologia não sejam anunciados ou


comercializados por conterem nanotecnologia, mas pelo benefício que trazem.

Assim, o consumidor final estará, provavelmente, sempre mais interessado em saber se o produto
final é mais saudável, dura mais tempo na embalagem ou se ele consegue acessar informações
rápidas sobre essas características. É importante entender que a nanotecnologia é uma ferramenta
para a qualidade de forma mais ampla dos produtos, não um objetivo em si mesmo.

Nas nanotecnologias para pós-colheita (ou alimentos, numa visão mais abrangente), notamos que a
oferta de tecnologias é ampla e não específica. Ou seja, a grande maioria dos produtos não é projetada
para atender um único tipo de alimento ou cadeia produtiva, e aparece em vários níveis, indo da
produção do alimento (ingredientes com nanotecnologia), na tecnologia de processamento (filmes
de revestimento e filmes comestíveis), na embalagem (embalagens ativas) e no monitoramento de

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

propriedades ou da qualidade (sensores e embalagens inteligentes). Essa, obviamente, não é uma


lista definitiva, mas uma visão de como os desenvolvimentos em nanotecnologia podem ir além do
que temos pré-concebido.

Boa parte das tecnologias já assimiladas tem como enfoque tempo de prateleira. Essa é uma
preocupação constante do produtor/processador do produto alimentício, mas nem sempre é um
aspecto da tomada de decisão do consumidor. Tecnologias como sensores de monitoramento da
qualidade são, assim, mais bem assimilados em nível de produção e distribuição (por exemplo,
supermercados), já que proveem informação sobre o produto que pode ser utilizada para reduzir
perdas, descarte ou otimizar os processos, incluindo a logística de produtos.

Em termos do futuro, naturalmente os produtos irão surgir na prateleira. Um aspecto determinante


é o balanço de custos, ou seja, normalmente inovações como embalagens que indicam o
estado do alimento irão aparecer com mais frequência em produtos de maior valor agregado, se
popularizando gradualmente. Embalagens ativas com antimicrobianos nanotecnológicos à base de
prata são utilizadas em leite tipo A ou premium, filmes de revestimento para controle da oxidação
em macadâmias, entre outros exemplos. Ingredientes nanotecnológicos, como antioxidantes
nanoencapsulados adicionados na formulação de alimentos, seguem a mesma tendência. À medida
que as escalas de produção aumentam e os consumidores começam a ver vantagens objetivas –
como a saudabilidade e tempo de prateleira, fatores que são avaliados mesmo que subliminarmente
– essas tecnologias se popularizam rapidamente.

Quais então serão os próximos passos?

As tendências já definidas do comportamento do consumidor indicam que, em mercados maduros,


há cada vez mais interesse em produtos funcionais (nutracêuticos, multinutrientes, etc.), práticos
para o consumo, de apresentações diferenciadas (snacks saudáveis, filmes comestíveis, etc).

Esses mercados estão dispostos a investir em produtos com diferencial, o que facilita um segundo
estágio de adoção das nanotecnologias. Portanto, embalagens inteligentes (com sensores que
indicam o estado do alimento), nanoencapsulados nutricionais, etc. poderão ser disseminados em
outra escala nos próximos anos.

É importante diferenciar estes mercados de outros ainda menos desenvolvidos, nos quais aspectos
como o custo do alimento ou disponibilidade ainda são fatores de decisão mais importantes. Nestes,
as tecnologias de impacto nas etapas de produção/distribuição terão maior importância no futuro
próximo pela redução de custos totais.

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

Um aspecto transversal é o impacto ambiental dessas nanotecnologias. Se de fato há


uma preocupação com o risco de algumas nanopartículas engenheiradas (toxicidade e acúmulo
ambiental), esses riscos não são em geral maiores ou diferentes dos que já são estudados para
produtos muito comuns, como os plásticos largamente usados em embalagens convencionais.
Não se deve negar que é importante olhar para o aspecto ambiental, e isso deve ser feito de forma
rigorosa e responsável. Porém, num contexto mais amplo, os desenvolvimentos da nanotecnologia
contribuem muito para redução de impactos ambientais, como as embalagens biodegradáveis com
reforço de nanoestruturas. O uso de nanotecnologias na cadeia alimentar, em qualquer condição
(com ou sem contato), deve ser feito sempre pautada pela preocupação com a saúde e segurança do
consumidor, que é item essencial requerido pelos órgãos reguladores para a liberação dos produtos
finais ao mercado.

6.2 Comentários finais

É importante considerar o peso de decisões externas na inserção destes produtos.


Órgãos reguladores discutem hoje quais são os critérios necessários para que um produto seja
classificado como nanotecnologia, em todos os seus aspectos (ABNT/CEE-089). É importante que
sejam definidos os critérios para classificação, inclusive para evitar situações nas quais produtos são
divulgados como “nano” sem que nenhuma propriedade objetiva exista – ou seja, produtos que
utilizam o termo nano apenas como estratégias de marketing.

Em geral, os órgãos têm demonstrado maior preocupação em desenvolver os métodos de


monitoramento, definir quais deles são os mais adequados para fiscalização e como classificá-
los. Como exemplo, não há muito sentido numa legislação sobre contaminação de alimentos que
contenham nanotecnologia, já que existe uma sobre contaminação em alimentos em geral. Como
a preocupação final é se há contaminação, e em que limites, basta que haja adaptações para que o
cenário de alimentos com nanotecnologia seja levado em conta como uma possibilidade.

Essa é uma questão aberta. No entanto, o amadurecimento da discussão nos mostra que não
há indicativos de riscos exagerados ou grandes modificações do panorama legal, ainda que o
monitoramento dos efeitos em longo prazo seja uma questão de responsabilidade.

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Módulo | Nanotecnologia na pós-colheita de frutas e hortaliças

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FONTE DAS FIGURAS


Figura 1: Cancer National Institute. (2016). Understanding Nanotechnology: the size of things.
Disponível em: http://nano.cancer.gov/learn/understanding/. Acesso em: 4 maio. 2021.

Figura 2: National nanotechnology initiative strategic plan. Disponível em: https://www.nano.gov/


sites/default/files/2016_nni_strategic_plan_public_comment_draft.pdf. Acesso em: 4 maio. 2021.

Figura 3: Elaborada para o curso.

Figura 4: Elaborada para o curso.

Figura 5: Elaborada para o curso.

Figura 6: ASSIS, Benedito G.; BRITTO, Douglas. (2014). Revisão: coberturas comestíveis protetoras
em frutas: fundamentos e aplicações. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S1981-67232014000200001&lng=pt&tlng=pt. Acesso em: 5 maio. 2021.

Figura 7: MIRANDA, Marcela. Revestimento nanoestruturado de cera de carnaúba na manutenção


da qualidade pós-colheita de tomates. 2017. 105 f. Dissertação (Mestrado em Biotecnologia) –
Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2015. Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/
handle/ufscar/8588. Acesso em: 5 maio. 2021.

Figura 8: MIRANDA, Marcela. Revestimento nanoestruturado de cera de carnaúba na manutenção


da qualidade pós-colheita de tomates. 2017. 105 f. Dissertação (Mestrado em Biotecnologia) –
Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2015. Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/
handle/ufscar/8588. Acesso em: 5 maio. 2021.

Figura 9: Elaborada para o curso.

Figura 10: CORREA, D. S et al. (2014). Nanostructured conjugated polymers in chemical sensors:
synthesis, properties and applications. Journal of Nanoscience and Nanotechnology (Print), v. 14, p.
6509-6527, 2014.

Figura 11: Elaborada para o curso.

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Coordenação: Embrapa Instrumentação

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