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Capítulo 1

América Latina - A Eterna Terra do Futuro

Em 1 de janeiro de 2003, Luiz Inácio da Silva, conhecido amplamente por seu


apelido, Lula, foi empossado como o presidente constitucional do Brasil. A ocasião
foi solene e carregada de significado. Lula foi o primeiro líder sindical e
socialista autodeclarado a ser eleito para a presidência de um país latino-
americano. Por muitos anos seu partido político, o Partido dos Trabalhadores (PT),
havia defendido a nacionalização de grandes firmas e bancos, reforma agrária
profunda, e um redirecionamento para o socialismo. A eleição de Lula representou
uma mudança dramática na história do Brasil e um teste para a jovem democracia do
país. Por mais de duas décadas, de 1964 a 1985, o Brasil havia sido regido por uma
ditadura militar que havia perseguido, aprisionado e até mesmo torturado seus
opositores de esquerda. Lula passou tempo na cadeia na década de 70, e seu
predecessor, Fernando Henrique Cardoso, um acadêmico afável e filho e neto de
oficiais militares, havia sido exilado na década de 1960.
A inauguração de Lula, ocorrida na capital modernista do Brasil, Brasília,
foi prestigiada por numeros chefes de estado, dignatários e oficiais de patente
alta de ao redor do mundo. o presidente George W. Bush, entretanto, não estava
entre os presentes; tampouco estavam o vice-presidente Dick Cheney, o secretário de
estado Colin Powell, ou qualquer outro membro proeminente do gabinte dos Estados
Unidos da América. A delegação dos estadunidense era encabeçada por Robert
Zoellick, o representante sindical dos Estados Unidos que, apesar de ser um oficial
apto, carecia da estatura política e diplomática que a ocasião requeria. Com sua
tradicional irreverência e seu aguçado senso de humor, Lula fez pouco caso da
descortesia e disse que haveria muitas ocasiões para ele se encontrar com seu
colega ao Norte. Outros cabeças de estado e oficiais latino-americanos, no entanto,
não foram tão casuais; eles ficaram ofendidos. De seu ponto de vista a ausência de
um representante apropriado dos Estados Unidos foi uma séria afronta diplomática e
um claro lembrete que, com poucas exceções - incluindo Cuba e, possivelmente, o
México - a América Latina não era uma prioridade política e diplomática para os
Estados Unidos. Para eles, isto confirmou que a América Latina era um "continente
esquecido".
Como ficaria posteriormente claro, Lula estava certo. Quatro anos após sua
eleição, o lapso entre seu governo e a administração Bush havia sido superado. A
secretária de estado Condoleezza Rice compareceu à inauguração de seu segundo
mandato como presidente, e ele desenvolveu um elo estreito com o presidente Bush.
Em 2007 Lula se tornou o primeiro líder latino-americano a ser convidado para o
Camp David. Esta melhora nas relações econômicas e diplomáticas se deveu em grande
parte à decisão de Lula de alterar as políticas de esquerda que o seu Partido dos
Trabalhadores há muito almejava. Ao invés disso, ele seguiu um programa econômico
benéfico ao mercado que reduziu a inflação, reviveu os mercados de crédito, e
atraiu volumes consideráveis de investimento estrangeiro. Em 2008, o compromisso de
Lula com a prudência fiscal, estabilidade econômica, abertura ao comércio e
orientação mercantil deram resultado quando a agência Standart & Poor's conferiu à
dívida nacional brasileira a tão sonhada classificação de investimento, o que
ajudou o país a atrair investimento estrangeiro adicional e permitiu que tomasse
empréstimos internacionais a custos significantemente mais baixos.
Mas apesar do final feliz deste episódio brasileiro, nem tudo está sossegado
na fronte latino-americana. Desde o começo do século vinte e um o público latino-
americano andou constantemente rumo à esquerda e elegeu - algumas vezes por amplas
margens - presidentes que são abertamente críticos dos Estados Unidos e suas
políticas econômicas e estrangeiras e que implementaram programas populistas em
seus respectivos países.
Hugo Chávez da Venezuela têm sido o mais vocal dos líderes populistas e anti-
americanos. Mas ele não é o único: Néstor Kirchner e Cristina Fernández de Kirchner
da Argentina, Evo Morales da Bolívia, Rafael Correa do Equador, Fernando Lugo do
Paraguay e Daniel Ortega da Nicarágua têm sido explícitos em suas críticas aos
Estados Unidos e ao sistema de mercado. Todos eles se apoiaram em retórica
populista para atacar a globalização e argumentar que a região necessita aumentar
em grande escala o papel do Governo nos assuntos econômicos. Ao longo dos últimos
anos companhia privadas na maioria destes países têm sido nacionalizadas, barreiras
de mercado foram alçadas e o controle governamental sobre preços, investimento e
negócios foi intensificado. Em muitas destas nações - incluindo Bolívia, Equador e
Venezuela - novas constituições visaram a pavimentar o caminho rumo à uma sociedade
socialista e foram promulgadas, e manobras legais foram iniciadas ou aprovadas para
manter presidentes de esquerda no poder.
O presidente Chávez condenou o capitalismo, investidores estrangeiros e o
setor de negócios internacional; ele povoou a suprema corte Venezuelana com seus
apoiadores, fechou um canal de TV que era propriedade de seus oponentes políticos,
cortou laços diplomáticos com sua vizinha Colômbia (apenas para restabelecê-los
alguns dias depois), interveio em assuntos de outros países, e tornou-se um aliado
próximo do adoecido Fidel Castro. Em um discurso nas Nações Unidas em setembro de
2006, Chávez chamou o presidente estadunidense George W. Bush de "diabo" e o acusou
de "agir como se o mundo dele fosse". As críticas de Chávez, todavia, não foram
somente direcionadas aos Estados Unidos; em um encontro de chefes de estado ibero-
americanos ocorrido em Santiago, Chile, em novembro de 2007, ele se envolveu em uma
discussão séria com o rei Juan Carlos, da Espanha, e acusou o ex-presidente
espanhol José María Aznar de ser "um fascista" e "uma serpente". Mais tarde, Chávez
ameaçou multinacionais espanholas de expulsão da Venezuela. Em maio de 2008, ele
criticou a chanceler alemã Angela Merkel e disse que o seu Partido Democrata
Cristão partilhava dos "ideais políticos de Adolf Hitler".
Em fevereiro de 2009, Hugo Chávez venceu um referendo crucial que o tornava
apto a se candidatar a presidente quantas vezes ele desejasse. Se as coisas
decorrerem de acordo com seus desejos e ele for reeleito mais uma vez, em 2013, ele
será presidente da Venezuela até, pelo menos, 2019, extendendo seu ofício para nada
menos que vinte e um anos, mais do que o da maioria das figuras importantes da
região, incluindo Augusto Pinochet, do Chile. As coisas podem ser ainda melhores
para o ex-oficial do exército, é claro, e ele pode permanecer no poder
indefinidamente no poder. Alguns dias após vencer o referendo, Chávez enviou
esquadrões militares para tomar companhias produtoras de arroz pelo território do
país. Chávez, em seguida, condenou o Governo do recém-eleito presidente Barack
Obama por alegadamente manter a política externa de George W. Bush e reclamou de o
Departamento de Estado dos Estados Unidos continuar a caracterizar a ficha de
direitos humanos da Venezuela como abaixo de impecável.
É claro, nem todo líder de esquerda tem sido tão abertamente oposto ao
mercado aberto e à globalização como Chávez, e nem todos eles defendem políticas
populistas. Em contraste ao presidente bolivariano e seus apoiadores há o que o
secretário de assuntos exteriores mexicano Jorge Castañeda tem chamado de "Nova
Esquerda Latino-Americana". Além de Lula, representantes antigos e atuais desta
esquerda moderada incluem Fernando Henrique Cardoso do Brasil, Ricardo Lagos e
Michelle Bachelet do Chile, Alan García do Peru e Tabaré Vázquez do Uruguai. Estes
moderados não demonizam a globalização, mas entendem a importância do mercado -
(apesar de suas críticas a alguns de seus excessos, incluindo aqueles que
engendraram o crash global de 2008) e reconhecem que a inovação e eficiência estão
no centro do sucesso econômico. Em termos diretos, eles acreditam que mais
intervenção governamental e regulação são essenciais para a redução da
desigualdade. Porém, eles não são socialistas ávidos; seu objetivo é adotar as
políticas das sociais-democracias da Europa ocidental.

O Futuro Econômico da América Latina e dos Estados Unidos

O futuro econômico da América Latina, uma região com população de mais de


meio bilhão de pessoas e vastas fontes de recursos naturais, é importante para o
resto do mundo. Em particular, uma performance econômica medíocre na América Latina
são más novas para os Estados Unidos. Se a renda, empregos e salários crescerem a
passos curtos - ou pior, se eles estagnarem - o fluxo de imigrantes ilegais para os
Estados Unidos vai provavelmente aumentar drasticamente. Durante a última década,
quase meio milhão de imigrantes ingressaram nos Estados Unidos a cada ano. A vasta
maioria deles - mais de 80 por cento - vêm de nações latino-americanas. Imigrantes
ilegais não estão mais restritos aos mexicanos e centro-americanos. Eles agora
chegam de todos os cantos da América Latina: Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia,
Equador, Paraguai, Peru e Venezuela. Não é de difícil concepção, que quanto mais
duras as condições econômicas domésticas são, mais intenso é o fluxo de pessoas que
cruzam a fronteira ilegalmente. Imigração ilegal também afeta a União Europeia. No
século vinte e um, um grande número de latino-americanos - muitos deles jovens,
incapacitados e pobres - emigraram ilegalmente para a Europa, particularmente para
a Espanha, Portugal, Itália e França. Começando em 2005, autoridades europeias
redobraram o controle nos aeroportos na tentativa de estancar o fluxo de migrantes
latino-americanos sem documentação. Desde então, grupos de latino-americanos de
todas as idades e estilos de vida têm sido barrados, detidos, e enviados de volta
aos seus países de origem.
Uma América Latina malsucedida estará atolada na pobreza e desigualdade, e a
população vai pôr a culpa pelo mau momento da região no capitalismo e na
globalização. Políticas que visam a aumentar o protecionismo e controles
governamentais serão implementadas, e corporações multinacionais com base nos
Estados Unidos, bem como bancos espanhóis e companhias de utilidade Europeias, irão
se deparar com regulações mais severas, mudanças no ambiente legal e riscos de
nacionalização mais altos. O fracasso provavelmente também resultará num degrau
mais baixo de cooperação econômica em áreas tais como direito de propriedade
intelectual. E, é claro, sempre há a possibilidade de que algum país produtor de
petróleo - Venezuela e Equador vêm imediatamente à mente - venha a perturbar o
fluxo de óleo e provocar desordem econômica séria nos Estados Unidos.
Ademais, há o problema da cooperação diplomática. Apesar de muitos países
latino-americanos terem sido aliados históricos dos Estados Unidos, a região nem
sempre apoiou iniciativas americanas nas Nações Unidas e outros fórums
internacionais. Esse foi o caso, por exemplo, em abril de 2003, quando o secretário
de estado Colin Powell falhou em obter o apoio do Chile e do México no Conselho de
Segurança da ONU em uma resolução chave sobre o Iraque. A colaboração em tais
momentos seria ainda mais difícil caso sentimentos anti-americanos se tornassem
generalizados por toda a região.
Outrossim, uma desaceleração significante nas economias latino-americanas
provavelmente resultará em um aumento de atividades ilícitas tais como tráfico de
drogas, contrabando, falsificações e lavagem de dinheiro. Durante 2008 e 2009, a
violência relacionada às drogas cresceu abruptamente no México, e de acordo com
vários relatos de agências encarregadas da lei, o cartel de Sinaloa se infiltrou em
diversas cidades dos Estados Unidos. Em um cenário de problemas econômicos é
possível que a região teria um comportamento menos vigilante acerca de terrorismo e
ameaças terroristas. A fronteira entre o México e os Estados Unidos é muito porosa
e poderia passar a ser um ponto de entrada favorecido pelos terroristas, e a
"fronteira tripla" entre Argentina, Brasil e Paraguai é notória por concentrar toda
sorte de [unsavory characters], incluindo [alguns] com conhecidas conexões
terroristas.
É claro, o futuro da América Latina não necessita ser lugubridade econômica e
fracasso. É possível que alguns países exibam crescimento econômico robusto e
condições sociais melhores nas próximas duas décadas e a região deixe de ser a
eterna "terra do futuro". Para que isso aconteça, entretanto, a América Latina vai
ter que encorajar a inovação, aumentar a eficiência e modernizar suas instituições.
E precisará, além disso, pôr em prática reformas viscerais para aumentar a
qualidade da educação e aparelhar novas gerações com as habilidades necessárias em
um mundo cada vez mais sofisticado e competitivo. Se a região - incluindo seu maior
país, o Brasil - está politicamente pronta para dar uma nova empreitada em direção
à modernização é uma questão aberta.

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