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A ESSÊNCIA DO ESTUDO DA GEOMETRIA

Construir templos implica saber medir as dimensões do espaço e do tempo.


Os primitivos construtores livres ou francos elaboraram bases operativas das
quais a moderna franco-maçonaria especulativa conserva hoje a memória e o
uso simbólico.

Duas peças fundamentais dessa Arte Real, que se mantêm centrais nos dias
de hoje, são o esquadro e o compasso, colocados sobre o volume da lei
sagrada, sempre que este está aberto na ara maçônica. Mas, o que medem
hoje, em sessões de trabalho especulativas, estes instrumentos operativos?
Ao esquadro, que se considera fixo e ligado à matéria, a ele atribui-se um
caráter passivo, enquanto que ao compasso, instrumento móvel que se
considera como símbolo do espírito, se lhe atribui um caráter ativo. Em
sessão de Loja, o compasso e o esquadro são colocados sobre o altar de três
formas diferentes: No primeiro grau, o de aprendiz, o esquadro fica por cima
do compasso aberto a 45 graus, simbolizando que a matéria se sobrepõe e
domina o espírito;

 No segundo grau, o de companheiro, o esquadro é entrecruzado com o


compasso, agora aberto a 60 graus, simbolizando o equilíbrio atingido entre a
matéria e o espírito; 

 Finalmente, no terceiro grau, o de mestre, o esquadro é colocado debaixo


do compasso, aberto a 90 graus, simbolizando que o espírito passou a
dominar e a transcender a matéria. Sem dúvida, na atual maçonaria
especulativa, o esquadro e o compasso são os instrumentos com que cada
livre-construtor de templos se mede a si mesmo, avalia a ação do seu espírito
sobre a matéria do seu corpo e da sociedade exterior, quantifica o grau da sua
própria libertação, a sua independência em relação às condicionantes do
mundo profano.

Porém, a leitura deste simbolismo deve ser ainda mais aprofundada.


Observando-se atentamente a sobreposição e entrecruzamento do esquadro e
do compasso, sobressai de imediato a forma da Estrela Flamejante,
pentagrama de profundo simbolismo iniciático desde a mais remota
Antiguidade. Esta figura alude aos cinco sentidos do Homem e às forças
subtis da Natureza. No seu interior, inscreve-se o  G simbolizando o Grande
Geômetra ou Grande Arquiteto do Universo. 

Onde poderemos chegar com esta comparação? À compreensão de que a


Geometria, na verdadeira tradição dos livres construtores de templos, não
pode ser considerada uma disciplina como as outras, nem sequer distinta
delas, mas sim como o sistema de referência fundamental, o sistema a partir
do qual se efetuam todos os percursos intelectuais, morais e espirituais.
No mundo estático da Idade média, a fé implicava confiança absoluta em
relação às hierarquias, com a emblemática solidez da afirmação selada pelo
magister dixit. 
Só o pedreiros-livres, estudiosos da Geometria, constituíam uma exceção em
relação ao imobilismo do dogmatismo reinante. Um geômetra, quando se
inclina perante a palavra do mestre não o faz por ela proceder dele, mas sim
por ela ter sido demonstrada. A relação mestre-aluno não assenta nem na
confiança nem na submissão, é sim determinada pelo próprio exercício da
transmissão de um conhecimento. O mestre diz ao seu aprendiz: «eis o que
eu afirmo, eis como eu provo o que afirmo, e tu só o saberás depois de o
queres verificado por ti próprio, com os teus instrumentos, o esquadro e o
compasso».

De outro modo, não teriam sido erigidos ao longo dos séculos os edifícios
majestosos dos templos, cuja perenidade testemunha a correção das bases
operativas usadas na sua construção. 

Assim, é pela Geometria e pelo aprofundar do seu estudo que se introduz o


espírito de pesquisa e se instala na consciência um modo de atuar que
subverte o dogma da fé e conduz ao racionalismo. Reconheçamos que o
mesmo pensamento que se desenvolveu a fim de estabelecer os planos dos
templos e das catedrais preparou a supremacia da razão. 

Partindo desta filosofia operativa dos primitivos construtores-livres, embora


trilhando uma via atribulada e cheia de avanços e retrocessos, a moderna
maçonaria especulativa amadureceu a idéia de que um homem pode ser
digno de estima sem partilhar a mesma religião do seu irmão. Numa
perspectiva dinâmica do mundo que se contrapõe ao imobilismo dogmático, o
maçom, sem renunciar à sua própria fé, toma em consideração todas as
ideologias e instala na sua consciência a idéia da tolerância, isto é, a idéia
segundo a qual nenhum discurso tem o monopólio do verdadeiro, do bom e
do belo, e que cada coisa é o estado transitório de uma perpétua
metamorfose. 

Pelo esquadro e pelo compasso, pelo estudo da Geometria, o maçom aprende


que o espírito é o estado etéreo da matéria e que esta é o estado sólido do
espírito, que as propriedades se diferenciam, mas não a natureza, que a
movimentação social se torna fluída e as fronteiras entre as castas pouco
nítidas e que a tradição se torna criativa porque cada um faz surgir
sentimentos novos dos mesmos textos, caindo os muros que separam os
homens.

É por isso que a via iniciática da Maçonaria se mostra capaz de voltar a unir
Fé e Razão, Matéria e Espirito, Ação e Meditação e de recriar o homem total
que retorna à Unidade Primordial, fazendo desaparecer os guetos e
transformando todos os homens em irmãos.

José, E.'., A.'.M.'.


R.'.L.'. Bispo Alves Martins (Oriente de Viseu) - G.'.L.'.L.'.P.'.\G.'.L.'.R.'.P.'.

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