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Transexualidade, Tendência Atualizante e Terapia Afirmativa:

o clássico e o contemporâneo nas questões de identidade de


gênero e sexualidade no processo terapêutico

Frederico Monte

“Eu sou filho do arco-íris


Eu tenho outra íris
Eu tenho outro olhar
E se o céu azul
Nos traz o arco-íris
É pra que a Terra inteira possa admirar
Por isso esse amor e esse orgulho
Que a vida colocou dentro de mim
E não importa a cor do meu amor
É o arco-íris que me faz brilhar assim.” (Preta Gil)

RESUMO

O campo da sexualidade se mostra um campo vasto com poucos estudos


principalmente dentro do universo transexual; nos deparamos com várias indagações
que perpassam as questões de orientação sexual tomando um caráter existencial.
Buscamos realizar um levantamento bibliográfico de como a questão da
transexualidade é trabalhada sob o olhar rogeriano baseando-se no principal postulado
dessa consolidada abordagem (ACP), a Tendência Atualizante em junção com
posturas da Terapia afirmativa que trata a sexualidade como algo natural e positivo
do ser humano e que está embasada em pesquisas de orientação sexual e identidade
de gênero. Percebemos aspectos, em sua maioria, psicanalistas para tais questões
sempre com um olhar patologizante. Defendemos a possibilidade do trabalho em
conjunto dessas duas técnicas, a Abordagem Centrada na Pessoa e a Terapia
Afirmativa para a minimização de sofrimento dentro do grupo das transexuais como
também a classe LGBTQIA+.

Palavras chaves: Transexualidade, Sexualidade, Tendência Atualizante, Identidade


de Gênero, Terapia afirmativa
ABSTRACT

The field of sexuality proves to be a vast field with few studies, mainly within the
transsexual universe; we are faced with several questions that permeate sexual
orientation issues taking on an existential character. We seek to carry out a
bibliographic survey of how the issue of transsexuality is worked under the Rogerian
perspective based on the main postulate of this consolidated approach (ACP), the
Updating Trend in conjunction with affirmative therapy postures that treat sexuality
as something natural and positive of human being and based on research on sexual
orientation and gender identity. We perceive aspects, in their majority, psychoanalysts
for such questions always with a pathologizing look. We defend the possibility of
working together on these two techniques, the Person-Centered Approach and
Affirmative Therapy to minimize suffering within the group of transsexuals as well
as the LGBTQIA + class.

Key words: Transsexuality, Sexuality, Updating Trend, Gender Identity, Affirmative


therapy

RESUMEN

El campo de la sexualidad resulta ser un campo vasto con pocos estudios,


principalmente dentro del universo transexual; nos enfrentamos a varios interrogantes
que impregnan cuestiones de orientación sexual adquiriendo un carácter existencial.
Realizamos una búsqueda bibliográfica a saber cómo se trabaja el tema de la
transexualidad bajo la perspectiva rogeriana a partir del postulado principal de este
enfoque consolidado (ACP), la Tendencia de Actualización en conjunto con posturas
de terapia afirmativa que tratan la sexualidad como algo natural y positivo del ser
humano y está basado en investigaciones sobre orientación sexual e identidad de
género. Percibimos aspectos, en su mayoría, psicoanalistas para este tipo de cuestión
siempre con una mirada patologizadora. Defendemos la posibilidad de trabajar en
conjunto estas dos técnicas, el Enfoque Centrado en la Persona y la Terapia
Afirmativa para minimizar el sufrimiento dentro del grupo de transexuales así como
de la clase LGBTQIA +.

Palabras clave: Transexualidad, Sexualidad, Tendencia de Actualización, Identidad


de género, Terapia afirmativa
1. INTRODUÇÃO

O campo sexual mostra-se ainda um território vasto e pouquíssimo explorado, nos


deparamos com vários movimentos em defesa de várias causas educacional, existencial,
política, educacional... isto tudo está muito em evidência; no passado tudo ‘ era resumido
em uma sigla GLS (gays, lésbicas e simpatizantes), porém com o advento desses
movimentos cada vez mais categorias foram se juntando e num momento seguinte com
essas inclusões passou a ser usada a sigla LGBT ( Gays, lésbicas ,bissexuais, travestis e
transexuais ) no último caso que poderia ser tanto masculino quanto feminino; dando
outro salto no tempo e com mais avanços nos estudos no que tange a sexualidade chegou-
se a sigla LGBTQIA+ que será detalhado no decorrer desse artigo.

Independente da condição do indivíduo nos deparamos com as questões


relacionais do ser, com o mundo e sua existência bem como fenômenos que chegam as
pessoas, não vislumbrando nenhum outro aspecto que não seja do “ser “.
Este trabalho tem como principal intuito de adentrar o universo da condição
sexual, suas especificidades no nosso caso as mulheres transexuais e fazer uma ponte
junto a psicologia humanista especificamente a teoria rogeriana cujo o lastro principal é
a Tendência Atualizante que defende a ideia de uma força interior que nos leva a um
desenvolvimento satisfatório e construtivo que leva a autorealização e autonomia e a
terapia afirmativa que trata a sexualidade humana de forma positiva e natural assim como
a heterossexualidade. O assunto é deveras controverso até mesmo dentro dos estudos
sobre questões sexuais e de identidade de gênero. Nesse artigo vamos passar para o outro
lado do balcão, vamos adentrar no universo transexual feminino ver seus conceitos ,
questões , estigmas , barreiras; acreditamos um olhar biopsicoscial cabe perfeitamente
nesse grupo específico de “ Pessoas” fazendo uma ponte com alguns autores que
trabalham a causa desde a visão patologizante, jurídica e social e do conceito clássicos
dentro da teoria de Carl Rogers , a Tendência Atualizante até um olhar mais
contemporâneo dos preceitos da terapia afirmativa que não é reconhecidamente uma
abordagem mas está fazendo diferente quando trabalhada de forma adequada dentro do
set terapêutico pois ROGERS diz,” O ser humano possui um importante valor... Por mais
que o rotulem e o avaliem, ele continua sendo, acima de tudo, uma pessoa.”
Pontuaremos qual seria o papel da psicologia humanista mais especificamente
rogeriana pois acreditamos que todas as psicologias são centradas na pessoa, então como
a aborgadem pode ajudar nessas questões do ser, do existir; como essas teorias podem
conversar para que haja uma comprovada eficácia num processo terapêutico. Percebe-se
uma negligência em setores da sociedade nesse momento e não é diferente com as
Transexuais, então levanta-se o questionamento, como usar a psicologia positiva, como
trabalhar as questões da tendência atualizante, e da naturalidade sexual pregada por
Klecius Borges em sua terapia afirmativa, como se trabalhar o direito apenas de ser, de
vivenciar sua própria existência?

Por fim, a metodologia desses estudo foi baseada em pesquisas bibliográficas


através de artigos usando com base de pesquisa o SCIELO, PEPSIC, dissertações, resenha
e autores clássicos para a fundamentação dessa investigação cientifica.

2. JUSTIFICATIVA

A vivência de realizar atendimentos psicoterápicos a funcionários, familiares e


comunidade ligados à Assembleia Legislativa do Estado da Paraíba durante um ano, no
período do estágios supervisionados obrigatórios com a ênfase na Abordagem centrada
na Pessoa trabalhando fortemente a Tendência Atualizante aliado as técnicas aplicadas na
Terapia Afirmativa em pacientes LGBTQIA+ , mostrou-se positivo dentro do processo
terapêutico, percebemos que existem aspectos, principalmente na Terapia Afirmativa, que
trabalham como uma preparação para uma relação mais autêntica do sujeito no que tange
as questões de sexualidade e identidade de gênero num primeiro momento e num outro
momento percebendo a sexualidade como um aspecto natural da vida e compreendendo
os fatores externos que bombardeia não só ele paciente mas um grupo inteiro, podemos
assim adentrar na atmosfera do “ ser” , na experiência existencial do paciente, dos outros
fenômenos que fazem parte da vida do sujeito, criando assim uma atmosfera acolhedora
e facilitadora para que possibilite a facilitação da tendência ao desenvolvimento eclodir
no paciente.

3. ALGUMAS QUESTÕES DA SEXUALIDADE HUMANA

A sexualidade humana desde muito tempo sempre foi alvo de discussão por várias
frentes e sempre existiram problematizações sobre a importância e suas práticas na vida
dos sujeitos; em culturas mais antigas eram tratadas de formas mais livres, natural; com
o advento da igreja com seus dogmas e seus novos padrões de normalidade vestiu-se
numa atmosfera muito proibitiva e limitadora e muitas vezes excludente permanecendo
dessa forma por séculos. Vários autores debateram essas questões em suas teorias como
Freud, Lacan por exemplo no início do século XX até autores contemporâneos como
Michel Foucault com sua trilogia sobre a história da sexualidade (A vontade de saber, o
uso do prazer e a o cuidado de si) entre tantos outros. A medida que os estudos iam se
aprofundando foram sendo trabalhados comportamentos dentro desse universo sexual
salientando-se que sempre muito presos a questões sociais e religiosas foram tomando
forma e se subdividindo em várias ramificações, isto é, as orientações sexuais mas aqui
mencionaremos de forma objetiva para o nosso estudo as que por mais tempo foram
evidenciadas , digamos assim ; que seriam a heterossexualidade , homossexualidade ,
bissexualidade , pansexualidade e intersexualidade

3.1 HETEROSEXUALIDADE

Consiste no indivíduo que sente atração física, emocional, sexual entre outros
sentimentos e sensações pelo sexo oposto ao seu; dentro de uma sociedade
cisheteronormativa é o que rege o dito “normal “. (LOPES,2011) em seu texto diz,
“Heterossexual é aquele que realiza o padrão normal de sexualidade, desfrutando da
harmonia entre os sexos biológico, psíquico e civil, caracterizando-se pela orientação ao
sexo oposto ao seu.”.

3.2 HOMOSEXUALIDADE

Consiste no indivíduo, homem ou mulher, que sente atração física, estética,


emocional e sexual por indivíduos do mesmo sexo, durante muito tempo foi considerado
como uma patologia, até meados de 1990 era considerada uma doença mental pela
Organização Mundial da Saúde (OMS). (BORGES,2009) em sua obra “Terapia
Afirmativa “trabalha a homossexualidade partindo do pressuposto que é uma variação
natural da sexualidade humana; defendendo que as questões oriundas da
homossexualidade a padrões sociais, culturais e religiosos. Um levantamento realizado
pela ILGA (Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e
Intersexuais) em 2019 constatou que em 70 países a homossexualidade é crime; em alguns
casos com pena de prisão em outros, como em alguns países do Oriente médio e África
com pena de morte.

3.3 BISSEXUALIDADE

Consiste em indivíduos que tem atração sentimental, estética, física, emocional e


sexual por homens e mulheres, podendo acontecer ao mesmo tempo, com predominância
mais com homens e menos com mulheres, podem acontecer em períodos espaçados, na
verdade não existe uma regra; atualmente dentro da Bissexualidade existe uma
especificação que são ambissexuais, pessoas que não estabelecem preferência entre os
sexos. Existem vários debates sobre esse tipo de orientação sexual, existe uma corrente
que defende a preferência pelos dois sexos por um lado mas em contrapartida existe uma
gama de pessoas que os tratam como pessoas indecisas ou sem coragem de definir uma
sexualidade propriamente dita, muitas vezes causadas por interferências sociais, culturais
e religiosas.

3.4 PANSSEXUALIDADE

Algumas orientações sexuais não se diferenciam muito entre si como é o caso da


Panssexualidade que conceitualmente são pessoas que se envolvem de forma física,
sentimental e sexual por pessoas de ambos os sexos; o que diferencia, por exemplo, da
bissexualidade é que não existe nenhuma preocupação com identidade de gêneros bem
como de ser ou não binário, comumente ela é dita como uma extensão da bissexualidade.

3.5 INTERSEXUALIDADE

Podemos de uma forma bem objetiva definir uma pessoa intersexual forma
objetiva como sendo, “[...] uma pessoa que naturalmente, ou seja, sem qualquer
intervenção médica, desenvolve características sexuais parte da definição típica de sexo
masculino e do sexo feminino”. (UNFE INTERSEX FACT SHEET).
Ainda segundo (GAUDENZI,2018),
“A intersexualidade é um termo utilizado desde o
século XX para o que se conhece no senso comum
como hermafroditismo, isto é, a condição de
indivíduos que nasceram com órgãos sexuais
ambíguos. A linguagem biomédica marca tal
condição como patológica, sendo compreendida
como resultado de uma interação anormal dos
fatores genéticos e hormonais ligados ao gênero no
período pré-natal, e a denomina de distúrbio do
desenvolvimento sexual (DDS). “

4. QUESTÕES DE IDENTIDADE DE GÊNERO

Até aqui demonstramos, de forma simplificada, bem simplificada; o que


comumente acontece dentro do sistema vigente no que tange ao social dentro do universo
da sexualidade. Em nenhuma das práticas mencionadas anteriormente existe nenhum
desacordo com o sexo genital – o que está ligado a fisiologia do homem/mulher - e o
sexo Psicológico – aquele que a pessoa acredita ser, isto é, em termos de identidade de
gênero são conhecidos como cisgêneros; no entanto, existe um grupo de pessoas na
sociedade onde essa realidade é completamente oposta, existe uma total desencontro da
questão biológica com a psicológica.

As questões de identidade de gênero está ligada a como cada indivíduo produz sua
forma de consciência perante a sociedade, é uma ideia de “sentir-se como” um dos
expoentes que lidou com essa temática na década de 1960 foi Robert Stoller, americano,
que vai produzir a ideia de que sexo e gênero são duas coisas diferentes; as questões de
gênero alia uma sociedade, costumes, cultura, hábito será internalizado o que cada
indivíduo é em termos de gênero. Não podemos transitar por esse tema sem entender o
que é sexo; sexo é o que o classifica os seres humanos na parte anatômica, fisiológica e
morfológicas, trazendo para uma linguagem popular e mais acessível é o que distingue
“homem” e “mulher; o “masculino “e o “feminino”, Segundo ( LOPES apud FERREIRA)
sexo “ é a conformação particular que “distingue o macho da fêmea, nos animais e nos
vegetais, atribuindo-lhes um papel determinado na geração e conferindo lhes certas
características distintivas”. . Gênero está ligado aos significados sociais; como o sujeito
se enxerga perante sua orientação sexual, sua sexualidade. (LOPES) enfatiza, “...na
espécie humana o sexo da pessoa equivale a uma conjugação de fatores biológicos,
psicológicos e sociais”. O Conselho Federal de Psicologia em sua resolução Nº 01, de 29
de janeiro de 2019 que estabelece normas de atuação para psicólogas e psicólogos no que
tange as relações com travestis e transexuais diz,

“[...] as expressões e identidades de gênero como


possibilidades da existência humana, as quais não
devem ser compreendidas como psicopatologias,
transtornos mentais, desvios e/ou inadequações; [...]
que expressão de gênero refere-se à forma como cada
sujeito apresenta-se a par do que a cultura estabelece
como sendo da ordem do feminino, do masculino ou
de outros gêneros; [...] que identidade de gênero
refere-se à experiência interna e individual do gênero
de cada pessoa, que pode ou não corresponder ao sexo
atribuído no nascimento, incluindo o senso pessoal do
corpo e outras expressões de gênero;”

5. TRANSEXUALIDADE

A transexualidade sempre esteve presente na sociedade desde que o mundo é


mundo mas nunca foi compreendida; já teve um olhar mitológico, já foi mencionada em
rituais de algumas tribos, foi vista como patologia durante muito tempo e só recentemente
quando deixou der ser tratada como doença(2018) que houve um olhar mais social e
psicológico. A classe transexual tanto a masculina quanto a feminina são alvos de muito
preconceito tanto pela sociedade cisheteronormativa em que vivemos onde ser normal
implica em ter e pertencer a um determinado padrão quanto pelo próprio meio
LGBTQIA+ onde o reconhecimento só acontece de forma quase que total depois de muito
sofrimento, depois de muitas provações. É quase que unanime a forma como esses
sujeitos chegam a conclusão que são trans, sempre começa sendo aquele menininho
afeminado que tem todos os comportamentos femininos , logo ele é categorizado como
gay na classe dos afeminados pois dentro do mundo gay existem várias subcategorias que
não se comunicam entre si, ao contrário, existe muita discriminação; um próximo passo
é não se sentindo completo com o estágio que se encontra esse menininho muitas vezes
vai pelo lado das artes ( Dragqueen, Transformistas... ) onde podem extravasar esse lado
feminino que habita sua psique, mas ainda sendo menininho durante o dia , só
demostrando essa feminilidade a noite ou em eventos aleatórios; contudo chega um tempo
que “ estar montado “ passa a ser cada vez mais prazeroso , existe naquele momento o
encontro com o sexo psicológico, digamos assim, então o próximo passo é tornar aquela
atitude, aquela postura permanente , isto é, está 24 horas travestido de mulher , logo o
passo seguinte inicia-se, o ser “ travesti” . Muitos chegam a esse ponto e se percebem
satisfeitos, porém para um grupo não para por aí a insatisfação em alguns casos até
aumenta pois só aí que o sujeito percebe que o que sente vai muito além de uma aparência,
é muito mais profundo, é algo da alma que envolve muitas questões que transpassam
ideologias, costumes, culturas, religião... aí chegamos ao verdadeiro transexual.

Dentro dos nossos estudos bibliográficos encontramos vários conceitos sobre o


que é ser transexual, vários olhares, vários posicionamentos, várias linhas de raciono.
Vislumbramos artigos que trabalhavam o lado jurídico, outro com uma olhar
patologizante; autores como Berenice Bento, Klecius Borges, Judith Butler, André Cõrtes
Vieira Lopes entre o tantos trabalhados consultados o conceito de transexualidade e
deixando seu olhar e engrandecendo o meio pois existe muito, mas muito ainda de todos
os âmbitos que possamos imaginar no que se refere a essa temática que ainda precisa ser
estudado.

(HIGHTON,1993) em seu artigo, “, La salud, la vida y la muerte. Un problema ético-


jurídico: el difuso límite entre el daño y el benefício a la persona” diz,

"Transexualismo é uma questão que está em uma


situação limítrofe, crepúscula, que é compreendido e
confundido, muitas vezes dramaticamente,
normalidade e desvio, aparência orgânica e mental da
inclinação, vida individual e vida social. É um
problema de fronteira entre os conhecidos e
desconhecidos que confrontar ideologias opostas e
diferentes hierarquias de valores. O transexual
representa emblematicamente a patologia do incerto,
é um sujeito em que se apresenta um contraste
eloquente e definido entre o elemento físico, ou seja,
as características sexuais externas, e as de natureza
psíquica. Isto leva a uma busca ansiosa por uma
correspondência entre aparência física e
comportamento, hábitos, gestos, costumes, gestos e
atitudes em geral, que são as do sexo que realmente
sentem e profundamente vivenciam no cotidiano.
Essa tendência, visando a sua própria identidade
sexual, leva a que os transexuais se submetam à
cirurgia dos genitais, embora seja irritante e
insuportável, para "substituí-los" pelos que
correspondam com o seu estado psicológico e suas
formas de vida (google tradutor)

Percebe-se que dentro do conceito não existe uma, digamos, fluidez é uma
conceituação densa que perpassa pelo social e o pessoal, o psicológico do indivíduo; é
importante salientar que essa visão é pontual desse autor e nos serve com o exemplo de
quão complexo é a definição do que é ser o uma pessoa trans.; porém nas demais fontes
consultadas os conceitos sofriam pequenas variações no que tange a palavras porém não
foge de uma ideia central ; um exemplo disso é ( Lopes,2011) define a transexualidade
como, “[...] são pessoas que experimentam desconforto psíquico com seu sexo
antagônico, desejando obsessivamente ter seu corpo readequado ao sexo oposto que
creem possuir. Para eles, a operação de mudança de sexo é uma obstinação, não se
comportando em momento algum de acordo com o seu sexo biológico.” Nota-se em
ambos as definições um olhar predominantemente orgânico, porém com o interesse da
ciência pelo tema e um olhar humanista/ humanizado comprovou que essa identidade de
gênero passa muito além do que que uma readequação da genitália, percebemos isso
claramente no caso dos homens trans que em sua grande maioria apesar de todos os
tratamentos hormonais para adquirirem características masculinas permanecem com seus
órgãos genitais; atualmente já existem técnicas para a readequação masculina que seria a
genistoplatia masculinizante (faloplastia) , um procedimento longo composto por
algumas etapas - mastectomia, histerectomia, ,hormonioterapia e alguns outros que leva
em média de um ano a um ano e meio para completar todo o processo pois necessita de
várias intervenções cirúrgicas , não é como a genistoplatia feminilizante
(neocolpovulvoplastia) que ocorre em apenas um procedimento cirúrgico.

5.1 A TRANSEXUALIDADE E O TEMPO

Existem várias passagens onde podemos perceber a ideia ou a menção de uma


formar arcaica e rudimentar de transexualidade se pudemos chamar dessa forma, visto
que tempos mais tarde com o advento de uma série de fatores que fosse surgir esse termo
de forma cientifica.

(Green, 1998) relata várias passagens sobre dentro de um processo histórico mais
antigo, o que no nosso entendimento serve de embasamento para o cerne de várias
questões que até hoje rondam essa questão, sendo um pouco psicanalíticas parafraseando
uma simbologia de Freud sobre as questões do inconsciente, pré-consciente e o
consciente, diríamos que os problemas enfrentados atualmente seriam a ponta do iceberg
enquanto as histórias seriam as que ficam abaixo da linha d’agua, o inconsciente. Iremos
relatar as que no nosso entendimento se destacaram mais.

Na mitologia grego – romana na história de “Vênus Castina “, segundo (Green,


1998) poder-se –ia perceber nuances da transexualidade quando havia uma simpatia por
parte da Deusa de anseios femininos dentro de corpos masculinos; outra história seria que
um Deus filho de Hermes e Afrodite (Deusa do amor) que se chamava hermafrodita
possuía órgãos genitais masculinos e seios ao mesmo tempo, nos remetendo ao que seriam
características de algumas travestis e transexuais, existem várias representações em
museus pelo mundo retratando essa dualidade do feminino e masculino, esse caso em
específico na nomenclatura atual fazem parte do grupo dos intersexuais.

Outo conto se passa no reino de Frigia onde discípulos do Deus Attis que era filho
e amante de Cybelle ( mãe terra) viam-se obrigados a cometer a castração em decorrência
das emasculação do Attis por conta desse amor proibido , os que faziam essa castração
passavam a usar roupas femininas .Em Roma , apesar da proibição, alguns sacerdotes
pertencentes a esse movimento passavam pelas ruas extirpando seus órgãos com facas
consagradas e lançando nas cassas, aquelas que fossem atingidas deveriam oferecer
roupas femininas ao sacerdote em questão.

Damos um salto até o século XX mais precisamente na década de 1950 onde o


médico americano Dr. Christian Hamburguer, em conjunto com outro médico o Dr.
Harry Benjamin contribuíram com a readequação de um jovem americano de
descendência dinamarquesa chamado , George Jorgensen de apenas 28 anos que era ex-
soldado do exército americano que após passar por tratamentos hormonais e cirúrgicos ,
mesmo que de forma precária , transformou-se em Christine Jorgensen; aquele sujeito
oprimido vivendo dentro de uma prisão sem muros que era seu próprio corpo e oprimido
socialmente tormou-se celebridade no mundo inteiro ganhando inclusive o título de
“Woman of the year” em 1954.

Outra história semelhante porém não muito difundida veio de uma artista da noite
parisiense que nasceu em paris como Jacques Charles Dufresnoy passou a ser conhecida
artisticamente como e Coccinelle que se apresentou por vários anos na famosa boate Le
Carrousel de Paris, sendo umas das primeiras artistas da noite que teve oportunidade de
fazer a cirurgia de resignação sexual em 1958 em Casablanca capital do Marrocos , se
submeteu a uma vaginoplastia por Georges Burou; após o procedimento a mesma relatou,
“ O Dr. Burou corrigiu o erro que a natureza cometera e eu me tornei uma mulher de
verdade, tanto por dentro quanto por fora. Após a operação, o médico apenas disse:
'Bonjour, mademoiselle', e eu sabia que havia um sucesso.” (Coccinelle, 1958)

Desse período até os dias atuais muita coisa evoluiu, algumas técnicas cirúrgicas
foram criadas e alguns países passaram a fazer o procedimento tais como Argentina,
Tailândia e o Brasil por exemplo. No Brasil a resignação pode ser feita pelo SUS
obedecendo um protocolo de no mínimo dois anos em tratamento com uma equipe
multidisciplinar de psiquiatra, psicólogo, nutricionista e endocrinologista.

5.2 TRANSEXUALIDADE E AS RELAÇÕES SOCIAIS

Para adentramos nesse tema precisamos transitar por alguns conceitos que
posteriormente serão facilitadores para que possamos embasar, para que haja um
entendimento maior da relação da transexual com a sociedade.

Vivemos numa sociedade cisheteronormativa, logo todos os valores sociais,


emocionais, sexuais, estéticos entre outros está baseado numa relação “homem” e
““mulher” frisando que tudo isso se aplica ao grupo dos Cisgêneros; sujeitos que fogem
desse padrão principalmente no que tange a sexualidade são considerados como “[...]
produto de um desenvolvimento psicossexual problemático.” (BORGES,2009. P. 17)

Diante disso, em se tratando dos transexuais que sofrem punições e preconceito


por não se enquadrarem nesse padrão de sociedade, se faz necessário no nosso
entendimento, trabalharmos três conceitos, que são: ranqueamento dos corpos,
abjetificação e passabilidade. No que trata de ranqueamento do corpo (CLEMENTE &
GERMANO, 2017) relatam;
“[...] influência capitalista no processo de valoração
dos indivíduos, em que há uma relação entre a
categorização imposta a determinados grupos e o
sistema econômico e social que assemelha, organiza
e ranqueia os modos de vida. Logo, a partir das
relações de poder deste sistema recortam as pessoas
em operações binárias, de modo que segmentam e
categorizam a sociedade, por gênero - homem/
mulher, por raça - branco/ negro, por sexualidade –
heterossexual/ homossexual e assim por diante”.

Este conceito está diretamente ligado a como estes recortes indiquem quem será
mais ou menos favorecido na ordem do capital vigente. Nesse sentido, divide a população
em termos de quem terá uma cidadania mais plena, com todos os direitos básicos
reservados, incluindo educação, saúde, trabalho e quais serão marginalizadas, como de
segunda ou terceira ordem, com algum ou nenhum grau de direito preservado (Clemente
& Germano, 2017). No que tange a questões de diversidade sexual, no nosso caso as
transexuais esse ranqueamento se aprofunda, segundo (PRADO & MACHADO, 2017);

[...] uma lenta inclusão de alguns dos sujeitos


completamente excluídos ao passarem a ser vistos
como potenciais consumidores e trabalhadores com
perfil desejado, como por exemplo as relações
homossexuais e, portanto, tornam-se alvos de
interesse. Assim, a hierarquização também estará
presente entre as diferentes identificações excluídas,
à medida que um homossexual é tratado de maneira
diferente de uma travesti e o mesmo acontece com
uma transexual.”

Podemos perceber claramente tomando como base esse conceito um primeiro que
seria uma inferioridade social que cai como uma forma excludente desses indivíduos.
Segundo a mais recente Pesquisa Nacional de Perfil Socioeconômico e Cultural dos
Graduandos da IFES (2018), uma ampla fonte de dados sobre estudantes de graduação
das universidades federais brasileiras, o percentual de homens e mulheres trans
correspondem a menos de 0,1% do total de 533 mil alunos de instituições federais.

A passabilidade, segundo (DUQUE ,2013) consiste na capacidade de ―passar


por, ou seja, de passar uma imagem como se o indivíduo pertencesse àquele grupo, e não
a outro. Esse fenômeno é muitas vezes utilizado por sujeitos LGBTQIA+ como um
mecanismo de defesa, diminuindo a vulnerabilidade dessas pessoas. Apesar disso, para
as pessoas trans e travestis não ocorre de maneira tão simples, uma vez que as diferenças
são expostas nos próprios corpos (FONCECA, 2018).

Segundo Oliveira (2019), a não-passabilidade dificulta o acesso à educação e a


permanência na escola e universidade. Ainda, é explícito que a passabilidade interfere na
qualidade de vida dos indivíduos além da fase escolar. Uma pessoa que aparenta ser
cisgênera sofre menos violência, tem mais chances de inserção no mercado de trabalho e
mais aceitação social (STRAPAZOLI, 2018)

Dessa maneira, a ruptura com as normas de gênero provoca um estranhamento


nos demais, o que gera práticas discriminatórias como maneira de "manter a ordem", que
podem chegar até mesmo em violência física (Coelho & Sampaio, 2014).

No entanto, em entrevista ao Buzzfeed (2017), a ativista transgênera Daniela


Andrade aponta um erro de leitura comum no conceito de passabilidade. Fica-se
subentendido que todo sujeito transexual tem como objetivo passar na sociedade como
cisgênero, o que não é verdade. A proteção de pessoas trans não está relacionado com
aumento da passabilidade dos corpos, mas sim no combate social do preconceito e
estigma. Nesse âmbito, é percebido que entre o binarismo e a heteronormatividade,
existem diversas formas de existir e resistir (OLIVEIRA & ROMANINI, 2019).

Antes de abordarmos o próximo conceito se faz necessário nos apropriarmos do


significado da palavra ―Inteligível‖ que no DICIO (Dicionário Online de Português)
significa, ―que se entende com facilidade; cujo teor é fácil de compreender. Agora
munidos desse conceito compreende-se a sociedade cisheteronormativa e os estigmas
impostos por esse padrão social que serão guias para o que é ser ―normal.
(MEDIUM,2017 apud BUTLER,2015) diz ―Um “sujeito” só se torna reconhecível como
sujeito se ele estiver em conformidade com a norma que produz os sujeitos.” Então como
consequência lógica, o sujeito que não englobar esses padrões não tem o direito de existir,
não tem vida, são fadados a viver às margens da sociedade quando não são simplesmente
excluídos da mesma.

No que tange a sexualidade humana, no nosso caso a transexualidade, que por si


só é notório o quanto ainda está presa a estigmas arcaicos e em se tratando da questão de
gênero só existe a possibilidade de uma convivência “saudável” se forem enquadrados no
que se refere a desejo, aparência e demais aspetos se estiverem em conformidade com
essa matriz heterossexual. (MEDIUM,2017 apud BUTLER,2015) continua afirmando
que:

“A heterossexualização do desejo requer e institui a


produção de oposições discriminadas e assimétricas
entre “feminino” e “masculino”, em que estes são
compreendidos como atributos expressivos de
“macho” e de “fêmea “. A matriz cultural por meio da
qual a identidade de gênero se torna inteligível exige
que certos tipos de “identidade” não possam “existir”,
isto é, aqueles em que o gênero não decorre do sexo e
aqueles em que as práticas do desejo não “decorrem”
nem do “sexo” nem do “gênero”, portanto qualquer
pessoa que fuja disso, isto é, se a socialização
masculina é falha, esses sujeitos não serão
reconhecido como sujeito, quase todas as vezes serão
os modelos de como não se deve ser.”

Após essas informações entramos propriamente no conceito de Abjetificação que


segundo (MEDIUM ,2017 apud BUTLER,2015) “... são aqueles que, não sendo
reconhecidos como sujeitos, por não terem identidades inteligíveis, serão lançados para o
limite exterior do campo dos sujeitos.”

O transexual como foi mencionado anteriormente carrega sobre si vários estigmas


entre eles que não é sujeito aos olhos da sociedade heteronormativa vivendo a margem
da sociedade, logo uma maneira de enquadra-los em algum conceito é trata-los como
homossexuais, muitas vezes as mesmas são tratadas como “Bichas operadas “, “veado
castrado”, “o veado Josy” entre outros adjetivos pejorativos. (BORGES,2009, p.28) em
sua obra “Terapia Afirmativa “levanta uma possível razão para tais atos de desrespeito
um deles é a homofobia social onde ele diz,

“A homofobia social e cultural tem como base a


cresça profundamente arraigada de que a
homossexualidade (gays, lésbicas, travestis e
transexuais), principalmente a masculina, ameaça a
estrutura social patriarcal, na qual os valores
masculinos predominam [...] portanto, considerado
inferior na escala social.”

Um outro aspecto abordado por (BORGES, 2009) seria o preconceito no âmbito


institucional, onde se trabalha em cima do pressuposto que todos são heterossexuais e em
decorrência dessa estrutura social existe um reforço ainda maior dos sentimentos de
inadequação e exclusão social.

(DAVIS apud BORGES, 2009.p.29) enumera sete mecanismos, que segundo ele,
perpetua a opressão aos homessexuais , travestis e transexuais :

1 . Conspiração do silêncio. Tentativa de manter o


grupo invisível, ignorando as demandas sociais da
população;

2. Negação a cultura. Ações deliberantes que


excluem o grupo de referências positivas nos campos
cultural, artístico, político entre outros;

3. Negação da força popular. Não leva em


consideração as estatísticas e importância social do
grupo;

4. Medo de visibilidade. Quando heterossexuais, e


pasmem, alguns homossexuais em assuntos que
envolvem pessoas do mesmo sexo;

5. Demarcação de espaços públicos específicos. Os


chamados “guetos” onde existe uma maior liberdade
de atitudes e comportamentos
6. Negação da autodenominação. Insistência em
termos pejorativos como por exemplo bicha, boiola,
veado operado, sapatão...

7. Simbolismo negativo. Projeções de


comportamento, atitude e crença sempre com um
olhar negativo, com estereótipos negativos, isto é,
promíscuos, molestadores sexuais entre outros.

Apesar de acreditarmos que os transexuais passam por quase todas as questões um


tanto quanto semelhantes aos homossexuais; claro, com algumas especificidades penso
ter a necessidade de conceituar o termo. Segundo (NETTO,2019) transfobia seria,

“[...] uma forma de preconceito contra pessoas


transexuais que pode se traduzir em atos de violência
física, moral ou psicológica. A transfobia é uma
forma de aversão às pessoas trans e se manifesta em
diferentes ações de preconceitos, sejam explícitos ou
velados. Esse preconceito deriva da não-aceitação da
manifestação individual dessas pessoas. Atualmente,
o brasil é um país extremamente violento contra
pessoas com sexualidades distintas da
heterossexualidade, porém é um país extremamente
violento contra pessoas transexuais especificamente”.

Complementando o conceito (RIBEIRO; SILVEIRA, 2020) relatam que, “A


transfobia vem expor a segregação em seus aspectos mais violentos, dessa relação do
sujeito com a lei, os entrelaçamentos entre a ordem do semblante e o impossível de
representar. Isto é, a impossibilidade de inscrever a proporção, a razão, a relação sexual,
que, assim como “A Mulher”.”

Atualmente ainda vermos casos extremos de transfobia velada em todos os


âmbitos da sociedade, alguns expoentes em suas áreas conseguem se sobressair, porém
ainda é uma minoria citamos como exemplo Nany People nas artes cênicas/ teatro;
Leonora Aquilla no jornalismo, Lea T na moda; Bixarte Trans paraibana, cantora
engajada nos movimentos contra a tranfobia e a questão da passabilidade; Thammy
Gretchen, ator e personalidade da mídia entre tantos outros. Inclusive o Thammy (homem
Trans) está envolto numa grande discussão, pois uma grande empresa de cosméticos o
contratou para fazer a campanha dos dias dos pais com o título “Um pai Presente” um
claro exemplo de respeito a diversidade; a empresa está sendo alvo de tentativas de
boicote e o Thammy está sendo alvo de sérias ofensas transfóbicas. Esses expoentes tem
um papel importante na desconstrução ou pelo menos um primeiro passo para
desconstruir tantas teorias ultrapassadas; porém são apenas minorias/ exceção, no dia a
dia o sofrimento daquela sem condições de estudo, pobre, negra tem seus direitos tolhidos
e não tem como em algum momento esses sujeitos absorverem tudo isso em suas psiques.

Mediante toda essa carga oriunda de várias frentes e com o poder que o social
exerce sobre os sujeitos não é de se admirar que cresçam nesse mesmo grupo de pessoas
sentimentos internalizados causando vários efeitos nocivos. (BORGES, 2009, p.32)
enumerou algumas manifestações que variam muito dependendo do grau de
autocinhecimento e autoaceitação do sujeito, são eles:

 Confusão emocional;
 Baixa autoestima;
 Atitude hipercrítica em relação a si mesmo e aos outros;
 Isolamento social;
 Supressão generalizada da expressão de sentimentos;
 Depressão crônica;
 Autoabuso pelo uso de álcool, drogas ilícitas, automutilação, exposição a situação
de riscos, tentativas de suicídio;
 Ansiedade crônica;
 Dificuldade generalizada de estabelecer intimidade;
 “Atuação” por meio de adoção de estereótipos;
 “Recusa’ em assumir posições de liderança;
 Atitudes supercompensatória (querer ser melhor do que todos) nas relações
familiares, profissionais e sociais;
 Baixa imunidade, tendo como consequência problemas de saúde;
 Depreciação de outras pessoas do grupo de forma verbal e em alguns casos
agressões físicas;

Após levantado todos esses aspectos no que tange a sexualidade,


homossexualidade e mais especificamente transexualidade, se faz necessário um
conhecimento, um embasamento para criamos uma ponte entre essas questões
acima mencionadas e a teoria centrada na pessoa para que possamos prosseguir
com o nosso estudo, chegando as discussões, resultados e considerações finais.

6. A TEORIA ROGERIANA ABORDAGEM CENTRADA NA PESSOA, UMA


BREVE EXPLANAÇÃO

A Abordagem Centrada na Pessoa é um sistema de psicoterapia, desenvolvida por


Rogers (1942), oficialmente inaugurada no dia 11 de dezembro de 1940, através do
discurso feito na universidade de Minessota, com o título:” Os mais recentes conceitos
em psicoterapia”. Carl Ransom Rogers (1902-1987) foi um psicólogo norte americano,
que representou a escola de psicologia humanista, sendo esta considerada a terceira força
da psicologia. Desenvolveu sua abordagem através da experiência prática atendendo
crianças e jovens carentes. O início de seu trabalho em aconselhamento sob os postulados
psicanalíticos, notou de forma empírica o que se mostrava eficiente no tratamento com
tais pessoas, abandonando assim sua postura tradicional (Psicanalítica), e criando um jeito
próprio de abordar o outro na sua subjetividade. Através do método de orientação não-
diretiva (SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).

De acordo com Vitola e Cemim (2005), a Abordagem Centrada na Pessoa tem sua
fundamentação em três pressupostos filosóficos, que são, O Humanismo, Existencialismo
e Fenomenologia. Moreira (2002) segue raciocínio semelhante ao expressar que, a ACP
(Abordagem Centrada na Pessoa) é uma abordagem humanista, uma vez que esta faz do
ser humano o objeto de sua investigação e prática, enfatizando o valor da pessoa humana,
independente da sua raça, posição social ou credo religioso. E pressupondo que, só através
do amor a pessoa poderá realizar todo o seu potencial, no exercício de sua liberdade.
Ainda de acordo com a autora o Existencialismo é uma corrente filosófica que se baseia
no questionamento sobre a existência humana. Neste enfoque o homem é concebido como
um ser consciente, livre e responsável pela construção de sua história, sendo o arquiteto
de sua própria realização. Já a fenomenologia foi estruturada por Edmund Husserl, sendo
compreendida como o método das Abordagens Existencialistas. Pois se busca conhecer
o homem a partir de seus referencias internos, no aqui agora de sua experiência imediata,
subjetivada e de forma imparcial (VITOLA& CEMIM, 2005).
Rogers (1961/1999) contrapondo o determinismo psíquico da Psicanálise
freudiana e o mecanicismo dos Behavioristas, afirmou que a essência da personalidade
humana é positiva, com tendência a autorrealização. A esta propensão natural ao
desenvolvimento pleno do organismo, ele chamou de “Tendência Atualizante”. Embora
o impulso para a realização seja inato, este poderá ser facilitado ou bloqueado pelos
estímulos externos do ambiente, como a relação familiar e a educação. Assim,
desenvolveu como posturas terapêuticas três atitudes facilitadoras da tendência
atualizadora do self, sendo elas: Compreensão empática, aceitação incondicional e
congruência (ROGERS, 1980/1987; SCHULTZ; SCHULTZ, 2009). Compreensão
empática é um dos princípios base da abordagem, pois para se compreender outra pessoa,
é necessário cessar os próprios valores, e entrar no campo experiencial do outro, sob a
ótica de como este vê, e interpreta tais acontecimentos vivenciados (ROGERS, 1961
/1999). Observa-se nesta postura a utilização prática do método fenomenológico: Olhar
o fenômeno em si mesmo, sem a intenção de interpretar e explicar tal fato (SCHULTZ;
SCHULTZ, 2001).
Aceitação incondicional é uma atitude humanista de acolher, respeitar e se dirigir
ao outro, sem julgamentos e condições pré- estabelecidas. A Congruência significa ser
autêntico, honesto e verdadeiro. Primeiro consigo mesmo, e depois com o outro na relação
terapêutica, informando os seus sentimentos sempre que estes se fizerem necessários
(VITOLA; CEMIM, 2005). De acordo com esta teoria de personalidade, em qualquer
idade é possível mudar condutas e atitudes, ressaltando neste enfoque, que os conceitos e
sentimentos atuais, possuem maior importância para o desenvolvimento pessoal, do que
os fatos vivenciados no passado, negando também as forças pulsantes do inconsciente
freudiano (ROGERS, 1961/1999). Contudo, esta abordagem não rejeitou a ideia de que,
uma boa relação primária com os pais, em especial com a mãe ou alguém que substitua
neste papel, é de extrema importância para o desenvolvimento saudável da personalidade.
Pois se a mãe ou a cuidadora, oferecer consideração positiva, independente do
comportamento expresso da criança, esta irá internalizar amor e valor incondicional, que
será a base para uma personalidade saudável. Entretanto, se o contrário acontecer, esta
criança irá aprender o amor através de condições impostas e levará esta aprendizagem
para outros relacionamentos, inclusive afetando a construção do seu autoconceito
(SCHULTZ; SCHULTZ, 2009).

Nesta abordagem (ACP) o papel do psicoterapeuta, é atuar como facilitador do


afloramento da tendência atualizante do seu cliente. Para que este saia do estado de
incongruência entre o seu autoconceito e sua experiência, possibilitando o desenrolar do
seu fluxo espontâneo construtivo (MOREIRA, 2010). Com base nestes conceitos acima
descritos, a clínica rogeriana traz a proposta da orientação não-diretiva, acolhimento
incondicional, através de uma atmosfera humanizada onde a pessoa possa ser
compreendida, aceita dentro da sua singularidade, respeitando o seu mundo enquanto
fenômeno, em uma relação real e autentica com a pessoa do terapeuta no aqui agora de
sua vivência.

A tendência atualizante é um conceito simples e pacifico como o próprio Rogers


porém com implicações profundas e importância sem tamanho; há quem diga que o
conceito sobressaiu a obra do próprio autor porque sem os postulados de um instinto ao
desenvolvimento não existe embasamento, não existe uma fundamentação da Abordagem
centrada na pessoa. Rogers em sua obra “Psicoterapia e Relações Humanas (ROGERS &
KINGET, 1965/1979) logo defende que "todo organismo é movido por uma tendência
inerente para desenvolver todas as suas potencialidades e para desenvolvê-las de maneira
a favorecer sua conservação e seu enriquecimento" (p. 159); podemos dizer que seria uma
justificativa impulsionadora para o pensamento do que é ser “homem” na teoria de
Rogers.

(ROGERS & KINGET, 1965/1979) observaram que,

(...) a tendência à atualização é a mais fundamental do


organismo em sua totalidade. Preside o exercício de
todas as funções, tanto físicas quanto experienciais. E
visa constantemente desenvolver as potencialidades
do indivíduo para assegurar sua conservação e seu
enriquecimento, levando-se em conta as
possibilidades e limites do meio (p. 41),
Portanto, compreendemos que a tendência atualizante é uma característica do
indivíduo, sendo uma condição para que sejam expandidas suas potencialidades, contudo,
condicionadas às limitações do meio. (ROGERS & KINGET, 1965/1979) defenderam
que existe um acordo entre as necessidades do organismo e as necessidades do eu para
que a tendência atualizante se apresente plenamente.

Como nosso trabalho lida com o indivíduo transexual e também com o grupo, nos
valemos dos conhecimentos de Rogers para grupos em sua obra Terapia Centrada no
Cliente, ROGERS (1951/1992) onde o mesmo diz,

“Um grupo tem, dentro de si mesmo, as capacidades


de ajustamento necessárias para conquistar um maior
grau de harmonia interna e produtividade para
alcançar um ajustamento mais efetivo de seu
ambiente" (p. 375).

Podemos, assim, entender que a tendência atualizante se caracteriza como


essencial para uma atuação clínica baseada na Abordagem Centrada na Pessoa, de forma
individual ou de grupo.

7. O QUE É TERAPIA AFIRMATIVA?

O primeiro profissional de Psicologia que usou propriamente o termo “Terapia


Afirmativa “(gay affirmative Therapy ) chamava-se Alan Malyon em um artigo publicado
em 1982. (BORGES, 2009 apud MALYON, 1982.p.21) emprega o seguinte conceito,

“A psicoterapia afirmativa gay não é um sistema


independente de psicoterapia; Ela representa um
conjunto especial de conhecimentos psicológicos que
questiona a visão tradicional de que o desejo
homossexual e a orientações homossexuais fixas são
patológicas. A abordagem considera a homofobia, e
não a homossexualidade como em si, como a variável
patológica mais importante para o desenvolvimento
de certas condições sintomáticas encontradas em
homossexuais”

Aqui no Brasil o expoente no assunto é Psicólogo Klecius Borges formado em


1976 pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); a princípio não seguiu carreira
clinica porém sempre esteve engajado em questões ligadas a psicoterapia participando de
vários grupos de formação no Brasil e nos Estados Unidos. O marco que segundo ele
mudou toda a sua visão pessoal e profissional aconteceu em 1999 quando participou de
um seminário na Esalen Institute, uma universidade localizada no estado da California,
mais especificamente em São Francisco, local onde a comunidade LGBTQIA+ sempre
foi muito engajada nos movimentos de inclusão. O que mais o chamou atenção além de
ser um evento exclusivamente para o público gay era liderado por um psicoterapeuta
abertamente gay; naquela situação de convívio e produção de conteúdo psicológico com
vários outros gays de faixas etárias diferentes e de diversos locais dos Estados Unidos
percebeu que as diferenças pessoais, sociais e culturais eram muito semelhantes.

Daquele momento em diante procurou se aprofundar na chamada “Psicologia


Homossexual”; iniciou atendimentos individuais, de casais, produziu artigos e participou
de várias mesas redondas sobre temas ligados a homossexualidade em suas múltiplas
manifestações, expandiu seu conhecimento e atendimentos aos familiares (pais, mães,
irmãos...) de homossexuais.

A terapia afirmativa trabalha a ideia de uma sexualidade positiva, que as


dificuldades enfrentadas pelos grupo LGBTQIA+, digamos assim, sejam oriundas de uma
sociedade cisheteronormativa, uma sociedade cisheterocentrista – que vê a
homossexualidade como algo inferior.

O psicólogo inglês Dominic Davies em sua obra “Pink Theraphy” defende como
condições primordiais para ser um terapeuta afirmativo dois postulados; segundo
(BORGES,2009 apud DAVIES, 2000),

“A neutralidade do terapeuta prescrita por boa parte


das escolas, não se aplica não se aplica aos Gays e
lésbicas devido à história de opressão e exposição a
mensagens altamente negativas sobre a
homossexualidade que foram submetidos ao longo da
vida.”

Em outras palavras Davies trabalha o posicionamento de que o terapeuta


afirmativo quando necessário pode expor sua sexualidade, sendo gay, lésbica ou uma
pessoa que veja a homossexualidade e as demais orientações sexuais como normais, com
um olhar positivo; essa atitude seria um facilitador dentro do processo terapêutico. Aqui
no Brasil, embora não seja muito utilizada e até o presente momento não ser reconhecida,
alguns casos isolados, os terapeutas afirmativos também usam desse postulado e tem feito
a diferença no que tange às relações com os pacientes.

O segundo postulado na visão de (BORGES, 2009 apud DAVIES 2000) menciona


que, “O terapeuta afirmativo é aquele que reconhece a identidade LGBTQIA+, digamos
assim, como forma de experiência e expressão humana, tão positiva quanto a identidade
heterossexual.”

Klecius Borges introduz o conceito de homoignorante/homoignorância ao invés


de homofobia pois o mesmo diz que o preconceito com a classe é mais questão de
desconhecimento do que se trata se um gay, uma lésbica, no nosso caso uma transexual
do que propriamente medo como indicado através do sufixo “fobia”.

Tomando como base esse conceito o autor trabalha essas questões de orientação e
identidade sexual como algo oriundo de questões sociais, familiares e alguns momentos
religiosa; ele nomeia de Homofobia social e cultural ao que abrange ao coletivo e a
homofobia internalizada, que acontece silenciosamente de forma psicológica sendo a
mais nociva e que leva, quando acontece, mais pessoas LGBTQIA+ a desenvolver uma
série de problemas psicológicos muitas vezes sintomatizados no corpo, como algumas
atitudes de isolamento, exclusão, depressão, ansiedade, ideação suicida entre tantas
outras.

Segundo (BARCELLOS, 2004 apud BORGES, 2009, P. 76) a


homofobia/transfobia internalizada é caracterizada da seguinte forma:

“[...] algo devastador que compromete


profundamente processos de formação de identidade,
encarcerando os indivíduos em personas mentirosas,
ainda que tiranas, e atinge, desmontando a capacidade
de amar e ser amado, às vezes em caráter irrevogável.
[...] essa é uma questão de maior importância na
clínica da homossexualidade/transexualidade, pois,
além do que se já mencionou, está também na raiz de
uma cisão entre a sexualidade e sentimento que se
traduz na dificuldade trágica que muitos
homossexuais/transexuais enfrentam para viver sexo
e amor num mesmo relacionamento.”

Em alguns casos onde não existe um nível de autoconhecimento, aceitação e


coincidência por parte do sujeito encontra-se em estágios iniciais, percebe-se essas
questões de sentimentos internalizados na clínica através de atitudes e
comportamentos apresentados pelos sujeitos, (KORT, 2008 apud BORGES, 2009. P.
34) aponta algumas dessas posturas/ atitudes, são elas:

 Valorizar uma atitude “de macho” e desqualificar os “afeminados “, para os gays


e desprezar as “caminhoneiras”, para as lésbicas;
 Manifestar grande desconforto com “bichas” ou “caminhoneiras”;
 Criticar os “guetos” ou comunidades;
 Ter medo de ser “descoberto”, mesmo quando não há riscos envolvidos;
 Sentir atração romântica recorrente por heterossexuais;
 Se passar por heterossexual mesmo em situações nas quais não haveria perigo em
ser identificado como gay ou lésbica;
 Fazer comentários do tipo “Não tenho de dizer aos outros o que faço na cama”;
 Falar sobre como um lugar ou uma pessoa é “muito gay “.

O terapeuta que escolhe atender usando os postulados da terapia afirmativa


se faz necessário uma preparação que leve em conta não apenas os aspectos da
psicodinâmica da homossexualidade, mas também um conhecimento profundo
sobre os desafios que os gays, lésbicas, travestis e transexuais enfrentam ao
viverem numa sociedade cisheteronormativa. (BORGES, 2009, P. 46) para que
isso aconteça é importante que o profissional esteja conectado sobre a cultura
vigente nesses grupos, direitos civis, conceitos anteriormente trabalhados como
ranqueamento dos corpos, passabilidade, abjetificação e principalmente suas
próprias questões que por ventura possam influenciar na relação com o paciente,
por esses motivos a abordagem defende algo que não se usa em nenhuma outra
ênfase que é a exposição por parte do terapeuta da sua orientação sexual, que
segundo (KORT 2008 apud BORGES, 2009, P.48) seria um erro não expor
quando questionado pois a franqueza no que tange a sexualidade por parte do
terapeuta seria um fator de fortalecimento do processo, favorecendo o surgimento
do que se chama de “ condição essencial de respeito”.
A Terapia Afirmativa procura cobrir dentro da complexidade inerente às
práticas da clínica psicológica sempre tendo em vista o paciente seja ele gay,
lésbica, travesti ou transexual como indivíduos, “não podendo ser reduzido apenas
à sua orientação afetivo-sexual.” (BORGES, 2009, P. 53); logo tem como foco
trabalhar provocações e adversidades enfrentados por gays, lésbicas, travestis e
transexuais que são vigorosamente definidos pelo contexto social
cisheterocentrado, homofônico/transfóbico.
Após levantado todos esses aspectos no que tange a sexualidade,
homossexualidade e mais especificamente transexualidade, se faz necessário um
conhecimento, um embasamento para criamos uma ponte entre essas questões
acima mencionadas e a teoria centrada na pessoa para que possamos prosseguir
com o nosso estudo, chegando as discussões, resultados e considerações finais.

8. RESULTADOS E DISCUSSÃO

O presente trabalho tem como linha foco principal a questão de identidade de


gênero, mais especificamente a de transexuais e seus dilemas que passam por questões
variadas dentro da sociedade. As bases de pesquisa utilizadas foram o SCIELO e
PECSIC, ao todo foram localizados 76 artigos quando colocamos na busca apenas o termo
“Transexualidade” desses, 49 artigos no SCIELO e 27 artigos no PECSIC, porém após
leitura prévia dos resumos percebemos que dentro da nossa temática apenas 16 desses
artigos foram selecionados como amostragem para o nosso estudo. Quando foram
adicionados outros indicadores junto a Transexualidade como “Tendência Atualizante”,
“Psicologia Humanista “, “Abordagem Centrada na Pessoa” e “Terapia Afirmativa” não
observou-se nenhum artigo nessas bases de pesquisa., porém tivemos acesso a revistas
eletrônicas conceituadas que contribuíram para os conceitos secundários de nosso
trabalho, vejamos alguns exemplos, são elas: Revista Latinoamericana de Psicopatologia
Fundamental, Revista da Abordagem Gestáltica, HERE – História da Enfermagem,
Interface - Comunicação, Saúde, Educação, Ciência & Saúde Coletiva, Physis: Revista
de Saúde Coletiva, Cadernos Pagu, Revista Estudos Feministas, Psicologia: Ciência e
Profissão e Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica ; além claro de autores como Rogers
, Klecius Borges.

O que encontramos como cenário na nossa pesquisa foi um olhar patologizante da


transexualidade, isto é, grandes discursões sobre as questões de gênero mas no que tange
ao existir ou não dessa identidade de gênero sempre tendo como base uma sociedade
cisheteronormativa levando em conta sempre o dicotômico e o binário para tratar questões
de subjetividade.

No que tange a abordagem psicológica os resultados mostraram que a


transexualidade é observada pelos preceitos da psicanálise sempre buscando o lado
médico-psi , de ser ou não ser trans, se tem prazer ou não, de fazer ou não a readequação,
dos direitos enquanto cidadãos parecendo verdadeiros manuais de instruções, passando
longe de um olhar humano, humanizado, humanista voltado para a autorealização,
desenvolvimento pessoal e autonomia. Procuramos justamente preencher a lacuna de um
olhar mais positivo, natural da sexualidade humana, enxergar esses sujeitos apenas como
pessoas que buscam e tem o direito evoluir como qualquer um outro. Nossa intenção foi
trabalhar em cima de uma terapia centrada na pessoa com o auxílio da terapia afirmativa
para processos terapêuticos eficazes.

Apesar das questões sexuais serem percebidas e por muito tempo pelo lado
biologizante encontramos na literatura alguns nuances de que, mesmo, que
subliminarmente, percebia que existia algo além do que apenas questões de genitália ou
possíveis disfunções hormonais no que dizia respeito a esse universo. A psicanálise
manifestou a ideia que o sexo da pessoa tem relação indireta com seus genitais, o ser
“homem” ou “mulher “diz respeito a determinação psíquica de cada um; “... para Jung,
cada indivíduo traz dentro de si a semente da totalidade da personalidade que se
desenvolverá ao longo da vida.” (BORGES, 2009, p.75) Porém sempre atribuindo a
fatores externos algum desvio, atribuindo a infância e vinculado a ambientes
desfavoráveis para um desenvolvimento normal.
Talvez pelo engajamento das militâncias LGBTQIA+ percebeu-se uma maior
visibilidade pelo meio acadêmico que passou a se interessar pelas questões políticas,
corporais, sociais, sexuais e psicológicas em várias áreas de conhecimento. Outro aspecto
observável ocorreu dentro dos processos terapêuticos, (SILVA,2018) diz que se trata de
uma busca solitária o que tange a transição de gênero [...] percebemos a necessidade de
expor seus anseios, ansiedades, medos e expectativas com relação ao processo
transexualizador.” Logo notamos a partir dessa fala que deveríamos traspor as questões
conceituais e nos debruçamos no fenômeno, na vivencia, no ser. Rogers em sua larga
experiência de consultório tomou esses postulados como marco central de sua abordagem,
“Não podemos mudar, não nos podemos afastar do que somos enquanto não aceitarmos
profundamente o que somos.” (ROGERS) logo concluímos que em se tratando de
situações, sensações mais intimas do sujeito temos como dever criar um ambiente em que
ele se sinta-se a vontade, estimulado para alcançar de forma eficaz o cerne de si mesmo.
Rogers trabalha isso na sua tendência atualizante quando diz,

[...] existe em todo organismo, em qualquer nível, um


fluxo subjacente de movimento para uma realização
construtiva de suas possibilidades intrínsecas. Há no
homem uma tendência natural para o
desenvolvimento completo”. (ROGERS, 1977/1986,
p.17)

Porém ele continua seu discurso defendendo que para que isso venha a acontecer
é importante existir uma atmosfera que favoreça ambientação adequada para que essa
tendência ao crescimento possa surgir de forma consolidada no sujeito; nesse ponto penso
que a Terapia Afirmativa seja de suma importância pois se trata de uma abordagem que
está ligada diretamente com todas as questões sexuais, além de ter como filosofia
principal a sexualidade de forma positiva, isto é, sexualidade como algo natural.
(BORGES, 2009) reforça,

“O objetivo da terapia afirmativa é basicamente


ajudar o paciente a tornar-se mais autêntico, por meio
da integração dos sentimentos, pensamentos e desejos
homossexuais às diferentes áreas de sua vida,
desenvolvendo assim uma identidade sexual
positiva.”
Constatou-se que a Abordagem Centrada na Pessoa munida das três atitudes
facilitadoras do self (compreensão empática, congruência e aceitação incondicional),
juntamente com uma atmosfera propícia para a eclosão/desenvolvimento da tendência
atualizante simultaneamente com olhar de uma sexualidade natural proposta por Klecius
Borges (2009 ) reafirmando que a orientação sexual e a transexualidade, no nosso estudo,
são manifestações naturais da sexualidade humana, que consiste apenas de um jeito de
ser, que o sujeito é um ser consciente, livre e responsável pela construção de sua própria
história, logo um trabalho em conjunto da Abordagem Centrada na Pessoa e as técnicas
da Terapia Afirmativa proporcionam uma redução do sofrimento psíquico não só das
transexuais mas como de toda a classe LGBTQIA+ .

Com a exceção da literatura clássica tanto psicológica da abordagem centrada


quanto as que lidam com as questões de sexualidade, entenda-se fatores de orientação
sexual e identidade de gênero como por exemplo a Terapia afirmativa, tivemos limitações
no estudo pois como mencionado anteriormente existia uma olhar basicamente
psicanalítico (Freudiano, Lacaniano, Jungiano), logo deixamos como sugestão para
trabalhos futuros um olhar mais humanista para as questões de sexualidade e
enxergarmos a terapia afirmativa como algo que soma dentro deste processo não apenas
na abordagem centrada na pessoa mas em todas as ênfases psicológicas que por ventura
possam se deparar em seus consultórios individualmente ou em grupos. Vamos nos
desprender dos conceitos e estigmas, nos prendendo apenas na essência do ser, no
fenômeno. É importante que o sofrimento psíquico seja reconhecido socialmente, a
voz que sofre precisa ser compreendida [...] daí a pessoa pode existir para além do seu
sofrimento.” (CANNONE,2020).

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Compreendemos nesse trabalho que a sexualidade ainda é um campo vasto e


pouco explorado com muitos estigmas, e esses se fazem como limitadores sociais desse
grupo de pessoas tão férteis em tantos aspectos; entendemos que a terapia centrada na
pessoa é um procedimento consolidado, contudo não possui aporte teórico para lidar com
o universo LGBTQIA+. Já a terapia afirmativa desde os primórdios já criou um
embasamento teórico e posturas clínicas para atender esse grupo.

Nós enquanto psicólogos com a ênfase humanista, dentro da Abordagem Centrada


na pessoa , devemos usar os postulados de Rogers - aceitação incondicional,
compreensão empática e congruência – na construção de um ambiente satisfatório para
que possibilite uma tendência atualizante eficaz; a Terapia afirmativa nos auxiliará
justamente na construção desse ambiente favorável com sua filosofia de uma sexualidade
positiva possibilitando uma maior autenticidade do sujeito, uma integração dos
sentimentos e sensações no que tange a sexualidade e identidade de gênero nas várias
facetas do viver, sempre trabalhando a autorealização e autonomia

A construção de uma clínica da diversidade de gênero e sexualidade, no enfoque


da abordagem centrada na pessoa com a tendência atualizante, incorporado com os
pressupostos da Terapia Afirmativa é uma possibilidade que este modelo integrador nos
apresenta. A postura afirmativa que está embasada nas mais novas pesquisas no campo
do gênero e sexualidade, juntamente com os preceitos teóricos e técnicos de uma
abordagem consolidada a muitos anos (ACP), nos possibilitará uma iniciativa
desafiadora. Finalizo esse texto na expectativa de que outros trabalhos surjam para
comprovarem a eficiência dessa junção de teorias nos processos de minimização de
sofrimento, quando necessário, nos processos terapêuticos relacionando as transexuais e
a todo universo LGBTQIA+ e suas especificidades.
REFERÊNCIAS

1. BORGES, Klecius, Terapia Afirmativa: Uma introdução à psicologia e à


psicoterapia dirigida a gays, lésbicas e bissexuais. São Paulo: edições GLS,
2009.p.21,43.

2. ROGERS, Carl R. Psicoterapia e Consulta. Psicológica. São Paulo: Martins


Fontes, 942/1973.
3. ROGERS, Carl R. Tornar-se Pessoa. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes,
1961/1999.

4. ROGERS, Carl R; ROSEMBERG, Rachel. A Pessoa como Centro. 3. Ed. São


Paulo: EPU Editora, 1977.

5. ROGERS, Carl R. Um Jeito de Ser. São Paulo: EPU Editora, 1980/1987.

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