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AS

IRMÃS
FOX
Texto:
Ivone Martins
CENAS:

Prólogo - As Irmãs
CENA I - O Mascate
CENA II – Lucrécia retorna
CENA III - Tricotando
CENA IV – Tiptologia Espiritual
CENA V - Escavação Coletiva
CENA VI – O Convite
CENA VII – Corintian Hall
CENA VIII – A Revista
CENA IX - Primeira Apresentação Pública
CENA X – In Vino Veritas
CENA XI - Comunicação Com os Espíritos
CENA XII – Nós que nos amávamos tanto – Crescemos.
CENA XIII – Materialização de Estelle Livermoure
CENA XIV – O Casamento
CENA XV – Dialogo Conjugal
CENA XVI – Tutela
CENA XVII – As Trevas Desceram
CENA XVIII - Retratação de Margareth
CENA XIX - Repórter II
CENA XX - O último Fox
EPILOGO - Síntese Final

PRÓLOGO
AS IRMÃS

Entram correndo Margareth e Kate crianças.


MARGARETH- (Canta) Foi na loja do Mestre André
Que eu comprei um pianinho
Plim, plim, plim, um pianinho
Tiro, liro, li, um pifarito
KATE –(Canta) Foi na loja do Mestre André
Que eu comprei um tamborzinho
Tum, tum, tum, um tamborzinho
JUNTAS -
Plim, plim, plim, um pianinho
Tiro, liro, li, um pifarito
Entra a música da primeira cena. Elas param e se abraçam
assustadas. Entra Lucrécia e se posiciona de costas. Entra
na outra extremidade o mascate com a mala escondendo o
rosto. Quando ele colocar a mala no chão as meninas
correm e viram Lucrécia de frente para ele e saem rindo.

CENA I
O Mascate

MASCATE – (Galanteador) Boa tarde. Oh, vejo que é meu


dia da sorte. Antes de Rossman bater à porta, ela se abre e
surge rapariga bonita para receber Rossman. Qual é o seu
nome senhorita?
LUCRÉCIA – (Envergonhada) Pullver. Lucrécia PUllver.
Dama de companhia da senhora Bells.
MASCATE – (Alegre) Oh, uma dama de companhia com
porte de princesa! (Observa-a fazendo corar) Por gentileza,
anuncie a dona da casa que Charles Rossman, seu criado
voltou de viagem e trás coisas bonitas, de bom gosto e
preços muito bons...Veja! Tecidos finos, macios, suaves,
perfumes, joias e até chocolates. (Lucrécia pega o
chocolate e volta correndo para o seu lugar) Se a senhora
Bells comprar “coisinhas de Rossman”. Te darei uns
agradinhos....”coisinhas” para deixar moça bonita, ainda
mais bonita. Além do mais Rossman estar muito cansado
do viagem e vai pedir pernoite nesta casa de pessoas
bondosas. Vai mocinha. Fale com ela.
LUCRÉCIA – Sim, estou indo. (sai)
MASCATE – (Canta e remexe na mala. Lucrécia volta) E
então? A senhora Bells irá receber esse pobre e cansado
viajante?
LUCRECIA – O que é isso?
MASCATE – Isso o que menina Lucrécia?
LUCRÉCIA – Isso que esconde em sua mão
MASCATE –(Rindo) Oh, menina Lucrécia é muito esperta.
Isso são apenas as economias que Rossman carrega
consigo.
LUCRECIA – Parece bastante
MASCATE – Nada que possa fazer Rossman rico.
LUCRÉCIA – Pra mim estaria muito bom.
MASCATE – Ah, a menina Lucrécia gosta de dinheirinho.
LUCRÉCIA – Todo mundo gosta.
MASCATE- É verdade. É verdade.
LUCRECIA – Bom, a senhora Bells pede a gentileza que o
senhor entre pelos fundos e aguarde, pois o senhor Bells
chegará ao anoitecer. Assim poderá descansar e comer
alguma coisa na cozinha.
MASCATE – Oh, que deus esteja nesta casa que recebe
Rossman tão bem. E a daminha com porte de princesa não
acompanha Rossman até a cozinha? Não vai querer ver
“coisinhas” lindas que Charles trouxe?
LUCRÉCIA – A senhora Bells dispensou-me. Não vejo
meus pais há meses, estou indo para casa hoje.
MASCATE – Oh, pobrezinha. (risinho meloso) Oh, vou te
contar uma segredinha. Se Rossman fizer vendas
boas...Se senhora Bells compra tecidos finos que só
Rossman tem por essas bandas. Prometo deixar um
lembrancinha para o menina Lucrécia. Está bem?
LUCRÉCIA – (Rindo) Verdade?
MASCATE – Rossman não mente jamais.
LUCRÉCIA – Nunca?
MASCATE – (Rindo) Nunca!
LUCRÉCIA – Jamais conheci alguém que nunca mente.
MASCATE – Rossman é um obcecado pela verdade. Diria
mesmo que obsessivo
LUCRÉCIA - O que é obsessivo senhor Rossman?
MASCATE – Alguém que não desisti nunca. Até provar
seus pontos de vista.
LUCRÉCIA -. A senhora Bells vai comprar e Lucrécia vai
ganhar o tal presentinho que o senhor Rossman
prometeu... Até...adeusinho.

CENA II
Lucrécia retorna

LUCRÉCIA – Bom dia, senhora Bells.


SENHORA BELLS – Bom dia, minha querida.
LUCRECIA – Já estava sentindo saudades daqui e da
senhora também.
SENHORA BELLS – Eu também estava, confesso.
LUCRECIA – Nunca tive uma folga tão longa antes.
SENHORA BELLS – Oh, minha querida. Não foi tanto
assim.
LUCRECIA – Foram sim. Três dias. Minhas folgas sempre
foram de no máximo um dia e meio.
SENHORA BELLS – Bem, eu achei que desse modo
poderia aproveitar melhor os seus pais e a sua família. Só
isso.
LUCRECIA – Obrigada. O senhor Rosmann ficou muito por
aqui?
SENHORA BELLS – Querida, pode apanhar o meu tricô na
sala?
LUCRECIA – (saindo) Claro senhora Bells. Não sabia que
estava nervosa.
SENHORA BELLS- Nervosa eu? Que ideia, minha querida.
LUCRECIA – Sei que está.
SENHORA BELLS – E por que estaria?
LUCRECIA – A senhora sempre falou que gostava de
tricotar para acalmar os nervos.
SENHORA BELLS – Ah, é isso. Mas não é o caso agora
minha boa Lucrécia.
LUCRECIA - Bom, aqui está . (entrega o tricô)
SENHORA BELLS – Obrigada.
LUCRECIA – E o senhor Rosmann? Ficou...
SENHORA BELLS – Acho que farei um cachecol para
você. Quer?
LUCRECIA – Claro, eu iria adorar.
SENHORA BELLS – Está decidido então.
LUCRECIA – A senhora está bem, senhora Bells?
SENHORA BELLS – Claro, minha querida. Por que?
LUCRECIA – A senhora parece agitada. E também...
SENHORA BELLS – E também....
LUCRECIA – Não responde as minhas perguntas.
SENHORA BELLS – Perguntas?
LUCRECIA – Sobre o senhor Rossmann.
SENHORA BELLS – Quem é esse?
LUCRECIA – Ora, o mascate que ficou aqui na noite que
fui para a casa de meus pais.
SENHORA BELLS – Ah, na verdade se foi na manhã
seguinte bem cedo. Na verdade, nem o vi sair. Esperou a
chuva passar e se foi.
LUCRECIA – Que pena.
SENHORA BELLS – Pena por que, minha cara?
LUCRECIA – Ele me disse que se a senhora comprasse
alguma coisa, ele me daria um presentinho.
SENHORA BELLS – Entendo, na verdade nem tive tempo
de ver os tecidos que trazia. Partiu sem sequer se despedir
ou agradecer a acolhida que demos.
LUCRECIA – Está certo. Deixa pra lá. Da próxima vez que
vier irei cobrá-lo
SENHORA BELLS – Esqueça isso. Afinal nem sabemos se
passar é por aqui novamente.
LUCRECIA – Não me pareceu ser do tipo mentiroso.
SENHORA BELLS – Você o viu apenas uma vez. Como
pode julga-lo?
LUCRECIA – Tem razão senhora Bells. Vamos esquecer
esse nome. (Som de trovão) Nossa, não parecia que
teríamos uma tempestade.
SENHORA BELLS – Nessa época chove muito.
LUCRECIA – Que lindo colar senhora Bells.
SENHORA BELLS – Obrigada. Gostou?
LUCRECIA – Muito. Novo? Nunca o vi antes.
SENHORA BELLS – Na verdade é herança de minha avó.
LUCRECIA – Uma joia muito rica.
SENHORA BELLS – Nem tanto.
LUCRECIA - Faria de tudo por uma joia dessas.
SENHORA BELLS – Bobagens. Querida pode providenciar
um chá?
LUCRECIA – Sim, agora mesmo. (Sai)
CENA III
Tricotando

SENHORA PULLVER – Senhora Bells, perdoe a


observação que faço. Estou deveras preocupada.
SENHORA BELLS – Deixe de rodeios, minha cara Anne.
O que a preocupa? Noto que desde que chegou reluta em
perguntar-me algo.
SENHORA PULLVER – Embora não pertencendo a uma
classe social elevada como a da senhora. Sinto-me
honrada com sua amizade. Portanto, preocupo-me com o
seu bem estar.
SENHORA BELLS – Querida Anne, neste lugar pouco se
faz verdadeiros amigos. Além do mais o que seria de mim
sem a ajuda de sua filha Lucrécia como minha dama de
companhia?...É uma ótima menina. E como disse, não sou
de fazer amigos com facilidade... Mas fale, o que a
preocupa?
SENHORA PULLVER – Estou achando a senhora abatida
e nervosa e...
SENHORA BELLS- Ah, é verdade minha boa Anne. Não
tenho dormido bem a noite. É uma tristeza que me aperta o
peito...Tenho passado noites em claro.
SENHORA PULLVER – Será que tem a ver com o que
Lucrécia me contou? Por favor fale! Estou bastante
apreensiva a respeito.
SENHORA BELLS – (Cortando) Ah, então já sabe. Oh,
Anne, estou com muito medo...Acho que...Estou
enlouquecendo...Eu preciso te contar Anne. Comecei a
ouvir rumores inexplicáveis pela casa, como se tivesse
gente andando de um quarto para o outro.... Vejo as
trancas das janelas levantarem sozinhas. Oh, Anne, será
que estou enlouquecendo? Não tenho mais sossego.
SENHORA PULLVER – Cruz credo, mas como foi que isso
começou?
SENHORA BELLS – (Nervosa) No começo pensei serem
ratos. Há muitos ratos na adega... Mas depois, depois do
que ocorreu...(chora) O meu deus....
SENHORA PULLVER – (vai até ela) Calma.
SENHORA BELLS – Depois do que aconteceu quando a
senhorinha Aurélia passou a noite aqui conosco....
SENHORA PULLVER – Então é verdade o que Lucrécia
me contou. Ela estava aqui aquela noite.
Entra Aurélia e Lucrécia
AURÉLIA – (Elas gritam assustadas) Senhora Bells,
senhora Bells... É a senhora no corredor?
LUCRÉCIA – Não responde.
AURÉLIA – Senhora Bells, tem alguém andando no
corredor.
LUCRÉCIA – São passos de homem andando...Depressa,
venha senhora Bells.
AURÉLIA – Deve ser o mesmo que estava batendo
embaixo da minha cama alguns momentos atrás.
LUCRÉCIA – O que?
AURÉLIA – Veja. As trancas levantam sozinhas. Veja !!!!
LUCRÉCIA – Escute. Os passos então descendo para a
adega.
SENHORA BELLS – Foi horrível. Aurélia chorava e dizia
ter ouvido batidas na cama e abaixo dos pés...Comecei a
gritar...Fechem as janelas, as trancas. As trancas...Quem
está aí, por deus? ...e aí, de repente, tudo ficou em silencio.
SENHORA PULLVER – Então Lucrécia não mentiu.
SENHORA BELLS- Não tenho mais sossego. Mesmo
porque meu marido diz nada ouvir quando está em casa,
pois como a senhora sabe, ele viaja muito, por conta de
seus negócios. E o pior, diz ser coisas da minha
cabeça...Tem brigado muito comigo. (Envergonhada)
Chegou até mesmo a agredir-me fisicamente.
SENHORA PULLVER -Meu deus.
SENHORA BELLS – Implorei a ele para mudarmos daqui
e, para minha surpresa e gosto, concordou. Até o final do
ano nos mudaremos Anne. Sentirei sua falta e de Lucrécia.
Mas se continuar aqui, não sei o que será de mim.
MARGARETH – (Entra correndo) Você não me pega....
KATE – Não vale...Você é maior do que eu...
Senhora Bells e senhora Pullver saem.

CENA IV
Tiptologia Espiritual

Tiptologia espiritual – Noite de 31 de março de


1848.Casa da família Fox.

MARGARETH– (Sentam cansadas) Do que vamos brincar


agora?
KATE – Com ele.
MARGARETH – (levanta e se afasta) Não, não, não. Isso
de novo não.
KATE – É divertido Meg.
MARGARETH – Está bem, mas você fala.
KATE – Senhor Pé Rachado o senhor está aqui? Se sim
dê duas batidas. (Som de duas batidas)
MARGARETH – Meu deus. Isso não é possível.
KATE – Mas você ouviu. Ele responde.
MARGARETH – Pergunte de novo.
KATE – Senhor Pé Rachado o senhor está aqui? Se sim
dê duas batidas. (Som de duas batidas)
SENHORA FOX – Os ruídos de novo.
MARGARETH – Mamãe, estou com medo.
SENHOR FOX – Calma, venham todas para cá e vamos
orar.
KATE – Você também deveria tentar Meg. Ele vai te
responder também.
SENHOR FOX – Kate, fique quieta filha.
Kate se afasta sorrateiramente e volta a comunicação.
KATE – Senhor Pé Rachado o senhor quer falar conosco?
Se sim dê duas batidas. (Som de duas batidas)
SENHORA FOX – Kate, volte aqui.
KATE – (Bate três palmas, a seguir ouve-se três ruídos)
Ouça papai, ele responde.
SENHOR FOX – Filha deixe de bobagens e venha rezar.
SENHORA FOX – Espera... (aproxima-se de Kate)
SENHOR FOX – O que foi?
KATE – Senhor Pé Rachado, faça o que eu faço! (bate três
palmas) Um, dois, três...(ouve-se três ruídos) Pergunte a
ele mamãe, ele responde...
SENHORA FOX – Perguntar...
KATE – Isso mamãe, você vai ver que é verdade.
SENHORA FOX – Seja você quem for está nesta casa?
KATE – Senhor Pé Rachado, seja você quem for está
nesta casa? Responda para a mamãe. Se não dê uma
batida, se sim dê duas batidas. (ouve-se duas batidas) Viu
mamãe, ele responde.
SENHORA FOX – (Voltando ao marido) John... está
acontecendo algo estranho. Muito estranho John. As
meninas também ouviram os ruídos...
SENHOR FOX – Meg, Meg...
SENHORA FOX – Meu marido, ouça-me. Isso não são
estalos da madeira seca, tão pouco os ratos da
adega...Sentimos movimentos nas camas e cadeiras a
noite. Tão intensos a ponto de notarmos quando deitadas.
John? Está me ouvindo John? Não são ratos. Esta casa
está assombrada por um espirito infeliz e sem repouso. Já
ouvi falar de histórias assim.
KATE – (Rindo inocente) Oh, mamãe, eu já sei o que é.
Amanhã é primeiro de abril e alguém quer nos pregar uma
peça.
SENHOR FOX – Por deus! Será que não teremos paz? E
vocês novamente com essas lamurias. Vocês estão
sugestionadas por boatos, isso sim. A casa não é tão nova.
É de madeira. No inverno haver estalos é normal. E os
ratos são muitos na adega, precisamos de armadilhas.
KATE – Senhor Pé Rachado, o senhor é um homem, se
sim, dê duas batidas. (ouve-se duas batidas)
SENHOR FOX – Parem com essa bobagem! Estava ciente
que enfrentaria resistência em uma nova comunidade.
Substituir um pastor depois de tantos anos não é fácil.
Deve ser alguém querendo fazer pilhérias comigo.
SENHORA FOX – É um ser humano. Ou um espirito?
SENHOR FOX – Meg você enlouqueceu.
SENHORA FOX – Se for um espirito dê duas batidas.
(Ouve-se duas batidas) Ele respondeu John. Se eu chamar
os vizinhos para que também escutem continuará a bater?
(Ouve-se duas batidas)
SENHOR FOX – Meg isso é loucura.
SENHORA FOX – Me diga espirito. Quantos filhos tenho?
(Ouve-se seis batidas)
SENHOR FOX – Meu deus.
(Outra batida)
SENHORA FOX – Mais uma batida?
SENHOR FOX – Está vendo? É uma pilhéria.
SENHORA FOX - Me diga espirito. Quantos filhos tenho?
(Ouve-se sete batidas) É o sétimo John, tivemos sete filhos
com o que morreu. Está vendo John, ele sabe. Ele sabe.
SENHOR FOX – Isso não pode estar acontecendo.
SENHORA FOX – Rápido John, mande chamar o senhor e
senhora Redfield e também os Duesler...
MARGARETH – Eu chamo mamãe...(saem correndo)
SENHORA FOX – John, não vê que ele não poderia saber
isso se não fosse mesmo um espirito.
SENHOR FOX – Ainda não sei o que pensar Meg.
Senhor e senhora Redfield entram assustados.
SENHORA REDFIELD – Senhora Fox, com licença,
Margareth nos adiantou um pouco do ocorrido...,Mas
confesso a senhora e também ao senhor que não me
causou estranheza alguma.
SENHOR FOX – Como?
SENHORA REDFIELD – Embora não tenha havido antes
manifestações tão veementes como agora.
SENHOR FOX – Como assim senhora Redfield ?
SENHOR REDFIELD – A casa nunca foi bem vista pela
população de Hydesville. Diziam-na assombrada.
SENHORA FOX – Assombrada?
SENHOR REDFIELD – Os inquilinos anteriores haviam
ouvido em seus compartimentos ruídos estranhos e
também móveis se moveram sem contato humano...Os
Bells também saíram daqui por causa disso.
MARGARETH – É o que está acontecendo senhor Redfield
Senhor e senhora Duesler entram
SENHORA DUESLER – Com licença senhora Fox. Viemos
o mais rápido que pudemos. Estou quase pondo os bofes
pela boca.
SENHORA FOX – Obrigada por virem.
SENHORA DUESLER – Estou deveras assustada com o
que relatou a menina Margareth. No fundo eu sempre achei
que tudo não passasse de histórias da imaginação desse
povo atrasado...Mas vamos direto ao ponto. Viram o
demônio?
KATE – Demônio?
SENHOR REDFIELD – É um espirito senhora Duesler. E
não o vimos. Mas está aqui a comunicar-se, respondendo
às perguntas que a senhora Fox e as crianças fizeram
SENHORA DUESLER - Fizeram perguntas? Ouviu isso
marido? E obtiveram respostas? Descobriram quem é? O
que está querendo?
SENHORA FOX – Pois veja a senhora...Pedi que dissesse
quantos filhos eu tenho, me respondeu sete. Como a
senhora sabe eu tenho seis. Perguntei novamente e tornou
a responder sete....
SENHORA DUESLER – (cortando-a) Ouviram? É o
demônio não há dúvidas. O pai da mentira.
SENHORA FOX – Não, não ouça. Eu tive na verdade sete
filhos. Perdi um em tenra idade. Ele respondeu a verdade.
SENHORA DUESLER – Meu Jesus amado. Será que se
eu perguntar se conseguiremos comprar uma nova casa
ele responde?
SENHOR DUESLER – (censurando- a entre dentes)
Mulher a coisa é séria.
SENHORA DUESLER – Bom e como conseguiram isso. É
simplesmente inacreditável!!!
KATE – Fui eu senhora Duesler. Eu tive a ideia de
conversar com palmas e ele foi respondendo. Não foi
papai?
SENHORA DUESLER – Oh, quem não responderia a um
anjinho como você? Será que ele está nos vendo aqui?
Ai...E você Margareth, tão calada, não conversou com o
demôn...quero dizer, com o espirito? Não está com medo?
MARGARETH – Sim, estou com muito medo.
SENHORA DUESLER – Oh, pobrezinha.
SENHOR REDFIELD – Espirito se está nos ouvindo, dê
três batidas. (ouve-se as três batidas. Espanto geral)
DAVID – Sim, responde. Estou me comunicando com ele
desde que entrei aqui.
SENHORA DUESLER – Estão vendo, ele responde
mesmo. Diga espirito, conseguiremos comprar nossa nova
casinha?
SENHOR DUESLER – Chega. Isso é sério mulher.
DAVID – Se é o espirito de alguém que foi assassinado dê
duas batidas.
SENHORA DUESLER – Assassinado aqui? (desmaia)
Ouve-se duas batidas. Espanto geral.
DAVID – A pessoa que o assassinou ainda vive?
SENHORA REDFIELD – Meu deus parem com isso.
DAVID – Se sim, dê duas batidas.
Ouve-se duas batidas. Espanto geral.
SENHOR REFIELD – Se você é um espirito então diga
quantos anos tem minha esposa.
SENHORA REFIELD – Não diga nada. Pergunte a sua
idade, ora essa.

SENHOR FOX – (nervoso, pondo ordem na casa) Por


deus, chega! Senhor Redfield, senhor Duesler como
podem ver estou desorientado e preciso de ajuda. (ajoelha)
DAVID – (indo até o pai) Pai.
SENHOR REDFIELD – O pior é que a essa altura a
boataria já deve ter se espalhado por toda Hydesville. Haja
vista, que várias pessoas nos viram correndo para cá.
HANNAH – (entra assustada) Desculpem a invasão
senhora Fox. Não pude deixar de procura-la ao saber do
ocorrido, quero dar meu testemunho...Bom, fui inquilina
desta casa. Sou Hannah Weekman e...
SENHOR REDFIELD – Acalme-se senhorita...Senhor Fox,
a senhorita Hannah é filha do antigo inquilino desta casa,
antes do senhor e sua família chegarem. Bom, eles
alegaram ter visto e ouvido coisas nesta casa. Mas conte-
nos menina Hannah.
HANNAH –Uma noite ouvimos ruídos. Nossa criada gritou
assustada. Fomos até o quarto dela. A encontramos
sentada na cama. Ela chorava muito e dizia que algo se
movimentava sobre sua cabeça e que de repente começou
a sentir frio. Muito frio. Sentia frio sobre seu corpo todo.
Mas ficou mais alarmada ao senti-lo sobre o rosto. Oh, foi
horrível! Aconteceu comigo também algumas vezes.
SENHOR REDFIELD – Senhor Fox, em 1846, há dois anos
portanto, instalou-se aqui a família Weekman, senhor
Michael Weekman. Alguns dias depois, após terem se
alojado, passaram a ser perturbados por ruídos. Fomos
acordados certa noite pela senhora Weekman pedindo
ajuda.
SENHORA DUESLER – Ah, eu fiquei sabendo do ocorrido
e vi com meus próprios olhos. A senhora Weekman, tremia
como uma vara verde, a coitada. E mal podia falar de
medo, e depois disso perdeu a voz. Não é verdade senhor
Redfield?
SENHORA FOX – Um momento. Obrigada menina
Hannah, agora vá e diga ao senhor Duespley que está ali
fora para que contenha os curiosos.
SENHOR REDFIELD – Não será fácil senhora Fox. Uma
multidão está aí fora. E querem saber da conversa com o
espirito. Precisamos tomar providências, com certeza já
chegou aos ouvidos das autoridades. Senhor Fox, vamos
escavar a adega. Quem sabe não desvendamos o
segredo? Talvez o espirito esteja falando a verdade e haja
um corpo enterrado na adega.
DAVID – Papai, através da combinação alfabética com as
pancadas produzidas, cheguei à identidade da
vítima...Trata-se de um mascate de 34 anos... de nome
Charles Rosmann.
SENHORA DUESLER – Oh, o mascate Charles Rosmann
(desmaia)
SENHOR REDFIELD – Meu deus, um assassinato aqui, há
quatro anos atrás. Os antigos inquilinos não eram oi Bells?
Precisamos de provas, provas!!!
SENHORA DUESLER – (Recuperando-se) Os Bells,
assassinos? Quem diria, com toda aquela pompa. Por isso
que fugiram.
SENHOR DUESLER – Mulher contenha-se, não temos
provas.
SENHOR REDFIELD – Então senhor Fox, partimos para as
escavações?
SENHOR FOX- Não, não senhor Redfield. Não dou
autorização para escavarem a adega de minha casa. Isto é
uma loucura. Poderá virar até uma histeria coletiva...Eu não
acredito nisso!!!
SENHOR DUESLER – (Voltando da janela) Senhor Fox a
boataria já se espalhou, a casa está cercada de curiosos.
SENHORA DUESLER – Cercada? (desmaia)
SENHOR REDFIELD- Temos que acalma-los.
SENHORA REDFIELD -Precisamos contar a verdade.
Senhor Fox, temos todos nós aqui, provas que é um
espirito. Ele respondeu às perguntas que fizemos.
SENHORA DUESLER – (Recuperando-se) Eu não
perguntei. Ele bem que podia ser camarada conosco
também.
SENHOR DUESLER – Quieta.

CENA V
ESCAVAÇÃO COLETIVA

Os atores simularão a escavação da adega dos Fox.

CENA VI
O CONVITE

SENHOR FOX – Isso já está indo longe demais.


SENHORA FOX – Essas meninas não têm mais sossego.
SENHOR FOX – Devemos recusar todos os convites para
expor as meninas.
LEAH – Papai, nós devemos aceitar.
SENHOR FOX – O que? Até você filha?
LEAH – Vejo tudo como divino. Também eu fui tocada pelo
mesmo dom de minhas irmãs.
SENHORA FOX – Você?
LEAH – A mensagem que obtive dos espíritos é que esses
fenômenos não se limitarão a um só local. Espalhar-se-ão
pelo mundo. Haverá grandes mudanças no século XIX. Os
mistérios serão revelados. O mundo será esclarecido.
SENHOR FOX – (Com uma carta na mão) Não é possível.
Não teremos mais descanso. Sabem o que é isto? Uma
proposta para minhas filhas se apresentarem no Corinthian
Hall.
SENHORA FOX – (Espantada) No Corinthian Hall? O
maior Auditório de Rochester!
SENHOR FOX – Sim, e a abertura será com discurso do
grande escritor W. Capron. Não, não! Esta história está
indo longe demais...Não!!!! Algo está errado. Existe algo
maligno por trás disso tudo.... Sinto que não é algo bom
para as meninas.
SENHORA FOX – Tens razão, meu querido. Não podemos
expor nossas filhas a um evento como esse. É perigoso.
Acho melhor manda-las para Rochester. Leah, você leva
Kate e Margareth fica na casa de David. Será o melhor
para elas.
LEAH – Mamãe, entenda, não é mais apenas Margareth e
Kate e esta casa que estão dotados deste fenômeno.
SENHOR FOX – Como assim?
LEAH – Como eu disse, eu também estou sendo portadora
dessas manifestações...
SENHOR FOX – Que loucura. Isso é uma provação, só
pode ser. Eu sou um pastor. O Senhor está pondo à prova
a minha fé. Só pode.
LEAH – Há alguns dias, esse fato notável aconteceu
comigo na residência do ministro A.H. Jervise, e de forma
impetuosa na casa do diácono Hale...Eu estava ao piano
quando....
SENHORA FOX – O que aconteceu filha?
LEAH – Quando um grande espelho na sala se quebra.
Como vê meu pai, as comunicações não se limitarão a
nossa família, mas se espalharão para o mundo.
SENHORA FOX – (Chora) É uma loucura Leah. Já pensou
a quem vamos enfrentar? Com certeza será formada uma
comissão para tentar desmascarar os fenômenos. Muitos
não acreditam em nada disso.
LEAH – O doutor Langworthy verificará se as batidas são
produzidas pela ventriloquia. Não temos nada a temer.
Fique tranquila.
SENHOR FOX – Leah, mesmo que o doutor Langworthy dê
um relatório favorável a vocês, não irão parar por aí,
formarão outras comissões. Não admitirão nunca. Vamos
poupar sofrimentos minha filha.
LEAH – Nada tenho para temer papai. Peço a sua
permissão e a sua benção.
SENHOR FOX – Parte do clero já acirram o povo contra
nós. E eles estarão lá, você sabe...
LEAH – Sim, eu sei. Todos nos acusando. Mas há também
aqueles que acreditam em nós. (Se olham...Os três se
abraçam) Então, posso conversar com minhas irmãs?

CENA VII
CORINTIAN HALL

SENHORA FOX – Ainda há tempo de cancelarmos a


apresentação Leah. John, o que acha? O Corinthian Hall
está completamente lotado, alvoroçado. Temo pelas
meninas...Por favor, vamos embora.
SENHOR FOX – (Abraça-a) Calma, calma.
LEAH – Não se preocupe mamãe, estamos confiantes. Já
conversei com minhas irmãs, estaremos unidas. Nada
temos a temer. Nos dê sua benção.

CENA VIII
A REVISTA

JUDY – Com licença, meu nome é Judy, encarregada da


revista. Por favor, senhor e senhora Fox, dirijam-se ao
camarote reservado, pois a apresentação não demora.
SENHORA FOX – A senhora disse revista?
SENHOR FOX – Mas que absurdo!!! Minhas filhas
revistadas como se fossem delinquentes!
LEAH – Papai, mamãe, por favor.... Fiquem tranquilos.
Orem por nós.
Senhor e senhora Fox saem.
LEAH – Bom, nada trouxe comigo que justifique uma
revista.
JUDY – Senhora Leah, acho que não entendeu. Eu quis
dizer dispa-se até a última peça.
LEAH – Como?
JUDY -Não precisa envergonhar-se, afinal sou mulher
como você.
LEAH – Sim, mas ...
JUDY – Ordens são ordens. Nunca teve a curiosidade de
saber como é feita a revista em uma penitenciaria?
LEAH –(constrangida) Fará isso também com minhas
irmãs?
JUDY – Naturalmente. (As duas correm até Leah)
LEAH – Mas são duas crianças.
JUDY – Com as três.
KATE/MARGARETH – Nãoooo
JUDY - Rápido, por favor. O salão está lotado. Não tenho
tempo a perder. (Começam a despir-se)

CENA IX
PRIMEIRA APRESENTAÇÃO PÚBLICA

W CAPRON – Queremos ouvir agora o senhor David Fox.


DAVID FOX – Naquele dia escavamos na adega. Mas não
obtivemos sucesso. Um tempo depois, com amigos
resolvemos refazer as escavações em outro ponto da
adega...encontramos alguns fios de cabelo...pequenos
fragmentos de ossos...Nada mais...
W. CAPRON – Obrigado, senhor David Fox. Lucrécia
Pullver, por favor.
LUCRÉCIA – Eu fiquei muito triste com o desaparecimento
daquele mascate. Eu pretendia comprar alguma coisa dele
e também, ele me prometeu um presentinho. (risos)...Mas
nunca mais o vi. Cerca de três dias depois os Bells me
procuraram para voltar. Bom, eu voltei, como sabem.
Pouco tempo depois a senhora Bells me deu um dedal, que
disse haver comprado do mascate. Um dia eu a visitei e ela
me disse que o mascate havia voltado e me mostrou outro
dedal...Que disse ter comprado dele também. Mostrou-me
também outras coisas, que suponho deve ter comprado do
mascate. Soube depois que se mudaram e nunca mais ouvi
falar deles.
MEMBRO DA COMISSÃO – Em 31 de abril de 1847,
ouviu-se ruídos estranhos. As crianças inocentes brincam e
acreditam comunicar-se com algo que não veem. A mãe
sugestionada, amedrontada, acredita e passa também a (ri)
vejam vocês. Conversar com o invisível! O pai, um pastor,
resisti. Acredita ser alvo de alguma brincadeira. Aí, o filho,
único varão, se dispõe a contar e conferir por ordem
alfabética as respostas dadas com batidas as perguntas
feitas e... pasmem senhores... Obtém respostas corretas.
(risadas) Logo senhores tudo ficará mais fácil. Basta
perguntarmos as paredes de nossas casas e elas nos
responderão. (risadas) E não, não parou por aí! Pelo
numero de batidas eles descobrem o que? Um
assassinato!!! (Exaltado) E a vítima tem um nome.
Rossman. Charles Rossman. Nome e profissão. Trata-se
de um pobre mascate que desapareceu sabe lá deus
como. Vivia pelo mundo. Ninguém sabia ao certo quem era.
Mas ele escancara as portas da morte e volta ao mundo
dos vivos. O que é isso senão Heresias!!!!! E isso foi o que
aconteceu. Uma histeria coletiva...Nada foi provado nas
escavações, sim, porque chegaram ao ponto do senhor
Fox autorizar que abrissem um buraco que quase atingiu o
lençol freático. Mas provas? Nenhuma. Senhor Fox...o
senhor tem consciência como pastor que é, cidadão de
bem, e pai dessas crianças, da gravidade de sua conduta?
Compactuar com essa heresia. Responda senhor Fox.
A.H. JERVIS – Um momento. O fato é que esses
fenômenos aconteceram também na minha residência e na
presença dos reverendos Brihain e Griswold, através da
senhora Leah, por quem tenho muito apreço e
consideração.
MEMBRO DA COMISSÃO – Está vendo senhor Fox o que
sua omissão causou?
A.H. JERVIS – E isso aconteceu de novo de forma ainda
mais impetuosa, na casa do diácono Hale, que hoje não
pode comparecer aqui. A senhora Leah diz a verdade.
Essas crianças não mentiram.
Tumulto
W. CAPRON – Silêncio!!! O doutor Langreorthy foi
escolhido para fazer parte desta comissão. Por favor,
senhor Langreorthy.
LANGREORTHY - Senhores.... Coube-me a
responsabilidade de examinar se as batidas são produzidas
por meio da ventriloquia...Pois muito bem....Nada prova
que essas inocentes crianças utilizam esse meio para
produzir os sons. Portanto, meu relatório inocentas as
irmãs Fox.!
Tumulto
PADRE – Queremos outra comissão! Precisamos varrer
toda essa loucura que assolou nossa comunidade.
DAVID FOX – Minhas irmãs são pessoas honestas.
MEMBRO DA COMISSÃO – Pessoas honestas não
inventam mentiras.
DAVID FOX – Elas podem provar que os ruídos são reais.
PADRE- Mais um herege!
DAVID - (Desesperado) Espirito se seu nome é Charles
Rossman o mascate, responda para esta comissão.
MEMBRO DA COMISSÃO – Parece que seu espirito está
de folga hoje.
Risadas
DAVID FOX – Por favor, é importante, se sim dê três
batidas.
(Som das três batidas. Espanto de todos)
PADRE – Vejam senhores. Ele também!
MULTIDÃO – São todos bruxos.
PADRE – Vamos acabar com eles. É o demônio que se
manifesta através dessa família.
Multidão avança.
GEORGES WILLETTIS – Só massacrarão essas meninas
e sua família depois de passarem por cima do meu
cadáver.
As meninas são retiradas junto com a família pelos fundos.
NARRADOR – Meses depois as Irmãs Fox mudaram-se
para New York onde passaram a realizar sessões ao lado
de grandes nomes da arte e políticos, convencendo-os da
comunicabilidade dos espíritos. Elas fizeram ainda
demonstrações públicas da mediunidade em todos os
estados do oeste americano o que ocasionou a fundação
de centenas de centros espiritas, lá conhecidos como
templos espiritualistas.

CENA X
IN VINO VERITAS

MIRIAM – As meninas estão cansadas, Frank. Já foram


duas apresentações hoje.
FRANK – Temos mais duas com casa lotada. Não
podemos devolver esses ingressos todos.
MIRIAM - Apenas temo que nesse ritmo alucinado elas
acabem não resistindo. É muita pressão. Elas não
aguentarão.
FRANK – In vino veritas!
MIRIAM – O que?
FRANK – No vinho a verdade. Não podemos impedir a
divulgação dos espíritos. O vinho poderá nos ajudar.
MIRIAM – Pretende dar bebidas a elas?
FRANK – E por que não? É apenas um modo de reanima-
las e também, um estimulo para suportar a pressão do
trabalho.
MIRIAM – Não me parece direito Frank.
FRANK – O importante é o público que está pagando para
ouvi-las. Os espíritos estão felizes, elas estão felizes e nós
também estamos felizes com tantas bilheterias cheias,
noite após noite. Então não há com que se preocupar. As
meninas estão cansadas? Nada que bons vinhos não
amenizem, ora essa?!
MIRIAM – Você é quem sabe.
FRANK – Não se preocupe. Das irmãs Fox cuido eu. Mais
uns meses nesse ritmo e não precisaremos trabalhar nunca
mais. Escuta o seu marido. Eu sei o que estou fazendo. É
por uma boa causa.

CENA XI
COMUNICAÇÃO COM OS ESPÍRITOS

FRANK – Bem vindos todos a mais um encontro com


nossos entes queridos que se foram. Tudo que pedimos
agora é um pouco de concentração. O que verão aqui vai
além do fato de acreditar ou não. Só pedimos que assistam
a tudo e testemunhem com seus próprios olhos e ouvidos
tudo que acontecerá neste teatro. Para começar nós
precisamos de silêncio e concentração. Pensem em seus
familiares que partiram. Em seus entes queridos. Pensem
firmemente em todos eles. E permitam que eles venham
até nós, E se comuniquem através destas meninas que
foram escolhidas para serem os mensageiros de um novo
tempo que se aproxima. Façamos silêncio absoluto.
Apenas deixem o pensamento atrair pessoas queridas que
desejam se comunicar.
KATE – Ela está aqui.
MARGARETH – Sim, sinto sua presença.
FRANK – Quem está aqui meninas?
KATE – Ela.
FRANK – Quem é ela?
MARGARETH – Uma senhora...
FRANK – Como é o nome dela?
KATE – Seu filho está aqui.
FRANK – Conseguimos uma comunicação. A mãe de
alguém que está nesta plateia está aqui esta noite.
KATE – Ela quer falar com seu filho.
FRANK – Como ela se chama Kate?
KATE – Senhora Brow. Emilly Brow.
JOHN – Emilly Brow é minha mãe.
FRANK – Como é o seu nome?
JOHN - John Brow.
FRANK – Senhor Brow, sua mãe faleceu a quanto tempo?
JOHN – Dois anos.
FRANK – Certo. Peço a todos que mantenham o silêncio e
a concentração. Para não prejudicar o contato do senhor
Brow com sua querida mãezinha.
EMILLY – Por que você sofre?
KATE – Por que você sofre?
FRANK – Ela pergunta porque você sofre?
KATE – Espera.
FRANK – Um momento senhores. Mais alguma coisa?
EMILLY – Não foi sua culpa meu filho.
KATE – Não foi sua culpa meu filho.
FRANK – Senhor John, o senhor se sente culpado?
JOHN – Eu acabei dormindo e não acordei para dar a ela o
seu medicamento.
KATE/EMILLY - Não foi por isso que eu parti filho. Era
chegada a minha hora. Você não tem culpa de nada. Pare
de se torturar. Estou muito bem aqui. Acredite.
JOHN - Mãe, eu te amo.
KATE/EMILLY – Eu também te amo filho. E sempre vou te
amar. Sempre. Pare de sofrer, de se sentir culpado. Isso
também me faz sofrer. Cuide do Bob.
FRANK – Quem é Bob, senhor Brow?
JOHN – O nosso cachorro. Ele também sente muito a falta
dela.
KATE/EMILLY – Bob sabe que estou bem. Já estive em
casa algumas vezes filho.
JOHN – Mãe, eu não queria que a senhora tivesse partido.
E continuo não querendo.
KATE/EMILLY – Aceita filho. Tinha que ser. Estou bem e
feliz agora. Sem doenças, sem dores e sem sofrimentos. É
a vida filho.
JOHN – Mãe... eu preciso da senhora.
KATE/EMILLY – Você precisa viver a sua vida filho. Há
ainda uma longa jornada de realizações aqui na terra. E
para isso você precisa seguir a sua missão. A minha estava
concluída filho. (sai)
JOHN – Mãe...mãe...
FRANK – Ela se foi, senhor John.

CENA XII
NÓS QUE NOS AMAVAMOS TANTO - CRESCEMOS

KATE (Que a época dos fenômenos de Hydesville era a


mais nova das irmãs Fox, com sete anos de idade) –
Margareth...
MARGARETH – Diga.
KATE – Estou com medo.
MARGARETH – Medo?
KATE – Margareth você se imagina daqui quinze anos?
MARGARETH – Sim....as vezes penso nisso.
KATE – E como estaremos?
MARGARETH – (choram e se abraçam) Oh minha pobre
Kate.
Entram Margareth e Kate adultas e se abraçam.
KATE ADULTA – Margareth, o que aconteceu conosco?
MARGARETH ADULTA – Nossa infância nos foi negada
Kate.
KATE CRIANÇA – (Corre para fora rindo) Senhor pé
rachado faça o que eu faço.
MARGARETH CRIANÇA – (Saindo atrás dela) Espere por
mim Kate.
MARGARETH ADULTA – O que foi? O que você tem?
KATE – Recebi uma comunicação Meg.
MARGARETH – Que comunicação?
KATE – “Quando as trevas caírem sobre você, pense no
lado mais luminoso.”
MARGARETH – Bonito, gostei. Parece um poema.

CENA XIII
MATERIALIZAÇÃO DE ESTELLE LIVERMOURE

SENHOR LIVERMOURE – (Cordialmente) Encantado,


senhorita Katherine. Obrigado por me receber.
KATHERINE – O prazer é todo meu, senhor Livermoure.
Confesso-me surpresa que um banqueiro importante como
o senhor solicitasse falar comigo.
SENHOR LIVERMOURE – Ora, ora...
KATHERINE – É uma honra recebe-lo.
SENHOR LIVERMOURE – Senhorita Katherine, não sei
como começar, preciso de sua ajuda. Eu...bem, você já
deve ter ouvido falar de mim. Sabe que nunca acreditei
nesses fenômenos....Desculpe-me, mas quero ser o mais
franco possível.
KATHERINE – Por favor, senhor Livermoure, abra o seu
coração.
SENHOR LIVERMOURE – A verdade é que vejo na
senhorita, a possibilidade de...Oh meu deus.
KATHERINE – Fique calmo o senhor está entre amigos.
SENHOR LIVERMOURE – Sim, sim, naturalmente...muito
obrigado.
KATHERINE – Em que posso ajudá-lo?
SENHOR LIVERMOURE – Eu preciso, eu quero, na
verdade eu preciso rever a minha Estelle..
KATHERINE – Estelle?
SENHOR LIVERMOURE – Minha esposa amada. Ela
faleceu. Mas, mas eu desejaria ardentemente acreditar que
posso vê-la, entende? Ou ao menos me comunicar com
ela. Por favor, senhorita Katherine, me diga que isso será
possível de algum modo.
KATHERINE – Senhor...
SENHOR LIVERMOURE – (Chora) Eu pago. Pago o que
for preciso. Diga um valor. Dinheiro não é problema...
KATHERINE -Percebo que vocês se amavam muito.
SENHOR LIVERMOURE – Sim, nunca esqueci minha
Estelle. Sofri muito com sua doença. No auge de sua
agonia, ela dizia para mim, que se existisse vida após a
morte, ela voltaria para me ver. Por isso eu sei, que foi
Estelle que a colocou no meu caminho. Ela encontrou uma
forma de estabelecer contato, entendo?
KATHERINE – Sim, compreendo.
SENHOR LIVERMOURE – Acompanho pela imprensa os
fenômenos obtidos pela senhorita e suas irmãs. E também
os conselhos de amigos próximos....(Desesperado) Por
favor, me ajude a rever Estelle.
KATHERINE – New York tem sido um polo importante de
nosso trabalho, sem sombra de dúvidas. Personalidades de
todas as áreas têm nos procurado e agora até mesmo o
senhor que era um notório descrente de todos esses
fenómenos entre vivos e mortos.
SENHOR LIVERMOURE – Confesso que eu e Estelle
sempre fomos céticos e materialistas. Mas nos amávamos
muito. Ainda nos amamos. Mas com sua morte uma parte
de mim se foi com ela... Tão bela, tão cheia de vida. Por
favor senhora Katherine, posso ter esperanças de rever
minha Estelle?
KATHERINE – A decisão de me procurar não foi apenas
sua, não é senhor Livermoure?
SENHOR LIVERMOURE – (Surpreso) Não. Na verdade, foi
um pedido da própria Estelle antes de morrer. Ela
comentou com seu médico. Mas como sabe?
KATHERINE – Peço que se acalme. Sente-se. Agora
procure relaxar. Feche os olhos.
Ele obedece. Sons estranhos. Musica. Surge Estelle. Ela o
acaricia. Ele demonstra sentir sua presença.
SENHOR LIVERMOURE – Estelle! Estelle é você eu sei
que é!
ESTELLE – Sim, eu não disse que voltaria? Não estou
sozinha aqui. Sabe quem está comigo? Ele mesmo,
Benjamin Franklin para me ajudar no processo de
materialização. Ele estará sempre comigo me auxiliando.
Adeus, meu querido. Voltarei sempre que possível. Eu
estou bem agora.
SENHOR LIVERMOURE – (Emocionado) Estelle! Estelle!
Minha querida Estelle! Senhorita Kate, ela esteve aqui.
Pude sentir o seu toque suave, o seu perfume. Obrigado,
muito obrigado por me proporcionar esse momento único.

CENA XIV
O CASAMENTO

Casamento de Margareth e Kate. Leah está de luto. Duas


senhoras bisbilhoteiras fazem comentários sobre a viúva.
MULHER I – Quem diria que Katherine Fox, após um ano
na Inglaterra conquistaria um advogado londrino tão
famoso.
MULHER II – É um espirita confesso.
MULHER I – Não diga...
MULHER II – E Margareth também não deixou por menos
casando-se com o doutor Kane – O explorador do oceano
ártico. Isso que é sorte.
MULHER I – Veja, a viúva negra. Leah Fox. Tão nova a
viuvinha e já enterrou três maridos.
MULHER II – Pois sim, usufruindo o que os falecidos lhe
deixaram não é nada difícil ostentar esse luto e a cara de
sofrimento.
MULHER I – O último que enterrou era um magnata de
seguros em Wall Street.
MULHER II – Veja, está vindo em nossa direção.
MULHER I – (À parte) Deixa comigo. Oh que lindo
casamento de suas irmãs. Emocionante na verdade.
LEAH – Obrigada.
MULHER I – Como devemos chama-la? Senhora Fish?
Senhora Brow ou senhora Underhill?
LEAH – Fox. Senhora Leah Fox, senhoras.
SMITH – Posso falar com a senhora?
LEAH – Comigo?
SMITH – Sim, um minuto apenas.
LEAH – Me dão licença?
MULHERES – Naturalmente. (saem)
LEAH – Em que posso ajuda-lo, senhor....
SMITH – Smith...Douglas Smith
LEAH – Estou um pouco ocupada. É um casamento como
pode ver.
SMITH – Naturalmente. Serei breve. Pensei em agendar
apresentações das Irmãs Fox em teatros por toda a costa
americana.
LEAH – Apresentações?
SMITH – Sim, nada muito diferente do que as senhoras já
vêm fazendo. Acredito que desse modo poderemos
divulgar esses fenômenos a um número bem maior de
pessoas.
LEAH – Compreendo.
SMITH – E como a senhora é a mais velha, achei por bem,
procura-la primeiro.
LEAH – Minhas irmãs também estão envolvidas na
divulgação desses fenômenos espirituais senhores Smith.
SMITH – Claro, claro. Mas pensei em uma conversa
separada primeiro. Até mesmo para tratarmos da questão
financeira.
LEAH – Que questão financeira senhor Smith?
SMITH – Pensei em cobrarmos ingressos um pouco mais
caros. Afinal teremos despesas com viagens,
hospedagens...
LEAH – Mais caros quanto?
SMITH – Bom, considerando que estarei investindo um
tempo nisso também, divulgando e chamando público. É
natural que eu seja bem remunerado, não acha?
LEAH – Lamento senhor Smith. Não estamos fazendo esse
serviço pensando em compensações financeiras.
SMITH – Sim, por certo. É muito nobre isso. Mas meu
trabalho precisa ser remunerado. Sem ele não há
apresentações.
LEAH – Lamento, mas acho que perdeu o seu tempo. Não
estamos interessadas, com licença.
SMITH – Espera. A senhora não entendeu. Todos
podemos ganhar e muito. É apenas uma questão de
aproveitar esse momento em que todas as atenções estão
voltadas para isso.
LEAH – O senhor não entendeu ainda? Precisarei gritar?
SMITH – Minha senhora. Com sua licença.
CENA XV
DIALOGO CONJUGAL

MARGARETH – Não acredito no que estou ouvindo Kane.


Não é possível. Não pode ser verdade. Como pode pensar
isso de mim?
KANE –Você precisa entender, minha querida, que tenho
uma carreira, posição social, responsabilidades como
médico...A situação está insustentável para todos nós.
MARGARETH – Você não faz ideia do que passei. Eu e
minhas irmãs passamos. Não avaliou em nenhum
momento que também sofro com tudo isso? E vem você
dizer que é por dinheiro? É isso que pensa de mim? Que
sou uma mercadora?
KANE – (Alterado) Eu a proíbo de continuar com essas
sessões fraudulentas.
MARGARETH – O que? Fraudulentas diz você. Nunca
mais diga isso.
KANE – Somos casados. Tenho sofrido todo tipo de
pilhérias dos amigos. Profissionalmente isso ainda pode me
afetar. Você não precisa mais de dinheiro Margareth.
Temos uma boa situação.
MARGARETH –(Quase chorando) Você não crê em mim?
Quando nos conhecemos eu já fazia as sessões. Você
sempre soube que essa era a nossa missão.
KANE – Sim, eu sabia.
MARGARETH – Você me ama. Não me ama?
KANE – Amo.
MARGARETH – Me abrace Kane. Eu preciso de você.
KANE – (abraça-a) Também preciso de você Meg.
MARGARETH – Às vezes sinto como se você estivesse
indo embora aos poucos.
KANE – Eu ainda estou aqui Meg.
MARGARETH – Mas é como se não estivesse. Como se
estivesse cada vez mais e mais distante.
KANE – Sou seu marido Meg.
MARGARETH - Então como pode me acusar?
KANE – Acredita Meg que o que aconteceu com você é
mesmo obra de espíritos? Olhe para mim, nos meus
olhos...Não seria obra do demônio? Diga...
MARGARETH – Não!!!
KANE – Margareth eu amo acima de tudo. Confie em
mim...Diga-me, acredita que são mesmo espíritos?
MARGARETH – (Confusa) Kane... Eu não sei. Eu não sei.
As vezes sim. Às vezes não. Mas o fenômeno acontece
desde que éramos crianças. É a mais pura verdade.
Sabe...às vezes eu tento me convencer que há uma
relação com leis ocultas da natureza, entende? Mas não
sei o que é. (Chora) Acredite em mim, por favor. O que
acontece comigo é real. É de verdade...Eu não sei mais o
que falar...
KANE – Minha pobre Margareth. Vê, você também tem
dúvidas. Nem você mesma acredita...
MARGARETH – Não é isso...
KANE – Me escute. Ouça bem o que vou te dizer. Você vai
desmentir a comunicação com os espíritos.
MARGARETH – Não!!!!
KANE – Vai desmentir. Vai desmentir a comunicação com
os espíritos. Vai dizer que se submete a tratar-se. Eu
estarei ao seu lado. Não tema.
MARGARETH – Kane...
KANE - Com o tempo você esquecerá tudo isso. É preciso,
minha querida. Pense em nosso casamento. Pense em
mim...Está ouvindo Meg?
MARGARETH – Estou.
KANE - Nossa felicidade depende exclusivamente de você.
(Sai)
MARGARETH – Kane, não me deixe, por favor...Kane!

CENA XVI
TUTELA

Kate e Margareth bebem. Estão levemente embriagadas.


Chega Leah.

MARGARETH – Olha só quem chegou! Salve irmãzinha


querida, agora o trio está completo. Podemos começar a
festa.
KATE – O que veio fazer aqui? Veio rir de mim? Quer pisar
ainda mais em mim? Diga!!!
LEAH – Acabou?
KATE – Eu quero meus filhos de volta. Você não tem o
direito de tira-los de mim. Me solta Meg.
LEAH – Eu avisei que se não parasse de beber iria tomar
providências...E pelo que vejo, nada mudou por aqui. Fiz o
que tinha que ser feito. Não me arrependo.
MARGARETH - Como teve a coragem de tirar os filhos da
sua própria irmã? Você não tem coração? Responda. Estou
falando com você.
LEAH – E você tem? É este o apoio que tem dado a Kate?
Não bastava você? Agora arrasta também a Kate para o
álcool. Me espanta ver a que ponto chegou, minha irmã.
Estou envergonhada e triste. Pobre papai e mamãe se as
vissem agora. Agradeço a deus eles estarem mortos para
não presenciar um espetáculo tão degradante.
MARGARETH – Cale-se! Não ouse mencionar nossos
pais. Não precisamos de lição de moral Leah. Você sempre
nos recriminou. Sempre foi quem decidiu o que devíamos
fazer ou não. Você nos colocou nisso.
LEAH – Eu?
MARGARETH – Papai não queria nos expor. No Corintian
Hall foi você que os fez aceitar.
LEAH – Eu apenas segui o que a espiritualidade nos pedia.
MARGARETH -Você tinha inveja de nós.
LEAH -Inveja de que?
MARGARETH – De nossa capacidade. Nosso dom.
LEAH – Esqueceu que também fui dotada da mesma
capacidade?
MARGARETH – Isso é o que você diz. Nunca acreditei
nessa história. Você inventou isso para não se sentir
inferior a nós.
LEAH – Você está bêbada.
MARGARETH – Você nunca teve dom algum.
LEAH – E você perdeu o pouco que tinha.
MARGARETH – Eu sempre fui uma grande médium,
sempre.
LEAH -Disse bem, foi. Não é mais.
MARGARETH -Invejosa!
LEAH – Pensa que não percebi nas últimas apresentações
que você estava blefando?
MARGARETH – Mentira.
LEAH – Até isso o álcool tirou de você.
MARGARETH – Isso é inveja. De todas sempre fui a mais
dotada.
LEAH – Mas infelizmente o álcool destruiu isso também,
não é irmãzinha?!
MARGARETH – Você nos forçou a aceitar as sessões
espirituais para ganhar dinheiro com isso. Você não presta
Leah.
LEAH – Você está bêbada. Não diga mais nenhuma
palavra.
KATE – Eu quero meus filhos de volta. Eu te odeio Leah.
Odeio.
LEAH – Você não está em condições de cuidar das
crianças. Você não está em condições de cuidar nem de
você mesma.
KATE – Traidora. Nos jogou nisso e agora quer também
meus filhos.
LEAH – Você os estava maltratando. Não posso admitir
que eles sofram. Eles são inocentes.
MARGARETH – Não deixarei que leve os meus sobrinhos.
Não vou deixar, Leah. Se você fizer isso eu acabo com a
sua reputação. Está me ouvindo?
LEAH – Eu já cumpri o que havia prometido. Fiz a
denúncia para a Sociedade para Prevenção de Crueldade
às Crianças. Eles ficarão por alguns meses sob minha
tutela. E vou leva-los quer queiram vocês ou não.
MARGARETH – Faça isso e vou acabar com você Leah.
LEAH – Prepare as crianças. Estou esperando lá fora. (Sai)
MARGARETH – Traidora! Traidora!
CENA XVII
AS TREVAS DESCERAM

REPORTER I- Lembrem-se, são mil e quinhentos dólares


para vocês negarem tudo que afirmaram até aqui sobre os
fenômenos espiritualistas.
MARGARETH – Faríamos isso de qualquer modo. Leah é
a culpada de tudo. Fomos usadas por ela. Nossa própria
irmã. Estamos prontas.
REPORTER I – Perfeito. Podemos começar.
CARDEAL MANNING – o dinheiro em questão é apenas
uma compensação. O importante é que em seus corações
vocês possam efetivamente renunciar a essa crença
demoníaca.
MARGARETH – (visivelmente embriagada) Eu já deveria
ter revelado a farsa a muito tempo. Mas fomos sendo
arrastadas e envolvidas por tudo o que estava
acontecendo. Somos pessoas de origem humilde e, de
repente estávamos viajando para todos os lugares,
ganhando dinheiro, fama...Mas eu preciso dizer que... Na
qualidade de uma das fundadoras do espiritismo, eu quero
denuncia-lo como fraude absoluta do principio ao fim e
como a mais doentia das superstições e a mais maligna
heresia que o mundo já conheceu...
REPORTER I– A senhora está ciente da importância da
sua declaração?
KATE – Por deus, Margareth. Não!!!
REPORTER I– Quieta. Deixe-a falar.
MARGARETH – (A empurra) Me deixa continuar. Essa
senhores é a minha pobre irmãzinha Kate, que sempre
esteve ao meu lado. Já a outra, Leah. Maldita seja. Foi
quem nos fez aceitar isso tudo. Kate e eu fomos usadas
por ela. E tudo por dinheiro, meus senhores.
Dinheiro...Leah tinha 23 anos no dia em eu nasci. A filha de
Leah, Elizabeth tinha 7 anos no dia em que eu nasci. (ri,
descontrolada) Eu já era tia antes de ter nascido. Mas foi
essa mulher, Leah que nos colocou nisso e fez de nós seus
instrumentos. Ganhávamos dinheiro para ela.
REPORTER I – E seus pais? Nunca desconfiaram da
mentira?
MARGARETH - Minha mãe, coitada, era uma tola.
Acreditou nessas mentiras todas. Todo mundo acreditou. E
de repente a coisa foi crescendo e virando uma bola de
neve. E o que era uma mentira tola de duas crianças foi
virando uma verdade. Mas agora acabou.
CARDEAL MANNING – Que o senhor as ilumine.
KATE – (Chorando) Eu me converto e peço perdão das
mentiras todas que contamos. Eu assino minha confissão.
Cardeal, me ajude. (Beija a mão do cardeal)
CARDEAL MANNING – Calma, agora tudo acabou. O
senhor as perdoará.

CENA XVIII
RETRATAÇÃO DE MARGARETH

SENHORA FOX – Minha filha.


MARGARETH – (maravilhada) Mãe...
SENHORA FOX – Quando as trevas descerem sobre você,
pense no lado mais luminoso.
MARGARETH – O lado mais luminoso, sim é isso, é isso
meu deus....
SENHORA FOX – Calma, não diga nada. Eu sei. Na
verdade, todos estamos sofrendo filha. Todos.
MARGARETH – Perdão mamãe...
SENHORA FOX – Você não é isso que você se tornou
filha. Você sempre foi um ser profundamente amoroso.
Onde está a minha Meg?
MARGARETH – Por favor mãe, me perdoa.
SENHORA FOX – Não é a mim que você deve pedir
perdão filhinha.
MARGARETH – Sim, verdade, eu entendi...eu entendi...
(Chora) Obrigada mãe, obrigada.... Obrigada por me trazer
a luz.

CENA XIX
REPÓRTER II

REPORTER II – Atenção, atenção, senhoras e senhores,


para esta importante entrevista. Depois de um ano das
declarações da senhora Margareth Fox desmentido os
fenômenos de contatos espirituais...Ou melhor, depois do
período de trevas que caiu sobre as vidas das irmãs Fox,
onde elas foram renegadas e apagadas por todos. Hoje
temos aqui a mesma Margareth Fox que afirma que o
período de trevas acabou. Teriam então as luzes voltado a
iluminar as irmãs? Acompanhem essa importante
entrevista. Senhora Margareth, a senhora convocou a
imprensa para se retratar?
MARGARETH – Exatamente.
REPORTER II– O que a fez voltar atrás em suas
declarações que os fenômenos mediúnicos foram uma
farsa inicialmente orquestrada pela senhora e sua irmã
Kate?
MARGARETH – Na verdade reconheço hoje que a mim e a
minhas irmãs. Incluindo aí não apenas Kate, mas Leah
também, foi dada uma importante missão. E uma missão
sempre é maior que quem a representa. O espiritismo,
senhoras e senhores, é mais importante que eu. Mais
importante que minhas irmãs. A nós foi confiada uma
missão. Uma missão que hoje eu compreendo a
importância.
REPORTER II – É importante para a senhora fazer uma
retratação pública?
MARGARETH – Sim. Hoje 20 de novembro de 1889, é um
dia muito importante para mim. Quero que essa data nunca
mais seja esquecida.
REPORTER II – A senhora e suas irmãs deram o primeiro
passo na divulgação e criação do que seria a base para a
codificação do espiritismo.
MARGARETH – Sim.
REPORTER II – Mas curiosamente também deram o
primeiro passo no sentido de destruir tudo isso. Me refiro
ao seu depoimento alegando que tudo não passou de uma
farsa. Afinal, há alguma verdade nas acusações que a
senhora fez contra o espiritismo?
MARGARETH – Nenhuma.
REPORTER II – Então o que a fez denunciar as batidas
dos espíritos como sendo um truque feito pela senhora e
sua irmã?
MARGARETH – As acusações que fiz eram inverídicas em
todas as suas minucias. Não hesito em dize-lo. Na época
eu necessitava de dinheiro e criaturas, cujo nome prefiro
não citar, se aproveitaram da situação. Também estava
vivendo um período muito difícil, Kate estava prestes a
perder a guarda de seus filhos. Tudo isso alterou meu
raciocínio. Mas minha crença no espiritismo nunca sofreu
mudanças...Quando fiz as declarações não era
responsável por minhas atitudes e palavras.
REPORTER II – E qual era o objetivo das pessoas que a
induziram a fazer a confissão que a senhora e todos os
médiuns traficavam com a credulidade do povo?
MARGARETH – Visavam diversos objetivos. O primeiro e o
mais importante era a ideia de esmagar o espiritismo.
Segundo fazer dinheiro para si mesmos e com isso
provocar uma grande excitação.
REPORTER II – E o que diz sua irmã Katherine de sua
presente atitude?
MARGARETH – Está de pleno acordo. Kate nunca foi
favorável à minha atitude.
REPORTER II – E na presente retratação não houve
nenhuma interferência de ordem monetária?
MARGARETH – Não, absolutamente.
REPORTER II – Pretende voltar a realizar apresentações
públicas?
MARGARETH – Não. Pretendo dedicar-me a trabalhos de
propaganda na tribuna pública, pois desse modo, poderei
refutar as calunias por mim lançadas contra o espiritismo.
Farei isso por todo o resto de minha vida. (emociona-se)
Obrigada.
REPORTER II – Apenas mais uma pergunta.
MARGARETH – Sim
REPORTER II – Terá algum empresário para seu ciclo de
conferências?
MARGARETH – Não, lhes Tenho horror. Também eles me
ultrajaram muito. Frank Steben tratou-me
vergonhosamente. Fez muito dinheiro a minha custa e
deixou-me em Boston, sem um centavo.
REPORTER II – Aí está, meus senhores, a retratação de
Margareth Fox.

CENA XX
O ULTIMO FOX

REPORTER III– Senhor David?


DAVID – Sim
REPORTER III -David Fox?
DAVID –Sim
REPORTER III -Gostaria de conversar com o senhor sobre
suas irmãs.
DAVID – Ah não. Esse assunto de novo não.
REPORTER III – Por favor, senhor David, é importante.
DAVID -Importante para quem? Isso tudo é passado.
Minhas irmãs já morreram. Tudo isso ficou lá atrás.
REPORTER III – Mas é um passado que tem uma
importância muito grande para a história.
DAVID -Que história meu amigo?
REPORTER III – A história do espiritismo. Até onde eu sei,
suas irmãs foram as precursoras da comunicação com
espíritos.
DAVID – E daí?
REPORTER III – Não vê a importância que elas tiveram?
DAVID -Você vê? Tudo que sei é que esse acontecimento
destruiu nossa família. E sobretudo destruiu a elas.
REPORTER III -Imagino que deva ter sido difícil. Seu pai
era um pastor.
DAVID – Pobre de meu pai. Pobre da minha mãe...e ,
pobre das minhas irmãs.
REPORTER III – Eu não me apresentei, sou John Willians.
Trabalho no Boston Journal. Também sou espirita. E
também escritor. Ao menos tento.
DAVID – Senhor Willians, eu sou o membro menos
importante dos Fox.
REPORTER III – Que isso. Todos os Fox são importantes.
DAVID – Considerando que sou o único ainda vivo, eu até
posso entender.
REPORTER III - Tenho muito respeito por toda a história
de sua família, senhor Fox.
DAVID – É mesmo? Então sabe o que o mundo fez a elas.
REPORTER III – Em parte sim.
DAVID – Meu amigo, elas foram usadas por todos. Juntas
ou isoladamente elas foram exploradas, sugadas até a
alma e depois desacreditadas e esquecidas quando nada
mais poderiam render. Essa foi a vida das minhas irmãs. E
eu pergunto. Isso é vida?
REPORTER III – Sei que deve ter sido difícil.
DAVID- Multiplica isso que você imagina por mil e aí talvez,
poderá ter uma vaga ideia de tudo que passamos.
REPORTER III – Sabe-se que Margareth acabou sem
recursos.
DAVID – Minhas irmãs ganharam muito dinheiro. Muito
mesmo. Mas perderam tudo. Margareth viveu os últimos
anos de sua vida de favor, com uma amiga. Faleceu aos
sessenta anos por problemas cardíacos. Assim morreu a
última das irmãs.
REPORTER III – Soube que o senhor participou das
escavações na casa de Hydesville.
DAVID -Sim, mas nada foi encontrado.
REPORTER III – Nada na época. Foi encontrado
recentemente um esqueleto por crianças que brincavam no
local. E junto ao esqueleto foi achada uma lata de um
produto comumente usado por mascates. Está assim
confirmada a identidade do espirito de Hysville e também a
veracidade dos fenômenos das irmãs Fox. O Boston
Journal publicou a matéria. Por isso estou aqui.
DAVID – Pena que minhas irmãs já não mais existam.
REPORTER III -Elas chegaram ao fim da vida amigas?
DAVID- Amigas?
REPORTER III – Quero dizer, elas se entenderam, se
perdoaram?
DAVID – Acredito que numa outra dimensão sim, elas se
perdoaram. E devem estar juntas, vivendo a infância que
lhes foi roubada. Você não imagina como eram amigas e
unidas, no princípio.
REPORTER III -A que o senhor atribui a infelicidade pela
qual elas foram tragadas?
DAVID – Não sei. Acredito que elas não estavam
preparadas para tudo aquilo. Sabe lá o que é pegar duas
garotas humildes e coloca-las no centro de um furacão?
Elas não tinham mais vida. Viraram do dia pra noite
celebridades e depois...depois do depoimento da
Margareth as coisas pioraram muito. Elas passaram a ser
odiadas e mal faladas na mesma intensidade. Quem tem
estrutura pra suportar tudo isso meu amigo?
REPORTER III – Algo mais que o senhor queira declarar?
DAVID FOX – (citando Immanuel Kant) Muito breve, e o
tempo está próximo, será demonstrado que a alma humana
pode viver desde essa existência terrestre em comunicação
estreita e indissolúvel com entidades imateriais do mundo
dos espíritos; haverá fatos suficientes para provar que esse
mundo atua indubitavelmente sobre o nosso e lhe
comunica influências profundas das quais o homem atual
não tem consciência, mas que no futuro reconhecerá.

EPILOGO
SÍNTESE FINAL

Irmãs Fox reunidas em um outro possível plano da


existência.

MARGARETH – Sabe o que eu gostaria de fazer agora?


KATE- O que?
MARGARETH -Brincar como brincávamos quando éramos
crianças.
KATE – Eu também.
MARGARETH -Leah, lembra da música que nos ensinou?
LEAH – Qual delas?
MARGARETH – Do mestre André, lembra?
LEAH – Ah, sim, claro
KATE – Como era?
LEAH – (Canta) Foi na loja do Mestre André
Que eu comprei um pifarito
Tiro, liro, li, um pifarito
TODAS - Ai olé, ai olé, foi na loja do Mestre André!
Ai olé, ai olé, foi na loja do Mestre André!
MARGARETH- (Canta) Foi na loja do Mestre André
Que eu comprei um pianinho
Plim, plim, plim, um pianinho
Tiro, liro, li, um pifarito
TODAS - Ai olé, ai olé, foi na loja do Mestre André!
Ai olé, ai olé, foi na loja do Mestre André!
KATE –(Canta) Foi na loja do Mestre André
Que eu comprei um tamborzinho
Tum, tum, tum, um tamborzinho
Plim, plim, plim, um pianinho
Tiro, liro, li, um pifarito
TODAS - Ai olé, ai olé, foi na loja do Mestre André!
Ai olé, ai olé, foi na loja do Mestre André!

FIM

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