Você está na página 1de 4

Resenha Crítica

Referência:
BORGES, L. S. et al. Abordagens de Gênero e Sexualidade na Psicologia: Revendo
Conceitos, Repensando Práticas. Psicologia: Ciência e Profissão. v. 33, n. 3, p. 730-
745, 2013.
O artigo foi realizado pelas autoras Lenise Santana Borges, Alice de Alencar
Arraes Canuto, Danielle Pontes de Oliveira e Renatha Pinheiro Vaz. Dentre elas, a
psicóloga Lenise Santana Borges é doutora em psicologia social pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. As demais, também psicólogas, são graduadas pela
Pontifícia Universidade Católica de Goiás.
Lenise Borges é a autora que possui maior experiência. Ela tem vários trabalhos
publicados, incluindo artigos em periódicos, capítulos de livros, livros, resumos em
anais, e apresentou diversas pesquisas em congressos e seminários pelo Brasil. Sua
atuação em pesquisas é norteada principalmente pelos temas: práticas discursivas,
mídia, gênero e sexualidades.
As demais autoras fizeram parte de um projeto de pesquisa, intitulado “Desafios
para a formação profissional: a pesquisa sobre gênero e sexualidade nos cursos de
psicologia“, coordenado por Lenise Borges, que deu origem ao artigo que a presente
resenha aborda e que será discutido na sequência.
O artigo sintetiza um estudo sobre as diversas pesquisas realizadas no campo
acadêmico, produzidas no período datado entre 1993 e 2008, a cerca das noções de
gênero e sexualidade. Partindo disso pretendeu compreender: quais as teorias mais
frequentemente utilizadas na descrição dos objetos de estudo; quais os temas centrais
apresentados nos trabalhos encontrados; e, quais as lacunas e avanços existentes na
produção científica acadêmica. Para tanto, assumiu uma posição crítica quanto ao
suposto estatuto de verdade que as universidades conferem ao que se produz na ciência,
haja vista o poder que um discurso tem de formar/modelar o objeto de que fala.
O trabalho em questão fez uso de revisão sistemática da bibliografia produzida
pelos cursos de psicologia (graduação e pós-graduação) da PUC/GO e de análise
curricular de formação dos estudantes. O objetivo foi identificar ou não a presença de
disciplinas que tratam das questões de gênero e sexualidade e verificar qual a relação
que isso pode ter com o conteúdo abordado nas pesquisas que contém em seus títulos os
seguintes descritores: gênero, sexualidade, homossexualidade e/ou homossexual(is).
Foi possível perceber a partir da pesquisa que, quanto ao gênero, os estudos têm
sido orientados sempre por uma perspectiva binária, com base numa determinação
biológica do sexo. Deixando de considerar outros aspectos, tais quais, classe, raça,
geração, sexualidade e orientação sexual.
A conceituação de sexualidade, quando encontrada em alguns trabalhos, estava
sempre relacionada a uma representação de uma condição inata ou natural.
Já nos estudos sobre homossexualidade, as discussões variam entre estar
relacionada a uma escolha ou não. Para alguns, trata-se de um desejo, para outros, de
uma opção.
Com aparente rigor metodológico, que inclui leitura integral de todos os
trabalhados retornados da busca, descrição sistemática dos artigos encontrados e seleção
dos trechos considerados mais relevantes, a pesquisa em questão apresentou a
identificação dos repertórios e sentidos mais recorrentes quanto aos temas de gênero e
sexualidade.
Borges et al. (2013), autoras do artigo cuja análise está sendo realizada aqui, tem
interesse em analisar os discursos acadêmicos, pois supõem que os mesmos tem poder
de padronizar e restringir as possibilidades de expressão de gênero e sexualidade,
justificando o ponto de vista a partir da citação de Foucault (2004, p.55), onde afirma
que os discursos “formam os objetos de que falam”. Nesse sentido, destaca-se como
intuito das autoras a tentativa de fazer inferências quanto à qualidade da formação dos
estudantes de graduação e pós-graduação, a respeito das questões relacionadas à
desigualdade e diversidade, a partir de um apanhado de pesquisas produzidas pelos
estudantes de psicologia.
Para compreender as informações que a pesquisa apresenta, é necessário algum
grau de conhecimento de estatística para que seja possível a interpretação das tabelas e
dados coletados dos artigos retornados da busca que fizeram. É importante, também,
que o leitor esteja familiarizado com pesquisas desenvolvidas a partir de revisão
sistemática.
De maneira geral, o texto é bem escrito e bem estruturado. De modo que a
leitura não provoca entendimentos ambíguos e a apresentação dos dados fica clara
através das tabelas. Do início ao fim é possível perceber conexão entre os tópicos, sem
que algo pareça “solto” ou sem conexão com o objetivo do trabalho. Todos esses
atributos fazem com que a atenção permaneça voltada ao conteúdo da pesquisa,
instigando o leitor a se manter interessado até a conclusão.
O estudo foi realizado tomando como base o material científico produzido na
universidade e a base curricular dos estudantes em apenas uma instituição, dentre tantas
que oferecem o curso de psicologia, e, ainda assim, pretendeu que a pesquisa pudesse
orientar a reflexão sobre a prática do ensino de psicologia, desconsiderando as fronteiras
institucionais e regionais que lhe são impostas inevitavelmente.
Na atualidade, o fluxo de informações e as produções e inovações científicas
acontecem de maneira muito rápida e dinâmica, de modo que o artigo objeto dessa
resenha pode estar defasado, pois realizou o levantamento dos dados até o ano de 2008,
tendo sua publicação realizada em 2013. Aproximadamente sete anos separam o
momento atual da publicação do trabalho em questão. É possível que o cenário, mesmo
na PUC/GO, esteja diferente do que foi encontrado à época e que conclusões diversas
sejam encontradas por ocasião de um novo estudo semelhante ao que foi realizado pelas
autoras.
Elas (autoras) mencionaram que um dos objetivos do projeto foi verificar
lacunas e avanços quanto à produção de conhecimento científico, quando da
sistematização e conclusão do levantamento realizado. No entanto, não ficou claro se a
expectativa de avanço estava baseada numa dimensão qualitativa ou quantitativa. Em
contrapartida, a conclusão das autoras demonstra que não há avanço, mas lacunas,
justificando isso basicamente comparando a quantidade de material, pertinente ao tema,
que foi produzido na instituição de ensino e a quantidade total do que foi registrado no
banco de dados da universidade.
Se não se conhece a diversidade de temas que todos os artigos do banco de
dados têm armazenado, como seria possível fazer esse tipo de relação quantitativa? Para
saber se o percentual de ocorrência das pesquisas destinadas aos temas de gênero e
sexualidade é pequeno, seria interessante comparar com o percentual de ocorrência de
cada tema, distinto dos de interesse, encontrado nos artigos do banco de dados do curso
de psicologia.
Apesar de oferecer conhecimentos importantes, o artigo deixa a sensação de que
os dados coletados poderiam ter sido mais explorados. As conclusões foram
superficiais, deixando de extrair um saber mais aprofundado que corroborasse com o
objetivo almejado.

Você também pode gostar