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CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DO IMPACTO DAS INTELIGÊNCIAS ARTIFICIAIS

GERATIVAS NA FORMAÇÃO EM PSICOLOGIA NO BRASIL

uma análise bibliográfica e estudo PRISMA iniciais

Dra. Patrícia Junqueira Grandino


Professor do Programa de Pós-Graduação em Mudança Social e
Participação Política da Universidade de São Paulo - EACH-USP
E-mail patjg@uol.com.br

Me. Claudio Donizetti Brites da Silva


Estudante de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Mudança
Social e Participação Política da Universidade de São Paulo - EACH-USP
E-mail claudiobrites@gmail.com

Introdução
Este estudo se propõe a explorar o impacto das Inteligências Artificiais (IAs) gerativas na formação
em Psicologia no Brasil, numa perspectiva decolonial e crítica. A metodologia abarca: levantamento
bibliográfico e documental, análise sistemática de literatura através do estudo PRISMA, pesquisa
Snowball com aplicação de questionário na escala Likert a alunos e professores, seguida de
triagem, entrevistas semi-dirigidas com usuários de IA, e análise psicanalítica das entrevistas
baseada a teoria do laço social e dos cinco discursos de Lacan. O trabalho está subdividido em seis
etapas principais, desde a contextualização teórica até a análise crítica dos dados coletados, sendo
que até aqui, para a qualificação, foi realizado o levantamento bibliográfico, a análise histórica da
formação no país e o estudo PRISMA em bases de dados como BVS (Biblioteca Virtual em Saúde),
Periódicos CAPES, Dialnet, Scielo e Google Acadêmico.
Fundamentação teórica
A análise delineada neste estudo se estrutura sobre documentos oficiais que traçam o percurso da
Psicologia no Brasil, antes mesmo do seu reconhecimento enquanto profissão em 1962. A partir de
investigações relevantes conduzidas por autores como Ana Maria Jacó Vilela, Felipe Augusto
Leques Tonial, Oswaldo H. Yamamoto, Maria Emília Yamamoto, Carina Cavalcanti de Souza, entre
outros da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, dedicados à história da estruturação da
Psicologia no país, foi possível cruzar informações das esferas da educação e saúde, permitindo
um entendimento panorâmico da formação profissional no campo. A metodologia documental
adotada visou ancorar a investigação em um quadro histórico e institucional, fornecendo uma base
sólida para avaliar a emergente interação entre a Inteligência Artificial (IA) e a formação em
Psicologia.
A bibliografia central congrega obras que dialogam com IA, educação em Psicologia e perspectivas
decoloniais. O objetivo é promover uma análise que situe as tecnologias emergentes em um
contexto educacional e social mais amplo, com enfoque na descolonização do conhecimento e
práticas em Psicologia. As matrizes epistemológicas deste trabalho se ancoram em teorias críticas
e na Psicanálise Lacaniana, proporcionando estruturas analíticas para um exame aprofundado das
interações entre IA e educação em Psicologia, avançando na exploração das repercussões em uma
conversa multidisciplinar. A integração das IAs gerativas na formação e prática em Psicologia é uma
área de investigação em crescimento que exige uma compreensão abrangente de várias matrizes
epistemológicas.
A intersecção entre IA e Psicologia é rica e carrega consigo questões éticas e práticas
consideráveis. Fiske, Henningsen e Buyx (2019) iluminam as potenciais mudanças no
relacionamento terapêutico e nos protocolos de tratamento. Ossati (2020) e Turkle (1988) exploram
as correlações entre psicanálise e IA, propondo que a psicanálise pode oferecer insights valiosos
para entender os mecanismos de IA. Uchôa-de-Oliveira e Bastos (2021) conceituam a uberização
no Brasil, termo cunhado por Tom Slee (2019), para ajudar em uma crítica ao avanço das
tecnologias no campo das profissões.
Tem-se ainda as teorias psicanalíticas de Jacques Lacan (1985), seu estudo sobre Cibernética e a
origem da linguagem, que podem ser instrumentais para entender como as IAs gerativas
influenciam a subjetividade, bem como pode-se pensar sua produção e viés a partir da teoria dos
cinco discursos. Com uma visão mais técnica, Taulli (2020) e Russell, Norvig et al. (2022) oferecem
uma compreensão moderna da IA, elucidando os princípios fundamentais que dirigem essas
tecnologias e como elas podem ser aplicadas em diversos campos.
Esta fundação teórica entrelaça narrativas históricas, epistemológicas, éticas e técnicas, buscando
uma investigação da incorporação de IAs gerativas na formação em Psicologia no Brasil que seja
crítica e ciente do contexto social e político do país, e o papel dessa profissão nesse contexto.
Simultaneamente, destaca a necessidade de uma abordagem crítica e decolonial, que possa
responder às demandas emergentes da sociedade e do campo, em um cenário de rápidas
transformações tecnológicas e socioeconômicas.
Desenvolvimento do tema

A fase inicial da pesquisa englobou um levantamento documental a respeito da formação e do


estabelecimento da profissão no Brasil, proporcionando uma compreensão aprofundada do
panorama histórico e contemporâneo da Psicologia no país. A análise de documentos relevantes
oriundos tanto da esfera profissional da Psicologia quanto dos ministérios da Educação e da Saúde
revelou uma dicotomia persistente na formação: de um lado, uma inclinação ao tecnicismo e, de
outro, uma dedicação ao campo social e emancipatório dos sujeitos. Adicionalmente, identificou-se
uma narrativa colonial e neoliberal permeando a formação, que, na contemporaneidade, encontra-
se também influenciada por uma lógica uberizada e clientelista da formação.
Complementarmente, foi conduzido um estudo PRISMA com o objetivo de investigar a extensão em
que a Inteligência Artificial (IA) tem sido considerada no âmbito do ensino superior, especialmente
na formação em Psicologia. A pesquisa foi conduzida com critérios precisos para garantir uma
abordagem sistemática e compreensiva. Utilizando o DECS, foram selecionados os descritores
"Inteligência artificial", "Ensino Superior", “Universidade”, "Prática Psicológica", "Psicologia" e
“Estágio Clínico” para guiar a busca na literatura.
Foram exploradas diversas bases de dados para garantir uma ampla cobertura da literatura
existente, como BVS (Biblioteca Virtual em Saúde), Periódicos CAPES, Dialnet, Scielo e Google
Acadêmico. A estratégia de busca empregou o operador booleano AND para combinar dois ou três
descritores por vez, sempre incluindo o descritor "Inteligência artificial". As buscas foram restritas
aos últimos 10 anos, abrangendo título, resumo e assunto dos documentos, sem restrição de idioma
ou campo de estudo.
A aplicação desses critérios resultou na identificação de um conjunto de publicações e dissertações
que lançam luz sobre a interação entre IA, ensino superior e prática psicológica. O uso de múltiplas
bases de dados e a combinação de descritores permitiram um levantamento bibliográfico ainda
escasso, que oferece uma visão inicial sobre como a IA gerativa está sendo incorporada ou
discutida no contexto da formação superior em Psicologia.
Os resultados variaram significativamente. Na BVS, as combinações de "Inteligência artificial" com
"Ensino Superior" e "Universidade" renderam 67 e 69 resultados, respectivamente. No entanto, a
inclusão de termos relacionados à Psicologia reduziu drasticamente o número de resultados, com
13 resultados para a combinação com "Psicologia" e nenhum para "Prática Psicológica" e "Estágio
Clínico". Nos Periódicos CAPES, a situação foi semelhante, com 1150 resultados para combinações
envolvendo "Universidade", mas uma ausência de resultados quando "Prática Psicológica" e
"Estágio Clínico" foram incluídos. Na Dialnet, houve 214 resultados para "Inteligência artificial" AND
"Universidade", mas apenas um ou nenhum resultado para as combinações com "Prática
Psicológica" e "Estágio Clínico". Na Scielo, o máximo foi de 6 resultados para "Inteligência artificial"
AND "Universidade". No Google Acadêmico, as combinações com "Ensino Superior" e
"Universidade" apresentaram um alto número de resultados, com 201 e 1060 resultados,
respectivamente. As combinações com "Psicologia" renderam 65 e 224 resultados,
respectivamente, mas, assim como nas outras bases de dados, a busca por "Prática Psicológica" e
"Estágio Clínico" rendeu poucos ou nenhum resultado.
Este estudo PRISMA evidenciou um interesse considerável pela IA no ensino superior e na
Psicologia. No entanto, ressaltou a necessidade de mais investigações focadas na prática
psicológica e no estágio clínico, áreas cruciais para a formação em Psicologia. Os achados
proporcionam uma base sólida para investigações futuras, além de ajudar a contextualizar o cenário
da pesquisa atual, evidenciando tanto a relevância do tema escolhido quanto as lacunas existentes
na literatura que esta pesquisa busca preencher.
Tais levantamento iniciais pavimentam o caminho para as etapas subsequentes da pesquisa. A
próxima fase envolverá uma pesquisa Snowball, que buscará capturar as percepções de docentes
e discentes sobre as IAs gerativas na formação em Psicologia. Esta etapa será crucial para
compreender como a comunidade acadêmica está navegando na interseção entre a IA e a formação
em Psicologia, e quais são as implicações percebidas desta interação.
Posteriormente, a fase de triagem e entrevistas semi-dirigidas com usuários de IA fornecerá uma
compreensão mais aprofundada das experiências práticas e percepções dos participantes. As
entrevistas buscarão elucidar como a IA está sendo incorporada na prática educacional e quais são
os impactos percebidos na formação dos estudantes de Psicologia.
Finalmente, a análise psicanalítica das transcrições das entrevistas proporcionará uma
compreensão crítica e reflexiva sobre as respostas dos participantes. Utilizando a teoria do Laço
Social e dos Cinco Discursos de Lacan como base analítica, esta fase buscará desvendar as
complexas dinâmicas em jogo na interação entre IA e formação em Psicologia e seu impacto na
formação e na própria estrutura da imagem da Psicologia, promovendo uma discussão crítica das
descobertas, explorando as implicações e contribuições para o campo da Psicologia e o uso de IA
na educação.
Conclusões
A fase inicial deste estudo proporcionou uma visão elucidativa do tecido histórico e contemporâneo
que configura a formação em Psicologia no Brasil, bem como a presença embrionária da Inteligência
Artificial (IA) nesse cenário educacional. O levantamento documental revelou uma formação
bifurcada entre tecnicismo e compromisso social, permeada por narrativas coloniais e neoliberais,
e agora, enfrentando a emergência de uma lógica uberizada. Por outro lado, o estudo PRISMA,
embora revelasse um interesse tangível na interseção da IA com o ensino superior e a Psicologia,
destacou uma lacuna significativa quando a investigação se aprofundava na prática psicológica e
no estágio clínico, evidenciando uma necessidade premente de mais investigações nesse âmbito.
Os resultados variados, derivados da exploração de várias bases de dados, não apenas validam a
relevância do tema proposto, mas também sublinham a exigência de uma exploração mais
aprofundada. Este mapeamento inicial é fundamental para orientar as fases subsequentes da
pesquisa, que se dedicarão a sondar as percepções da comunidade acadêmica sobre as IA
gerativas e aprofundar a compreensão sobre suas implicações práticas através de entrevistas e
análise psicanalítica. Tais esforços convergem para um entendimento mais crítico e reflexivo sobre
a interação entre a IA e a formação em Psicologia, visando não apenas desvendar as dinâmicas
complexas em jogo, mas também contribuir para um diálogo mais informado e crítico sobre a
integração ética e responsável das IAs na formação da profissão no Brasil.
Referências bibliográficas
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NAU Editora, 2013.
LACAN, J. Psicanálise e cibernética ou sobre a natureza da linguagem. In.: ______. O Seminário,
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MIGLIEVICH-RIBEIRO, A. Por uma razão decolonial: Desafios ético-político-epistemológicos à
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https://www.scielo.br/j/civitas/a/LhdvrTHy73MP8sxQQqK4QDR/. Acesso em: 10 de outubro de
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RUSSELL, Stuart J.; NORVIG, Peter. Inteligência Artificial: Uma Abordagem Moderna. Formato
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TONIAL, F. A. L. Uma análise documental da formação em psicologia no Brasil:
desdobramentos da reforma curricular dos anos de 1990. 2014. Dissertação (Mestrado em
Psicologia) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2014. Disponível em:
https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/123295. Acesso em: 10 de outubro de 2023.

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