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ASSIM VAI A...

DTM E DOR OROFACIAL - DIAGNÓSTICO, TRATAMENTO


E A IMPORTÂNCIA DE UMA EQUIPA MULTIDISCIPLINAR
Uma abordagem multidisciplinar sobre o diagnóstico e tratamento da Disfunção Disfunção
Temporomandibular (DTM) e a Dor Orofacial (DOF)
entre outros profissionais que, dependendo do caso, da sua
1. O que o levou a enveredar por está área?
gravidade/complexidade e da existência de comorbilidades,
2. Qual a prevalência e os principais fatores etiológicos da dor orofacial?
poderão ter um contributo a dar (como a cirurgia maxilo-fa-
3. A oclusão é transversal a todas as especialidades na medicina dentária. De que modo contribuem as disfunções
cial, a reumatologia, a psicologia e a psiquiatria, a neurolo-
temporo mandibulares para a dor orofacial? gia entre outras).
4. Que especialidades são importantes para abordar o doente numa perspetiva multidisciplinar e conseguir uma Na Orisclinic há muito tempo que instituímos uma aborda-
boa comunicação? gem multidisciplinar, em que frequentemente o paciente é
5. Indique as DTM`S musculares e articulares mais comuns. Qual o processo de diagnóstico e plano de tratamento observado conjuntamente por mais do que um profissional,
adequado? dentro do mesmo espaço físico, partilhando uma linguagem
6. A maioria dos doentes que recebe são encaminhados por outros colegas ou diagnosticados por si? Estes e uma perspetiva de abordagem comum. A comunicação só
pacientes procuram diretamente esta consulta especializada ou chegam por outros motivos? é eficaz se todos os profissionais dominarem um conjunto de
7. Quais as técnicas desenvolvidas mais recentemente para esta área? conhecimentos relativos à sua área de atuação sobre deter-
minada patologia, partilharem uma linguagem comum, e
transmitirem adequadamente essa informação através do
Júlio Fonseca fisiopatológico das DTM é influenciado tanto localmente, por processo clínico. Assim, como estamos todos dentro do mes-
Médico Dentista, Pós-Graduado em Reabilitação fatores neuromusculares e fisiológicos relativos aos múscu- mo espaço físico, isso agiliza a comunicação. A qualidade
Oral Protética, Mestre em Patologia Experimental
los mastigatórios e à anatomia da ATM, como sistemicamen- dos registos clínicos também é essencial, visto que dessa
e aluno do Doutoramento da FMUC; Presidente
da Sociedade Portuguesa de Disfunção Temporo-
te, nos sistemas de regulação da dor. forma, quando essa informação é transmitida entre profis-
mandibular e Dor Orofacial (SPDOF) entre 2018- sionais, quanto mais completa estiver melhor será a com-
2021; Responsável pela consulta de Dor Orofacial 3. A era dos “fatores oclusais específicos” como agentes preensão de todos.
e Disfunção Temporomandibular da OrisClinic etiológicos de DTM terminou. Não existe uma relação sim-
(Coimbra) e Centro Visages (Viseu).
ples de causa e efeito que explique a associação entre oclu- 5. As DTM musculares mais comuns são a mialgia locali-
são e DTM. No entanto a controvérsia gerada em torno do zada e a dor miofascial. No campo articular teremos por sua
1. A sintomatologia dolorosa orofacial é uma das causas papel dos fatores oclusais na patogénese das DTM está lon- vez a artralgia e os deslocamentos discais.
mais comuns da procura do médico dentista. Em cerca de ge de terminar. Apesar da importância dos fatores oclusais Os tratamentos sugeridos para as DTM variam bastante
10% das consultas por queixas de dor, a causa é não odon- não ser tão grande quanto se pensava, não se pode excluir entre um grande espectro de modalidades. Na verdade,
togénica. Assim a elevada ´´demanda´´ dos nossos pacientes, totalmente este fator. nenhum tratamento é universalmente eficaz para todos os
bem como a necessidade de estabelecer um correto diag- Ao longo dos anos foram publicados inúmeros estudos, pacientes em todos os momentos. A seleção do tratamen-
nóstico diferencial, acabaram por me motivar a estudar e apresentando dados a favor, contra ou até dados incon- to mais eficaz inicia-se com uma compreensão profunda do
a dedicar-me exclusivamente a esta área. Para além disso, gruentes e duvidosos. Em resumo, pode concluir-se que, distúrbio e da sua etiologia. É essencial conhecer os vários
esta área tem um foco muito importante no diagnóstico, algumas associações significativas entre as variáveis oclu- tipos de tratamento (e os distúrbios musculares e articulares
essencialmente através da história clínica, e o ´´método´´ e sais e a DTM foram ocasionalmente descritas, mas não são tratam-se de forma distinta) para lidar de maneira eficaz
´´pesquisa´´ com enfoque na relação médico/paciente sem- consistentes entre os estudos (ou seja, relatadas na maioria com os sintomas, assim como a adequada evidência cientí-
pre foi muito motivador para mim. das pesquisas), pelo que os clínicos são encorajados a aban- fica que os deve suportar para cada indicação. O tratamento
donar o antigo paradigma gnatológico na prática de DTM. conservador e não invasivo é considerado como o de eleição
2. As DTM apresentam-se como uma das alterações mús- Parece claro que muitas má-oclusões específicas são numa fase inicial, dado que a sintomatologia é habitualmen-
culo-esqueléticas mais frequentes, representando primaria- comumente encontradas na população livre de sintomas e te reduzida através da utilização conjunta de goteiras oclu-
mente dor e incapacidade para os doentes. São consideradas que os fatores oclusais devem ser encarados como cofato- sais, fisioterapia e medicação.
a causa mais comum de dor orofacial de origem não-dentá- res, a ser avaliados e tidos em conta, mas não como causas
ria. Nos Estados Unidos da América (EUA) apenas as DTM diretas. 6. A maioria dos doentes que recebo são encaminhados por
apresentam uma prevalência global de 5% a 15%, estando Para entender o papel da oclusão na DTM, o clínico deve colegas, de várias especialidades (desde a medicina dentária
os custos anuais médios afetos a esta patologia estimados compreender os muitos fatores que podem influenciar a fun- à neurologia, passando pela ORL e CMF). Muitas das vezes
nos 4 biliões de dólares. Em adultos, a DTM é duas vezes ção deste sistema complexo. Em consequência, a aborda- existe uma suspeita de DTM ou DOF, embora ainda não exista
mais prevalente no sexo feminino do que no masculino (2:1) gem oclusal não deve ser entendida e encarada para trata- um diagnóstico definitivo, que depois só é feito na consulta.
em estudos de base populacional e 4:1 ou mais entre os mento ou prevenção das DTM. No meu caso específico os pacientes já vêm direcionados
casos clínicos de DTM dolorosa. para a minha consulta, muitas vezes referenciados por cole-
É amplamente aceite uma etiologia multifatorial que 4. As DTM e a DOF são variadas como entidades noso- gas com um diagnóstico provisório. No entanto também é
resulta de um padrão complexo de interação entre fatores lógicas, multifatoriais e podem ser objeto de tratamentos comum consultarmos pacientes por outros motivos (reabi-
sistémicos (fatores psicossociais, genéticos, hormonais e muito variados, também por esse motivo. Nos dias de hoje litações protéticas ou ortodônticas por exemplo) e detetar-
neurológicos) e fatores anatómicos (morfologia facial, micro é internacionalmente aceite que este grupo de patologias mos a necessidade de uma avaliação cuidada em termos de
e macrotrauma, entre outros). O resultado de várias décadas deva ser abordada por uma equipa multidisciplinar, liderada DTM e DOF, pois o paciente poderá muitas vezes apresentar
de estudos epidemiológicos sugere que o complexo padrão pelo médico dentista e complementada pelo fisioterapeuta, sinais e sintomas (frequentemente sub-clínicos) relevantes.

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7. Não existem técnicas muito “recentes” utilizadas na zação de acupunctura, e sempre que se considere vantajoso, a existência de monómero residual, com ajustes em cadeira
abordagem dos pacientes com DTM. No entanto existem esta deve ser incluída num plano de tratamento abrangente, muito reduzidos e uma enorme estabilidade do material –
algumas vias de investigação que poderão ser promisso- com as vantagens já indicadas. e se quisermos, sem sequer requerer impressões, bastando
ras das quais destacaria o estudo do genoma e dos fatores Conclui-se então que a acupuntura apresenta grande inte- usar um scanner intra-oral e enviar para o laboratório. Para
genéticos potencialmente envolvidos, por forma a permitir resse no tratamento da DTM e dor orofacial, devendo estar mim é um privilégio poder contar com uma equipa labora-
identificar os pacientes e os fatores de risco para desenvol- integrada nas opções terapêuticas disponíveis para o trata- torial que já há alguns anos me permite entregar aos meus
ver ou cronificar uma DTM. mento destas patologias. doentes aquilo que a tecnologia de melhor oferece.

Carlos Miguel Marto Marco António Loureiro Paula Moleirinho Alves


Mestrado Integrado em Medicina Dentária, Facul- Mestrado em Medicina Dentária pela Faculdade Doutoranda na FMH; Especialista em Fisiotera-
dade de Medicina da Universidade de Coimbra de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC); pia; Mestre em Reabilitação Neurológica - espe-
(FMUC); Assistente Convidado, FMUC; Aluno de Assistente Convidado das disciplinas de Reabilita- cialidade para fisioterapeutas; Pós-Graduada em
doutoramento, FMUC; Pós-graduado em Acupunc- ção Oclusal e Fisiologia do Sistema Estomatogná- Oclusão, DTM e Dor Orofacial ; Pós-Graduada em
tura em Medicina Dentária e em Investigação Bio- tico do Mestrado Integrado em Medicina Dentá- Fisioterapia Cervico-Crâneo-Mandibular ; Práti-
médica, FMUC; Investigador no Instituto de Inves- ria da FMUC desde 2015; Assistente Convidado da ca privada em Dor Orofacial e DTM desde 2009;
tigação Clínica e Biomédica de Coimbra (iCBR). disciplina de Reabilitação Oclusal da Pós-Gradua- Docente na ESSEM desde 2007.
ção em Reabilitação Oral Protética da FMUC desde
1. A especialização nesta área resul-
2015; Pós-Graduado em Acupunctura Médica Dentária pela FMUC.
7. A acupunctura não é uma prática recente, sendo uti- tou de uma necessidade pessoal, uma vez que eu tenho
lizada pela Medicina Tradicional Chinesa há milénios. No Disfunção TemporoMandibular (DTM), e durante a manifesta-
entanto, a sua utilização na medicina ocidental e sobretudo 1. O desafio diagnóstico e a gratificação dos doentes. Foi ção dos primeiros episódios não encontrei respostas que me
na medicina dentária iniciou-se de forma clara apenas na por isso que, quando a Sra. Professora Maria João Rodrigues permitissem controlá-los. Esta ausência de soluções conduziu-
segunda metade do século XX, tendo vindo a expandir-se me abordou para integrar a sua equipa aceitei de bom gra- -me na procura de estratégias de intervenção e à descoberta
desde então. do. É desafiante e estimulante tratar um doente com dor desta área da fisioterapia. Contudo o que me fez ficar foi o pri-
A incorporação da acupunctura na medicina ocidental, orofacial. vilégio, de pela primeira vez, ter integrado uma equipa multi-
deu origem ao conceito de acupuntura médica, que define disciplinar onde os resultados atingidos são muito superiores
uma acupunctura contemporânea e que incorpora conheci- 2. Importa desde logo “separar as águas” e referir que aos obtidos quando se trabalha individualmente.
mentos de anatomia, fisiologia, entre outros. existe dentro da dor orofacial aquela que é odontogénica e
Os bons resultados obtidos pela acupuntura no tratamen- a dor orofacial não-odontogénica. Ao passo de que na pri- 2. A dor orofacial é bastante comum e pode ter diferentes
to de várias patologias são reconhecidos pela Organização meira, temos um factor etiológico bem definido envolvendo causas fisiopatológicas como a DTM, a nevralgia do trigé-
Mundial de Saúde (OMS) que a indica no tratamento de um ou vários dentes, na segunda poderemos ter “dores nos meo, as cefaleias, causas odontogénicas e traumáticas ou as
mais de 60 patologias, nas quais se incluem a dor orofacial dentes” e não só. Esta dor pode abranger parte da face e/ou dores faciais idiopáticas persistentes. Muitas destas causas
(incluindo distúrbios craniomandibulares), dor em medicina cavidade oral, envolvendo os mais diferentes componentes podem apresentar etiologias multifatoriais.
dentária (incluindo dor dentária e disfunção temporomandi- do sistema estomatognático e muitas das vezes é crónica,
bular (DTM)) e outras patologias associadas como enxaque- multifactorial, complexa e debilitante. 3. Enquanto fisioterapeuta a oclusão não é a minha área
ca e dor na região cervical (em Acupuncture: Review and de intervenção, contudo aquilo que atualmente a literatura
Analysis of Reports on Controlled Clinical Trial, OMS). 3. Resgatando a natureza multifactorial da dor orofacial e científica nos indica é que a oclusão não é um fator determi-
De facto, a utilização da acupuntura no tratamento de das disfunções temporo-mandibulares, a oclusão e a relação nante para a dor orofacial, pode em situações específicas ser
DTM e dor orofacial, são as aplicações mais relatadas e com das arcadas dentárias mantém a sua importância no diag- considerada um fator de risco, mas na maioria das vezes o
maior sucesso na medicina dentária. Dentro da sua aplicação nóstico e tratamento, embora não de forma exclusiva na aparecimento de sintomas resulta de um somatório de fato-
nestas patologias, a acupunctura promove vários efeitos de maioria dos casos, como já foi comprovado por factos cien- res predisponentes e não apenas de fatores isolados.
interesse. tíficos. Contudo, é uma das “fatias do bolo” e não podemos
O efeito analgésico possibilita uma diminuição da sen- negar a importância do seu contributo, a título de exemplo, 4. Esta é definitivamente uma área em que a abordagem
sação de dor, contribuindo para o conforto do doente. Este nas regras de elaboração de goteiras oclusais em CAD/CAM. deve ser multidisciplinar e que deve incluir para além da
efeito está associado a uma outra vantagem, como a dimi- fisioterapia, a medicina dentária, a otorrinolaringologia, a
nuição ou eventual eliminação da necessidade de utilização 4. Como referi, a dor odontogénica faz parte da dor oro- cirurgia maxilo-facial, a neurologia, a psiquiatria, a fisiatria
de fármacos. O efeito anti-inflamatório localizado encontra- facial e é indiscutível a necessidade da avaliação médico- e a psicologia. Os profissionais, devem sempre que possível,
-se bem descrito, com a libertação de mediadores anti e pró- -dentária. Mas para comunicarmos, temos todos de falar a comunicar entre si pessoalmente e quando relevante devem
-inflamatórios, contribuindo para reduzir a inflamação local. mesma língua e é de salientar o crescente interesse nesta ser realizadas reuniões de equipa.
A acupuntura apresenta também efeito de relaxamen- área, que leva colegas das mais diferentes especialidades a
to muscular, que pode ser explorado quer a nível local nos comunicar entre si e a relatar os seus desafios e dificuldades. 5. As DTMs musculares mais comuns são as mialgias e
músculos mastigadores, quer a nível sistémico em cadeias as articulares são os deslocamentos anteriores de disco,
musculares associadas, como os músculos da região cervical 6. Felizmente, a maioria dos doentes são referenciados, a osteoartrose e a osteoartrite. No que concerne ao trata-
ou fáscias musculares cranianas. Quando existentes, a reso- numa fase precoce, embora ainda receba doentes que pas- mento da fisioterapia, a evidência científica existente neste
lução de pontos-gatilho musculares é um fator importante saram por diferentes áreas sem um diagnóstico para a sua momento mostra-nos que a melhor abordagem é a multi-
no tratamento da DTM, sendo que estes são fatores preci- dor. A dedicação cada vez maior a esta área trouxe-me modal que se centra na tríade educação, exercícios terapêu-
pitadores e perpetuantes da patologia. Ao mesmo tempo o doentes com patologias relativamente raras numa prática ticos e terapia manual.
relaxamento muscular permite ultrapassar outras situações generalista. Tal acontecimento, levou a que tivesse de estu-
associadas à DTM, como por exemplo o trismus ou as enxa- dar e observar o caso clínico, para além do que muitas vezes 6. O diagnostico é sempre médico, uma vez que o diag-
quecas de causa muscular. pensamos ser a causa. Acredito que a nossa especialização nóstico em fisioterapia é sempre funcional e não fisiopato-
Por último, o efeito calmante sistémico, atuando no sis- só traz benefícios para o doente. lógico. Os pacientes que chegam são sempre encaminhados
tema nervoso, permite uma redução da ansiedade nestes por outras especialidades, sendo na maioria das vezes por
doentes, contribuindo para o sucesso terapêutico. 7. No que se refere à tecnologia, referi anteriormente as medicina dentária.
Assim, após o correto diagnóstico da patologia por parte goteiras oclusais elaboradas por técnicas de CAD/CAM. O fac- Atualmente já existem doentes que chegam direciona-
do médico dentista, deve ser avaliada a vantagem na utili- to de fazermos um tratamento com menos imprecisões, sem dos para a consulta de dor orofacial, contudo, ainda exis-

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tem muitos pacientes a procurar outras especialidades como quente e acreditamos que lidamos por vezes com subdiag- mo, contribuindo para evitar o agravamento da patologia ou
a medicina dentária, a otorrinolaringologia e a neurologia, nósticos. aumentar a perceção do real estado do doente.
uma vez que os sintomas são muito variados e podem incluir 3. Este é talvez um dos temas mais polémicos e apesar de O intensificar do trabalho multidisciplinar real foi outro
otorrinolaringologia, dor numa peça dentária, cefaleia, limi- estar já amplamente publicado e provado que a etiologia da grande campo onde houve uma inovação. Só recentemente
tação da abertura bucal entre outros. Nestes casos são as DTM é multifatorial e que a oclusão representa um fator de foram criadas equipas funcionais de profissionais de saúde
especialidades, que após avaliação, procedem ao encami- agravante minor, continua a ser muitas vezes usada a justi- que permitiram que técnicas que estavam separadas pudes-
nhamento para a consulta de dor orofacial. Contudo, conti- ficação da má oclusão para culpar o aparecimento da DTM. sem ser usadas de uma forma altamente eficaz para o doen-
nua a haver a necessidade de realizar uma divulgação junto Temos de ter noção que temos muita gente com uma oclu- te, tais como a viscosuplementação com ácido hialurónico
de todos os profissionais de saúde. são longe da ideal sem qualquer tipo de disfunção e muita juntamente com a fisioterapia de manipulação mandibular.
gente com uma oclusão aparentemente ideal com proble- As duas separadas são úteis, mas juntas exponenciam o
7. Na área da fisioterapia não se pode falar na inovação mas graves de oclusão, como tal é importante perceber que resultado para o doente e isto é inovador.
de técnicas, mas sim nos conhecimentos que a evidência nos temos fatores predisponentes, agravantes e perpetuantes e
trouxe sobre o papel do sistema nervoso central na área dos é o equilíbrio destes que interfere com a DTM.
mecanismos de dor, e sobre a relevância do sono, dos exer- Ricardo Santos
cícios e da educação para o seu controlo. A evidência atual 4. Eu tenho a sorte de trabalhar com equipas multidisci- Terapeuta da Fala no Hospital Privado da Trofa, SA
e no Hospital CUF, Porto. Professor Adjunto Con-
sobre dor crónica indica-nos que a mesma se encontra muito plinares em permanência, posso dizer que é imprescindível
vidado na ESS do Porto. Professor Convidado em
mais relacionada com o processamento da informação noci- para mim trabalhar com um fisioterapeuta em permanência. Pós-Graduações nas áreas da Ortodontia e Cirur-
ceptiva do que com o estado periférico dos tecidos, o que A nível de outras especialidades, tenho o privilégio de estar gia Ortognática. Especialista em Terapia e Reabili-
constitui uma importante mudança de paradigma. em serviços hospitalares onde fazemos reuniões de serviço, tação. Comissão Científica da SPDOF.
onde me articulo com a psicologia, psiquiatria, anestesia,
neurologia, fisiatria, otorrinolaringologia, cirurgia maxilo-fa- 1. Essencialmente o trabalho de proxi-
André Mariz cial ou reumatologia. midade e integrado com a medicina dentária em diferen-
Licenciatura em Medicina Dentária pelo ISCSEM; tes áreas de atuação como a odontopediatria, a ortodontia
Mestrado em Medicina Dentária pelo ISCSEM;
5. Quando falamos de DTM articular falamos essencial- e a prostodontia. Foi uma necessidade que sentimos no tra-
Doutorando na Universidade de Granada; Assis-
tente na Disciplina de Reabilitação Oral I e II da
mente de patologias e de disfunções intrarticulares com balho interdisciplinar e que nos permitiu prestar cuidados
licenciatura de Medicina Dentária e do mestra- deslocamento de disco com ou sem redução, com ou sem especializados e diferenciados. Obviamente que o desafio
do integrado em Medicina Dentária na disciplina bloqueio, que poderão ou não estar associada a patologia de trabalhar nesta área constituiu, por si só, uma motivação
de Dor Orofacial e ATM no ISCSEM, desde 2005; degenerativa com ou sem dor. para uma melhor compreensão da etiologia multifatorial e
Professor assistente do Curso internacional em
AS DTMs musculares mais comuns são as mialgias que são fisiopatologia da disfunção temporomandibular (DTM) e dor
Disfunção Temporomandibular e dor Orofacial
Lisboa/Brasil - Facsete /Ciodonto; Autor e co-autor de diversos artigos
usualmente locais mas em casos de alteração de sensibili- orofacial.
científicos/trabalhos publicados em revistas/congressos nacionais e zação central usualmente, mas que, em casos de alteração
internacionais; Conferencista e docente de cursos nas áreas da Pros- de sensibilização central, se transforma em dor miofascial. O 2. A articulação temporomandibular (ATM) é uma das arti-
todontia, Dor Orofacial e Disfunção Temporomandibular; Prática clínica diagnóstico é essencialmente baseado em entrevista e exa- culações mais complexas e desempenha um papel funda-
exclusiva em Dor Orofacial, no Centro Clínico SAMS/SIBS. me clínico, podendo recorrer a algum tipo de exame ima- mental em funções como mastigação, fonação e deglutição,
giológico. de relação direta com as áreas de intervenção da terapia da
1. A minha entrada na área da DTM foi totalmente ocasio- fala. As alterações na ATM podem ter uma multiplicidade de
nal, houve um convite do regente da cadeira de DTM quando 6. Uma vez que me dedico em exclusivo a DTM, dor orofa- manifestações, de cariz músculo-esquelético e neuromuscu-
acabei o curso e foi paixão imediata. Desde aí, esta área cial e sono, os meus doentes são praticamente todos reen- lar. A sua etiologia está comumente associada a alterações
tem sido sem dúvida, uma das mais fascinantes da medicina caminhados por colegas, aliás é outra forma de trabalhar oclusais, posturais, hábitos parafuncionais, situação emo-
dentária para mim. em equipa, com os inúmeros médicos dentistas, cirurgiões cional (stress e ansiedade), alterações articulares e do disco
É uma área de grande intensidade, onde lidamos com dor, maxilo faciais, estomatologistas, médicos, fisioterapeutas, (entre outras). Quanto à prevalência, com base na casuísti-
com doentes que por vezes têm dor há anos sem percebe- terapeutas da fala entre outros que me encaminham doen- ca clínica, é mais frequente no género feminino e sobretudo
rem o porquê e pacientes com fortes limitações nas fun- tes, e os mesmos são reencaminhados após estarem con- entre os 20 e os 40 anos. Do ponto de vista clínico e de inves-
ções mais básicas da ATM como comer, sorrir ou bocejar. É trolados da sua disfunção. É um privilégio e um motivo de tigação ainda não existe um consenso quanto à etiologia da
igualmente uma área que tem experienciado uma evolução orgulho este trabalho em equipa e esta confiança extrema DTM. De facto, raramente uma condição clínica de DTM (sinais
incrível durante estes cerca de 20 anos de trabalho com a no meu trabalho pelos meus pares e profissionais de saúde e sintomas) se associam a uma só etiologia. Como exemplo, é
enorme vantagem de trabalharmos com inúmeras especia- que me enviam doentes de vários sítios. frequente pacientes com DTM terem associadas perturbações
lidades, o que sendo médico dentista, nos torna menos soli- Com o aumento do acesso à informação sobre a temática ao nível do sono e parafunções na vigília.
tários e parte de uma grande equipa. da dor orofacial e DTM a nível dos media e redes socias, exis-
tem já muitos doentes que chegam diretamente para a con- 3. O modelo de diagnóstico da dor orofacial e DTM deve-
2. Quando falamos de dor orofacial temos de ter noção sulta de disfunção temporomandibular, de bruxismo ou mes- rá ser o modelo biopsicossocial, pelo que a par dos fatores
que estamos a falar de uma área enorme que vai desde mo dor e infelizmente, somos muitas vezes ainda o fim da biológicos (como oclusão dentária) deverão ser considera-
uma simples dor de dentes até à nevralgia de trigémio ou à linha. Quando chegam até nós, já foram a otorrinolaringolo- dos outros fatores, como os psicológicos e sociais. Assim, as
DTM. Se organizarmos as causas de dor orofacial, permitam- gia, neurologia, medicina dentária ou medicina geral e fami- teorias meramente ‘mecanicistas’ tornam-se redutoras para
-me sugerir o capitulo inicial do segundo livro da Sociedade liar. É importante reforçar a informação sobre esta área junto a realização de um diagnóstico adequado da situação clíni-
Portuguesa de Dor Orofacial e Disfunção Temporomandibu- das especialidades da área da saúde e junto dos doentes. ca do paciente. Um diagnóstico adequado passará por uma
lar, onde adaptamos o esquema da Professora Joanna Zakr- abordagem interdisciplinar no momento da compreensão e
zewska que organiza as causas de dor orofacial em idiopá- 7. Neste momento, a nível de inovação, podemos falar definição da sua fisiopatologia. A comunicação efetiva entre
ticas, vasculares, musculo esqueléticas, neuropática e dores sobre dois grandes campos que é a aplicação da terapia as diferentes valências que atuam nesta condição (medicina
de cabeça primárias. Normalmente falamos de etiologia comportamental na dor orofacial e disfunção temporoman- dentária, fisioterapia, terapia da fala, cirurgia maxilo-facial,
multifatorial, sendo que a nível de prevalência é bastante dibular, através da utilização de uma série de aplicações de entre outras) irão fomentar um diagnóstico diferencial mais
variável dependendo do tipo de dor, mas é bastante fre- telefone que monitorizam a dor ou hábitos como o bruxis- adequado.

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SBDOF(Sociedade Brasileira de Dor Orofacial), Membro do Board edi-
4. Sendo uma alteração multifatorial e complexa, as áreas torial do International Journal of Clinical Anesthesiology, Membro do e algumas condições oclusais, classificadas como oclusão
clínicas com possibilidade de atuação neste domínio são Board editorial do Journal of Anesthesia & Perioperative, Membro do de risco para DTM. Todos estes aspetos, tornam-na extre-
também diversas e podem passar pela medicina dentária, Board editorial do Journal of SciTz Dentistry: Research & Therapy Mana- mamente complexa, exigindo do profissional o entendimen-
fisioterapia, cirurgia maxilo-facial, terapia da fala, psicolo- gement,Membro do Board editorial of the Journal of Oral Health and to destes fatores, podendo ser classificados como de risco,
Dental Care , Membro do Board editorial do Journal of Cosmetology &
gia, reumatologia, medicina do sono, otorrinolaringologia, como também agravantes.
Oro Facial Surgery, Membro do Board editorial do Journal of Anesthe-
entre outras. Uma boa comunicação consegue-se pela parti- sia-Intensive care and pain therapy. Tradutor e revisor científico do livro
lha de um mesmo ‘código’ (terminologia, provas de avalia- texto “Clinical Management of TMD and OFP” – Richard A. Pertes and 3. Sabemos que a obtenção de uma oclusão ideal ou fun-
ção, entre outros) e a definição de canais de comunicação Sheldon G. Gross), Sócio Honorário e membro correspondente no Brasil cional é objetivo de muitas especialidades da medicina den-
eficazes, tendo sempre o paciente no fulcro deste sistema. da Sociedade Portuguesa de Dor Orofacial e Disfunção Temporoman- tária, como por exemplo a ortodontia, a prótese, a reabilita-
dibular,Responsável pelo do Núcleo de Dor Orofacial e DTM do Serviço
ção oral, a dentisteria, entre outras.
Mais Saúde do Hospital Mater Dei – Belo Horizonte – MG,Pesquisador
5. No diagnóstico das DTM’s é fundamental a recolha de internacional e membro do CIIEM(Centro de investigação internacional Os anos 80 e 90, foram marcados dentro da medicina den-
uma história clínica abrangente e relacionar esses aspe- da Faculdade Egas Moniz – Lisboa – Portugal. Artigos publicados em tária, como sendo a oclusão o principal fator responsável
tos com a queixa do paciente e sinais e sintomas relatados periódicos nacionais e internacionais, conferencista no Brasil e exterior. pela origem de uma DTM. Este conceito ainda tem um forte
e observados pelo exame clínico. De forma a uniformizar os impacto na formação de profissionais não especialistas em
critérios de diagnóstico e facilitar a comunicação entre os dife- 1. A disfunção temporomandibular e a dor orofacial é DTM, causando muitas vezes abordagens indevidas, as quais
rentes profissionais, é fundamental a utilização de sistemas uma área (especialidade) da medicina dentária que faz buscam o tratamento da DTM através de mudanças na posi-
de categorização e índice dos sinais e sintomas, como o DC/ uma ampla interface com diversas especialidades da pró- ção dentária e/ou na superfície oclusal dos dentes.
TMD ou RCD/TMD. O tratamento adequado será aquele que pria medicina dentária, como também da área médica. Com a evolução das pesquisas e o conhecimento da análi-
melhor identificar e compreender os fatores etiológicos pre- Esta característica, faz com que possamos ajudar os indi- se crítica dos estudos através da prática baseada em evidên-
disponentes, iniciadores e perpetuantes do paciente. Deverá víduos que são afetados por estas condições no segmento cia, sabemos hoje que a oclusão tem o seu papel, restrito a
idealmente contemplar a consciencialização e educação do orofacial (dores crónicas, cefaleias, limitações funcionais, condições bem definidas e bem estabelecidas, classificadas
paciente para a sua condição, auto-cuidados, terapia cogni- alterações do sono, bruxismo, doenças que acometem a como oclusão de risco para DTM. Este é um ponto impor-
tivo-comportamental (de forma direta e/ou indireta), fisiote- articulação temporomandibular, dores neuropáticas, entre tante para ser bem esclarecido às especialidades afins, de
rapia, terapia miofuncional orofacial, terapêutica farmacoló- outras tantas condições) melhorando e controlando altera- modo a evitar tratamentos iatrogénicos para o controle da
gica, dispositivos de oclusão e cirurgia. Ao nível da terapia da ções importantes no sistema mastigatório, dores na região DTM através da oclusão, como é o caso do ajuste oclusal
fala, a intervenção inclui a realização de atividades terapêu- da face e da coluna cervical(pescoço), amenizando o sofri- por desgaste seletivo, de indicações da medicina dentária
ticas miofuncionais, com o principal objetivo de reeducar e mento e melhorando a qualidade de vida destes indiví- para prevenir ou tratar DTM, e até mesmo abordagens cirúr-
equilibrar os músculos orofaciais, assim como promover uma duos. Além disso, devido à sua grande abrangência de gicas com o mesmo objetivo. Considero este um importan-
adequada realização das funções orofaciais, nomeadamente atuação, faz com que seja um desafio intelectual aos que a te e ainda desafiador papel para nós especialistas na área,
mastigação, deglutição e fonação. O contributo desta aborda- ela se dedicam, possibilitando uma ampla atuação na prá- para levar este entendimento aos profissionais das diversas
gem foca-se na redução da sobrecarga associada a compen- tica clínica, tornando o nosso dia a dia neste fascinante especialidades.
sações e adaptações miofuncionais que atuem como fatores e apaixonante campo, extremamente rico e gratificante. Por esta razão, um diagnóstico correto, através de etapas
perpetuantes e/ou agravantes da DTM, assim como muitas Foi por esta razão que enveredei por esta área e continuo bem estabelecidas de avaliação do paciente e da sua his-
vezes inclui procedimentos para ajuste da amplitude mandi- apaixonado por ela. tória, um exame físico intra e extra oral adequados, ainda
bular na realização das funções orofaciais que são inerentes são os passos mais importantes para proporcionar uma defi-
à reabilitação nestes casos, sendo este o fator diferencial da 2. As dores orofaciais de maior prevalência na região da nição quanto às melhores e mais adequadas intervenções
atuação da terapia da fala nesta área. cabeça e pescoço, são as cefaleias, odontalgias e DTM (Dis- para cada paciente. Em suma, a seleção da melhor inter-
função Temporomandibular). venção, inicia-se pela seleção adequada do paciente atra-
6. A maior parte dos casos são encaminhados pelos cole- Como fator etiológico, sabemos que as cefaleias primá- vés do diagnóstico correto, o que proporcionará o sucesso
gas de medicina dentária, embora existam muitos casos cuja rias como a migrânea e a cefaleia do tipo tensional, classi- do tratamento.
identificação inicial é efetuada em terapia da fala, muitas ficadas como primárias, onde a cefaleia é a própria doen-
vezes pacientes ortodônticos ou com problemas vocais, por ça e não surge de outra doença principal, como tumores, 4. Dentro do modelo atual de diagnóstico e tratamento da
disfonia de tensão músculo-esquelética. aneurismas, e até mesmo condições mais simples como DTM e dor orofacial, é importante o profissional compreen-
Verifica-se uma procura crescente da consulta específi- a própria odontalgia, é classificada como uma alteração der a necessidade de uma equipa multi e interdisciplinar
ca de dor orofacial e DTM, embora isto não se verifique na neurovascular de causa genética, e predominante no sexo neste contexto. Costumo dizer que é a doença que define
maioria dos casos. feminino. As odontalgias acontecem na sua maioria por qual é o profissional que irá ser o seu aliado e a direcioná-
lesões de cárie, mas também por outros fatores como por -lo para a interdisciplinaridade necessária. Importante aqui
exemplo o trauma excessivo, exercido pelo bruxismo do é ter uma equipa homogénea que tenha a mesma formação
Eduardo Januzzi sono e/ou de vigília. e o mesmo olhar para o paciente, ou seja, o mesmo entendi-
Doutor em Saúde Baseada em Evidências e mes- A DTM é uma alteração musculoesquelética, que pode mento da doença e das possibilidades de controlo. Isso faci-
tre em DTM e Dor Orofacial (Escola Paulista de
afetar a articulação temporomandibular, a musculatura mas- lita não só a comunicação durante todo o tratamento, mas a
Medicina. UNIFESP), Médico dentista e Mestrado
Integrado em Medicina Dentária pela Faculda-
tigatória e estruturas associadas como a coluna cervical. É contribuição máxima de cada especialidade para o sucesso
de Egas Moniz – Lisboa Portugal, especialista em de ressalvar que esta é responsável por muitas dores referi- do tratamento, evitando abordagens divergentes e até mes-
DTM e Dor Orofacial (CFO. Brasil), especialista em das na face, incluindo cefaleia (secundária) o que exige um mo contraditórias.
Prótese Dentária e em Periodontia (APCD . Bau- diagnóstico diferencial importante. Quanto à sua etiologia, As principais especialidades para uma adequada e com-
ru), especialista em Saúde Baseada Em Evidência
sabemos que é multifatorial e apresenta diversos fatores pleta equipa multidisciplinar são a medicina dentária, a
(Hospital Sírio Libanês – SP), extensão em Dor oro-
facial , DTM e oclusão (UMD- New Jersey – USA), coordenador de cursos
de risco, tais como os distúrbios do sono, bruxismo, laxidão fisioterapia, a terapia da fala, a neurologia e a cefaliatria, a
de pós-graduação em DOF / DTM e Implantodontia (Faculdade Ciodon- ligamentar, macrotraumas, doenças sistémicas (como as reumatologia, a otorrinolaringologia, a medicina do sono, a
to . MG . Brasil), coordenador do ambulatório de Dor orofacial, DTM e reumáticas), doenças degenerativas como a osteoartrite e psicologia e a psiquiatria. Cabe aqui destacar que, cada pro-
Cefaléias (CETRO. MG. Brasil), Consultor Científico da Signo Vinces (Sis- a osteoartrose, aspectos psicológicos (ansiedade, depressão fissional, requer uma capacitação e formação específica em
temas de Implantes Dentais: Brasil e Europa ), ITI member, Membro da
dentre outros transtornos) e a própria predisposição genéti- dor orofacial e DTM, de forma a compreenderem adequada-
IASP – International Academy for Study of Pain,Membro do Comitê de
Dor Orofacial da Sociedade Brasileira de Cefaléias, Sócio fundador da
ca à dor crónica (Fibromialgia e Dor Miofascial por exemplo) mente esta ampla e complexa área.

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5. As DTM musculares são classificadas de acordo com ram elucidar de forma relevante a Inter- relação do sono um processo de artrose, com eventuais agudizações infla-
alguns critérios de classificação, como por exemplo o da com os pacientes de DTM e DOF. matórias. A história clínica e observação é importante para
Academia Americana de dor orofacial (AAOP), em agudas No controlo das DTM articulares, a técnica da Viscossuple- um correto diagnóstico e orientação terapêutica.
e crónicas. Existem critérios de classificação voltados para a mentação da ATM com o hialuronato de sódio, um derivado
pesquisa clínica como o DC e o RDC, instrumentos validados do ácido hialurónico, veio mudar radicalmente a forma de 6. Habitualmente um doente que chega à consulta/Urgên-
de forma a minimizar o caminho dos seus resultados. tratar as alterações degenerativas, assim como as alterações cia de otorrinolaringologia vem por outra queixa que não a
Para uma prática clínica de excelência, adoto a classifica- biomecânicas da ATM, relacionadas ao disco articular. ATM, julgando ser patologia do ouvido ou seios perinasais.
ção da AAOP, por ser didática e atender de forma adequada No que se refere as DTM musculares, as novas perspetivas Nesse caso, ao ser diagnosticada a patologia da ATM, é refe-
o raciocínio clínico para o diagnóstico. da toxina botulínica na dor crónica e na migrânea crónica, renciado para o médico dentista com formação nesse ramo.
Desta forma as DTM agudas, são classificadas em mialgia vieram ampliar o nosso leque de intervenções em pacientes
local, co-contração, miosite e mioespasmo. Já as DTM cróni- crónicos de difícil tratamento. Os novos fármacos para a dor 7. Numa situação aguda de processo inflamatório a
cas, são classificadas em dor miofascial, fibromialgia e con- crónica, como os antidepressivos duais, e as novas substân- abordagem terapêutica médica é a principal abordagem,
traturas. Pode ainda fazer parte desta classificação, a mial- cias que atuam na CGRP (Proteína do Gene relacionada à enquanto que numa situação crónica a abordagem médica
gia mediada centralmente. calcitonina) para a migrânea crónica, vieram enriquecer o poderá ser complementada com fisioterapia.
O processo de diagnóstico deve compreender o conheci- nosso arsenal farmacológico e viabilizar uma melhoria sig-
mento da história do paciente, através de um questionário ini- nificativa na qualidade de vida, como também minimizar o Francisco Maligno
cial onde o paciente tem a oportunidade de preencher antes impacto na dor e sofrimento destes indivíduos. Licenciado pela Faculdade de Medicina Dentária
da Universidade do Porto (FMDUP); Assistente
da consulta, ainda na recessão, de forma a compreender a A era digital, com saneamento intra oral e a confeção de
convidado nas Unidades Curriculares de Oclusão,
importância das perguntas e complexidade do problema. Em goteiras através de sistemas computadorizados, como o ATM e Dor Orofacial na FMDUP.; Docente no Cur-
seguida, deve ser realizada uma avaliação do paciente, com- CAD/CAM, veio otimizar a confeção e os ajustes das gotei- so de especialização em Oclusão, Distúrbios Tem-
preendendo o exame físico intra e extra oral e obedecendo as ras, minimizando tempo e custos operacionais. poromandibulares e Parafunções Orofaciais na
etapas de avaliação do paciente, para proporcionar uma ava- Tudo isto tem contribuído de forma importante para o FMDUP; Aluno de Doutoramento da FMDUP.

liação ordenada e compreensiva. Exames complementares de avanço nesta área e na qualidade e melhoria do controlo
imagens, para avaliação do sono como a polissonografia, ou destes pacientes. 1. Desde o tempo em que frequentava o Mestrado Inte-
provas laboratoriais, podem fazer parte desta avaliação, para grado em Medicina Dentária na Faculdade de Medicina Den-
se estabelecer o diagnóstico correto. O uso de aplicações para tária da Universidade do Porto que tenho um especial inte-
smartphones, também podem ser válidos para ajudar no pro- Cristina Caroça resse na área de oclusão, distúrbios temporomandibulares,
cesso de diagnóstico. É preciso deixar claro que para tudo isto, Médica Especialista de Otorrinolaringologia do parafunções orofaciais e dor orofacial.
Hospital CUF Infante Santo e CUF Belém Clínica;
é necessária uma boa capacidade de avaliação e treino. A sorte de poder colaborar no serviço de Oclusão, ATM e
Professora auxiliar convidada da NOVA Medical
Quanto ao tratamento, este vai depender do diagnósti- School |Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa;
Dor Orofacial da mesma instituição desde cedo motivou-me
co e do grau da doença. Podemos adotar tratamentos con- Doutoramento em Medicina no Ramos de Saúde a adotar um espírito crítico e a individualizar os meus trata-
servadores (goteiras, fisioterapia, fármacos, orientações, das Populações; De 2000 a 2007, médica otorrino- mentos tendo por base uma avaliação multidisciplinar dos
tratamento cognitivo – comportamental, etc..), tratamentos laringologista no CHLO doentes que muitas vezes é negligenciada.
minimamente invasivos (viscossuplementação, artrocente- Hoje em dia a minha prática clínica resume-se exclusiva-
se, artroscopia) ou até mesmo tratamentos invasivos, como 1. Sou médica otorrinolaringologia e é importante reco- mente à área da reabilitação oral e ao tratamento de doen-
a cirurgia da ATM. nhecer que existem situações que podem surgir na consul- tes com dor orofacial, DTM e parafunções orofaciais.
ta/urgência de otorrinolaringologia que se manifestam por
6. Trabalho há mais de 30 anos nesta área, realizo consul- orofacial, e nem sempre por patologia do foro otorrinolarin- 2. A evidência mostra que a dor orofacial é relativamente
tas clínicas e cursos de formação, participo em pesquisas clí- gológico. comum, afetando aproximadamente 10% a 26% da popu-
nicas e publicações e tenho na minha prática clínica ambas lação adulta1.
as situações, ou seja, recebo pacientes encaminhados por 2. A grande maioria das situações de dor orofacial são Os distúrbios temporomandibulares são descritos como a
diversos profissionais, como também identifico e realizo o sem dúvida a patologia da ATM, frequentemente associadas principal fonte de dor crónica na região orofacial, apresen-
diagnóstico de pacientes da minha prática privada. a alterações da oclusão e bruxismo. Em otorrinolaringolo- tando uma prevalência de 5% a 12% da população2, sendo
Existem ambas as situações. gia as alterações na oclusão poderão ser desencadeadas por mais frequentes nas mulheres que nos homens3.
Chegam muitos pacientes encaminhados por outros pro- quadros de dificuldade respiratória. Os sintomas mais frequentes são as dores na face, arti-
fissionais e também aqueles que procuram na internet ou culações temporomandibulares, cabeça, região do ouvido e
até mesmo pela indicação de pacientes que se encontram 3. Pelo meu contacto com a medicina dentária sei neste zumbidos. Os sinais frequentemente observados são a dis-
em tratamento e fazem a indicação. momento que a oclusão funciona como factor minor na etio- função (caracterizada pela limitação e/ou incoordenação
Existem ainda, pacientes que chegam por outros motivos logia da DTM, tendo muito mais peso fatores como stress ou dos movimentos) e o desconforto à palpação dos músculos
e que identificamos durante uma primeira consulta, ao exa- a ansiedade que levam a uma sobrecarga e consegue assim mastigatórios e da articulação temporomandibular e a pre-
minar o sistema mastigatório, ou até mesmo na anamnese uma assimetria de forças e desequilíbrio muscular levando sença de ruídos articulares4.
e recolha da história clínica. à dor orofacial. Estudos epidemiológicos estimam que 40 a 75% da popu-
lação apresenta pelo menos um sinal de distúrbio temporo-
7. A investigação clínica e as pesquisa clínica e as publi- 4. A necessidade de uma abordagem multidisciplinar é mandibular, como ruídos articulares na articulação tempo-
cações atuais, têm-nos ajudado muito a melhorar as nossas cada vez mais importante, pois sem dúvida, é essa aborda- romandibular e 33%, pelo menos um sintoma, como dor na
opções terapêuticas e também o diagnóstico. gem que vai conseguir reunir condições para a resolução do face ou na articulação temporomandibular4.
A medicina do sono, com exames que vieram melhorar o problema. Os indivíduos com estas condições frequentemente rela-
diagnóstico e a compreensão da da fisiopatologia, como a tam dor noutras estruturas, tais como a região cervical e da
sono endoscopia, o melhor entendimento e interpretação do 5. A patologia inflamatória é uma situação aguda e a mais cabeça, o que por vezes torna o diagnóstico mais difícil.
diagnóstico por imagens, a melhoria dos dispositivos para frequente, sendo importante identificar também a patologia Não nos podemos esquecer que a dor odontogénica (dor
tratar a Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono (SAHOS) vie- crónica de deformação articular, que poderá desencadear de origem dentária) é relatada em vários estudos como a

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10. Stuart CE, Stallard H. Principles in- volved in restoring occlusion to natural teeth.
causa mais comum de dor orofacial e por isso deverá ser a 5. Baseado na classificação do Diagnostic Criteria for Tem- J Prosthet Dent 1960;10:304–313.
primeira a ser descartada aquando do diagnóstico5. poromandibular Disorders a mialgia local, a dor miofascial e 11. D’Amico A. Functional occlusion of the natural teeth of man. J Prosthet Dent
1961;11:899–915.
a dor miofascial com dor referida são os diagnósticos de dor 12. Schwartz LL. Pain associated with the temporomandibular joint. J Am Dent
3. Nas últimas décadas a etiologia dos distúrbios tem- muscular mais frequentes. Assoc 1955;51:394–397.
13. Laskin DM. Etiology of the pain-dysfunction syndrome. J Am Dent Assoc
poromandibulares foi alvo de muita discussão. As teorias A dor miofascial dos músculos mastigatórios é relatada 1969;79:147–153.
mecânicas que surgiram no seguimento dos postulados de por 45,3% dos pacientes com distúrbios temporomandibu- 14. McNeill C, Danzig WM, Farrar WB, et al. Craniomandibular (TMJ) disorders: The
state of the art. J Prosthet Dent 1980;44:434–437.
Costen6, como: lares4,19. 15. Sessle BJ. Invited review: the neurobiology of facial and dental pain: present
- a perda da dimensão vertical6,7, o incorreto posicio- Dentro dos diagnósticos articulares, os distúrbios de inter- knowledge, future directions. J Dent Res 1987;66:962–981.
16. Dworkin SF, Burgess JA. Orofacial pain of psychogenic origin: Current concepts
namento do côndilo mandibular na fossa mandibular6, a ferência de disco são os mais comuns. Podemos destacar and classification. J Am Dent Assoc 1987;115:565–571.
desarmonia oclusal8, a incoordenação muscular8,9, a discre- o deslocamento do disco com redução, o deslocamento do 17. Engel GL. The need for a new medical model: a challenge for biomedicine.
Science 1977;196:129–136.
pância da oclusão cêntrica para a posição de intercuspida- disco com redução e bloqueio intermitente, o deslocamento 18. Ohrbach R, editor. Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders: Asses-
ção máxima10, a ausência de guias caninas11, entre outras, do disco sem redução com limitação de abertura e o deslo- sment Instruments. Version 15May2016. [Critérios de Diagnóstico para Disfunção
Temporomandibular: Portuguese Version Sept2017] Faria C, Coutinho FA, Resende
levaram muitos profissionais de saúde a adotar linhas tera- camento do disco sem redução sem limitação da abertura4,19. T, Ferreira H, Gonçalves M, Gomes R, Gomes D, Pinto JC, Trans. www.rdc-tmdinter-
pêuticas baseadas em princípios puramente gnatológicos Os distúrbios articulares de interferência de disco surgem national.org
19. Manfredini D, Guarda-Nardini L, Winocur E, et al. Research diagnostic criteria for
que se traduziam em procedimentos invasivos e reabilita- na população de doentes com DTM numa percentagem de temporomandibular disorders: a systematic review of axis I epidemiologic findings.
ções extensas. 41,1%4,19. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod 2011;112(4): 453-62.

A história mostra-nos que o doente com dor orofacial não Outros distúrbios articulares, como a patologia degenera-
pode ser tratado desta forma. tiva da articulação temporomandibular, que não é tão fre- Graziella Silva
Laszlo Schawrtz, em 1955, afirmou que os fatores oclu- quente, constitui uma preocupação para os profissionais4,19. Equivalência a Licenciatura em Medicina Dentá-
ria pela Universidade de Coimbra ; Especialista
sais constituem apenas um fator contributivo para o desen- A prescrição de meios auxiliares de diagnóstico adequa-
em Ortodontia pela Universidade Unicsul - Brasil;
volvimento dos distúrbios temporomandibulares, tendo-se dos às diferentes condições clínicas deve ser feita de forma Especialista em Disfunção temporomandibular
afastado das teorias mecânicas e aproximado-se do modelo prudente e consciente. e Dor Orofacial pela Facsete / Ciodonto - Bra-
biopsicossocial12. Na minha prática privada tento sempre esgotar todas sil; Curso teórico/clinico em Ortodontia - filosofia
A teoria psicofisiológica de Laskin em 1969 veio suportar as opções terapêuticas conservadoras antes de propor ao MBT- PT; Curso internacional em Disfunção Tem-
poromandibular e dor Orofacial Portugal/Brasil -
a linha de Schwartz, no que diz respeito ao papel do stress paciente terapias invasivas.
Facsete / Ciodonto; Professora assistente do Curso
e da sua influência na tensão muscular. A sua teoria consi- internacional em Disfunção Temporomandibular e dor Orofacial Lisboa/
derava que o espasmo muscular constituía o fator primário 6. Em ambiente académico tenho a oportunidade de Brasil - Facsete /Ciodonto; Membro do Board editorial do Journal of Cos-
responsável pelos sinais e sintomas da síndrome de dor e acompanhar muitos doentes com dor e disfunção da ATM. metology & Oro Facial Surgery; Membro do Board editorial do Journal of
disfunção13. Na minha prática privada muitos dos doentes que eu rece- Anesthesia-Intensive care and pain therapy.
A Associação Americana de Distúrbios Crânio-Mandibula- bo são encaminhados por colegas.
res afirmou em 1980 que a etiologia dos distúrbios temporo- Uma vez que me dedico também à área de reabilitação 1. O que me levou a ganhar interesse pela área da DTM
mandibulares baseia-se numa teoria multifatorial e comple- oral, incluo sempre no planeamento dos casos a recolha de e da Dor Orofacial foi ver, na minha prática clínica diária, a
xa e que o termo “TMJ dysfunction” deveria ser abandonado uma história clínica com um conjunto de perguntas que me necessidade de tratamento dos doentes com queixas fre-
e substituído por “Temporomandibular disorders”, separan- permitem perceber se estou perante um possível diagnósti- quentes de sinais e sintomas de DTM, principalmente na
do os distúrbios dos músculos mastigatórios dos distúrbios co de distúrbio temporomandibular. Essas questões estão ao especialidade da medicina dentária, o que me levou a que-
articulares14. acesso de todos os médicos dentistas no “TMD Pain Scree- rer a aprofundar os meus conhecimentos nesta área.
Na década de 90, com o desenvolvimento da neurobiolo- ner”, um questionário de triagem para a pesquisa de sinais Outra das razões que me levou a enveredar por esta
gia e da psicopatologia surgiram novas perspetivas na etio- e sintomas de DTM18. área, foi o facto da especialidade da disfunção tempo-
logia dos distúrbios temporomandibulares, particularmente Embora exista cada vez mais informação acessível à popu- romandibular e dor orofacial ser uma área da medicina
com os trabalhos de Sessle BJ e Dworkin SF15,16. lação referente a este tema, ainda há muitos doentes sub- dentária que está interligada com outras especialidades,
Hoje, sabemos que o modelo mais aceite no tratamento diagnosticados por puro desconhecimento. exigindo assim, uma abordagem multidisciplinar que pro-
dos doentes com dor orofacial é o modelo biopsicossocial17. Os pacientes que procuram diretamente médicos dentis- porciona uma ampla visão do estado clínico do doente e
tas que se dedicam a esta área apresentam na maior parte que posteriormente, traz um impacto positivo à sua qua-
4. Acredito que a comunicação e o trabalho em equipa são dos casos dor na região da face, têmporas ou região do ouvi- lidade de vida.
a chave para lidar com a dor orofacial. do, ruídos articulares e/ou limitação dos movimentos man-
Medicina dentária, psicologia, neurologia, psiquiatria, dibulares, tendo muitas vezes já consultados outros espe- 2. As dores orofaciais que mais afetam os pacientes, ou
fisiatria, medicina física e de reabilitação, fisioterapia, medi- cialidades médicas como otorrinolaringologia e neurologia. seja, de maior prevalência na região da cabeça e pescoço,
cina do sono, otorrinolaringologia, anestesiologia, terapia da são as Odontalgias, DTM (Disfunção temporomandibular) e
Referências bibliográficas:
fala são algumas das áreas da saúde que podem e devem 1. Macfarlane TV, Blinkhorn AS, Davies RM, et al. Association between local
cefaleias.
colaborar em prol do tratamento do doente com dor orofa- me- chanical factors and orofacial pain: survey in the community. J Dent 2003; Os fatores etiológicos são multifatoriais: fatores genéticos,
31(8):535–42.
cial. 2. Pain.NIoDaCRF. Available at: http://www.nidcr.nih.gov/DataStatistics/FindData
traumas, bruxismo do sono e/ou de vigília, doenças sisté-
O tratamento deve ser sempre individualizado para obten- ByTopic/FacialPain. Accessed January 14, 2019. micas (reumáticas), doenças degenerativas (osteoartrose a
3. LeResche L. Epidemiology of temporomandibular disorders: implications for the
ção de melhores resultados terapêuticos. investigation of etiologic factors. Crit Rev Oral Biol Med 1997;8(3):291-305.
oateoartrite),aspectos psicológicos (depressão, ansiedade
A adoção dos mesmos sistemas de classificação das DTM 4. Shaefer JR, Khawaja SN, Bavia PF. Sex, Gender, and Orofacial Pain. Dent Clin N e stress) e algumas condições oclusais, classificadas como
Am 62 (2018) 665–682.
por parte das diferentes especialidades, bem como a ado- 5. Renton T. Dental (odontogenic) Pain. Rev Pain. 2011 Mar;5(1)2-7.
oclusão de risco para DTM (mordida aberta anterior, overjet
ção do modelo biopsicossocial na terapêutica instituída, 6. Costen JB. A syndrome of ear and sinus symptoms dependent upon disturbed maior do que 6mm, discrepância entre RC e MIH maior do
func- tion of the temporomandibular joint. 1934. Ann Otol Rhinol Laryngol 1997;106:
permite melhorar a comunicação entre os profissionais 805– 819.
que 5mm, mordida cruzada unilateral).
envolvidos. 7. Thompson JR. The rest position of the mandible and its significance to dental Todos estes aspectos, tornam a dor orofacial bastante
science. J Am Dent Assoc 1946;33:151–180.
Considero que o Diagnostic Criteria for Temporomandi- 8. Moyers RE. Temporomandibular muscle contraction patterns in Angle Class II, divi-
complexa, exigindo do profissional o entendimento destes
bular Disorders constitui o sistema de classificação dos DTM sion 1 malocclusions: an electromyographic analysis. Am J Orthod 1949;35:837–857. fatores que podem ser classificados como de risco, agravan-
9. Perry HT. Muscular changes associated with temporomandibular joint dysfunc-
mais amplamente difundido pela comunidade científica18. tion. J Am Dent Assoc 1957;54:644–653.
tes e perpetuantes.

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3. A obtenção de uma oclusão ideal ou funcional é objeto Os exames complementares de imagens (TAC, IRM, Ultras- Com o estilo de vida alucinante e de enorme stress com
de estudo de muitas especialidades da medicina dentária, sonografia) para avaliação do sono como a polissonografia, que se vive atualmente, o número de pacientes com DTM é
como por exemplo: a ortodontia, a reabilitação oral, a den- ou provas laboratoriais nas doenças reumáticas, podem cada vez maior.
tisteria, entre outras. fazer parte desta avaliação, para se conseguir estabelecer o A procura por um diagnóstico correto para doentes com,
Antigamente, na medicina dentária, a oclusão era vista diagnóstico correto. Quanto ao tratamento, este vai depen- por exemplo, dor facial atípica ou dor miofascial, que já pas-
como o principal fator responsável pelo desenvolvimento de der do diagnóstico e do grau da doença. Podemos adotar saram por inúmeros profissionais de saúde e não encontra-
uma DTM. tratamentos conservadores (Goteiras, fisioterapia, fármacos, ram solução para as suas queixas, foi uma das razões que
Este conceito ainda tem um forte impacto na formação orientações, tratamento cognitivo – comportamental, etc..), me levou a seguir este caminho.
de profissionais não especialistas em DTM, causando muitas tratamentos minimamente invasivos (Viscossuplementação, Tratar bem os pacientes não reside apenas em saber tra-
vezes abordagens indevidas, fazendo com que o tratamento artrocentese, artroscopia) ou até mesmo tratamentos inva- tar convenientemente cáries, extrair dentes ou saber colo-
da DTM passe por mudanças na posição dentária e/ou na sivos, como a cirurgia da ATM. car implantes, é preciso saber resolver e reabilitar todas as
superfície oclusal dos dentes. estruturas orofaciais, como dentes, articulações e muscula-
Atualmente, sabemos que a oclusão é um fator de risco, 6. Na minha prática clínica acontecem ambas as situações. tura.
mas não é preponderante, e isto deve ficar bem definido, Recebo pacientes encaminhados por colegas de áreas como Sou prostodontista e faço muitos processos de reabilita-
para evitar o tratamento das DTM com base em intervenções otorrinolaringologia, fisioterapia e neurologia, da mesma ção. Trato pacientes com perda de muitas peças dentárias,
como o ajuste oclusal ou tratamento ortodôntico. maneira que também realizo o diagnóstico de pacientes da grandes desgastes dentários e articulares, perda de dimen-
Considero que este é um verdadeiro desafio para os espe- minha prática privada. são vertical e seria impossível reabilitar estes pacientes
cialistas da área que tentam levar este conhecimento aos Muitos dos pacientes são encaminhados por outros profis- olhando apenas para os dentes.
profissionais das diversas especialidades. sionais e procuram a consulta tendo já sido direcionados ou
Por tudo isto, o diagnóstico é feito através de etapas bem até mesmo pela indicação de pacientes que se encontram 2. Atualmente, os fatores psicossociais como stress, ansie-
estabelecidas da avaliação do paciente, através do conheci- em tratamento. dade e depressão são considerados os principais fatores
mento da sua história detalhada e de um exame clínico intra E ainda existem aqueles que chegam por outros motivos e etiológicos de DTM. Se associarmos a pressão constante de
e extra oral. Estes são os passos mais importantes para nos que identifico durante uma primeira consulta. resultados no trabalho, horários de trabalho demasiado lon-
ajudar a proporcionar a melhor solução quanto às interven- gos, redução de quantidade e qualidade de sono, falta de
ções mais adequadas para cada paciente. 7. No controlo das DTM articulares, a técnica da Viscossu- exercício e redução dos tempos de lazer e descanso, temos
Em resumo, a seleção da melhor intervenção inicia-se plementação da ATM com hialuronato de sódio, auto enxer- uma prevalência cada vez maior de DTM.
pela seleção adequada do paciente através do diagnóstico tos de condrócitos da cartilagem nasal e a viscossuplemen-
correto e que proporcionará o sucesso do tratamento. tação guiada para o compartimento inferior, vieram mudar 3. Ora aí temos um tema muito sensível, a oclusão
a forma de tratar as alterações degenerativas, assim como dentária já foi considerada o fator principal para DTM, ao
4. As principais especialidades para uma adequada e com- as alterações biomecânicas da ATM. ponto de se fazerem reabilitações totais com coroas para
pleta perspectiva multidisciplinar são a medicina dentária, a Quanto às DTM musculares, as novas perspectivas da toxi- estabilizar e melhorar a oclusão para resolver o problema.
fisioterapia, a terapia da fala, a neurologia e reumatologia, na botulínica na dor crónica e na Migrânea crónica, vieram Nos dias de hoje, esta realidade perdeu alguma impor-
a otorrinolaringologia, a medicina do sono, a psicologia e a ampliar o nosso leque de intervenções em pacientes cróni- tância. No entanto, não pode ser totalmente descurada
psiquiatria e a fisiatria. cos de difícil tratamento. podendo nunca ser descurada, pois é um fator de risco
É importante destacar que, cada uma destas áreas, requer Os novos fármacos para a dor crónica, como os antide- para DTM.
uma capacitação e formação específica em Dor Orofacial pressivos duais, e as novas substâncias que atuam em CGRP
e DTM, de forma a compreenderem adequadamente esta (Proteína do Gene relacionada à calcitonina) para a Migrâ- 4. Tratar pacientes com disfunção requer uma equipa mul-
complexa e ampla área. nea crónica, vieram enriquecer o nosso arsenal farmacoló- tidisciplinar bem treinada e que fale a mesma linguagem. É
gico e viabilizar uma melhoria significativa na qualidade de necessário que o diagnóstico seja preciso, confiável, depen-
5. As DTM musculares são classificadas de acordo com vida, como também minimizar o impacto na dor e sofrimen- dendo de uma taxonomia aceite e com critérios e diagnós-
alguns critérios de classificação, como é o caso da Acade- to destes indivíduos. ticos bem definidos.
mia Americana de Dor Orofacial (AAOP), que as classifica em Tudo isto tem contribuído de forma importante para o Por outro lado, é necessário que todos os clínicos interve-
agudas e crónicas. avanço nesta área e na qualidade e melhoria do controlo nientes no tratamento estejam num nível de formação ele-
As DTM agudas são classificadas em mialgia local, Co-con- destes doentes. vado e que, qualquer que seja a sua especialidade (médico
tração, miosite e mioespasmo. Já as DTM crónicas são classi- dentista, fisioterapeuta, neurologista, psicólogo, terapeuta
ficadas em dor miofascial, fibromialgia e contraturas. Pode do sono, etc), não se sintamnão se sintam superiores aos
ainda fazer parte desta classificação, a mialgia mediada cen- Guilherme Guerra outros clínicos, pois todos acabam por se complementar e
tralmente. Licenciatura em Medicina Dentária pelo ISCSEM; são essenciais para o resultado que realmente importa, a
Especialista em DTM e Dor Orofacial pela Facul-
As DTM articulares são classificadas em desvios na forma resolução das queixas do paciente.
dade CIODONTO / FACSETE –Belo Horizonte – Brasil;
(defeitos na superfície articular, afinamento e perfuração do Curso de extensão em Dor Orofacial e DTM Neon
disco), deslocamento do disco com redução, sem redução Cursos – BH – Brasil; Professor Assistente do Curso 5. Nas DTM´s articulares mais comuns temos artralgias,
(com e sem travamento) travamento intermitente, hipermo- internacional em Disfunção Temporomandibular deslocamentos do disco com e sem redução, com ou sem
bilidade, travamento aberto e as artralgias (capsulite, sino- e Dor Orofacial Lisboa/Brasil - FACSETE /Ciodonto, perda de mobilidade, hipermobilidade e osteoartrose.
Médico Dentista da Clínica Dental Face – Lisboa - PT.
vite e retrodiscite). Como DTM´s musculares mais comuns temos dor muscular,
O processo de diagnóstico deve compreender um conhe- mialgia com dor miofascial, com e sem dor referida, espa-
cimento abrangente da história do paciente, através de um 1. Trabalho numa clínica de referência do país e tenho a mos, contraturas e hipertrofia.
questionário inicial que o paciente tem a oportunidade de sorte de trabalhar desde o início da minha vida profissional O diagnóstico passa pelo conhecimento cuidado e exaus-
preencher antes da consulta, ainda na recepção. em equipas multidisciplinares, com profissionais de excelên- tivo da história clínica do paciente e por um exame clínico
Em seguida, deve ser realizada uma avaliação completa do cia nas várias especialidades clínicas como: Cirurgia, Perio- de todas as estruturas intraorais como dentes, mucosas, etc,
paciente, compreendendo o exame físico intra e extra oral dontologia, Endodontia, Ortodontia, etc, mas com uma lacu- e extraorais, como a musculatura e articulçação, hábitos de
e obedecendo a etapas ordenadas de avaliação do paciente. na na área da Oclusão e DTM. sono, postura e hábitos de vida.

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Já o tratamento passa por um procedimento cognitivo No último ano da licenciatura (6º ano) concorri a algumas O plano de tratamento escolhido pelo clínico está depen-
comportamental, farmacologia, fisioterapia, melhoria do das melhores universidades europeias com ensino pós-gra- dente do diagnóstico e da severidade da DTM, podendo
sono e viscosuplementação. duado em regime de tempo integral, mas acabei por ficar na contemplar técnicas não invasivas (terapia cognitiva com-
Universidade de Coimbra, como docente, com o objetivo ali- portamental, goteiras oclusais, tratamento ortodôntico,
6. Iniciei a minha especialização em DTM no ano de 2012 e ciante de ajudar a criar a nossa pós-graduação em ortodontia. fisioterapia, etc.) e técnicas invasivas (ex. cirurgias da
desde dessa altura tive a felicidade de conhecer muitos cole- Desde então, tenho dedicado a minha vida profissional ao ATM).
gas de outras áreas, como fisioterapeutas ou otorrinolaringo- estudo, investigação e docência nesta área (fiz a especialida-
logistas e aos poucos vou recebendo muitos doentes indicados de em 2002, o mestrado de ortodontia em 2004 e o doutora- 6. Muitos são diagnosticados por mim, mas a maioria
por eles. mento em 2014) e neste momento coordeno a pós-graduação resulta do encaminhamento por outros colegas. A aborda-
Por outro lado, na minha clínica passam diariamente mui- de ortodontia da Faculdade de Medicina da Universidade de gem destes doentes, quer no consultório privado quer na
tos pacientes e temos um protocolo de avaliação na 1ª con- Coimbra que, para além de cumprir os requisitos previstos na faculdade, é feita há mais de 20 anos em conjunto com Prof.
sulta, em que qualquer um dos meus colegas das outras regulamentação aplicável para que os nossos alunos possam Maria João Rodrigues, que é uma referência nacional e inter-
especialidades de medicina dentária conseguem fazer uma ser futuros especialistas pela OMD, integra uma rede europeia nacional nesta área.
triagem dos pacientes de DTM. de pós-graduações idóneas e de elevado prestígio.
Diariamente, passam na clínica mais de 100 pacientes, por 7. Recentemente têm surgido várias técnicas, como por
isso tratamos muitos pacientes com DTM que nem sabiam 2. A dor orofacial engloba patologias tão diversas como as exemplo: farmacogenómica, fotobiomodulação, ortóteses
que a tinham, ou sabiam, mas não davam muita importân- disfunções temporo-mandibulares (DTM), dor facial persis- para canal auditivo, estimulação magnética transcraneana
cia. Por exemplo, tratamos muitos pacientes com desloca- tente idiopática, estomatodínia, disestesias, distonias, pelo repetitiva, reprogramação condicionada através da tomada
mentos do disco com redução que quando questionamos que apresentam fatores etiológicos distintos. de consciência de parafunções, acupuntura, etc.
quando começaram os estalidos nos respondem que a arti- As DTM são as mais prevalentes e a sua etiopatogenia é
culação sempre estalou, mas que nunca os incomodou, ou multifactorial, englobando fatores emocionais, ortopédicos,
mesmo pacientes com dores de cabeça frequentes que já se epigenéticos e genéticos, que condicionam a capacidade de Fernando Exposto
tinham habituado a elas. adaptação biológica. Médico Dentista, licenciado em 2007 pelo Insti-
tuto Superior Ciências de Saúde Egas Moniz (ISC-
Quando o motivo da consulta é DTM é porque esta já se
SEM), Portugal. Mestre em Ciências Dentárias
encontra num estado avançado e incapacitante com dores 3. A oclusão pode afetar as DTM de uma forma indireta, na pela Universidade do Danúbio em Krems, Aus-
insuportáveis que afetam a vida normal ou num caso medida em que condiciona o equilíbrio ortopédico do siste- tria (2010-2012) Residência clínica em Dor Oro-
extremo, por exemplo, como o de limitação da abertura ma estomatognático. facial, Universidade do Kentucky, Lexington, USA
da boca. Nos últimos anos, os fatores de risco mais estudados estão (2013-2015) Mestre em Cefaleias, Centro de Cefa-
leias Dinamarquês, Rigshospital, Universidade de
relacionados com o estado psicossocial do doente.
Copenhaga, Copenhaga, Dinamarca (2016-2018) PhD em Health Scien-
7. Esta é uma área de estudo e em grande evolução a que O stress, a depressão e estados de ansiedade, têm sido ces, Universidade de Aarhus, Aarhus, Dinamarca (2016-2019) Especialis-
se dá cada vez mais importância. Por exemplo, a definição apontados como fatores preponderantes para o aparecimen- ta em Dor Orofacial pelo American Board of Orofacial Pain (ABOP diplo-
de bruxismo está em constante mudança, sendo que se divi- to da DTM, mais precisamente para o aparecimento de dis- mate) Instrutor clínico, Secção de Dor Orofacial, Faculdade de Medicina
de em bruxismo do sono e de vigília, e defende–se até que, função e dor dos músculos da mastigação. Dentária, Universidade de Aarhus, Aarhus, Dinamarca (2017-presente)
Investigador, Secção de Dor Orofacial, Faculdade de Medicina Dentária,
em alguns casos pode ser secundário a apneia do sono.
Universidade de Aarhus, Aarhus, Dinamarca (2019-presente).
O tratamento passa cada vez mais por técnicas menos 4. As especialidades médicas e médico-dentárias mais
invasivas com ênfase no controlo do comportamento cogni- relevantes para uma abordagem multidisciplinar são: neu-
tivo e mudanças de hábitos de vida. rologia, ortodontia, medicina do sono, fisiatria/fisioterapia, 1. Depois de alguns anos a fazer prática clínica em rea-
cirurgia maxilo-facial e a psiquiatria/psicologia. Menos fre- bilitação oral comecei a ter um gosto cada vez maior pela
quentemente, mas também importante, é a recolha de opi- prática clínica de doentes com DTM. Ao ver estes doentes
Francisco Vale nião da reumatologia e otorrinolaringologia. começei a perceber que me faltava conhecimento para aju-
Professor da Faculdade de Medicina da Universi- Em muitas situações, o tratamento deve ser mais inter- dá-los e foi então que decidi que queria fazer uma residên-
dade de Coimbra (FMUC); Coordenador do Mes-
disciplinar do que multidisciplinar, com o objetivo de procu- cia clínica em dor orofacial na Universidade do Kentucky.
trado Integrado em Medicina Dentária da FMUC;
Diretor do Instituto de Ortodontia da FMU; Coor-
rar potenciar ao máximo as possibilidades terapêuticas em Comecei também a desenvolver um gosto pela investigação
denador da Pós-graduação de Ortodontia da benefício do paciente. e pelo mundo académico e foi por isso que decidi fazer o
FMUC; Regente de ortodontia (UPC3) do Mestrado doutoramento na universidade de Aarhus. Hoje, o que me
Integrado de Medicina Dentária da FMUC; Coor- 5. A classificação de DTM mais aceite a nível internacional move é a possibilidade de ajudar doentes de modo indivi-
denador da UPC3 (Ortodontia/Odontopediatria)
é o RDC (“Research Diagnostic Criteria for Tempomandibular dual na minha prática clínica, bem como com a investigação
do Mestrado Integrado de Medicina Dentária da FMUC+; Membro da
Comissão Científica da Sociedade Portuguesa de Ortopedia Dento-Fa-
Disorders”). que realizo.
cial; Membro do Conselho Geral da OMD; Membro da direção do colégio Esta metodologia é constituída por dois eixos de diagnós-
de Ortodontia da OMD; Membro do Conselho Científico da OMD; Membro tico. O eixo I diz respeito ao diagnóstico físico/clínico e o eixo 2. A prevalência da dor orofacial crónica varia consoante
do International College of Dentists; Provisional Member Angle Society II engloba o diagnóstico psicológico. O eixo I agrupa os doen- os estudos, mas deve andar à volta dos 30%.
of Europe.
tes em três categorias: desordens musculares, desordens do Os fatores etiológicos dependem do tipo de Dor Orofa-
disco articular, outras desordens como artralgias, osteoartri- cial, por exemplo, quando falamos de neuropatia trigeminal
1. O fascínio pela ortodontia surgiu ainda durante o curso te e osteoartrose. O eixo II avalia comportamentos, estado dolorosa pós-traumática, a etiologia é um trauma dirigido
e, nessa altura, existiram dois grandes fatores que contribuí- psicológico, depressão e níveis de incapacidade. ao nervo trigémio que pode ser derivado de uma extracção
ram para a minha escolha: o entusiasmo e a sabedoria dos Assim, a parte fundamental do diagnóstico é a anamnese, ou durante um tratamento endodôntico. Por outro lado, se
meus mestres, no lecionamento da disciplina e a vasta área que depois deve ser confirmada na exploração clínica, feita falamos de DTM os estudos longitudinais OPPERA confirma-
de conhecimento do ser humano que a disciplina abrange e através da análise oclusal e funcional clínica e, por vezes, ram que a etiologia é multifatorial e incluem, entre outros,
exige para ser praticada em pleno, que vão desde a genética adicionando a análise funcional instrumental e alguns exa- fatores como sintomas orofaciais não específicos (cansaço e
humana, embriologia e crescimento craniofacial à fisiopato- mes complementares de diagnóstico, como a ressonância rigidez muscular) e número de comorbidades (síndrome do
logia e biomecânica. magnética. colon irritável, insónia e cefaleias).

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ASSIM VAI A...

3. A grande maioria dos estudos, incluíndo os de melhor 1. Sendo eu psicóloga clínica e da saúde, esteve sempre da dor crónica que espelham a necessidade de intervenção.
qualidade não demonstram que a oclusão tem um papel pre- presente a ligação entre a doença física e psicológica, onde a Nomeadamente:
ponderante no desenvolvimento de DTM, até porque como dor física e emocional assumem especial importância.
disse anteriormente, a etiologia da DTM é multifatorial. No Visto estar sediada em Coimbra e profissionalmente liga- • Prevalência da Dor Crónica 1) a nível nacional (adultos)
entanto, isto não quer dizer que a oclusão não poderá ter um da aos CHUC, acabou por se desenvolver naturalmente, a - 36%*
pequeno papel num número reduzido de doentes. O proble- colaboração com profissionais oriundos e em funções labo-
ma é identificar os doentes em que isto acontece. Por isso, rais nesta instituição; parceria advinda da necessidade, sen- • Prevalência da Dor Crónica moderada a grave 2) a nível
recomenda-se sempre começar com terapias não invasivas sibilização e solicitação de médicos dentistas para o envol- nacional (adultos) - 16%**
e só se estas não resultarem é que se poderá avançar para vimento da psicologia nos diagnósticos, plano terapêutico,
terapias mais invasivas e com o intuito de alterar a oclusão. intervenção e adesão terapêutica numa equipa multidisci- • Número estimado de adultos com Dor Crónica no país - 3
Em relação às outras dores orofaciais não existem estudos plinar, nos seus desafios junto de pacientes em que as pro- milhões
que indiquem qualquer contribuição da oclusão. blemáticas e etiologias eram mais complexas, e onde per-
cebiam ou intuíam aspetos psicossociais presentes quer na • Doentes com impacto moderado ou grave da Dor Crónica
4. Na minha opinião, a equipa deverá ser constituída por etiologia como na sua manutenção, seja pela resistência à nas atividades domésticas ou laborais - 50%
médicos dentistas, psicólogos e fisioterapeutas. Também terapêutica por fraca adesão e/ou ineficácia objetivamente
deverá haver uma facilidade de interagir com colegas neu- pouco compreensível do tratamento efetuado. O que resul- • Doentes com perda de emprego associada à dor cróni-
rologistas, otorinolaringologistas e oftalmologistas. ta num impacto psicoemocional e socioeconómico na vida ca - 4%
Idealmente, para se conseguir uma boa comunicacão, a do próprio, e em custos financeiros acrescidos no consumo
equipa deverá avaliar o doente em conjunto e depois dis- de serviços de saúde e redução da produtividade laboral • Doentes com reforma antecipada por causa da dor - 13%
cutir de que modo poderão contribuir para a melhoria do (absenteísmo e presenteísmo).
paciente. No entanto, em todas as orquestras tem que haver • Doentes com diagnóstico de depressão associada à dor
um condutor e neste caso, o condutor deverá ser o médico Assim, tal como já se ia constatando na literatura e evi- crónica - 17%
dentista que recebe toda a informacão dos colegas e decide dência científica internacional e percebendo na relação clí-
qual o melhor plano de tratamento. nica percecionada com diversos pacientes, a multidiscipli- • Insatisfação com o tratamento da dor crónica - 35%
naridade para abordagem de um doente com problemática
5. O estalido articular não doloroso e a mialgia local são de dor orofacial, nas suas diversas vertentes onde a DTM • Não sendo conhecidos dados na população pediátrica.
as DTMs mais comuns na população geral. No entanto, na se destaca, a psicologia assomava-se como inevitável em (está em curso a sua caraterização: Programa Nacional para
minha prática clínica os doentes mais comuns são maiori- articulação e complementaridade com diversas disciplinas a Prevenção e Controlo da Dor – Metas de Saúde a 2020)
tariamente doentes com DTM crónica e com comorbidades, do saber e intervir, considerando que cada indivíduo é um
como cefaleias ou outras dores crónicas. todo holístico e que este aspeto terá se estar presente na Quando nos referimos à dor orofacial (DOF) estudos de
O processo de diagnóstico dever ser feito de acordo com o abordagem de processos de sofrimento e mal estar físico e população, tal como nas publicações do Ano Global Contra a
que diz o diagnóstico Criteria for Temporomandibular Disor- psicológico. Dor – Outubro 2013-2014, referem-na como uma experiência
ders (DC/TMD) que é um exame standart e validado para as comum, numa prevalência de 7%, mais presente em mulhe-
DTM mais comuns, dolorsas e não dolorosas. Quanto ao pla- Em suma estando reunidos aspetos como o ser especiali- res adultas e dentro destas nas mais jovens. Quanto à dis-
no de tratamento, varia consoante o diagnóstico e o doente, dade de Psicologia clínica na carreira da saúde e especiali- função temporomandibular (DTM), dados de caraterização
mas o importante é explicar ao doente qual o diagnóstico, e dade de Psicologia clínica e da saúde pela OPP, com expe- de prevalência, também segundo as publicações referidas,
se possível implementar um plano de tratamento não inva- riência em psicologia de ligação, inevitavelmente que a dor referem a sua presença em relatos de 9-13% da população
sivo em que o doente colabora e é responsável pelo succes- física e emocional, na sua interatividade e influência mútua, em geral (numa relação homem:mulher de 2:1), mas ape-
so do tratamento. estão significativamente presentes nas diversas situações e nas 4-7% procuram tratamento (4 vezes mais mulheres). Os
problemáticas; desta forma apresenta-se relevante a inter- sinais e sintomas atingem o seu pico por volta dos 20-40
6. Como trabalho num centro terciário de dor orofacial venção na vertente psicológica onde a pessoa é abordada de anos de idade. Há estudos que indicam a presença de pelo
todos os meus doentes são referidos por colegas, procuran- forma idiossincrática, com recurso a estratégias e técnicas menos um sinal DTM em 60 a 70% da população, numa altu-
do assim, uma consulta especializada. de base maioritariamente cognitivo comportamentais, sen- ra da sua vida, no entanto apenas 5% precisa de tratamento.
do também considerado, sempre que possível intervenção
7. Infelizmente, com a exepção dos anticorpos contra familiar, com base na teoria familiar sistémica. Etiologia
CGRP que foram desenvolvidos para o tratamento de enxa- Falar de etiologia na DOF e na DTM significa abranger a
quecas, não houve nos últimos 20 anos nenhuma técnica Inevitavelmente que este trabalho conjunto conduziu à sua complexidade, sendo estas consideradas multifatoriais.
ou medicamento que tivesse revolucionado a prática da dor minha colaboração na Sociedade Portuguesa de Disfunção Investigações foram revelando sintomas “medicamente ine-
orofacial. A maioria dos avanços que tem havido na área Temporomandibular e Dor Orofacial (SPDOF-DTM) da qual xplicáveis”, por não terem causa orgânica clara na explica-
estão relacionados com o diagnóstico e com a etiologia das faço parte na qualidade de psicóloga com a responsabili- ção da sua presença; surgindo evidência do efeito de inter-
diversas dores orofaciais. dade do envolvimento, parceria, sensibilização e atualiza- venções psicológicas na DOF crónica.
ção da psicologia no contexto da saúde na ligação e diálogo Então muitos aspetos da etiologia da DTM não são cla-
Fátima Feliciano entre profissionais e abordagens, com foco na saúde mental ros, para as quais as evidências de suporte são inadequa-
Doutorada e Especialista em Psicologia Clínica; em interação íntima com a física; Sendo esta uma associação das, observando-se um suporte definitivo para um histórico
Especialista-Supervisora nas metodologias VIG/
científica portuguesa com participação e parcerias interna- biopsicossocial e multifatorial, ilustrando a complexa intera-
VHT; Especialista em Psicologia Clínica e da Saú-
de e Psicologia da Educação pela OPP; Especialista
cionais, também integro a Comissão Científica. ção entre mecanismos biológicos (ex: hormonais), estados
Avançada em Intervenção Precoce, Necessidades psicológicos, condições ambientais e macro e microtrauma.
Educativas Especiais e Neuropsicologia pela OPP. 2. Prevalência
Perita em Psicologia Forense no INML-CF. Membro Para percebermos o panorama da dor, The Pain Proposal Percebendo-se que os fatores psicológicos são variáveis
do Conselho Nacional de Psicólogos. – A Dor Crónica em Portugal (2010) apresenta estatísticas importantes nas dores crónicas orofaciais, os estudos indi-

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cam que pacientes com DTM demonstram um aumento de e discussões de casos. No entanto esta é uma realidade que ca, tem impacto na pessoa muito para além do sofrimento
somatização, de stress, de ansiedade e da depressão quan- continua a necessitar de ser exponenciada, num contexto causado, nomeadamente, sequelas psicológicas, isolamen-
do comparados com indivíduos saudáveis. Assim um vas- onde o paradigma da saúde tem limitações na forma de os to, incapacidade e perda de qualidade de vida; impacto que
to número de questionários têm sido usados para avaliar o profissionais partilharem, prevalecendo algum hermetismo ultrapassa a própria pessoa podendo envolver a família, cui-
estado psicológico de pessoas com DTM, no entanto estes dentro de cada especialidade. Mas as necessidades e ine- dadores e amigos.
deverão ser efetivados na forma de avaliação psicológica, vitabilidades que as limitações de cada área num trabalho
onde se articulam diversas formas e técnicas de obtenção e mais isolado apresentam, são ecoadas na evidência cien- Os prognósticos são variáveis, uma minoria recupera os
análise de informação que permite elaborar um perfil psico- tífica. Desta feita, neste progresso que vai acontecendo, a seus níveis iniciais de saúde e funcionamento; sabendo-se
lógico personalizado, a partir do qual se podem caraterizar formação básica académica poderá ter um papel de infor- que estes sintomas afetam todas as áreas de vida da pessoa,
fatores de vulnerabilidade, potenciais e fatores de manuten- mação e treino de equipas multidisciplinares; por outro lado podendo conduzir a sentimentos de desesperança e deses-
ção da problemática, permitindo articular os protocolos de os congressos, workshops, reuniões científicas com presen- pero; e ainda gerando elevados níveis de incapacidade.
intervenção psicológicacom outras áreas de multidisciplina- ça de profissionais em multidisciplinaridade, são contributos
ridade, o que somente poderá ser feito pelo psicólogo. essenciais; e a organização de equipas estruturadas de cariz Assim, ao nível da psicologia as evidências científicas
multidisciplinar, com diretivas claras de organização de pro- mostram que as intervenções psicológicas produzem melho-
4. Assume-se uma perspetiva de modelo convergente, tocolos articulados entre os diversos especialistas, exigem- ria nos resultados do tratamento junto destes pacientes,
abordando-se a dor crónica segundo o paradigma biopsi- -se cada vez mais. com destaque para a terapia cognitivo-comportamental, e
cossocial, de articulação entre os diversos profissionais de também desta em combinação com o biofeedback na redu-
saúde em diálogo. Os conhecimentos e informações de cada Neste âmbito a SPDOF tem tido um papel de relevo, seja ção da intensidade de dor, na interferência na atividade e na
especialista envolvido permitem identificar os diversos fato- pela sua equipa constituídas por especialistas de diversas depressão (Aggarwal et al., 2011); ficando ainda por com-
res de risco: orgânicos, psicoemocionais e psicossociais, que áreas. Esta associação científica portuguesa, com participa- preender que barreiras estão a limitar a implementação efe-
irão ser alvo de intervenção de forma a serem minimizados ção e parcerias internacionais, preza por organizar eventos, tiva da abordagem psicológica nesta prática clínica.
e a deixar o paciente melhor preparado para a intervenção como congressos, workshops, reuniões científicas, partilha
médica de redução da dor. de literatura e protocolos com instituições distintas, desde o Para além da terapia cognitivo-comportamental, consi-
Nesta linha, um estudo sobre o estado da arte do ensi- âmbito académico ao âmbito da saúde; sempre com a pre- derada como abordagem psicoterapêutica padrão para a
no da dor em Portugal, na formação académica, contabiliza missa da multidisciplinaridade, prermitindo que profissio- dor crónica (cognitivas: reestruturação cognitiva; e com-
as instituições que possuem disciplinas relacionadas com o nais dialoguem nos seus saberes, na partilha destes e no portamentais: alicerçadas na aprendizagem operante),
estudo da dor, que assentam nos seguintes cursos: Enfer- treino de competências transversais (ex:comunicação). têm vindo a ser também utilizadas, de forma coadjuvada,
magem (34), Fisioterapia (14), Psicologia (13), Medicina (7), intervenções familiares e psicoterapias da terceira gera-
Medicina Dentária (5) e Farmácia (3), sendo que a maioria 6. Na qualidade de psicóloga clínica que integra uma equi- ção, com destaque para o mindfulness. Assim, segundo
tem entre 1 a 2 disciplinas neste âmbito, os restantes têm pa multidisciplinar, que intervém com esta problemática, na Lapa, Carvalho, Viana e Pinto Gouveia (2015) “O objetivo
entre 3 e 4 disciplinas. cidade de Coimbra, os pacientes que avalio e/ou acompanho do mindfulness neste contexto é, então, manter consciên-
são quase exclusivamente encaminhados pelos profissionais cia do momento presente, diminuindo o apego a experiên-
Assim, para uma indicação terapêutica mais adequada, a de medicina dentária e de fisioterapia, que recebem estes cias (ex:.sensações físicas, pensamentos, emoções) que de
avaliação de sintomas terá de ser feita em equipa, sendo pacientes, e cujo diagnóstico seja de DTM e DOF. Assim estes outra forma estariam associadas a comportamentos auto-
fundamental que esta envolva médicos dentistas, fisiotera- vêm maioritariamente por ser uma consulta especializada máticos ineficazes, promovendo o bem-estar e uma maior
peutas, terapeutas da fala, além de psicólogos, otorrinola- de psicologia clínica, integrada na identificação e aborda- responsabilidade para com os objetivos pessoais.” (p.4);
ringologistas, neurologistas e clínicos da dor, os quais con- gem inicial de medicina dentária e/ou fisioterapia, e articu- identificando-se como mecanismo em ação na estratégia
juntamente deverão avaliar os possíveis fatores causais e lada de acordo com as necessidades identificadas na ava- mindfulness:
respetivas áreas de atuação, de forma articulada, priorizada liação das diversas dimensões do paciente. Pontualmente
e em complementaridade; singularizando cada indivíduo na pode acontecer um paciente que procurou apoio psicológico • O impacto na regulação emocional - promoção da capa-
sua situação clínica. e/ou psicoterapia, referir aspetos que indiciam uma proble- cidade em regular afeto negativo (maior familiarização e
mática neste âmbito e ser então referenciado pelo psicólo- menor reatividade com as experiências internas).
Fica então evidente a presença do psicólogo como um go para a consulta de medicina dentária especializada em
especialista essencial no lidar com a problemática da DOF e DTM e DOF, sendo que este especialista articulará/envolverá • O impacto na redução da ruminação - pensamentos
DTM, desde a avaliação à intervenção. Atuação que permita outras especialidades que forem sinalizadas. repetitivos sobre estados emocionais negativos e autorrefle-
uma abordagem sensibilizadora ao paciente e integradora xão sobre os eventos que os terão originado.
da complexidade do seu problema, numa compreensão do 7. Centrando-nos na área da psicologia, diremos que as
mesmo organizada na forma de modelo idiossincrático; o intervenções e tratamentos têm em consideração a relevân- • A descentração e desapego - diminuem o evitamento de
que permitirá ter o paciente como parceiro primordial de cia dos aspetos de estabilidade emocional, saúde mental, estados emocionais negativos (paradoxalmente aumentam
cada profissional, onde se procura que este perceba e con- equilíbrio psicoemocional e promoção de bem-estar; seja no a intensidade desses estados emocionais, ex: supressão),
cretize o seu papel de gestor da sua situação de saúde e seu papel no âmbito dos fatores etiológicos, como na manu- que diminuem a qualidade de vida e afastam os sujeitos de
doença, com psicoeducação, informação, desenvolvimento tenção do problema; pelo que se tem vindo a propor avalia- uma vida valorizada.
e prática de estratégias e hábitos de vida favoráveis e pro- ção de perfis de risco para a adesão e resultados terapêu-
motores de saúde. ticos, os quais permitem delinear propostas de intervenção Sendo esta forma de intervenção cada vez mais estudada
psicológica mais precisas e adaptadas às características e na sua aplicação no campo da dor, podemos dizer que esta-
Quanto à comunicação entre profissionais, é um facto que necessidade do paciente. mos perante movimentos de estudo e prática do mindful-
esta tem vindo a apresentar um aumento paulatino, quer na ness, no âmbito dos fenómenos da dor e forma de lidar com
sua presença como na desenvoltura com que os profissio- Como referido no Programa Nacional Para a Prevenção e ela, onde o treino de profissionais e população em geral tem
nais articulam informações, solicitações, encaminhamentos Controlo da Dor (2017), a dor, especialmente a dor cróni- vindo a acontecer com maior frequência. n

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