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48

O documentário “48” teve um papel de esclarecimento sobre o que realmente


aconteceu há 35 anos e fez com que eu adquirisse outra perceção da realidade.
São nos apresentadas diversas imagens de prisioneiros políticos que viveram numa
ditadura e num sistema autoritário durante 48 anos, daí a ideia para o nome do
documentário. De certa forma, é constantemente posto em causa, ao longo do filme, o
poder daquelas imagens e daqueles rostos que, por detrás, todos tinham uma história
para contar. Na altura em que o tema da tortura era bastante abordado, estes
indivíduos levaram-nos a refletir sobre todas as cruciações a que foram sujeitos e
todos estes sentimentos de ódio e manipulação. Em soma, o filme tem o intuito de
demonstrar como é que um sistema autoritário se consegue manter e atuar.
Na visualização deste documentário percebi a constante menção da PIDE e como
esta atuava na entidade familiar. Os testemunhos destas pessoas que abordam as suas
formas de tortura são, no mínimo, escandalosos. Perceber o que estas pessoas
experienciaram e o que as suas famílias tiveram de sacrificar e lidar. A PIDE impunha
uma vida de vigilância e violava os direitos e as privacidades das pessoas. Estas
imagens presentes ao longo do filme acabam por ganhar uma força e uma dinâmica
incomensuráveis e nos dar acesso aos sentimentos destes indivíduos para que, de
certa maneira, possamos perceber um bocadinho do que estes viveram.
Um dos presos políticos acabou por afirmar que quando se é preso existe um
combate e uma luta com os policias que têm como objetivo fazer com que os presos
falem e denunciem os outros. Ainda assim, aborda o poder destas forças de autoridade
que espancam e torturam, mas no meio de tanto poder existe um que não lhes é
retirado que é o poder de não falar. Esta situação fez-me refletir sobre as forças destas
pessoas. Estão aqui, 48 anos depois, a falar sobre a situação mais dolorosa das suas
vidas e, mesmo assim, arranjam algo que as conforte e veem, de certa maneira, um
lado menos mau. Estes são, obviamente, vítimas de um regime, mas, também,
resistentes ativos que falam das suas histórias para que estes episódios não sejam
esquecidos.
Por fim, no filme um preso refere o “poder do prisioneiro” como algo importante.
Por outras palavras, este testemunho afirma, como já referi anteriormente, que os
prisioneiros tinham um poder e acaba por relatar o exemplo das fotografias. As
imagens de cadastros, quando eram tiradas, eram obrigatórias, mas a cara e a
expressão com que ficavam era uma escolha destes presos. Tinham esse poder de
decidir como estariam no momento da captura da fotografia. E esses mesmos rostos,
como observamos no filme todo, são a prova desta resistência e força que eles tinham.

Rita Nunes, 20220910

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