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INTRODUÇÃO

O contexto geral da Saúde no Brasil, salvo excepcionais casos, revela


uma crescente insuficiência material e humana em face de uma demanda cada
vez maior e específica.

As causas são as mais variadas possíveis – e quase impossíveis de


serem catalogadas a termo – e alternam de caso para caso, quase que
necessariamente. Alguns são exemplos: ressurgimento de antigas doenças,
uso irresponsável de fármacos e seus efeitos colaterais, aparecimento de
novas doenças, envelhecimento da população, adoecimento precoce,
crescimento da violência e de acidentes etc.

Outrossim, verifica-se um desenvolvimento acelerado de novas


tecnologias, procedimentos e pesquisas médicas e farmacológicas pela
indústria que ultrapassam a capacidade de controle, de sobreposição de freios
e de preparação dos futuros profissionais ante uma precarização do ensino
superior. No mundo frenético, imediatista e dinâmico em que vivemos, poder-
se-ia até mesmo inferir que: quem pesquisa, fabrica e/ou atua, tem pressa em
aplicar; quem está doente tem pressa em se curar!

Ora, todo esse contexto gera, na prática, uma impressionante variedade


de erros profissionais, tais como: exame superficial do paciente e consequente
diagnóstico falso ou parcial; operações prematuras; omissão de tratamento ou
retardamento na transferência para outro especialista; descuidos nas
transfusões de sangue ou anestesias; emprego de métodos antiquados,
displicentes ou incorretos; prescrições erradas; abandono do paciente;
negligência pós-operatória; omissão de instrução necessária aos doentes;
entre tantos outros.

Justamente essas circunstâncias têm causado um aumento nas


demandas judiciais contra médicos e hospitais em todo o mundo, com base na
apuração e avaliação das responsabilidades civis ou penais, diante dos direitos
da pessoa humana – à saúde, v.g. – e dos deveres no exercício da medicina.

As consequências são as mais diversas desse feito “dominó”. Veloso de


Franca (FRANCA, 2014) destaca que “um dos efeitos menores será, sem
dúvida, o aumento dos honorários médicos, devido principalmente às altas
cotas de seguro. O mais grave será a inibição do médico no exercício de sua
profissão. E os demandantes que parecem, a princípio, sair ganhando sairão
certamente perdendo”.

Não obstante a gravidade do tema, ainda é escassa na doutrina pátria


as pesquisas científicas relativas à aplicação, pelo Judiciário brasileiro, do
Direito positivado tocante ao tema.

Com efeito, o cenário de, por um lado, existir inúmeras normas legais
relativas ao exercício da medicina, incluso às de responsabilização, e, por
outro, a garantia constitucional ao direito à saúde em sua plenitude, torna a
judicialização da saúde e da medicina no país uma bomba de fissão nuclear
prestes a explodir na sociedade como um todo, cujas consequências se
inserem diretamente no próprio exercício/direito à saúde latu sensu.

Nesse sentido, analisar cientificamente, examinar a situação concreta da


aplicação no Direito, pelas Cortes do país, em casos concretos, com fulcro na
doutrina e nas normas positivadas, torna-se um passo necessário para
averiguar-se como se está desenrolando o tema da judicialização da saúde e
da medicina no caso brasileiro nos tempos atuais. No caso específico do
questionamento objeto do presente trabalho, o âmbito de análise restringiu-se
ao da responsabilidade civil quando no exercício, por um cidadão, de seu
direito à saúde latu sensu.

No referencial teórico utilizado, foi feita a revisão de literatura de obras


importantes, como a da Responsabilidade Civil de Rui Stoco, da
Responsabilidade Civil do Médico de Miguel Kfouri Neto, e dos apontamentos
doutrinários de Genival Veloso de França feitos na obra Direito Médico, (12ºed
– Rio de Janeiro: Forense, 2014), entre outras. Na análise de um caso
concreto, foi utilizado o Acórdão de um julgamento recente efetuado
(agosto/2019), de um processo da Comarca de Novo Hamburgo/RS, da
Relatoria do Desembargador Dr. Eduardo Kraemer da Nona Câmara Cível de
Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que
decidiu um caso bastante complexo de diagnóstico e omissão médica a um
paciente, causando-lhe inúmeros danos, com efeitos ricochetes à sua
parentalidade.
A partir dessas constatações e de sua problemática, isto é, do aumento
das pesquisas na área, crê-se que se poderá contribuir de forma efetiva para
uma melhor compreensão da dimensão e delimitação da responsabilidade do
médico no contexto brasileiro, incluindo as circunstâncias hospitalares, bem
como influir não só na formação dos futuros agentes e na formulação de
políticas e legislações públicas, como também no aprimoramento do exercício
da medicina em consonância com o direito à saúde, em benefício para toda a
sociedade.

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