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LITERATURA

O Noviço, de Martins Pena


A obra

Escrito em 1845 e representada pela primeira vez no Teatro São Pedro (Rio de Janeiro), em 10 de agosto do mesmo
ano, O noviço talvez seja o texto mais bem construído de todas as comédias de Martins Pena. A peça é ainda hoje encenada,
como convém a um clássico da nossa literatura dramática.
Tematizando a liberdade de escolha entre os jovens, O noviço é uma comédia romântica que explora de maneira
interessante o maniqueísmo típico desse estilo literário: na dualidade entre enganados e enganadores, entre fracos e fortes,
enfim, entre o bem e o mal, há uma união do primeiro pólo – o pólo dos enganados, dos fracos, do bem – que assim se reforça
e consegue vencer o segundo: o pólo dos enganadores, dos fortes, do mal…

O estilo

As características românticas de O noviço são o maniqueísmo, o “happy end”, a temática da liberdade e a presença
da cor local. Porém, existem alguns elementos nesta peça que não se ajustam ao romantismo, por exemplo, a denúncia social
que se dá por meio do humor, da sátira e das caricaturas, e o comportamento pouco convencional, em termos de heroísmo
romântico, de seu herói: Carlos utiliza-se de meios moralmente pouco recomendáveis para atingir o que pretende, aproxi-
mando-se, deste ponto de vista, do vilão, Ambrósio. Além disso, a união dos fracos e enganados (Florência e Rosa) contra a
força (Ambrósio), transformando em capacidade de luta a submissão e em esperteza a ingenuidade, constitui recurso pouco
frequente nos textos tradicionalmente românticos.

Estrutura da obra

A peça é dividida em três atos, em vez de possuir apenas um, como ocorre na maioria dos outros trabalhos de Martins
Pena, podendo assim desenvolver melhor tanto a trama quanto os tipos representados.
No primeiro ato, apresentam-se o hipócrita e interesseiro Ambrósio, que se casou com a crédula Florência; o noviço Carlos
que, vocacionado para a carreira militar, fugiu do convento para casar-se com Emília (filha de Florência e sua prima). Aparece tam-
bém Rosa, primeira esposa de Ambrósio (não havia divórcio na época), que foi abandonada por ele após ter seus bens roubados.
Carlos encontra Rosa, e esta lhe fornece meios para chantagear Ambrósio e permitir-lhe sair corretamente do convento, retirar
Emília e Juca (irmão mais novo de Emília) da vida religiosa que o padrasto planejava para eles e casar com Emília.
A chantagem ocorre no segundo ato, junto com a revelação à Florência de que o marido é bígamo; Ambrósio foge.
No terceiro ato, após muita confusão, Ambrósio é preso, Carlos liberto de ir ao convento ou ser preso (ele atacara um frade
na fuga), e o par romântico fica livre para casar. A peça toda lembra as comédias pastelões, com personagens caricatos,
situações mirabolantes, perseguições, disfarces, esconderijos e quiproquós.

Personagens

As personagens da peça não possuem densidade psicológica, já que são constituídas por meio de estereótipos e de
recursos caricaturais que as transformam em “tipos”:

Ambrósio – malandro trapalhão, um consumado velhaco que acredita que “os meios justificam os fins”.
Florência – mulher de Ambrósio, submissa e ingênua.
Emília – enteada de Ambrósio
Juca – menino de 9 anos, filho de Florência
Carlos – noviço da Ordem de São Bento, sobrinho de Florência
Rosa – provinciana, primeira mulher de Ambrósio
Padre-mestre dos noviços
Jorge
José – criado
1 meirinho, que fala
2 ditos, que não falam
Soldados de Permanentes, etc.

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O enredo o plano do marido da tia: filhos e enteados dedicados à vida
religiosa seriam obrigados a fazer votos de pobreza, o que
O noviço traz basicamente a história de Carlos, rapaz garantiria a posse de todos os bens por parte de Ambrósio.
endiabrado, que é enviado a um convento por decisão de sua tia Emília e Juquinha saem da sala.
e tutora. Não tendo vocação para a vida religiosa, o moço foge Batem à porta. Rosa entra na sala e, com muita
do convento e dedica-se a desmascarar o ambicioso Ambrósio, reverência, dirige-se a Carlos, imaginando ser ele um frade.
segundo marido de sua tia. A seguir, organiza-se a sequência Conta-lhe que está à procura de seu marido Ambrósio Nu-
de ações que desenvolvem a essência do enredo. nes, o qual, há seis anos, a abandonara em Maranguape, de
A peça inicia-se com Ambrósio Nunes em uma sala posse de sua fortuna, a pretexto de investimentos lucrativos
ricamente decorada. Preparando-se para ir à igreja com sua em Montevidéu. Sem notícias, ela chegou a pensar que ele
mulher Florência, o personagem afirma, em tom cínico, que tivesse morrido, mas uma pessoa informara-lhe de que estava
mudara sua vida de homem pobre em oito anos. Fora miserável, o fujão na Corte, e estava ela ali, no momento, após longa
porém, valendo-se de determinação, perspicácia e destituído viagem e andanças pelo Rio de Janeiro. Carlos aproveita-se do
de qualquer escrúpulo, tornara-se rico, condição que lhe con- engano da mulher e, fingindo ser bom capuchinho, investiga
feria poder e lhe garantia plena impunidade. É interrompido detalhes da história e recebe, como prova da veracidade dos
por Florência, que o apressa, dizendo que é necessário chegar fatos relatados, uma cópia da certidão de casamento de Rosa
cedo para sentarem-se nos primeiros bancos e, assim, poderem e Ambrósio. Promete ajudá-la e pede-lhe que aguarde alguns
assistir confortavelmente à Missa de Ramos. Ambrósio, com momentos em um quarto da casa. Florência, o marido e a
delicadeza de fala e de gestos, pergunta à esposa como anda filha, prontos para saírem, deparam-se com Carlos. Ambrósio
o projeto de encaminhar a enteada Emília para o convento, cobra de Carlos obediência. O moço ironicamente desafia o
satisfazendo-se com a notícia de que tudo corre como ele marido da tia por meio de frases ambíguas, dando a entender
desejava. Com muita habilidade, Ambrósio enfatiza a ideia que conhecia sua história pregressa. Este se enfurece e passa
de que a herança deixada pelo primeiro marido de Florência a fazer-lhe exigências. Carlos o toma pelo braço, abre a porta
nunca o atraiu, revela que sua paixão sempre foi espontânea do quarto e mostra-lhe Rosa. Ambrósio desorganiza-se, corre
e pura e, de certo modo, lhe é um tanto penoso administrar e arrasta, violentamente para fora da casa, mulher e enteada.
a fortuna do nobre falecido. No entanto, cabe ao marido zelar Carlos diverte-se com a aflição do cínico tio e expõe
pela esposa amada. Desse modo, toma para si a incumbência à Rosa a atual condição de Ambrósio. A mulher traída não
de cuidar do dinheiro. resiste. Desmaia. Cria-se um alvoroço. Juquinha é chamado
Florência cede às propostas aparentemente sinceras a ajudar; apanha um galheteiro, Carlos a faz cheirar vinagre,
do marido e concorda em encaminhar não somente a filha para azeite, tentando-lhe restituir os sentidos. Em meio a intensa
o claustro, mas também incentivar seu filho Juca de nove anos agitação, ouvem-se meirinhos aproximarem-se. Dirigem-se
a ser frade, acreditando que assim estaria proporcionando a eles a casa para efetuar a prisão do travesso noviço. Carlos faz
ambos uma vida virtuosa e verdadeiramente feliz. Ambrósio, a mulher acreditar que Ambrósio é poderoso e que os oficiais
com a intenção deliberada de controlar toda a situação familiar, batiam à porta para prendê-la. Propõe a ela que trocassem as
mostra-se preocupado com a possibilidade de Carlos, sobrinho vestimentas. Rosa vestiria seu hábito de religioso, e ele, seu
tutelado de Florência, vir a se revoltar contra o noviciado que vestido. Desse modo, estaria ela a salvo da fúria dos meirinhos,
lhe fora imposto há seis meses e causar aborrecimentos ao e ele seria preso em seu lugar. Rosa ingenuamente aceita a
casal. Encerra-se a conversa. Ambrósio retira-se para acabar proposta. Juca a encaminha para um quarto. Carlos, travestido
de vestir-se. Florência está a agradecer a Deus o marido que de mulher, recebe dissimuladamente o Mestre de Noviços e os
tem, quando Emília entra na sala. A mãe aproveita o momento meirinhos. Faz-se passar por tia do noviço endiabrado, aponta
para expor à filha as vantagens que a vida de freira proporciona. o esconderijo e orienta a maneira segura de surpreender e
Emília chora e, contrariada, declara não ter inclinação para o prender o sobrinho. Os oficiais entram no quarto, capturam o
claustro. A mãe, insensível à dor da filha, abandona a sala e falso noviço e o levam para o convento.
sobe ao sótão para aprontar-se para a missa. Carlos diverte-se imaginando a confusão que aconte-
Inesperadamente, Carlos, vestido de frade, entra ceria, quando o Abade percebesse que uma mulher fora presa
afobado e conta à Emília que havia fugido do convento, após em seu lugar. Pede a Juca que  ficasse à janela e o avisasse
discussão que acabara com uma barrigada no Abade Mestre.  da chegada do padrasto.
Irado, manifesta o desejo de ser militar, de envolver-se em Ambrósio, perturbado, invade a sala. Havia deixado
lutas com espadas e não de se submeter a jejuns prolongados Florência e Emília na igreja. A sua agitação é tamanha que se
e a coros e rezas infindáveis. A moça, comovida, ouve o relato dirige a Carlos, pensando ser ele Rosa. O sobrinho aproveita-se
dos martírios sofridos pelo noviço rebelde e lhe conta que tam- do engano e diverte-se, respondendo às perguntas de Ambrósio
bém ela deverá entrar para um convento. Carlos revolta-se, como se fosse sua primeira esposa. Chega inclusive a atirar-se
declara o seu amor pela prima, acusa severamente Ambrósio aos pés de Ambrósio em pranto exagerado. Nesse instante, o
de estar conspirando contra todos. Promete que não descan- tratante Ambrósio percebe o equívoco. Irrita-se com o desca-
sará enquanto não vingar-se do velhaco Ambrósio. Em meio à ramento do sobrinho, que imediatamente lhe contém a fúria,
conversa, o garoto Juca, desajeitado em um hábito de frade, mostrando a certidão que estava em seu poder. O tom da cena
corre para o colo de Carlos, que então percebe claramente inverte-se: Ambrósio humilha-se, implora a Carlos que nada

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revele à Florência. Dono da situação, o rapaz faz exigências:  mentos felizes ao lado do marido farsante, chora convulsivamente
abandonará o noviciado, receberá a herança deixada pelo pai; e é confortada pela filha. Está assim prostrada há oito dias. Nada
Emília não será freira, e ele terá o consentimento para casar- a anima, nem mesmo os remédios receitados por um médico da
-se com a prima. Ambrósio, de joelhos, aceita as imposições família. Emília afirma ser necessário que a mãe reaja e, desse
e suplica a piedade de Carlos. modo, vingue-se de tanta traição. Florência diz que seu procura-
Subitamente, Florência e Emília entram na sala e há dor está encaminhando um mandado de prisão e que quer enviar
novo equívoco: Florência acredita ter flagrado o marido em trai- uma carta ao Abade, explicando-lhe os fatos e pedindo-lhe o
ção. Sente-se desgraçada e num assombro se dá conta de que é favor de mandar um representante do convento para que ela se
o sobrinho que subjuga Ambrósio. Pede explicações para aquela justificasse pessoalmente pelos transtornos causados. Decide,
patifaria e, cinicamente, Carlos afirma que estavam encenando então, que o criado José fosse o portador da carta.
uma comédia para o Sábado de Aleluia. A tia, atônita, ouve ainda Nova surpresa: Carlos, mais uma vez, havia fugido do
o rapaz trapalhão declarar o acordo que fizera com Ambrósio. Este claustro. Apressado, invade os fundos da casa, com o hábito
vai interrompendo a fala de Carlos com argumentos incontestá- roto e sujo, as mãos esfoladas, joelhos machucados. Entra em
veis. Diz à mulher que fora um erro encaminhá-lo ao convento, seu antigo quarto. Ouve a voz do padre-mestre, esconde-se
pois não se pode impedir que os jovens possam realizar o amor embaixo da cama em que está deitada a tia. Emília acompa-
tão genuíno que sentem. Carlos acrescenta que, como prova de nha o padre até os aposentos onde está Florência, que acorda
agradecimento, cederá metade de seus bens em favor do tio bon- meio atordoada. Estava ele incumbido novamente de efetuar a
doso e lhe entrega a certidão de casamento, como se entregasse prisão do noviço indomável. Florência e Emília surpreendem-se
o termo de cessão de parte da fortuna. Ambrósio rasga o papel, com a notícia de que Carlos tivesse escapado novamente das
dissimulando total desinteresse pela doação. Florência sente-se grades do convento. Enquanto Florência expõe a sua decisão
abençoada por ter casado com um homem tão honrado e chega de livrar Carlos do noviciado, Emília percebe a presença do
a vangloriar-se da própria capacidade de distinguir o amante amado embaixo da cama. O padre-mestre retira-se da casa,
sincero entre tantos pretendentes que tivera logo após a viuvez. aliviado por não ter mais de lidar com as diabruras de Carlos.
Elogia as qualidades do marido, que insiste não ser merecedor Florência lamenta-se da tragédia que lhe acometera.
de tanta reverência. Emília se mostra comovida e comporta-se como se não sou-
Felizes, Emília e Carlos acertam o casamento para besse do paradeiro do primo, mesmo este lhe puxando as saias
dali a quinze dias. Nem bem confirmam o enlace matrimonial, e fazendo-lhes cócegas nas pernas. Chega a casa Ambrósio,
o Mestre dos Noviços surge para efetuar a prisão do noviço trajando-se como um frade, seguindo o criado José até o quarto
fujão. O religioso declara, enraivecido, o constrangimento que de Florência. Há novo equívoco. Florência imagina ser o frade
passara diante do Abade ao cair novamente em uma cilada o representante que requisitara ao Abade e passa a lhe contar
de Carlos, quando levou ao convento uma mulher. Diante das a trama de que fora vítima. Ambrósio, não suportando ouvir
declarações do Mestre, Ambrósio perturba-se e tenta saber do tantas acusações, denuncia-se, retirando o capuz, revelando
paradeiro da tal mulher. Florência desconfia das intenções do assim a sua real identidade. Revela à mulher que as portas da
marido. A confusão está armada: o Mestre arrasta o noviço para casa estão trancadas e que ninguém poderá lhe socorrer os
fora da casa; a tia não consegue impedir a prisão do sobrinho, gritos. Impõe que lhe entregue dinheiro e joias, enfim, tudo
mesmo dizendo que Carlos abandonaria a vida religiosa e que que ela possuísse; caso contrário, só restaria a alternativa de
ela mesma diria isso ao Abade. matá-la. Nesse momento, esclarece-se mais um equívoco:
O clima na casa é de confusão. Ambrósio mostra-se José, fiel a Ambrósio, não tinha enviado a carta ao Abade, na
atordoado, Florência pede explicações para ter sido levada verdade, tinha facilitado os planos de seu patrão.
apressadamente para a igreja e ter sido lá deixada. Ambrósio Florência corre aos gritos pela casa, esconde-se em
rapidamente dissimula a própria aflição. Tenta abraçar a esposa um canto coberta por uma colcha. Ambrósio, na correria,
que se revela arredia, exigindo que se esclareça a identida- encontra Carlos, puxa-lhe pelo hábito, pensando tratar-se
de da mulher que fora presa em lugar do sobrinho. Acuado, das saias de Florência. Carlos revida com uma bofetada. A
Ambrósio inventa ser a tal mulher uma antiga namorada, que tia permanece imóvel, coberta por uma colcha. Em seguida,
não se conformara com o fato de ter ele se casado. Confessa entram quatro homens armados e o vizinho Jorge que vinha
o erro cometido ao envolver-se na juventude com aquela em socorro aos gritos que da rua se ouviam. Florência diz que
moça. Diz-lhe, no entanto, que a causa da separação fora o um ladrão, travestido de frade, tinha invadido a casa, mas já
amor incontido que sentiu desde o primeiro momento que viu havia fugido. Os homens vasculham a casa e acabam encon-
Florência. O discurso amoroso de Ambrósio é interrompido por trando Carlos, que, aos berros, sai debaixo da cama e, tentando
Rosa, vestida de frade. Esta, entregando a certidão a Ambrósio, proteger-se das agressões, mete-se atrás de um armário e o
interpõe-se ao casal, gritando que aquele homem lhe pertencia. atira ao chão. O vizinho, ferido na perna, grita à Florência que
Ambrósio corre pela casa, tentando escapar. Nesse momento, o ladrão se escondia no quarto e havia escapulido por uma
ouve-se a ordem de prisão ao bígamo. Enquanto isso se pas- porta. Emília desvencilha-se do vizinho, agradece a ajuda e
sa, Florência, estarrecida, lê a certidão de casamento de Rosa mando-o embora. Insiste com a mãe que o frade era Carlos.
Lemos e Ambrósio Nunes. A mãe retruca, afirmando que era o padrasto.
Muda-se o cenário. Florência, recolhida no quarto de A tensão aumenta com a chegada de Rosa, que é rece-
Carlos, para evitar contato com o ambiente em que vivera mo- bida com certa amabilidade por Florência. As duas conversam a

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sós. Lamentam-se da inocência com que se entregaram ao vilão outro e no Largo há uma casa onde se veem muitos bichos,
Ambrósio. Rosa apresenta à Florência a ordem de prisão contra cabritos com duas cabeças, porcos com cinco pernas…
o bígamo e queixa-se ao saber que Ambrósio há instantes es- ANINHA – Como é bonita a corte! Lá é que a gente
capara daquela casa. De modo inesperado, arrebenta-se uma pode se divertir, e não aqui, onde se ouve só os sapos canta-
tábua do armário e Ambrósio, quase asfixiado, põe a cabeça rem. Teatros, mágicas, cavalos que dançam, cabeças com dois
de fora. Ambas as mulheres o atacam aos socos e pauladas. cabritos… Quanta coisa! Quero ir para a corte!
O farsante, aos gritos, suplica compaixão às duas esposas.
Entra, no quarto, Carlos, preso por Jorge e os solda- Martins Pena: Breve biografia
dos. Florência desfaz o engano, dizendo que era seu sobrinho
quem tomavam por ladrão. Ambrósio esconde-se novamente Luís Carlos Martins Pena nasceu no dia 05 de novem-
no armário. Rosa, acompanhada de oficiais de justiça, entrega bro de 1815 no Rio de Janeiro (RJ). Seu pai era desembargador
o mandado lavrado de prisão. O bígamo é retirado do armário e não tinha muitas posses. Ficou órfão muito cedo, com apenas
e recebe a sentença de prisão. O Mestre de Noviços retorna um ano, de pai e aos dez anos, de mãe. Seu padrasto, o mili-
a casa com a permissão de livrar Carlos do convento. Antes tar Antônio Maria da Silva Torres, deixou-o sob tutela, após a
de retirar-se, o religioso abençoa a futura união de Emília e morte da esposa em 1825 durante o parto da filha.
Carlos. Ambrósio sai, lamentando-se da punição recebida. Sob orientação dos tutores, ingressou na carreira
comercial e concluiu em 1835, aos vinte anos, o curso de
Fonte: https://www.passeiweb.com/estudos/livros/o_novico/
Comércio. Estudou, ainda, literatura, teatro, desenho, mú-
sica, arquitetura, história, além do estudo de outras línguas.
O autor e sua época Este último foi responsável pelo ingresso do autor na carreira
diplomática, o que o levou a Londres. Na viagem de volta ao
Martins Pena (1815-1848) foi o maior comediógrafo Brasil, o autor sofreu complicações da tuberculose em Lisboa e
do Brasil Império. Sua obra, composta por 30 peças, das quais faleceu aos 7 dias de dezembro de 1848 em Lisboa (Portugal).
22 são comédias, retrata a vida cotidiana de pessoas comuns Martins Pena é considerado o consolidador do teatro
do Rio de Janeiro. Produzida entre 1833 e 1847, anos que no Brasil com suas comédias de costumes que até hoje são
abrangem o final da Regência e o início do Segundo Reinado, representadas. A primeira representação de uma peça do autor
ela documenta um período marcado por grande crescimento foi em outubro de 1838, a peça era “O juiz de paz na roça”, no
urbano da capital do Império. Teatro São Pedro.
A cidade do Rio de Janeiro modernizava-se e ganhava Ao passo que se despontava como escritor de peças
ares de capital com calçamento e arborização de ruas, amplas teatrais, exercia diversos cargos no Ministério dos Negócios
avenidas, jardins públicos e palácios. A rua do Ouvidor enchia- Estrangeiros, inclusive como agregado à Legação do Brasil em
-se de novas lojas de chapeleiros, modistas francesas, alfaiates, Londres (Inglaterra). Além de fundador da comédia de costu-
boticários, floristas, charuteiros, joalheiros e até sorveteiros. mes no Brasil, escreveu outros gêneros como farsas e dramas
Novas diversões para a “boa sociedade” se disseminavam: e contribuiu no Jornal do Commercio como crítico teatral.
cafeterias, concertos, bailes, serões e o teatro – locais para Sua obra pertence ao teatro romântico. Suas peças
ver e ser visto. Os principais teatros da capital eram o Teatro brincavam satirizavam os costumes de sua época (Regências e
Constitucional Fluminense, o Teatro Lírico e o mais antigo de início do Segundo Reinado) com personagens populares, como
todos, o Real Teatro São João (depois chamado Pedro de Al- que tiradas das ruas do Rio de Janeiro e colocadas no papel:
cântara e, atualmente, Teatro João Caetano). A capital recebia malandros, moças casadoiras, soldados, sertanejos, provincia-
companhias teatrais e líricas internacionais, além de atores, nos, juízes, estrangeiros, jovens pomposos, velhas solteiras,
compositores e escritores de teatro nacionais como João Ca- funcionários públicos, meirinhos, contrabandistas, caixeiros,
etano, Carlos Gomes e Martins Pena, respectivamente. comerciantes, etc. O âmbito social e o enredo escolhidos por
O fascínio exercido pela corte aparece neste diálogo Martins Pena também refletiam os da época: casamentos, fes-
tas na roça, festas da cidade, decisão de herança, pagamento
entre dois personagens da roça em uma peça de Martins Pena:
de dotes e assim por diante.
JOSÉ – Vamos para a corte, que você verá o que é
Martins Pena, com certeza, ofereceu uma identidade
bom. ANINHA – Mas então o que é que já lá tão bonito?
ao teatro brasileiro, dando ao mesmo cunho histórico-social,
JOSÉ – Eu te digo. Há três teatros e um deles é maior
uma vez que retratava a própria sociedade brasileira da pri-
que o engenho do capitão-mor.
meira metade do século XIX.
ANINHA – Oh, como é grande!
Obras: Um Sertanejo na Corte (1833-37), O Juiz de
JOSÉ – Representa-se todas as noites. Pois uma má-
Paz da Roça (1842), O Judas em Sábado de Aleluia (1846), O
gica que lá se apresentou…
Cigano (1845), As Casadas Solteiras (1845), O Noviço (1845),
ANINHA – O que é mágica?
O Namorador ou A Noite de São João (1845), O Caixeiro da Ta-
(…) ANINHA – Que vontade eu tenho de ver todas es-
verna (1845), Os Meirinhos (1845), Os Ciúmes de um Pedestre
sas coisas! JOSÉ – Além disso há outros muitos divertimentos.
ou O Terrível Capitão do Mato (1846), Os Irmãos das Almas
Na rua do Ouvidor há um Cosmorama, na rua de São Francisco
(1846), O Diletante (1846), Quem Casa, Quer Casa (1847).

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Martins Pena e a comédia de costumes ou jovens que se rebelam contra as decisões autoritárias dos
pais – situações que não se encaixam no perfil do Romantismo.

Considerado o criador do teatro de costumes no Bra- O noviço é uma comédia em três atos escrita em 1845,

sil, Martins Pena retratou a sociedade de sua época, criando mas publicada somente em 1853. A história se passa no Rio

personagens que simbolizam diferentes tipos sociais – dos se- de Janeiro e mostra tanto cenas de cultura popular como as

nhores aos escravos. “Se se perdessem todas as leis, escritos, intrigas da sociedade. A trama desenrola-se a partir da ação

memórias da história brasileira dos primeiros cinquenta anos de Ambrósio, um homem pobre, ambicioso e sem escrúpulos

deste século XIX, que está a findar, e nos ficassem somente as que se casa com Florência, uma viúva rica, mãe de dois filhos,

comédias de Pena, era possível reconstituir por elas a fisionomia Emília e Juca, e tutora de Carlos, seu sobrinho órfão – o no-

moral de toda essa época.” viço da peça. Ingênua e facilmente manipulada pelo marido,

Esta análise, feita no final do século passado pelo Florência acredita que Ambrósio se casou com ela por amor e

crítico literário Sílvio Romero sobre as comédias de Luís Carlos não desconfia que, na verdade, ele está interessado apenas

Martins Pena, resume a importância adquirida pela dramaturgia em seu dinheiro.

desse autor no panorama da literatura brasileira. Considerado, O noviço é construído com uma cadeia de intrigas na

por muitos estudiosos, o “pai do teatro de costumes no Brasil”, qual nem mesmo os personagens de melhor caráter hesitam

Martins Pena criou personagens que – apesar de não terem em lançar mão da chantagem e outros subterfúgios pouco

grande densidade psicológica – simbolizam diferentes tipos éticos.

sociais de nosso país. Estão presentes, em seus textos, desde Ambrósio percebe que Emília se encontra em idade

os nobres representantes da Corte, no alto da camada social, de se casar e, se isso ocorrer, Florência terá de dar ao noivo

até os escravos, na base da pirâmide, passando também por um dote, algo que lhe desagrada profundamente. Então, con-

funcionários públicos, empregados em diferentes tipos de vence a mulher de que a moça deveria ser colocada em um

empresas, sacristãos, soldados, artesãos, etc. convento e, para evitar que surjam outros problemas com sua

Mostrando, por meio do humor e da sátira, as condu- tão cobiçada herança, persuade a mulher a também colocar

tas e os costumes “censuráveis” da população, o autor traça Juca, o outro filho, no convento para se tornar frade.

um amplo retrato do Brasil da primeira metade do século XIX. Para atrapalhar a tranquilidade de Ambrósio, surge

Observador astuto de sua época e crítico mordaz, expõe a Carlos, interno a contragosto há seis meses no convento da

desorganização e a corrupção nos serviços públicos, o contra- Ordem de São Bento. O grande desejo do noviço é ser militar

bando de escravos, a exploração do sentimento religioso, os e casar-se com Emília, que também é apaixonada por ele. A

comerciantes que enganam seus clientes, os casamentos sob jovem também não se conforma com a decisão de ter que se

encomenda ou homens que se casam apenas por interesse tornar freira. Após dar uma cabeçada que fez desmaiar o abade

financeiro. de seu convento, Carlos foge e se esconde na casa de Emília.

Martins Pena é o precursor de um gênero de teatro, a Ao descobrir que o padrasto da moça convenceu Florência a

chamada comédia de costumes, por meio da qual constrói um colocar os filhos dela no convento, começa a desconfiar da

retrato da sociedade brasileira. Seus personagens representam honestidade de Ambrósio.

tipos sociais, em geral, vistos sob seus piores aspectos. Quase As coisas para Ambrósio se complicam ainda mais

todas as suas comédias possuem alguns traços em comum. O quando aparece na casa de Florência a cearense Rosa, primeira

autor costuma mostrar as tradições e os costumes populares, mulher de Ambrósio. Pensando ser Carlos um padre, ela lhe

como as festas do Espírito Santo, a “malhação” do Judas, os conta estar há seis anos à procura do marido que desaparecera

festejos de São João, além de explorar uma série de situações com todo o dinheiro que possuía. Informada de que Ambrósio

que se repetem nos enredos: as intrigas domésticas, os ca- estaria no Rio de Janeiro, dirigiu-se à cidade, localizou a casa

çadores de dotes, os casamentos por interesse, as diferenças na qual ele morava e foi procurá-lo, querendo saber se era

entre o universo dos moradores da roça e da cidade. verdadeira a informação de que ele se casara novamente.

Cronologicamente, Martins Pena pertence ao Ro- Carlos obtém um trunfo contra Ambrósio, mas ainda tem um

mantismo, movimento literário do início do século XIX, cujas problema a superar: o mestre dos noviços está em seu encal-

características são o individualismo, o lirismo e o predomínio ço, querendo reconduzi-lo ao convento. Então, mente a Rosa,

da sensibilidade e da imaginação sobre a razão. Suas peças, dizendo que Ambrósio chamou a polícia para prendê-la. Troca

escritas entre 1833 e 1846, trazem várias marcas dessa escola. de roupa com ela e esta, ao ser encontrada de batina, é levada

É comum, por exemplo, encontrar personagens driblando todas à força ao convento.

as adversidades para ficar junto da pessoa amada. Afinal, um Carlos começa a chantagear Ambrósio. Exige que

bom casamento era, naqueles tempos, uma das principais ele convença sua tia a retirá-lo do convento, autorize seu ca-

preocupações dos jovens. samento com Emília e receba o dote a que tem direito. Com
Seus textos, porém, antecipam algumas caracterís- medo de ser desmascarado, o bígamo golpista concorda com

ticas do Realismo, movimento literário surgido em meados do as exigências. O enredo ainda apresenta mais confusões,

século XIX.  Para lembrar, O Realismo opõe-se ao lirismo e mantendo o ritmo da comédia com várias cenas engraçadas

à imaginação dos autores românticos. Nas peças de Martins até o final feliz para Carlos e Emília.

Pena, isso aparece em alguns personagens, como moças que O noviço é uma das peças mais populares de Martins

não se envergonham quando se encontram diante dos amados Pena e podemos dizer que seu grande tema é o engano. Anote!

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Obra Literária_O Noviço (Martins Pena) - 1/2021
Temos o mestre dos noviços, que captura Rosa por engano; [o] obriga a necessidade a ser o mais somenos amanuense
temos Ambrósio, mentindo para toda a família, e até mesmo em uma repartição pública e a copiar cinco horas por dia os
Carlos, que para desmascarar Ambrósio, engana Rosa. Nem mais soníferos papéis. O que acontece? Em breve matam-lhe
os religiosos escapam, pois, à noite, eles vestem casaca e se a inteligência e fazem do homem pensante máquina estúpida,
disfarçam com uma peruca, fingindo-se de leigos, para fre- e assim se gasta uma vida!”
quentar o teatro, o que lhes é proibido. Apesar de traçar um painel pessimista da realidade,
Assim como em toda a sua obra, Martins Pena tece uma Martins Pena não deixa de mostrar esperanças: “O respeito e
série de críticas à sociedade brasileira em O noviço. A corrupção, a modéstia prendem muitas línguas, mas lá vem um dia que
a impunidade, o tratamento desigual por parte da Justiça em a voz da razão se faz ouvir, e tanto mais forte quanto mais
relação a pobres e ricos, por exemplo, não escapam à atenção comprimida [...] Que não se constranja ninguém, que se
do autor que, logo no início da peça, faz Ambrósio comentar: estudem os homens e que haja uma bem entendida e escla-
“No mundo, a fortuna é para quem sabe adquiri-la. recida proteção, e que, sobretudo, se despreze o patronato,
[...] Vontade forte, perseverança e pertinácia são poderosos que assenta o jumento nas bancas das academias e amarra o
auxiliares [...] Há oito anos, eu era pobre e miserável, e hoje homem de talento à manjedoura.”
sou rico, e mais ainda serei. O como não importa; no bom re- Para o autor, entretanto, as injustiças, a corrupção e
sultado está o mérito... Se em algum tempo tiver de responder as desigualdades só serão corrigidas quando os mais fracos
pelos meus atos, o ouro justificar-me-á e serei limpo de culpa. se unirem e, juntos, lutarem contra os poderosos. Essa união
As leis criminais fizeram-se para os pobres [...]”. está simbolizada no acordo que Florência e Rosa fazem para
As críticas à religião e à burocracia religiosa também se vingarem de Ambrósio: “ROSA – E nós, suas desgraçadas
estão presentes nas falas do noviço Carlos: “Não nasci para vítimas, nos odiaremos mutuamente, em vez de ligarmo-nos,
frade, não tenho jeito nenhum para estar horas inteiras no para de comum acordo perseguirmos o traidor? FLORÊNCIA
coro a rezar com os braços encruzados. Não me vai o gosto – Senhora, nem eu, nem vós temos culpa do que se tem pas-
para aí... Não posso jejuar: tenho, pelo menos, três vezes ao sado. Quisera viver longe de vós; vossa presença aviva meus
dia, uma fome de todos os diabos. [...] Gosto de teatro, e de desgostos, porém farei um esforço – aceito o vosso ofereci-
lá ninguém vai ao teatro, à exceção de Frei Maurício, que fre- mento – unamo-nos e mostraremos ao monstro o que podem
quenta a plateia de casaca e cabeleira, para esconder a coroa.” duas fracas mulheres quando se querem vingar.
Martins Pena viveu em uma época na qual a Igreja Martins Pena fez do palco um espelho do Brasil. Suas
Católica estava ligada ao Estado e dava grande importância comédias, escritas poucos anos depois da proclamação da Inde-
às exterioridades do culto. Suas críticas aos religiosos e, in- pendência, significam uma tomada de consciência da realidade
diretamente, à Igreja revelam uma ousadia e irreverência. O brasileira, uma maneira de se tentar pensar criticamente sobre
agudo senso de observação do autor muitas vezes resulta em nossa cultura. Com isso, a tradição da comédia de costumes
um quadro crítico da sociedade brasileira da primeira metade acabou sendo incorporada em nosso teatro, que seria conti-
do século XIX. nuada, nos anos seguintes, por autores como Joaquim Manuel
O personagem Carlos, obrigado a seguir uma carrei- de Macedo, José de Alencar, Artur Azevedo, Viriato Correia,
ra que não deseja, é um instrumento para o autor fazer um Oduvaldo Vianna e tantos outros.
discurso libertário cheio de críticas sutis às instituições: “Eis Como escreveu o crítico José Veríssimo a respeito
aí porque vemos entre nós tantos absurdos e disparates. Este de Martins Pena, “poder-se-ia dizer, com alguma razão, que o
tem jeito para sapateiro: pois vá estudar medicina... Excelente teatro brasileiro estava, se não fundado, começado”.
médico! Aquele tem inclinação para cômico: pois não senhor,
será político... Ora, ainda isso vá. Estoutro só tem jeito para Considerações finais. Fixe seus conhecimentos:
caiador ou borrador: nada, é ofício que não presta... Seja
diplomata, que borra tudo quanto faz. Aqueloutro chama-lhe Nascido no Rio de Janeiro no dia 5 de novembro de
toda a propensão para a ladroeira; manda o bom senso que 1815, Luís Carlos Martins Pena teve uma vida curta, morren-
se corrija o sujeitinho, mas isso não se faz: seja tesoureiro do em Lisboa, de tuberculose em 7 de dezembro de 1848.
de repartição, fiscal, e lá se vão os cofres da nação à garra... Esses 33 anos de vida, entretanto, foram suficientes para
Essoutro tem uma grande carga de preguiça e indolência e só que se consagrasse como dramaturgo, tendo escrito 28 peças
serviria para leigo de convento, no entanto vemos o bom do teatrais. Ainda jovem, Martins Pena fez curso de comércio e
mandrião empregado público, comendo com as mãos encru- frequentou a Academia de Belas Artes, aprendendo pintura,
zadas sobre a pança o pingue ordenado da nação [...]”. escultura, arquitetura e cenografia. Estudou também História,
Martins Pena também se aproveita das falas de Carlos Geografia, Literatura e Línguas. Em 1838, iniciou sua vida de
para retratar a situação dos intelectuais na sociedade brasilei- funcionário público, tendo sido nomeado amanuense do con-
ra, quase sempre pendurado em empregos burocráticos, em sulado da Corte. Durante bom tempo trabalhou como censor
geral, nas repartições públicas: “Este nasceu para poeta ou teatral, escrevendo pareceres sobre peças de todos os gêne-
escritor, com uma imaginação fogosa e independente, capaz de ros: comédias, farsas, dramas, óperas etc. Tal trabalho lhe foi
grandes cousas, mas não pode seguir a sua inclinação, porque proveitoso, pois permitiu-lhe que se familiarizasse, cada vez
poetas e escritores morrem de miséria no Brasil... E assim mais, com a técnica teatral.

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CURSO PREPARATÓRIO
Sua primeira peça, O juiz de paz da roça, escrita em 1833, aos 18 anos, foi levada aos palcos pela primeira vez
cinco anos mais tarde pela companhia teatral de João Caetano, um dos mais importantes atores brasileiros do século XIX. A
montagem serviu para a consolidação da comédia de costumes como gênero preferido do público e popularizou o nome de
Martins Pena. Após escrever outras comédias, como Um sertanejo na Corte (inacabada), A família e a festa na roça (1837), o
autor decidiu enveredar pelo caminho do teatro histórico, gênero nobre no Romantismo europeu, mas não foi bem-sucedido.
Na realidade, era como autor de comédias que ele se destacava. Entre 1844 e 1846, escreveu 17 peças cômicas, entre elas
O noviço. Em 1847, Martins Pena foi nomeado adido de primeira classe da legação brasileira em Londres. Seus trabalhos
diplomáticos, entretanto, tiveram de ser interrompidos no ano seguinte, por estar gravemente enfermo. Não chegou a voltar
ao Brasil. Morreu em Lisboa e foi sepultado no Cemitério dos Prazeres. Dois anos mais tarde, seus restos mortais foram exu-
mados e trasladados para o cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro.
Além de ser o grande precursor da comédia de costumes, Martins Pena também é considerado um dos pioneiros do
teatro no Brasil. Um marco no teatro brasileiro. Quando os jesuítas chegaram ao país, no século XVI, o teatro foi uma das
formas utilizadas pelos religiosos para catequizar os índios. Fora esse espaço religioso, porém, a sociedade brasileira não
tinha receptividade para esse tipo de arte, que acabou subsistindo de forma efêmera. Quando D. João VI chegou ao Brasil em
1808, encontrou um país carente de lazer e cultura e, para reverter a situação, ordenou o início de uma série de obras que
resultaram no aparecimento da Biblioteca Nacional, do Jardim Botânico e também do Teatro São João, mais tarde batizado de
teatro São Pedro. As peças encenadas, até então, eram de autores estrangeiros. A proclamação da Independência acendeu
desejos de se nacionalizar a literatura e as outras formas de arte. Durante o Romantismo, surgiram textos teatrais brasileiros
capazes de serem levados ao palco. Uma das primeiras encenações de autores nacionais foi a tragédia Antônio José, também
conhecida como O Poeta e a Inquisição, escrita por Gonçalves de Magalhães e encenada por João Caetano, em seu esforço
de criar um ambiente teatral no Rio de Janeiro. Mas foi com Martins Pena que o teatro brasileiro tomou impulso e adquiriu
colorido verdadeiramente nacional.

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