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INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE

SINTERIZAÇÃO

J. M. Vieira
R. C. C. Monteiro
A. M. Senos

(Dezembro de 2000)
Nota prévia:

O curso Introdução aos Modelos de Sinterização serviu de suporte às


aulas da disciplina de Sinterização e Microestrutura, do 3º Ano da
Licenciatura de Engenharia Cerâmica e do Vidro, entre os anos de 1981 e
1992.

O actual texto escrito teve uma primeira edição em 1982, foi expandido
em 1985 com a recolha de exemplos de sistemas reais de sinterização,
representativos da cinética que é discutida em cada capitulo.

Na versão actual, que reporta na sua estrutura a 1992, foi introduzido um


novo capítulo sobre Sinterização Reactiva, e melhorou-se o aspecto gráfico
e fez-se uma revisão do texto, mantendo-se intencionalmente intacta a
sequência expositiva anterior. Esta edição de 2000 passou a estar
também disponível em suporte digital, facultando ao aluno compor sobre
este texto as suas notas de estudo e enriquecê-lo.

O texto pretende continuar a ser um apoio ao aluno na actual disciplina de


Transformações Estruturais e Sinterização, do 3º Ano das Licenciaturas
em Engenharia Cerâmica e do Vidro e de Engenharia de Materiais. A
perspectivação dos temas, a diversidade da exemplificação, o treino na
análise destes fenómenos nos materiais e a discussão das noções
sumariamente apresentadas aqui, só podem ser integralmente realizadas
no ambiente da aula e com a participação do aluno. Ultrapassam por isso
o objectivo fixado para este texto.

Os autores,
Dezembro de 2000.
ÍNDICE

INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO


Nota prévia

1. INTRODUÇÃO........................................................................................................................ 1
1.1 PROCESSO DE SINTERIZAÇÃO ...................................................................................................................... 1
1.2 ESTADO INICIAL DO PÓ.................................................................................................................................. 1
a) Composição química ............................................................................................................................... 1
b) Tamanho inicial das partículas ................................................................................................................. 2
c) Estado de aglomeração........................................................................................................................... 2
d) Homogeneidade e isotropia:..................................................................................................................... 2
1.3 CLASSES DE SINTERIZAÇÃO ......................................................................................................................... 2
Classe A - Vitrificação.................................................................................................................................. 3
Classe B - Sinterização em presença da fase líquida ..................................................................................... 3
Classe C - Sinterização no estado sólido ...................................................................................................... 3
1.4 ESTÁDIOS DOS PROCESSOS DE SINTERIZAÇÃO........................................................................................... 4
1.4.1 ESTÁDIOS DA SINTERIZAÇÃO NO ESTADO SÓLIDO ................................................................................. 4
A - Estádio inicial ........................................................................................................................................ 4
B - Estádio intermédio ................................................................................................................................. 5
C - Estádio final........................................................................................................................................... 7
1.4.2 ESTÁDIOS NA SINTERIZAÇÃO COM FASE LÍQUIDA .................................................................................. 7
1º estádio - Rearranjo .................................................................................................................................. 7
2º estádio - Reacção .................................................................................................................................... 8

2. TERMODINÂMICA DAS SUPERFÍCIES CURVAS............................................................9


2.1 POTENCIAL QUÍMICO DE UMA PARTÍCULA COM SUPERFÍCIES CURVAS ........................................................ 9
2.1.1 POTENCIAL QUÍMICO DE UMA SUPERFÍCIE ESFÉRICA ............................................................................ 9
2.2 ACTIVIDADE QUÍMICA SOBRE UMA SUPERFÍCIE CURVA .............................................................................. 11
2.3 CONCENTRAÇÕES DE DEFEITOS PONTUAIS................................................................................................ 12
2.4 EFEITO DE UMA PRESSÃO APLICADA, pa, SOBRE O POTENCIAL QUÍMICO................................................... 14

3. CINÉTICA DE SINTERIZAÇÃO ......................................................................................... 15


3.1 LEIS DOS "FACTORES DE ESCALA OU DE PROPORCIONALIDADE DE HERRING" () ...................................... 15
3.1.1 TRANSPORTE DA MATÉRIA NA FASE GASOSA, EVAPORAÇÃO/ CONDENSAÇÃO.................................... 15
3.1.2 TRANSPORTE DE MATÉRIA POR DIFUSÃO EM VOLUME ........................................................................ 19
3.1.3 TRANSPORTE DE MATÉRIA POR DIFUSÃO EM SUPERFÍCIE................................................................... 20
3.1.4 DEFORMAÇÃO VISCOSA DA MATÉRIA()................................................................................................. 21
3.2 MODELOS DE SINTERIZAÇÃO DO ESTÁDIO INICIAL DE SINTERIZAÇÃO NO ESTADO SÓLIDO ....................... 23
3.2.1 RELAÇÕES ENTRE PARÂMETROS DA MICROESTRUTURA NO ESTÁDIO INICIAL..................................... 23
3.2.2 CINÉTICA DE RETRACÇÃO LINEAR NO ESTÁDIO INICIAL........................................................................ 25
3.2.2.1 DIFUSÃO EM VOLUME A PARTIR DA FRONTEIRA DO GRÃO............................................................ 25
3.2.2.2 DIFUSÃO NA PRÓPRIA FRONTEIRA DE GRÃO ................................................................................ 27
3.2.3 MECANISMOS CONCORRENTES COM A DENSIFICAÇÃO ....................................................................... 27
3.2.3.1 DIFUSÃO EM VOLUME ................................................................................................................... 28
3.2.3.2 DIFUSÃO EM SUPERFÍCIE.............................................................................................................. 29
3.2.3.3 TRANSPORTE NA FASE GASOSA, CONTROLADO POR EVAPORAÇÃO /CONDENSAÇÃO.................. 29
3.3.4 REDUÇÃO DE ÁREA DA SUPEFÍCIE ESPECÍFICA NO ESTÁDIO INICIAL.................................................... 30
3.2.5 DISCUSSÃO DOS MODELOS DO ESTÁDIO INICIAL ................................................................................. 32
3.3 CINÉTICA DE DENSIFICAÇÃO NO ESTADO INTERMÉDIO ()............................................................................ 36
3.3.1 DIFUSÃO EM VOLUME........................................................................................................................... 36
3.3.2 DIFUSÃO NA FRONTEIRA DE GRÃO....................................................................................................... 38
3.3.3 DISCUSSÃO DOS MODELOS DO ESTÁDIO INTERMÉDIO......................................................................... 39
3.4 DENSIFICAÇÃO NO ESTÁDIO FINAL DA SINTERIZAÇÃO ............................................................................... 42
3.4.1 DIFUSÃO EM VOLUME........................................................................................................................... 42
3.4.2 DIFUSÃO NAS FRONTEIRAS DE GRÃO................................................................................................... 44
3.4.3 DISCUSSÃO DOS MODELOS DO ESTÁGIO FINAL ................................................................................... 45

4. CINÉTICA DE CRESCIMENTO DE GRÃO.......................................................................47


4.1 CRESCIMENTO DE GRÃO EM SISTEMAS MONOFÁSICOS.............................................................................. 47
4.1.1 POLICRISTAL PURO E DENSO ............................................................................................................... 47
4.1.2 CRESCIMENTO DE GRÃO PARA O POLICRISTAL DENSO, IMPURO ......................................................... 48
4.2 CRESCIMENTO DE GRÃO EM SISTEMAS DE DUAS FASES............................................................................ 51
4.2.1 INCLUSÕES IMÓVEIS - LEI DE ZENER .................................................................................................... 51
4.2.2 MECANISMOS DE COALESCÊNCIA DAS INCLUSÕES.............................................................................. 52
4.2.3 MOBILIDADE DAS INCLUSÕES ESFÉRICAS............................................................................................ 53
4.2.4 CRESCIMENTO ANORMAL DE GRÃO ..................................................................................................... 55
4.3 MAPAS DE CRESCIMENTO DE GRÃO ........................................................................................................... 56
4.3.1 RELAÇÕES DE ACOMPANHAMENTO E SEPARAÇÃO.............................................................................. 56
4.3.2 TÉCNICA DE CONSTRUÇÃO DOS MAPAS DE CRESCIMENTO DE GRÃO() ................................................ 58
4.3.2.1 LINHA DE EQUIMOBILIDADE........................................................................................................... 58
4.3.2.2 LIMITES DA REGIÃO DE SEPARAÇÃO PORO-FRONTEIRA DE GRÃO................................................ 60
4.4 SÍNTESE DAS LEIS DE CRESCIMENTO DE GRÃO .......................................................................................... 63

5. BALANÇO ENTRE DENSIFICAÇÃO E CRESCIMENTO DE GRÃO ...........................65

6. SINTERIZAÇÃO EM PRESENÇA DE UMA FASE LÍQUIDA ..........................................71


6.1 ESTÁDIOS DA SINTERIZAÇÃO EM PRESENÇA DE FASE LÍQUIDA ................................................................. 71
1º - Rearranjo das partículas ...................................................................................................................... 71
2º - Solução-precipitação ........................................................................................................................... 71
3º - Formação de esqueleto sólido ou coalescência..................................................................................... 71
6.2 REARRANJO DAS PARTÍCULAS ................................................................................................................... 72
6.2 SOLUÇÃO-PRECIPITAÇÃO ........................................................................................................................... 74
6.3 FORMAÇÃO DE UM ESQUELETO SÓLIDO (COALESCÊNCIA)......................................................................... 75

7. SINTERIZAÇÃO REACTIVA .............................................................................................. 79


7.1 REACÇÃO COM FORMÇÃO DE FASE AMORFA........................................................................................... 79
7.2 FORMAÇÃO DE FASE SÓLIDA BINÁRIA POR REACÇÃO NO ESTADO SÓLIDO........................................... 82
7.3 INTERDIFUSÃO COM A FORMAÇÃO DE SOLUÇÃO SÓLIDA........................................................................ 87
7.3.1 EFEITO DE KIRKENDALL-HARTLEY...................................................................................................... 88
7.3.2 CINETICA DE FORMAÇÃO DO COLO SIMULTÂNEA COM A INTERDIFUSÃO.......................................... 91
7.4 RETRACÇÃO LINEAR E DENSIDADE RELATIVA DA MISTURA BINÁRIA DE PÓS............................................. 93
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 1

1. INTRODUÇÃO
Nesta introdução são apresentados os objectivos do curso e ainda os primeiros conceitos, que repetindo-
se ao longo deste estudo permitirão avançar na compreensão dos fenómenos que ocorrem na sinterização
dos materiais.

No processo de sinterização um aglomerado de partículas é processado por forma a obter um corpo com
propriedades úteis. Este processamento envolve sempre temperaturas elevadas.

As forças actuantes sobre o aglomerado de partículas durante a sinterização provocam alterações das
dimensões: densificação; alterações dos constituintes internos do corpo, da distribuição das fases,
granulometria, etc... Neste curso pretende-se caracterizar estas transformações a partir da observação de
microestruturas e estudo dos modelos que de uma forma simplificada as descrevem.

Note-se, desde já, que o carácter aproximado dos modelos que irão ser discutidos conduzirá a
interpretações conflituosas dos fenómenos observados. Somente por acumulação de informação e de
experiência se estabelecem os critérios que se firmarão como úteis na análise das questões de
sinterização. Este é o objectivo principal do curso. Apresenta-se neste capitulo introdutório um conjunto de
conceitos e definições cuja utilidade será demonstrada na continuação do curso.

1.1 PROCESSO DE SINTERIZAÇÃO

A partir de um pó ou de uma suspensão de pó, é formado por várias técnicas de conformação um corpo
cerâmico. Este corpo cerâmico é sujeito, em seguida, a um ciclo térmico. No fim do ciclo térmico as
propriedades mecânicas, a estabilidade química e as propriedades tecnológicas estão melhoradas. Por
vezes, como na sinterização sobre pressão, a operação de formação do corpo cerâmico e o ciclo térmico
são coincidentes.

Tratamentos térmicos posteriores, ou novas operações sobre a sua forma (acabamento), não serão aqui
considerados a não ser no que tiverem de análogo com os fenómenos que ocorrem durante a sinterização.
São porém de referir os tratamentos térmicos com vista à obtenção de uma dada distribuição final de
fases, ou um dado tipo de microestrutura em sistemas simples.

1.2 ESTADO INICIAL DO PÓ

São dadas as propriedades do material inicial que vão condicionar a evolução do processo de sinterização:

a) Composição química
A composição química determina as fases que irão estar presentes, ou formarem-se, durante o ciclo
térmico. Reacções químicas de transformação de fase simultâneas com o processo de sinterização
tem, a um tempo, interesse tecnológico e também interesse teórico.

De entre as fases com importância para este estudo é a formação de fase líquida a que assume maior
relevo nestas considerações.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 2

Mesmo nos sistemas formados por uma só substância química, estável ao longo de todo o ciclo térmico,
as suas impurezas condicionam a evolução do compacto durante a sinterização. Muitas matérias primas
usadas no fabrico dos cerâmicos são materiais "comuns", sendo difícil a caracterização completa da
composição em impurezas.

b) Tamanho inicial das partículas


As velocidades de sinterização e das reacções que ocorrem em simultâneo com esta são função do
tamanho inicial de partículas que por isso importa caracterizar. Como veremos em devido tempo, estes
processos são tanto mais rápidos quanto mais finas as partículas iniciais.

Para além do tamanho de partícula, também a distribuição de tamanhos nos sistemas de uma só fase, ou
as distribuições iniciais de tamanhos dentro de cada fase e as razões de tamanhos das várias fases que
constituem o pó, são de particular interesse pela sua influência sobre as alterações microestruturais que
ocorrem em simultâneo com a densificação.

c) Estado de aglomeração
As operações de preparação do pó cerâmico envolvem operações de calcinação, moagem e
classificação granulométrica. Destas operações resultam partículas que são aglomerados densos ou
porosos de cristalites. Tais aglomerados afectam a fluência e a compactação do pó na prensagem.
Quando porosos, os aglomerados originam um sistema complexo de porosidade inicial difícil de
modelar. São também o núcleo de perturbações no desenvolvimento da densificação.

De modo semelhante, heterogeneidades de composição na escala dos aglomerados e das partículas


originam perturbações microestruturais difíceis de sistematizar.

d) Homogeneidade e isotropia:
O corpo antes da sinterização deve ser homogéneo quanto à:
i) densidade inicial;
ii) granulometria;
iii) composição química média.

Corpos formados por partículas com a razão de aspecto muito diferente da unidade,

l
razão de aspecto = (1.1)
d
onde,
l = comprimento da partícula
d = diâmetro, ou dimensão transversal da partícula,
quando formados a partir de massas plásticas, por vazamento, extrusão ou prensagem unidireccional,
poderão mostrar anisotropia da retracção na sinterização. Tal efeito é minimizado pela prensagem
isostática. Porém, a prensagem isostática é uma técnica limitada a formas relativamente simples.

1.3 CLASSES DE SINTERIZAÇÃO

Analisemos as microestruturas A, B, C, representadas esquematicamente na figura 1.1, a seguir:


INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 3

Classe A - Vitrificação
A microestrutura A, corresponde à classe de sinterização designada por vitrificação. Nesta classe, o
líquido em quantidade suficiente para poder encher completamente o espaço dos poros iniciais rodeia
as partículas sólidas, podendo reagir quimicamente com estas. Os poros existem dispersos na fase
líquida e são eliminados progressivamente devido às forças de tensão superficial nas superfícies
internas destes. A cinética da sinterização nesta classe é controlada pela reologia do líquido.

Classe B - Sinterização em presença da fase líquida


Se a quantidade de líquido disponível à temperatura de sinterização for insuficiente para preencher o
espaço entre as partículas sólidas quando a porosidade for anulada, então a sinterização envolverá, a
partir de certo ponto, a alteração da forma inicial das partículas sólidas com o desenvolvimento de
contactos planos entre estas para permitir um melhor preenchimento do espaço da porosidade.

Esta alteração de forma é promovida pelas forças de tensão superficial das superfícies dos poros e
também pelas forças capilares dos filmes líquidos nos espaços entre as partículas.

Neste processo são importantes não só a viscosidade do líquido, como ainda as reacções de
solução/precipitação do sólido no líquido e a difusividade do sólido no líquido.

A B C

SÓLIDO LÍQUIDO POROS

Fig. 1.1 - Microestruturas representativas das três classes de sinterização. A - Vitrificação; B -


Sinterização em presença de fase líquida; C – Sinterização no estado sólido

Inclui-se nesta classe um processo designado por sinterização com a presença de líquido transiente.
Neste, o líquido que é volátil ou reactivo, mantém-se presente durante o processo de densificação, sendo
depois eliminado pelo aquecimento prolongado do corpo sinterizado denso.

Classe C - Sinterização no estado sólido


esta classe todo o transporte é operado por deformação e difusão na fase sólida, a única fase material
presente. Esta é a classe em que o sistema se apresenta mais simplificado, isto é, o de menor número
de variáveis a considerar. Resulta, por isso, que a maior parte dos tratamentos teóricos, a serem
discutidos a seguir, se centram nesta classe de sinterização.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 4

Convém no entanto frisar que a sinterização com fase liquida é mais comum do que a sinterização no
estado sólido quando se trata da produção industrial de cerâmicos, mesmo de muitos dos cerâmicos para
aplicações técnicas especializadas.

1.4 ESTÁDIOS DOS PROCESSOS DE SINTERIZAÇÃO

É necessário distinguir os estádios que ocorrem na sinterização no estado sólido dos presentes nas outras
classes de sinterização.

1.4.1 ESTÁDIOS DA SINTERIZAÇÃO NO ESTADO SÓLIDO

Na análise já clássica da sinterização no estado sólido são distinguidos três estádios de sinterização aos
quais correspondem três tipos diferentes de microestrutura.

A observação de microestruturas correspondentes a estes três estádios sugere que são necessárias
simplificações dos materiais reais, por forma que se possam estabelecer os modelos matematicamente
resolúveis dos fenómenos observados:
a) As partículas são aproximadas por formas geométricas simples: esferas, ou poliedros.
b) As partículas são de um só tamanho; existem modelos de sinterização para sistemas com uma
distribuição regular de tamanhos de partículas, mas tal está para além dos objectivos deste curso.
c) Assume-se que todas as partículas estão empacotadas de uma forma regular formando um
compacto ideal.
d) O número de contactos por partícula permanece constante, e as alterações de dimensões do
compacto são proporcionais às alterações de dimensões de cada par de partículas.

Os três estádios de sinterização no estado sólido são caracterizados por:

A - Estádio inicial
O sistema é descrito por um conjunto de esferas representando as partículas. No início deste estádio uma
fronteira de grão começa a desenvolver-se entre as partículas, como está representado na figura 1.2.

O colo cresce por transporte da matéria quer a partir da fronteira de grão (mecanismos que provocam a
contracção linear e densificação do compacto), quer a partir das superfícies livres dos poros. Este
transporte é originado por diferenças de curvatura, ou de pressão, nas superfícies internas do compacto.

A cinética de sinterização neste estádio é usualmente descrita pelo:


1) Tamanho relativo do colo, x/R;
2) A aproximação relativa dos centros das partículas, y/R, ou pelo seu equivalente, a retracção
linear relativa, ∆l/lo;
3) A redução relativa da superfície específica do compacto, ∆S/So. Esta variável foi introduzida
mais tarde nos modelos de sinterização, tem contudo vantagens em ser usada quando aparecem
contribuições mistas dos mecanismos de sinterização.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 5

R
y
ρ
R - tamanho de partícula
x x - tamanho de colo
ρ - raio de curvatura do colo
y - retracção linear, y/R=∆l/lo

Fig. 1.2 - Formação do colo entre partículas esféricas no estádio inicial de sinterização.

O estádio inicial termina ao fim de cerca de 3-5 % de retracção linear quando o tamanho relativo do colo se
aproxima de 30 %. Para estes valores, as diferenças de curvatura na superfície livre dos poros estão
eliminadas e a porosidade adquire a forma cilíndrica característica do estádio de sinterização seguinte.

B - Estádio intermédio
Neste estádio o sistema é descrito por um conjunto de poliedros com forma tal que permite uma ocupação
perfeita do espaço tridimensional com poliedros idênticos e tendo nas arestas comuns a cada três
poliedros um poro aberto longitudinal.

Nos modelos mais simples assume-se que estes poros são cilíndricos. Porém a forma estável destes
canais é função do ângulo diedro θ, equação (1.2), onde
γ ss
θ = arcos[ ] (1.2)
2 γ sv

γss - é a tensão superficial da fronteira de grão entre as partículas sólidas


γsv - é a tensão superficial da interface sólido vapor.

Os poros terão de facto uma secção circular apenas quando 2θ=π.

A cinética da sinterização é agora melhor descrita pela redução da porosidade, P, ou pelo seu
complementar, a densidade relativa, ρ=1-P. Quando a redução do perímetro da secção transversal do
poro, aproximadamente 2πrp , onde rp é o raio do poro cilíndrico, é tal que este se aproxima do
comprimento do cilindro,
2π r p = l (1.3)
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 6

o poro torna-se instável. Por colapso dos canais, a porosidade aberta dá origem à porosidade fechada
característica do estádio final da sinterização. Num sistema real tal verifica-se entre os 85-95% de
densidade relativa.

γsv
θ
γss
-γss

γsv

Fig. 1.3 - Secção transversal de um poro aberto com ângulo diedro θ<π/2.

Embora tetraedros, cubos, octaedros e outros poliedros simples permitam uma ocupação perfeita do
espaço tridimensional, a observação microscópica da forma dos grãos cristalinos, nomeadamente a
contagem do número de arestas por face nas figuras das secções polidas transversais, figura 1.4,
demonstrou que os poliedros regulares de maior número de faces, nomeadamente:
o duodecaedro - poliedro regular de doze faces pentagonais,
o tetracaidecaedro - poliedro formado a partir do octaedro por corte das arestas a 1/3 do seu
comprimento, formando aí faces quadradas, deixando faces hexagonais nas faces iniciais do
octaedro,
são os que melhor se aproximam das formas observadas nos materiais.

70

60

50
frequência (%)

40

30

20

10 tretacaidecaedro

0
0 2 4 6 8 10
nº de lados, n

Fig 1.4 - Curva de frequência do número de lados por face em secções polidas de Cu sinterizado e
imagem do tetracaidecaedro.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 7

A observação de que as figuras planas mais observadas têm de 4 a 6 lados está de acordo os resultados
dos cálculos de frequência feitos para o dodecaedro e o tetracaidecaedro.

C - Estádio final
No estádio final da sinterização os poros fechados formam um conjunto de poros isolados nos vértices
comuns a cada quatro poliedros. Os poliedros são os mesmos do estádio intermédio. Os poros são
esféricos se 2θ=π, e serão formados por calotes esféricas se 2θ<π. Para efeitos do estudo presente a
hipótese da esfericidade é suficiente.

A taxa de sinterização é de modo análogo descrita pela taxa de densificação, ou pela redução da
porosidade.

Dois fenómenos que eram de pouca importância nos estádios anteriores tornam-se agora mais relevantes:
i) O crescimento de grão é facilitado e rápido neste estádio, interferindo com a densificação;
ii) O aumento de pressão de gases insolúveis no interior dos poros fechados, vai contractuar
as forças que promovem a densificação podendo fazê-la parar antes de se atingir
porosidade nula, ou mesmo, inverter o processo de sinterização provocando a expansão
do corpo cerâmico.

1.4.2 ESTÁDIOS NA SINTERIZAÇÃO COM FASE LÍQUIDA

Na sinterização em presença da fase líquida um estádio de rearranjo precede o estádio final de reacção.

1º estádio - Rearranjo
O líquido entre os grãos cristalinos forma um filme lubrificante. As forças capilares e de tensão superficial
do líquido forçam as partículas umas contra as outras para minimizar o volume total ocupado pelo corpo.
Este rearranjo causa redução da porosidade. O estádio de rearranjo é caracterizado por uma velocidade
elevada de densificação operada por via do escoamento viscoso do líquido.

0,5
Redução de porosidade, ∆P

0,4

Outros processos
0,3

0,2
Rearranjo
0,1

0
0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5
Fracção volúmica de liquido, Vl

Fig. 1.5 - Redução da fracção volúmica de poros ou porosidade P, por rearranjo em função de Vl.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 8

A extensão do estádio de rearranjo é dada pela fracção volúmica de líquido Vl - figura 1.5. O estádio de
rearranjo pode ser praticamente o único estádio presente se a quantidade de líquido é elevada, como no
caso da classe de sinterização da "vitrificação".

2º estádio - Reacção
Quando ainda persiste porosidade no fim do estádio de rearranjo, esta só poderá ser eliminada por
solução/precipitação de material das partículas sólidas e consequente alteração da forma destas. São
factores importantes que determinam a velocidade de densificação neste estádio: a solubilidade mútua das
fases e os coeficientes de difusão dos constituintes do sólido no líquido.

Estes estádio termina com o desenvolvimento da coalescência das partículas, com o crescimento de grão
e engrossamento do esqueleto sólido formado pelas grãos das fases cristalinas.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 9

2. TERMODINÂMICA DAS SUPERFÍCIES CURVAS


Um dos conceitos fundamentais para a compreensão dos fenómenos de sinterização é sem dúvida o da
variação do potencial químico com a curvatura das superfícies ou intersuperfícies.

2.1 POTENCIAL QUÍMICO DE UMA PARTÍCULA COM SUPERFÍCIES CURVAS

É a existência da força de tensão superficial que leva a que as bolhas de gás no interior de líquidos, as
bolas de sabão no ar, as gotas de líquido em meio gasoso ou em outros líquidos não miscíveis, adoptem a
forma esférica. A esfera é o sólido com superfície mínima para um dado volume. Esta força de tensão
superficial, ou energia de superfície específica, opõe-se a que a forma do corpo se desvie da forma
esférica de equilíbrio, pois que tal implicaria a criação de nova área com o aumento da sua energia livre
total.

O trabalho necessário para um desvio elementar da forma de equilíbrio, que implique um acréscimo de
área do sistema dA ,é:
dW = γdA (2.1)

onde γ é a energia de superfície do sistema. Este trabalho aumenta a energia interna, E, do sistema e a
sua energia livre, G, pois que:
dE = TdS - pdV + γdA + ∑ i µ i dn i

e
dG = - SdT + Vdp + γdA + ∑ i µ i dn i (2.2)

Sendo:
S - entropia T - temperatura
V - volume p - pressão
A - área γ - tensão superficial
n - número de moles µi - potencial químico da espécie i

Mantendo-se constantes as outras variáveis de estado, resulta de (2.2) que a tensão superficial, ou energia
de superfície específica, se identifica com:
∂E ∂G
γ =( )S,V,n i = ( ) (2.3)
∂A ∂A p,T,n i

2.1.1 POTENCIAL QUÍMICO DE UMA SUPERFÍCIE ESFÉRICA

Consideremos as duas superfícies na figura 2.1, a seguir, como sendo do mesmo material (exemplo um
sólido ou um líquido) e que por um mecanismo qualquer dn moles do material podem ser permutadas em
equilíbrio entre ambas as superfícies.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 10

Sobre a superfície plana, o potencial químico é o potencial químico de equilíbrio, µo. As dn moles do
material ao serem transportadas de 0→1 aumentam de dr o raio de 1, e de dV e dA os seus volume e área
respectivamente:

r
1
dn moles

µ- µ = ∆ G
0

0
Fig.2.1 - Transporte em equilíbrio entre superfícies de curvatura diferente.

d 4
dV = ( π r 3 )dr = 4π r 2 dr
dr 3

d
dA = (4π r 2 )dr = 8πrdr
dr

dG = γdA = γ (8πrdr)

A variação total de volume do sistema é nula. Há, porém, um acréscimo dA da área total do sistema de
que resulta um aumento da energia livre:

Sendo ∆G a variação de energia livre por mole, originada por esse efeito, temos:

dV 4π r 2 dr
dG = dn ∆G = ∆G = ∆G
V mol V mol
onde Vmol é o volume molar da substância. Igualando estas duas equações resulta:
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 11

2
µ - µ o = ∆G = V mol γ (2.4)
r

O potencial químico à superfície da partícula curva, µ, encontra-se assim elevado de ∆G em relação à


superfície plana.

Em (2.4), o factor (2/r) representa a curvatura de uma superfície esférica. De uma forma geral, a curvatura
de uma superfície é dada pela relação:
1 1
curvatura = Κ = + (2.5)
r1 r2

sendo r1 e r2 os dois raios principais de curvatura da superfície no ponto. Para uma esfera é evidente que r1
= r2. Para uma superfície plana a curvatura é nula, isto é, ambos os raios de curvatura são infinitos. Para
um cilindro, o raio de curvatura segundo o eixo do cilindro é infinito, sendo pois:
1 1 1
Κ cilindro = + =
r cilindro ∞ r cilindro

2.2 ACTIVIDADE QUÍMICA SOBRE UMA SUPERFÍCIE CURVA

Considere-se que na figura 2.1 o transporte entre 0→1 é feito pela fase gasosa. Na vizinhança imediata da
superfície plana a pressão de vapor é a de equilíbrio, po. Pela mesma razão, na vizinhança imediata da
superfície curva o vapor estará em equilíbrio com o sólido e terá o potencial químico correspondente.

Se um mole de vapor é transportado reversivelmente de "0" onde o potencial químico é µo, e a pressão de
equilíbrio po, para "l" onde o potencial químico é µ, ele sofre uma variação da sua energia livre de ∆G.

A temperatura constante, ∆G resultou do trabalho de compressão ou de expansão isotérmica do gás. A


pressão final, p1, é determinada a partir desse trabalho e correspondente aumento do potencial químico de
um mole de vapor, com pV = RT:

RT p
µ 1 - µ o = ∆W = ∫ pp V(p)dp = ∫ pp
1 1
dp = RT ln( 1 ) (2.6)
o o
p po

Sobre uma esfera de material, µ-µo > 0 (equação 2.4), a pressão em equilíbrio com tal superfície é
superior à de equilíbrio com a superfície plana de referência. De modo análogo, sobre uma superfície
côncava, quando vista do lado do material, o raio de curvatura e a curvatura são negativos, logo a pressão
de vapor em equilíbrio local é inferior à da superfície plana de referência.

De uma forma mais geral, a actividade química de uma substância (a) relaciona-se com o potencial
químico, pela equação (2.7),
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 12

a
µ - µ o = RT ln( ) (2.7).
ao

Para soluções diluídas a actividade do soluto em equilíbrio com o solvente é dada em boa aproximação
pela fracção molar, concentração molar, ou solubilidade, S. Uma partícula esférica em equilíbrio com um
líquido no qual é solúvel terá a sua solubilidade S, aumentada em relação ao valor de equilíbrio So:
S
µ - µ o = RT ln( ) (2.8)
So

sendo µ-µo dado, ainda, por (2.4).

2.3 CONCENTRAÇÕES DE DEFEITOS PONTUAIS

Para que um átomo X na figura 2.2 se desloque da posição 1 para a posição vaga ou lacuna, 2, ele terá
que mover-se intersticialmente (percurso a) até 2, ou por saltos atómicos sucessivos no sentido inverso da
lacuna de 2 até 1. O átomo X sendo equivalente a todos os vizinhos, os estados inicial e final nesta troca
são equivalentes para ambos os percursos. Estes são dois processos de difusão mais comuns nos sólidos
cristalinos: a) difusão de átomos intersticiais; b) difusão de lacunas.

a
b

Fig. 2.2 - Transporte de espécies atómicas por difusão. a) difusão de átomos intersticiais; b) difusão de
lacunas.

Considere-se que um átomo intersticial é criado pela sucessão de reacções:


M g → M M S →V M s + M i

A temperatura constante, a razão das concentrações em equilíbrio é dada pela constante de reacção, Ki:
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 13

[ V M S ][ M i ]
= Ki
pg

sendo pg a pressão de vapor do material e [VMs] a concentração dos lugares vagos à superfície. Esta última
concentração é fictícia, porquanto a criação de tal lacuna de superfície correspondente apenas a uma
mudança na posição da superfície, logo [VMs]≅1. A equação anterior é equivalente a:
[ M i ] = K i pg (2.9)

Pelas equações (2.4), (2.6) e (2.9), haverá uma concentração de átomos intersticiais sobre a superfície
convexa do material maior do que a concentração em equilíbrio com a superfície plana, [Mi]0,pela mesma
razão que há uma maior pressão de vapor na vizinhança da mesma superfície convexa. Conclusão
análoga, mas de sentido oposto, é válida para a superfície côncava. De (2.4), (2.6) e (2.9) resulta a
equação para as concentrações de defeitos intersticiais:
[ ]
µ - µ i = RT ln( M i ) (2.10)
[ M i ]o
Para determinar a concentração de lacunas atómicas tem-se sucessivamente, as reacções parciais que
descrevem a criação da lacuna,
V M S + M M →V M + M M S

M M s →V M s + M g
-------------

M M →V M + M g

e a constante de reacção, Kv,

[V M ] pg = K v (2.11)

Neste caso, a concentração de lacunas é inversamente proporcional à pressão de equilíbrio local do vapor
do sólido. Pelo que, por (2.4), (2.6), (2.9) e (2.11), a diferença de potencial químico terá sinal negativo na
equação respectiva, equação (2.12)
[V M ]
µ - µ o = - RT ln [ ] (2.12)
[V M ]o

Sobre uma superfície côncava existe um excesso de lacunas que se difundirão a partir das regiões de
maior concavidade para as de menor concavidade. A este fluxo de lacunas corresponde um fluxo atómico
em sentido inverso.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 14

2.4 EFEITO DE UMA PRESSÃO APLICADA, pa, SOBRE O POTENCIAL QUÍMICO

Considere-se de uma forma simplificada e ideal que o sistema está em equilíbrio, mas sujeito a uma
pressão aplicada, pa, como na figura 2.3:

2/3

Pa Fa=Pa Ω 1/3

Fig. 2.3 - Trabalho molar realizado pela pressão aplicada pa

Cada átomo do sistema está sujeito a uma força, fa,

f a = p a Ω 2/3

sendo Ω o volume do átomo. Um mole de átomos na superfície estará sujeito à força, Fa,
2/3
F a = pa Ω N Av

sendo NAv o número de Avogadro. Ao construir-se a camada com a área Ω2/3NAv o ponto de aplicação da
força recua de Ω1/3, pelo que a energia interna do sistema se eleva de,
1/3 2/3 1/3
F a Ω = p a [ N Av ( Ω Ω )] = p a V mol

e sendo esta a alteração do potencial químico do sistema. Pelo que o excesso de potencial químico devido
à pressão aplicada pa será,
µ - µ o = p a V mol (2.13)

Comparando (2.13) com (2.4) conclui-se que do ponto de vista termodinâmico, os efeitos de curvatura das
superfícies das partículas são equivalentes aos de uma pressão aplicada p' tal que:
p′ = γΚ (2.14)
sendo Κ a curvatura da superfície. A pressão p' é pois aditiva com a pressão aplicada e com as pressões
internas actuando no sistema.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 15

3. CINÉTICA DE SINTERIZAÇÃO
Neste capítulo são estabelecidas as leis de sinterização que relacionam a microestrutura e a alteração de
dimensões com o tempo e permitem caracterizar os mecanismos que operam na sinterização. A força
motriz para todos estes mecanismos tem origem nos gradientes do potencial químico devidos à curvatura
das superfícies dos poros. A forma como estes gradientes vão ser eliminados no sistema dependerá do
mecanismo em questão.

Este capítulo começa com um dos primeiros estudos publicados sobre mecanismos de sinterização. Neste
estudo são estabelecidas, de uma forma geral, as dependências entre o tempo e o tamanho da partícula
para os vários mecanismos de transporte de matéria nos sólidos a temperatura elevada. Seguem-se
depois outras secções com os modelos de sinterização para os estados inicial, intermédio e final de
sinterização no estado sólido.

3.1 LEIS DOS "FACTORES DE ESCALA OU DE PROPORCIONALIDADE DE HERRING" (1)

Os quatro mecanismos em discussão são: o transporte na fase gasosa, os transportes por difusão em
volume e em superfície e o escoamento viscoso.

A estrutura básica do argumento estabelecido para o mecanismo transporte na fase gasosa repete-se
depois, por analogia, no tratamento teórico dos mecanismos seguintes. Apenas para o escoamento
viscoso, o argumento é ligeiramente modificado, por se fazer uso da equação de Newton para a fluência
viscosa.

3.1.1 TRANSPORTE DA MATÉRIA NA FASE GASOSA, EVAPORAÇÃO/ CONDENSAÇÃO

As variações de pressão de vapor devidas à curvatura da superfície dos sólidos e definidas em (2.6)
podem ser dadas pela aproximação de 1ª ordem da exponencial para as condições encontradas na
sinterização dos pós. Da equação (2.6) resulta sucessivamente:
2γ V mol
p = po exp[ ]
r RT
sendo,

2γ V mol
«1
r RT

1
C. Herring J. App. Phys. 21,301-303 (1950)
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 16

2γ V mol
p ≈ p o (1 + )
r RT

e, ainda, a equação (3.1).

2γ V mol
∆p ≡ p - p o = p o (3.1)
r RT
É evidente que das equações (2.7-8), (2.10) e (2.12) resultam equações análogas a (3.1) para a actividade,
a solubilidade e as concentrações de defeitos atómicos respectivamente.

As diferenças de pressão (3.1) produzem localmente diferenças da taxa de evaporação e condensação de


acordo com a equação de Langmuir (2): “a quantidade de massa que se evapora por unidade de área,
d(m/A)/dt, é função da diferença de pressão, ∆p, entre a pressão actual no ponto e a pressão de equilíbrio
do material à temperatura dada,

m 1
d 
 A  M mol  2
= α ∆p  (3.2)
dt  2πRT 

sendo α ≈ 1, o coeficiente de acomodação, e

M mol = d V mol (3.3)


a massa da molecular da substância, e d a sua densidade”.

Para que o material seja transportado entre os pontos 1 e 2 de diferente curvatura, figura 3.1, é necessário
que:

2
1

Fig. 3.1 - Etapas no transporte na fase gasosa

2
W.D Kingery - " Introduction to ceramics " 2nd ed, pp 471
G.A SMORJAI chap 10, pp 691-692 in " Solid State Chemistry and Physics " Vol. 2 P.F Weller ed.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 17

1) se evapore em "1"
2) se difunde na fase gasosa entre "1" e "2"
3) se condense em "2"

Devido à equivalência de situações em "1" e "2" a cinética de condensação rege-se pela mesma lei que a
da evaporação (3.2), a reacção 3 é a simétrica da reacção 1. O processo total será controlado pela mais
lenta das reacções 1 a 3. A difusão na fase gasosa (2) torna-se limitativa do transporte apenas para valores
elevados da densidade do gás, ou da pressão total da atmosfera gasosa, e será por isso pouco importante
nas situações analisadas ao longo deste capítulo.

Dadas as equações (3.1) e (3.2) para o transporte na fase gasosa, considerem-se agora dois compactos
de tamanho de grão tais que R2=λR1, sendo λ o factor de escala tal que a estrutura do segundo seja obtida
por meio da ampliação λ do primeiro, figura 3.2.

Considerem-se dois elementos de volume em pontos correspondentes das superfícies das partículas dos
dois compactos, figura 3.2.

(2)
(1) dV2 dS2

r1 r2 = λr1

Fig. 3.2 - Condições geométricas para a aplicação das leis de Herring

Devido à proporcionalidade estabelecida, as equações (3.4) regulam as relações entre raios e entre
elementos de superfície e de volume equivalentes,

r 2 = λ r1
dS 2 = λ ds1 (3.4)
2

dV 2 = λ dv1
3
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 18

e porque ∆p em (3.1) depende dos raios de curvatura, temos, ainda, as relações seguintes entre os valores
de ∆p
2γΩ 1 p o 2γΩ ∆ p(1)
∆ p(2) = p o = ( )=
R 2 KT λ r 1 KT λ

e as taxas de evaporação por unidade de área,

m 1 m
d  d 
 A( )   1  A
2 = α  M mol  2 ∆p(2) = (1)
dt  2πRT  λ dt

A evaporação de dV2 provoca em "2" a alteração morfológica relativa igual à da evaporação dV1 em "1" e
decorrerá num intervalo de tempo dt2 tal que:

m
d 
 A
d. dV 2 = [ dS 2 (2)] dt 2
dt
sendo d a densidade.

De modo análogo dt1 é tal que:

m
d 
 A
d. dv1 = [ ds1 (1)] dt 1
dt

Dividindo membro a membro estas equações e substituindo a razão dV2/dv1 pelo seu valor em (3.4),
obtém-se:

dV 2 = λ ∆ t 2 = 3
λ
dv1 ∆ t1

ou seja,
d t 2 = λ 2 d t1 (3.5)

Esta equação constitui uma das leis de proporcionalidade de Herring e enuncia-se: "Os tempos
necessários para que se operem transformações morfológicas relativas iguais em dois sinterizados de
tamanho de partícula diferentes por um mecanismo de evaporação/condensação são proporcionais aos
quadrados dos respectivos tamanhos de partícula ".
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 19

3.1.2 TRANSPORTE DE MATÉRIA POR DIFUSÃO EM VOLUME

A primeira equação de Fick (3) estabelece que o fluxo de matéria J difundindo-se por unidade de área, é
proporcional ao gradiente das concentrações dC/dx
dC
J =-D (3.6)
dx
sendo D o coeficiente de difusão correspondente ao mecanismo de transporte de matéria. Na figura 3.2 a
área dS2 para este tipo de transporte é a que delimita internamente o elemento de volume e através da
qual o material se difunde a partir de dV, sendo de adoptar uma área análoga em "1". As relações de
proporcionalidade (3.4) entre elementos geométricos correspondentes mantêm-se válidas.

A partir das equações (2.10), ou (2.12), podemos estabelecer as equações análogas a (3.1) para as
diferenças de concentração de defeitos, pelo que as diferenças de concentração em "1" e "2" estarão na
relação:
1
dC(2) = dC(1)
λ

como, por (3.4):

dx(2) = λdx(1)

Resulta então que:


J(1)
J(2) =
λ2
Tal como para (3.5), obtém-se sucessivamente,

dV 2 = [J(2) ds 2 ] dt 2
dv1 = [J(1) ds1 ] dt 1

dV 2 dt 2
= = λ3
dv1 dt 1

logo,
dt 2 = λ dt 1 (3.7)
3

3
W.D. Kingery - " Introduction to ceramics " 2nd ed. pp. 219
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 20

Esta equação constitui a respectiva lei de proporcionalidade de Herring para o transporte por difusão em
volume e estabelece que os tempos para operar transformações relativas idênticas por um mecanismo de
difusão em volume são proporcionais ao cubo dos respectivos tamanhos de partícula.

Note-se que um processo de transporte controlado pela difusão na fase gasosa, porque também é de
difusão num volume obedecerá à mesma lei (3.7). Basta para tanto, na dedução anterior, substituir o
elemento de superfície pela superfície exterior do elemento de volume e tomar para D, Dg, o coeficiente de
difusão na fase gasosa. O fluxo será ainda controlado pela equação de Fick, (3.6).

3.1.3 TRANSPORTE DE MATÉRIA POR DIFUSÃO EM SUPERFÍCIE

Considera-se que há difusão em superfície quando o fluxo total de matéria operado pelo coeficiente de
difusão em superfície, Ds, na camada superficial de espessura δs, é muito superior ao fluxo por difusão em
volume, Dvol, figura 3.3. Nessas condições a difusão de matéria a partir do elemento de volume dV opera-
se apenas na tira superficial de largura constante δs e comprimento igual ao perímetro superficial do
elemento de volume pelo que, em (3.4) dS2 é agora:

dS 2 = λ ds1

Ds

dS
dV
δS

Fig. 3.3 - O elemento de área para difusão na superfície.

As outras relações mantêm-se iguais às do caso anterior. Resulta pois sucessivamente:


dV 2 = [J(2) dS 2 ] dt 2
dv1 = [J(1) ds1 ] dt 1

dV 2 1 dt 2
= = λ3
dv1 λ dt 1
e,
dt 2 = λ dt 1 (3.8)
4
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 21

Esta equação constitui a respectiva lei de proporcionalidade de Herring. Note-se que este é dos
mecanismos já discutidos aquele em que se encontra a dependência mais acentuada em relação ao
tamanho de partícula.

3.1.4 DEFORMAÇÃO VISCOSA DA MATÉRIA(4)

Sob a acção da pressão (2.14) resultante das forças de tensão superficial, o corpo viscoso deforma-se.
Como estabelece a equação de Newton da fluência viscosa, no escoamento viscoso a tensão de
escorregamento, τ, é proporcional ao gradiente da velocidade de escorregamento dv/dx:

dv d dy
τ =η =η ( )
dx dt dx

dx dy
τ

Fig. 3.4 - Deformação viscosa da matéria

sendo η a viscosidade. Posto que a deformação angular de ciselhamento é:


dy
γ=
dx
permutando a ordem de derivação resulta uma segunda forma da equação de Newton que caracteriza
identicamente a deformação viscosa:

τ =η (3.9)
dt
Para um fluido incompressível, a razão ou coeficiente de Poisson é ν=1/2, e

4
W.D Kingery - livro citado, pp. 709
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 22

1 2
τ= σ e ε= γ
2 3

sendo σ a tensão normal que produz o escoamento, ε=dx/x a deformação linear relativa. A equação (3.9) é
pois equivalente a (5)


σ = 3η (3.10)
dt

Num compacto em sinterização a pressão normal σ é criada pela diferença das pressões de curvatura p'
(2.14).

Da relação de proporcionalidade r2 = λr1 e da igualdade das deformações relativas nos pontos equivalentes
“1” e “2”,
dr λdr
ε (2) = (2) = (1) = ε (1)
r λr
e portanto das transformações equivalentes em "2" e "1" e da relação seguinte entre as pressões normais,
∆p(1) σ (1)
σ (2) = ∆p(2) = =
λ λ
Resulta sucessivamente,
σ (2) σ (1)
dε (2) = dt 2 = dε (1) = dt 1
3 3
logo,
σ (1)
dt 2 = σ (1) dt1
λ
concluindo-se que
dt 2 = λ dt 1 (3.11)
Esta equação traduz a lei de proporcionalidade de Herring correspondente à deformação viscosa. Note-se
que este mecanismo é de todos o menos dependente em relação às modificações do tamanho de
partícula.

5
W.D Kingery - livro citado, pp. 756-757
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 23

3.2 MODELOS DE SINTERIZAÇÃO DO ESTÁDIO INICIAL DE SINTERIZAÇÃO NO ESTADO SÓLIDO

A forma particular da microestrutura do compacto neste estádio vai ser introduzida para se estabelecerem
as equações que regem o fluxo de material e as leis temporais da sinterização expressas como
crescimento do tamanho relativo do colo, como retracção linear relativa e como redução da área superficial
específica.

3.2.1 RELAÇÕES ENTRE PARÂMETROS DA MICROESTRUTURA NO ESTÁDIO INICIAL

Na geometria de duas esferas em contacto há a considerar, neste estádio, dois conjuntos de relações,
consoante há, ou não, densificação com a interpenetração das esferas.

Como a forma específica da superfície do colo é a função do ângulo diedro, isto é, do equilíbrio entre as
tensões superficiais em presença na fronteira de grão, para simplificar adopta-se a hipótese de que este
ângulo é fixo e igual a π, 2θ=ψ=π. Com tal aproximação a superfície do colo tem curvatura contínua na
linha de intersecção com a fronteira de grão. Com a interpenetração de esferas, ver figuras 1.2 e 3.5, a
curvatura do colo é:

1 1 1 1 1
Κ= + =- + ≈ (3.12)
r1 r2 ρ x ρ

Este raio de curvatura ρ, é aproximadamente o valor da retracção y, como se representa na figura 3.5:

ρ ≈ y (3.13)

R
y
ρ
x

Fig. 3.5 - Geometria do colo com interpenetração das esferas.

A conservação dos volumes implica que, o volume da região anelar B seja igual ao da região da
interpenetração A. O volume de uma calote de raio da esfera a, e altura da calote b é:
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 24

1 2
V calote = π b (3a - b)
3

Tomando como um cilíndrico o volume da região do colo, com uma altura y, obtém-se
1
π x2 y = π (2y )2 (3R - 2y)
3
Desprezando 2y em comparação com 3R nesta equação, o volume da zona lenticular formada pelo
material transportado para o colo será, com a aproximação na eq. (3.13):
2
x
y≈ρ≈ (3.14)
4R
π x4
V= (3.15)
4R
A área do colo para a chegada efectiva de fluxo é tomada como tendo o perímetro, 2πx, e altura πρ:

A= π x
2 3
(3.16)
2R
ou, se o fluxo chega à superfície do colo apenas na região da fronteira de grão de espessura δfg:

A fg = 2πx δ fg (3.17)

Quando não há retracção no contacto entre de esferas, o colo cresce por transporte de matéria das
superfícies livres das esferas.

ρ x

Fig. 3.6 - Geometria do colo sem retracção linear.

Pela geometria da figura 3.6, o raio de curvatura, ρ será:

(R + ρ )2 = R 2 + (x + ρ )2
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 25

2
ρ≈ x (3.18)
2R
A condição representada na figura 3.6 é equivalente à condição de tangência com continuidade de
curvatura entre a superfície livre das partículas e da superfície do colo.

Uma vez que o raio de curvatura em (3.18) é duplo do valor anterior (3.14) para o mesmo valor do tamanho
de colo, x, o volume e a área correspondentes serão também o dobro dos anteriores, logo:
π x4 π 2 x3
V= e A= (3.19)
2R R

3.2.2 CINÉTICA DE RETRACÇÃO LINEAR NO ESTÁDIO INICIAL

A cinética de densificação determinada pela retracção linear relativa irá ser estabelecida a partir das
relações anteriores e da 1ª equação de Fick para os mecanismos de difusão em volume e difusão na
fronteira de grão, figura 3.7
.

R
y
2 ρ
1 x

Fig. 3.7 Percursos para transporte de matéria com densificação: 1. difusão na fronteira do grão, 2.
difusão em volume a partir da fronteira do grão.

3.2.2.1 DIFUSÃO EM VOLUME A PARTIR DA FRONTEIRA DO GRÃO

O fluxo de lacunas que parte do colo é calculado pela 1ª equação de Fick (3.6), a seguir, sendo ζ a
coordenada distância ao longo da linha do raio do colo.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 26

dC
J l = - Dl

Fazendo constante o gradiente da concentração de lacunas no colo, equação (3.20),

e sendo, por analogia com (3.1) e por (3.12), ∆C dado pela equação (3.21):

dC ∆C
( )colo ≈ (3.20)
dξ x
C o Ω γ sv 1
∆C = (3.21)
KT ρ

uma vez que na fronteira de grão a curvatura é nula, a concentração de defeitos é constante e igual a Co.

A taxa de variação do volume do colo obtém-se por integração deste fluxo sobre a superfície de chegada,
equação (3.16). A partir de (3.6), (3.16), (3.20), (3.21) e com a definição de coeficiente de difusão em
volume, Dv=DlCoΩ, resulta sucessivamente:
dV
= ΩJA = 2 π 2 Dv γ sv Ω
dt KT
e
dx 1 dV R dV
= = (3.22)
dt dV dt π x3 dt
dx

com (3.15) e raio de partícula, R, constante, por integração, resulta a lei de crescimento do colo, equação
(3.23) a seguir,

dx R 2 π 2 D v γ sv Ω
=
dt π x3 KT

x 3 x 2π Dv γ sv Ω
( ) d( ) = dt
R R KT R 3

x 8π Dv γ sv Ω 1 1
=( )4 t 4 (3.23)
R KT R3

Se n partículas se contactam ao longo de um segmento de recta de comprimento l0, a retracção linear


relativa nessa direcção será dada por
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 27

∆l n (2y) y
= = (3.24)
lo n (2R) R
Da equação anterior e das equações (3.14) e (3.23) resulta a lei em t1/2 para a retracção linear relativa no
1º estágio da sinterização controlada por difusão em volume,
∆l π Dv γ sv Ω 1 1
=( )2 t 2 (3.25)
lo 2 KT R3

3.2.2.2 DIFUSÃO NA PRÓPRIA FRONTEIRA DE GRÃO

Substituindo na derivação anterior a área de chegada do fluxo pela área (3.17), e definindo agora DlCoΩ
como o coeficiente de difusão na fronteira de grão, Dfg, obtém-se sucessivamente:

dV 8π D fg δ fg γ sv Ω 4R
= ΩJ A fg = 2
dt KT x

dx 8 δ fg D fg γ sv Ω R 2
=
dt KT x5

Resultando por integração as leis respectivas de crescimento do colo:

x 48 δ fg D fg γ sv Ω 1 1
=( )6 t 6 (3.26)
R KT R4

e a de retracção linear relativa:


∆l 3 δ fg D fg γ sv Ω 1 31
=( )3 t (3.27)
lo 4 KT R 4

3.2.3 MECANISMOS CONCORRENTES COM A DENSIFICAÇÃO

Três outros mecanismos podem contribuir para o crescimento do colo neste estádio de sinterização. Não
causam densificação porque a matéria provém da superfície livre das esferas onde a curvatura é positiva,
figura 3.8.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 28

ρ
4 5
R 3

Fig. 3.8 - Percursos para transporte de matéria sem densificação. 3- difusão em volume, 4- difusão
superficial, 5- evaporação/condensação.

3.2.3.1 DIFUSÃO EM VOLUME

Este mecanismo é análogo ao descrito em 3.2.2.1, porém a matéria provém das superfícies livres onde a
curvatura, é positiva e muito menor do que a da concavidade do colo.

2 1 2R
« =
R ρ x
2

Para estabelecer o gradiente da concentração de lacunas far-se-á a aproximação de que a uma distância
igual a ρ da linha central do colo, a concentração de lacunas é já a de equilíbrio sobre a superfície livre das
esferas. Resulta assim um fluxo de lacunas J,
∆C
J l ≈ - Dl
ρ

sendo ∆C função de ρ como em (3.21).

Partindo da anterior equação do fluxo e utilizando as relações (3.18) e (3.19) obtém-se sucessivamente:

dV 4 π 2 Dv Ω γ sv R
= ΩJA =
dt KT x
e

dx 2π Dv γ sv Ω R2
=
dt KT x4

donde, por integração, se deriva a correspondente lei em t1/5 para o crescimento do colo relativo:
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 29

x 10π Dv γ sv Ω 1 1
=( )5 t 5 (3.28)
R KT R3

3.2.3.2 DIFUSÃO EM SUPERFÍCIE

Neste mecanismo mantém-se a hipótese anterior de que a uma distância ρ da linha central do colo a
concentração das lacunas é já a de equilíbrio sobre a superfície livre das esferas. Como o fluxo só é
significativo na camada superficial de espessura δs, a área de chegada ao colo terá uma largura δs e um
comprimento igual ao perímetro do colo, ou seja,

As = 2πx δ s

Com esta área em vez do valor dado em (3.19) e definido agora Ds=DlCoΩ o coeficiente de difusão em
superfície, por uma derivação análoga à anterior, obtém-se a respectiva lei em t1/7 para o crescimento do
colo relativo:

x 28 D s δ s γ sv Ω 1 1
=( )7 t 7 (3.29)
R KT R4

3.2.3.3 TRANSPORTE NA FASE GASOSA, CONTROLADO POR EVAPORAÇÃO /CONDENSAÇÃO

A diferença de curvatura entre a superfície do colo e a das superfícies livres das partículas é dominada pelo
termo em 1/ρ. Por analogia com (3.21), a diferença de pressão de vapor do sólido entre estas duas
regiões é dada por:
γ sv Ω
∆p ≈ - p o
KT ρ

o que origina evaporação na superfície esférica convexa seguida de condensação na região côncava do
colo, com a velocidade de transporte de matéria dada pela equação de Langmuir (3.2). Com as equações
(3.2), (3.18), (3.19) e a diferença de pressão anterior (V=m/d, sendo d a densidade do material) obtém-se
sucessivamente,
m
d( )
A A = 2 π α po γ sv Ω  mat  x
2 1/ 2
dV 1
=
dt d dt d KT  2πKT 

e a respectiva lei em t1/3 para o crescimento do colo relativo:


1/ 3
x  9π m at α p o γ sv Ω 
=  3  t
1/ 3
(3.30)
R  2 (KT ) d R 2 
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 30

3.3.4 REDUÇÃO DE ÁREA DA SUPEFÍCIE ESPECÍFICA NO ESTÁDIO INICIAL

Considerando um compacto de esferas iguais, como se representa na figura 3.9, a redução da área
superficial do compacto (∆S) para pequenos colos é aproximadamente dada pela área ocupada por estes
colos sobre a esfera,
∆S = S o - S ≈ π x 2 N c (3.31)

2x
2x

Fig. 3.9 - Coordenação de partículas num compacto de esferas.

sendo:

So - área superficial inicial


S - área superficial actual
Nc - numero de contactos/partícula, ou número de coordenação médio das partículas,

A área inicial da esfera é:

S o = 4π R (3.32)
2

Combinando as equações (3.31) e (3.32) resulta,


∆S x
2
Nc
= (3.33)
S o 4 R2
Considerando que a equação geral da cinética de crescimento do colo em condições isotérmicas segue
uma lei em potência,
n
x
  =Bt (3.34)
R

e reorganizando a equação (3.33) de modo a determinarmos o tamanho relativo do colo (x/R) como função
redução da área superficial (∆S/So), obtém-se sucessivamente
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 31

1/ 2
x  4 ∆S 
=  (3.35)
R  N c S o 

e substituindo em (3.34),
n/2
 4 ∆S 
  =Bt
 Nc So 
ou, de forma equivalente,

n/2
 ∆S 
  =C t (3.36)
 So 
com,

n/2
N 
C = B c  (3.37)
 4 

Uma equação análoga a (3.36) foi deduzida a partir de relações geométricas mais precisas:

γ
 ∆S 
  = K t (3.38)
 So 

com o valor do expoente γ (γ∼n/2) dependente do mecanismo e do número de coordenação médio das
partículas no compacto. A equação (3.38) é válida para ∆S/So≤0.5, ponto em que as superfícies dos colos
vizinhos começam a ligar-se e se observa o fim do estágio inicial.

Pode-se estimar Nc a partir do valor de densidade relativa do compacto. O expoente γ relaciona-se


directamente com o mecanismo de densificação como se apresenta na tabela 3.1

Tabela 3.1 - Expoente de redução de área superficial, γ, em função do mecanismo de


sinterização e do numero de coordenação Nc.
Mecanismo Densifi- n γ Incerteza de γ
cação Nc=4 7 10
Evaporação/condensação não 3 1,6 1,5 1,4 ± 0,1
Difusão em volume sim 5 2,7 2,7 2,7 ± 0,1
Difusão na fronteira de grão sim 6 3,3 3,3 3,2 ± 0,1
Difusão em superfície não 7 3,6 3,5 3,4 ± 0,1
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 32

3.2.5 DISCUSSÃO DOS MODELOS DO ESTÁDIO INICIAL

Para além da dependência no tempo, as soluções anteriores das leis de crescimento do colo relativo e da
retracção linear relativa contêm ainda duas outras dependências importantes: i) a dependência na
temperatura, que está implícita nos coeficientes de difusão ou na pressão parcial de equilíbrio, po, e ii) a
dependência na granulometria, os factores Rm que aparecem em denominador, com m = 2,3,4. As
dependências na granulometria, são respectivamente as mesmas que as estabelecidas pelas leis dos
factores de escala ou de proporcionalidade de Herring.

Resumem-se as leis de sinterização do estado inicial na tabela 3.2, que auxiliará na identificação dos
mecanismos e faz uso das equações gerais de crescimento do colo, da retracção linear relativa e da
redução da área de superfícies específica.

Tabela 3.2 - Resumo das leis de sinterização para o estádio inicial de sinterização no estado
sólido.
n s γ
 x  ∝ Dt  ∆l   
MECANISMO Retracção R   ∝ t  ∆S  ∝ t
Rm l
 0  S
 0
linear

(secção) n D m s γ
Difusão em volume Sim 4 Dv 3 2 2
(3.2.2.1)
Difusão na fronteira de grão Sim 6 δfgDfg 4 3 3
(3.2.2.2)
Difusão em volume Não 5 Dv 3 --- 2,5
(3.2.3.1)
Difusão em superfície Não 7 δsDs 4 --- 3,5
(3.2.3.2)
Evaporação/ condensação Não 3 p0 2 --- 1,5
(3.2.3.3)

Não consta nesta tabela o mecanismo de deformação viscosa da matéria que apenas estaria presente se
houvesse fase líquida, o que será discutido no capítulo 6 dedicado à sinterização em presença de fase
líquida. Não está também incluído o mecanismo de crescimento do colo por deformação plástica dos
cristais. Este último mecanismo envolve a acção das deslocações na região do colo. É um mecanismo cuja
existência neste estádio é discutível na sinterização dos óxidos cerâmicos, ou de outros materiais
cerâmicos duros, sendo contudo admitida no princípio do estádio do estádio inicial da sinterização de
materiais com deformação plástica fácil, como por exemplo nos metais puros quando sinterizados a
temperaturas homólogas próximas da unidade.

A análise das colunas 3ª, 6ª e 7ª da tabela anterior mostra que será problemático identificar o mecanismo
de formação de colo a partir, apenas, do valor declive (1/n), (1/s) ou (1/γ) nos gráficos de log(x/R), log(∆l/lo)
ou log(∆S/So) versus log(t), porquanto a imprecisão dos dados experimentais pode ser superior à diferença
relativa entre os valores dos expoentes nessas colunas que discriminam os mecanismos. Esta dificuldade é
agravada pela possibilidade de encontrarem valores ligeiramente diferentes de n, s, e γ para um mesmo
mecanismo, consoante as aproximações feitas nos modelos de um mesmo mecanismo forem diferentes.
Acrescente-se, também, a incerteza nos valores iniciais de (x/Ro), (∆S/So), (∆l/lo) e to, o tempo necessário
ao aquecimento inicial da amostra, e o efeito destes termos aditivos sobre o declive medido nos gráficos
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 33

logarítmicos de log(x/R), log(∆l/lo) ou log(∆S/So) versus log(t), e ter-se-á um conjunto de limitações


intrínsecas a este tipo de análise dos dados experimentais da cinética de sinterização no estádio inicial. A
análise de dados experimentais com a utilização conjunta das 3ª, 6ª e 7ª coluna da tabela 3.2 traz novas
informações que facilitam a identificação do mecanismo. A partir desta interpretação correcta dos dados
experimentais poder-se-á fixar o tratamento a seguir para obter os resultados técnicos pretendidos. Neste
sentido, a determinação do expoente m, calculado a partir da ordenada na origem das rectas log(x/R),
log(∆S/So) ou log(∆l/lo) versus log(t), em compactos com diferentes granulometrias, e a comparação do
valor do coeficiente de difusão D efectivo ou da pressão de vapor po, com os valores de D e p0
determinados por outras técnicas, facilitam a identificação da natureza do mecanismo de sinterização.

Também, com o recurso à técnica de sinterização com velocidade de aquecimento constante determina-se
expeditamente uma energia de activação da retracção linear relativa o que permite igualmente a
confirmação da natureza do mecanismo de sinterização, quando este é comparado com o valor da energia
de activação medido em condições isotérmicas.

São vários os exemplos na bibliografia da aplicação dos modelos aqui tratados para a análise da cinética
de sinterização. Entre outros, apresentam-se seguidamente como exemplos os resultados experimentais,
de que é feita uma breve discussão, da sinterização inicial do NaCl (6), do TiO2 (7) e do Cu(8). A evolução
do tamanho relativo do colo com o tempo de sinterização, a temperaturas de 700, 725 e 750°C, das
esferas de NaCl (r=60-70µm), apresenta um expoente n entre 2.8 e 3.4 na figura 3.10. O valor deste
expoente, a inexistência de retracção linear no compacto e, ainda, a proximidade dos valores calculados de
po com os determinados por outras técnicas, figura 3.11, levaram à identificação do mecanismo de
evaporação-condensação como controlando a sinterização do NaCl. Para o TiO2 de tamanho de partícula
submicrométrico (d= 0.14µm), sinterizado a 1023K, o inverso do declive de log(∆S/So) versus log t, γ= 2.6
na figura 3.12, e a variação de log(∆l/lo)2 versus log(t) àquela temperatura indicam um processo de
sinterização inicial controlado por difusão em volume.

6
*1 - Kingery, W.D, Berg. M., J. Appl. Phys. 26(10) (1955), 1205
7
- German, R. M., Munir, Z.A, Sci. Sint. 10(1) (1978), 11
8
- Wilson, T. L., Shewmon, P.G, Trans. Metall. Soc. AIME, 236 (1966) 48
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 34

Fig. 3.10 - Cinética de crescimento de colo para esferas de cloreto de sódio (r=60-79µm). (Kingery e
Berg, 1955)

Por simplificação não se incluiu neste estudo dos modelos de sinterização uma situação experimental de
relevo, que é a acção simultânea de dois ou mais mecanismos de sinterização. A interferência dos fluxos
dos dois mecanismos implica desvios da cinética relativamente aos modelos de sinterização a um só
mecanismo.

-3,0
Log10(pressão vap/atm)

-4,0
Pf

-5,0

-6,0
0,80 0,90 1,00 1,10 1,20
-1
1000/T (K )

Fig. 3.11 - Pressão do vapor do cloreto de sódio determinada por dados de sinterização (a linha sólida é
o valor médio de medidas directas). (Kingery e Berg, 1955)
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 35

Tal verifica-se no caso da sinterização do Cu (9), com os resultados experimentais da retracção linear
relativa, a temperaturas entre os 650-950°C, representados na figura 3.13. O expoente s, determinado a
partir do declive destas rectas, varia entre 2.2 e 3.6, valores estes não condizem com os deduzidos
anteriormente, dados na tabela 3.2. Foi proposto que nesta gama de temperaturas e tamanhos de partícula
o Cu sinterizará pela acção simultânea de um mecanismo densificante com a concorrência do mecanismo
de coalescência das partículas controlada por difusão superficial.

A acção simultânea de mecanismos de mecanismos de sinterização é significativa apenas em regiões de


transição ao longo dos eixos crescimento, de variação de tamanho de grão e da temperatura, quando são
da mesma ordem de grandeza as velocidades de formação de colo por um e outro dos mecanismos. O
estudo da acção simultânea de mecanismos é objecto da técnica de construção de mapas de sinterização
e será útil numa fase mais avançada de estudo dos modelos de comportamento dos materiais durante a
sinterização.

0,0

0,14 µm TiO2,
-0,2 1023K, ar,
REF. 53

-0,4
Log10(∆S/S0)

-0,6

-0,8

-1,0 γ=2,6

-1,2
0,1 1 10 100 1000
tempo, (min)

Fig. 3.12 - Cinética de redução da área superficial para titânia, alumina e sílica
(German, 1978)

9
- Wilson, T. L., Shewmon, P.G, Trans. Metall. Soc. AIME, 236 (1966) 48
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 36

0,01
s=3,22
s=2,22

950ºC
∆L/L0 s=2,44

0,001 850ºC s=3,57

750ºC
650ºC

0,0001
1 10 100 1000
tempo (horas)

Fig. 3.13 - Cinética de retracção linear para esferas de cobre (d=145µm).


(Wilson e Shewmon, 1966)

3.3 CINÉTICA DE DENSIFICAÇÃO NO ESTADO INTERMÉDIO (10)

Embora os mecanismos de transporte na superfície, ou seja, a difusão em superfície, a evaporação,


condensação e a difusão em volume entre pontos da superfície dos poros de curvatura diferente, sejam
responsáveis por colapso dos poros e consequente crescimento do tamanho médio de grão nos estádios
intermédio e final da sinterização; serão considerados nesta secção apenas os dois mecanismos que
produzem a densificação.

3.3.1 DIFUSÃO EM VOLUME

Adoptar-se-á neste estádio como sólido de referência o tetracaidecaedro já referido em 1.4.1, figura 1.4. O
volume do tetracaidecaedro é determinado a partir do volume dum conjunto de pirâmides quadrangulares
em que a aresta é cortada a 1/3. Sendo o volume da pirâmide dado por:
1
V pir .= Ab h
3

onde Ab é a área da base e h a sua altura. Resulta assim que o volume do tetracaidecaedro será:

10
R.l Coble, Gupta, T.K in "Sintering and Related Phenomena", G.C Kuczynski, ed., 1967, p.p 423
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 37

Vs=8 2 l
3
(3.39)
Quando o ângulo diedro é 2θ=ψ=π, os poros tomam a forma cilíndrica. Encontram-se ao longo das arestas
do poliedro. Cada poro é comum a três grãos. Como o tetracaidecahedro tem 14 faces, 24 vértices e 36
arestas, o volume de poros por grão, em função do seu raio r, é dado por:

V p = 12π r l (3.40)
2

e a fracção de porosidade por


2
Vp3π  r 
P= =   (3.41)
Vs 2 2  l 
Definido o diâmetro esférico equivalente, G, como o diâmetro da esfera de volume igual ao do grão ou
poliedro,
π
Vs= G
3
(3.42)
6
resulta para a porosidade em função de G:
1
2
 π 3  r 
P = 36     (3.43).
6 2  G 

O fluxo de lacunas parte da superfície dos poros cilíndricos para as fronteiras de grão e causa a
densificação com a diminuição de Vp, será calculado por analogia com a solução do fluxo integrado de
calor que radia por unidade de comprimento (L) de um condutor eléctrico cilíndrico:
J
= 4π D l ∆C Ω (3.44)
L

A analogia das duas situações surge quando se considera que cada fronteira de grão, aproximadamente
circular, está rodeada por um canal poroso (formado por um cilindro a toda a volta da fronteira de grão). As
paredes deste canal tem uma altura ≈2r, e radiam lacunas para a fronteira de grão. Isto é, o material está a
ser radiado para as paredes do poro.

O comprimento efectivo do cilindro de chegada do fluxo, por tetracaidecaedro, será

1 
L = 14 faces  2r  = 14r
2 
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 38

2rp

Fig. 3.14 Elemento de simetria cilíndrica sobre face do tetracaidecaedro.

Pela equação anterior e as equações (2.5), (3.39), (3.41) e (3.42) e, por analogia com (3.21), a taxa de
variação do volume dos poros por tetracaidecaedro será:
dV p J 56π Dv γ sv Ω
=  L = - (3.45)
dt L KT

e,
dP 7π D v γ sv Ω Dv γ sv Ω
=- = - 336 (3.46)
dt 2 KT l 3 KT G 3
ou seja, no estádio intermédio da sinterização controlada pelo mecanismo de difusão em volume a
porosidade decrescerá linearmente com o tempo,
Dv γ sv Ω
P - P o = - 336 (t - t o ) (3.47)
KT G 3
sendo Po e to os valores iniciais respectivos das porosidade e do tempo no início do estádio intermédio.

3.3.2 DIFUSÃO NA FRONTEIRA DE GRÃO

O estabelecimento da equação de densificação para este mecanismo é análogo ao anterior. Deve-se notar,
porém, que a altura efectiva do cilindro na zona de difusividade elevada é apenas a fronteira de grão,
h ≈ 2 δ fg .

Obtém-se, assim, sucessivamente:

dV p 56π D fg δ fg γ sv Ω
=- (3.48)
dt KT r
e
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 39

1 3 5 D fg δ fg γ
dP sv Ω
= - 336 π 6 2 4 3 6 1
dt KT P 2 G 4

A variação da porosidade deixa de ser uma função linear do tempo e o valor total da constante numérica
na equação seguinte é 2562,

1 3 5 D fg δ fg γ
sv Ω
3
3
  (t − t 0 )
P 2 − P0 2 = -  504 π 6 2 4 36  (3.49)
  KT G4

3.3.3 DISCUSSÃO DOS MODELOS DO ESTÁDIO INTERMÉDIO

As equações (3.47) e (3.49) dependem das aproximações que foram feitas nos modelos estabelecidos. A
primeira aproximação importante é o sólido escolhido para representar os grãos. Se fosse escolhido o
dodecaedro (sólido regular de doze faces pentagonais) o comprimento efectivo seria (L=12r) e o valor de Vs
seria Vs=7.67 l, a constante numérica em (3.47) seria 288, ou, seja, 14% menor do que a actual. O modelo
dá uma lei densificação essencialmente correcta, com cerca de 10% de imprecisão na constante numérica.

A segunda aproximação introduzida é a equação solução do fluxo. A solução (3.44) não é a única equação
aplicável a este problema. Alternativamente, pode adoptar-se a equação de fluxo radial por unidade de
comprimento de um elemento cilíndrico de raio interior de raio r1 e de raio exterior r2.
J 2π Dl ∆C Ω
=
L  
ln r 2 
 r1 

ra rp
l

Fig. 3.15 – Fluxo de simetria cilíndrica em torno de poro aberto.

Assumindo r1 como o raio do poro (rp) e r2 como uma distância igual a metade da aresta do poliedro (ra),
figura 3.15, a integração da cinética de densificação com esta equação de fluxo resulta numa lei de
densificação praticamente coincidente com as leis de densificação (3.47) e (3.49), respectivamente, no
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 40

intervalo de porosidade característico deste estágio, 10%<P<35%. Assim, para a densificação controlada
pelo mecanismo de difusão em volume, a lei de densificação será dada por(11):
t
  - 
3

3
 8 2 P    D v γ sv Ω
2
P 2 1 + ln     = -1190 (t - t o ) (3.50)
   3π    KT G 3
    t0

Como se mostra na figura 3.16, o termo à esquerda na equação (3.50), definido como a função f(P), é
quase linear em P entre 10 e 35% de porosidade (estágio intermédio), pelo que as equações (3.50) e (3.47)
representam essencialmente a mesma lei de densificação, à parte um factor numérico próximo da unidade.

40%
)]} (%)

30%
-3/2
P/3π)
1/2
P {1+Ln[(8 2

20%
3/2

10%
Estágio Intermédio

0%
0% 10% 20% 30% 40%
Porosidade (%)

Fig. 3.16- Equivalência entre ambos os tipos de solução de fluxo

Outras aproximações importantes mas não incluídas nos modelos dados acima, são o ângulo diedro que
pode ser significativamente inferior a 2θ=ψ=π, caso em que pode originar a paragem da densificação
durante este estágio, e a aproximação feita de que o tamanho de grão permanece constante neste estágio.
Embora o crescimento de grão seja geralmente lento enquanto a porosidade mantém valores elevados,
contudo, há sistemas experimentais, como o cobre, Al2O3, em que o crescimento de grão está patente
desde o início da sinterização e num largo intervalo de temperaturas. Nestes casos, as relações
descrevendo o crescimento de grão tem de ser introduzido nas equações diferenciais (3.46), e (3.48-3.49),

11
Citada em (9)
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 41

antes de se proceder a integração em ordem ao tempo para se obter a lei de densificação. No cobre (12),
sinterizado entre 750°C e 1000°C, figura 3.17, observa-se uma lei semi-logarítmica de densificação
(drel.∝log(t)). À temperatura de sinterização o tamanho de grão, G, segue uma lei cúbica, G3=C t, figura
3.18. De acordo com estes resultados, a lei semi-logarítmica da densificação do Cu explica-se como
resultando da integração da equação (3.46) com G3=C t.

95
900ºC

90 1000ºC
850ºC

85 800ºC
Densidade relativa, ρ (%)

80
750ºC

75

70

65

60
1 10 100 1000 10000
tempo, t (min)

Fig. 3.17 - Evolução da densidade relativa com o tempo de sinterização em compactos de cobre
(Coble e Gupta, 1967)

12
Coble, R.L, Gupta, T.K, " Sintering and Related Phenomena " Ed. Kuczynski, Hooton, Gibbon, p. 423 - 444
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 42

80

70

60 1000ºC
tamanho de grão, G (µm)

50
900ºC
850ºC
40

800ºC
30

20
750ºC

10

0
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13
1/3 1/3
(tempo) (min)

Fig. 3.18 - Evolução do tamanho médio de grão com o tempo de sinterização, elevado à potência 1/3 em
compactos de cobre (Coble e Gupta, 1967)

3.4 DENSIFICAÇÃO NO ESTÁDIO FINAL DA SINTERIZAÇÃO

As taxas de densificação geradas pelos mecanismos de difusão em volume e na fronteira de grão serão
aqui estabelecidas por analogia com derivações feitas para o estádio intermédio. O crescimento de grão
não pode ser desprezado no estudo deste estádio, mas para simplificar continuamos a admitir que o
tamanho de grão permanece constante. O estudo dos mecanismos de crescimento de grão é remetido
para o capítulo 4, a seguir.

3.4.1 DIFUSÃO EM VOLUME

Como já referido em 1.4.1-C, os grãos serão representados por tetracaidecaedros regulares e os poros
fechados por esferas, nos vértices destes. Cada poro esférico é comum a 4 tetracaidecahedros. Admite-se
implicitamente que 2θ=ψ=π, como nos estádios anteriores. Com 24 vértices por tetracaidecahedro, resulta:
3
r 
V p = 8π r e P = 48   (3.50)
3

G 
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 43

O estabelecimento da lei de densificação é análogo ao da secção anterior. Como equação de fluxo


tomaremos a solução do fluxo radial entre camadas concêntricas, com diferença de concentração de
lacunas conhecida (Ca-Cb), dada por:

rb r a
J total = 4π Dl ( C a - C b )
rb - ra

sendo ra e rb definidos na figura 3.18.

rb
ra

Fig. 3.19 - Fluxo de simetria esférica em torno do poro.

Fazendo rb≈G/2 e como ra<<rb (P≈2-3%), a equação anterior é simplificada para:

J total = 4π Dl ∆C r (3.51)

onde r é o raio do poro e ∆C o excesso de lacunas à superfície do poro devido à concavidade. Pelas
equações (3.50) e (3.51) e por analogia com (3.21), obtém-se

dV p Dv γ sv Ω
= - 48π
dt KT

Como,

dV p dr
= 24π r 2
dt dt
resulta sucessivamente para a velocidade de redução do raio do poro por efeito da densificação:

dr Dγ Ω
= - 2 v sv 2 (3.52)
dt KT r
e para a porosidade:
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 44

dP Dγ Ω
= - 228 v sv 3 (3.53)
dt KT G
Donde, por integração, resulta uma função linear P em relação a t, tal como na equação (3.47) no estádio
anterior, mas com valor de 228 para a constante numérica.

3.4.2 DIFUSÃO NAS FRONTEIRAS DE GRÃO

Cada poro fechado intersecta os planos das fronteiras de grão adjacentes segundo 6 linhas curvas na
superfície da esfera e com a orientação das arestas de um tetraedro regular. O comprimento destas 6
intersecções é aproximado a duas vezes o perímetro de um círculo máximo da esfera (poro), de que
resulta que a área efectiva por poro para chegada do fluxo, pelas fronteiras de grão, é:

A fg = 4πr δ fg

A simetria esférica do fluxo mantém-se como aproximadamente válida. Por (3.51), a densidade do fluxo por
unidade de área será,
J Dl ∆C
=
A r

Donde se obtém sucessivamente dVp e dr/dt, equação (3.54), com Afg dada acima.

D fg δ fg Ω γ sv
dV p = - 48π
KT r

dr 2 D fg δ fg γ sv Ω
=- (3.54)
dt KT r 3

Como r é função de G e P em (3.50), resulta para velocidade de densificação dada por dP/dt,

1 D fg δ fg γ
dP sv Ω
= - 288 48 3 1
dt KT G 4 P 3

Separando variáveis e integrando obtém-se a respectiva lei de densificação, equação (3.55).

4 4
D fg δ fg γ sv Ω
P - P o3 = - 1395,4
3 (t - t o ) (3.55)
KT G 4
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 45

3.4.3 DISCUSSÃO DOS MODELOS DO ESTÁGIO FINAL

Tal como no estágio anterior, a escolha de um outro sólido representativo da forma dos grãos, tal como o
duodecaedro, implica outros valores para as constantes numéricas das equações (3.53) e (3.55)
Também, o valor diferente do ângulo diedro se bastante inferior a θ=π/2 pode explicar a paragem da
densificação por inversão da curvatura da superfície dos poros durante este estágio da sinterização.

Porém, o factor de desvio mais importante nas equações acima é o crescimento de grão, comum neste
estágio, o que leva a que as leis de densificação (3.53) e (3.55) sejam raramente observadas. Pode-se
acrescentar que a existência de gases retidos nos poros fechados diminui a força motriz para a
densificação e pode mesmo inverter o processo de densificação em consequência da expansão dos gases.

Note-se que nos resultados da densificação do Cu a 1000°C na figura 3.17, se observa-se que, a partir dos
90% de densidade relativa no estágio final, deixa de existir a linearidade entre P e log(t). Não sendo
provável uma mudança de mecanismo de densificação, esta diminuição de velocidade de densificação é
atribuída à existência de gases retidos nos poros, os quais se expandem quando o crescimento de grão
acelera como é patente a esta temperatura na figura 3.18 (t>400min).

Apesar das limitações à aplicação directa das soluções dos modelos utilizados, as equações (3.52) e (3.54)
são de grande utilidade pois aprestam-se para a introdução dos efeitos de crescimento de grão na
densificação, como será feito adiante no capítulo 5.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 47

4. CINÉTICA DE CRESCIMENTO DE GRÃO


Será discutido na primeira parte deste capítulo a cinética de crescimento de grão de sistemas simples de
uma só fase, sólida. São estabelecidas, em seguida, as interacções entre as fronteiras de grão e as
partículas de uma segunda fase - precipitados ou poros isolados - por forma a determinar as leis de
crescimento de grão em sistemas mais comuns. Pretende-se, por fim, estabelecer as relações topológicas
entre os tamanhos de grão e dos poros que permitirão definir as condições em que cada tipo de
mecanismo de crescimento de grão é dominante e as condições para a ocorrência da separação entre os
poros, ou inclusões isoladas, e as fronteiras de grão.

4.1 CRESCIMENTO DE GRÃO EM SISTEMAS MONOFÁSICOS

4.1.1 POLICRISTAL PURO E DENSO

Sendo o policristal puro e denso representativo do sistema mais simples de todos é assim o primeiro a ser
analisado aqui. É necessário fazer algumas considerações que serão mantidas na análise dos sistemas
mais complexos, a seguir:

1) A força motriz para o movimento das fronteiras de grão, F, e o crescimento de grão daí
resultante, são originados pelo excesso de energia livre das superfícies curvas que formam as
fronteiras de grão num policristal real em que os grãos têm um número variável de vizinhos.

2) Sob a acção desta força F, as fronteiras ou limites de grão adquirem a velocidade média:
dG
v= M F ≈ (4.1)
dt

onde M é a mobilidade das fronteiras de grão. Por sua vez, esta velocidade é a velocidade de
crescimento do tamanho médio de grão.

3) O raio de curvatura das fronteiras de grão é proporcional ao tamanho médio de grão. Pelo que
a força motriz associada à curvatura será,
2
γ ss Ω 3
F= (4.2)
cG

onde c é uma constante de proporcionalidade da ordem da unidade. Tal como a energia de


superfície γsv, também γss a energia específica das fronteiras de grão é aproximadamente
isotropica e constante.

4) A forma de distribuição de tamanhos de grão, nomeadamente a sua largura relativa, conserva-


se estável durante o crescimento de grão.

Para os policristais puros e de uma só fase a mobilidade da fronteira de grão, M é constante, só depende
do coeficiente de difusão na fronteira de grão, Dfg:
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 48

D fg
M= (4.3)
kT
Por substituição da mobilidade (4.3) e da força motriz (4.2) na taxa de crescimento de grão (4.1) e
integrando resulta uma lei quadrática de crescimento de grão:
2
dG D fg γ ss Ω 3
=
dt kT c G

logo,
2 2

 D fg γ ss Ω 3 
2
G -G =
2
o
 t (4.4)
 kT c
 

sendo Go o tamanho inicial de grão.

4.1.2 CRESCIMENTO DE GRÃO PARA O POLICRISTAL DENSO, IMPURO

Os átomos das impurezas em solução sólida no policristal interagem com os átomos da rede do cristal.
Esta energia de interacção tem valores diferentes nas posições da rede, nos limites de grão e nas
superfícies livres. A esses valores diferentes da energia livre correspondem valores diferentes da
concentração dos átomos das impurezas nessas três regiões.

Se essa energia de interacção na zona de fronteira de grão é superior à da rede a concentração de


impureza será menor na zona de fronteira de grão. Pelo contrário, se essa energia de interacção é inferior,
a concentração de impurezas na fronteira de grão é maior do que na rede. Esta última situação é muito
frequente em óxidos cerâmicos com intervalos de solução sólida estreitos para dadas impurezas.

Os dois tipos de perfil de energia de interacção e de concentração estão representados esquematicamente


na figura 4.1 onde x representa a distância normal à fronteira de grão. No caso do equilíbrio, sem
movimento da fronteira de grão, o perfil de concentração C(x) deverá ser simétrico, porque se admite que
E(x) é simétrico.

A força elementar com que cada átomo de impureza interage com a fronteira de grão é fi(x) = - dE(x)/dx.
Assim, no equilíbrio, a resultante, Ft, ou força de interacção entre a fronteira de grão e as impurezas em
solução sólida,

Nv +∞ +∞
dE(x)
Ft = ∑ f i =
i

-∞
f(x) dni (x) = - N v ∫ [C(x) - C( ∞ )]
-∞
dx
dx

deve ser nula. Nesta equação, Nv é o número de átomos por unidade de volume. Note-se que os limites do
integral anterior se estreitam porque dE(x)/dx só é diferente de zero na vizinhança imediata do limite de
grão.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 49

repulsão atracção

E(x) E(x)

0 x 0 x
sentido do movimento

C(x) C(x)

0 x 0 x

Fig. 4.1 - Perfil de energia de interacção e de concentração das impurezas nas fronteiras de grão.

Quando há movimento da fronteira de grão, os átomos de impurezas tomam um tempo finito, não nulo,
para se difundirem de um lado para o outro da fronteira de grão. Como o seu coeficiente de difusão Di na
zona da fronteira de grão é em geral diferente dos átomos da rede, o perfil da concentração C(x) distorce-
se deixando de ser simétrico, resultando, assim, uma força de interacção Ft de valor diferente de zero. A
fronteira de grão move-se arrastando as impurezas na sua retaguarda, ou empurrando-as na sua frente, e
adquire uma mobilidade controlada pela concentração de impurezas dada por13,
 1 
= M   (4.5)
M fg,i  2 

 1 + Mα C ig Ω 3 

onde,
kT
α = 4 Nv W KD
Di, fg

sendo M a mobilidade dos átomos (4.3), Cig a concentração de impurezas no interior do grão cristalino, Nv
a densidade total de átomos, W =2δfg a espessura da fronteira de grão e Kd = Cfg/Cig o coeficiente de
distribuição da impureza.

A concentração total de impurezas, Ct é constante, mas Cig e Ci,fg dependem dos volumes relativos da rede
e das zonas das fronteiras de grão de espessura W. A fracção volúmica de fronteira de grão depende da
área específica ou área de fronteiras de grão por unidade de volume, área esta que é função do tamanho
de grão:

13
- J. Cahn - Acta Metall., 10, 1962, pp 789
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 50

3
Av = (4.6)
G
Obtém-se sucessivamente:

V fg 3 W
=
Vt G

 V fg  V fg  3W 
C t = C ig  1 -  + K D C ig = C ig 1 + ( K D - 1)
 Vt  Vt  G 

Para os valores representativos das constantes nesta equação,

W ≈ 3 - 10 A° , K D ≈ 10 4 - 10 5 , G = 1µm

o termo em Kd domina o segundo membro desta equação. Daí resulta que a concentração de impurezas
no interior da rede cresce com o tamanho de grão com Ct, sendo dada aproximadamente por,

Ct G
C i,g ≈ (4.7)
3 KDW
Substituindo (4.3) e Ci,g em (4.5) resulta para a mobilidade da fronteiras de grãos nos policristais com
impurezas em solução sólida:
 
 
 1 
M fg ,i ≈ M  
4 D fg 2
 1+ Ct Ω G N v 
 3 D fg,i
3
 

a qual é aproximadamente proporcional ao inverso do tamanho de grão, uma vez que o segundo termo do
denominador é muito superior à unidade para os valores representativos dos factores que o compõem e
porque Dfg≈Di,fg. Assim,
3 D fg 1
M fg,i ≅ 1
(4.8)
4 C Ω- 3 KT G
t

Substituindo (4.2) e Mfg,i na velocidade de crescimento de grão (4.1) e integrando, resulta uma lei cúbica
para o crescimento de grão no policristal denso com impurezas em solução sólida:

 9 D fg γ ss Ω 
G - G o =   t (4.9)
3 3

 4 KT C t c 
Este mecanismo de crescimento de grão revela nos policristais com baixas concentrações de impurezas,
enquanto todas as impurezas permanecem na solução sólida - condição necessária para que este modelo
seja aplicável e que assegura que Ci,g e Cfg se encontram abaixo dos seus valores de saturação,
mantendo-se constante o coeficiente de distribuição Kd=Cfg/Ci,g. Foram ainda feitas as hipóteses de que Di,g
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 51

era semelhante a Dfg e que a espessura da fronteira de grão W era pequena. A lei de crescimento de grão
seria diferente nos casos contrários, o que é mais provável com concentrações elevadas de impurezas
onde, devido à segregação, W tende para valores mais elevados, W≈100-500Ao.

4.2 CRESCIMENTO DE GRÃO EM SISTEMAS DE DUAS FASES

São considerados aqui os mecanismos de crescimento de grão activos quando a segunda fase se
encontra dispersa na forma de partículas isoladas: precipitados sólidos, líquidos e poros isolados. De entre
os vários tipos de inclusões de segundas fases, a porosidade tem um interesse particular neste caso pela
interacção entre o crescimento de grão e a densificação durante a sinterização. As interacções entre os
poros e as fronteiras de grão merecem por isso um relevo especial neste tratamento.

4.2.1 INCLUSÕES IMÓVEIS - LEI DE ZENER

As tensões de superfície da fronteira de grão ao longo do circulo de contacto entre uma fronteira de grão
em movimento e uma inclusão esférica imóvel - fig.4.2 -, dão origem a uma força de arrastamento (e ,
reciprocamente, de travagem) dada por

F i = 2π r i γ ss senξ cos ξ

cujo valor máximo corresponde a ξ=π/4, com o valor


F i,max = π r i γ ss (4.10)

Fi

γss γss
ξ
ξ
ri
inclusão esférica

Fig. 4.2 - Força de travagem da inclusão esférica sobre a fronteira de grão

Existindo no policristal uma distribuição uniforme de inclusões isoladas, imóveis, esféricas, de raio ri e
volume fraccionário Vfi, a densidade numérica de inclusões por unidade de volume será,
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 52

V fi
ni =
4 3
π ri
3

Todas as inclusões que se encontram num volume formado pela unidade de área de fronteira de grão e de
espessura 2ri estão em interacção com esta, produzindo uma pressão de travagem igual à soma das suas
interacções com a unidade de área da fronteira de grão,

2 r i V fi
ptrav = π r i γ ss
4 3
π ri
3

A pressão de curvatura, associada à força motriz de crescimento de grão, equação (4.2), ao reduz-se por o
tamanho médio de grão estar a crescer. Quanto esta pressão de curvatura igualar a pressão de travagem,
o movimento das fronteiras de grão cessa e o crescimento de grão pára, atingindo-se o tamanho de grão
limite,

4 ri
G lim = (4.11)
3 V fi

compatível com a fracção volúmica de inclusões Vfi de raio ri.

Esta relação é citada na bibliografia como a relação ou lei de Zener do crescimento de grão. Para o
estabelecimento de (4.11) fez-se, por hipótese, o raio de curvatura das fronteiras de grão igual ao diâmetro
esférico equivalente dos grãos, ou seja, c=1/2 em (4.2).

Pela lei de Zener (4.11) o tamanho de grão limite só poderá ser modificado (crescer) se a fracção volúmica
da segunda fase Vfi diminuir com o tempo, ou se crescer o raio das inclusões, ri. Para uma segunda fase,
sólida ou liquida, a sua fracção volúmica pode diminuir quando os limites de solubilidade desta
aumentarem. Quando as inclusões são os poros, resultado da densificação no processo de sinterização é
a diminuição de Vfi = P. O crescimento de ri é possível por coalescência das inclusões.

Tem-se observado experimentalmente que a relação de Zener é válida também no estado intermédio da
sinterização apesar de a porosidade ser formada por poros alongados, não isolados. Os valores
experimentais da constante numérica de proporcionalidade da lei de Zener, equação (4.11) são mais
próximos de 0,1 do que do valor teórico 4/3.

4.2.2 MECANISMOS DE COALESCÊNCIA DAS INCLUSÕES

A coalescência das inclusões isoladas e poros fechados pode ocorrer por efeito do transporte de matéria
por difusão entre inclusões, ou em resultado do arrastamento pelas fronteiras de grão e do movimento
aleatório das inclusões no interior dos grãos. As diferenças de tamanho das inclusões (sólidas, liquidas, ou
poros) resultam em diferenças de solubilidade (2.8), de pressão de vapor (2.6), (2.14) e (3.1) de
concentração de defeitos atómicos (2.10) e (2.12). As menores solubilidades, pressões, ou concentrações
de defeitos estão associadas às inclusões maiores. Estas precipitam o material ou absorvem os gases ou
os defeitos emitidos a partir das menores, por difusão através da matriz, e crescem. Como resultado, as
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 53

inclusões mais finas desaparecem e o raio médio das inclusões cresce. Este tipo de crescimento de
inclusões é designado por "engrossamento de Ostwald".

Para os processos de engrossamento de Ostwald controlados por difusão em volume entre as inclusões, o
raio, ri, cresce proporcionalmente a t1/3, e é proporcional a t1/4 se as inclusões se encontrarem em contacto
com fronteiras de grão e a difusão se dá preferencialmente nestas.

Mantendo-se constante a fracção volúmica, o engrossamento de Ostwald das inclusões permite o


crescimento do tamanho de grão limite dado pela lei de Zener (4.11). Assim,
3 3
G lim - G o lim = A1 t (4.12 a)
para a difusão em volume, e
4 4
G lim - G o lim = A2 t (4.12 b)
para a difusão nas fronteiras de grão.

Necessariamente que a lei de Zener deve verificar-se concomitantemente com estas leis de crescimento
de grão. No estádio intermédio, onde a lei de Zener também é observada, a coalescência da porosidade
aberta é possível por transporte da matéria entre as zonas dos canais com curvatura diferente pelos
mecanismos de difusão em volume, de difusão em superfície ou de transporte na fase gasosa. As zonas
dos canais com curvatura diferente surgem por efeito de variações locais do tamanho dos grãos,
originando-se canais mais longos, ou mais curtos, e paredes que se encurvam para se adaptarem à
distorção dos canais e das próprias fronteiras de grão adjacentes.

Observa-se um outro tipo de mecanismo de coalescência quando as inclusões são móveis e acompanham
as fronteiras de grão(14). Acompanhando o movimento das fronteiras de grão, as inclusões, que
inicialmente se encontravam nas fronteiras de grão ou vértices de um grão menor que se está a extinguir,
convergem todas para o centro desse grão e aí fundem-se numa só, quando o grão desaparecer. No caso
particular de as inclusões serem poros isolados contendo gases inertes comprimidos com pressão interna
igual à pressão de curvatura dos poros, a coalescência destes origina um poro de volume superior à soma
dos volumes dos poros iniciais, e a densidade relativa do material diminui.

Um último mecanismo de coalescência das inclusões é o que resulta do movimento aleatório das inclusões
por efeito da agitação térmica e das tensões locais dentro dos materiais. Neste movimento aleatório as
inclusões têm uma probabilidade não nula de chocar e fundirem-se com a formação de uma inclusão de
maior diâmetro.

4.2.3 MOBILIDADE DAS INCLUSÕES ESFÉRICAS

Tal como as impurezas em solução sólida, também a mobilidade das inclusões irá controlar o crescimento
de grão. Sob a acção da força Fi da fronteira de grão actuando sobre a inclusão (4.10) esta adquire a
velocidade vi = Mi Fi, onde Mi é a mobilidade da inclusão a ser determinada, figura 4.3.

Para um deslocamento de dx da inclusão, dV/Ω átomos serão deslocados da frente da inclusão, ao longo
da distância (2ri), para a parte posterior desta. O volume dV é o volume varrido pelo plano equatorial da
inclusão, sendo pois:

14
- W.D. Kingery and B. François 1965 - J. Amer. Soc. 48,546-547.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 54

d V = π r i2 dx

Fi

δs
Fa

dx
ja
ri

Fig. 4.3 - Movimento de uma inclusão esférica por difusão em superfície.

O trabalho realizado pela força atómica Fa sobre os dV/Ω átomos deve igualar o trabalho da força Fi
quando esta produz o deslocamento dx da inclusão, donde resulta,
Ω Fi
Fa=
2π r 3i

A intensidade do fluxo atómico Ja criado por Fa depende do mecanismo de transporte, sendo dado por
1 Da
Ja= Fa
Ω KT

Para o caso representado na fig. 4.3, existe difusão preferencial na camada superficial de espessura δs. No
plano equatorial a área efectiva para o fluxo Ja é As = 2πri δs. A taxa de transporte volúmico de material
será:
d V Ds δ s
= 2πr F a
dt KT

substituindo nas relações acima entre Fa, Fi, dV e dado que vi=dx/dt, resulta:

dx  D s δ s Ω 
=  Fi
dt  πKT r i4 

ou seja, a mobilidade de uma inclusão esférica quando controlada por difusão em superfície é:
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 55

Ds δ s Ω 1 (4.13).
M i,s =
π KT r i4
Outros mecanismos que possibilitam o movimento da inclusão são:
i) a difusão em volume quer através da matriz circundante, quer através da inclusão e
ii) a evaporação-condensação, quando a inclusão é um poro ou,
iii) a solução-precipitação, no caso de o precipitado ser um líquido.

Para os mecanismos de difusão em volume, a mobilidade de inclusão é proporcional(15) a ri-3:

Dv Ω 1 (4.14)
M i,v =
f ′π KT r i3

onde f'≈2 é uma constante resultante de integração em volume do fluxo atómico. No caso particular de a
difusão volúmica ser a dos constituintes do sólido através dos gases inertes comprimidos num poro, a
equação anterior da mobilidade transforma-se em:

po D g Ω2 1 Dg ρ g Ω 1
M i, g = = (4.15)
2π (KT ) r p 2π ρ s KT r 3p
2 3

onde ρg é a densidade dos gases oclusos no poro e ρs a densidade do sólido, proporcional a 1/Ω.

Finalmente, a mobilidade de um poro esférico controlado pelas reacções de evaporação - condensação é


proporcional a rp-2:
α po Ω2 1
M p,e-c = 1 3 2
(4.16)
π ma (KT ) r p
2
2 2

sendo ma a massa de uma molécula de vapor e α, o coeficiente de acomodação, ou de evaporação do


material (vd.3.2).

4.2.4 CRESCIMENTO ANORMAL DE GRÃO

Se a velocidade máxima possível para os poros for inferior à velocidade das fronteiras de grão vpmax < vf,
dá-se a separação entre os poros e as fronteiras de grão. Tal separação, aumentando a distância entre as
fontes de matéria (fronteiras de grão) e os sumidouros de matéria (poros) reduz drasticamente os fluxos de
matéria que proporcionam a densificação. Esta separação surge(16) quando existem inicialmente grãos
com tamanho já muito superior ao médio G max > 2,5 G .

Por necessidade de equilíbrio das tensões superficiais nas superfícies de contacto entre vários grãos, o
aumento de curvatura nas fronteiras de grão dum grão anormal eleva o risco de separação. Quando este

15
- R.J. Brook 1976 Treat. Mat. Sci. and Techn. 9,pp 331-364.
16
- M.Hillert - Acta Metall 13,1965,227-238.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 56

crescimento anormal se verifica, a microestrutura apresenta uma porosidade dispersa no interior de


grandes grãos cristalinos.

O crescimento de grão anormal é nucleado simultaneamente a partir de n grãos anormais, constituindo-se


uma distribuição duplex de tamanhos de grão. Espera-se que os grãos anormais ao crescer através da
matriz dos grãos finos terminem por se encontrar. A diminuição da velocidade das fronteiras de grão nesta
segunda geração de grãos facilita o acompanhamento pelos poros. Os grãos inicialmente anormais
evoluem para uma fase ulterior de crescimento de grão normal. Surgem, assim, as microestruturas com
uma distribuição normal de grãos, quase todos com poros dispersos no seu centro, mas livres de poros na
região periférica dos grãos. Por efeito da coalescência a quando do crescimento de grão com arrastamento
dos poros, observam-se nos vértices dos grãos destas microestruturas poros com dimensões
relativamente maiores do que as dos poros isolados no interior dos grãos. De forma diferente, o
crescimento anormal dos grãos com a separação entre os poros e as fronteiras de grão pode surgir numa
distribuição inicial de tamanhos de grão normal, como se discutirá na secção 4.3, a seguir.

Movendo-se livre da força de travagem dos poros, as fronteiras de grão adquirem velocidade livre, vf =
MfFf, sendo Ff a força de pressão da curvatura (4.2) e Mf a mobilidade da própria fronteira de grão (4.3) ou
(4.8) consoante a concentração de impurezas. A força Ff é independente do tamanho de grão anormal mas
proporcional ao inverso do tamanho de grão da matriz, dm. Este, por ter um crescimento normal, lento,
pode ser tomado como constante. Para um material puro a mobilidade Mf é constante. Para um material
impuro Mf é proporcional a dm e mantém-se constante também. Com a velocidade de crescimento anormal
de grão constante, o tamanho de grão anormal cresce proporcionalmente ao tempo, ou seja,

G - Go = A t (4.17).

Por ser linear no tempo este crescimento mantém-se rápido mesmo ao fim de intervalos largos de tempo
onde as outras leis de crescimento de grão em potência fraccionário do tempo, t, já teriam uma diminuição
relativa da velocidade bastante acentuada.

4.3 MAPAS DE CRESCIMENTO DE GRÃO

A lei de Zener (4.11) representa uma relação entre o tamanho de grão e o tamanho das inclusões, válida
apenas quando as inclusões são imóveis e se encontram uniformemente distribuídas. Quando as
inclusões, particularmente os poros, são também móveis, será necessário definir as condições de força e
das mobilidades em que o acompanhamento, ou a separação se verificam. A representação gráfica
dessas condições constitui o objectivo dos mapas de crescimento de grão.

4.3.1 RELAÇÕES DE ACOMPANHAMENTO E SEPARAÇÃO

Para que um poro móvel acompanhe a fronteira de grão é necessário que a fronteira de grão e o poro se
movam com a mesma velocidade. Ou seja,

vp = v f (4.18)

define a condição de acompanhamento. Ao contrário,

v p,max < v f (4.19)


INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 57

define a condição de separação. Esta condição de separação verifica-se sempre que a força máxima de
arrastamento do poro (4.10), multiplicada pela sua mobilidade (4.13) a (4.16) for menor do que a
velocidade da fronteira de grão travada pelos poros.

Durante o acompanhamento, condição (4.18), a força total para o crescimento de grão é a força de
pressão de curvatura (4.2) reduzida pela força da pressão de travagem dos poros que acompanham a
fronteira de grão.

Cada poro exerce uma força de travagem máxima dada por (4.10). Sendo f a distância média entre dois
poros sobre a fronteira de grão, 1/f2 representa a densidade de poros sobre a fronteira de grão. Como a
densidade superficial de átomos sobre a fronteira de grão é Ω-2/3, o número de poros por átomo na
fronteira de grão, será:

(4.20)
N=Ω2
2/3

A força motriz por átomo (4.2) é reduzida de NFp.

Por substituição na condição de acompanhamento:

M p F p= M f ( F f - N F p ) (4.21)

resulta sucessivamente:
Mf Ff
F p=
M p+ N M f
e
 Mf Mp 
v f =   Ff
 (4.22)
 M p+ N M f 

por substituição de Fp em (4.18) e (4.21).

O factor que multiplica Ff em (4.22) define a mobilidade da fronteira de grão travada pelo arrastamento dos
poros. Se no factor da mobilidade em (4.22), o balanço é tal que,

N M f »Np (4.23)

a mobilidade é dominada por Mf e vf ≈ Mf Ff. A condição (4.23) define dentro da região de


acompanhamento a sub-região de controle de crescimento de grão pelas propriedades das fronteiras de
grão.

Se pelo contrário,
M p» N M f (4.24)

a mobilidade em (4.22) é dominada por Mp, vf ≈ (Mp/N)Ff, sendo o crescimento de grão nesta subregião de
arrastamento controlado pelos mecanismos que controlam a mobilidade dos poros, equações (4.13) a
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 58

(4.16). Assim, são previsíveis quatro zonas nesta subregião. Para uma microestrutura no estádio final de
sinterização, a separação entre os poros, f, na região de arrastamento é proporcional ao tamanho de grão,
f ≈ G . A coalescência dos poros resultante do arrastamento faz com que o tamanho do poro cresça
proporcional ao tamanho de grão, r∝G, com P constante. Introduzindo estas aproximações em (4.22), e
com a condição (4.24), as relações (4.20) e (4.2) resultam as seguintes leis de crescimento de grão nesta
subregião de arrastamento controlada pelos poros:
4 4
G - G o = As t (4.25)
se a mobilidade dos poros (Mp,s, (4.13)) é controlada pela difusão em superfície,
3 3
G - G o = Av t (4.26)
se é controlada por difusão em volume (4.14) ou (4.15); e
2 2
G - G o = Ae - c t (4.27)
quando é controlada pela velocidade de evaporação-condensação, (4.16).

4.3.2 TÉCNICA DE CONSTRUÇÃO DOS MAPAS DE CRESCIMENTO DE GRÃO(17)

As condições (4.18), (4.19), (4.23) e (4.24) estabelecem um conjunto de relações entre o tamanho de grão,
G, e o tamanho do poro, rp, através das expressões das mobilidades, das forças e da densidade N. Estas
condições definem regiões no espaço (rp,G); ou de preferência no espaço [log(2rp),log(G)], pois que as
expressões acima envolvem potências de rp e de G.

Na construção do mapa de crescimento de grão que se segue serão feitas, ainda, as seguintes
aproximações:
f ≈ l ≈ 0,36 G (4.28)

e em (4.2), c≈1/2, pelo que


2
2γ Ω 3
F f ≈ ss (4.29)
G

4.3.2.1 LINHA DE EQUIMOBILIDADE

Na região de acompanhamento, a região de controle pela fronteira de grão (4.23) é separada da de


controle pela mobilidade dos poros, por uma linha, a linha de equimobilidade, definida pela condição de
igualdade de ambos os termos do denominador de (4.22):

M p= N M p

Definida a razão das mobilidades como

17
- R.J. Brook, 1969 J. Amer. Ceram. Soc. 52(1), 56-57.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 59

Mp
B= (4.30)
NMf

então a linha de equimobilidade é definida de modo equivalente pela condição B=1. Sendo a condição
(4.23) equivalente a B>>1 e inequação (4.24) equivalente à condição B<<1.

Substituindo na equação B=1, N pelo seu valor em (4.20), Mf por (4.3) - a mobilidade intrínseca da fronteira
de grão de um material puro, Mp por (4.13) - o controle da mobilidade dos poros pequenos por difusão em
superfície é a situação mais provável - e ainda substituindo f por (4.28) resulta sucessivamente:
2
Ω 3 D fg = δ s D s Ω
G KT π KT r p
2 4

donde,
1
 π D fg 2
=
Ge   r2 (4.31)
1 p
 0,13 δ s D s Ω 3 

Esta equação de Ge como função de rp, Ge = f(rp), define a linha de equimobilidade que separa as duas
subregiões na zona de arrastamento dos poros, figura 4.4.

-3

arrastamento separação
-4

G2
1 G1
-5 M ∝
G
log(G)

-6
D
M = fg

k T
-7 DS DV p0

Ge
-8

-9
-9 -8 -7 -6 -5 -4 -3
log(2 rp)

Fig. 4.4 - Mapa dos mecanismos de crescimento de grão.

No espaço [log(2rp),log(G)] a equação (4.31) define uma linha recta de declive 2 e ordenada na origem
proporcional a log(Dfg/Ds). Assim, se por efeito de temperatura, da química dos defeitos ou das impurezas
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 60

da rede, a razão das difusividades Dfg/Ds baixa, o que quer dizer que os poros se tornaram relativamente
mais móveis, a ordenada na origem de (4.31) baixa também a linha de equimobilidade na fig. 4.4 desloca-
se para a direita reduzindo a extensão e a importância da área de controle do crescimento de grão pelos
poros. O efeito inverso aumenta a importância dos mecanismos correspondentes ao controle do
crescimento de grão pela mobilidade dos poros.

Se na equação B=1 a mobilidade dos poros for controlada por um dos outros mecanismos de transporte da
matéria, (4.14) a (4.16) o declive da linha de equimobilidade diminui. Este declive será também inferior ao
anterior -fig.4.4- se a mobilidade da fronteira de grão for controlada pelas impurezas em solução sólida.

A igualdade de mobilidade intrínseca da fronteira de grão (4.3) e da mobilidade da mesma fronteira de grão
controlada pelas impurezas em solução sólida (4.8) define no espaço [log(2rp),log(G)] uma linha horizontal
de cota G = 3/(4Ct Ω-1/3), que separa as duas zonas na região de controle por Mf,. A cota desta linha
horizontal baixa com o aumento da concentração total de impurezas, Ct, aumentando assim a extensão da
área controlada pelos efeitos da solução sólida. Também, o aumento de Ct reduz a mobilidade (4.8) e faz
com que a linha de equimobilidade, B=1, se desloque para a direita, crescendo a extensão da área
controlada pelas impurezas em solução sólida.

A igualdade dos valores das mobilidades dos poros, comparadas duas a duas, define na subregião de
controle por Mp linhas de transição verticais que separam as áreas em que é dominante no crescimento de
grão cada um dos mecanismos (4.13) a (4.16) e a que correspondem as leis de crescimento de grão
dadas pelas equações (4.25) a (4.27), respectivamente.

4.3.2.2 LIMITES DA REGIÃO DE SEPARAÇÃO PORO-FRONTEIRA DE GRÃO

A condição de separação verifica-se quando a velocidade máxima dos poros nos limites da zona de
acompanhamento se torna insuficiente para que estes acompanhem as fronteiras de grão. A inequação
(4.19) traduz esta condição de separação. Substituindo vp pelo seu valor, vp = Mp Fp, com Fp dado por
(4.10) e os valores de Mp de (4.13) a (4.16) consoante o mecanismo, e substituindo vf pelo seu valor no
limite na região de acompanhamento (4.22), a condição de separação torna-se equivalente a:
Ff Mp
-1≥ (4.32)
N Fp NMf
O termo à esquerda define a razão entre as componentes positiva e negativa da força motriz em (4.21) e
será notado por:
Ff
Q≡ (4.33)
N Fp

A região de separação é definida de modo equivalente pela inequação Q-1>B. Ou seja, quando a razão
das forças é muito superior à razão das mobilidades, os poros não são suficientemente moveis para
acompanharem as fronteiras de grão no seu movimento rápido e separam-se das fronteiras de grão.

Substituindo (4.10), (4.20), (4.28) e (4.29) na expressão de Q, (4.33), com G constante, resulta que Q é
proporcional a rp-1:

0,26 G 1
Q= (4.34)
π rp
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 61

Por outro lado, como se verificou em (4.30)-(4.31), B é a função dos mecanismos que controlam a
mobilidade dos poros e das fronteiras de grão. Para o caso considerado em (4.30)-(4.31), em que Mp é
controlado por difusão em superfície (4.13) e em que Mf corresponde à mobilidade das fronteiras de grão
num sistema puro (4.3), obtém-se
1
0,13 δ s D s Ω 3 G 2 1
B= (4.35)
π D fg 4
rp
Representados graficamente respectivamente como log(Q) e log(B) versus log(2rp), a G constante, figura
4.5, as funções Q e B em (4.34) e (4.35) são representadas, respectivamente, por rectas de declive (-1) e
de declive (-4) que se intersectam para um certo valor de rp.
3
B
G = constante
2

1
log(B ou Q)

Q
-1

-2 Q-1

separação

-3
-7 -6 -5 -4 -3
log(2 rp)

Fig. 4.5 - Condição de separação poro-fronteira de grão, com G constante.

O primeiro termo na condição de separação, Q-1>B, tal como Q, não depende do mecanismo de
crescimento de grão. Como se verifica na figura 4.5, limrp→0 (Q-1) = Q, e portanto log(Q-1)≈log Q para
valores elevados de Q. Por outro lado log(Q-1)→ -∞ quando Q→1. Os limites da região de separação
sobre uma dada linha horizontal de tamanho de grão G = constante na fig. 4.4 correspondem aos pontos
de intersecção de log(B) com log(Q-1) na fig. 4.5. Estes dois valores de rp satisfazem a equação Q-1=B e
pertencem por isso à linha limite da região de separação. A região de separação fica compreendida entre
estes dois valores de rp, dado que Q-1>B no intervalo das duas raízes de Q-1=B. A posição do ponto de
intersecção à direita da figura 4.5 é muito aproximadamente independente do valor de B e dada pelo valor
de rp que satisfaz à equação Q=1. Esta condição traduz uma relação bastante simples entre G e rp, como
se verifica fazendo Q=1 em (4.34):
π
G1 = rp (4.36)
0,26
A equação (4.36) define a linha recta de declive (+1) que delimita inferiormente a região de separação no
mapa de crescimento de grão -fig.4.4. É designada por "linha de Zener" por prever uma proporcionalidade
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 62

simples entre r e G, com P constante, tal como a equação de Zener do crescimento de grão, equação
(4.11).

A posição do ponto de intersecção à esquerda na figura 4.5, é dada muito aproximadamente pela
igualdade Q-1≈Q=B. Substituindo Q e B pelos seus valores (4.33) e (4.35) respectivamente, resulta a
equação que define assimptoticamente a segunda raiz de Q-1=B:
2 D fg
G2 = 1
3
rp (4.37)
δ s Ds Ω 3

A posição desta linha que delimita superiormente a região de separação no mapa de crescimento de grão,
fig. 4.4, é função da razão dos coeficientes de difusão Dfg/Ds. O seu declive é inferior para os outros
mecanismos que controlam Mp (4.14 a 4.16).

Se o intervalo entre as duas raízes G1 e G2 é pequeno, as expressões aproximadas (4.36) e (4.37) deixam
de ser válidas, e os limites da região de separação têm que ser calculados a partir do polinómio de
segundo grau em G, que se obtém quando se substituem os valores de Q e B em Q-1=B,

1
0,13 δ s D s Ω 3 2 0,26
G - G + 1= 0
π D fg r 4p π rp
Necessariamente que os limites das duas raízes quando rp→∞ são ainda (4.36) e (4.37), respectivamente.
Dada a diferença dos seus declives, as raízes G1 e G2 intersectam-se no ponto (Gi,rpi) dado por G1 = G2, de
coordenadas,
 1

  0,52 D fg  2
 
 rpi =  1
  π δ s Ds Ω 3 
 π
 Gi = r pi
 2

Este ponto será ligeiramente diferente do ponto em que se anula o discriminante do polinómio acima.

O mapa de crescimento de grão para os casos em que Mf corresponde aos sistemas puro ou impuro (4.3)
ou (4.8) e Mp é controlado por difusão em volume, tem uma forma análoga ao descrito na fig. 4.4.

Se a mobilidade dos poros é controlada pela difusão na fase gasosa, (4.15), e se a pressão dos gases no
interior dos poros está em equilíbrio com a pressão de curvatura pt ≈ 2 γsv/rp, então Mp,g é proporcional a rp-
2; porque D é proporcional a p -1, logo é proporcional a r . Por substituição destas dependências na razão
g t p
das mobilidades B, (4.30), resulta que também G2 em (4.37) é proporcional a rp, tal como G1. Ambas as
linhas limite da região de preparação são paralelas no respectivo mapa de crescimento de grão. A região
de separação atravessa todo o mapa de crescimento de grão, o que representa uma probabilidade
elevada de se verificar a separação poros-fronteira de grão.

Se a temperatura for muito elevada, nomeadamente com atmosferas reactivas com o sólido, a mobilidade
dos poros será controlada por evaporação-condensação, (4.16), a separação entre G1 e G2 é função da
razão do coeficiente de difusão e de p0, Dfg/po, sendo o risco de separação entre os poros e as fronteiras
de grão crescente com esta separação. Se por outro lado, no mesmo sistema, a mobilidade das fronteiras
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 63

de grão é limitada pelas impurezas em solução sólida (4.8), a razão das mobilidades é proporcional a G3,
resultando que a raiz G2 análoga a (4.37) será proporcional a rp1/2. Tendo menor declive que G1 em (4.36)
a separação entre ambas cresce quando rp decresce e por isso, o risco de crescimento anormal de grão
por separação entre os poros e as fronteiras de grão é mais provável para tamanhos de grão finos e de
raio de poros pequenos, situação esta que é inversa das descritas acima para as outras conjugações de
mecanismos.

Em geral, o risco de crescimento anormal de grão é tanto maior quanto mais extensa é a região de
separação nos mapas de crescimento de grão e quanto mais esta região se prolonga para as regiões de
valores mais baixos de rp e G. Efectivamente, é nestas condições de tamanhos de grão finos que é maior a
reactividade dos materiais e que os mecanismos que causam a densificação estão a actuar, podendo ser
por isso perturbados pela nucleação do crescimento anormal de grão. O uso de aditivos que reduzam a
mobilidade das fronteiras de grão é condição favorável para o desenvolvimento de microestruturas de grão
normal, bem como o são as condições experimentais que aumentam a mobilidade dos poros.

4.4 SÍNTESE DAS LEIS DE CRESCIMENTO DE GRÃO

Constata-se que todas as leis de crescimento de grão estabelecidas neste capítulo são matematicamente
análogas, apesar da diversidade dos mecanismos de crescimento de grão. Todas as leis estabelecidas
são dadas por potências da forma Gm - Gom = A(T)t. O valor do expoente m, por si mesmo, não é suficiente
para identificar univocamente o mecanismo de crescimento de grão. Cada valor do expoente pode
corresponder a um de vários mecanismos, como se observa na tabela 4.1, primeira coluna. Tal como as
leis temporais de crescimento de colo no estádio inicial de sinterização, o erro experimental podem tornar
difícil a destrinça entre valores próximos do expoente m, reduzindo assim a confiança no critério de
identificação do mecanismo de crescimento de grão pelo valor do expoente m.

Nas colunas seguintes da tabela 4.1 apresentam-se critérios complementares ao da identificação do


expoente da lei Gm - Gom = A(T)t que, quando suportados pelas observações experimentais, permitem uma
identificação menos ambígua do mecanismo de crescimento de grão. Tais critérios são: os coeficientes de
difusão calculáveis a partir dos valores da função A(T), o intervalo de tamanhos de grão em que a lei é
observada, as características da microestrutura observada, o número de fases presentes e a forma
regular ou segregada como se distribuem as fases secundárias (inclusões e poros).
Tabela 4.1 – Resumo das leis de crescimento de grão no estado sólido e critérios que se verificam para a sua aplicação.

m FASES MICROESTRUTURA GRANULOMETRIA MECANISMO DE CRESCIMENTO M fg ∝


DE GRÃO
1 1 ou 2 Distribuição bimodal , matriz + grãos anormais Finos e grossos Anormal D fg
2 1 Denso Qualquer Normal, puro D fg
M fg =
KT
2 Separação, poros (inclusões) dentro dos grãos Finos Condição de separação, finos
D fg
M fg =
KT
2 Arrastamento (solubilidade nos precipitados, ou Grossos Normal, cinética de reacção M fg ∝ S o ou po
evaporação/condensação)
3 1 Denso Médios ou grossos Normal, impuro 1
M fg ∝
G
Tamanho de grão limite, engrossamento
2 Precipitados ou poros dispersos - Relação de Zener Grossos M fg ∝ Dv
de Ostwald
2 Separação a seguir a crescimento normal Médios ou grossos Condição de separação, impuro
1
M fg ∝
G
Normal, difusão em volume ou no gás
2 Arrastamento, temperatura elevada e pressão Média M fg ∝ Dv
elevada
po
M fg ∝
pt
Tamanho de grão limite, engrossamento
4 2 Inclusões segregadas na intersuperfície - relação de Grossos M fg ∝ D fg
Zener de Ostwald
Normal, difusão em superfície
2 Arrastamento, temperaturas intermédias Finos M fg ∝ D s

4.64
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 65

5. BALANÇO ENTRE DENSIFICAÇÃO E CRESCIMENTO DE GRÃO


Neste capitulo curto será discutido o método analítico que descreve a interacção reciproca entre
densificação e o crescimento de grão. Tal interacção é mais crítica no estádio final em que o crescimento
de grão se torna particularmente rápido, com prejuízo da velocidade de densificação. A este estádio se
limita o balanço de sinterização feito aqui de forma introdutória.

Tome-se, por hipótese, o tetracaidecaedro como representação dos grãos. A porosidade no estádio final
foi definida em (4.5) como,
3
 rp 
P = 48  (5.1).
G 
Quando o raio dos poros varia pelos efeitos simultâneos da densificação e da coalescência associada ao
crescimento de grão, a taxa de densificação, ou de eliminação da porosidade torna-se função de rp e de G,
sendo ambas as variáveis dependentes do tempo.

Resulta de (5.1), que a porosidade variará de uma forma geral como,

dP  1 dr p 1 dG 
= 3 P  - 
 (5.2)
dt  r p dt G dt 
Como o crescimento de grão não produz densificação, a velocidade de densificação mantém-se idêntica
ao termo calculado com G constante:

dP  ∂P  3 P ∂rp 
=  =   (5.3)
dt  ∂t  G r p  ∂t  G

sendo (∂rp/∂t)G a contribuição dos mecanismos de densificação para a diminuição de rp (secção 3.4),
diferente portanto da taxa total, drp/dt, em (5.2).

Por outro lado, quando há somente crescimento de grão a porosidade é constante, ou seja dP=0.
Substituindo dP = 0 em (5.2) resulta sucessivamente:

1 ∂rp  1  ∂G 
  =   (5.4)
r p  ∂t  P G  ∂t  P
e
1 1
dr p = dG
rp G

donde, por integração:


r p r po
= (5.5)
G Go
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 66

Esta proporcionalidade entre rp e G, com P constante, está implícita em (5.1). Por outro lado, ela é análoga
à proporcionalidade entre r e G expressa pela lei de Zener (4.11), com P constante. Porém, a
proporcionalidade (5.5) pressupõe que os poros são móveis e que se mantém nos vértices do
tetracaidecaedro.

Para os valores de porosidade característicos do estádio final de sinterização o sistema tem grande
probabilidade de se encontrar na região de arrastamento dos poros controlada pelas mobilidades deste,
equações (4.13) a (4.16), onde a condição (4.23) é aplicável. A taxa de crescimento de grão a P constante
é dada por (dG/dt)p ≈ Mp Ff/N. Substituindo Mp pelo seu valor para a difusão em superfície (4.13), N por
(4.20) e Ff por (4.29), e substituindo, ainda, em (5.4) a taxa de crescimento de grão daí resultante, obtém-
se a taxa de crescimento do raio dos poros por efeito da coalescência:
∂rp  0,085 D s δ s Ω γ ss
  = (5.6)
 ∂t  P KT r 3p
Os outros mecanismos de mobilidade dos poros dão origem às seguintes taxas de crescimento do raio dos
poros, respectivamente:
∂rp 0,26 Dv Ω γ ss
  = (5.7)
 ∂t  P f ′ πKT r 2p

quando Mp é controlado por difusão em volume (4.14),


∂rp  0,13 ρ g D g Ω γ ss
  = (5.8)
 ∂t  P π ρ s KT r 2p
quando controlado por difusão na fase gasosa (4.15), e

∂rp  0,26 α p o Ω 2 γ ss
  = (5.9)
 ∂t  P π 2 m 2 (KT ) 2 r
1 3

0 p

quando controlado por evaporação-condensação, (4.16).

Note-se que, os valores do expoente de rp nas equações (5.6) e (5.9) são sempre inferiores de uma
unidade aos do factor correspondente de Mp.

As velocidades de densificação (4.47) ou (4.49) e as velocidades de coalescência (5.6) a (5.9),


representam as duas componentes ortogonais da velocidade total de crescimento do raio médio dos poros,
sendo a evolução do sistema representável pela sua trajectória temporal sobre a superfície
rp(P,G)=G(P/48)1/3. A velocidade total de crescimento do raio do poro é a soma de ambas as contribuições:

dr p  ∂ r p  ∂rp 
=   +   (5.10)
dt  ∂t  P  ∂t  G

A "direcção" seguida pela trajectória é dada em cada ponto pela razão das duas componentes ortogonais:
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 67

∂rp
 
 ∂t  P
Γ= - (5.11)
∂rp 
 
 ∂t  G

O sinal negativo é necessário para que a razão Γ no balanço de sinterabilidade seja definida como uma
quantidade sempre positiva. A projecção desta trajectória no plano (P,G) caracterizará o balanço entre a
densificação (P) e o crescimento de grão, (G).

No caso de maior interesse para sistemas com granulometria fina a razão Γ é previsivelmente
independente dos factores microestruturais do sistema. Por substituição de (5.6) e (3.49) em (5.11) resulta,
D s δ s γ ss
Γ = 0,04 (5.12).
D fg δ fg γ sv
Introduzindo a constante Γ na equação (5.3) obtém-se:

 dP  3P  ∂ r p 
  =-  
 dt  G Γ r p G  ∂t  P

Mas por (5.4), e eliminando o tempo, t, resulta a seguinte equação diferencial que faz o balanço entre a
densificação dP/P e crescimento de grão, dG/G,

dG dP
= Γ
G 3 P

que tem por solução,

Γ Γ
G P 3 = G o P0 3 (5.13)

Esta relação no inverso de potências evidência um crescimento rápido de G quando P tende para 0,
crescimento este que se torna possível por os poros, sendo cada vez mais pequenos, terem um efeito
reduzido de travagem das fronteiras de grão, figura 5.1.

Este crescimento acentuado de G para os valores baixos de porosidade, implica necessariamente uma
grande redução das taxas de densificação. Mesmo assim, quando este par de mecanismos é dominante
no balanço de sinterização, a relação (5.13) prevê que, para todo o valor de Γ, a porosidade P virá a ser
assimptoticamente nula.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 68

15

100 30 10 3

10
G/G0

0,1

0
0,85 0,90 0,95 1,00
Densidade relativa, ρ

Fig. 5.1 - Evolução do tamanho relativo de grão com valores crescentes da razão Γ da sinterabilidade.

Encontram-se outras conjugações de pares de mecanismos com interesse experimental que originam
razões Γ dependentes do tamanho de poro. Um é o caso da densificação controlada por difusão em
volume (3.47) com a coalescência dos poros controlada por evaporação- condensação (5.9). Neste caso a
função de balanço Γ(rp) é proporcional a rp.
p
Γ( r P ) = r (5.14)
R
sendo R uma constante com dimensões de comprimento onde se reúnem todos os outros factores de Γ
com excepção de rp.

O cálculo da "trajectória" por uma sequência de passos análogo à que conduziu a (5.13) conduz à solução:
1 1 1 1  1
P 3 = 48 3 R  -  + P0 3
 G Go 

sendo rpo obtido a partir de (5.1), Po1/3 = 481/3 rpo/Go. Passando ao limite obtém-se,
3
lim P  R 
= Po  1 -
 rp 
G →∞
 o 
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 69

Assim, se o valor inicial da razão de coalescência (5.14), Γ(rp=rpo)=rpo/R é superior à unidade, o cociente
R/rpo na expressão anterior é menor do que a unidade, e a porosidade nunca se anulará completamente
por o lim P se tornar superior a zero. Esta conjugação de mecanismo será por isso particularmente
desfavorável à densificação no balanço de sinterização.

Por um cálculo análogo, para o caso em que o mecanismo de difusão em superfície controla a
coalescência e a difusão em volume controla a densificação, resulta uma função de coalescência Γ(rp) no
balanço de sinterabilidade inversamente proporcional a rp, equação (5.15), sendo R* constante.
*
Γ( r p ) = R (5.15)
rp
A solução da trajectória, embora diferente de (5.13) goza ainda da propriedade limG→∞ P = 0. O resultado
prático neste balanço de sinterabilidade é sensivelmente equivalente a (5.13) e favorável a conseguirem-se
densidades finais próximas da densidade teórica.

Finalmente, se a coalescência dos poros e a densificação são controlados pelo mesmo mecanismo de
difusão, a difusão em volume, a razão Γ é constante e tem um valor muito baixo Γ ≈ 0,02. Por analogia
com (5.13) e pela figura 5.1, o balanço de sinterabilidade é particularmente favorecido quando a difusão
em volume domina ambos os processos.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 71

6. SINTERIZAÇÃO EM PRESENÇA DE UMA FASE LÍQUIDA


Dª R.C.C. Monteiro

Nos últimos anos(18) tem havido um progresso considerável na ciência dos materiais a partir da
sinterização em presença de uma fase líquida, já conhecida nas ligas de metais pesados sinterizadas e na
produção de metal duro (WC-Co).

6.1 ESTÁDIOS DA SINTERIZAÇÃO EM PRESENÇA DE FASE LÍQUIDA

Baseando-se em observações feitas por Lenel, Gurland e Norton, o tratamento teórico desenvolvido por W.
D. Kingery é baseado numa subdivisão em três estágios da sinterização em presença de fase liquida
(secção 1.4.2):

1º - Rearranjo das partículas


- Imediatamente após a fusão e aparecimento do liquido, observa-se uma densificação rápida do
compacto, quer pelo deslocamento das partículas sólidas umas sobre as outras, quer pela quebra
de pontes de material fundido entre as partículas, sendo ambos os mecanismos devidos à acção
de uma pressão capilar.
2º - Solução-precipitação
- depois da densificação obtida pelo rearranjo ter sido completada, quando as partículas sólidas
têm alguma solubilidade na fase liquida, um segundo estágio de densificação é observado. A
solubilidade nos pontos de contacto entre as partículas é maior que a solubilidade nos outros
pontos da superfície das partículas sólidas. Isto resulta numa transferência de material a partir dos
pontos de contacto, fazendo com que a distância centro-centro entre as partículas seja diminuída,
e haja densificação.
3º - Formação de esqueleto sólido ou coalescência
- aparece se, no decorrer da sinterização, as partículas sólidas ficarem em contacto sem haver
fase fundida entre elas; então haverá transferência de material entre a fase sólida, e esta poderá
conduzir a uma futura densificação, que acontecerá a uma velocidade relativamente mais
pequena que para os outros estágios. Será uma velocidade comparável à encontrada na
sinterização no estádio sólido.

Embora a teoria de Kingery tenha aumentado o conhecimento de sinterização em presença da fase


líquida, muito frequentemente os dados experimentais eram interpretados com base na consideração que
os estágios ocorriam completamente separados. Contudo, em muitos sistemas tem-se vindo a encontrar
uma grande interacção entre os três mecanismos de sinterização e assim se representa na figura 6.1,
considerando-se a sobreposição das chavetas como indicativa dos intervalos de tempos em que ambos os
mecanismos actuam simultaneamente.

18
Texto com primeira edição em 1982
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 72

Coalescência
densidade, Reacção

Rearranjo

Fig. 6.1 - Sobreposição de mecanismos na sinterização com fase líquida.

6.2 REARRANJO DAS PARTÍCULAS

Com base em considerações recentes, a densificação por rearranjo é tratada como uma função directa da
força exercida, ou que existe, entre duas partículas sólidas que estão ligadas por uma ponte de material
fundido. Para aplicar este método requer-se o conhecimento exacto da configuração da ponte de material
fundido, por causa da forte dependência da força entre as partículas em relação à geometria do contacto.
Para duas partículas esféricas, ligadas por uma ponte líquida, a força F entre elas é dada por:

F = 2π r γ lv cos φ - π r 2 ∆P (6.1)

Esta força consiste num termo de tensão superficial, que actua no perímetro do colo 2πr, e de um termo
derivado da pressão capilar ∆P no líquido. γlv é a energia livre de superfície da interface líquido-vapor e r e
Φ estão definidos na fig. 6.2.

D
R
φ r

Fig. 6.2 - Ponte de líquido fundido entre duas partículas sólidas


INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 73

A equação acima, (6.1) tem sido resolvida por métodos numéricos, e tem-se mostrado que, para maior
parte das situações, a aproximação circular é satisfatória.

A força entre as partículas é a força motriz para o rearranjo das partículas em cada sistema. Embora seja
necessário mais trabalho de investigação para se estabelecerem relações entre a força entre as partículas
e a contracção devida ao rearranjo, apareceu como uma primeira aproximação, a relação,

 ∆L 
  = K (F - F0 ) (6.2)
 Lo  rearr .
A força intrínseca do sistema, Fo, corresponde a uma certa configuração inicial das partículas, o conjunto
das pontes entre as partículas. Só quando F>>Fo, poderá aparecer um rearranjo de partículas. À medida
que F aumenta, mesmo as pontes rígidas mais fortes irão colapsar e a contracção por rearranjo será tanto
mais pronunciada quanto mais F exceder Fo. Há evidência experimental para esta interpretação do
rearranjo. O valor de F depende da quantidade de fase líquida, da densidade de empacotamento do
sistema, e também da uniformidade da mistura dos componentes do sistema.

No tratamento da cinética de rearranjo proposto por W.D. Kingery,

∆L
= K t 1+ y (6.3)
Lo
em que expoente de t é próximo da unidade,1+y≈1,.

Vários outros autores tentaram verificar esta equação, nem sempre com sucesso. Aparentemente, as
discrepâncias resultam de se considerar ao estabelecer-se (6.3) uma força friccional (a viscosidade) como
constante durante todo o processo de rearranjo. Assim, a viscosidade parece determinar essa força de
fricção entre as partículas, enquanto que os mecanismos de colapso das pontes entre as partículas podem
ser determinantes para a velocidade de rearranjo.

Uma observação frequente em experiências de sinterização em presença de fase liquida é a de que a


densificação no princípio do processo de sinterização é mais rápida e mais completa em sistemas em que
a fase sólida tem alguma solubilidade no liquido do que em sistemas exibindo uma solubilidade
desprezável. Assim, há aceleração do rearranjo se alguma intersolubilidade existir entre as fases do
compacto, já que o expoente do tempo aumenta quando aumenta a solubilidade do sólido no líquido. A
explicação de que as pontes entre as partículas colapsão pela solução de pequenas quantidades de
material nos pontos de contacto, aparece como razoável.

A retracção linear obtida por rearranjo, é tanto mais favorecida quanto menor for o ângulo diedro (o ângulo
segundo o qual as duas interfases sólido-líquido se intersectam na junção sólido-líquido-sólido), e
consequentemente quanto menor for a área de contacto das duas partículas sólidas.

O rearranjo das partículas será facilitado pela variação da forma das partículas pelo processo de solução-
precipitação descrito, a seguir, como o segundo estágio de sinterização dado pelos modelos de W.D.
Kingery.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 74

6.2 SOLUÇÃO-PRECIPITAÇÃO

Depois do rearranjo ter sido completado, os pontos de contacto entre as partículas estão ainda sob a força
compressiva da tensão de superfície. O filme liquido presente entre as partículas na região de contacto,
retém a maior parte desta tensão e portanto o fundido na região de contacto está sob uma pressão
substancialmente superior à na massa fundida na área circundante do colo. Este diferencial de pressão
(∆P) causa um aumento no potencial químico ∆µ, e, portanto, na solubilidade S do sólido na fase líquida,
de acordo com (2.13). Este aumento de solubilidade fornece a força motriz para a transferência de material
das zonas de contacto para as áreas exteriores do fundido, onde a fase sólida é precipitada. É este o
processo que conduz ao achatamento das partículas nos contactos entre partículas, portanto, à retracção
do corpo. No modelo inicial de Kingery, era considerada uma molha completa, isto é, as partículas sólidas
estavam separadas sempre por um filme líquido, e assim foi considerado posteriormente em estudos
análogos.

As mesmas forças que são responsáveis pelo rearranjo são responsáveis pelo achatamento das partículas
no processo de solução precipitação. Estas forças não causam directamente densificação, mas produzem-
na sim pelo aumento da dissolução dos materiais nos pontos de contacto e transferência através da fase
líquida. A força motriz modifica-se se existe uma fronteira sólida entre as partículas (ângulo diedro, θ > 0).
O mecanismo de solução-precipitação já não poderá actuar neste caso. A densificação procederá a uma
velocidade muito baixa, determinada principalmente pela difusibilidade da fronteira de grão.

Com base na equação (2.13) e considerando partículas esféricas de raio r, Kingery derivou equações para
a cinética de contracção linear que podem ser escritas de modo a conter explicitamente o comprimento
inicial do compacto Lo e o tempo (to) no início do estádio de solução-precipitação:

∆L 4 1
= const. R 3 (t - t o )3 (6.4)
Lo

∆L 1
= const. R -1 (t - t o ) 2 (6.5)
Lo
A equação (6.4) é aplicada nos casos em que a difusão na fase líquida é o processo determinante da
velocidade de retracção, enquanto que (6.5) se aplica quando é a reacção de solução-precipitação na
interface sólido-líquido que é o processo de controle da velocidade.

Se em vez das partículas esféricas, se considerarem partículas prismáticas, serão obtidas relações
semelhantes, mas os valores do expoente de tempo serão 1/5 e 1/3, respectivamente para o processo
controlado por difusão e para o processo controlado por reacção na fronteira de fase.

O expoente do tempo, determinado experimentalmente para a sinterização por solução-precipitação,


depende criticamente do instante de tempo que é escolhido como (to) nas equações (6.4 e 6.5). Já que na
sinterização de um compacto de pó, ocorrerá um rearranjo sobreposto com a solução - precipitação (ver
fig. 6.1), a escolha de to é de algum modo arbitrária. Uma determinação exacta do expoente de tempo
torna-se difícil. Resulta, assim, que alguns autores consideram um dado sistema como controlado por
difusão, enquanto que outros vem a considerar o mesmo sistema como controlado pelo outro processo de
densificação, o de reacção.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 75

Só as leis estabelecidas pela teoria de Kingery (equações 6.4 e 6.5), conseguiram explicar o achatamento
das partículas, o que o que não era possível com base na teoria do engrossamento de Ostwald. Por causa
do achatamento nos pontos de contacto, há uma melhor acomodação das partículas, e isto explica que
uma densificação completa seja muitas vezes observada mesmo com um pequeno volume de fase líquida.
A força motriz num processo de engrossamento de Ostwald, que é sobretudo importante no estágio final
de sinterização em presença de fase líquida, tem sido explicada em termos de diferenças de actividades e
solubilidades das interfaces mostrando curvaturas diferentes. Pelo processo de engrossamento de
Ostwald, apenas pode ser explicada uma pequena densificação, aquela que corresponde à dissolução das
partículas mais finas retidas entre as partículas maiores e que impediam um empacotamento eficiente
destas últimas.

6.3 FORMAÇÃO DE UM ESQUELETO SÓLIDO (COALESCÊNCIA)

Uma condição necessária para a ocorrência do processo de rearranjo bem como do processo de solução-
precipitação, é a penetração do líquido entre os grãos sólidos. Quando se formam contactos sólido-sólido
as fases sólidas vão constituir uma malha rígida, em que a eliminação dos poros será mais difícil e a
velocidade de densificação será diminuída. A extensão com que o líquido penetra nas juntas enter as
partículas sólidas depende do ângulo diedro φ formado pela fase líquida com cada par de grãos da fase
sólida, figura 6.3.

γSl φ γSl

γSS

Fig. 6.3 - Ângulo diedro (φ) entre dois grãos sólidos em contacto com líquido
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 76

Numa distribuição de equilíbrio das fases, as forças de tensão superficial estarão num estado de balanço
na junção sólido-líquido-sólido, em que as fronteiras de grão e as fronteiras entre as fases se intersectam,
pelo que verificar-se-á a relação:

φ 
γ ss = 2 γ sl cos  (6.6)
2
em que γss é a tensão superficial na fronteira entre os grãos da fase sólida e γsl é a tensão superficial na
fronteira entre as fases sólida e liquida e φ é o ângulo diedro.

Analisando a equação (6.6) mostra-se que:


a) com 2 γsl> γss, então π>φ>0, não deverá ocorrer uma penetração completa da fase liquida,
b) com 2 γsl = γss, φ = 0,
c) com 2 γsl< γss, nenhum valor de φ satisfaz a equação (6.6)

Nestes dois casos b) e c), o líquido penetrará completamente ao longo da fronteira, separando os grãos da
fase sólida. No caso a) as partículas de fase sólida vizinhas podem ser soldadas em conjunto. Algumas
vezes, quando a fracção volúmica de líquido é baixa, o número de tais ligações é tão grande que quase
todas as partículas de fase sólida crescem em conjunto, criando todo um esqueleto, ficando a fase líquida
inclusa nesta estrutura sólida. A densificação posterior do sistema é então muito mais lenta. A ligação de
algumas partículas sólidas é observada praticamente em todas as microestruturas. Em certos sistemas
verifica-se que depois de tempos de sinterização apreciáveis (por exemplo 24h), o tamanho de grão
continua a aumentar apesar de a densificação ter cessado.

O controle da microestrutura do sistemas é realmente importante dado o efeito que a microestrutura exerce
nas propriedades mecânicas e noutras propriedades. Se o líquido formar filmes contínuos à volta dos
grãos da fase sólida, haverá uma perda de resistência mecânica do material a quente, pois os grãos desse
material desagregar-se-ão mais facilmente durante o serviço.

À medida que φ aumenta a partir de zero a penetração da fase líquida entre os grãos da fase sólida vai
decrescendo, embora até φ≈π/3, o líquido ainda penetre apreciavelmente através da fase sólida ao longo
das arestas comuns a cada três grãos. Quando φ>π/3, a fase líquida ocorrerá como inclusões discretas
nos vértices nas junções de cada quatro grãos da fase sólida. Esta relações de distribuição de fases são
ideais, tendo sido observados desvios nas microestruturas dos sistemas reais. Elas são aplicáveis nos
casos em que os grãos são isométricos, esféricos, em que as forças de tensão superficial são exercidas
tangencialmente à superfície e são independentes da sua direcção na superfície de grão, ou seja, são
isótropas.

O crescimento de grão é largamente influenciado pelo ângulo diedro formado pela fase líquida. A partir de
estudos do crescimento de grão isotérmico em sistemas com duas fases (1 sólida + 1 líquida) em que a
fase sólida era constituída por grãos arredondados, foi verificado que o aumento de tamanho médio de
grão podia ser dado por uma relação do tipo:
3
G =Kt
ou ainda
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 77

( )
log G 3 - G o = f [log(t - t o )]
3
(6.7)

em que Go é tomado como o tamanho médio de grão no instante to (inicio do 3º estágio de sinterização na
presença de fase líquida).

T1 T2 T3 T4
log(G3 - G03)

log(t - t0)

Fig. 6.4 - Cinética de crescimento de grão na sinterização em presença de fase líquida.

Em todos os casos os gráficos de log(G3-Go3) em função de log(t-to) dão linhas rectas cuja inclinação é
aproximadamente a unidade. Esta lei de crescimento de grão aplica-se aos casos em que o processo de
solução-precipitação está na base de crescimentos individuais e não ao caso em que pode ocorrer
coalescência entre grãos sólidos contíguos. As leis de crescimento de grão para o mecanismo de
coalescência não estão totalmente definidas, embora tal mecanismo esteja claramente evidenciado nas
análises microestruturais.

Greenwood considerou que a equação de crescimento de grão (6.7) acima era semelhante à do
crescimento de partículas esféricas isoladas num líquido em que as partículas são parcialmente solúveis,
com a dissolução dos grãos pequenos e crescimento dos grãos maiores por transporte difusivo através da
fase líquida. A equação para a velocidade instantânea de variação do tamanho da partícula de raio r, é
dada por:

dr 2 Dl S M mol γ sl 1  r 
=  - 1
dt ρ 2 RT 2
r r 

onde r é o tamanho de raio médio, Dl - coeficiente de difusão no líquido, γsl - tensão superficial sólido-
líquido, Mmol, ρ, S são respectivamente o peso molecular, a densidade e a solubilidade do sólido na fase
líquida.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 78

Por esta equação, em qualquer instante as partículas que têm um raio maior que r estarão crescendo e
as partículas menores que r dissolvem-se, enquanto que as partículas de raio r não estariam nem
crescendo nem se dissolvendo.

Substituindo r=2 r , e integrando, Greenwood obteve:

6 D l S M mol γ sl
(t - t o ) = 6 β (t - t o )
3 3
r - ro =
ρ 2 RT

para o crescimento das partículas com duas vezes o tamanho médio, e sugeriu que embora esta equação
predissesse velocidades de crescimento elevadas, elas seriam mesmo assim correctas em ordem de
grandeza. Foi também derivada uma equação semelhante, para o raio médio de partícula:

r - r o = 0,889 β (t - t o )
3 3

A possibilidade de a equação (6.7) ser também aplicada como a lei de crescimento quando as partículas
estão em contacto directo foi também sugerida por Greenwood.

Apesar da lei de crescimento de grão dada pela equação (6.7) ser observada em muitos casos, é contudo
difícil de decidir definitivamente qual é o mecanismo controlador do crescimento de grão, se a difusão
através da fase liquida ou a reacção na interfase sólido-líquido. As dificuldades para identificar encontrar o
mecanismo real de crescimento de grão observado nas microestruturas são devidas em parte a que os
mecanismos de coalescência estão ainda longe de ser completamente compreendidos. A coalescência de
partículas para o caso de grãos isométricos parece ser uma função directa do ângulo diedro (é facilitada
para ângulos φ>π/3), enquanto que para grãos anisométricos tais relações parecem não existir. Análises
microestruturais quantitativas bastante sofisticadas têm sido usadas e mesmo assim parece ser bastante
difícil de estabelecer conclusões unívocas acerca do mecanismo predominante de crescimento de grão.

Literatura recomendada sobre "Sinterização em presença de fase líquida":


1- Eremenko V.N Naidich, Jn. Lavrinensko, I.A "Liquid-Phase Sintering" Special Res. Report, Consultants
Bureau, New York 1970.
2- Huppmann, W.J., Mater Sci. Res., 10, 359, 1975.
3- Kingery, W.D., J. Appl. Phys. 30, 301 1959.
4- White, J., "Sintering and Related Phenomena", Ed. G. C. Kukzynski, Plenum Press, New York, London
1973.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 79

7. SINTERIZAÇÃO REACTIVA
Há efeitos na sinterização dos sistemas quimicamente heterogéneos que não podem ser explicados
separadamente ou apenas como reacção ou como densificação. Os dois fenómenos interferem
mutuamente no potencial químico um do outro, na direcção dos fluxos de matéria e, ainda, na geometria
interna do compacto que geram. As principais interferências a analisar são devidas a reacções no estado
sólido que alteram as concentrações de defeitos móveis na zona de contacto entre as partículas, ou que aí
precipitam segundas fases binárias, em geral com volume molar diferente dos reagentes, ou a reacções de
formação de líquidos durante o processo de densificação. Efeito importante da heterogeneidade química é
também a indução de crescimento exagerado de grão sob o efeito do gradiente de energia livre da reacção
química ou de uma transformação de fases.

7.1 REACÇÃO COM FORMÇÃO DE FASE AMORFA

A evolução simultânea da densificação e da reacção química com a formação de uma fase amorfa, que
tem essencialmente as propriedades de transporte de uma fase liquida, pode ser descrita como uma
modificação do modelo de W.D. Kingery para a sinterização em presença de fase líquida. Já, no
modelo de W.D. Kingery, a cinética de densificação era controlada quer pela etapa de difusão, quer
pela da reacção de solução precipitação. A diferença a assinalar é a de que no caso anterior fase
sólida dissolvida e precipitada era a mesma, enquanto que nos sistemas que vamos estudar, os sólidos
dissolvidos são os reagentes, sendo precipitadas novas fases sólidas, os produtos de reacção. Aos
termos do potencial químico de curvatura e da pressão aplicada há que adicionar o termo do potencial
químico da reacção química.

0 modelo apresentado a seguir foi aplicado inicialmente à reacção de formação do SiAlON,

2 Si3 N 4 + SiO2 + Al 2 O3 → Si 6 − 2 Z Al Z O Z N 8− Z + líquido (7.1).

O modelo também é válido na sinterização reactiva da almunina e o zircão que conduz formação de
mulite mecanicamente reforçada com zircónia. Pela reacção de dissociação do zircão, ZrSiO4, e
reacção com a alumina a forma-se a mulita, 3Al2O3 .2SiO2, como fase principal e precipita-se a
zircónia, ZrO2:

2ZrSiO 4 + 3 Al 2 O3 → 3 Al 2 O3 .2 SiO2 + 2ZrO 2 (7.2)

O modelo consiste numa modificação introduzida por R.J. Brook no modelo de R.L. Coble para a
prensagem a quente uniaxial controlada por difusão na fronteira de grão. Tal como no modelo de W.D.
Kingery para a sinterização em presença de fase líquida, a fronteira de grão é substituída por um filme
amorfo de espessura característica e fixa, W. Quanto à origem do líquido, este poderá formar-se como
um dos produtos de reacção, como na dissociação do zircão, ou existir como uma das fases de
equilíbrio com as fases sólidas, como no caso da fase líquida na reacção de formação do SiAlON.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 80

a) b)

Fig. 7.1 - Modelo de R.L. Coble para a sinterização com reacção. a) Empacotamento alternado de
esferas de alumina e zircão. b) – Definição de ângulo sólido de reacção (2θ).

Desde que o potencial químico total para a densificação seja igual, ou superior, ao potencial químico da
reacção à temperatura de sinterização, a reacção avança com a dissolução do sólido, camada a
camada, na zona de contacto das partículas sob o efeito da compressão da pressão de sinterização e
da pressão aplicada, seguindo-se a de precipitação dos produtos de reacção nos pontos de menor
potencial químico, as superfícies livres das partículas sólidas. Admitindo que as partículas formam um
compacto de empacotamento regular (cúbico simples, com número de coordenação médio Z=6), figura
7.1 a), e que a reacção ocorre em toda a extensão do contacto, ou seja, numa área A=πr2
correspondente ao ângulo sólido, 2θ=120º, o volume de material transformado no tempo dt no contacto
reactivo de cada hemisfério, de volume V=1/2 4/3 πr3 será, figura 7.1b):

dVt = A drt = π r 2 drt (7.3)

onde drt é a variação do raio das partículas dos sólidos reagentes. A reacção do elemento de volume
dVt, no contacto, produz uma transformação química relativa, dada por (da eq. 7.3):

dVt 3  1 drt 
=   (7.4)
Vt 2  rt dt 

Na prensagem a quente uniaxial o diâmetro da amostra é constante pelo que a retracção axial iguala o
incremento relativo da densidade:

1 drt 1 dρ
=− (7.5)
rt dt ρ dt

Pela eq. (7.4), obtém-se a seguinte relação entre o volume transformado e a densificação:
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 81

1 dVt 3 1 dρ
=− (7.6)
Vt dt 2 ρ dt

Definindo de forma mais geral o factor geométrico do transporte reactivo G, G=-2/3 no caso acima da
prensagem a quente uniaxial com 2θ=120º, e a probabilidade S de que um átomo mobilizado pelo
processo da densificaçação contribua também para o processo da reacção, a equação anterior (eq.
7.6) pode ser generalizada para qualquer geometria de reacção e processo de sinterização, como:

1 dVt S  1 dρ 
=   (7.7)
Vt dt G  ρ dt 

a) b)

c)

Fig. 7.2 - Sinterização reactiva de misturas de ZrSiO4-Al2O3. a) Densificação sob pressão aplicada,
pa=20MPa. b) Composição de fases. c) Correlação entre as velocidades relativas; linha recta
correspondente ao valor de S/G=-3/2.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 82

A evolução da densificação com reacção na prensagem a quente do sistema ZrSiO4-Al2O3, está


representada na figura 7.2. A equação (7.7) descreve a maior parte do processo, com um valor de
S/G=-3/2, como previsto pelo modelo simplificado de R.J. Brook et al.,. No início do processo, o
rearranjo de partículas promove a densificação sem reacção, por um mecanismo de deformação
viscosa. No fim do processo, à temperatura mais elevada de 1550ºC, a componente espontânea
reacção é suficientemente rápida e pode continuar por si mesma após o termo do processo de
densificação, esgotada a contribuição da força motriz da sinterização. A mesma correlação foi
observada também na densificação do SiAlON onde ocorre a transformação de fases α→β'-S3N4, na
componente do nitreto de silício, figura 7.3.

Fig. 7.3 - Velocidades relativas na sinterização reactiva do SiAlON, com a transformação de fase
α→β'-S3N4.

7.2 FORMAÇÃO DE FASE SÓLIDA BINÁRIA POR REACÇÃO NO ESTADO SÓLIDO

Neste processo, forma-se uma nova fase sólida por reacção no estado sólido na zona de contacto
entre partículas iniciais quimicamente diferentes. Tal é o caso que se observa na sinterização reactiva no
sistema ZnO-Al2O3 com a precipitação da espinela de zinco (C. Leblud, J. Mater. Sci. 16 539-544 (1981)).
A fase precipitada, por a espinela de zinco, sendo sólida e cristalina caracteriza-se por ter baixa
deformabilidade. Em dadas condições, a acumulação desta fase na zona de contacto provoca a
expansão do compacto, figura 7.4. Distingue-se, assim, da situação anterior onde uma reacção de
dissociação dava origem a uma fase amorfa, como a pré-mulita, com fluência elevada e onde a
reacção de dissociação do reagente é acompanhada pela retracção do contacto. 0 transporte para
ambos os processos, formação de fase sólida e densificação, é operado pelas mesmas espécies
móveis.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 83

b)
a)
c)

Fig. 7.4 - Formação de espinela de zinco por reacção no estado sólido. a) Geometria inicial. b)
Geometria do contacto com ângulo sólido de reacção, 2θ«π/2. c) Incremento da distância entre as
partículas do empacotamento cúbico simples. C. Leblud, J. Mater. Sci. 16 539-544 (1981).

A formação da espinela de zinco, ZnAl2O4, ocorre por reacção entre os dois óxidos na proporção
equimomolar de 1:1 :

ZnO + Al 2 O3 → ZnAl 2 O4 (7.8)

O empacotamento de partículas dos dois óxidos preparados com granulometrias semelhantes será
próximo do descrito como cúbico simples, com número de coordenação, Z≈6 . Cada partícula terá seis
primeiro vizinhos do outro óxido. Dado que os óxidos tem volumes molares distintos, para se manter a
estequiometria da reacção, a homogeneidade da distribuição de partículas e a relação de vizinhos, os raios
médios de partícula de cada um dos reagentes devem obedecer à seguinte proporção:
4
N A π RA
3

3 V
= A (7.9)
4 VZ
N Z π RZ
3

3
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 84

onde NA e NZ, RA e RZ, VA e VZ são respectivamente o número de partículas, o raio de partícula e o volume
molar da Al2O3 e do ZnO. Por a reacção ser limitada pela difusão do ião Zn no óxido de alumínio, a
espinela vai-se formando, camada a camada, sobre a Al2O3 nos pontos de contacto entre os dois óxidos. A
formação de dns moles de espinela no intervalo de tempo dt, eleva de dKt a espessura da camada reagida,
sendo o seguinte o volume transformado:
N 6 At dK t = dn S V S (7.10)
onde At é a área da interface de reacção por contacto, a interface A-S neste caso, e VS é o volume molar
da espinela. A área At é função do ângulo de abertura do contacto 2θ, que se observa ser constante, e do
raio da partícula de alumina, que evolui com o tempo:
At = 2π R A,t (1 - cos θ ) (7.11)
2 3

onde,
1
R A,t = R A (1 - x )3 (7.12)

O avanço relativo da reacção, ou grau de reacção, x, é definido como o quociente entre a quantidade de
espinela formada e a quantidade máxima de espinela que poderá ser formada no sistema quando
completamente reagido,

x ≡ nS = nS (7.13)
n S,max n S + n A
justificando-se a segunda igualdade nesta equação pela paridade que existe entre o numero de moles da
fase formada e o numero de moles de cada um dos reagentes que é consumido, eq. (7.8). O grau de
reacção x serve para se determinar a fracção molar de espinela formada,
nS x
α≡ = (7.14)
n A + nZ + ns 2 - x
onde nA, nZ e nS são o numero de moles de Al2O3, de ZnO e de espinela presentes em cada instante da
reacção.

Sendo NA dado por, eq.(7.9),


VA
N A= (7.15)
4
π R3A
3

a conservação de massa impõe que,

n A + n S = constante ⇒ dn S = dx (7.16)

donde resulta, por substituição das quantidades acima:


INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 85

 RA VS dx
dK t =   (7.17).
 9(1 - cos θ ) V A  (1 - x ) 3
3 2

Simultaneamente é removida de cada contacto uma espessura de reagentes, dft, obtida por diferenciação
de RA,t (Eq.7.12):
1 dx
d ft = - ( dR A,t + dR Z,t ) = ( R A + R Z ) 2
(7.18)
3 (1 - x ) 3

A variação da distância total entre os centros das partículas iniciais dos óxidos em reacção será, então:
 V s RA +  dx
dr t = dK t - df t =  - R A RZ  (7.19)
 9 V A (1 - cos θ ) 3  (1 - x )23
3

donde resulta, por integração:

x
dx 1 - (1 - x 31 
rt = A ∫ = 3 A  )  (7.20)
0
2
(1 - x ) 3 

sendo A, a quantidade dada entre parêntesis rectos na equação eq. (7.19).

Depois de um intervalo de tempo t, a geometria inicial descrita pela figura 7.4a) terá evoluído para a
geometria representada na figura 7.4c). A distância entre os centros das partículas aumentou para rt. O
volume do compacto teve um incremento que, quando expresso em termos do incremento de volume da
célula elementar do empacotamento cúbico, será:

[ ] [
∆ V p,t = N ( R A + R Z + r t )3 - ( R A + R Z )3 = N 3( R A + R Z )2 r t + 3( R A + R Z ) r t2 + r t3 ] (7.21)

A transformação dos volumes dos óxidos num volume único de espinela resulta numa alteração do volume
total da componente sólida, ∆VM, pelo que a variação total de volume do compacto será a soma de ambos
os termos:
∆ V t = ∆ V p,t + ∆ V M (7.22)
sendo que,

∆ V M = x[ V S - ( V A + V Z )] (7.23)
Expressa esta transformação do volume como alteração da densidade relativa, a densidade relativa ρt,
ao fim do tempo t decresce para,
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 86

1
ρt ≈ (7.24)
∆Vt 1
+
VM o ρo

onde VM0 é o volume molar inicial. Observa-se na figura 7.5 que a formação da espinela de zinco é
acompanhada por um aumento da porosidade do compacto. O incremento da porosidade, P=1-ρ,
segue o incremento da fracção relativa de espinela nas proporções dadas pelo modelo de reacção,
com um ângulo sólido de reacção, 2θ=24,4º, figura 7.6.

a) b)
Fig. 7.5- Sinterização reactiva com formação da espinela de zinco. a) Fracção molar de ZnAl204. b)
Aumento da porosidade com o tempo de reacção.

a) b)
Fig. 7.6 - Incremento da porosidade em função da fracção relativa da espinela de ZnO, e valores
calculados de acordo com o modelo, com um angulo sólido de reacção, θ=24,4º.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 87

7.3 INTERDIFUSÃO COM A FORMAÇÃO DE SOLUÇÃO SÓLIDA

São normalmente diferentes os coeficientes de difusão das espécies químicas que se interdifundem
para a formação de soluções sólidas com a composição de equilíbrio dos sólidos em contacto. Uma
excepção conhecida é o par de metais Cu-Ag cujas misturas binárias não apresentas anomalia de
comportamento de sinterização. Nos sistemas binários onde os fluxos de interdifusão são desiguais
observam-se modificações da geometria do colo e interrupções anómalas a cinética de densificação.
São conhecidos como exemplos da paragem da sinterização por efeito da interdifusão durante a
sinterização os pares de metais que formam soluções sólidas extensas, o Ni-Cu, Ni-Au, Ni-Fe e Zn-Cu
e nos óxidos cerâmicos, os pares NiO-Fe203, MgO-Fe203, ZnO-Fe203 e BaTi203-SrTi203

A comparação das curvas (1 a 3) das figuras 7.7a) e b) mostra que a sinterização de uma mistura física
equimolar de pós de BaTi203-SrTi203, ocorre mais tarde e é mais lenta do que no caso dos pós
pré-reagidos. Todos os pós foram preparados com as mesma granulometria e submetidos às mesmas
etapas durante o tratamento a alta temperatura.

a) b)

Fig. 7.7 - Sinterização reactiva no sistema de BaTi203-SrTi203. a) Pós pré-reagidos. b) Misturas


físicas de pós em sinterização reactiva.

No caso do sistema (3) na figura 7.7b) a sinterização foi perturbada ao máximo pela reacção
simultânea de formação da solução sólida de titanato de Ba e Sr, segundo a reacção,

1 1
BaTiO3 + SrTiO3 → (Ba0,5 Sr0,5 )TiO3 (7.25)
2 2
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 88

7.3.1 EFEITO DE KIRKENDALL-HARTLEY


~
Por definição, o coeficiente de interdifusão, ou de coeficiente de difusão químico, D , estabelece a
razão entre um fluxo de uma das espécies atómicas, na liga na solução sólida iónica, e o gradiente da
concentração desta, dc/dx, que o origina este fluxo, j,

~ j
D=− (7.26)
dc
dx

Nas experiências de A. Smigelskas (1947) relatadas por P.G. Shewmon, observou-se que, durante os
tratamentos térmicos a alta temperatura, a 785ºC, as marcas inertes de Mo dispostas inicialmente a
distâncias constantes fixas ao longo da direcção de interdifusão no par de Cu-Zn se moviam no sentido
do Cu enquanto a composição da liga na zona de interdifuão evoluía no sentido da homogeneização.
Por difusão no estado sólido, este par de metais forma uma liga, o latão, a solução sólida substitucional
de cobre e zinco com um largo intervalo de solubilidade. Observou-se também que as marcas inertes
de Mo seguiam o movimento dos perfis de concentração constante em que se encontravam desde o
início do tratamento térmico. O movimento das marcas é bastante superior ao limite de precisão dos
métodos de medida disponíveis e às correcções dimensionais devidas à pequena diferença de volumes
molares dos constituintes da liga, quando puros e nas proporções em que aparecem em cada plano de
análise da liga. Este deslocamento das marcas inertes por efeito da reacção de difusão não é exclusivo
do Mo, tendo-se confirmado que o mesmo se verificava se as marcas fossem de outros materiais
inertes, metais, óxidos, ou, até os poros da microestrutura, ou as impressões do teste de microdureza.

O efeito é representado esquematicamente na figura 7.8 (1) para o par Ni-Cu. Este efeito, caracterizado
inicialmente por Kirkendall, co-autor das mesmas experiências, e interpretado por Darken, é explicado
como resultando da diferença dos coeficientes de interdifusão dos dois elementos na solução sólida. A
observação mostra que, simultaneamente com a difusão dos dois elementos em sentidos contrários, há
um movimento de massa através de cada plano cristalino de referência onde assentam as respectivas
marcas inertes. A rede cristalina da solução sólida de Ni-Cu vai progredindo para dentro da rede inicial
do Cu, figura 7.8. O movimento relativo não pode ser explicado apenas por uma diferença marginal do
volume molar da solução sólida em comparação com o volume molar do Cu. O movimento de cada
átomo, por efeito da difusão (difusão lacunar) é um movimento relativo com referência às posições
vizinhas da rede, mas é também um movimento global com referência a qualquer origem do espaço
que se tome sobre o provete para definir as coordenadas dos perfis de concentração.

Darken comparou o problema da interdifusão na solução sólida binária ao da determinação da equação


do fluxo de tinta que se difunde numa corrente de água. O observador na margem determina uma
evolução das concentrações de tinta com o tempo que será diferente da medida por outro observador
que siga a deriva da corrente de água. Assim, tomando para origem do espaço qualquer das marcas
móveis no par de Cu-Zn, (ou Cu-Ni, no caso da Fig. 7.8), a cada sistema de eixos móveis de origem,
un=0, corresponderá uma curva diferente de concentrações, ct(un). O problema de definir o coeficiente
de difusão permanece irresolúvel, qualquer que seja eixo móvel escolhido como referência. Se
definirmos um sistema arbitrário de eixos, x, e compararmos com este todas as determinações de
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 89

concentrações c1 e c2 (com c1+c2=c, e a concentração da liga em mole/unidade de volume), os valores


dos gradientes de concentração, num dado instante, t, porque calculados sobre diferenças locais, são
independentes da escolha da origem dos eixos.

Fig. 7.8 - Efeito de Kirkendall-Hartley. (1) Par de interdifusão Ni-Cu com marcas inertes
de Mo e W. (2) - Precipitação de lacunas no colo formando recortes e como porosidade de
Kirkendall no interior da zona de interdifusão.

São também independentes do sistema de eixos arbitrariamente escolhido os produtos destes


gradientes multiplicados pelos correspondentes coeficientes de difusão:

 dc1   dc1   dc2   dc2 


  = ∨   =
 dx t  dun t  dx t  dun t
(7.27)
 dc   dc 
Di  1  = Di  1  i = 1, 2
 dun t  dx t

Pela definição de fluxo da espécie i através do plano da rede atómica, o factor Didci/dun, identifica-se
com o fluxo medido no plano móvel de velocidade vk=dun/dt, tal como é visto neste sistema de eixos
móvel, também designado como referencial de Kirkendall (k). No sistema de eixos de referência
exterior, ou referencial de Matano, de coordenadas x, o fluxo no mesmo ponto do par de interdifusão,
respectivamente para cada espécie, será:

dc1
j1 = − D1 + c1 v k (7.28)
dx
dc
j2 = − D2 2 + c 2 v k
dx
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 90

Aplicando a cada espécie a 2ª equação de Fick, com o volume molar do sistema binário constante, i.e.,
(c1+c2=c= constante ⇔ dc=0, ⇒ dc2=-dc1), obtém-se sucessivamente:

∂c ∂c1 ∂c2 ∂  ∂c ∂c
∂t
=
∂t
+
∂t ∂x  ∂x ∂x
(
=  D1 1 + D2 2 − c1 + c2 )v k  = 0 ) (7.29)

Como ∂c / ∂t = 0 , o resultado da integração em ordem a x do último termo da igualdade acima será


constante. Fora da zona de interdifusão são simultaneamente nulas as derivadas dci/dx e a velocidade
vk, pelo que a constante de integração é zero. Tal permite calcular vk, a velocidade da rede cristalina,
como:

vk =
1
(D1 − D2 ) ∂c1 (7.30)
c ∂x

O produto cvk representa também um fluxo de matéria no sistema. Este fluxo jD=cvk identifica-se com o
fluxo total de massa através do plano do cristal (referenciais de Kirkendall) identificado pelas marcas
inertes. Fisicamente, este fluxo de matéria só se torna possível porque a diferença entre os dois fluxos
atómicos (difusão lacunar) é compensada por um contrafluxo de lacunas garantindo a conservação de
lugares da rede cristalina da solução sólida. Já, a velocidade de reacção para a formação da solução
sólida controlada por difusão será proporcional aos fluxos atómicos, j1, ou j2. Entrando de novo com a
2ª equação de Fick e utilizando o valor de vk (eq. 7.30) obtém-se:

∂c1 ∂  ∂c1  ∂  c c  ∂c 
=  D1 − c1v k  =  2 D1 + 1 D2  1  (7.31)
∂t ∂x  ∂x  ∂x  c c  ∂x 

0 termo entre parênteses recto no último termo da igualdade na eq. (7.31) continua a ser o fluxo j1.
Donde, por comparação com a definição de coeficiente de difusão efectivo, ou químico (eq. 7.26), se
conclui, ser este o coeficiente de interdifusão dado por:

~ c c 
D =  2 D1 + 1 D2  (7.32)
c c 
~
A expressão de D na eq. (7.32) é simétrica em relação à permuta dos índices das espécies atómicas,
~
pelo que tem necessariamente o mesmo valor para as ambas as espécies móveis. Isto é, D representa
uma difusividade efectiva que controla de forma unívoca o processo químico de reacção de formação
da solução sólida por difusão lacunar dos seus constituintes.
~
As equações de vk e D são facilmente generalizadas para os em que o factor de actividade γi, (ai=γici,
sendo ai, a actividade química da espécie atómica i) é diferente da unidade. Por aplicação das
equações dos potenciais químicos parciais, da relação de Gibbs-Dühem e da equação de Nerst-
Einstein da mobilidade atómica, resultam:
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 91

(D1 − D2 ) 1 + ∂ ln γ 1  ∂c1


1  
vk =
c  ∂ ln c1  ∂x
(7.33)
~ c c   ∂ ln γ 1 
D =  2 D1 + 1 D2  1 + 
 c c   ∂ ln c1 

~
Esta última equação de D é designada como a equação de Darken do coeficiente de interdifusão ou
de difusão química.

7.3.2 CINETICA DE FORMAÇÃO DO COLO SIMULTÂNEA COM A INTERDIFUSÃO

0 efeito perturbador da interdifusão na formação do colo do fluxo de massa, jD, actuado pela força
motriz do processo de interdifusão está representado esquematicamente na figura 7.8, acima. Na parte
(1) da figura 7.8 é representado o movimento das marcas inertes de Mo e W que avançam para o lado
do Cu. A dupla seta nesta figura indica que o coeficiente de difusão do Cu é mais rápido do que o do
Ní, DCu»DNi. O contrafluxo de lacunas jD em sentido contrário ao fluxo atómico do Cu, cria excesso de
concentração de lacunas do lado do Cu em relação ao valor da concentração dado pelo equilíbrio
térmico, pelo que estas tendem precipitar-se nas fronteiras de grão e nos núcleos das deslocações
formando-se a porosidade de Kirkendall no interior da liga, do lado do Cu. isto porque a saída do Cu
das suas posições atómicas da rede é mais rápida do que a chegada do Ni atómico, que o deveria
substituir. Transpondo este balanço de espécies móveis e de lacunas para a geometria do colo
formado entre a esfera e a placa, parte (2) da figura 7.8, a superfície do colo é idêntica à superfície
interna de qualquer outro poro, pelo que funciona como superfície de precipitação das lagunas
originadas pelo fluxo de interdifusão, normal ao plano de ligação da esfera, e compete com a nucleação
e crescimento de novos poros no interior da liga. Determinada pela direcção e intensidade do fluxo de
lacunas, a superfície côncava do colo tende a seguir a zona de reacção entre o Cu e a solução sólida,
resultando numa geometria recortada como a figurada em (a) ou (b) de (2) na figura 7.8, consoante é a
placa ou a esfera que são de Cu.

O fluxo de matéria da sinterização jv, actuado pela força motriz da curvatura negativa do superfície do
colo está também activo. Para uma geometria pouco distorcida da superfície do colo, a superfície do
colo continua a ser descrita como côncava e com um raio de curvatura dado aproximadamente por
ρ=x2/4R. Sendo a espessura da zona de solução sólida formada da ordem de 2ρ, o gradiente de
concentrações das espécies químicas através da zona de difusão no colo será, ∆C0/2ρ. Fazendo a
aproximação cA=cB≈c/2, e tomando para o fluxo de sinterização, jv, uma distância característica para o
gradiente das concentrações igual a ρ, resulta então para os fluxos jD e jv,

∆C 0
j D = (D A − D B )

(7.34)
 D + DB  γ Ω
jv =  A 
 KT ρ
2
 2
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 92

Uma vez que as expressões dos fluxos nas equações acima têm dependência diferente em relação à
curvatura do colo, pode-se determinar um tamanho de colo limite (ρ*) a partir do qual o efeito de
Kirkendall-Hartley se sobrepõe ao processo de sinterização. Conhecidos os valores dos coeficientes de
difusão na eq. (7.34) pode-se determinar, ainda, o tempo necessário para se obter o equilíbrio químico
na zona do colo, ou seja, o tempo para a extinção do efeito de Kirkendall-Hartley, e compará-lo com o
tempo de formação do colo em resposta ao potencial de curvatura da superfície.

Tomando as expressões dos fluxos na eq. (7.34), teremos uma sinterização apreciável desde que jv>jD.
Caso contrário, o efeito de Kirkendall dominará o transporte de massa na zona do colo. Da
desigualdade anterior, resolvida em ordem à curvatura do colo, ρ, resulta que a sinterização é
favorecida no início do processo enquanto a curvatura da superfície do colo for,

D + D  γΩ
ρ <  A B
( ρ * ≈ 10nm) (7.35)
 D A − DB
 KT∆C 0

Com os valores representativos das propriedades dos óxidos, temos γ=1J.m-2, Ω=10-29m3, KT=10-20J, e
∆C0=0,1 entre os limites da zona de solução sólida formada, figura 7.8 (1), e assumindo uma razão de
uma ordem de grandeza entre os coeficientes de difusão na equação acima (DB=0,1DA), o valor de
tamanho de colo crítico na desigualdade anterior será, ρ*≈10-8m. A este valor de raio de curvatura do
colo corresponde um tamanho de colo relativo x/R=0,20 para partículas de raio inicial de 1µm, mas de
apenas x/R=0,06 se as microesferas tiverem um raio médio de R=10µm. A formação de colo só será
predominante sobre os efeitos da interdifusão para valores incipientes do tamanho de colo, no principio
do estádio inicial. A densificação fica bloqueada assim que estes valores do tamanho de colo crítico
forem atingidos e só poderá prosseguir quando estiver homogeneizada a solução sólida na zona do
contacto das partículas.

Se os coeficientes de difusão são independentes da concentração, a cinética de formação da solução


sólida segue uma lei parabólica em t1/2. O tempo característico para a homogeneização química das
esferas de raio R será, aproximadamente:

R2
τh ≈ ~ (7.36)
D

0 tempo necessário para que o colo atinja por difusão em volume na solução sólida um tamanho igual a
metade do diâmetro da partícula, x/R≈1/4, será:

KT
τ s ≈ 10 −3 R3 . (7.37)
Dv γ Ω

Note-se que o coeficiente de difusão em volume efectivo Dv será o da espécie atómica mais lenta em
movimento para a superfície do colo.
~
Para os valores anteriores de γ, Ω, KT, com Dv / D ≈ 0,1 e R=10µm, a razão entre os tempos
característicos dos dois processos dados pelas eqs. (7.36) e (7.37), será,
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 93

τh γΩ  Dv 1
≈ 10 3  ~  (τ h ≈ 10 τ s ) (7.38)
τs KT  D R

A cinética de formação do colo fica retardada durante um intervalo de tempo uma ordem de grandeza
superior ao que seria necessário quando se compara com o tempo de formação de colo em pós da
mesma solução sólida previamente reagidos e reduzidos a igual granulometria. Este efeito está
documentado na sinterização de misturas físicas dos titanatos de Ba e Sr na figura 7.7 b) onde, por
comparação com os resultados na figura 7.7 a), a densificação das misturas físicas de ambos os pós
se atrasam entre os 1000ºC e os 1200ºC.
A dependência em 1/R da razão dos tempos característicos dos processos de homogeneização
química e de formação do colo por difusão em volume na eq. (7.38) indica, ainda, que a perturbação do
fenómeno da interdifusão na sinterização de misturas de pós binários decresce com a redução da
granulometria dos pós na mistura. É assim que o recurso a pós ultrafinos, submicrométricos
(G∼0,1µm), com misturas preparadas por via húmida ou de co-precipitação, mesmo que
incompletamente reagidos durante as etapas prévias de calcinação, é normalmente suficiente para
obviar e contornar o efeito de Kirkendall-Hartley na sinterização. Pela mesma razão, a eq. (7.38) prevê
que este efeito estará virtualmente ausente quando se utiliza a via de sol-gel para a preparação dos
precursores dos pós mistos, ou nos estudos de sinterização com nano-partículas.

7.4 RETRACÇÃO LINEAR E DENSIDADE RELATIVA DA MISTURA BINÁRIA DE PÓS

Qualquer que seja a origem da perturbação da cinética de crescimento do colo, o efeito de Kirkendall-
Hartley, ou a expansão associada ao desenvolvimento de fase sólida binária na sinterização de
compactos formados a partir de misturas dos pós percursores, as contribuições destes efeitos são
função da composição ponderal da mistura. Nos casos analisados nas secções 7.2 e 7.3 fez-se a
aplicação a misturas equimolares binárias, com igual fracção molar de ambos os reagentes. Os
modelos foram desenvolvidos pressupondo-se que as partículas de ambas as fases são de tamanho
igual, pelo que, implicitamente, o sistema tem um número inicial de partículas de cada das fases
também igual. Motivado pela necessidade de se optimizarem as propriedades dos materiais exploram-
se com frequência largos intervalos de composição em torno de uma composição central da mistura
binária de pós.

A caracterização da dependência da velocidade de sinterização em relação à fracção de fases em


sistemas binários, medida quer pela retracção linear, quer pela densidade relativa, foi feita cedo, em
1959, por Kriek, Ford and White19 na sinterização com fase líquida dos refractários de dolomita
(sistema CaO-MgO). Embora ambas as fases sólidas existam como fases de equilíbrio na composição
da dolomita, concluiu-se que a velocidade de retracção nos contactos entre as partículas de óxidos
diferentes seria mais lenta do que nos contactos entre partículas iguais, observando-se um mínimo na
velocidade de densificação da dolomita quando as fracções volúmicas de CaO e MgO são
aproximadamente iguais. Mínimos análogos na velocidade de sinterização foram também relatados nos
estudos de sinterização dos sistemas metálicos Co-Ni, Fe-Co, Cu-Ni, quando ocorreu interdifusão para
a formação das ligas respectivas. Nota-se a existência de mínimo análogo na densidade final na
sinterização das misturas físicas de pós de BaTiO3-SrTiO3 nos resultados da figura 7.7b). O gráfico da

19
H.J.S. Kriek, W.F. Ford and J. White, Trans. Brit. Ceram. Soc., 58 (1959) 1-34
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 94

figura 7.9, põe em evidência uma dependência aproximadamente parabólica entre densidade final na
sinterização deste sistema e a composição inicial da mistura mecânica de pós.

1,00

0,90
Densidade relativa, ρ

0,80

0,70

Reagido
Mistura mecânica
0,60
0,00 0,20 0,40 0,60 0,80 1,00
BaTiO3 SrTiO3
Fracção ponderal, W

Fig. 7.9 – Dependências aditiva linear (pós pré-reagidos) e parabólica (mistura física de pós) da
densidade final em relação à composição ponderal dos pós de BaTiO3-SrTiO3 na sinterização com
velocidade de aquecimento constante, (dados da figura 7.7).

Seguindo Ja. E. Geguzin20, a topografia da mistura de pós é definida como uma distribuição
homogénea de partículas das duas fases, com densidades (ρ1, ρ2) e tamanhos médios de partícula
conhecidos (G1, G2), em fracções ponderais dadas (C1, C2), com C1+C2=1. Donde se determinam
sucessivamente, a fracção volúmica de cada fase, Vi, reportada ao volume total dos sólidos,

1
V1 = ∨ V2 = 1 − V1 (7.39)
(1 − C1 ) ρ1
1+
C1 ρ 2

o volume médio das partículas de cada fase, vpi,

π Gi3
vpi = i = 1, 2 (7.40)
6

20
Ja. E. Geguzin, Fisika Metalov i Metallovedenie, 2 (1956), 406.
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 95

a fracção numérica das partículas de cada fase, ni,


N1 C1 v p 1 ρ1
n1 = = ∨ γ = , n2 = 1 − n1 (7. 41)
N 1 + N 2 C1 + γ (1 − C1 ) vp2 ρ2

onde N1 e N2 são os números totais de partículas de cada uma das fases. Note-se que a razão do peso
das partículas, γ, na equação (7.41) reduz-se ao quociente das densidades das componentes da
mistura quando os tamanhos de partícula médios de ambas as componentes são iguais, (G1=G2=G).

A dependência parabólica com o mínimo observado na figura 7.9 resulta da regra do produto da
probabilidade condicionada, posto que a fracção de contactos de cada tipo entre partículas é dada pela
probabilidade de que uma partícula da componente i estabeleça um contacto de primeiros vizinhos com
outra partícula da mesma fase i (contactos homólogos), ou com uma das partículas da outra fase
(contactos heterólogos),

n 22 = (1 − n1 ) n12 = 2 n1 (1 − n1 ) (7.42)
2 2
n11 = n1 ∨ n11 + n22 + n12 = 1

sendo que a retracção linear relativa do compacto, ∆l/l0, é determinada a partir das fracções de
contactos de cada tipo, do número de partículas (n) ao longo dum comprimento do compacto, l0, e da
retracção dos contactos (aproximação de centros) entre partículas iguais (λii, i=1, 2) e entre partículas
diferentes (λ12),

∆l n
= (λ11 n11 + λ 22 n22 + λ12 n12 ) (7.43)
l0 l0

Por substituição dos valores das fracções dos contactos dados na eq. (7.42), obtém-se a equação de
Geguzin da retracção linear relativa na sinterização da mistura binária de partículas:

∆l n λ11 + λ 22
= [λ11 n1 + λ 22 (1 − n1 ) + 2λ0 n1 (1 − n1 )] ∨ λ0 = λ12 − (7.44)
l0 l0 2

Para compactos da mistura de pós com retracção isotrópica, a densidade relativa na sinterização é
determinada a partir da fracção de empacotamento inicial do compacto, ρ0, e da retracção linear
relativa dada pela equação de Geguzin,

ρ0
ρ= 3
(7.45)
 ∆l 
1 − 
 l0 

A quantidade λ0 na equação de Geguzin, eq. (7.44), designada por “retracção de mistura” tem uma
importância particular na evolução do sistema. Quando λ0=0,
INTRODUÇÃO AOS MODELOS DE SINTERIZAÇÃO 96

λ11 + λ 22
λ0 = 0 ⇔ λ12 = (7.46)
2

a retracção nos contactos entre pares de partículas diferentes é igual à média dos valores de retracção
nos contactos entre pares de partículas iguais. A retracção linear da mistura de pós é aditiva, isto é,
conforme prevê a equação de Geguzin neste caso, a retracção linear relativa da mistura é uma função
linear da fracção numérica de partículas da uma dada fase na mistura, evoluindo em linha recta entre
os valores de ∆l/l0=λ22/(l0/n) para n1=0 e ∆l/l0=λ11/(l0/n) para n1=1. Não se deve confundir com esta
previsão a quase linearidade da dependência da densidade final em relação à composição da solução
sólida de (Ba,Sr)TiO3 pré-reagida, também mostrada na figura 7.9.

Para todos os valores negativos da retracção de mistura, λ0<0, a equação de Geguzin prevê a
existência de um mínimo em ∆l/l0(n1) na relação entre a retracção linear relativa e a composição da
mistura de pós. Reportando-se à formação das soluções sólidas, o maior desvio à linearidade com a
formação do mínimo descrito pela equação de Geguzin é atingido nos sistemas insolúveis, quando
λ12=0, caso em que não existe qualquer retracção nos contactos entre partículas diferentes. A equação
de Geguzin permite assim obter estimativas do valor da retracção nos colos formados entre as
partículas diferentes nas misturas de pós, como se observa no sistema do titanato de bário e estrôncio
na figura 7.9. Um caso ainda mais desfavorável à densificação das misturas de pós é o da sinterização
simultânea com a formação de fase sólida binária com ângulo sólido de abertura (θ) baixo e expansão
dos contactos entre partículas diferentes, secção 7.2. Neste caso, a retracção dos contactos
heterólogos tem valor negativo, λ12<0, e o mínimo na retracção linear relativa em função da
composição ∆l/l0(n1) será ainda mais acentuado do que quando λ12=0.

A determinação da superfície específica da interface de reacção (Sv12) para a aproximação dos


pequenos colos, no caso de misturas de partículas com tamanhos médios aproximadamente iguais
(G1≈G2=G) pode ser feita a partir da estimativa da retracção linear relativa nos colos entre partículas
diferentes (λ12/G),

6  λ 
SV 12 =  Z ( ρ )  n12  12  (7.47)
G   G 

onde Z(ρ) é o número de coordenação médio do empacotamento de partículas na mistura de pós, com
valores representativos no intervalo 4<Z(ρ)<10, como dado na tabela 3.1.

Tendo em conta os pressupostos da análise feita, esperam-se desvios importantes em relação ao


previsto pela equação de Geguzin, eq. (7.44), quando a razão entre tamanhos médios de partícula das
componentes se afasta bastante da unidade, quando o transporte por difusão em superfície (ou na fase
gasosa) desloca a camada de reacção para as superfícies livres dos poros, ou se a qualidade da
mistura é insuficiente e persistem na mistura aglomerados volumosos de partículas de uma mesma
fase, ou ainda se as tensões internas de retracção diferencial entre contactos nos casos mais extremos
dos sistemas insolúveis ou dos sistemas com expansão dos contactos heterogéneos induzem
destruição interior do compacto com a formação de fissuras e falhas que dificilmente possam ser
remediadas durante o processo de densificação.

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