Você está na página 1de 7

GABRIELA MUSSALEM RANGEL - DRE: 118143431

VICTOR LUIZ DE AZEVEDO VITARI FERREIRO – DRE: 119140389

COMPETÊNCIA DA CORTE

O Brasil é um Estado Parte na Convenção Americana sobre Direitos Humanos


desde 1992 e reconheceu a competência contenciosa da Corte Interamericana de
Direitos Humanos em 1998 conforme demonstra o decreto de nº 678 1, 6 de novembro
de 1992, e o decreto legislativo nº 89 2, 3 de dezembro 1998, com Declaração de
aceitação da competência obrigatória da Corte Interamericana de Direitos Humanos
depositada junto à Secretária-Geral da Organização dos Estados Americanos em 10 de
dezembro de 1998, respectivamente. Além disso, o decreto nº 4.463, 8 de novembro de
2002, promulgou a: “Declaração de Reconhecimento da Competência Obrigatória da
Corte Interamericana de Direitos Humanos, sob reserva de reciprocidade, em
consonância com o art. 62 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de
São José), de 22 de novembro de 1969.” Dessa forma, A Corte Interamericana de
Direitos Humanos é competente para conhecer do presente caso, nos termos do artigo
62.3 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos: “A Corte tem competência para
conhecer de qualquer caso relativo à interpretação e aplicação das disposições desta
Convenção que lhe seja submetido, desde que os Estados Partes no caso tenham
reconhecido ou reconheçam a referida competência, seja por declaração especial, como
prevêem os incisos anteriores, seja por convenção especial”.

O Brasil ratificou a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura,


CIPST3, em 20 de julho de 1989. As obrigações internacionais que decorrem da CIPST
e da CADH, já mencionada, adquiriram plena força legal após as datas de promulgação,
tendo o Brasil, como já mencionado anteriormente, em 10 de dezembro de 1998,
reconhecido a competência contenciosa da Corte Interamericana de Direitos Humanos e
1
BRASIL. Decreto-lei nº 678, DE 6 DE NOVEMBRO DE 1992. Promulga a Convenção Americana sobre
Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Presidência da
República. Casa Civil. Subchefia para assuntos jurídicos.
2
BRASIL. Decreto Legislativo nº 89, DE 3 DEZEMBRO DE 1998. Aprova a solicitação de reconhecimento
da competência obrigatória da Corte Interamericana de Direitos Humanos em todos os casos relativos à
interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos para fatos ocorridos a partir
do reconhecimento, de acordo com o previsto no parágrafo primeiro do art. 62 daquele instrumento
internacional. Senado Federal.
3
BRASIL. Decreto-lei nº 98.386, DE 9 DE DEZEMBRO DE 1989. Promulga a Convenção Interamericana
para Prevenir e Punir a Tortura. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para assuntos jurídicos.
a ela se submetido. O artigo da 8 da Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a
Tortura expõe que: “[...] uma vez esgotado o procedimento jurídico interno do Estado
e os recursos que este prevê, o caso poderá ser submetido a instâncias internacionais,
cuja competência tenha sido aceita por esse Estado.” Dessa forma, a Corte, instância
internacional com competência contenciosa reconhecida pelo Brasil, tem legitimidade
para analisar e declarar qualquer tipo de violação cometida as normas presentes na
Convenção.

A Corte tem competência para examinar e se pronunciar sobre possíveis


violações de direitos humanos a respeito de um processo de investigação ocorrido
posteriormente à data de reconhecimento de competência do Tribunal, ainda que esse
processo tenha tido início antes do reconhecimento da competência contenciosa nos
casos em que continuam ou permanecem, posteriormente a data do reconhecimento da
competência, violações as normas da Convenção Americana de Direitos Humanos e da
Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura 4. Ademais, conforme
Accioly5, “A responsabilidade jurídica do estado pode achar-se comprometida tanto por
um dano material quanto por um dano moral. Importa: 1º) haja dano feito a direito
alheio; 2º) que se trate de ato ilícito; 3º) que esse ato seja imputável ao estado ”. Além
disso, a Corte, conforme artigo 63.1 da Convenção: “Quando decidir que houve violação
de um direito ou liberdade protegidos nesta Convenção, a Corte determinará que se
assegure ao prejudicado o gozo do seu direito ou liberdade violados. Determinará também,
se isso for procedente, que sejam reparadas as conseqüências da medida ou situação que
haja configurado a violação desses direitos, bem como o pagamento de indenização justa à
parte lesada. Dessa forma, o Tribunal tem competência para analisar e julgar o Brasil em
relação os supostos fatos e omissões deste, ocorridos a partir de 10 de dezembro de
1998, tanto em relação à Convenção Americana como a respeito da Convenção
Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura.

CONSIDERACÕES DOS ARGUMENTOS PRELIMINARES

4
Brasil. Caso Vladimir Herzog Vs. Brasil. SENTENÇA DE 15 DE MARÇO DE 2018. Pág. 9
5
ACCIOLY, Hildebrando; G. E. do Nascimento e Silva; CASELLA, Paulo Borba. Manual de direito
internacional público. – 24. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. Pág. 226 Ebook.
Em seu escrito de contestação, o Estado apresentou cinco exceções preliminares,
sendo quatro delas acerca da suposta incompetência da Corte em julgar o presente caso,
sendo elas a incompetência ratione quanto aos fatos anteriores à data de reconhecimento
da jurisdição desta corte, a incompetência ratione temporis quanto aos fatos anteriores à
adesão à Convenção Americana de Direitos Humanos pelo Estado brasileiro, a
incompetência ratione temporis quanto aos fatos anteriores à entrada em vigor da
Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura para o Estado brasileiro e a
incompetência ratione materiae para analisar as supostas violações dos artigos 1, 6 e 8
da CIPPT, que serão analisadas conjuntamente. A outra exceção versa acerca da falta de
esgotamento dos meios internos de resolução do problema.

A. EXCEÇÕES PRELIMINARES RELATIVAS À ALEGADA


INCOMPETÊNCIA DO TRIBUNAL

A.1. Alegações dos lesionados, do Estado e da Comissão

Os lesionados sustentaram que a Corte é competente para julgar o caso uma vez
que o Estado brasileiro é signatário de declarações e convenções em matéria de direitos
humanos. Nesse sentido, o direito dos cidadãos deve ser resguardado em todas as
hipóteses, principalmente pelo Estado, quando este é o violador das garantias
individuais, e diante de tratamento extremamente arbitrário com o qual conduziu todos
os fatos relativos ao caso de Vladimir Herzog, é necessário que a Corte interfira a fim
de reparar as vítimas.

O Estado afirma que a Corte não tem competência para julgar o caso tanto em
virtude do tempo quanto em virtude da matéria. Em relação ao tempo, alega que o
Brasil só reconheceu a competência da corte em dezembro de 1998, anos depois do
incidente e por isso ela só poderia julgar e interferir em fatos posteriores a essa data.
Além disso, salienta que o Brasil só aderiu à Convenção Americana sobre Direitos
Humanos em 1992, também não podendo ser responsabilizado por violações ao tratado
antes dessa data porque ainda não era signatário, ademais, a Convenção Interamericana
para Prevenir e Punir a Tortura só teria entrado em vigor em 19 de setembro de 1989 e
que apenas para fatos ocorridos depois dessa data se poderia alegar violação por parte
do Estado.

Em relação a incompetência material para análise das supostas violações dos


artigos 1, 6 e 8 da Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, alega o
Estado que o Brasil não consentiu expressamente em aceitar a jurisdição e por isso não
poderia ser submetido a julgamento, destacando o artigo 8 da própria Convenção.

A Comissão salientou que a principal função da Comissão é a defesa dos


direitos humanos, que no presente caso haviam sido comprovadamente violados. Além
disso, destacou que o Estado brasileiro ratificou a Convenção Americana de Direitos
Humanos.

A.2. Considerações da Corte

É verdade que o Brasil reconheceu a competência contenciosa da Corte


Interamericana somente em 1998, no entanto, ratificou a sua Convenção anos antes, em
1992. Nesse sentido, a Corte Interamericana não tem competência para interferir em
casos posteriores à ratificação da Convenção Americana, assim como posteriores a
Convenção Interamericana para Prevenir a Tortura, ratificada em 1989, em observância
ao princípio da irretroatividade. No entanto, a demanda interposta pelos lesionados diz
respeito a fatos que se esgotaram em data posterior à ratificação, mais precisamente em
1994, quando houve o trânsito em julgado de uma ação declaratória de natureza civil,
proposta na Justiça Federal pela família.

Assim, entende a Corte que há competência para analisar plenamente o caso,


inclusive em relação as supostas violações dos artigos 1, 6 e 8 da Convenção
Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura. Nesse ponto, destaca-se que todas as
normas devem ser interpretadas da forma que amplia os direitos fundamentais dos
indivíduos (princípio pro homine), assim, apesar do Brasil não ter aceitado
expressamente a jurisdição da Convenção, como a ratificou em 1989 está sujeito a seus
termos, havendo, portanto, competência material em relação aos respectivos artigos.
Uma vez esclarecidas as divergências em relação às datas de ratificação e
vigência das referidas Convenções acerca dos Direitos Humanos, o Tribunal reafirma a
sua competência em relação a esse tema.

B. FALTA DE ESGOTAMENTO DOS MEIOS INTERNOS DE


RESOLUÇÃO DO PROBLEMA

B.1. Alegações dos lesionados, do Estado e da Comissão

Os lesionados argumentaram que se trata de caso com supostas violações


severas dos direitos humanos, tais quais o direito à vida, integridade da pessoa,
liberdade de expressão, direito à justiça, entre outros, pelo Estado, que deveria zelar por
esses direitos individuais. Os julgamentos relativos aos crimes contra a vida e de tortura,
como lembrado pelos familiares de Vladimir Herzog, foram arbitrários e morosos desde
o momento que o jornalista adentra as dependências do DOI-CODI. Em razão das
graves acusações criminais que sofre o Estado brasileiro em relação ao presente caso e a
fim de que se resolva o mesmo baseado nos critérios de justiça, alegam ser competente a
Corte, uma vez já esgotadas as tentativas de resolução do conflito internamente, que,
por sua vez, foram perpetradas negligentemente por parte da União.

Alega o Estado que é regra básica do Direito Internacional dar a oportunidade


da União de retratar-se internamente em relação às supostas violações cometidas. Foi
reconhecida, em sentença da Justiça Federal, a responsabilidade do Estado brasileiro
pela prisão arbitrária do jornalista, mas, indica o Estado, que quanto a fixação do valor
da indenização deveria ter sido iniciada ação própria. Além disso, lembra que de forma
administrativa foi realizado pedido de indenização de R$ 100.000,00 (cem mil reais)
que foi atendido, e que as vítimas não mais recorreram, além de não ter havido mais
tentativas de resolução do conflito mesmo que existam outros recursos internos ainda
não explorados.

A Comissão expõe que houve violações de direitos e liberdades por parte do


Estado e que mesmo depois de muitos anos do ocorrido, em todas as tentativas de
resolução, a Justiça brasileira se mostrou omissa em emitir sentença capaz de produzir
justiça em relação ao pedido dos lesionados. Por isso, eles estariam aptos a procurar a
Corte para tomarem as devidas providências.

B.2. Considerações da Corte

Tratando-se de sérias alegações de violações de direitos humanos, inclusive a


acusação de tortura de um cidadão brasileiro, sendo o Brasil um país democrático e
signatário de diversas convenções e tratados acerca da garantia dos direitos humanos, é
necessário que apresente mais especificamente quais são os recursos internos que
estariam a disposição dos lesionados e que não foram utilizados nas tentativas de
solucionar o litígio (Cf. Caso Gonzales Lluy e outros Vs. Ecuador. Exceções
preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 1 de setembro de 2015. Série C
N 298, par 28; e Caso Favela Nova Brasília Vs. Brasil, par. 78).

Parte da reparação que se busca é justamente em relação às violações


perpetradas pelo Estado em relação aos direitos de justiça, garantias judiciais e proteção
individual, desde o momento da prisão arbitrária do indivíduo.

A fim de atuar em conformidade com o princípio do equilíbrio processual, e a


fim de manter a transparência do processo, é necessário que o Estado esclareça
objetivamente quais os recursos que ainda não foram utilizados pelos lesionados
internamente para que a Corte discuta a admissibilidade.

Em conclusão, a Corte declara improcedente a preliminar acerca da falta de


esgotamento dos meios internos de resolução do conflito.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Decreto-lei nº 678, DE 6 DE NOVEMBRO DE 1992. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm
BRASIL. Decreto Legislativo nº 89, DE 3 DEZEMBRO DE 1998. Disponível em:
https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decleg/1998/decretolegislativo-89-3-dezembro-
1998-369634-norma-pl.html
BRASIL. Decreto-lei nº 4.463, DE 8 DE NOVEMBRO DE 2002. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/d4463.htm#:~:text=DECRETO
%20N%C2%BA%204.463%2C%20DE%208,22%20de%20novembro%20de%201969.
COSTA RICA, Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Disponível em:
https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm

Organização dos Estados Americanos. Convenção Interamericana para Prevenir e Punir


a Tortura (1985). Disponível em: http://www.oas.org/juridico/portuguese/treaties/a-
51.htm.
ACCIOLY, Hildebrando; G. E. do Nascimento e Silva; CASELLA, Paulo Borba.
Manual de direito internacional público. – 24. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
Pág. 226 Ebook.
https://repositorio.pucrs.br/dspace/bitstream/10923/14950/2/
Caso_Vladimir_Herzog_na_Corte_Interamericana_de_Direitos_Humanos_escrito_de_a
micus_curiae_elaborado_pelo_Grupo_de.pdf

https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_353_por.pdf

Você também pode gostar