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Rio de Janeiro, 24 de agosto de 2015

ISSN: 2446-7014 • Número 19

BOLETIM GEOCORRENTE CONSELHO EDITORIAL


O Boletim Geocorrente é uma publicação quinzenal voltada à
análise de fatos correntes do cenário internacional sob a lente teórica
da Geopolítica, procurando identificar os elementos agravantes,
motivadores e contribuintes para a escalada de conflitos e crises Editor Responsável
em andamento e seus desdobramentos. Para isso, o grupo de Leonardo Faria de Mattos (EGN)
pesquisa ligado ao Boletim conta com integrantes de diversas áreas
de conhecimento, cuja pluralidade de formações e experiências Editor Científico
proporciona uma análise ampla de contextos e cenários geopolíticos Francisco Eduardo Alves de Almeida (IGHMB)
e, portanto, um melhor entendimento dos problemas correntes
internacionais. Editores Adjuntos
Felipe Augusto Rodolfo Medeiros (EGN)
Essa publicação é vinculada ao Programa de Pós-Graduação em
Estudos Marítimos (PPGEM), do Centro de Estudos Político- Jéssica Germano de Lima (EGN)
Estratégicos (CEPE) da Escola de Guerra Naval (EGN). Noele de Freitas Peigo (FACAMP)

Pesquisadores do Grupo de Geopolítica Corrente


NORMAS DE PUBLICAÇÃO André Figueiredo Nunes (UFRJ)
Esse Boletim tem como objetivo publicar artigos curtos tratando de Ariane Dinalli Francisco (PUC - Rio)
assuntos da atualidade e, eventualmente, de determinados temas de
caráter geral sobre dez macrorregiões do Globo, a saber: América do Caio Ferreira Almeida (UFF)
Sul; América do Norte e Central; África Subsaariana; Oriente Médio Carlos Henrique Ferreira da Silva Júnior (UFRJ)
e Norte da África; Europa; Rússia e ex-URSS; Sul da Ásia; Leste Daniel Costa Sampaio de Araujo (IUPERJ)
Asiático; Sudeste Asiático e Oceania; Ártico e Antártica. Danillo Avellar Bragança (UERJ)
Franco Aguiar de Alencastro Guimarães (PUC - Rio)
Para publicar nesse Boletim, faz-se necessário que o autor seja João Victor Marques Cardoso (UFF)
pesquisador do Grupo de Geopolítica Corrente, do Laboratório de Lais de Mello Rüdiger (UFRJ)
Simulações e Cenários (LSC) da Escola de Guerra Naval e submeta Louise Marie Hurel Silva Dias (PUC - Rio)
seu artigo contendo, no máximo, 350 palavras ao processo avaliativo. Luciane Noronha Moreira de Oliveira (EGN)
A avaliação é feita por pares, sem que os revisores tenham acesso ao Luma Teixeira Dias (UFRJ)
nome do autor (blind peer review). Ao fim desse processo, o autor Marcelle Siqueira Santos (UERJ)
será notificado via e-mail de que seu artigo foi aceito (ou não) e que Marcelle Torres Alves Okuno (IBMEC)
aguardará a primeira oportunidade de impressão. Matheus Souza Galves Mendes (UFRJ)
Pedro Allemand Mancebo Silva (UFRJ)
CORRESPONDÊNCIA Raissa Pose Pereira (UFRJ)
Escola de Guerra Naval – Centro de Estudos Político-Estratégicos. Sara Oliveira Dantas (IBMEC)
Av. Pasteur, 480 - Praia Vermelha – Urca - CEP 22290-255 - Rio de Tatiane González Barbosa (IBMEC)
Janeiro/RJ - Brasil (21) 2546-9394 Thayná Fernandes Alves Ribeiro (UFRJ)
E-mail: geo.corrente@yahoo.com.br. Vinícius de Almeida Costa (UFRRJ)
Aos cuidados do Editor Responsável do Boletim Geocorrente. Vinicius Guimarães Reis Gonçalves (UFRJ)
Vivian de Mattos Marciano (UFRJ)

Os textos contidos nesse Boletim são de responsabilidade única dos membros do Grupo, não retratando a opinião ofi-
cial da Escola de Guerra Naval nem da Marinha do Brasil.

• América do Sul • Rússia e ex-URSS


• América do Norte e Central • Sul da Ásia


África Subsaariana
Oriente Médio e Norte da África


Leste Asiático
Sudeste Asiático e Oceania
Regiões
• Europa • Ártico e Antártica
América do Sul
O corredor ecológico Triplo A: preservação ou ameaça à soberania brasileira?
Por: Lais Rüdiger
Foto: Cdn.defesaaereaenaval.com.br
As notícias sobre a criação de um ambicioso projeto proposto
pelo atual presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, começaram
a ser vinculadas na imprensa internacional em fevereiro deste ano.
O chamado Corredor Ecológico Triplo A engloba as regiões dos
Andes, Amazônia e Atlântico, conforme mostrado no mapa. Se for
aprovado, 62% do Corredor será constituído por território brasileiro,
34% colombiano e 4% venezuelano, num total de 135 milhões de
hectares. O projeto também está vinculado ao nome do ativista
colombiano Martin von Hildebrand, que apontou o Corredor como a
manifestação de uma unidade política entre os três países envolvidos.
Dessa forma, seriam criados mosaicos de áreas protegidas, com a
unificação de todas as regiões indígenas existentes.
A sugestão será levada pelo presidente colombiano para a Conference of Parties (COP 21), promovida
pela ONU, que ocorrerá no início de dezembro, em Paris. As alegações da criação do Corredor são para conter o
avanço das mudanças climáticas e para a preservação do meio ambiente, como informa o site oficial do governo
da Colômbia. Além disso, para Santos, o objetivo maior é encontrar um equilíbrio entre a questão do cuidado com
a região amazônica e o desenvolvimento econômico em áreas como agricultura, mineração, produção de petróleo,
construção de infraestrutura e desenvolvimento urbano.
Sendo a primeira vez que o Plano Nacional de Desenvolvimento colombiano (2014 – 2018) engloba uma
questão do chamado “Crescimento Verde”, existe, ainda, a ênfase do presidente Santos de que a Colômbia é um
país rico em biodiversidade e deve preocupar-se com o futuro. O projeto é incerto devido às diferentes normas de
proteção ambiental no Brasil, Colômbia e Venezuela. Contudo, essa seria uma maneira de o país colombiano buscar
um posicionamento de liderança em relação ao plano. Cabe ao Brasil estar atento aos seus interesses, quanto aos
recursos naturais da Amazônia e às regiões geopolíticas estratégicas, fronteiriças a esses dois Estados vizinhos.

América do Sul
Reacende a chama do Sendero Luminoso Por: Carlos Henrique

No Peru, na última semana de julho, foram resgatadas 54 pessoas na região de El VRAEM – Vale dos

Rios Apurímac, Ene e Mantaro – dominada pelo narcotráfico. Os reféns estavam sendo mantidos pelo Sendero
Luminoso, grupo criado nos anos 1960 por Abimael Guzmán (presidente Gonzalo) e quase extinto na década
de 1990, após forte ação militar do governo do Peru, com apoio norte-americano, por ter sido classificado como
terrorista pelo governo peruano e também pelos EUA e União Europeia.
Conforme divulgado, os resgatados eram 21 adultos e 33 crianças, sendo estas sequestradas de famílias
camponesas ou frutos dos abusos a mulheres feitas escravas para que, posteriormente, viessem a compor o
efetivo do grupo armado. Na primeira semana de agosto, os senderistas também atacaram uma base do Exército
peruano, matando um militar em Mazángaro, localizado às margens do rio Mantaro. Segundo o Comando
Especial da região, o ataque teria ocorrido em represália ao resgate.
A região é conhecida como uma das maiores do mundo na produção de coca e pela quase total ausência do
Estado peruano. Por esses motivos, diferentes ações têm sido realizadas por agentes antidrogas, que alcançaram
a desarticulação do grupo na região sul do El VRAEM, com a captura dos “camaradas” Renan e Yuri, ou
Alexander Alarcón e Dionisio Ramos, respectivamente. Os capturados foram responsáveis pela organização de
uma série de ataques à infraestrutura de gás de Camisea, projeto energético crucial para o Peru.

[2]
É importante apontar que a região norte do El VRAEM, que tem os irmãos Quispe Palomino como líderes
do Sendero Luminoso, está sendo fortemente monitorada pelo Estado peruano, o que faz com que os criminosos
utilizem outras rotas para o transporte de coca, inclusive rotas fluviais para o Brasil e Bolívia. O aumento das
ações do grupo, uma ameaça à estabilidade regional, requer maior coordenação nas ações de combate por parte
dos governos da região, podendo inclusive vir a ser tema no Conselho de Defesa Sul-Americano.

América do Norte e Central


A Operação Stratton Por: Danillo Bragança
Uma grande operação da Guarda Costeira norte-americana movimentou a base naval de San Diego entre os
meses de abril a agosto. Cerca de 32 toneladas de cocaína foram apreendidas neste esforço conjunto, que contou
com o apoio logístico da Marinha norte-americana. Esse montante representa a maior apreensão em uma única
operação, além de um grande êxito para a Guarda Costeira: as 32 toneladas apreendidas correspondem a cerca de
8% da cocaína consumida nos Estados Unidos anualmente, cujo total é de 420 toneladas, como afirma o almirante
Paul Zukunft, chefe da operação.
Embora os números sejam consistentes, eles representam um esforço muito questionável. Se, por um lado,
as operações em águas norte-americanas e mexicanas de fato se mostram como um êxito importante; por outro,
chamam atenção para o estado das relações entre México e Estados Unidos em outras áreas. A cooperação, que
antes se dava em níveis mais automáticos, encontra dificuldades atualmente. O entendimento entre o governo
Obama e o governo Peña Nieto está em situação delicada, desde os eventos de Ayotzinapa, em setembro de 2014,
quando 43 jovens estudantes foram mortos por uma milícia local.
Em níveis de cooperação militar, o estranhamento se mantém. Essa operação da Guarda Costeira estadunidense
sequer contou com o apoio logístico do parceiro mexicano, o que não é raro, mas pode sinalizar algo mais. A recente
fuga de Chapo Guzmán, um dos narcotraficantes mais atuantes do México, aumentou o clima de desconfiança
na capacidade de Peña Nieto em combater o crime no país. O distanciamento das autoridades norte-americanas
parece querer destacar a atual imagem do presidente mexicano da que ele tentava construir anteriormente. O que se
percebe imediatamente é que a tolerância com os erros institucionais e a permissividade do governo mexicano está
em limites alarmantemente baixos. Uma vitória republicana nos EUA em 2016 pode vir a agravar ainda mais esse
clima de desconfiança e distanciamento entre os dois países.

África Subsaariana
Assassinato político no Burundi Por: Franco Alencastro
O presidente do Burundi, Pierre Nkurunziza, reeleito em 21 de julho
deste ano, enfrenta a primeira crise de seu terceiro mandato: o assassinato do
general Adolphe Nshimirimana no dia 02 de agosto, um de seus mais próximos
colaboradores e braço direito. O crime – levado a cabo por homens em fardas
militares, segundo testemunhas – é mais um sinal da crise política do Burundi,
que teve início em abril, com o anúncio que Nkurunziza pretendia concorrer a
uma segunda reeleição.
Na ocasião, o argumento do presidente para legitimar sua candidatura
foi que seu primeiro mandato não teria contado, já que à época ele foi
indicado pelo poder Judiciário. As declarações não convenceram os
opositores de Nkurunziza, que foram às ruas nos meses de maio e julho.
Ainda, em 13 de maio, ocorreu uma tentativa de derrubada do governo,
que foi desbaratada por tropas leais ao presidente. Entretanto, as ações de Foto: Holytrinity.ab.ca/
grupos militares e paramilitares contra os aliados do chefe de Estado continuam, incluindo uma insurgência armada
[3]
em Cibitoke, perto da fronteira com Ruanda.
A escalada da crise, considerada a mais séria desde o fim da guerra civil em 2005, levou mais de cem mil pessoas
a deixarem o país como refugiados. Tal situação tem colocado a União Africana (UA) em uma posição difícil, já que o
Burundi é um dos maiores contribuidores com tropas para as operações militares da organização na Somália. Suspender
o país da organização seria, então, politicamente custoso. Por outro lado, a pressão da UA reforçaria o isolamento de
Pierre Nkurunziza e o obrigaria a dialogar com a oposição, evitando uma insurgência ainda maior. Será um importante
momento para testar o comprometimento da UA com a democracia.

África Subsaariana
Crise hídrica poderá afetar o desenvolvimento africano? Por:Vivian Mattos

Foto: Sadc.int
Segundo os relatórios de atividades do secretariado da
Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (CDAA),
a água é um elemento fundamental para o desenvolvimento
socioeconômico da região. Entretanto, a questão hídrica
sempre foi pauta das agendas dos países situados no sul da
África, haja vistos os inconstantes níveis de pluviosidade ao
longo dos anos, gerando períodos de secas e de inundações.
Atualmente, países membros da CDAA como a África
do Sul, Angola, Namíbia, Zimbábue, entre outros, estão
sofrendo com a falta de recursos hídricos, e alguns analistas
afirmam que, se os hábitos dessas populações não forem
revistos, a situação piorará nos próximos anos. A crise pode afetar gravemente o crescimento das indústrias
e do setor financeiro dos países membros, além de prejudicar objetivos como os da erradicação da fome e da
miséria, considerando que as economias desses Estados são alicerçadas na agricultura. Outro fator que tem
preocupado os países membros é o aumento da temperatura, prevista para aumentar entre 1°C e 3°C até 2080,
intensificando a instabilidade da região.
Desde 2011, o bloco tem voltado seus esforços para solucionar a escassez de água. Uma das ações foi a
criação do Programa Regional de Infraestruturas Hídricas, auxiliado por países não africanos como a Alemanha,
Austrália e Reino Unido, em questões como financiamento e planejamento. A comunidade tem cerca de 20
projetos de planejamento e gestão integrada nas áreas de saneamento básico, distribuição e armazenamento
de água. Deve-se atentar que, dos três maiores parceiros econômicos do Brasil na África Subsaariana, dois
estão na região afetada pela seca: África do Sul e Angola. Ambos possuem fortes relações com o Brasil, estão
inseridos no entorno estratégico brasileiro, fazem parte da ZOPACAS e, no caso de Angola, também membro
da CPLP.

África Subsaariana
A luta não é somente da Nigéria Por: João Victor Marques
A vitória de Muhammadu Buhari na última eleição presidencial da Nigéria representou um grande marco
na evolução democrática do país. Como apontado no Boletim Geocorrente 11, os pontos focais de atuação
suscitados por Buhari são o combate à corrupção e, principalmente, o extermínio do grupo terrorista Boko
Haram. A segurança, ou a ausência dela, foi o fator decisivo para o resultado eleitoral, de modo que essa se faz
fundamental para a análise sobre os primeiros passos do novo governo.
É possível que os nigerianos tenham escolhido Buhari devido ao seu histórico “linha dura”, já que seu
breve governo na década de 1980 foi autoritário. Entretanto, o diálogo e a consulta têm sido atividades marcantes
do presidente até o momento, evidências que o general reformado mudou.

[4]
As visitas oficiais aos vizinhos Chade, Níger e Camarões; aos Estados Unidos, em julho; e sua participação
extraordinária na cúpula do G7 corroboram a disposição de Buhari em buscar apoio na luta contra o Boko
Haram. Contudo, eventuais empecilhos surgem, como a recusa de Washington em vender armamentos à Nigéria
sob a alegação de que as leis e as Forças Armadas nigerianas estão aquém do compromisso com os Direitos
Humanos.
A Nigéria sofre debilidades econômicas e institucionais crônicas, como a corrupção, a vulnerabilidade aos
preços do petróleo, a dependência da importação de artefatos bélicos e a deficiente infraestrutura energética. É
necessário averiguar se o plano de desenvolver um complexo industrial de defesa e de transferir temporariamente
o centro de comando militar da capital para o norte do país serão iniciativas eficientes. Com a incidência do
Boko Haram e da pirataria no Golfo da Guiné, não apenas a estabilidade nacional, mas também regional, são
comprometidas. Desse modo, faz-se imperativa, portanto, a coordenação diplomática e militar conjunta dos
países da África Ocidental.

Oriente Médio e Norte da África


O impacto das guerras civis no Oriente Médio Por: André Nunes
Atualmente, um dos principais problemas do Oriente Médio são as guerras civis que afetam alguns dos
países da região, como a Síria, o Iraque, o Iêmen e a Líbia, cujos conflitos internos têm contribuído para a
desestabilização de seus entornos.
De acordo com os dados de 2014 da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), os conflitos dos
países acima referidos têm movimentado um grande número de refugiados: aproximadamente 16,5 milhões de
pessoas se deslocaram em busca de abrigo em países vizinhos e, até mesmo, fora da região. Na América Latina,
o Brasil é um dos principais destinos dos refugiados da Síria. Um estudo levantado pela ACNUR revelou que,
até outubro de 2014, o país já havia acolhido cerca de 1.524 refugiados sírios de um total de 7.289 pessoas
(aproximadamente 21%). Ainda, somente por via marítima, 137.000 refugiados chegaram à Europa neste ano,
dentre os quais 43.900 são sírios.
Outro impacto que pode ser atribuído às guerras civis no Oriente Médio é o surgimento de múltiplos
grupos terroristas que vinculam seus atos ao radicalismo religioso e que, assim, contribuem para o crescimento
da animosidade entre as populações de diferentes etnias e, igualmente, entre xiitas e sunitas.
Devido às guerras internas, os governos de alguns países da região têm recorrido à repressão para se
sustentarem no poder, enquanto outros grupos utilizam do mesmo artifício para poderem alcançá-lo. Caso não
haja solução para os conflitos internos de determinados Estados da região, a probabilidade de serem resolvidos
os problemas políticos, sociais e, principalmente, aqueles relacionados à segurança, é muito baixa.
Por fim, o repúdio aos crimes contra os Direitos Humanos, o combate ao terrorismo e, até mesmo, um
maior desenvolvimento econômico em alguns Estados locais seriam mais eficazes se as guerras civis deixassem
de ser um fato constante no Oriente Médio.

Europa
Nacionalismo catalão: a independência é uma opção? Por: Matheus Mendes
A Espanha possui como característica uma política regionalista, o que permite a existência de
comunidades autônomas que administram suas províncias. No entanto, há algumas regiões com interesses
separatistas, como o País Basco e a Catalunha. Vale apontar que esta última passará por eleições locais,
antecipadas para o dia 27 de setembro, a fim de formar um novo Parlamento e aumentar o interesse político
de um referendo para a independência catalã.

[5]
Nesse sentido, Artur Mas, presidente da Catalunha,
demanda do governo espanhol um referendo nos moldes do
que foi o escocês em setembro do ano passado. Por outro lado,
Mariano Rajoy, primeiro-ministro da Espanha, já rechaçou
essa possibilidade e alguns políticos do governo conservador
madrilenho justificaram a ilegalidade do processo pela
Constituição espanhola. A perda da Catalunha representaria
cerca de 20% do PIB espanhol, mas, ainda assim, o partido
do governo está mais preocupado com a ascensão do partido
de esquerda “Podemos”, que vem ganhando força mesmo
não tendo participado de nenhum processo eleitoral.
Embora as eleições de setembro não sejam de fato um Foto: Polgenow.com

referendo, pouco mais de 5 milhões de eleitores (de um total de 7,5 milhões de habitantes) podem outorgar
mais poder aos separatistas. Estes estão confiantes em conseguir uma “consulta popular” em até 18 meses
após as eleições locais, criando especulações em Madri. Mesmo que se consiga o processo de independência
junto à Espanha, este seria uma cisão dolorosa e demorada, pois fecharia portas tanto na União Europeia como
na OTAN, já que a Espanha, provavelmente, vetaria sua entrada em ambas. Além disso, internacionalmente,
países como Reino Unido, França e Alemanha tenderiam a não aprovar o processo, já que também possuem
movimentos internos independentistas, o que contribuiria para um clima de tensão generalizado no cenário
europeu e mundial.

Rússia e ex-URSS
Rússia e a imigração de muçulmanos frente às ameaças de terrorismo
Por: Daniel Araújo

À semelhança da Europa, a Rússia tem sido pressionada
a desenvolver formas de lidar com as imigrações de
muçulmanos do Oriente Médio. Isso porque tais ondas
migratórias recentemente têm se tornado uma questão de
segurança, devido a muitos grupos rebeldes disseminarem
suas ideologias por meio delas, podendo originar possíveis
núcleos jihadistas. Além disso, vale ressaltar que a Rússia
possui uma fronteira direta para acesso imigratório por
terra e tem regiões com quantidade populacional nativa de
Foto: Speroforum.com
muçulmanos.
A Duma, a Câmara baixa do Parlamento da Rússia, tem solicitado ao governo uma participação junto à
sociedade internacional para acelerar a abertura de um tribunal para apurar os crimes cometidos pelos grupos
rebeldes, que se reconhecem unificadamente como pertencentes ao Estado Islâmico (EI). Nesse sentido, uma das
cartas enviadas pelo parlamentar russo Oleg Nilov afirmava “o EI é uma organização criminosa que necessita
ser contida por todo o mundo civilizado, sendo a primeira grande ameaça desde o fim da Segunda Guerra
Mundial”.
De acordo com alguns analistas, o posicionamento da Rússia em relação ao EI tenderá a uma atuação
mais presente no Oriente Médio, possivelmente se refletindo em um fortalecimento das Forças Armadas da
Síria, promovendo treinamentos para conter os rebeldes associados àquele grupo em seu próprio território.
Outra possibilidade é o fortalecimento das forças de segurança nos territórios independentes do Curdistão
iraquiano, em que os Pershmega (curdos armados) têm lutado em diversas frentes contra os rebeldes associados
ao EI, no norte do Iraque. Tal análise é possível após leitura de declarações do próprio ministro das Relações
[6]
Exteriores da Federação russa, Sergey Lavrov, que comentou em abril: “o grupo rebelde ‘Estado Islâmico’ é o
principal inimigo da Rússia”.

Sul da Ásia
Talibã e Afeganistão: conversas sobre a paz em perigo? Por: Ariane Francisco
No Boletim 17 abordaram-se os atentados do Talibã no Afeganistão em junho e a retomada de áreas cujo
controle o grupo tinha perdido com a guerra de 2001. Nas últimas semanas, porém, a confirmação da morte de
um de seus líderes causou reviravolta dentro do grupo e nos termos das conversações de paz com o governo
de Cabul.
Por anos, a questão do paradeiro de Mulá Mohammad Omar tem sido discutida. Os rumores de que o
líder do Talibã estaria morto circulavam de tempos em tempos, com confirmações dos Estados Unidos e do
Afeganistão, mas negados pelo grupo. Dessa vez, porém, o próprio Talibã confirmou a notícia. A questão do
porquê o anúncio ter sido feito neste momento, quando conversas entre a milícia nacionalista e o Afeganistão
estavam se desenvolvendo, é que vem causando estranhamento, além de desestabilização na alta hierarquia do
grupo.
Tendo sido o principal grupo jihadista, hoje o Talibã afegão compete com o Estado Islâmico (EI). A falta
de uma unidade no alto-escalão do mesmo – Mulá Mansor, atual líder, não é visto como carismático e enfrenta
grande oposição do filho de Omar – poderia causar uma série de deserções, dando espaço para o Estado
Islâmico entrar no país. De acordo com o Asia Times, quanto maior for a permanência do governo de Ghani,
maiores são as chances do EI se sobrepujar ao Talibã. Após ganhar sua guerra contra o governo central e os
EUA (a retirada das tropas estrangeiras seria uma condição para a paz no país), o grupo passaria a enfrentar
outro conflito.
Em relação às conversações em si, depois de inicialmente informais, novas reuniões oficiais foram
acordadas para depois do fim do Ramadã, a fim de que uma maior confiança entre as partes seja construída.

Leste Asiático
O futuro do Yuan Por: Vinicius Reis
Durante a segunda semana de agosto, a moeda chinesa, o yuan, sofreu consecutivas desvalorizações,
gerando quedas nas bolsas ao redor do mundo. Países como o Brasil, que tem a China como principal parceiro
comercial e um modelo de exportação baseado em commodities, temem o impacto no curto e médio prazos da
desvalorização do yuan e da desaceleração da economia chinesa. A política macroeconômica de Pequim tem
despertado o receio de uma guerra cambial em âmbito global, principalmente entre economias emergentes, as
mais afetadas por um conflito econômico entre potências.
A atuação do Banco Popular da China (PBoC) pode ser analisada a partir de dois pontos de vistas não
excludentes: como indutor de crescimento econômico, via aumento da competitividade dos produtos chineses
em outros mercados, e/ou como um sintoma da reformulação do mercado chinês de maneira a reduzir,
gradativamente, o controle do Estado sobre o mesmo. Desde 2013, Xi Jinping vem estimulando reformas
econômicas - entre elas, a abertura gradativa da bolsa de Shangai para investidores estrangeiros - e já declarou
que pretende agir de maneira a construir um sistema monetário internacional estável.
Um dos principais objetivos dessas reformas é promover a inserção internacional da moeda chinesa.
Atualmente, o yuan é a quinta moeda de pagamento do mundo (2,17% do comércio internacional, contra 87%
do dólar norte-americano) e espera-se que, até 2018, a flexibilidade da taxa de câmbio aumente e que a moeda
passe a flutuar livremente, ou seja, de acordo com a oferta e procura. Caso as reformas se concretizem, a
moeda chinesa poderia passar a integrar a cesta de direitos especiais de saque (XDR ou SDR), gerida pelo FMI.
Seu valor é determinado pela variação média da taxa de câmbio dos cinco maiores exportadores do mundo
(excluindo a China) nos últimos cinco anos.

[7]
Leste Asiático
Século XXI: a continuidade da Guerra da Coreia por outros meios Por: Marcelle Torres
Em meio à celebração do 70º aniversário de libertação da Coreia após 35 anos de dominação colonial
japonesa, havia expectativa de retratação formal do Japão em relação às “mulheres de conforto” coreanas e à
disputa pela sucessão e controle do conglomerado nipo-sul-coreano Lotte Group. No entanto, destaca-se um
fato que poderá desencadear mais um período de tensão na região: a detonação de uma mina terrestre, ferindo
dois soldados sul-coreanos durante uma patrulha de rotina na Zona Desmilitarizada (DMZ).
A Coreia do Norte é acusada de ter cruzado a fronteira e implantado as minas em caixas de madeira
ao longo da DMZ. Em resposta, o Ministério da Defesa Nacional sul-coreano reiniciou as transmissões de
propaganda contra Pyongyang, suspensas há mais de 11 anos, e permitiu aos soldados o combate a qualquer
potencial ataque militar. Além disso, o período também coincide com o início do exercício militar anual Ulchi
Freedom Guardian, entre EUA e Coreia do Sul, a fim de testar os sistemas de defesa e o grau de prontidão no
caso de uma invasão norte-coreana. Pyongyang, por sua vez, ameaça retaliar os EUA, caso o exercício militar
aconteça.
A tensão pode acarretar um conflito na região prejudicial não só às Coreias, mas também à Rússia e
à China, que investem em projetos de infraestrutura na península e se recusam a aceitar a instalação de um
escudo antimísseis na Coreia do Sul, o qual aumentaria a influência norte-americana no Pacífico e ofereceria
cobertura às ações da 7ª Esquadra. Resta saber se as conversas exploratórias da Six Party Talks conseguirão
trazer Pyongyang de volta à mesa de negociações. O intuito seria o desmantelamento do seu programa nuclear
e o impedimento à especulação de um futuro lançamento de míssil de longo alcance norte-coreano, suspeito
de acontecer no mês de outubro durante a comemoração do 70º aniversário da fundação do Partido dos
Trabalhadores da Coreia.

Oceania e Sudeste Asiático


Da questão ambiental à política: desafios de Camberra Por:Thayná Fernandes
Devido à proximidade da Conferência Climática da ONU, prevista para ocorrer em dezembro deste ano
em Paris, muitos países se movimentam para realizar acordos entre si e reduzir a emissão de gases tóxicos. Para
que o aquecimento do planeta não supere os 2°C (meta acordada mundialmente), seria necessário que todos os
Estados parassem de emitir os gases causadores do efeito estufa.
A Austrália, contudo, parece não estar realmente tão entusiasmada em relação ao meio ambiente.
Recentemente, o primeiro-ministro australiano, Tony Abbot, cortou os investimentos que o governo faria na
indústria de energia eólica, alegando que os recursos devem ser empregados em assuntos mais urgentes. O
principal meio de produção energética australiana é o carvão. Com fatores naturais favoráveis à utilização de
energias renováveis, seria simples para a Austrália investir em uma política ambiental. Todavia, o país não
avança nessas discussões. Ao contrário, por exemplo, da China que, no ano passado, construiu infraestrutura
para gerar mais de 20 gigawatts (GW) de energia eólica e pretende alcançar 100 GW neste ano. Camberra
só precisaria construir, de 2020 a 2030, 1.4 GW para ter 50% de sua matriz energética composta por fontes
renováveis.
Essas questões ultrapassam a esfera ambiental, fluindo para as áreas da economia e da política. Em 2009,
uma pesquisa da Universidade de Harvard concluiu que a construção de uma rede mundial de energia eólica
seria suficiente para suprir as necessidades energéticas globais, apresentando-se como alternativa à extrema
dependência de petróleo. Contudo, essas energias renováveis ameaçam os países que mais lucram com exportação
e produção desse óleo. As dificuldades enfrentadas pelo governo Abbot, com 53% de desaprovação, são cada
vez maiores: além do retrocesso da economia do país, ataques à despreocupação quanto ao meio ambiente são
estratégicos para os partidos da oposição, que anseiam pelas eleições gerais, previstas para 2017.
[8]
Ártico e Antártica
O Ártico e o Atlântico na nova estratégia naval russa Por: Pedro Allemand
No dia 12 de agosto foram anunciados ajustes
Foto: Economist.com
à estratégia naval russa. As adaptações foram feitas
aproveitando mudanças em uma série de documentos
estratégicos que revisam o papel da estrutura de
segurança e defesa na política externa russa para os
próximos 5 a 15 anos. A principal justificativa para essa
revisão é a percepção, por parte da Federação Russa,
de uma intensificação na competição pelos recursos
dos oceanos do mundo, bem como a necessidade
de se adaptar a estratégia considerando as novas
condições globais, pensando a partir das restrições
socioeconômicas internas.
Dentre as alterações efetuadas, especialmente
relativas à estratégia naval, vale ressaltar a criação de novos vetores de política marítima, destacando
os polos dentro da estratégia naval russa e com ênfase renovada no Ártico e no Atlântico. Essa mudança,
à primeira vista pequena, deve ser lida em conjunto com o discurso que a justifica, bem como a partir dos
últimos movimentos russos com relação ao Ártico. Contextualizando esses três elementos, compreende-se a
importância vital da região para o futuro da segurança nacional e crescimento econômico do país. Também é
possível perceber, nessa reorientação da política naval, a aplicação das teorias do poder marítimo. O aumento
de presença em ambos os polos e a intenção de atuar no Atlântico demonstram um avanço da doutrina russa
quanto ao domínio de novas linhas de comunicação marítima, tais como as rotas de navegação do Ártico, ao
mesmo tempo em que amplia sua atuação nos canais já consolidados no tabuleiro estratégico global.
Além de todas essas questões, esse tipo de mudança ressalta também a necessidade de conhecer o
pensamento geopolítico e suas implicações práticas. A compreensão do cenário global atual é muito enriquecida
quando se compreendem os movimentos estratégicos dos Estados à luz de sua situação geopolítica e das ideias
dominantes no pensamento geoestratégico dos tomadores de decisão.

[9]
Temas Especiais
Disputas espaciais: os incômodos geopolíticos na “terra de ninguém”
Por: Louise Marie Hurel
Como diria o cientista da computação norte-americano David Aucsmith, após a terra, o mar e o céu, o
espaço representa o quarto domínio da guerra, seguido do espaço cibernético. Esses domínios simbolizam
tipos idealizados de espaços, onde ocorre o embate de forças e interesses. “Idealizados”, pois não é possível
separá-los tão claramente de suas conexões com a tecnologia, interesses geopolíticos, tensões em torno
da segurança internacional e entre outros diversos fatores: os domínios não são monolíticos, tampouco se
respaldam em monocausalidade. O desenvolvimento e a subsequente preponderância de um ou outro nas
disputas geopolíticas ocorrem, principalmente, devido ao aumento da capacidade de projeção que, nesse
caso, um país tem em um determinado domínio.
Será que abordar disputas espaciais se tornou um clichê datado? Falar sobre tensões no domínio
espacial significa reavivar um debate que “parou” com o fim da Guerra Fria? O contexto, desenvolvimento
tecnológico, rapidez na produção/reprodução e distribuição de poder no sistema internacional trazem uma
combinação diferente para a análise. Por exemplo, um dos desafios futuros para esse espaço, por muitos
chamado de “terra de ninguém”, é o lixo espacial. Satélites orbitam em altas velocidades, portanto, a forma
mais rápida e menos custosa de se desligar um satélite é lançando outro elemento.
Em um embate nebuloso, os Estados Unidos vêm sentindo as dificuldades vis- à -vis sua preponderância
no domínio espacial. Atores como China e Rússia são vistos como potenciais “spoilers” para a manutenção
da sensação de segurança e controle estadunidense sobre o espaço. Essa afirmação encontra respaldo na
mais recente declaração de que a China realizou testes utilizando armas cinéticas terrestres antissatélites.
Em suma, sem grandes convenções e acordos, a existência da “terra de ninguém”, desregulada,
apresenta uma ameaça aos EUA e um espaço aberto para muitos países que desejam desenvolver tecnologias.
O surgimento de grandes atores nesse domínio - como a China - continuará a incomodar.

Dicas de artigos selecionados


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Transcrição da Entrevista com Joseph Nye para o Programa Milênio - By: Lucas Mendes

• THE NATIONAL INTEREST - 17/08/2015


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El tren cubano que España y la UE no pueden perder - By: José Luis Barbería

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