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ANEXO F

PROCEDIMENTOS A SEREM ADOTADOS PELO TERAPEUTA


HÉLIO JOSÉ GUILHARDI1

Instituto de Terapia por Contingências de Reforçamento (ITCR)


Campinas - SP

Os supervisores devem orientar seus alunos-terapeutas para:

I. Elaboração do contrato de trabalho e normas gerais de atendimento


No primeiro contato que o terapeuta tiver com o cliente, devem ser feitos os
esclarecimentos sobre o funcionamento do processo terapêutico. O “contrato”, como é
comumente denominado, deve ser apresentado antes que o cliente apresente suas queixas,
pois há a possibilidade de haver discordâncias sobre os procedimentos a serem adotados. Se
elas não forem solucionadas, então a terapia não será iniciada.
Os comportamentos do terapeuta e informações específicas sobre as características dos
atendimentos estão detalhados no guia do Aluno-Terapeuta e no guia do Supervisor.
Observação: Em geral, este item é realizado na sessão de triagem, conduzida por
profissionais do ITCR especialmente orientados para tal atividade. Verifique
se a triagem foi feita, leia com cuidado as informações ali apresentadas.
Neste caso, apenas verifique com o cliente se as informações dadas na
triagem estão claras e se ele confirma a disposição de iniciar o tratamento
dentro das condições do contrato. Seja específico: pergunte se ele está ciente
de que as sessões serão gravadas e depois discutidas nos encontros de
supervisão etc. Se necessário, repita as informações. (Não parta do
pressuposto de que o cliente entendeu e continua de acordo com o que foi
combinado na sessão de triagem.)

II. Primeira sessão de terapia: queixa livre


Acertados todos os itens acima, o terapeuta deve anotar numa folha a identificação do
cliente (nome, idade), data e número da sessão. Inicia-se, então, a sessão propriamente dita.
É importante que o terapeuta faça anotações durante a sessão. Não há problemas em
anotar na presença do cliente, desde que o ritmo de escrever do terapeuta não atrapalhe o
ritmo de falar do cliente. O terapeuta deve apresentar um S D genérico (chamo de genérico
aquele SD que estabelece a ocasião para a emissão de qualquer classe de respostas verbais,
todas sendo consequenciadas com atenção, movimentos de aprovação, olhares etc.,
consequências supostamente com função de reforço positivo para o cliente) que propicie o
início das verbalizações do cliente. Possuem essa função de SD genérico frases do tipo:
— Por que você quer fazer terapia?
— O que o levou a nos procurar?
— O que tem acontecido com você?
— Fale-me sobre você. Etc.
Como se pode observar, o objetivo da apresentação de SD genérico é evocar uma
ampla gama de verbalizações (tactos, tactos distorcidos, intraverbais etc.) do cliente sobre
seus comportamentos, seus sentimentos e sobre o ambiente social e não social a que
respondeu no passado e ao qual responde atualmente. É desejável, no início, tentar evocar
uma variabilidade abrangente de relatos verbais do cliente, a partir da qual o terapeuta
poderá atuar, selecionando classes de relatos funcionalmente relevantes.

1 Em fevereiro/2009.
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Esquematicamente, o procedimento pode ser representado na forma da tríplice


contingência (lembre-se que cada elo influencia e é influenciado pelos demais, produzindo
uma interrelação entre os três e não uma determinação linear unidirecional):

A R C

Assim, por exemplo:


Antecedentes emitidos pelo terapeuta

A1. SD genérico do terapeuta: - Fale-me sobre o que o levou a procurar terapia (pausa).

Respostas emitidas pelo cliente

R1. Verbalizações do cliente evocadas por A1:


A. fala fluentemente e de forma espontânea.
B. fala pouco, faz longas pausas.

Consequências apresentadas pelo terapeuta

C1. Consequência social para a fala fluente e espontânea do cliente (R1A acima): acenar
com a cabeça, olhar para o cliente, emitir frases curtas ou palavras, tais como
“Entendo”, “Deve ter sido muito difícil para você...”, “Continue” etc. A função das
intervenções verbais é dupla: consequenciar (espera-se que tal consequência tenha
função reforçadora positiva) o que foi dito e fornecer S Ds genéricos adicionais para
que ele fale mais, sem, no entanto, direcionar nenhum tema. O objetivo é mantê-lo
falando fluentemente, sem se preocupar com reforçamento diferencial de qualquer
classe de verbalizações que o cliente faça sobre sua vida.

Observação: embora não caiba ao terapeuta, neste início, conduzir o conteúdo


específico da sessão, não deve, por outro lado, acatar qualquer tema
vindo do cliente. Assim, se ele se estender por assuntos outros que não
sobre sua vida (por ex., sobre os problemas do trânsito, a última partida
de futebol de seu time etc.), aponte isso para ele e o reconduza ao tema
de interesse da terapia (“Bem, vamos falar sobre o que trouxe você
aqui...”); ou relacione os relatos que ele traz com as dificuldades que ele
apresenta (por ex., falar sobre problemas de trânsito pode ser indicativo
de fobias, inseguranças etc.; falar sobre futebol pode ser uma esquiva de
iniciar uma conversa sobre as principais dificuldades que o trouxeram à
terapia. Mas essas possibilidades devem ser mais bem identificadas pelo
terapeuta e, só então, apontadas para o cliente).

C2. Consequência social para períodos de silêncio ou de falas com pausas longas do
cliente (R1B acima): acenar com a cabeça, olhar para o cliente, emitir verbalizações,
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tais como: “Deve ser difícil para você falar sobre sua vida”; “Fale-me sobre outras
coisas”; “Vamos ver: quantas irmãs você tem?”; “O que fazia seu pai?”. Tais
verbalizações têm a função de operação estabelecedora – tornar a relação terapêutica
mais acolhedora – e de aumentar a probabilidade de emissão de verbalizações,
quaisquer que sejam, que permitam ao terapeuta consequenciá-las com reforços
generalizados. Se for o caso, o terapeuta pode usar algum inventário, questionário,
roteiro de história de vida etc., com o objetivo de oferecer alguns S Ds para o cliente
incrementar suas verbalizações. O silêncio não deve ser constrangedor para o cliente;
para isso o terapeuta deve auxiliá-lo, fazendo um fading in de questões e comentários
em direção às dificuldades do cliente. Assim, se o terapeuta tem indícios de que as
dificuldades do cliente são de natureza social, pode conduzir o questionamento mais
ou menos assim: “Fale-me sobre o que você fez neste último fim de semana”; “Você
costuma ligar para alguém no fim de semana?”; “Se você tivesse um amigo bem
próximo, em quem você confiasse, que programa você faria com ele?”; “Você torce
para que algum conhecido seu – colega de classe, por exemplo – ligue para convidá-lo
para fazerem alguma coisa juntos?”; “O que você pensa sobre atividades em grupo?”;
“Como você se sentiu passando sozinho o fim de semana?”; “Você acha que tem
dificuldades de relacionamento social?” etc. Tais questões devem ser consideradas
como meros exemplos; não estão listadas numa hierarquia, como seria de se esperar
em um procedimento de fading in. O que mais importa é que a relação entre o
terapeuta e o cliente deve ir produzindo informações e, se o cliente se mantém
retraído ou em silêncio, cabe ao terapeuta liderar a interação, isto é, prover SDs que
aumentem a probabilidade de emissão de comportamentos dele.

Os relatos do cliente exercem um controle sobre o terapeuta e evocam novas questões


ou comentários. O ponto crucial é que o terapeuta não deve se afastar do objetivo de
introduzir e manter em pauta no diálogo a dificuldade do cliente, mas, ao mesmo tempo,
deve ser sensível às reações do cliente e não tornar a condução do tema aversiva, a ponto
de produzir respostas de fuga-esquiva dele. Não acelere desnecessariamente o processo.
Ou seja, o terapeuta pode até mesmo não fazer, inicialmente, nenhuma pergunta
diretamente relacionada com as dificuldades específicas do cliente, se houver evidências
de que falar sobre elas é muito aversivo. Haverá o momento apropriado para introduzir o
tema, com certeza, quando a relação entre terapeuta e cliente estiver reforçadora para
ambos. A função das intervenções verbais é dupla: consequenciar (espera-se que tal
consequência tenha função reforçadora positiva) o que foi dito e fornecer SDs específicos
que aumentem a probabilidade de emissão de verbalizações, usando fading in;
direcionando, portanto, o tema. O terapeuta deve se deixar modelar pelo cliente,
apresentando novos SDs, relacionados e consequentes às verbalizações mais pertinentes
emitidas pelo cliente. Chamo de pertinentes e apropriadas aquelas verbalizações que têm
função de tactos verbais sobre as dificuldades comportamentais e afetivas do cliente.
Chamo de pertinentes (não necessariamente apropriadas) as verbalizações intraverbais
sobre as dificuldades comportamentais e afetivas dele. Chamo, finalmente, de pertinentes
as verbalizações com função de fuga-esquiva das dificuldades comportamentais e
afetivas. Todas as três classes de verbalizações têm função de SDs para o terapeuta
direcionar a investigação e a intervenção nas classes comportamentais de interesse.
Apenas a maneira de conduzir a sessão irá variar. É extremamente importante que o
terapeuta seja sensível às consequências produzidas no cliente pelas intervenções que
fez. Ser sensível às reações dos clientes, produzidas pelas intervenções terapêuticas, é a
essência do sucesso da interação entre ambos. O terapeuta deve, o tempo todo, se manter
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questionando suas intervenções: “O que meus comentários (ou questões) produziram no


cliente?”; “Ele forneceu mais informações a partir de minhas perguntas?”; “Ele
concordou com o que eu disse?”. Ou, por outro lado: “O cliente discordou de meus
comentários?”; “Ele desviou o assunto para outro tópico?”; “Ele me puniu de alguma
forma?” Em suma, o cliente consequencia os comportamentos do terapeuta, de modo a
modelar os comportamentos deste. O terapeuta deve ser sensível às consequências
emanadas do cliente e se deixar modelar por ele, desde que o controle do cliente não
desvie o terapeuta dos objetivos terapêuticos e não caracterize uma relação de
contracontrole por parte do cliente para, desta maneira, se esquivar ou fugir da
investigação e da análise do terapeuta. Deixar-se modelar pelo cliente não significa ficar
sob controle do cliente. Na primeira situação, o terapeuta é sensível às consequências
diferenciadas emitidas pelo cliente; na segunda, o terapeuta é inassertivo ou inconsciente
dos controles manejados pelo cliente. Finalmente, se o cliente está fortemente engajado
em comportamentos de fuga-esquiva, cabe ao terapeuta se questionar sobre o
procedimento que vem adotando: está exigindo discriminações muito sutis? Está pulando
elos no processo de modelagem de respostas? Está introduzindo eventos muito aversivos
prematuramente? etc. Não se pode perder de vista que o objetivo é, no início, aumentar a
verbalização sobre qualquer tema relacionado com a vida do cliente, tendo claro, porém,
que progressivamente os temas devem se restringir aos clinicamente relevantes. É um
processo de modelagem com uma característica muito peculiar: o terapeuta faz a
modelagem, embora sob controle daquilo que é clinicamente relevante para o cliente, e
não sob controle das preferências do terapeuta. O comportamento a ser modelado não é
escolhido de forma arbitrária, como num experimento, mas é determinado pela relevância
social e terapêutica que o comportamento a ser modelado tem para o cliente. Com a
sequência das sessões, é de se esperar que o terapeuta, progressivamente, reduza as deixas
que evocam as verbalizações do cliente, ou seja, faça um fading out de sua ajuda para
produzir relatos do cliente.

Observação: no início do processo terapêutico, o terapeuta pode ser tolerante para lidar
com outros temas que não tenham a ver diretamente com as dificuldades do
cliente, pois há necessidade de privilegiar o repertório de falar do cliente
(deve-se respeitar seus operantes verbais livres), antes de atuar com
contingências diferenciais para produzir verbalizações com conteúdo
específico de interesse da terapia.

Pode-se notar, pelos exemplos citados, que as consequências fornecidas pelo terapeuta
incluem comentários e questões que funcionam, adicionalmente, como eventos
antecedentes para evocar novos comportamentos do cliente. A interação entre terapeuta e
cliente é, então, um fluxo de comportamentos emitidos por ambos, que se influenciam
reciprocamente sem que se possa afirmar que o fluxo é composto por unidades
moleculares. Qualquer divisão que o terapeuta proponha na sequência de comportamentos
é arbitrária, uma vez que aquilo que ele chama de consequente ao comportamento pode
ser mais propriamente denominado, pela sua importância funcional, de antecedente do
comportamento por vir, por exemplo. A divisão do encadeamento comportamental,
embora reconhecidamente arbitrária, deve ser útil para a compreensão das dificuldades do
cliente e para evocar procedimentos de intervenção que o ajudem. Ou seja, a
arbitrariedade deve ser funcional, de acordo com os objetivos terapêuticos. Se não for
assim, o exercício de elaborar as unidades de análise (contingências de reforçamento
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explícitas), feito pelo terapeuta, só atenderá aos seus interesses intelectuais, o que muito
poderá satisfazê-lo, mas não terá utilidade para o cliente.
O terapeuta deve desenvolver repertórios de interromper – se necessário – a fala do
cliente, de modo a permitir intervenções nos momentos em que o primeiro achar
relevante. O procedimento consiste em interromper com frases do tipo “Isso me parece
tão importante, que eu gostaria de dizer-lhe que...”. Se necessário, o terapeuta deve fazer
movimentos corporais, deslocar-se, movendo-se mais para a frente na cadeira, erguer um
pouco o braço, como que pedindo licença para falar. E, o mais importante, falar.
O terapeuta deve também instalar no cliente o comportamento de ouvir o que ele tem
para lhe dizer. Ou seja, o cliente deve aprender a ficar sob controle das verbalizações do
terapeuta. A única evidência que o terapeuta tem de que foi ouvido é o próprio
comportamento do cliente após a fala do terapeuta. O que foi dito ao cliente controla seu
comportamento subsequente? Ele responde às questões do terapeuta? Ele concorda ou
discorda explicitamente com o que foi dito? Faz perguntas relacionadas ao que lhe foi
exposto? etc. Se o cliente, após a fala do terapeuta, prosseguir sua narrativa, sem nenhuma
relação com o que lhe foi dito, essa falha deve ser apontada diretamente: “Interessante,
você não fez nenhuma referência ao que acabei de lhe dizer... Você notou isso? Você já
notou se é um padrão usual seu não responder diretamente aos comentários dos outros? O
que observei aqui comigo ocorre também na sua interação com outras pessoas?” etc. O
objetivo dessa forma de intervenção é fornecer para o cliente um S D para ele observar seu
próprio comportamento (de ouvir o outro, neste caso). É o primeiro passo na direção de
instalar o comportamento de ouvir. Não há necessidade de ir além neste momento. O
objetivo não é punir o cliente (embora se esteja correndo esse risco), mas fornecer-lhe S D
que controle o comportamento de ficar sob controle do (isto é, de observar) próprio
comportamento que emitiu.

Observação: os procedimentos descritos acima não se limitam, deve ficar claro, apenas à
primeira sessão. De modo geral, aplicam-se a todo o processo terapêutico.

III. Encerramento da sessão


O terapeuta deve dar um SD bem claro para o cliente de que a sessão está chegando ao fim.
Diga-lhe, por exemplo: “Bem, estamos chegando ao fim do nosso tempo por hoje. Você
não gostaria de concluir? Eu também tenho algumas coisas para dizer”. A sinalização do
fim da sessão deve prever tempo suficiente para:

1. O cliente concluir o item sobre o qual estava falando.


Se o cliente disser “Gostaria de acrescentar mais uma preocupação...”, o terapeuta
deve ser claro: “Tudo bem, porém vamos deixar esse novo tema para a próxima
sessão”. É função do terapeuta instalar o repertório adequado no cliente de:
a. verbalizar durante o tempo funcional da sessão e não se estender além do permitido.
O procedimento consiste em sinalizar o fim da sessão e interrompê-la sem hesitação.
Se necessário, o terapeuta deve levantar-se. É importante, porém, usar um ritmo
equilibrado para isso, ou seja, prever tempo para manejar aspectos importantes que
estejam ocorrendo durante a sessão (por exemplo: choro do cliente, evitar
interrupção prematura do desfecho de um episódio importante etc.);
b. hierarquizar o que é mais relevante para ser dito e utilizar o momento da sessão
mais apropriado para falar sobre tal tema. Deixar um assunto crítico para o final da
sessão pode ser um comportamento de fuga-esquiva, que não deve ser reforçado. O
terapeuta deve analisar esta possibilidade com o cliente na sessão seguinte. O
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procedimento consiste em só discutir aquilo que é dito no tempo funcional da


sessão, sem fazer concessões por causa da importância do tema. Ou seja, mesmo que
se trate de um tema grave e importante, se for proposto no final da sessão, sem
tempo hábil para discuti-lo, ficará para a sessão seguinte. Pode ser dito: “Que pena
que um assunto tão importante só surgiu agora. Mas teremos oportunidade de
analisá-lo na próxima semana”. (É preferível interromper o cliente antes que comece
a narrar o novo tema.)

Observação: ocasionalmente, o cliente traz para a sessão um tema extremamente


relevante e que exige um tempo maior que a duração usual da sessão
(note que o cliente, desde o início da sessão, apresenta suas dificuldades;
não se esquiva de abordá-las). Nesta condição, o terapeuta deve priorizar
as necessidades do cliente e prolongar a sessão ou propor que ele retorne
para uma nova sessão no final do expediente ou o mais breve possível.

2. O terapeuta fazer uma análise do que ocorreu na sessão.


O terapeuta deve fazer comentários que tenham função reforçadora (embora isso só
possa ser demonstrado empiricamente), a fim de aumentar a probabilidade de manter o
cliente verbalizando na próxima sessão e facilitar o estabelecimento do vínculo. O
terapeuta deve ser perspicaz, de maneira a detectar comportamentos que podem ser
valorizados, destacados, elogiados, de maneira justa e moderada. O objetivo é
estabelecer, entre os protagonistas do processo terapêutico, relações de reforçamento
positivo. Desta forma, comportamentos desejados serão fortalecidos, e sentimentos de
bem-estar, satisfação serão despertados no cliente. O reforçamento positivo tem uma
terceira função: a de operação estabelecedora. Uma pessoa que tem comportamentos
reforçados positivamente passa a responder a aspectos do ambiente aos quais não vinha
respondendo (fica sob controle de maior número de SDs e sensível a maior número de
SR+s, ou seja, ocorre uma importante mudança nas funções de estímulos até então já
disponíveis no contexto), ampliando a variabilidade comportamental e aumentando a
probabilidade de produzir reforços positivos adicionais. Ao mesmo tempo, o terapeuta
deve também ser perspicaz para detectar os sentimentos adversos do cliente, os excessos
e déficits comportamentais e a não emissão de comportamentos apropriados para
produzir reforços positivos, que tornam a vida do cliente aversiva. Como o terapeuta
pode ajudar o cliente a mudar as contingências adversas, de tal maneira que padrões
comportamentais inadequados ou ineficientes, que vem emitindo, sejam enfraquecidos e
passem a ser emitidos comportamentos funcionalmente apropriados que eliminam
consequências aversivas (e, assim, produzam sentimentos de alívio) ou produzem
consequências reforçadoras positivas (e, assim, dão origem a sentimentos de bem-estar)?
Quando as circunstâncias naturais do cotidiano do cliente não permitem a instalação e
manutenção de comportamentos reforçados positivamente, o terapeuta deve intervir,
oferecendo ao cliente a possibilidade e a esperança de ser reforçado negativamente, o
que envolve uma ampliação de comportamentos de fuga-esquiva e de contracontrole
(preferencialmente) e sentimentos de alívio. Tanto o reforçamento positivo, como o
negativo providos pelo terapeuta, contribuem ativamente para fortalecer a relação
terapeuta-cliente. Fala-se que o vínculo melhora.
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Observação: propomos que comportamento de fuga-esquiva é aquele que pospõe, alivia


ou remove um evento aversivo (é mantido, portanto, por reforçamento
negativo), mas não elimina a contingência coercitiva; comportamento de
contracontrole é aquele que remove a contingência coercitiva de modo
definitivo (é, portanto, reforçado negativamente).

O terapeuta deve também apresentar para o cliente alguma sistematização dos dados que
aconteceram na sessão. São exemplos de sistematização: “Pelo que você me falou, as
coisas nunca foram fáceis na sua vida”; “Você teve que lutar por tudo que conseguiu”;
“Pelo seu relato, nunca lhe deram liberdade para você fazer o que queria”; “Fica
evidente, pelo que ouvi, que a tristeza tem sido sua companheira” etc. É claro que, neste
momento da terapia, tais sistematizações podem ser incipientes, ainda muito genéricas,
mas serão retocadas com a evolução do processo terapêutico.
Finalmente, se os dados permitirem, deve-se apresentar para o cliente a descrição de
alguma contingência em operação na vida dele: “Você notou que esse sentimento
horrível que você relatou sempre apareceu quando surgiu uma ameaça de que algo ruim
poderia lhe acontecer e você não podia fazer nada para evitá-lo? Esse sentimento se
chama ansiedade”. É muito importante, inclusive, desenhar o paradigma (da ansiedade,
no exemplo) num papel, para o cliente compreender e visualizar claramente o que lhe
está sendo explicado.

IV. Folha de registro das dificuldades comportamentais e afetivas relatadas pelo cliente

O objetivo do preenchimento desta folha é registrar as informações que o cliente trouxe


sobre suas dificuldades comportamentais e afetivas, sem nenhuma sistematização, nem
elaboração feita pelo terapeuta. Assim:
a) Liste as dificuldades comportamentais conforme relatadas pelo cliente;
b) Registre as próprias palavras que ele usou e indique isso colocando as frases entre
aspas;
c) Liste, da mesma maneira, as dificuldades do cliente relatadas por pessoas significativas
do ambiente social dele (indique quem apresentou as dificuldades: pai, mãe, esposa
etc.)
d) Acrescente na lista quaisquer novas dificuldades que surjam nas sessões sucessivas,
indicando a data e a sessão. Assim sendo, a lista é uma relação dinâmica em constante
ampliação.
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Seguem-se algumas frases literais de clientes, que servem como exemplos:


“Tenho medo do medo.” (C 24 anos).
“Corro, corro e não presto atenção em mim.” (C 48 anos).
“Tenho dificuldade de relacionamento afetivo. Trabalho a conquista e aí vai bem. Depois
que a pessoa se apaixona perco o interesse.” (C 38 anos).
“Sempre tive sensação de baixa auto-estima. Compensava sendo muito amoroso e hábil
sexualmente.” (C 38 anos).
“Sempre tive falta de foco. Uma dispersão bastante forte”. (C 48 anos).
“Queremos falar do nosso irmão adotivo. Ele é muito agressivo com nossos pais. O
psicólogo dele disse que das nove depressões que existem... É isso mesmo? Ele disse
que ele tem sete dessas nove.” (Irmã de um rapaz de 15 anos).
“Começa aquela ruindade na minha cabeça. Vem uma coisa ruim; briga interna: eu comigo
mesmo.” (C 46 anos).
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FOLHA DE REGISTRO 1

Dificuldades comportamentais e afetivas relatadas pelo cliente (ou por pessoas


significativas do seu contexto social)

Data/ Verbalizações do cliente


Sessão

V. Folha de registro das dificuldades comportamentais e afetivas detectadas pelo


terapeuta e não apresentadas como queixas pelo cliente
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O objetivo do preenchimento desta folha é complementar os conhecimentos que o cliente


tem de suas dificuldades. Ele raramente discrimina todos os seus problemas. Em geral, detém-
se naquilo que lhe é mais aversivo, ou naquilo que provoca na comunidade que o cerca
reações que lhe são aversivas, mesmo que ele próprio não considere inadequados os
comportamentos que emite. É comum também o cliente relatar aquelas dificuldades que
considera “aceitáveis” pelo ouvinte e evitar falar sobre outras dificuldades, às vezes mais
fundamentais, a fim de evitar possíveis críticas ou avaliações depreciativas vindas do outro. O
terapeuta deve ir além das queixas explicitadas pelo cliente e detectar dificuldades que ele não
declara diretamente como parte dos seus problemas. Em seguida, o terapeuta deve expor o
cliente àquilo que ele discriminou, usando para tal um procedimento de fading in, uma vez
que tornar o cliente cônscio de novas funções de algumas circunstâncias de sua vida pode lhe
ser muito aversivo. Assim, por exemplo, uma cliente com 18 anos narra da seguinte maneira
um padrão típico de comportamentos da mãe: “Minha mãe é muito sensível e afetiva. Ela é
muito preocupada com a segurança, minha e de meu irmão. Sempre que saímos à noite (nos
fins de semana), ela não dorme enquanto não chegamos. Chora muito quando nos vê nos
preparando para o programa. Em geral, eu desisto de sair. Se for possível, trago uma ou mais
amigas para minha casa. Estou ficando um peso para elas ou me desligando do mundo jovem.
Minha mãe, coitada, insiste que gostaria que eu levasse uma vida normal. É mais forte que
ela, porém! Sei que morre pelos filhos e deixa de lado a vida dela para viver a nossa. Ela
nunca sai de casa para se divertir. Embora adore as amigas (não são muitas, é verdade) tem
quase nenhuma convivência com elas.” Tal frase, devidamente contextualizada, pode revelar
diferentes funções do comportamento da mãe. Veja algumas possibilidades:

1. A mãe quer o melhor para os filhos e se esforça para dar-lhes liberdade. Preocupa-se,
porém, com os perigos reais que rondam o circuito noturno e por excesso de amor (as
mães das colegas são, portanto, menos alertas com a segurança das próprias filhas), sofre
por eles. A mãe é muito sensível e precisa ser compreendida.

Comentário: Provavelmente, esta é a hipótese adotada pela cliente. Se ela acatar os


pedidos da mãe, será reforçada positivamente por ela. Por outro lado, a cliente perderá
importante reforçadores positivos, que lhe seriam acessíveis se fizesse o programa. Tal
condição lhe será aversiva e despertará sentimentos adversos (raiva, frustração, tristeza
etc.). Se a cliente resistir aos apelos da mãe, fizer seus programas e a deixar sozinha,
provavelmente, se sentirá ansiosa, culpada pelo sofrimento que causou na mãe, impotente
para mudar a situação, com pena pela dor que produziu etc.

2. A mãe tem déficits de comportamentos sociais. Como resultado, as atividades sociais em


geral e as dos filhos, em particular, têm para ela função aversiva. Paralelamente, a
presença dos filhos em casa a reforça negativamente (a poupa da solidão dentro do lar). A
filha interpreta que a mãe os quer por perto por amor, tem cuidados com a segurança etc.

Comentário: A filha poderá confundir repertório de comportamentos sociais (o que a mãe


não tem) com habilidade social (o que a mãe apresenta). Assim, a cliente tenderá a
discordar desta interpretação do terapeuta. Relatará como argumento em favor da mãe que
esta se dá bem com as pessoas (“mamãe sempre é amável e atenciosa com pessoas
conhecidas quando as encontra na rua...”). O fato de ser “amável e atenciosa” não
significa que gosta de estar na companhia das pessoas e de se engajar em atividades fora
do lar, nas quais predominam outras pessoas e não os familiares mais íntimos. A mãe
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apresenta um fenótipo comportamental que simula repertório social, nas situações


cotidianas em que ocorrem encontros sociais triviais, mas está sob controle das
consequências aversivas de se afastar das pessoas e não das consequências reforçadoras
positivas provenientes delas.

3. A mãe é fóbica e tem inúmeras inseguranças e medos desproporcionais. Quando os filhos


estão fora de casa, apresenta pensamentos ruminativos de que serão raptados, sofrerão
danos físicos etc., acompanhados de imagens de acidentes, violência sexual etc. A mãe
não revela tais dificuldades para os familiares. É reforçada negativamente pela presença
dos filhos em casa: pensamentos e imagens se amenizam e a ansiedade dela diminui.

Comentário: Há alguma função importante – a ser identificada – para a mãe ocultar suas
fobias, pensamentos e imagens carregados de aversividade. Talvez ela esteja obtendo
reforçadores positivos por se mostrar sensível, amorosa etc. Além disso, os
comportamentos de fuga-esquiva que vem emitindo estão sendo mantidos por
reforçamento negativo, cada vez que a filha renuncia ao programa com as amigas.
Acrescente-se que declarar suas dificuldades levaria a família, provavelmente, a
encaminhá-la para um tratamento (comportamental, de preferência!) e as interações
intrafamiliares se realinhariam, produzindo, em curto prazo, novas condições aversivas
para a mãe. A insensibilidade da mãe em relação às perdas sociais e afetivas, que seus
comportamentos impõem à filha, fica oculta atrás da imagem de mãe amorosa. A mãe fica
mais sob controle das consequências reforçadoras negativas (remoção dos aversivos)
imediatas que seu repertório comportamental produz, do que das consequências aversivas
que produz na filha (que, eventualmente, poderão vir a afetar a mãe, mas apenas em longo
prazo).

É delicado para o terapeuta mostrar para a cliente qualquer uma das alternativas que
podem revelar uma mãe que não se comporta da maneira como o faz por amor e sensibilidade.
O terapeuta terá, de alguma forma, de mostrar à cliente que a mãe modelou nela
comportamentos de coadjuvante ou cúmplice da modelagem e manutenção dos
comportamentos inadequados dela. (É oportuno lembrar neste ponto o comentário de Skinner:
“não precisamos descrever as contingências de reforçamento para sermos afetados por elas.”
1974, p. 127.) O terapeuta só deve explicitar as funções dos comportamentos dá mãe quando
tiver dados comportamentais para apoiar sua análise. De preferência, deve envolver a cliente
na busca das relações funcionais fundamentais, de tal maneira que o comportamento do
cliente fique sob controle das contingências de reforçamento que mantêm o comportamento
atual da mãe, dos déficits ou excessos comportamentais dela e das análises do terapeuta.

A falha está nos filhos, que devem se sentir culpados pelo que produzem na mãe? Ou
está na mãe que: usa critérios e procedimentos inadequados para controlá-los; ou
exige desempenhos poucos razoáveis para o estágio de desenvolvimento dos filhos?
Outra questão: não estará a mãe exagerando (e tendo ganhos secundários com isso)
na expressão do seu sentimento “causado pelos filhos”?

Os comentários do terapeuta devem prover uma contribuição construtiva para o


desenvolvimento da relação de ambos, sempre que possível. A filha deve discriminar as
contingências manejadas pela mãe; como ela própria vem respondendo a tais contingências e
quais novos comportamentos precisam ser modelados nela, que lhe permitam fugir ou se
esquivar dos controles aversivos da mãe ou contracontrolar os comportamentos dela, de tal
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maneira que ambas obtenham, dentro do possível, mais reforçadores positivos e menos
reforçadores negativos provindos de outrem.
É importante salientar que, em todas as alternativas apresentadas (e poderiam ser
sugeridas outras), a cliente, enquanto participa de tal manejo de consequências feito pela mãe,
pode estar completamente inconsciente dos controles comportamentais aos quais responde. (É
importante salientar que os comportamentos da mãe e as contingências às quais ela submeteu
a filha, podem ter sido igualmente inconscientes para ela.) Assim, a cliente (adulta) pode
relatar: “Eu e meus irmãos fizemos minha mãe sofrer muito. Isso me dói”. “Meu pai não dava
amor para minha mãe, não tinha tempo para ela. Eu compreendo algumas atitudes que ela
acabou tendo...” etc.

FOLHA DE REGISTRO 2

Dificuldades comportamentais e afetivas detectadas pelo terapeuta


e não relatadas pelo cliente

Data/ Verbalizações do cliente


Sessão

Obs: a presente folha de registro deve ser preenchida progressivamente, no correr das sessões, quando
surgem relatos ou evidências comportamentais pertinentes.

VI. Registro dos comportamentos-problema relatados pelo cliente ou detectados


pelo terapeuta (ou por pessoas significativas do contexto social do cliente)

O objetivo do registro a ser detalhado abaixo é sistematizar as informações trazidas pelo


cliente, agrupando as dificuldades comportamentais e afetivas funcionalmente equivalentes,
de tal forma que seja possível compor classes de comportamentos-problema. Assim sendo, a
elaboração das classes de comportamentos-problema é uma atividade do terapeuta, que
envolve análise dos relatos e observações sucessivas e acumuladas – basicamente cabe a ele
sistematizar conjuntos de informações na forma da tríplice contingência – e síntese dos
conjuntos analisados, compondo unidades de contingências mais abrangentes, que revelam a
inter-relação de unidades menores de contingências. Numa linguagem mais informal, a síntese
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comportamental mostra como a pessoa vem funcionando (comportamentalmente) na vida


cotidiana em todos os níveis: social, profissional, afetivo, de lazer etc.

1. Agrupe as dificuldades relatadas pelo cliente e as observadas pelo terapeuta, de acordo


com o critério da função que os comportamentos do cliente têm. Por exemplo: “Sinto-me
muito mal quando tenho que dizer ‘não’ para uma pessoa” pode pertencer à mesma classe
comportamental funcional que “Tenho tido problema de insônia, desde que assumi um
projeto de muita responsabilidade no meu trabalho.” Da mesma forma, “Tenho sentido um
vazio desde que deixei de ir frequentemente ao cinema, depois que me mudei de cidade”
pode ser funcionalmente equivalente a “Comecei a me sentir deprimido desde que sofri
uma torção no joelho e deixei de praticar corrida, minha atividade esportiva favorita”.

2. Contextualize as dificuldades do cliente indicando antecedentes e consequentes. Por


exemplo:

Antecedente Resposta Consequente

I. Alguém solicita Cliente tem dificuldades Cliente supõe que será


alguma coisa e isso para dizer “não”. criticado, menos
não agrada ao cliente. querido... se disser “não”.

II.“Queremos que você “Desde que recebi essa “Preocupo-me se serei


assuma o projeto que incumbência fiquei feliz, capaz de fazer o trabalho
acabamos de ganhar na mas ao mesmo tempo com bom nível; não sei
concorrência” apavorado. E se eu não der se não vou decepcionar
conta... Não consigo mais meus chefes; hesito em
dormir e meu rendimento dar umas ‘duras’ na
caiu. equipe”...

Note que no exemplo I, na redação das colunas, foi usada a linguagem do terapeuta.
Toda a elaboração foi feita por ele, sistematizando informações dadas pelo cliente. No
exemplo II, a redação reproduziu as verbalizações do cliente. É desejável alcançar o nível
de fidelidade expresso no exemplo II, mas o exemplo I também é aceitável, desde que o
terapeuta seja capaz de apontar a fonte de informação em que se baseou.
A categorização que o terapeuta faz das dificuldades do cliente é um processo
dinâmico, ou seja, o terapeuta propôs que as duas dificuldades pertenciam à mesma classe
funcional de comportamentos sob controle de determinadas funções de estímulos, da
mesma forma que outro terapeuta poderia colocar as mesmas duas dificuldades em classes
funcionais distintas. Assim, este último poderia classificar o exemplo I como déficit de
habilidades sociais e o exemplo II como dificuldades com o sono. Por quê? Porque os dois
terapeutas estariam respondendo a diferentes aspectos do contexto, isto é, estariam sob
diferentes controles de estímulos. A consequência prática destas diferenças é que cada
terapeuta conduziria o processo terapêutico de forma diferente para lidar com o problema
do sono: o primeiro daria ênfase ao desenvolvimento de habilidades sociais
(“assertividade”, usando um termo pouco apropriado, mas muito usado), englobando os
dois problemas como exemplos de um déficit básico, único, comum a ambos; o segundo,
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provavelmente, solicitaria a avaliação de um médico para as dificuldades com o sono, por


exemplo. Enquanto os terapeutas continuarem suas interações com o cliente, novos dados
serão observados e os terapeutas responderão a eles diferencialmente, de tal maneira que
poderão mudar a categorização comportamental preliminar que fizeram das dificuldades
do cliente. (Os terapeutas estarão respondendo a um novo controle de estímulos). Conclui-
se que as classes funcionais sugeridas pelo terapeuta não são estáticas, nem imutáveis;
alteram-se como resultado das influências recíprocas entre terapeuta e cliente. O terapeuta
deve ser sensível às novas informações e incorporá-las na análise que faz do caso. Deve,
em suma, ter seu comportamento menos governado por regras e mais selecionado pelas
consequências advindas do cliente.

3. Indique os paradigmas, que descrevem conceitos e procedimentos comportamentais, mais


apropriados para indicar os déficits e excessos comportamentais do cliente. Assim, diante
de um relato do cliente sobre um convite que recebeu para ir a uma festa, podem ser
elaborados vários paradigmas, como os que se seguem:

I. SD social R social Sr+

João, vamos à Claro! Você acha Curte com os amigos


balada no que vou perder a balada, fica com Aninha
Green’s? essa? Já combinei etc.
com Aninha...

II. SD social R social Consequências sociais

João, vamos à 1. Claro! Vamos curtir Extinção: ninguém comenta


balada hoje? com a turma (R verbal) a ausência; colegas não o
procuram nos dias seguintes;
ocorre um encontro casual e
ninguém toca no assunto

2. Não aparece e nem Punição+: os colegas comentam


justifica que João só dá “furos”; colega diz
que não vai mais convidá-lo para
nada

Punição-: os colegas deixam de


convidá-lo para outros eventos
do grupo; comentam da próxima
balada perto dele e não o
envolvem no programa

Nestes exemplos, o terapeuta e o cliente concordam com a elaboração dos paradigmas


que descrevem as contingências de reforçamento em operação. Porém,
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III. SD social R social (pública) Sr+

A. João, vamos à 1. Claro! Não vou Os amigos “curtem” a


balada? perder essa... presença de João, bebem,
(R verbal) conversam, ouvem músicas
etc.

S pré-av social R “social” (encoberta) Sav

B. João, vamos à 2. Que saco! Detesto Não gosto deste tipo de


Balada? baladas, não sei música (me atordoa);
o que fazer lá! nenhuma menina me
Sinto-me excluído pelas paquera; sei que sou
garotas (pensamentos e “feio”; não sei dançar...
imagens)

3. Vai ao evento, pois


antecipa que, se não
for será discriminado
pelos colegas...

No paradigma III, a sequência A mostra os eventos públicos com funções


arbitrariamente supostas pelos colegas de João e pelo próprio terapeuta. Seria, então,
tanto quanto o paradigma I, exemplo de um episódio social de reforçamento positivo.
No entanto, a sequência B, que só é conhecida por João (antes de relatá-la para o
terapeuta), revela outro paradigma: embora os eventos sejam os mesmos, eles têm
para João outras funções. Assim: o convite é um evento pré-aversivo, a resposta de
aceitar o convite é uma resposta de fuga-esquiva, e as consequências sociais e
ambientais são aversivas, conforme se infere pelos pensamentos de João durante a
balada: não gosta da música, não gosta do seu corpo, nem de sua aparência na festa;
não gosta de (na verdade, não sabe ou acha que não sabe) dançar etc. Neste caso, o
paradigma é de controle coercitivo, o comportamento é de fuga-esquiva e algumas
consequências aversivas são minimizadas ou evitadas (críticas, decepção etc. dos
amigos) – o que caracteriza reforçamento negativo –, enquanto que outras são
produzidas por João (exposição à música, à “indiferença” das garotas etc.) – o que
caracteriza punição positiva. (No caso, o reforçamento negativo prevaleceu.) Uma
observação importante: o terapeuta deve se precaver de consequenciar o cliente com
elogios, comentários (“que bom”; “que legal” etc.) ao ouvir um relato. Deve antes se
certificar das funções dos eventos narrados e, só depois de uma avaliação segura do
que ocorreu, emitir comentários.
Outros paradigmas poderiam estar em operação, compondo uma teia complexa
de interações entre contingências e cabe ao terapeuta decidir quantos – os mais
relevantes funcionalmente – devem ser elaborados e apresentados para o cliente.

4. Relacione os paradigmas identificados no item 3 com os sentimentos e emoções


associados a eles. Assim:
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a. reforçamento positivo social generalizado: produz sentimento de satisfação, bem


estar etc.
b. extinção (ausência de reforçamento positivo social generalizado) produz: tristeza,
frustração, desânimo, eventualmente, agressividade etc.
c. reforçamento negativo (eliminação de eventos sociais com função aversiva
generalizada, tais como crítica, desdém, advertência etc.) produz: (a) antes da emissão
da resposta eficaz de fuga-esquiva: sentimentos de ansiedade, preocupação, reações
emocionais (respondentes) etc.; (b) depois da emissão da resposta eficaz de fuga-
esquiva: alívio temporário, culpa (se a resposta de fuga-esquiva que emitiu não é
adequada, de acordo com sua própria avaliação), pena, raiva de si mesmo etc.
d. punição positiva (através da apresentação de consequências sociais com função
aversiva generalizada, tais como crítica, advertência etc.) produz: medo, culpa,
ansiedade, reações emocionais (respondentes) etc.
e. etc.

O terapeuta deve incluir, na elaboração das contingências de reforçamento que


estão em operação, uma cuidadosa investigação dos sentimentos envolvidos. Só com a
complementação do fenômeno comportamental com os sentimentos presentes se pode
chegar às contingências de reforçamento com segurança. A captação dos sentimentos
pode controlar o comportamento de investigação mais preciso do terapeuta e levá-lo a
uma análise mais refinada, precisa.

5. Liste os objetivos terapêuticos imediatos (os objetivos em contexto clínico podem


mudar em função da introdução de novas variáveis críticas, tais como mudança de
emprego, casamento, separação, início de um curso universitário, doenças, mortes etc.
e o terapeuta deve estar sob controle de tais mudanças) e os procedimentos a serem
adotados, a partir dos itens 1 a 4 acima. Assim, no exemplo apontado no item 3, os
objetivos poderiam ser:

a. desenvolver repertório de comportamentos aptos para obter reforçadores positivos


sociais generalizados, sem ser através da emissão de comportamento de fuga-
esquiva. Associados a esta classe de repertório surgirão sentimentos de bem-estar,
prazer, satisfação etc. Os procedimentos mais indicados seriam modelagem, uso de
modelos, ensaio comportamental no contexto terapêutico etc.
b. desenvolver repertório de comportamentos para lidar com as consequências sociais
advindas de desempenho que produz críticas, insucesso etc., com reações
emocionais e sentimentos desagradáveis, porém em níveis suportáveis. Tanto o
terapeuta como o cliente devem estar cônscios de que um mundo sem crítica, sem
erros, sem fracassos é impossível. Como tal, não é objetivo terapêutico evitá-los,
mas sim aprender a lidar com eles e, ao mesmo tempo, procurar minimizá-los. (Os
dois itens: aprender a lidar e procurar minimizar deverão ser detalhados como
parte da ação terapêutica). O fading in de críticas e a modelagem de desempenhos
comportamentais incompletos (ensinar o cliente a fazer com erros) produzirão
reações emocionais e sentimentos progressivamente mais intensos, que embora
desagradáveis, serão (ou deverão ser) suportáveis. Ao mesmo tempo, não inibirão
a continuidade ou o fluxo do repertório operante em ação (não ocorrerá a
“paralisação” dos comportamentos que vêm sendo emitidos, a chamada “supressão
da resposta”), de maneira a permitir ao cliente experienciar consequências sociais
aversivas, desde que amenas, com naturalidade. Eventualmente, pode-se atingir o
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nível de tornar reforçadoras as funções aversivas. A mudança de funções de


estímulos na direção sugerida ocorre, em geral, quando o cliente amplia seu
repertório comportamental e se habilita, desta forma, a produzir reforços sociais
generalizados, até então disponíveis, mas inacessíveis por ausência de repertório
apropriado para produzi-los de maneira contingente.

6. A história de contingências de reforçamento também deve ser levada em conta numa


análise comportamental. Diferentemente de outras propostas terapêuticas, o
conhecimento (usa-se falar em “consciência”) dos eventos passados, em si mesmo, não
produz mudanças comportamentais significativas. Traz, no entanto, contribuições que
não devem ser desdenhadas. Os eventos comportamentais passados trazem mais
exemplos a serem incluídos e interligados com os eventos presentes. Assim, por
exemplo, se o cliente relatou que, durante a infância, era incapaz de desobedecer ao seu
pai, pois este ficava furioso com qualquer gesto de oposição, ele está oferecendo
informações sobre os primeiros contatos com contingências coercitivas desse tipo. Os
problemas comportamentais atuais são generalizações inter-pessoas, inter-situações e
no tempo ou relações de equivalência de estímulos estabelecidas a partir de
experiências vivenciadas no passado e que mantêm, até o presente, as funções
originais. As funções comportamentais estabelecidas no passado mantêm-se relevantes
e são atuais (isto é, operam exatamente como qualquer contingência estabelecida
recentemente), enquanto as funções adquiridas se mantêm. O fato de a função de
determinado evento ter sido instalada na infância, por exemplo, não modifica em nada
sua função presente, se tal função não for alterada. E somente poderá ser alterada sob
influência de novas contingências de reforçamento. Assim, um estímulo com função de
SD – luz para um pombo, por exemplo – manterá a mesma função durante a vida do
organismo, a menos que a luz deixe de ser ocasião para emissão de resposta que, se
emitida, produzirá reforço positivo. Para tal, a resposta emitida na presença da luz
deverá passar pelo processo de extinção. Se isso for feito a luz, que tinha a função de
SD, passa a ter a função de S∆, independente da história prévia de condicionamento. Por
outro lado, a luz pode adquirir outra função, a de S pré-aversivo, por exemplo, desde
que a sua presença passe a sinalizar (ser pareada com) a apresentação de um estímulo
aversivo inescapável. Conhecer a origem do problema comportamental, do qual o
cliente se queixa presentemente, permite a ele enxergar o processo comportamental e
não apenas o resultado desse processo (aquilo que o incomoda hoje). Poderia estar
ocorrendo o oposto: o cliente ter convivido com um pai atencioso, receptivo às
negações e argumentações do filho e, presentemente, o cliente, ao interagir da mesma
forma que fazia com o pai (falando franca e diretamente o que pensava, discordando, se
opondo etc.) com pessoas exigentes e menos acolhedoras que o pai (poderia ser um
gerente, um amigo, a esposa etc.), pode vir a ter problemas de relacionamento. Seu
passado não o preparou para lidar com contingências de natureza aversiva, arbitrária,
intransigente etc. que ocorrem no presente. As contingências de reforçamento no
passado instalaram, em ambos os casos exemplificados, padrões comportamentais com
alta probabilidade de ocorrerem diante de condições de estímulo com fenótipos (e não
funções) semelhantes aos do passado. Conhecer a origem dos padrões comportamentais
é um passo para mudar os comportamentos atuais; outro passo é distinguir as funções
dos estímulos: as funções presentes não repetem, necessariamente, as do passado e,
como tal, as mesmas respostas não são funcionalmente apropriadas. Na primeira
alternativa, o cliente precisa adquirir um repertório comportamental e emiti-lo na
presença de estímulos atuais que não têm função aversiva (ele supõe que têm). Na
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segunda alternativa, ele possui o repertório comportamental, mas este não é adequado
para o controle de estímulo atual. O terapeuta precisa introduzir gradual e habilmente
respostas de oposição, fazer um fading in de contestação, de argumentação etc. (Fala-se
em fading in de estímulos e não em modelagem de respostas porque a classe de
respostas de argumentação já existe instalada no cliente e suas verbalizações têm a
função de estímulo para o ouvinte. A proposta de usar fading in é minimizar a função
aversiva que oposição e argumentação possam ter.) A dificuldade presente é que as
respostas de argumentação, de oposição, no passado tinham função de SDs para os
pais: estes concordavam com o filho, o atendiam; no contexto atual, no trabalho, por
exemplo, as respostas da mesma classe de argumentar e de se opor têm função de
estímulo aversivo para o ouvinte, o chefe, por exemplo, e são ocasião para o
comportamento produzir consequências aversivas (a função SD instalada na infância na
relação com os pais, passa a ser função SDp no contexto profissional). O terapeuta vai
ensinar o cliente a hierarquizar e suavizar a apresentação dos tais estímulos, que têm
função aversiva para o ouvinte, manejando a topografia das respostas sociais e
profissionais emitidas, minimizando as funções aversivas que possam ter para o outro.
Um bom recurso é usar classes verbais de autoclíticos, dizendo, por exemplo: “Não sei
se você concordará, mas acho que poderíamos apresentar outro argumento. Você acha
que o momento seria oportuno para ser debatido o assunto? etc.

Uma questão que pode ser proposta é: por que não basta o terapeuta apontar para o cliente
as funções que os eventos têm presentemente, sem se ater a funções que tiveram no passado?
Não bastaria dizer, por exemplo, “seu chefe não é seu pai”? Não. As funções dos eventos não
mudam quando se diz que mudaram, mas quando novas contingências de reforçamento
produzem as mudanças. O procedimento mais apropriado é somar a instrução (as funções dos
eventos mudaram...) com o contato do cliente com as novas consequências do seu
comportamento (comportamento governado por regras e modelado pelas consequências,
portanto). No caso das contingências coercitivas, há uma dificuldade adicional: o
comportamento de esquiva, mantido por reforçamento negativo, é pouco sensível às
mudanças nas consequências. Ele se mantém forte, mesmo quando a consequência não está
mais programada para ocorrer, simplesmente porque a resposta ocorre antes do evento
aversivo e não há como testar se ele seria ou não apresentado.
Deve estar clara uma proposição apresentada no início deste subtítulo, qual seja, que a
simples conscientização de como eventos comportamentais foram instalados no passado não
produz mudanças significativas para o cliente no presente. Conhecer a origem das respostas e
das funções dos estímulos no passado, não muda as funções dos estímulos e nem os padrões
comportamentais. Há que se introduzir contingências de reforçamento diferenciadas para tal.

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