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CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI

HISTÓRIA DA AMÉRICA

GUARULHOS – SP

1
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 4

2 HISTORIOGRAFIA DA AMÉRICA COLONIAL ................................................. 5

2.1 Historiografia cientificista .............................................................................. 6

2.2 Historiografia lascasiana ............................................................................... 9

3 PERSPECTIVA INDÍGENA SOBRE A HISTÓRIA DA AMÉRICA ................... 11

4 FONTES DE PESQUISA EM HISTÓRIA DA AMÉRICA COLONIAL .............. 12

4.1 Fontes escritas e visuais............................................................................. 13

5 A CONQUISTA DA AMÉRICA PELOS ESPANHÓIS ..................................... 16

5.1 A Espanha e as grandes navegações ........................................................ 16

5.2 A chegada de Colombo à América ............................................................. 19

5.3 As primeiras conquistas e a colonização .................................................... 22

5.4 O papel da Igreja Católica na colonização da América espanhola ............. 25

6 O ABSOLUTISMO E A EXPANSÃO MARÍTIMA ............................................ 28

7 A COLONIZAÇÃO E OS SISTEMAS DE TRABALHO NA AMÉRICA ............ 31

7.1 Divisão administrativa da América hispânica .............................................. 31

7.2 Formas de trabalho nas colônias espanholas ............................................. 35

7.2.1 A produção de plantation ............................................................................ 36

7.2.2 A encomienda ............................................................................................. 37

7.2.3 O repartimiento ........................................................................................... 39

8 O TRABALHO COMPULSÓRIO NA AMÉRICA ESPANHOLA ....................... 41

9 A FORMAÇÃO DA AMÉRICA PORTUGUESA ............................................... 45

9.1 Contexto da chegada dos portugueses na América ................................... 45

9.2 A chegada de Cabral à América e o início da colonização ......................... 50

9.3 A relação dos jesuítas com os indígenas.................................................... 55


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10 HIPÓTESES SOBRE O POVOAMENTO DAS AMÉRICAS............................ 60

10.1 A teoria asiática .......................................................................................... 61

10.2 Outras teorias ............................................................................................. 63

11 OS INDÍGENAS DA AMÉRICA DO NORTE ................................................... 64

12 ESTADO-NAÇÃO E IDENTIDADES NACIONAIS .......................................... 66

13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 70

13.1 Bibliografia Básica ...................................................................................... 70

13.2 Bibliografia Complementar.......................................................................... 70

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1 INTRODUÇÃO

Prezado aluno!

O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é


semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase
improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor
e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado.
O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos
ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar,
as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão
respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e
organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura
do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá
reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o
quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos
para as atividades.

Bons estudos!

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2 HISTORIOGRAFIA DA AMÉRICA COLONIAL

A palavra história pode apresentar vários sentidos, representando um termo


polissêmico que muitas vezes é de difícil precisão. Para nosso propósito aqui,
adotamos a definição sugerida por Koselleck (2006): a história pode se referir tanto
aos acontecimentos do passado e à experiência histórica quanto ao relato e à
descrição desses eventos. Assim, de acordo com a segunda definição da palavra
história, chegamos ao conceito de historiografia, justamente da forma como o
conhecimento histórico é sistematizado, descrito, interpretado e comunicado. Nesse
sentido, cabe lembrar que a própria historiografia possui história, variando em seus
objetos, abordagens e conclusões ao longo do tempo. Portanto, quando falamos de
uma historiografia da América Latina em seu período colonial, estamos tratando de
diferentes formas de abordagem do problema histórico estudado.
Para Rüsen (1998), a historiografia é a produção e apresentação de
conhecimento histórico obtido por meio da razão. Segundo o autor alemão, é
possível conhecer a história ao utilizar métodos científicos, o que a tornaria, então,
em um “saber redigido” (RÜSEN, 2001). Dessa forma, a historiografia é uma
espécie de narrativa construída a partir dos elementos encontrados pela pesquisa
histórica. Contudo, enquanto narrativa, a produção historiográfica se situa em um
determinado contexto, sendo influenciada pelas questões e determinações da
época na qual é constituída. No entanto, é importante ressaltar que há, de fato:

[...] algo na construção narrativa chamada ‘história’ que não pode ser
inventado, pois é previamente dado e tem de ser reconhecido como tal
pelos historiadores [...]. [A] interpretação histórica não pode ir além dos
contornos da experiência quando tenha por intenção enunciar o que
ocorreu no passado (RÜSEN, 2001, p. 94, acréscimo nosso)

Porém, é importante que o historiador esteja sempre atento à busca mais


fiel dos acontecimentos, embora seja possível o acréscimo de interpretações
subjetivas que auxiliem na construção do sentido histórico. A seguir, veremos como
algumas das principais vertentes da historiografia sobre a América Latina foram
desenvolvidas.

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2.1 Historiografia cientificista

No que se refere à América Latina, existem duas grandes e influentes


tradições historiográficas que se apresentam como antítese mútuas. Uma delas
deriva do pensamento do frade dominicano Bartolomeu de Las Casas (1484–1566)
e é conhecida como “lascasiana”, sendo esta mais favorável aos indígenas; a outra
é intitulada “cientificista”, mais voltada a uma suposta superioridade da cultura
europeia frente aos nativos.
A historiografia cientificista tem suas origens nos relatos dos próprios
conquistadores, que acabaram por ser aceitos de maneira praticamente acrítica por
historiadores europeus e norte-americanos do século XIX. A dicotomia entre
conquistados e conquistadores permeia esse tipo de narrativa, tendo como grandes
expoentes o alemão Leopold von Ranke (1795–1886) e o norte-americano William
Hickling Prescott (1796–1859). Evidentemente, o cientificismo possui uma longa
história e nos dias atuais apresenta características diferentes daquelas encontradas
no século XIX.
Ranke é reconhecido como o historiador que, no século XIX, passou a
defender que os trabalhos históricos deveriam ser produzidos única e
exclusivamente como discursos científicos. Para isso, era necessário que os
historiadores se cercassem de fontes tidas como oficiais e utilizassem um método
empírico de busca da verdade. Foi dessa forma que Ranke escreveu um artigo
intitulado “As colônias americanas”, baseado em inúmeras fontes hispânicas. Dessa
forma, Ranke acabou criando uma perspectiva nacionalista e expansionista, fato do
qual derivou a “[...] ideia de uma cultura dominante na empresa colonizadora: a
espanhola” (FERNANDES; MORAIS, 2007, p. 147). Como principal consequência
desse entendimento de Ranke acerca do processo colonial americano, surge a ideia
de que os indígenas ocuparam um papel eminentemente passivo durante a
dinâmica de chegada e ocupação do continente pelos europeus.
Na narrativa rankeana, a cultura indígena acaba sendo retardada como
inferior. Somente após a chegada dos europeus ela seria beneficiada pela
civilização, à qual finalmente tinha acesso por intermédio dos colonizadores. Ranke

6
parte do pressuposto da existência de uma oposição entre barbárie, representada
pelo Novo Mundo, e a civilização, encarnada pela Europa. Isso se deve à sua
abordagem simplesmente formal dos documentos aos quais teve acesso e que lhe
permitiram escrever “As colônias americanas”. Ranke não considerou a posição do
outro, interpretando o processo histórico da colonização das Américas de uma
perspectiva unilateral, que recalca a riqueza e diversidade das culturas pré-
colombianas (FERNANDES; MORAIS, 2007).
O próprio termo “pré-colombiano” acaba por revelar o ponto de partida da
interpretação histórica da América colonial, já que a referência não está nas
civilizações que aqui já existiam, mas no nome de Cristóvão Colombo, o primeiro
europeu a comprovadamente chegar até o continente. Em resumo, Ranke adotou o
ponto de vista do colonizador, fato que influenciaria todos os seus trabalhos dali por
diante.
Na mesma época de Ranke, um historiador norte-americano chamado
William Hickling Prescott valia-se da mesma oposição civilização versus barbárie
para escrever sobre a história da conquista da América. Em sua obra The history of
the conquest of Mexico, publicada originalmente em 1843, Prescott trabalha o tempo
todo sobre características típicas dos astecas e dos espanhóis para provar sua tese
de que uma das culturas era superior à outra e que seria uma imposição histórica a
sua vitória, no caso, a vitória dos espanhóis sobre o Império Asteca. Esse
argumento, é desenvolvido pela comparação entre as armas utilizadas por
espanhóis e por astecas. Enquanto os primeiros utilizavam canhões, frutos da razão
e da ciência, os astecas se valiam de seus rudes e ineficazes tacapes. O
pensamento europeu é tido como racional em oposição ao pensamento mágico dos
astecas. Para o autor, essa é uma prova inequívoca de que o progresso (europeu)
deve suplantar as sociedades tidas como irracionais. Para não sermos injustos,
Prescott em vários momentos elogia a sociedade asteca, mas somente quando esta
apresenta características semelhantes às encontradas na Europa: urbanização,
canais, capacidade de dominar a natureza, etc. Em síntese, a obra de Prescott,
segundo Fernandes e Morais (2007, p. 148), é calcada na apologia da “[...] razão,
da civilidade e da urbanização” que servem como parâmetros civilizacionais e como

7
“[...] elementos julgadores e hierarquizadores” (FERNANDES; MORAIS, 2007, p.
148).
A corrente cientificista não ficou encapsulada no século XIX, influenciando
a historiografia durante o século seguinte também. O antropólogo francês Jacques
Soustelle (1912–1990), especializado nas sociedades pré-colombianas, foi um dos
autores mais relevantes dessa tendência. Na década de 1950, Soustelle publicou A
vida cotidiana dos astecas na véspera da conquista espanhola, obra em que cita
largamente Ranke e Prescott. O livro de Soustelle foi publicado no Brasil e obteve
grande êxito, fato que ajudou a promover sua grande influência sobre o ensino de
história da América na rede de educação básica.
Com uma perspectiva um pouco diversa da utilizada por Ranke e Prescott,
Soustelle valorizava enormemente a civilização asteca e considerava uma grande
tragédia a sua derrocada frente aos espanhóis. No entanto, é necessário atentar às
razões que faziam o autor lamentar o fim do Império Asteca. Não se tratava de uma
constatação de que uma cultura singular havia perecido de maneira injusta. Na
verdade, Soustelle lamentava o aniquilamento da civilização asteca por considerá-
la muito semelhante à civilização europeia. Mais uma vez encontramos a oposição
civilização versus barbárie. O autor defendia que os astecas, quando comparados
às outras sociedades indígenas existentes nas Américas, distinguiam-se
enormemente como povo civilizado diante dos bárbaros (FERNANDES; MORAIS,
2007).
Como visto, essa corrente dita cientificista estruturou-se sobre a dicotomia
entre civilização e barbárie, incorrendo em um erro metodológico no qual se
mensurou qualitativamente as sociedades pré-colombianas a partir da régua
europeia. Contudo, essa historiografia foi extremamente influente ao longo do
século XX, sendo possível ainda perceber alguns resquícios nos livros didáticos
atuais (FERNANDES; MORAIS, 2007).

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2.2 Historiografia lascasiana

Essa tradição historiográfica foi influenciada pelos escritos de Bartolomeu


de Las Casas, do século XVI. Las Casas, que era frade da ordem dos dominicanos,
contestava o tratamento dispensado aos índios pelas coroas espanhola e
portuguesa, defendendo que esse assunto deveria ficar a cargo da Igreja. Ou seja,
Las Casas discordava da exploração e escravidão indígena, acreditando que os
índios deveriam ser catequizados e inseridos de alguma forma na sociedade
colonial.
No entanto, a partir dos seus escritos, Las Casas acabou servindo de
inspiração para uma corrente historiográfica oposta à cientificista. Enquanto esta
destacava a civilização europeia, os textos lascasianos dão ênfase especial à
crueldade dos conquistadores. Porém, ao mesmo tempo, essa corrente fragiliza em
excesso os nativos e praticamente esconde qualquer tipo de resistência por sua
parte:

Além de destacar o impulso assassino dos espanhóis, o padre dominicano


transforma o indígena em vítima de um processo. Na tentativa de salvar os
nativos, Las Casas os imobiliza frente ao ataque europeu. Em seus textos,
a fraqueza indígena assume proporções gigantescas, criando a imagem
de pessoas ocupadas em chorar e gemer suas calamidades, incapazes de
ter tempo ou coração para resistir, presas fáceis para os conquistadores
(FERNANDES; MORAIS, 2007, p. 151).

Las Casas, como membro do clero, tinha especial interesse em que a


administração dos indígenas passasse das mãos do Estado espanhol para a Igreja.
Portanto, é compreensível a sua ênfase na violência praticada pelos colonizadores.
Obviamente, seus relatos se aproximam da verdade, pois outras fontes do período
dão conta de que o processo de colonização foi extremamente violento, causando
em muitas regiões das Américas um genocídio. Porém, chama a atenção o fato dele
ocultar qualquer tipo de resistência indígena, que também foi documentada por
outras fontes. É possível inferir a partir desse fato que a amplificação de um único
aspecto da verdade servia como um argumento favorável à sua causa de assumir
o controle do destino dos indígenas.

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A verdade é que essa tradição também se tornou influente sobre a
historiografia da América colonial. Na década de 1970, foi publicado pelo jornalista
uruguaio Eduardo Galeano o livro As veias abertas da América Latina, que se tornou
um clássico instantâneo. O livro relata a histórica submissão da América Latina em
relação a diferentes “metrópoles” ao longo do tempo. Na época colonial, Portugal e
Espanha; depois a Inglaterra; por fim, os Estados Unidos da América. O argumento
do autor, já expresso no próprio título, é de que a América Latina é constantemente
sugada em seus recursos sem que possa reagir em relação a isso (GALEANO,
2010).
Apesar da correção da mensagem principal, de que a América Latina não
conseguiu até hoje desenvolver uma forte soberania, sempre vilipendiada pelo
imperialismo, Galeano comete um erro metodológico que o assemelha a Las Casas.
O autor acaba reforçando a ideia de que o povo latino-americano é passivo,
acostumado ao autoritarismo e ao espólio de suas riquezas. Portanto, são
recalcados os movimentos históricos de luta no continente contra a opressão interna
e externa. Como a obra se tornou muito importante para a elaboração de livros
didáticos no Brasil e nos demais países latino-americanos, a ideia de que a
subjugação latino-americana parece ser nosso destino final foi amplamente repetida
pelos formatos institucionais do ensino de história.
O modo como a história é questionada e relatada frequentemente nos diz
mais sobre o presente do que sobre o passado em si. No caso das tendências
historiográficas e dos autores referidos, isso pode ser destacado. Enquanto os
autores cientificistas refletem o desenvolvimento das ciências naturais e o
simultâneo crescimento do expansionismo europeu, Las Casas nos informa sobre
a sua crença de que os indígenas deveriam ficar sob cuidados da Igreja. Por sua
vez, Eduardo Galeano, ao publicar seu livro no início da década de 1970, reflete o
pessimismo no continente, oriundo dos regimes militares que se instalavam e
fortaleciam.

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3 PERSPECTIVA INDÍGENA SOBRE A HISTÓRIA DA AMÉRICA

Para além das correntes descritas, é preciso que o historiador esteja atento
aos discursos que elas favorecem, em geral etno e eurocêntricos. No entanto,
cumpre lembrar que os povos indígenas não foram sujeitos passivos do processo
de colonização, já que possuíam suas próprias estruturas sociais, culturas e história.
Cabe questionar até que ponto a identidade indígena, em um contexto de tanta
diversidade de povos pré-colombianos, carrega seus próprios pressupostos ou foi
forjada a partir de categorias criadas pelos colonizadores. Ademais, é necessário
considerar o amplo processo de mestiçagem física e cultural que promoveu
alterações significativas na identidade indígena.

A historiografia a respeito da América espanhola tem se dedicado há mais


tempo ao complexo processo das mestiçagens, mostrando que a mescla
de raças, ao mesmo tempo em que abria novos espaços para ação,
castrava direitos dos indivíduos de origem nativa que diversas vezes se
viram diluídos nas categorias formais de mestiços, zambos, mamelucos,
pardos etc. Ao perderem perante o estatuto legal sua “condição indígena”,
homens e mulheres se encontravam expostos a coerções das quais até
então estariam livres (CRUZ, 2012, p. 131)

Nesse sentido, chegamos à categoria de identidade, que foi artificialmente


enxertada nos habitantes das Américas no período colonial. Como sabido, as
populações nativas eram extremamente diversas, separadas por intransponíveis
abismos geográficos. Os índios que habitavam determinada região da América do
Norte raramente tinham algo a ver com outros índios que habitavam o mesmo
continente. Se estendermos essa constatação em relação aos que habitavam a
América do Sul, as diferenças se tornam ainda mais evidentes. Contudo, todos eles
foram inclusos na categoria “indígena” ou “índio”, recalcando diferenças
consideráveis entre os povos americanos (CRUZ, 2012).
Dessa forma, uma unidade que nunca houve foi construída em nome do
processo colonial. Por outro lado, os índios, a partir de suas próprias perspectivas
criaram identidades que os diferenciaram entre si, em um rico processo de
alteridade. É assim que surgem apaches, tupinambás, carijós, tapuias, etc.,
contudo, não se pode deixar de lado que este foi um processo dialético, no qual,

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além da própria auto definição indígena, contribuíram enormemente as distinções
realizadas pelo colonizador, como “[...] identidades inventadas” (CRUZ, 2012, p.
129).
Os processos de “ocidentalização” entendida como a exportação da cultura
europeia para o restante do globo a partir da época das grandes navegações e
“indianização” o fenômeno recém-descrito, ou seja, a criação de uma identidade
indígena de certa forma artificial anda lado a lado. A Igreja teve seu papel nesse
contexto ao criar, em consonância com o pensamento lascasiano, uma imagem
incorreta dos povos indígenas, que servia evidentemente para a dominação. De
acordo com o catolicismo em vigor no período colonial, as sociedades indígenas se
tratavam de vítimas indefesas dos conquistadores e precisavam conhecer a
verdadeira fé, a cristã. Portanto, há aqui uma convergência com certos tipos de
historiografia acerca da história colonial, que assim como a Igreja também serviram
como um “[...] mecanismo colonial de reprodução da diferença étnica” (CRUZ, 2012,
p. 130).

4 FONTES DE PESQUISA EM HISTÓRIA DA AMÉRICA COLONIAL

O historiador depende de fontes para fazer seu trabalho. Sem elas, não há
possibilidade de se conhecer o passado, já que as fontes são os vestígios da
atividade humana nas sociedades que existiram antes do presente. Portanto, sem
acesso a esses indícios, que informam ao historiador sobre os mais diversos
aspectos do seu objeto de estudo, é impossível para ele elaborar a sua narrativa.
As fontes se apresentam nas mais diversas formas: manuscritas, impressas,
imagéticas, sonoras, bibliográficas, etc. Logo, o historiador deve estar capacitado a
promover o recorte do seu objeto e decidir quais tipos de fontes deve utilizar ou
descartar para a construção do seu trabalho historiográfico. Em termos de história
da América colonial, são inúmeras as fontes disponíveis, embora no Brasil os
estudos nesse campo frequentemente tenham sido tratados de “forma marginal”
(SÁ; AZEVEDO, 2013, p. 37). No entanto, existem muitas fontes, sobretudo escritas

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e figurativas à disposição do historiador que queira se dedicar ao estudo do período
colonial das Américas.

4.1 Fontes escritas e visuais

As principais fontes escritas relativas ao período de conquista e


estabelecimento dos europeus nas Américas são as chamadas crônicas coloniais.
Esses escritos, feitos em geral por viajantes ou colonos, nos apresentam relatos
sobre a natureza, a vida cotidiana, os povos indígenas e o próprio processo de
conquista e colonização em si (OLIVEIRA, 2011). Portanto, são documentos
extremamente importantes do ponto de vista historiográfico, na medida em que
permitem ao historiador vislumbrar os acontecimentos ocorridos no período colonial.
Na época da conquista do continente americano, a crônica era um estilo
literário já consagrado na Espanha havia alguns séculos. Basicamente, eram textos
com o objetivo de listar de maneira cronológica acontecimentos dignos de nota
como uma espécie de memória escrita para a posteridade. Dessa forma, foi um
passo natural que as crônicas chegassem e fossem utilizadas pelos colonizadores
nas Américas. Além do registro do novo mundo que começava a se constituir, as
crônicas serviam como um relatório endereçado à coroa espanhola. Contudo, é
importante destacar que as crônicas não eram elaboradas por qualquer indivíduo,
de forma geral, os trabalhadores braçais não eram letrados, logo, a incumbência de
redigir as crônicas recaía sobre membros do clero, militares, escrivães, etc., todos
de origem europeia (OLIVEIRA, 2011).
Para que as crônicas que chegaram até elas se tornem fontes válidas, é
preciso que o senso crítico seja apurado a fim de evitar concordar ou discordar dos
relatos expressos no documento. É necessário que o historiador tenha em mente
que aqueles escritos foram elaborados por um determinado tipo de pessoa, com um
determinado objetivo, voltado à leitura de certos olhos. As crônicas se tornam muito
importantes, a partir desse ponto de vista, pois revelam o entendimento e os
preconceitos que os colonizadores possuíam a respeito dos indígenas. Portanto, é
importante reconhecer que os textos estão calcados sobre perspectivas e

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paradigmas europeus, a fim de utilizá-los com muito cuidado e evitar a mera
reprodução de pontos de vista eurocêntricos. Afinal, como afirma Oliveira (2001, p.
24), essas crônicas também contribuíram para a “[...] instauração de hierarquias,
lugares sociais, desigualdades e diferenças entre índios e europeus, entre homens
e mulheres, entre os indivíduos dos dois mundos que se encontram e se
confrontam”.
As crônicas elaboradas pelos colonizadores e missionários constituem o
mais importante corpus documental para a pesquisa da história da América colonial.
Infelizmente, quase não existem registros escritos produzidos por maias, astecas
ou incas. Isso se explica principalmente pela tradição de história oral desses povos
e, é claro, pela dominação colonial que sofreram, que não propiciava um ambiente
favorável à produção de crônicas por parte dos indígenas (OLIVEIRA, 2011).
Uma fonte reconhecida como muito valiosa sobre a ocupação da região do
atual Paraguai, por exemplo, é o livro Relatos de la Conquista del Rio de la Plata y
Paraguay 1534 a 1554, escrito pelo soldado alemão Ulrich Schmidel, que viveu
durante quase duas décadas na região. É considerada por muitos pesquisadores
como um relato pioneiro e bastante completo sobre a conquista do Paraguai e do
rio da Prata. Todavia, deve ser utilizada com algumas ressalvas, devido ao
direcionamento que o autor dá aos fatos. Schmidel era militar e é possível perceber
em seu relato um certo exagero em relação aos feitos militares de então. Outra
lacuna importante diz respeito à ausência de castelhanos e indígenas em sua
narrativa (NOVAIS, 2011).
Diferentemente de Ulrich Schmidel, o adelantado (título militar de alguns
conquistadores espanhóis do século XVI) Álvar Nuñez Cabeza de Vaca mencionou
largamente os povos indígenas contatados em suas expedições pela América do
Sul. Os relatos de Cabeza de Vaca não foram escritos de próprio punho, mas por
seu escrivão-mor Pedro Hernández, em uma obra que ficou conhecida como
Comentário, de 1555. Esse texto é visto quase como um trabalho de etnografia, pela
forma em que os diversos povos nativos são descritos. A partir desse tipo de relato
particular de Cabeza de Vaca, é possível compreender melhor as motivações desse
conquistador:

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[...] nos Comentários encontram-se descrições ricas em detalhes sobre o
modo de vida dos índios Agace, Payaguá, Guaycurú Guazarapo, Guató,
Sacosi, Chanese, Arianicosi, Artanece e Xarayé. A leitura desses relatos
evidencia que, nesse momento, já havia uma preocupação por parte dos
espanhóis em tornar os índios cristãos e súditos de sua majestade católica,
o rei da Espanha. Para tal, o Adelantado decidiu estabelecer uma nova
política indigenista, proibindo a escravidão e os abusos que Irala praticava
contra os Guarani Cário do Paraguai (NOVAIS, 2011, p. 3).

Existem ainda as fontes que foram produzidas pelos povos pré-


colombianos. Diversos documentos produzidos pelos astecas no momento da
chegada dos espanhóis revelam o clima de terror que se apossou daquela
sociedade. Isso ocorreu sobretudo devido às crenças astecas, registradas nesses
documentos. A vinda dos espanhóis coincidiu precisamente com profecias que
relatavam o fim do mundo. Durante o período imediatamente anterior à invasão
espanhola, comandada por Hernán Cortés, diversos “sinais” haviam se
manifestado: um incêndio, a queda de um raio, ocorrência de cometas, etc. Pois
esses acontecimentos acabaram sendo relacionados com a crença de que o deus
Quetzalcóatl, o mais importante do panteão asteca, que havia partido em direção
ao leste, estava retornando dentro do ciclo previsto de 52 anos. Dessa forma, os
astecas acabaram oferecendo presentes aos conquistadores ao mesmo tempo em
que, devido às suas crenças, tornavam-se mais vulneráveis ao seu ataque
(MORAIS, 2006). Outra fonte importante sobre a sociedade asteca é História
general de las cosas de la Nueva España, escrito pelo padre franciscano Bernardino
de Sahagún em 1793. Trata-se de um documento realizado a partir de diálogos com
os nativos, que relataram em detalhes ao religioso aspectos da vida cotidiana, das
artes, da administração e da religião asteca antes do domínio espanhol.
Uma fonte sobre o período colonial na América do Sul, mais precisamente
tratando da sociedade inca, é o livro El primer nueva corónica y buen gobierno,
escrito pelo indígena peruano Felipe Guamán Poma de Ayala, em 1615, tendo como
destinatário o rei Filipe III da Espanha. No volumoso escrito, com quase 1.200
páginas e 400 ilustrações, Poma de Ayala descreve os abusos cometidos pelos
colonizadores contra a população indígena do Peru, inclusive levantando a questão
de violência contra a mulher (CARNEIRO, 2017). Portanto, trata-se de uma nova
perspectiva, dessa vez centrada no olhar dos próprios índios, vitimados pela

15
brutalidade colonial. O objetivo do autor era relatar tal situação ao rei espanhol em
busca de sua intervenção. Não há registros de que o livro tenha chegado às mãos
do monarca. O escrito ficou desaparecido por quase 400 anos, sendo reencontrado
em Copenhague, capital da Dinamarca, em 1909 e publicado em Paris em 1936.
Contudo, o que acaba se tornando ainda mais importante em relação aos
escritos de Poma de Ayala é o seu caráter duplo como fonte histórica. A obra se
trata tanto de uma fonte textual, na qual é possível perceber as injustiças cometidas
contra os índios peruanos, quanto uma riquíssima fonte visual, que permite ao
historiador conhecer a estética indígena do período. Além disso, o livro é também
um trabalho histórico, no qual, além de registrar a história da Europa e da ocupação
colonial, esboça um panorama bastante completo acerca da história dos incas. Sem
dúvida alguma, El primer nueva corónica y buen gobierno é uma das fontes mais
importantes para o estudo da América colonial.

5 A CONQUISTA DA AMÉRICA PELOS ESPANHÓIS

5.1 A Espanha e as grandes navegações

Para compreendermos a conjuntura do reino espanhol em que se inserem


as navegações e a “descoberta” da América, precisamos antes entender as
transformações ocorridas na Península Ibérica na transição da Idade Média para a
Modernidade. Durante a Idade Média, o território da atual Espanha encontrava-se
dividido em dois reinos: Castela, ao centro da península, e Aragão, mais próximo
ao Mar Mediterrâneo. Em 711, a Península Ibérica foi conquistada pelos árabes,
com a exceção de Castela, que foi capaz de organizar, pela mobilização da Igreja
Católica, a reconquista do território. O processo de reconquista deu-se mediante a
concessão de terras às ordens religiosas e aos cavaleiros empenhados na
reconquista do território, o que permitiu a fixação de camponeses e a consolidação
das forças militares (VILAR, 2000).
Com o casamento entre os Reis Católicos Fernando de Aragão e Isabel de
Castela, houve um processo de centralização política e formação do reino espanhol,

16
mas sob uma monarquia cujo único caráter de unicidade se dava pela Igreja. Além
da diversidade cultural, havia interesses divergentes entre a nobreza dinástica
castelhana, que se interessava por questões internas, e a nobreza dinástica
aragonesa, voltada a interesses externos. Aragão havia mantido certa autonomia
econômica e política, mesmo com a centralização ocorrida com os Reis Católicos,
mas Castela era um reino mais rico, o que levou a uma série de problemas, inclusive
durante a colonização da América, que ficou juridicamente vinculada ao Reino de
Castela (ANDERSON, 1995). Durante o reinado de Isabel e Fernando, que durou
de 1474 a 1504, foi construída uma sociedade em Castela de caráter patrimonial,
com obrigações mútuas, sustentada pelas mercês, uma atualização das obrigações
feudais. Essa estrutura social seria posteriormente reproduzida na organização
administrativa e política da América (BETHELL, 1990).
Do ponto de vista econômico, antes da união dos reinos não havia uma
política econômica centralizada. Além das práticas econômicas de caráter feudal,
as riquezas e o poder eram assentados por uma política dinástica de casamentos,
garantindo influências e territórios (VILAR, 2000). Porém, após a centralização
política, iniciou-se um processo de expansão marítima, em que Aragão dedicou-se
ao Mar Mediterrâneo e Castela ao Oceano Atlântico, rivalizando com Portugal, uma
rivalidade assentada na navegação pelo Estreito de Gibraltar, nos arquipélagos
atlânticos e na exploração da costa africana, bem como no usufruto da rota para as
Índias. Essa rivalidade foi sanada com a assinatura de dois acordos: o Tratado de
Almeirim (1432) e o Tratado de Alcaçovas–Toledo (1479–1480).
De acordo com Bethell (1990, p. 128):

Este movimento expansionista dos povos ibéricos no século XV refletia, no


final da Idade Média, as aspirações ibéricas específicas e as demandas
europeias mais gerais. No século XV, a Europa era uma sociedade que
viva as consequências da desarticulação econômica e social oriundas da
Peste Negra. Havia escassez de trabalho, os ingressos da aristocracia
haviam diminuído, e os reis e a nobreza competiam por poder e recursos.
Era uma sociedade que se sentia ameaçada em suas fronteiras orientais
pela presença do Islã e pelo avanço do Império Turco–Otomano.

As navegações, inseridas na lógica do mercantilismo, foram motivadas pela


busca de rotas marítimo-comercias entre a Europa e a Ásia, principalmente para a

17
obtenção de especiarias e metais preciosos, frente às dificuldades impostas pelo
Império Otomano na rota terrestre. O processo de expansão marítima, que seria
seguido por Espanha, França e Inglaterra, vincula-se a uma prática econômica que
recebeu o nome de mercantilismo. Essa concepção econômica partia do
pressuposto que a riqueza de um Estado era medida pela quantidade de metais
preciosos que possuía. Ela surgiu durante o renascimento comercial das cidades e
com a emergência da burguesia, que transformou as relações de trabalho e passou
a exigir a monetarização das relações comerciais.
De acordo com Silva e Silva (2009, p. 283):

[...] a definição mais aceita de mercantilismo informa que esse termo


compreende um conjunto de ideias e práticas econômicas dos Estados da
Europa ocidental entre os séculos XV, XVI e XVII voltadas para o comércio,
principalmente, e baseadas no controle da economia pelo Estado.
Mercantilismo dá nome, nesse sentido, às diferentes práticas e teorias
econômicas do período do Absolutismo europeu.

Cabe lembrar que esse conceito não é contemporâneo aos fatos que
nomeia; na verdade, foi empregado por liberais no final do século XVIII, com tom
depreciativo, para se referir às práticas de intervenção do Estado na economia.
Segundo Bethell (1990), assim como os lusitanos, os reinos espanhóis
souberam aproveitar a proximidade com a África e a costa atlântica, tendo
desenvolvido uma tradição marítima, com destaque para os navegadores e os
pescadores bascos e cantábricos, permitindo aventuras transoceânicas.
De acordo com Pinsky e Bruit (2001, p. 23):

A descoberta da América por Cristóvão Colombo faz parte do processo de


expansão do capitalismo europeu. O comércio, renascido em fins da Idade
Média e desenvolvido no interior da Europa entre as cidades italianas e
flamengas, foi deslocado, no século XIV, para o litoral atlântico. A escassez
de metais preciosos provocava a falta de moeda em circulação, agravando
os problemas já existentes. As nações da costa atlântica (Portugal,
Espanha, França, Inglaterra e Holanda), detentoras do comércio
sobrevivente, eram as que mais sofriam com a crise e, para superá-la,
precisavam encontrar metais preciosos para valorizar suas moedas.

Aos motivos econômicos somavam-se as razões religiosas, expandindo a


fé cristã para outros territórios. Após a conquista das Ilhas Canárias, o intento do
Reino de Castela era a realização de uma viagem de circum-navegação para

18
alcançar as Índias, tema que abordaremos no próximo tópico. Resta assinalar aqui
que, quando Colombo finalmente conseguiu o patrocínio e o respaldo dos Reis
Católicos para a realização de sua viagem de circum-navegação, encontrou na
Espanha uma tradição de boas relações entre a coroa e os navegadores
expedicionários.

5.2 A chegada de Colombo à América

Não possuímos muitas informações sobre a biografia de Cristóvão Colombo


(1451–1506). Antes de empreender a viagem de circum-navegação, já havia se
dedicado a atividades marítimas no Mediterrâneo e no Atlântico. Embora existam
dúvidas quanto à sua terra natal (se Catalunha ou Gênova), sabe-se que era
descendente de um mercador italiano ligado ao comércio de produtos orientais,
familiarizado, portanto, com as possibilidades de riquezas advindas dessa
modalidade comercial. Colombo realizou parte de sua formação em Portugal,
descrita da seguinte forma por Matos (2006, p. 50):

Fascinou-o [a Colombo], por isso, o espaço português da segunda metade


do século XV, quando se desenvolveu o comércio africano e Lisboa se
tornou uma metrópole cosmopolita. Teve condições de acesso a um saber
clássico, muito ao jeito do Renascimento. Aprendeu latim, leu livros que
falavam de mundos distantes e prodigiosos e tomou conhecimento de
conceitos geográficos que lhe suscitaram soluções alternativas à rede
comercial que sempre conhecera. Pensou até que, se conseguisse abrir
uma nova e revolucionária via para esse comércio, caber-lhe-ia o lugar que
vira ser ocupado por gente que invejou durante a sua infância e juventude.
Portugal foi, talvez, o local onde está imaginação fértil e espírito aventureiro
mais se desenvolveram, fosse pelo momento que se vivia, fosse pelas
viagens que teve oportunidade de efetuar.

Colombo fez parte de seus estudos na Universidade de Lisboa, onde


desenvolveu a ideia de alcançar as Índias navegando por um sentido diferente
daquele empreendido pelas habituais viagens portuguesas. De acordo com Matos
(2006), sua ideia não se tratava de uma novidade absoluta, mas se inspirara em
viagens ocasionais ou fantásticas, que afirmavam a existência de ilhas e terras a
oeste, que inclusive apareciam na cartografia do período.

19
O caso mais antigo [...] está na carta atribuída a Zuane Pizzigano [...] onde
surge um grupo de ilhas (Antília e Satanases são as de dimensões mais
significativas) que o autor coloca no Golfo do México, pretendendo, dessa
forma, documentar viagens portuguesas a essas longínquas paragens
antes de 1424, data da feitura do mapa. Não importa agora qualificar a sua
argumentação, mas apenas salientar o mito, a ideia e a conversa suscitada
pelo assunto, que, pelos vistos, não se circunscrevia à Península Ibérica
(MATOS, 2006, p. 30).

O projeto de Colombo possuía aspectos econômicos, náuticos, políticos e


religiosos, todos imbricados. Econômicos, por propor um caminho alternativo ao
terrestre, chamado de Rota da Seda, controlado pelos otomanos; náuticos, por
afirmar que a viagem por circum-navegação seria a forma mais rápida de se chegar
às Índias, de acordo com seus cálculos e estudos; políticos, por estabelecer
relações diplomáticas com mercados da China e da Índia; e religiosos, pela
potencial evangelização da Ásia.
Em relação ao aspecto do conhecimento náutico, citamos a análise
desenvolvida por Matos (2006, p. 50):

[... ] imaginou [Colombo] que o Oriente, de onde vinham as mercadorias


ricas que desde pequeno via chegar à sua terra e com que se cruzara em
Lisboa, podia estar ao alcance de meia dúzia de dias de viagem,
caminhando atrás do Sol poente. Foi um sonho de muitos outros, contudo,
no caminho da Guiné e no contato com as viagens portuguesas, que ele
percebeu que no Atlântico Norte havia uma via de vento favorável ao
caminho para o Sul e Ocidente (os alísios de NE) e outra de regresso, um
pouco mais a norte. Digamos que, ao juntar este saber prático, colhido no
mar, com um conhecimento geográfico clássico e difuso, aprendido em
leituras rápidas e em discussões literatas, elaborou o plano que seria a
obsessão da sua vida.

Antes de apresentar seu plano a Castela, Colombo já o havia apresentado


a D. João II de Portugal e a Henrique VIII da Inglaterra, que o rechaçaram. A
negociações com os Reis Católicos se estenderam de 1485 a 1492, quando foram
assinadas as Capitulações de Santa Fé.
Com esse documento, ficou estabelecida a finalidade da viagem
(estabelecer a rota transoceânica para as Índias), a planificação e organização da
expedição e o reconhecimento da autoridade e do poder de Colombo, que iam de
títulos e cargos administrativos até questões econômicas, caso obtivesse sucesso.

20
Quais foram as repercussões imediatas do “descobrimento” na Europa? A
primeira delas foi, com a intermediação do Papa Alexandre VI, a assinatura, no dia
4 de maio de 1493, da bula Inter Caetera, que estabelecia uma divisão no Oceano
Atlântico entre o reino de Castela e Portugal a partir de uma linha imaginária a 100
léguas das ilhas do Açores e de Cabo Verde, garantindo à Castela as possessões
dos territórios recém descobertos e à Portugal o controle sobre o Atlântico Sul e
sobre a rota africana às Índias. Em relação à bula Inter Caetera, seu texto
legitimava, em nome de Deus e da Santa Sé, a posse pelos Reis Católicos dos
achados territoriais realizados por Cristóvão Colombo, que, à época, imaginava-se
tratar de um território asiático. Dessa forma, esse espaço deveria ser conquistado
e incorporado ao Orbis Christianus. (A concepção cosmológica de um Mundo
Cristão). De acordo com Rodrigues (2017, p. 3):

[...] a bula papal de Alexandre VI preconizava um projeto colonial, uma


assimilação de novos espaços e a subjugação dos mesmos pelo poder
dinástico imperial dos soberanos Reis Católicos. Além disto, confirmava a
primazia da Igreja como instituição diplomática e legitimadora do poder
imperial para a anexação de outros espaços e, sobretudo, do seu elemento
humano.

Posteriormente, ao longo do mês de maio e de junho de 1493, foram


assinadas outras bulas, realizando algumas modificações. A principal mudança, no
entanto, ocorreu no ano seguinte, em 1494, com a assinatura do Tratado de
Tordesilhas. Com esse tratado, houve uma correção da linha imaginária, que
passou a vigorar a 370 léguas a oeste de Cabo Verde, garantindo exclusividade de
Castela e Portugal em suas respectivas zonas e permitindo aos castelhanos
cruzarem a zona portuguesa em direção às Índias, mas sem exploração.
Além desses acordos e tratados entre Castela e Portugal, a “descoberta”
da América incentivou outras viagens empreendidas por Castela. Essas viagens
possuíam um caráter exploratório e de colonização, processo que foi iniciado pelo
próprio Colombo a partir de sua segunda viagem.

21
Por fim, podemos assinalar que a “descoberta” representou o contato entre
dois mundos distintos, o que proporcionou aos europeus a constituição de sua
identidade a partir de uma comparação com um “outro”. De acordo com Rodrigues
(2017, p. 5):

[...] este primeiro contato entre culturas extremamente distintas iria


desemborcar em consequentes pré-julgamentos, idealizações e, claro,
estranhamento. Começara neste momento indelével um profundo
relacionamento entre uma cultura ibérica fortemente cristã e um universo
sociocultural amplamente distinto, a cultura do Outro, que
homogeneamente qualifica-se como “mundo ameríndio”, mas que em seu
particularismo se mostrará amplamente diversificado e heterogêneo,
englobando uma enorme pluralidade de grupos étnicos e linguísticos com
amplas diferenças culturais entre si.

5.3 As primeiras conquistas e a colonização

A partir de então, o processo de conquista e colonização do Novo Mundo


herdou as experiências das coroas de Castela e de Aragão na reconquista da
Península Ibérica, segundo a noção de ocupar os territórios como forma de
conquista e de disseminação da fé católica.

22
Como dito anteriormente, o processo de conquista e de colonização do
território encontrado por Colombo começou a partir de sua segunda viagem,
baseado em sua crença de que se tratava de territórios asiáticos, e, assim,
estabelecendo feitorias nas ilhas da América Central. O processo de conquista e
colonização, portanto, iniciou-se pelo Caribe, e prosseguiria por meio de novos
navegadores e colonizadores na parte continental da América Central, na região
andina e na costa do Pacífico, em um processo que durou aproximadamente 80
anos, envolvendo três gerações.
No Caribe, paralelamente à integração territorial, política e social das
“Índias” à Espanha, houve o estabelecimento da soberania espanhola na região.
Conforme o estabelecido nas Capitulações de Santa Fé, o governo das Índias ficou
a cargo do então Vice-Rei Cristóvão Colombo entre 1492 e 1502, e, devido ao seu
insucesso, passou a outros administradores, até 1523. Nas Antilhas, a população
indígena foi organizada para a produção e o trabalho, e a partir desses contatos foi
sendo estabelecido o relato do indígena como primitivo e selvagem, informações
que podemos encontrar nas narrativas de Colombo em seu diário. Em certo trecho,
Colombo estabeleceu uma diferenciação dicotômica entre os indígenas “bons”,
“dóceis” e “covardes” e os indígenas “maus” e “selvagens”, como aqueles que
praticavam rituais antropofágicos. Assim, esses últimos deveriam ser submetidos
urgentemente à conversão católica, como forma de salvar suas almas e libertá-los
de costumes repudiados pelos europeus. Vejamos um dos trechos do diário:

[...] as outras ilhas dos canibais são muito maiores e bem mais povoadas,
pareceria aqui que capturar, tanto eles como elas, e enviá-los aí para
Castela só poderia fazer bem, porque se livrariam, de uma vez por todas,
desse costume desumano que têm de comer gente, e aí em Castela,
entendendo a língua, receberiam bem mais rápido o batismo, com grande
proveito para suas almas (COLOMBO, 1998, p. 133).

Após a ocupação das ilhas maiores e menores, que ocorreu nos primeiros
15 anos do século XVI, os navegadores dirigiram-se ao continente. A terceira e
quarta viagens de Colombo à América destinaram-se à exploração da costa da
América Central, ainda que outras expedições já tivessem estabelecidos núcleos
espanhóis no continente (VELOSO FILHO, 2012).

23
Em relação à conquista do México, as expedições partiram das Antilhas
Maiores, e estavam a cargo do governador Diego Velásquez. As duas primeiras
fracassaram, e a terceira, liderada pelo capitão Hernán Cortés, foi realizada em
quatro etapas: a primeira, com a conquista da Península de Yucatán e a fundação
de Veracruz, que ocorreu mediante alianças firmadas com os grupos indígenas
rivais aos astecas (mexicas); a segunda, que marcou a entrada dos espanhóis em
Tenochtitlán em 8 de novembro de 1519; a terceira etapa, em que houve o
estabelecimento de um acordo entre Cortés e Montezuma, que durou até 1520, até
ser rompido após a rebelião dos astecas; e a quarta etapa, quando os espanhóis se
reorganizam e planejam um ataque a Tenochtitlán com barcos, cercando a cidade
e levando à sua rendição, em 1521. Após a vitória sobre os astecas, Cortés,
nomeado governador geral da “Nova Espanha”, iniciou seu governo promovendo a
convivência entre espanhóis e indígenas, principalmente para proporcionar a
organização para o trabalho e o processo de evangelização com padres
franciscanos (MONTEIRO, 2017).
A conquista dos Andes se insere na expansão dos espanhóis em direção à
América do Sul, com incursões que partiram do Panamá e da Colômbia na segunda
década do século XVI. Em relação aos incas, os primeiros intentos ocorreram entre
1524 e 1528, com duas expedições de Francisco Pizarro, Diego de Almagro e
Hernando de Luque. A primeira expedição, de reconhecimento da costa, saiu do
atual Panamá e chegou até a atual Colômbia. Já a segunda expedição, realizada
entre 1526 e 1527, estabeleceu contato com os incas. A conquista propriamente
dita do “Império” Inca ocorreu entre 1531 e 1537, aproveitando-se da guerra entre
Atahualpa (situado em Quito) e Huáscar (localizado em Cuzco). Assim, em 1533 os
espanhóis conquistaram a cidade de Cuzco, seguindo-se uma resistência indígena
que durou mais quatro anos. Os indígenas derrotados retiram-se a Vilcabamba, ali
permanecendo até 1572, quando os espanhóis capturam e executam Túpac Amaru
I, seu líder. Nas décadas seguintes, ocorreram uma série de confrontos, chamados
de “guerras civis”, entre os próprios conquistadores, por discordâncias em relação
às áreas de dominação, e, posteriormente, pelas leis estabelecidas pela
administração dos vice-reinos (MONTEIRO, 2017).

24
5.4 O papel da Igreja Católica na colonização da América espanhola

Existe uma relação intrínseca entre o “descobrimento”, a conquista e a


colonização, de um lado, e de outro a disseminação da religião católica pela Igreja.
Os fundamentos da atuação da Espanha na América foram proporcionados pela
Igreja Católica e por sua atuação evangelizadora. Assim, é impossível dissociar o
processo de colonização do aspecto religioso, que eram complementares.
Antes de iniciar a primeira viagem rumo ao oeste com direção às Índias,
Cristóvão Colombo e sua esquadra se confessaram, receberam a comunhão e
tiveram benzidas as caravelas, a bandeira da Santa Cruz e os estandartes dos Reis
Católicos. Ao longo dos registros presentes em seus diários, é perceptível o caráter
evangelizador da conquista e da colonização, seja na nomeação dos espaços ou
nas observações quanto à possibilidade de atuação dos missionários junto aos
indígenas. Há alguns registros de que Colombo retornou à Espanha de sua primeira
viagem com alguns indígenas, que foram batizados e apadrinhados pelo próprio rei
(LUBIN, 1970).
A partir das informações recebidas de Colombo, os Reis Católicos
estabeleceram tratativas com o Papa Alexandre VI para a nomeação dos religiosos
destinados às atividades missionárias no Novo Mundo, que foram ordenados pelo
Papa a:

25
[...] pregar a palavra de Deus, a evangelizar, a batizar, a instruir os povos
que aí viviam, a lhes administrar os sacramentos necessários, a ouvir as
suas confissões e dispensá-los de certos votos, ou de recomendá-los que
fossem a Jerusalém, à Basílica de São Pedro e São Paulo, ou a Santiago
de Compostela (LUBIN, 1970, p. 451).

O Papa também autorizou a construção no Novo Mundo de capelas, igrejas


e mosteiros, para homens e mulheres. Os primeiros religiosos chegaram à América
juntamente com a segunda viagem de Colombo, em 1493, e a primeira missa foi
celebrada no dia 6 de janeiro de 1494, na igreja que Colombo mandou construir da
Ilha de Isabela. A partir de 1511, com o Papa Júlio II, iniciou-se a disseminação da
estrutura religiosa da Igreja Católica na América, com a criação de três dioceses na
América espanhola, em territórios já conquistados pelos espanhóis.
Após 1524, a política eclesiástica na colônia americana ficou a cargo do
chamado Conselho das Índias, e a coroa espanhola tornou-se responsável pela
indicação dos cargos eclesiásticos, bem como pelo pagamento de salários e pela
construção de catedrais, igrejas e mosteiros, com os recursos provenientes do
pagamento de dízimos sobre a produção agrícola e pecuária (MONTEIRO, 2017).
Por sua vez, a Companhia de Jesus foi fundada na conjuntura da Reforma
Protestante e do Renascimento, com a renovação da vida espiritual da Europa
Ocidental nas primeiras décadas do século XVI. Sua vinculação mais explícita com
a Reforma é o quarto voto, além dos três habituais das demais congregações:
deviam estrita obediência ao papa (VAINFAS, 2000). De acordo com Sousa e
Ferreira Júnior (2012, p. 4):

O pano de fundo das ações dos missionários era a Contrarreforma e a


necessidade de combater os protestantes na Europa e na América, tendo
em vista que os huguenotes já travaram combates com os jesuítas no Rio
de Janeiro e Maranhão e seu princípio de livre exame das escrituras, que
transformou a escola em instrumento da catequese dos reformadores e,
consequentemente, era alvo das preocupações dos jesuítas, o Concílio de
Trento, que reafirmava as tradicionais doutrinas católicas e o intento de
triunfo do catolicismo sob a autoridade papal.

O historiador Ronaldo Vainfas (2000), no entanto, reforça outro aspecto que


vincula os jesuítas ao movimento da reforma da Igreja Católica, ou Contrarreforma.
Eles estariam imbuídos de um espírito cruzadista medieval, e se propuseram a
difundir a fé por meio do conhecimento e do ensino. Por isso, também atuaram

26
instalando colégios em suas áreas de atuação. De acordo com Vainfas (2000, p.
327):

A tarefa de conversão dos gentios à fé católica colocava desafios inéditos


para os religiosos. Desconhecendo as sociedades nativas, os europeus
tinham a impressão de que os índios viviam “sem Deus, sem lei, sem rei,
sem pátria, sem república, sem razão”. O grande mérito dos jesuítas
consistiu na percepção da humanidade dos nativos da América. Foi ela
que os incentivou a desenvolver procedimentos capazes de atingir a
sensibilidade dos nativos, aproximando- -os da cultura cristã, como aliás
fariam logo depois em seus colégios. Essa estratégia assentava sobre três
convicções básicas: a de que os índios eram tão capazes dos sacramentos
quanto os europeus; a de que eram “livres por natureza”; e a de que tinham
um caráter de um “papel branco”, em que poderia ser impressa a palavra
de Deus. Com essas diretrizes, os jesuítas buscaram na catequese, antes
de tudo, a mudança de alguns costumes ameríndios, incompatíveis com a
fé católica como a poligamia e a antropofagia e, para isso, fizeram largo
uso da música, da dança, dos autos religiosos e das procissões.

A atuação da Igreja e da religião católica também foi fundamental para a


legitimação, oficialização e legitimação da nomeação dos territórios encontrados, já
que “nomear” estava vinculado a “dominar” pela tradição cristã. Além disso, havia
um fundamento jurídico que estabelecia a legitimidade da conquista de uma nação
caso seu monarca não fosse cristão.

Assim, a expansão da religião cristã era bem vista por Deus; estava em
seus planos para a humanidade, que teria a oportunidade de conhecer os
evangelhos [...] Tal cultura conquistadora, que modelou a consciência
social dos homens da Reconquista, atravessou o Atlântico e teve
continuidade no processo de conquista das civilizações do Novo Mundo
(MONTEIRO, 2017, p. 74).

De acordo com Rodrigues (2017, p. 9), esse modelo peculiar de conquista


por europeus não era uma mera idealização e continuação da pia religiosidade de
Colombo, e sim um traço cultural e uma demonstração de poder, “[...] baseada na
fé católica e no seu forte bastião político, a monarquia ibérica de Fernando de
Aragão e Isabel de Castela”. Essa prática fica patente nos nomes religiosos
conferidos aos diferentes espaços nos territórios conquistados.
Outro aspecto importante na atuação da Igreja Católica na América
espanhola foi a ação do Tribunal do Santo Ofício, a Inquisição, em território
americano, com a criação de sedes em Lima (1570), Cidade do México (1571) e
Cartagena (1610). Embora não tivesse jurisdição sobre os indígenas, a Inquisição

27
ocupou-se dos judeus e dos protestantes, bem como de atos imorais e práticas
religiosas sincréticas, de forma semelhante à sua atuação na Europa (MONTEIRO,
2017).

6 O ABSOLUTISMO E A EXPANSÃO MARÍTIMA

A expansão marítima e as práticas coloniais foram vistas como uma


possibilidade de superação das dificuldades advindas da crise econômica que
atingiu a Europa Ocidental e o sistema feudal nos séculos XIV e XV, mudando
significativamente a organização econômica europeia no século XVI. Não obstante,
é necessário lembrar que, entre os séculos XVI e XVIII, coexistiram formas
socioeconômicas feudais e capitalistas.

Se atentarmos para a expressão ‘política econômica’, poderemos


recuperar a afirmação de Eli Heckscher de que ‘o Estado foi o sujeito e o
objeto da política mercantilista’, isto é, o mercantilismo foi, principalmente,
a política econômica dos Estados modernos europeus, absolutistas,
embora tenhamos dúvidas quanto à afirmação do mesmo autor de que o
mercantilismo foi um ‘sistema uniforme e coerente’ (FALCON, 1996, p. 12).

O Estado Moderno e suas práticas absolutistas exerceram um papel


fundamental na expansão comercial marítima, intervindo e protegendo a economia,
mobilizando investimentos e recursos, unificando mercados e eliminando
obstáculos para o crescimento econômico. Alguns autores chamaram essas
práticas de “mercantilistas”, representando a política econômica do Estado
Moderno, que visava, por meio da economia, fortalecer seu poder. Em relação à
expansão comercial e marítima, destacamos o metalismo e o colonialismo.
Em relação ao metalismo, a expansão marítima da Europa Ocidental exigiu
uma disseminação do uso da moeda, em um processo de monetarização do
comércio e da sociedade, rompendo com a lógica de permutas e trocas. Esse
processo exigiu uma grande quantidade de cobre, ouro e prata, que, continuamente,
encontravam-se em falta no território europeu. O ouro obtido do Oriente e do norte
da África era insuficiente para a demanda de cunhagem de moedas. Esse foi, sem

28
dúvida, um elemento de incentivo às “grandes navegações” e à expansão marítima
europeia.
A configuração de um sistema-mundo foi sendo desenvolvida a partir da
colonização da América e da exploração colonial da África e da Ásia.
Segundo Falcon e Rodrigues (2006, p. 14):

Foi tão radical o deslocamento do comércio internacional, cujo centro


passou do Mediterrâneo ao Atlântico e especialmente aos portos do Mar
do Norte, que nos anais da história da Europa se lhe vem dando
tradicionalmente o nome de Revolução Comercial do Século XVI. Foi
efetivamente uma das grandes mudanças de centro de gravidade
registradas pela História [...]. Significou que, daí por diante e pelo espaço
de uns 350 anos, os grandes avanços econômicos haveriam de ser
encontrados sobretudo num raio de 500 milhas a partir da Bélgica

A cobiça europeia por metais preciosos e outros produtos considerados de


grande interesse comercial na Europa fez com que se instituíssem práticas coloniais
nesses continentes, caracterizadas pelo monopólio.
De acordo com Vilar (1981), os metais que mais despertaram a cobiça no
século XVI foram o ouro e a prata, saqueados dos astecas e incas desde os
primeiros contatos e buscados também em outras regiões. Quando as minas de
Potosi, no território do atual Peru, foram descobertas pelos europeus em 1545, o
interesse por esse metal multiplicou-se significativamente em função de seu valor
econômico.
Lembremos, portanto, que o sistema mercantilista, no qual se insere a
expansão marítima europeia, dependia de um poder centralizado, pois a
descentralização política gerava uma série de situações complexas relativas à
cobrança de impostos, taxações, problemas fronteiriços, além da ausência de
moedas. Com um Estado centralizado, houve a unificação da cobrança de impostos
e taxações, o estabelecimento de uma moeda única e a definição das fronteiras, o
que contribuiu para uma melhoria nas relações comerciais.

29
Veja, na Figura 1, a seguir, uma representação do sistema monárquico
absolutista, sua política econômica mercantilista e, nesse âmbito, onde se insere a
expansão marítima.

Fonte: www.brasilescola.com.br

30
7 A COLONIZAÇÃO E OS SISTEMAS DE TRABALHO NA AMÉRICA

A conquista da América pelos espanhóis se tratou de um longo e complexo


processo de transformações das relações de trabalho e da administração do
continente. Até então, as sociedades pré-colombianas haviam desenvolvido suas
próprias formas de se relacionar com a natureza e extrair suas riquezas. Antes da
chegada dos espanhóis, vários sistemas de trabalho já haviam despontado em
diferentes regiões do continente, bem como formas estatais singulares e diferentes
meios de administração das muitas sociedades ameríndias.
Porém, com a chegada dos espanhóis tudo foi transformado. Povos inteiros
deixaram de existir e aqueles que sobreviveram viram suas sociedades serem
adaptadas para servir aos interesses dos colonos e da coroa espanhola. Nessa
dinâmica entre conquistador e conquistado, necessidades específicas no trato da
produção colonial surgiram, fazendo com que os espanhóis desenvolvessem
soluções para otimizar o trabalho e incrementar a extração de metais preciosos e
produtos agrícolas. Com isso, frequentemente foi preciso adaptar antigas formas de
trabalho dos indígenas, desta vez sob o controle da Espanha. (PALMQUIST, 2018)
Para que o objetivo espanhol fosse atingido, criaram-se modelos
administrativos que delimitaram e consolidaram o espaço espanhol nas Américas.
Esse fato permitiu que o trabalho escravo e o trabalho compulsório fossem
implantados e largamente utilizados durante a colonização. Como resultado, houve
a desagregação das formações sociais indígenas e uma forte acumulação de capital
por parte dos conquistadores.

7.1 Divisão administrativa da América hispânica

A conquista espanhola do continente americano e o subsequente processo


de colonização provocaram a desestruturação das formas sociais tradicionais
indígenas. Isso significa que os modelos de sociedade desenvolvidos por milhares
de anos na América foram amalgamados e suplantados pelos valores, tradições e
crenças dos colonizadores. Essas grandes transformações ocorreram sobretudo

31
por meio das novas formas de trabalho impostas aos nativos, pelas constantes
guerras e pelo processo de aculturação que envolveu a evangelização dos índios
(GAMBA; PIRES, 2016; TODOROV, 2003; WRIGHT, 2006). Além disso, houve
imenso impacto biológico, por meio das doenças trazidas pelos conquistadores, que
atingiram um elevado número de indígenas e provocaram um verdadeiro genocídio
(PALMQUIST, 2018).
Portanto, novos formatos administrativos foram implementados nas
Américas a partir da chegada dos espanhóis. Novos territórios foram demarcados,
frequentemente sem levar em consideração as diferentes etnias e povos que neles
viviam. Ademais, houve a padronização da exploração do trabalho indígena, devido
à ânsia de extrair a maior riqueza possível do continente (WILLIAMS, 2012). Assim,
é possível verificar que esses fenômenos surgem atrelados à criação de espaços
coloniais articulados ao desenvolvimento das forças produtivas e espelhados nas
estruturas governamentais da metrópole (PIETSCHMANN, 2016). As duas formas
principais assumidas por esses espaços foram os vice-reinados e as capitanias
gerais.

O sistema colonial estabelecido pelos espanhóis estava estruturado


basicamente sobre a exploração de metais preciosos. Enquanto na América
portuguesa privilegiou-se inicialmente a exploração agrícola, tal modalidade foi
deixada de lado pelos espanhóis, que viam na atividade mineradora uma forma mais
lucrativa de extração de valor das colônias. Nesse sentido, algumas áreas foram
definidas como mais importantes, com destaque para as regiões do Golfo do México
e do porto de Vera Cruz, que eram mais rentáveis para a metrópole. No entanto,
em outras áreas a resistência indígena foi mais acentuada, causando conflitos

32
frequentes entre os povos nativos e os conquistadores espanhóis. Nessas regiões,
a coroa espanhola optou por criar capitanias gerais no lugar dos vice-reinados
estabelecidos em outros pontos do continente. As capitanias gerais apresentavam
a especificidade de maior autonomia, favorecendo respostas rápidas aos ataques
dos indígenas (PIETSCHMANN, 2016).
Seja como for, em um primeiro momento a divisão administrativa das
colônias espanholas se materializou em vice-reinados, mais extensos
territorialmente. Contudo, como recém-mencionado, a necessidade de manutenção
e organização de contingentes militares mais expressivos contra os indígenas
promoveu uma nova divisão, dessa vez criando as capitanias gerais. De qualquer
forma, ambas estruturas administrativas se reportavam a um órgão centralizado,
com sede na Espanha, criado em 1503, quando os espanhóis já haviam assumido
o controle total de suas possessões americanas. Esse órgão ficou conhecido como
Casa de Contratação, o qual ficava logo abaixo do rei espanhol e do Conselho das
Índias, responsável geral pela colonização e exploração das colônias e pela
nomeação de capitães gerais e vice-reis (VAINFAS, 1984).
A Casa de Contratação estava sediada na cidade espanhola de Sevilha e,
dentre suas atribuições, estava encarregada de administrar o comércio entre
colônia e metrópole, fiscalizar o recolhimento do quinto (imposto de 20% sobre os
metais preciosos extraídos) e também de operar como Corte de Justiça, para
arbitrar quaisquer conflitos jurídicos surgidos na colônia. Vale ressaltar que a
metrópole, visando assegurar seu completo domínio sobre a produção colonial,
estabeleceu um sistema chamado de “exclusivo metropolitano” (VAINFAS, 1984).
De acordo com esse sistema, as colônias podiam negociar somente com a sua
própria metrópole, no caso a Espanha.
A escolha de Sevilha para sede da Casa de Contratação não foi à toa.
Sevilha se tratava então do mais importante porto espanhol. Dessa forma, a
burguesia mercantil e marítima do país exigiu que tal porto fosse o único autorizado
a receber os navios oriundos da colônia. Assim, a burguesia espanhola garantia seu
controle absoluto sobre os negócios coloniais, fato que a enriqueceu rapidamente e
lhe conferiu poder no campo político. Portanto, além de faturar alto com a

33
exploração das colônias, a burguesia passou a influenciar diretamente na
administração da colônia, determinando nomeações, regras comerciais e a criação
de órgãos especiais para tratar dos negócios das colônias. Um desses órgãos foi o
Consulado, que se tratava de um grupo de mercadores que possuíam primazia em
explorar o comércio intercontinental (VAINFAS, 1984).
Desse modo, os espanhóis se tornaram, ao longo do tempo, beneficiários
de uma grande variedade de produtos, que iam muito além dos metais preciosos do
início da colonização:

Os produtos tropicais sempre tiveram importância na América Espanhola.


O México produzia, entre outras coisas, a cochonilha e o açúcar desde o
século XVI. Na América Central, o anil foi o produto principal de várias
regiões, como El Salvador. Na costa peruana, e noutras porções
continentais, o algodão adquiriu importância desde os fins do século XVI.
Quanto às Antilhas, destacou-se a produção do açúcar, notadamente em
Cuba durante o século XVIII. E, na mesma época, cresceram as
exportações de cacau venezuelano e do tabaco colombiano para os portos
espanhóis (VAINFAS, 1984, p. 49).

Fica claro que essa incrível gama de recursos para exploração exigia um
robusto aparato estatal para sua administração. Logo, a Espanha construiu uma
malha burocrática enorme, embora muito dinâmica, para cuidar de seus negócios
do outro lado do Atlântico.
Na própria Espanha, a estrutura administrativa era mais simples, composta
apenas pelo rei, pelo Conselho das Índias e pela Casa de Contratação. Na colônia,
ela se tornava muito mais complexa, com uma verdadeira rede hierárquica que ia
do Vice-Rei até os representantes indígenas. O Vice-Rei era responsável pela
administração geral do seu território, tendo submetidos a si quatro entes
administrativos principais. A área das finanças era administrada por um Tribunal de
Contas. No campo da justiça, havia uma instituição chamada Audiências, que por
sua vez controlava os alcaides municipais. Existia também a figura do Governador,
que cuidava dos corregedores espanhóis e indígenas. Por fim, para a defesa da
colônia, era mobilizado um exército, que se reportava diretamente ao Vice-Rei. Além
disso, paralelamente ao Vice-Rei estava a Igreja, representada pelos Arcebispados,
responsáveis por administrar os bispados e os missionários, que tinham a tarefa de
evangelizar os indígenas e construir mosteiros e conventos (Figura 1).

34
Contudo, apesar de estarem, em tese, sob o comando do Vice-Rei, as
Audiências tinham como uma de suas funções fiscalizá-lo, de forma que este não
adquirisse poderes absolutos. Para que isso fosse possível, existia o cargo de Juiz
de Residência, encarregado de apurar quaisquer irregularidades na gestão colonial.
Havia ainda a figura do Visitador, que fiscalizava tanto os órgãos administrativos na
metrópole quanto no vice-reinado. Por fim, existia uma instituição denominada
Cabildo, que funcionava como uma Câmara Municipal. Era ocupada por membros
da elite local, que não raramente acumulavam outros cargos na administração.
(PALMQUIST, 2018)

7.2 Formas de trabalho nas colônias espanholas

Diferentemente do que ocorreu no Brasil, o trabalho forçado indígena na


América hispânica foi utilizado durante todo o período colonial. A explicação mais
plausível para esse fato se desdobra a partir de dois fenômenos. O primeiro deles
diz respeito ao modo como as sociedades indígenas encontradas nas Américas
espanhola e portuguesa se posicionavam em relação ao trabalho. Povos indígenas
do Brasil viviam em sistemas comunais, em que o trabalho não era explorado por
uma classe social específica. Já nos grandes impérios encontrados pelos

35
espanhóis, a exploração do trabalho por estamentos privilegiados da sociedade era
uma das bases para a própria expansão desses impérios (CARDOSO, 1995). Esse
segundo tipo de formação social viabilizou para os espanhóis a exploração do
trabalho indígena, já que, na prática, isso significou um mero processo de troca
daqueles que oprimiam e exploravam a grande massa das sociedades nativas. No
lugar das castas sacerdotais e de nobres autóctones, entraram os espanhóis.
O segundo motivo está no fato de que a escravidão africana se tornou um
negócio bastante lucrativo a partir do século XVI, suplantando, na América
portuguesa, a utilização da mão-de-obra escrava indígena (MATOS, 2007). No
entanto, devido à diversidade de climas, topografias e tipos de mão-de- -obra
disponíveis, diferentes modalidades laborais surgiram na América espanhola.
Assim, o trabalho indígena foi exigido de maneiras diferentes de acordo com o tipo
de produto a ser explorado e a conformação das relações de produção. As principais
matrizes produtivas se enquadraram dentro dos sistemas de plantation,
encomienda e repartimiento, analisados caso a caso a seguir.

7.2.1 A produção de plantation

A implantação do sistema de plantation foi mais comum na produção de


algodão no sul dos Estados Unidos e na produção açucareira no Brasil. No entanto,
ele também foi largamente utilizado pelos espanhóis em suas colônias das Antilhas,
que correspondem aos atuais territórios de Cuba, República Dominicana, Ilhas
Venezuelanas e Porto Rico. Esse sistema consistia em grandes plantações do
mesmo tipo de produto agrícola, isto é, um sistema latifundiário e monocultor. Outro
importante produto extraído da terra, além dos já mencionados algodão e cana-de-
açúcar, foi o café. A principal força de trabalho do sistema de plantation foi a mão-
de-obra escrava (WILLIAMS, 2012).
Desde o fim da Idade Média, portugueses e espanhóis ensaiavam
procedimentos de conquista colonial. Inicialmente, as Ilhas da Madeira (Portugal) e
as Ilhas Canárias (Espanha) serviram como laboratório para a instalação de

36
plantations. Portanto, no contexto de expansão dos estados-nação ibéricos, a partir
dessas ilhas houve a aquisição de experiência nesse modelo de produção agrícola,
que viria a ser implantado posteriormente nas colônias americanas (MINT, 2008).
As plantations foram utilizadas em todo o mundo colonial, desde a Ásia,
passando pela África e chegando às Américas. Contudo, dois modelos de
exploração laboral completamente diferentes foram aplicados. Enquanto na Ásia e
na África preponderou o trabalho assalariado, nas Américas foi o trabalho escravo
e/ou compulsório que vigorou com mais força. Exemplificando, nas plantações de
seringueira (borracha) da Malásia, nas plantações de chá de Assam (Índia) e no
cultivo de palmeiras em Camarões, os trabalhadores eram nativos, livres e recebiam
algum tipo de remuneração pelo seu trabalho.

Por outro lado, o padrão predominante do desenvolvimento da plantation


[nas Américas] foi completamente diferente: a propriedade da terra era
gratuita ou muito barata, e a mão-de-obra era geralmente trazida do
ultramar. [...] Se se considerarem os porto-riquenhos levados para o Havaí
para o cultivo e o corte de cana [...], os trabalhadores chineses
“contratados” [semiescravizados] em Cuba [...] e, acima de tudo, os
africanos escravizados e seus descendentes que guarneceram as
plantations no Brasil, no Caribe e no sul dos EUA, temos que a maioria das
plantations desde o século XV foi provida por povos de outros lugares
(MINT, 2008, p. 133).

Dessa forma, além de constatarmos que as plantations foram, em grande


parte, uma das mais relevantes estruturas produtivas a estimular o tráfico de
escravos africanos, é possível afirmar que, embora criada pelos europeus para
atender objetivos comerciais da Europa, a plantation acabou por promover uma das
maiores diásporas das histórias.

7.2.2 A encomienda

Embora predominante no sistema de plantation, a mão-de-obra escrava


africana, em balanço final da colonização espanhola nas Américas, correspondeu a
uma pequena parte (KLEIN, 1987). A mão-de-obra mais utilizada pelos espanhóis
foi a indígena, em sistemas assemelhados à servidão. De acordo com Bethell
(1998), tanto na mineração quando na agricultura, os índios foram obrigados a

37
trabalhar nos regimes de encomienda e repartimiento, encontrados somente nos
domínios hispânicos. Esses sistemas não foram aplicados de maneira homogênea
nas colônias, mas contribuíram decisivamente para a consolidação do poder da
coroa espanhola sobre os nativos, fato que colaborou para a redução drástica das
populações indígenas (PALMQUIST, 2018).
A primeira metade do século XVI teve a encomienda como a forma
prevalente de trabalho forçado nas colônias. Ela sempre foi aplicada em regiões
onde a população indígena já estava estabelecida, devido à facilidade de transpor
esses trabalhadores, que já atuavam em sistemas exploratórios autóctones, para a
nova configuração das relações de produção.
A encomienda funcionava mediante um acordo entre o colono e a
metrópole. As terras recebidas pelo colono abrigavam comunidades indígenas
inteiras e a coroa espanhola autorizava que o novo proprietário explorasse o
trabalho de todos os indígenas que estivessem assentados em sua propriedade
(Figura 2). Esses colonos se tornavam, portanto, os encomenderos, possuindo,
além do direito de exploração do trabalho, o direito de cobrar tributos dos indígenas,
que eram pagos em espécie. Ou seja, no sistema de encomienda, os índios, além
de serem forçados a ceder sua força de trabalho, também eram obrigados a pagar
impostos ao encomendero (COGGIOLA, 2011).

38
No entanto, os encomenderos não tinham o direito de usar diretamente as
terras nas quais os índios estavam assentados. Era permitido somente forçá-los a
trabalhar nelas e obter o fruto do trabalho, sem a intervenção direta na terra. Por
outro lado, havia uma justificativa ideológica para que a cobrança de tributos se
tornasse possível: a evangelização dos índios. O encomendero, em troca dos
impostos recolhidos, era obrigado, pela coroa e pela Igreja, a fornecer a catequese
para os indígenas. Dessa forma, ficava estabelecido que era justo cobrar o tributo,
já que ele era revertido na salvação das almas dos nativos, considerados pagãos.
Além disso, era responsabilidade do encomendero providenciar a alimentação dos
trabalhadores sob o sistema de encomienda (COGGIOLA, 2011).
No final do século XVI, a encomienda passou a declinar, em função de uma
nova postura da coroa espanhola, que passou a se encarregar diretamente do
controle sobre os povos indígenas. O objetivo dessa mudança era forçar o
deslocamento dos índios para os arredores das cidades coloniais, abrigando- -os
nos chamados corregimientos, locais de concentração dessa população deslocada
para que ficasse supervisionada e disponível para o trabalho na mineração e
produção de alimentos (BAKEWELL, 1998).

7.2.3 O repartimiento

Como resultado dos deslocamentos indígenas para as cidades, uma nova


forma de exploração do seu trabalho surgiu: o repartimiento. Em termos gerais, isso
consistia na obrigação do pagamento de tributos por meio do trabalho. O
repartimiento nada mais era do que uma nova versão das práticas tradicionais de
trabalho forçado existentes nos impérios pré-colombianos, equivalendo à chamada
mita, que vigorou no Império Inca, e ao chamado cuatequil, utilizado no Império
Asteca. Assim, houve uma adequação dos antigos métodos ao contexto colonial.
Dessa forma, ficou estabelecido que cada comunidade indígena deveria indicar
homens adultos para trabalhar nas minas e nas obras conduzidas pelo governo. Em
contrapartida, o governo espanhol fornecia alimentação e um salário irrisório. Além

39
disso, liberava da obrigação de pagar o tributo aqueles caciques que indicassem os
trabalhadores. Assim, os indígenas se tornavam cada vez mais dependentes do
colonizador (VIEIRA, 2017).
Essa nova forma de trabalho teve impactos significativos sobre a sociedade
indígena, causando uma maior deterioração de sua cultura. No sistema de
encomienda, os indígenas tinham a possibilidade de produzir sua própria
alimentação, por exemplo. Também eram capazes de produzir seu próprio
vestuário, suas habitações, enfim, possuíam um grau expressivo de
autossuficiência. Já no repartimiento, essa relativa autonomia desapareceu por
quase completo (COGGIOLA, 2011).
A transposição de aldeias inteiras somada à prática do repartimiento foi o
golpe fatal na organização social e nos vínculos comunitários indígenas. Mesmo
aqueles índios que tentavam retornar para suas comunidades não obtinham
sucesso na empreitada. Em muitos casos, elas deixavam completamente de existir,
não somente pelo fato de terem sido transplantadas em sua maior parte para outras
localidades, mas pelo trabalho ativo dos espanhóis em inviabilizar sua existência.
Isso era feito pela destruição dos campos em torno das zonas originais de habitação
dos índios, de forma que não fosse mais possível produzir alimentos, eliminando as
chances de reagrupamentos. Unido a isso estava o fato de que os mitayos como
eram conhecidos os homens escalados para o trabalho no regime de repartimiento
acabavam por se fixar nos locais de trabalho, desligando-se permanentemente de
suas origens (VIEIRA, 2017).
Em meados do século XVII, o repartimiento evoluiu para uma nova forma
mascarada de exploração do trabalho. Justamente pelo fato dos índios serem
arrancados de suas comunidades originais, tornando-se privados de garantir sua
própria subsistência, os proprietários passaram a pressionar a coroa espanhola por
um novo modelo de contrato de trabalho, pois queriam evitar o compromisso de
fornecer o básico para a sobrevivência dos trabalhadores.

Em 1632, a coroa ratificou este sistema novo de trabalho, ou seja, a


supressão do repartimento forçoso dos trabalhadores agrícolas, e aprovou
a contratação voluntária dos mesmos mediante o pagamento de uma
jornada. Assim, os proprietários de grandes haciendas agrícolas e
pecuárias puderam dispor, pela primeira vez, de uma força de trabalho

40
permanente, não escrava, ao longo de todo ano. A expansão territorial da
hacienda se reforçou com a aquisição destes trabalhadores que, a partir
de 1630 em diante, passaram a residir e a se reproduzir nos confins
territoriais da propriedade, constituindo a peonagem encasillada
(classificada), trabalhadores que praticamente careciam de toda liberdade
de movimento (COGGIOLA, 2011, documento on-line).

Assim, os indígenas se tornaram “livres” para trabalhar da forma que


considerassem mais apropriada, servindo ao patrão que oferecesse melhores
condições. Na verdade, essa condição de liberdade existia somente no papel, já
que, para sobreviver, os indígenas precisavam se sujeitar a longas e degradantes
jornadas de trabalho, invariavelmente mal remuneradas. Contudo, esse foi o fim do
regime de repartimiento.

8 O TRABALHO COMPULSÓRIO NA AMÉRICA ESPANHOLA

Em um primeiro momento, é natural que surja a seguinte questão: tendo em


vista que a colonização do continente americano foi realizada por europeus, por que
o trabalho duro foi realizado por indígenas e africanos? Essa pergunta não é simples
e sua resposta passa por uma série de determinações históricas que moldaram o
trabalho compulsório na América colonial. Cumpre esclarecer que o conceito de
trabalho compulsório abarca toda forma de trabalho forçado, desde a escravidão
até a encomienda e o repartimiento (PAIVA, 2005).
Portanto, é preciso diferenciar as formas principais de trabalho compulsório
encontradas durante o período analisado. Por um lado, houve o trabalho escravo
africano, encontrado sobretudo no sistema de plantation. Por outro, encontra-se o
trabalho compulsório indígena, que se manifestou principalmente nos regimes de
encomienda e repartimiento. A escravidão prevaleceu no sul dos Estados Unidos,
em alguns pontos do Caribe e no Brasil. Na América espanhola, ocorreu a
preponderância de variantes da servidão, em que os indígenas, estruturalmente
forçados a trabalhar, recebiam alguma forma de compensação pelo trabalho
dispensado (SCHWARTZ; LOCKHART, 2002).
A escravidão africana se tornou um lucrativo negócio que vigorou por quase
400 anos. Há estimativas de que, entre os séculos XVI e XIX, mais de 12 milhões

41
de pessoas tenham sido aprisionadas na África e trazidas para a escravidão nas
Américas. Dessa forma, houve uma imposição comercial da escravidão africana no
continente. As classes proprietárias lucravam de duas formas com a escravidão:
pelo trabalho do escravo em si e também pela sua comercialização. Portanto, esse
é um dos aspectos que nos ajuda a compreender a primazia do trabalho dos
africanos sobre o dos europeus, provocando uma cisão entre brancos e negros com
larga duração histórica. Esse é um problema secular da história brasileira, por
exemplo, que não foi devidamente resolvido até hoje e que se manifesta no dia a
dia de qualquer cidade do país, seja por meio do racismo, da desigualdade social
ou dos inúmeros problemas sociais que afetam em maior parte a população negra
do Brasil (GOTO, 2013).

Além disso, no contexto do capitalismo mercantil, os recursos europeus


ainda eram escassos, se comparados às riquezas que viriam a ser geradas a partir
da Revolução Industrial. Como os escravos representavam, inicialmente, uma
mercadoria de pouco valor, a sua compra era facilitada aos exploradores dos
recursos do continente americano, que em seguida transformavam esse pequeno
investimento em grandes lucros.

O tráfico converteu a mão-de-obra africana, adquirida através de


mercadorias de pouco valor, em metais preciosos das Américas, ou em
especiarias ou drogas americanas além de açúcar, tabaco, cacau e
finalmente café que valiam moeda corrente ou notas que podiam ser
trocadas por moeda (MILLER, 1997, p. 34).

42
Portanto, foi com essas características que o trabalho escravo africano foi
implantado nas colônias das Américas. Atuaram como propulsores desse tipo de
comércio e de trabalho os portugueses e holandeses, em primeiro lugar, seguidos
pelos ingleses, quando instalaram o sistema de plantation em São Domingos (Haiti)
e na Jamaica (MARIANO; FERRO, 2014).
O recrudescimento do trabalho escravo africano se deu no contexto da
produção em larga escala de produtos agrícolas para abastecimento do mercado
europeu, revolucionado pelo advento da industrialização. Daí a criação dos grandes
latifúndios, especializados no cultivo de um único produto. Eram grandes extensões
de terra, que permitiam grande produtividade. Ao mesmo tempo, devido ao tamanho
da produção, fazia-se necessário um grande contingente de mão-de-obra,
constituída basicamente de escravos. Afinal, estes se apresentavam
economicamente muito mais vantajosos para os grandes proprietários, já que seu
custo era menor que o exigido por um trabalhador livre branco (WILLIAMS, 2012).
Em relação ao trabalho indígena, é possível afirmar que ele se manifestou
de diversas formas dependendo da época e do local. Sua variedade ocorreu em
função de dois fatores principais: pelas particularidades regionais e pela quantidade
de habitantes na zona onde se desenvolvia a colonização. Um exemplo que ajuda
a elucidar esta última característica é o das ilhas caribenhas. Logo após a chegada
dos conquistadores europeus, a população indígena local ainda era expressiva, o
que não duraria muito, com sua quase completa dizimação provocada no desenrolar
da conquista. Portanto, havia uma oferta enorme de mão-de-obra, prontamente
escravizada pelos colonizadores. Nesse contexto específico, a implementação da
escravidão como modelo de trabalho teve a ver com a abundância de braços
trabalhadores. Na sequência, com a queda acentuada da população, novas formas
de exploração do trabalho foram sendo implementadas (SCHWARTZ; LOCKHART,
2002).
As características regionais também influíram no estabelecimento deste ou
daquele tipo de trabalho. Nas minas, em geral, o trabalho foi realizado em variantes
da servidão, como a encomienda em um primeiro momento e o repartimiento

43
suplantando-a posteriormente. Já no regime de plantation, a forma tradicional de
labor foi a escravidão.
No século XVI, no momento em que a colonização se organizava com
rapidez, foi instituída a encomienda, que combinava elementos do feudalismo
europeu com formas tributárias dos impérios pré-colombianos. O critério para a
escolha dos encomenderos, isto é, os colonos era o serviço que haviam prestado
ao rei da Espanha. Portanto, quanto mais leal e ativo fosse o colono, mais chances
teria de se tornar um encomendero. A honraria era muito desejada, não somente
pelo prestígio que conferia ao agraciado, mas pela possibilidade de fazer fortuna
rapidamente (TODOROV, 2003).
No entanto, o sistema de trabalho por encomienda, devido à sua própria
natureza superexploratória, acabava por exaurir os indígenas, fato que, aliado à sua
baixa imunidade frente às doenças trazidas da Europa, causava severa
mortandade. Assim, os recursos humanos foram se tornando cada vez mais
escassos para que o sistema de encomienda pudesse se manter. A coroa
espanhola foi obrigada a intervir, no sentido de criar mecanismos que protegessem
minimamente os indígenas, evitando as grandes mortandades que prejudicavam a
produção. O trabalho africano foi uma das formas de suprir essa escassez de
trabalhadores, principalmente no vice-reino de Nova Granada. Porém, na maior
parte da América espanhola a solução foi encontrada na criação de um novo modelo
de trabalho chamado de repartimiento (TODOROV, 2003).
Em 1542, foram promulgadas novas legislações, que ficaram conhecidas
como Leyes Nuevas, segundo as quais ficava proibida a escravidão indígena e
colocava-se um ponto final no sistema de encomienda. Assim surgiu o
repartimiento, uma forma de trabalho diferente da escravidão e da encomienda, já
que os trabalhadores desfrutavam de maior autonomia. Em meados do século XVI,
foram descobertas grandes minas de prata no México (Zacatecas) e nos Andes
(Potosí). A forma de trabalho típica dessas minas foi o repartimiento, que forçava a
indicação de trabalhadores pelos chefes das aldeias como forma de tributo. Esse
sistema durou até o século XVII, e acabou sendo substituído por um novo sistema,

44
quase liberal, em que os indígenas já não tinham mais nenhum vínculo com os
patrões (COGGIOLA, 2011).
Conforme examinado neste capítulo, a conquista da América pelos
espanhóis apresentou particularidades que a contrapõe ao processo de colonização
de outros países europeus no continente. A forma de divisão administrativa, por
exemplo, foi muito diferente das realizadas na América portuguesa, francesa e
inglesa. Os territórios hispânicos nas Américas foram divididos em vice- -reinados,
que possuíam uma complexa estrutura hierárquica e administrativa.
Posteriormente, alguns desses vice-reinados ainda teriam algumas partes
desmembradas em capitanias gerais, que se mostravam mais adequadas para o
enfrentamento militar em relação aos indígenas.
As colônias espanholas também exploraram de maneira diversa o trabalho
dos índios. A escravidão africana nessas colônias foi muito menor do que a
encontrada nos Estados Unidos, no Caribe e no Brasil. Os espanhóis criaram
sistemas que foram utilizados somente em suas possessões, como a encomienda
e o repartimiento, diferenciando-se dos outros conquistadores europeus.

9 A FORMAÇÃO DA AMÉRICA PORTUGUESA

9.1 Contexto da chegada dos portugueses na América

O período que abarca os séculos XV e XVI dá início às grandes


transformações que moldaram o mundo moderno e contemporâneo. Foi nessa
época que os europeus pelo pioneirismo de Espanha e Portugal lançaram-se ao
mar em busca de novos territórios e possibilidades comerciais, chegando às
Américas. Na sequência, todas as regiões do globo foram atingidas pelo
empreendimento náutico da Europa, gerando novas concepções geográficas e a
assimilação de culturas até então desconhecidas pelos europeus.
Naquela altura do desenvolvimento histórico da Europa, muito já se sabia a
respeito da África e da Ásia, mas, mesmo assim, esse muito ainda era pouco em
relação ao que seria obtido a partir das grandes navegações. No período do Império

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Romano expandido até o Oriente Médio e com algumas incursões pelo interior
asiático já estavam disponíveis informações preciosas sobre as outras porções
territoriais quase que integralmente desconhecidas na Europa. Esse conhecimento
serviu como guia para as Cruzadas (séculos XI–XIII), por exemplo, que buscavam
retomar o controle cristão sobre Jerusalém. De modo similar, os romanos haviam
realizado expedições ao longo do Nilo, penetrando até a metade do território
africano, contudo sem conquistá-lo. No século XIII, as viagens de Marco Polo
haviam municiado mercadores italianos com relatos sobre a China. Em pleno século
XIV, contudo, esse conjunto de informações era esparso e fragmentado, somado
ao total desconhecimento das terras americanas (BRAUDEL, 1970).
No momento em que Portugal e Espanha iniciaram sua jornada em busca
de novos territórios, pode-se afirmar que era quase impossível prever o que se
encontraria. A motivação de portugueses e espanhóis era encontrar um caminho
alternativo para as Índias, já que havia um bloqueio árabe no Mediterrâneo. No
entanto, o termo Índias compreendia a ideia da Ásia inteira. Assim, China, Japão e
outros territórios incluíam-se nessa noção vaga sobre as terras buscadas pelos
navegantes ibéricos (BRAUDEL, 1970).
A principal razão para que os europeus procurassem desesperadamente
um novo caminho até o Oriente residia em questões econômicas. O comércio com
mercadores orientais crescia a olhos vistos; porém, com os bloqueios impostos no
Mediterrâneo, o fluxo de mercadorias foi drasticamente reduzido, causando graves
problemas de abastecimento na Europa. É interessante notar que, nesse período
anterior à Revolução Industrial e ao colonialismo, eram os europeus que dependiam
das mercadorias asiáticas para a movimentação de seu mercado interno, controlado
pelos negociantes genoveses e venezianos (BRAUDEL, 2016).
Os produtos mais importantes, transportados através de uma longa rede
desde o Extremo Oriente, passando pela Índia e chegando ao Mediterrâneo, eram
as chamadas especiarias e as pedras preciosas, com destaque para as primeiras
nesse comércio. Segundo Braudel (2016), a categoria reunia quase 300 tipos de
produtos, conforme registrado em catálogos de venda do século XIII.

46
Assim, devido à cada vez mais significativa carestia desses produtos, a
necessidade de se encontrar uma rota alternativa para o Oriente se tornou uma
imposição histórica. Mas você deve se perguntar as razões pelas quais Portugal se
lançou nessa tarefa bem antes dos outros reinos europeus. A resposta pode ser
resumida em três pontos (CARDIM, 1998):

 Sua centralização política precoce;


 O contexto político dos países centrais da Europa;
 Sua localização geográfica privilegiada.

Portugal, ao contrário da maioria dos países europeus, definiu suas


fronteiras já no século XIII. Isso ocorreu porque anunciando as monarquias
absolutistas que surgiriam logo à frente Portugal instituiu precocemente um regime
de governo bastante centralizado. Portanto, as estruturas administrativas e políticas
se reportavam a um único e poderoso rei, diferentemente de regiões como a da
atual Alemanha, divididas então em centenas de pequenos reinos e principados.
Evidentemente, as políticas e as decisões do monarca nesse sistema se tornavam
mais ágeis e de implementação imediata (CARDIM, 1998).
Um dos fatores mais importantes para que isso se tornasse possível foi a
luta local de séculos contra a ocupação árabe, iniciada a partir do século VIII. A
guerra contra os invasores foi permanente, arregimentando diversos contingentes
da população, o que levou a uma união entre pobres e ricos contra os infiéis. Aliás,
a luta dos portugueses contra os muçulmanos era dupla. Era um embate que
envolvia tanto a ocupação territorial quanto uma dinâmica de guerra entre a fé cristã
e o invasor de outra religião. Porém, o ponto mais importante desse conflito, além

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dos já citados para a formação do reino unificado, foi a formação de uma nobreza
militar. Esta, alinhando-se de maneira hierárquica, comum ao militarismo, encontrou
no rei o seu líder supremo. Logo, o país se definiu em torno de uma monarquia forte,
pronta para defender os interesses dos portugueses, tanto na esfera militar quanto
na econômica, ambas essenciais para o início das grandes navegações de Portugal
(MONTEIRO, 1996).
No século XV, a economia europeia encontrava-se fortemente abalada por
uma série de fatores originados no século anterior. A produção agrícola apresentava
forte declínio, representando uma crise de abastecimento. A mão-de-obra estava
em queda, devido ao rescaldo da Peste Negra, que havia vitimado dezenas de
milhões de pessoa, causando um forte impacto sobre os índices populacionais na
Europa. Além disso, a Guerra do Cem Anos (1337–1453) havia causado sérios
danos nas economias e nas sociedades dos dois principais reinos envolvidos,
França e Inglaterra. Por fim, as reservas de ouro e prata do continente haviam se
esgotado, causando impacto na cunhagem de moedas e afetando duramente a
economia (WALLERSTEIN, 2004).
Como resultado imediato, os países centrais da Europa estavam
desestruturados, com poucas perspectivas de crescimento. Foi nesse cenário que
Portugal se destacou e teve forte protagonismo. O passo natural foi procurar
soluções fora do território da Europa, voltando-se inicialmente para a África. Nesse
contexto, os portugueses perceberam que, ao instalar bases no norte da África,
teriam acesso ao ouro da região do Sudão e da Etiópia e ao mesmo tempo poderiam
interceptar as rotas comerciais do Saara. Desse modo, a economia voltaria a
prosperar e seria possível garantir um papel para a nobreza militar sedenta por
combates (WALLERSTEIN, 2004).
A historiografia tem demarcado o ano de 1415 como o marco inicial da era
das grandes navegações e descobrimentos. Naquele ano, Portugal se apossou de
Ceuta, uma cidade estabelecida na região do Estreito de Gibraltar, local privilegiado
para o controle da costa ocidental africana. A conquista se deu no contexto da
dinastia da Avis, que iniciou a modernização e a expansão ultramarina de Portugal.
O rei D. João I (décimo rei de Portugal e o primeiro da Casa de Avis), buscando

48
prestígio, decidiu conquistar uma cidade muçulmana, garantindo assim uma vitória
sobre os “infiéis” ao mesmo tempo em que se apossava de local estratégico para a
navegação na costa da África. D. João I liderou em pessoa a conquista de Ceuta,
acompanhado se seus filhos, sendo o mais importante deles o Infante D. Henrique
(Figura 1). A incumbência de realizar novas conquistas marítimas lhe seria atribuída
pelo pai, fato que resultou na descoberta das ilhas da Madeira, Canárias e dos
Açores, que foram povoadas, passando a produzir alimentos para Portugal. Além
disso, essa primeira experiência de colonização além-mar serviu como um
importante laboratório para as conquistas coloniais portuguesas no século seguinte
(MICHELAN, 2013).

É claro que a vontade política e as crises que assolavam a Europa foram


fundamentais para o avanço português pelo Atlântico. Entretanto, como visto na
fácil conquista de Ceuta, a posição privilegiada do reino de Portugal, na ponta da
Península Ibérica, projetado em direção ao mar, facilitou em muito a aventura dos
portugueses, que assim se tornaram os pioneiros na empreitada marítima e colonial.
A partir de então, o Infante D. Henrique coordenaria por muitas décadas o

49
empreendimento de avanço de Portugal em direção ao sul do Atlântico (JOÃO,
2004).
No entanto, diversas superstições a respeito dessa região totalmente
desconhecida ao sul do Cabo do Bojador situado no extremo ocidental da África e
ainda não cruzado pelos portugueses retardavam o processo. Por fim, quando
Portugal finalmente conseguiu ultrapassar esse último obstáculo, após 12 anos de
insistência de D. Henrique, as portas para a conquista de territórios distantes,
inclusive o Brasil, estavam abertas para os portugueses (JOÃO, 2004).

9.2 A chegada de Cabral à América e o início da colonização

Após a superação do primeiro grande desafio de navegação que foi


atravessar o Cabo de Bojador, os portugueses navegaram cada vez mais ao sul da
costa africana, deparando-se por fim com o Cabo das Tormentas, como era
conhecida a parte mais meridional do continente. Em 1488, o navegador Bartolomeu
Dias (1450–1500) finalmente conseguiu dobrar o Cabo, que passaria a ser chamado
de Cabo da Boa Esperança, devido às novas e grandes possibilidades abertas pela
sua navegação. Pela primeira vez os europeus conseguiam estabelecer uma
ligação marítima direta entre o Atlântico e o Índico. Esse fato, de suma importância
naquele contexto, significava na prática que o “caminho das Índias” estava
inaugurado, auspiciando excelentes negócios para o ramo das especiarias do
Oriente (PARZEWSKI, 2007).
Pouco tempo depois, outros grandes navegadores, a soldo do reino
português, passaram a realizar o trajeto até o Oriente, destacando-se Vasco da
50
Gama (1469–1524), que teria importância razoável para a chegada de Pedro
Álvares Cabral (1467–1520) ao Brasil, já que este fora orientado por suas dicas de
navegação para o extremo sul africano. Vasco da Gama aguardou Bartolomeu Dias
retornar de sua viagem pioneira para que pudesse se lançar também em direção à
Índia. De posse das preciosas informações trazidas por Dias, zarpou de Lisboa em
julho de 1497 capitaneando uma frota de quatro navios, fortemente armada com 20
canhões (PARZEWSKI, 2007).
Vasco da Gama aportou em Calicute, na costa ocidental da Índia, quase um
ano depois, em maio de 1498. Embora a viagem de ida tenha sido muito difícil, na
qual a frota fora recebida com hostilidade em quase todos os portos pelos quais
passou, o retorno se mostrou relativamente fácil, muito por conta dos navegadores
já conhecerem bem o caminho. Vasco da Gama aportou em Lisboa em setembro
de 1499. Como saldo, havia perdido dois navios da frota e mais de cem homens. Já
do ponto de vista econômico, a expedição fora absolutamente exitosa. Além de
determinar com precisão a rota marítima para o Oriente, Vasco da Gama trouxe
uma considerável carga de produtos que renderiam muito dinheiro para a coroa
portuguesa (PARZEWSKI, 2007).
Tendo descoberto o mais preciso e seguro caminho para as Índias, Vasco
da Gama foi procurado por outros navegadores em busca de seus conhecimentos.
Um desses navegantes foi Pedro Álvares Cabral, que aprendeu com o pioneiro a
navegar inicialmente até a Ilha de Santiago, para em seguida afastar-se da costa
africana fazendo a chamada “volta do mar” para longe da mortal costa da Namíbia
e também para escapar das calmarias e pegar ventos de nordeste realizando uma
espécie de arco no Atlântico até aproximar-se novamente da África (PARZEWSKI,
2007).
A partir daí, chegaria ao Cabo da Boa Esperança e poderia dobrá-lo em
direção ao Índico. No entanto, ao tentar realizar a manobra ensinada pelo seu
mentor, Cabral teria se afastado excessivamente da costa africana, tendo, dessa
forma, encontrado as terras meridionais da América. A sua frota era enorme, com
13 navios, mais de 1.500 tripulantes e com víveres que os permitiriam navegar por
mais de um ano sem aportar. Cabral saiu de Lisboa em 9 de março de 1500,

51
chegando ao Brasil em 22 de abril do mesmo ano. Todavia, devido ao grande
entusiasmo português com a descoberta da rota marítima para o Oriente e com
todos os seus lucros previstos as novas terras “descobertas” por Cabral não
despertaram interesse imediato. Não à toa, após dez dias de sua chegada ao novo
continente, Cabral retomou sua viagem às Índias, chegando em Calicute em agosto
de 1500 (SILVA, 1990).

Foi somente três anos depois que o então rei D. Manuel (1469-1521)
determinou que as novas terras encontradas pela coroa fossem arrendadas, no que
se seguiu a instalação de feitorias, ao modo das que os portugueses vinham
instalando na África. Portanto, não se tratava ainda de um processo de colonização,
mas uma forma de iniciar a extração de riquezas do novo território sem ocupá-lo de
fato (SILVA, 1990).
O primeiro produto a ser explorado pelos portugueses foi um tipo de árvore
chamada pau-brasil. Sua importância comercial estava na tinta vermelha que podia
ser extraída da madeira e que servia para tingimento e pinturas em geral. Portanto,

52
a lógica de exploração nesse momento ainda correspondia ao tipo de produtos que
os portugueses buscavam nas Índias. O corante obtido era levado até a região da
atual Bélgica para serem processadas em feitorias portuguesas naquele país. O
pau-brasil era obtido pelo sistema de escambo (uma forma de troca) com os
indígenas. O escritor francês Jean de Léry (1534–1611), que esteve no Brasil em
meados do século XVI, durante a ocupação francesa na atual região do Rio de
Janeiro (França Antártica), registrou o modo como o comércio de pau-brasil ocorria
entre índios e europeus:

Os selvagens, em troca de algumas roupas, camisas de linho, chapéus,


facas, machados, cunhas de ferro e demais ferramentas trazidas por
franceses e outros europeus, cortam, serram, atoram e desbastam o pau-
brasil, transportando-o nos ombros nus às vezes de duas ou três léguas
de distância, por montes e sítios escabrosos até a costa junto aos navios
ancorados, onde os marinheiros os recebem (LÉRY, 1980, p. 168).

Como visto, durante o século XVI outros exploradores europeus visitavam


e se instalavam nas terras descobertas por Portugal, em busca das riquezas típicas
da região (Figura 3). O objetivo, em geral, era obter matérias-primas para as
nascentes manufaturas têxteis da Europa. Além disso, com a circulação de notícias
da descoberta de metais preciosos na América espanhola, outras coroas europeias
manifestaram o interesse de se apossarem das terras brasileiras. A partir dessas
ameaças, o rei D. João III (1502–1557) adotou medidas para proteger os novos
territórios, criando as chamadas
capitanias hereditárias (SILVA,
1990).
A partir da década de
1530, o rei passou a escolher
alguns súditos leais (e ricos) para
os quais fazia a doação de uma
extensa faixa de terra nos novos
domínios. Cada um desses súditos
passava a ser conhecido como
“capitão donatário”, tendo como

53
responsabilidade investir capitais para desenvolver a produção econômica nas
terras que lhe cabiam. Dessa forma, o negócio se tornava bom para ambos os lados.
A coroa não precisaria dispor de recursos para manter e desenvolver as novas
terras, já o capitão donatário usufruía da posse de terras quase do tamanho do
território de Portugal, com a vantagem de deixá-las para seus herdeiros, tendo em
vista que a doação era, como dizia o nome, hereditária (SILVA, 1990).
Ademais, o capitão donatário tinha poderes totais sobre a sua capitania,
tanto no aspecto político quanto judicial. Ele também se tornava um chefe militar, já
que uma de suas atribuições era manter o domínio português sobre a região. Assim,
a figura do capitão donatário se tornou a mais importante no que concerne à defesa
do território português nas Américas, já que lutava ao mesmo tempo contra invasões
estrangeiras e contra constantes ataques indígenas. Nesse sentido, a historiografia
tem refletido longamente sobre o caráter da chegada e domínio dos portugueses no
Brasil, classificando-os por vezes como descoberta e em outras como achamento;
como encontro ou contato; ou então como invasão e conquista (GOMES; ROCHA,
2016).
Entretanto, na mesma medida era necessário tornar as terras lucrativas.
Para isso, os donatários precisavam organizar um aparato administrativo eficiente,
que tornasse viável a exploração comercial da colônia. Após o ciclo do pau-brasil,
um novo modelo produtivo foi instalado pelos capitães donatários: os engenhos de
cana-de-açúcar. Esse advento transformaria totalmente a relação da metrópole com
a colônia, pois foi assim que os novos domínios passaram a ser lucrativos de uma
maneira expressiva, o que também levou ao surgimento do tráfico de escravos
africanos. Após algumas décadas de subaproveitamento das terras americanas, a
colonização agora se tornava um fato (SILVA, 1990).
Porém, ao fim e ao cabo, o sistema de capitanias revelou-se incapaz de
desenvolver a colônia como Portugal esperava. Das 14 capitanias, somente as de
São Vicente e de Pernambuco atingiram níveis satisfatórios de prosperidade.
Alguns dos capitães donatários nem chegaram a vir para o Brasil, permanecendo
em Portugal. Assim, a partir de 1540 a coroa combinou o sistema de capitanias com
o regime de administração centralizada. No entanto, mesmo com essas

54
transformações o sistema de capitanias vigoraria até o século XVIII (FAUSTO,
1995).
A centralização administrativa se manifestou na forma de um governo-geral,
com sede na Bahia e criado em 1548. Diversos fatores fizeram com que Portugal
optasse por esse novo tipo de governo nas colônias. As tentativas de invasão
estrangeira se tornavam cada vez mais frequentes. Por outro lado, os conflitos com
os indígenas não arrefeciam. Por fim, a descoberta de prata no Peru e a
subsequente conquista do território pelos espanhóis colocavam esses adversários
coloniais muito próximos aos domínios portugueses (FAUSTO, 1995).
Tomé de Sousa (1503–1579) foi escolhido como o primeiro Governador- -
Geral, com a missão de centralizar as ações entres as capitanias. Souza possuía
vasta experiência, tendo servido na Índia, fato que colaborou para sua nomeação e
pelo trabalho que conseguiria realizar, tornando mais “profissional” a administração
da colônia. Na sua passagem pelo governo, Tomé de Sousa criou o primeiro
bispado do Brasil, em 1551, e forneceu as condições para que a chegada de
escravos africanos se tornasse regular (FAUSTO, 1995).
Portanto, o sistema de capitanias foi extremamente relevante para o
desenvolvimento da empresa colonial brasileira. Da mesma forma, dois de seus
principais atributos representam algumas das mais consistentes permanências
históricas do Brasil. As capitanias se estruturaram sobre a posse de grandes
extensões de terra, isto é, em latifúndios, que ainda são uma característica
marcante da propriedade rural no país. Outro aspecto foi justamente a consolidação
do trabalho escravo negro, que cinco séculos depois ainda se expressa
residualmente em nossa sociedade, seja na imensa desigualdade social, seja na
violência e exclusão que atingem os negros brasileiros (FAUSTO, 1995)

9.3 A relação dos jesuítas com os indígenas

A “descoberta” do Novo Mundo causou grande impacto político e econômico


na Europa (PARZEWSKI, 2007). Igualmente impactante foi a constatação de que
milhões de pessoas viviam do outro lado do Atlântico, abrindo possibilidades em

55
todas as esferas da sociedade europeia. Nesse sentido, a religião também foi uma
das esferas afetadas pelas notícias que chegavam da América. Afinal, os povos
indígenas eram considerados pagãos, isto é, sem religião, fato que movimentou a
Igreja no sentido de procurar assumir o protagonismo na condução dos negócios
indígenas e levar a cabo a missão de evangelizá-los (PAIVA, 1982).
Diversas ordens religiosas enviaram membros para as Américas, como os
dominicanos, agostinianos, franciscanos, beneditinos e, no caso brasileiro,
principalmente os jesuítas. Enquanto a maior parte dessas ordens instalou- -se no
Brasil com propostas mais contemplativas mediante a criação de mosteiros, de
conventos, construção de igrejas, etc. os jesuítas marcaram a sua trajetória na
América portuguesa por uma profunda ligação com os indígenas. Assim, atuaram
na sua procura em meio às matas e na sua introdução à cultura e educação
europeias, bem como para protegê-los de bandeirantes que procuravam escravizar
os nativos (TAVARES, 2007).
A Companhia de Jesus, ordem religiosa à qual pertencem os jesuítas, foi
fundada em 1534, na cidade de Paris, pelo religioso Inácio de Loyola (1491–1556).
A ordem espalhou-se rapidamente pela Europa e seu modelo de hierarquia criava
um sentimento de devoção e obediência extrema ao Papa. Essa forma de organizar
a ordem não era à toa. Sua criação ocorreu em um contexto muito atribulado na
Europa. Alguns anos antes, em 1517, havia ocorrido a divisão da Igreja devido às
95 teses publicadas pelo monge Martinho Lutero na Alemanha, ao que se seguiu a
sua excomunhão pelo Papa (PAIVA, 1982).
Lutero questionava diversos dogmas da Igreja, sendo apoiado por muitos
fiéis, que criaram uma nova igreja cristã, no evento histórico que ficou conhecido
como Reforma Protestante. Dessa forma, a igreja católica, conduzida com mão de
ferro pelo papa Paulo III (1468–1549), iniciou um movimento de contrarreforma, em
que os valores e os dogmas católicos eram veementemente reafirmados. Foi nessa
situação que surgiram ordens como a Companhia de Jesus, que exigia de seus
membros total fidelidade ao Papa (MONTEIRO, 2007).
Por outro lado, a Igreja havia perdido muitos fiéis com a Reforma. Dessa
maneira, o fato de se descobrir a existência de uma população de milhões de

56
pessoas não cristãs na América caiu como uma luva sobre a necessidade da Igreja
recuperar, ou até aumentar, o número de seguidores do catolicismo. Sendo assim,
a Companhia de Jesus foi encarregada de enviar missionários para o Novo Mundo,
com a importante missão de levar o cristianismo para o continente e catequizar seus
habitantes originais. De acordo com Paiva (2000), o entendimento era de que, para
a consolidação do vasto império ultramarino ibérico, além de seu controle militar,
político e econômico, era igualmente necessário estabelecer bases religiosas
europeias nos novos domínios, definindo assim o controle total das metrópoles
sobre suas colônias.
Os jesuítas exerceram papel de suma relevância na empreitada colonial
portuguesa. Os primeiros missionários chegaram em 1549 e iniciaram seu trabalho
por meio da criação das primeiras escolas do Brasil. Além disso, passaram a montar
os chamados aldeamentos indígenas, onde reuniam os índios convertidos, que
eram introduzidos ao modo de vida europeu, às artes (sobretudo a música) e ao
trabalho em comunidade, que assim se tornavam autossuficientes.
Consequentemente, é possível afirmar que os padres jesuítas tiveram papel ativo
na vida espiritual, cultural, política e econômica da colônia portuguesa. A primeira
escola foi a da capitania de São Vicente, inaugurada em 1554, seguida pelas da
Bahia (1556) e Rio de Janeiro (1568). Além de atuarem na evangelização dos
índios, essa escola tinha como objetivo formar novos sacerdotes, para que a colônia
não dependesse do envio de missionários europeus. A ligação com o papado era
bastante estreita, pois era preciso que o papa fornecesse uma licença para o
estabelecimento de instituições de ensino. A licença se chamava “missão”,
contendo em si a determinação para que os colonos não católicos fossem
convertidos, a catequização indígena e a obrigação de enquadrar os índios nos
padrões culturais e sociais europeus. Segundo Paiva (2000), a partir do termo
“missão” é que se caracterizaram as “missões jesuíticas”, grandes aldeamentos que
frequentemente comportavam milhares de habitantes.
As primeiras missões foram estabelecidas em torno de 1550. No entanto,
um problema se apresentava perante os padres: como estabelecer a aproximação
inicial com os indígenas? Vários métodos foram utilizados, tais como tocar música,

57
oferecer presentes, etc., contudo, umas das formas mais exitosas foi o uso dos
conhecimentos médicos desenvolvidos pela ciência até então. Dessa forma, os
padres demonstravam aos indígenas que a medicina trazida por eles era, de
maneira geral, mais eficaz que as tradicionais curas realizadas pelos pajés (PAIVA,
2000).
Os padres jesuítas também realizavam adaptações nas liturgias católicas a
fim de torná-las mais significativas para os índios, facilitando o processo de
conversão. Muitas vezes, as crianças desempenhavam um papel importante nessa
estratégia. A missa tradicional era substituída por uma cerimônia em que as
crianças atuavam, como em um teatro, representando passagens bíblicas. No
entanto, essa forma de evangelização acabou não atendendo as expectativas dos
jesuítas e teve que ser revista (RIBEIRO, 2015).
Como as tentativas pacíficas de levar o evangelho aos índios estava
fracassando, um dos líderes mais importantes da Companhia de Jesus, o padre
Manuel da Nóbrega, encarregado das missões no Brasil, decidiu radicalizar os
procedimentos de conversão. Para isso, Nóbrega defendeu o uso da força,
argumentando que esta seria a única forma de se organizar os aldeamentos. A partir
daí, Nóbrega lançou em 1558 um documento intitulado “Plano Civilizador”, no qual
expunha a sua nova doutrina para os índios:

A lei, que lhes hão de dar, é defender-lhes comer carne humana e guerrear
sem licença do Governador; fazer-lhes ter uma só mulher, vestirem-se,
pois tem muito algodão, ao menos depois de cristãos, tirar-lhes os
feiticeiros, mantê-los em justiça entre si e para com os cristãos: fazê-los
viver quietos sem se mudarem para outra parte, se não for ante cristãos,
tendo terras repartidas que lhes bastem, e com estes padres da
Companhia para doutrinarem (RIBEIRO, 2015, p. 151).

Nesse trecho, retirado de uma carta escrita por Manuel da Nóbrega ao


padre Miguel de Torres e datada de 8 de maio de 1558, estão expostas algumas
considerações importantes sobre o pensamento de Nóbrega acerca do que deveria
ser feito com a cultura e a sociedade indígenas. Em primeiro lugar, há a defesa
intransigente de que os costumes dos índios sejam radicalmente modificados.
Como se vê, seu desejo era o de acabar com o sedentarismo apresentado em
algumas tribos e também implantar a monogamia, que era estranha a muitas

58
sociedades nativas. Além disso, fica evidente que o padre considerava urgente
impor a moralidade cristã por meio de uma espécie de tutela pela qual os índios
deveriam estar sempre submetidos aos padres e aos colonos brancos.

Havia ainda a questão dos bandeirantes. No século XVI, a produção de


açúcar se tornava cada vez mais importante para a economia da colônia. Logo, a
necessidade de mão-de-obra crescia na mesma medida. Os bandeirantes se
tornaram, nesse contexto, uma peça fundamental para a obtenção de escravos
indígenas. Em geral, os bandeirantes eram homens nativos da própria colônia, mas
também havia a participação de portugueses nos grupos que realizavam as
“bandeiras”, isto é, expedições pelo interior da América portuguesa para capturar
índios e vende-los aos senhores de engenho. A maior parte dessas expedições de
apresamento partia da capitania de São Vicente, na região litorânea do atual estado
de São Paulo. Os aldeamentos criados pelos jesuítas acabavam se tornando uma
espécie de refúgio para os índios, que ali se tornavam menos vulneráveis ao avanço
dos bandeirantes (FAUSTO, 1995).
Como visto nesse capítulo, diversos fatores na Europa, que acabava de sair
do período medieval, encontram-se na base das grandes navegações portuguesas
que contornaram a costa africana, chegaram às Índias e por fim o Brasil. Naquele
contexto de centralização política de Portugal e sua experiência de colonização no
norte da África e nas ilhas do Atlântico, Pedro Álvares Cabral, no comando de uma
impressionante frota, chegou ao Brasil e marcou o início do seu processo colonial.
A princípio surgiram as capitanias hereditárias como forma de ocupação e
administração do território. Contudo, logo foi instalado o governo-geral, que
centralizou o domínio português na América. Na sequência, a Companhia de Jesus
chegou ao Brasil, montando as primeiras escolas e trabalhando fortemente na

59
evangelização dos índios. Esses encontros determinaram o desenvolvimento
colonial dali por diante, deixando marcas que permanecem até os dias atuais na
sociedade brasileira.

10 HIPÓTESES SOBRE O POVOAMENTO DAS AMÉRICAS

Existem algumas hipóteses concorrentes quanto ao povoamento das


Américas e a origem dos povos ameríndios. Para que compreendamos essas
diferentes teorias, é preciso levar em consideração os achados arqueológicos e
suas datações, e, a partir deles, considerar as hipóteses elaboradas pelos
pesquisadores. São três as principais teorias para o povoamento das Américas: a
teoria asiática (povos migrantes da Ásia Oriental, a partir do Estreito de Bering); a
teoria malaio-polinésia, e sua migração pelo Oceano Pacífico; e a teoria australiana,
que também argumenta pela migração pelo Oceano Pacífico. Lembramos que
essas teorias não necessariamente são excludentes entre si, apenas apontam
origens diferentes para as populações americanas, a partir das datações da cultura
material encontrada nos sítios arqueológicos. Vamos conhecer um pouco mais
sobre cada uma dessas teorias, nos detendo um pouco mais sobre a teoria asiática,
que inclui mais evidências genéticas (SALAZANO, 1997).

60
10.1 A teoria asiática

Essa teoria defende que os primeiros habitantes do continente americano


são de origem mongoloide, e entraram na América através do Estreito de Bering,
no Pleistoceno, durante os períodos glaciais, quando os níveis dos oceanos
baixaram 100 metros, formando a chamada Ponte Terrestre de Bering, ou Beríngia
(PROUS, 1997).
De acordo com Meggers (1979, p. 24)

A mais antiga ponte terrestre existiu entre cerca de 50.000 e 40.000 anos
[...] e foi usada por várias espécies de mamíferos do Velho Mundo,
incluindo o caribu e o mamute peludo, para invadir as Américas. Após um
intervalo de submergência que durou uns 12.000 anos, a ponte reapareceu
entre cerca de 28.000 e 10.000 anos atrás. [...]. No decorrer de alguns
milênios, antes que os segmentos de Leste e Oeste se fundissem e um
corredor se abrisse novamente, a ponte terrestre foi transitável.
Aproximadamente há 10.000 anos [...], o nível do mar elevou-se
suficientemente para cobrir o Estreito de Bering e desde essa época o
Novo Mundo tem sido atingido somente por água.

Pesquisadores que utilizam análise genética divergem entre si quanto ao


número de migrações ocorridas para a América através do Estreito de Bering,
defendendo que houve entre uma e quatro ondas migratórias (SALAZANO, 1997,
p. 38). Em resumo, seus argumentos são os seguintes:
 Existem autores que defendem uma migração única pelo Estreito de
Bering há 30 mil anos, via corredor livre de gelo de Alberta. O colapso
do corredor, entre 14 e 20 mil anos atrás, isolou os ameríndios dos
demais grupos, originando a diferenciação entre os ameríndios e os
na-denes, inuits e chukchis.
 Há aqueles que argumentam pela existência de três ondas
migratórias distintas, provenientes da Sibéria, que trouxeram à
América os ameríndios (11 mil anos atrás), os na-denes (9 mil anos
atrás) e os inuits (4 mil anos atrás). Essa teoria, além de análise
genética, utiliza análise linguística e odontológica.
 Por fim, há um conjunto de pesquisadores que sustentam a
existência de quatro ondas migratórias, mas que, entre si, divergem

61
quanto à denominação dos grupos migratórios e as datas de
migração. Alguns autores desses grupos, além das análises
genéticas, utilizam a morfologia craniana como fonte para suas
análises. (SALAZANO, 1997, p. 38)

No mapa exibido na Figura 2, temos a representação gráfica da migração


humana via Estreito de Bering, e os dois mais antigos sítios arqueológicos
encontrados nos Estados Unidos, o de Folsom e o de Clovis, que estimaram a
chegada dos seres humanos na América em aproximadamente 11 mil anos atrás.
Entretanto, outros sítios arqueológicos, como Monte Verde, no Chile, e Lagoa
Santa, no Brasil, colocam em dúvida essa periodização, pois suas datações são
anteriores.

Outra questão a ser considerada em relação à teoria asiática é que houve


processos de “microevolução” que ocorreram dentro do continente americano após
as ondas migratórias, o que explicaria a heterogeneidade da população ameríndia.
Assim:

62
[...] apesar de suas limitações, os estudos genéticos, tanto em nível de
proteína como de DNA, têm fornecido importantes contribuições para a
análise e eventual solução da questão da origem de nossos indígenas.
Atualmente, há consenso quanto à entrada no continente através do
estreito de Bering, mas dúvidas quanto ao número de ondas migratórias
(SALAZANO, 1997, p. 43).

Outro consenso apontado pelo autor é a data de entrada da primeira leva


migratória, que teria ocorrido 30 mil anos antes do presente.

10.2 Outras teorias

As demais teorias para a origem e o povoamento do território americano


levam em consideração a migração oceânica. Trata-se de teorias de difícil
investigação, em função da limitação dos achados arqueológicos. Porém, segundo
especialistas, há fortes indícios de migrações transpacíficas mais tardias em nosso
continente, principalmente pelos achados parasitológicos. Foi encontrada nos
intestinos de uma múmia peruana e de corpos mumificados em Minas Gerais e no
Piauí uma parasitose que, em função de suas condições de sobrevivência, não
poderia ter sido introduzida no continente americano através do Estreito de Bering
(SILVA; RODRIGUES CARVALHO, 2006). Além dos achados parasitológicos,
pesquisadores encontraram similitudes entre os crânios de antigos habitantes do
Equador, de Lagoa Santa, no Brasil, e da Polinésia. Contudo, os trabalhos
arqueológicos na região da Polinésia estimam que a ocupação daquela região não
ocorreu antes de 3 mil anos atrás, o que não é um empecilho para suas viagens até
a América, apenas torna essas possíveis ondas migratórias mais recentes (DA-
GLORIA, 2019).
Nesse sentido, não se trata apenas de acrescentar novas rotas migratórias
à história da ocupação da América, mas pensar novos grupos como componentes
dos povos ameríndios:

[...] a questão central relativa à dinâmica de ocupação do continente


certamente é o reconhecimento de uma leva migratória adicional,
constituída de grupos não mongolizados, aparentemente anterior à
entrada das populações com morfologia mongoloide típica (SILVA;
RODRIGUES-CARVALHO, 2006, p. 191).

63
11 OS INDÍGENAS DA AMÉRICA DO NORTE

O extenso território da América do Norte foi ocupado por diferentes etnias


indígenas ao longo do tempo. Esses grupos desenvolveram características mais ou
menos similares em cada uma das zonas ocupadas. De acordo com Kavin (2006),
essas etnias podem ser agrupadas conforme a região em que se estabeleceram:

 Na costa noroeste do Pacífico, viviam os povos Haida, Tsimshian,


Tlingit, Tillamook, Chinook, Älsé, Coos, Coquille, Nootka, Makah,
Washo e Wishram.
 No Ártico, encontramos o povo Inuit.
 Na região nordeste e dos Grandes Lagos, viviam os povos
Algonquian, Iroquois, Mohawk, Oneida, Onondaga, Cayunga e
Seneca.
 No sudoeste, viviam os povos Cherokee, Catawba, Creek e
Seminole.
 No sul e sudeste, ou seja, na “fronteira” com a Mesoamérica, viviam
os povos Pima, Papago, Hopi, Navajo e Apache.
 Na região das grandes planícies, no interior do continente, vivam os
Cheyenne, Lakota, Sioux e Comanche.

Percebemos, dessa forma, a diversidade de povos que ocupavam o


território da América do Norte. Essa não é uma listagem exaustiva e entre cada um
desses grupos étnicos há subdivisões. Na impossibilidade de abordarmos todos
esses povos, apresentaremos as características dos povos que vivem no Ártico.
No globo, a região do Ártico, que abrange o Canadá, a Dinamarca, a Rússia
e os Estados Unidos (Alasca) pode parecer bastante inóspita para a maioria de nós,
mas os indígenas Inuit ocupam há milhares de anos a região, adaptando-se à
geografia, caracterizada pela tundra plana, e ao clima, com invernos longos,
rigorosos e escuros. “Inuit” é o plural de “Inuk”, que significa “pessoa” no idioma
nativo, o qual se subdivide em diferentes dialetos, além de uma linguagem não

64
verbal, baseada na expressão corporal. Até pouco tempo, os inuits eram chamados
de esquimós, uma palavra proveniente do idioma dos algonquianos (outro povo
indígena), que significa “comedores de carne crua”. Entretanto, os inuits consideram
esse termo ofensivo e lutam para não serem identificados como “esquimós”.
Existem outras etnias vivendo na região do Ártico, mas os inuits são os mais
numerosos. Em relação a outros povos originários da América, seu contato com
europeus e descendentes se deu tardiamente, somente a partir de 1780, e alguns
grupos foram contatados apenas no século XX (KAVIN, 2006).
Os inuits dedicam-se à caça e à pesca como subsistência, organizam-se
em famílias nucleares como unidade básica, mas reconhecem uma família
estendida, e eventualmente formam acampamentos ou assentamentos sazonais
com uma ou mais famílias, formando alguns bandos. Não existe uma liderança
específica, a não ser em episódios pontuais, como em expedições baleeiras, em
que se destacam homens mais velhos. Quanto a essa organização social, ela não
pode ser universalizada para todas as etnias e as regiões do Ártico; no Alasca, por
exemplo, onde se estabeleceu um maior contato com as culturas da região noroeste
do território do atual Estados Unidos, costuma haver uma formalização da
autoridade (KAVIN, 2006).
Entre os inuits, havia uma divisão de gênero nas atividades a serem
desempenhadas, sendo as mulheres responsáveis pela elaboração de artefatos e
ferramentas de marfim ou ossos, como agulhas, facas, raspadores de peles, etc.
Além disso, os habitantes do Ártico usavam artefatos de pedras lascadas, como
pontas, lâminas e panelas. As vestimentas eram elaboradas com couros e peles de
animais caçados (KAVIN, 2006).
Com variações regionais, os povos do Ártico acreditavam que todas as
coisas, animadas ou inanimadas, possuíam alma ou espírito, que eram bastante
respeitados, a partir de uma moral e de um conjunto de regras compartilhadas. O
respeito às almas ou aos espíritos era necessário para a manutenção do bem-estar
geral, em uma noção de equilíbrio. Por isso, também usavam amuletos e rituais de
magia, existindo a figura de um xamã, que estava em contato com esse mundo
espiritual (KAVIN, 2006).

65
12 ESTADO-NAÇÃO E IDENTIDADES NACIONAIS

Os conceitos de Estado-nação e identidade nacional possuem diferentes


definições e uma longa trajetória historiográfica, adquirindo certas especificidades
de acordo com as realidades a que se referem. Em se tratando da América Latina,
após os processos de emancipação política, em que foi necessário definir os
contornos do Estado e forjar uma nação e uma nacionalidade, esse debate iniciou-
se ainda no século XIX, concomitantemente aos processos culturais, políticos e
sociais que deram origem a essa instituição. Nesse sentido, envolveram não
somente as elites políticas, mas também artistas plásticos, historiadores e literatos,
que contribuíram para a disseminação de representações sobre os símbolos de
determinadas nacionalidades.
De acordo com Wasserman (2011, documento on-line):

A questão nacional na América Latina e os problemas de identidade


nacional, das origens da nação e da nacionalidade são temas consagrados
há muito pelos intelectuais e pelos historiadores latino-americanos. A
busca do caráter nacional e das origens da nação está evidentemente
relacionada às dificuldades de construção de ordenamentos políticos
estáveis na região. A isso, somou-se o fato de constituir-se um contingente
populacional “transplantado”, com origens variadas, conforme o país.

Vamos estudar esse processo, partindo das principais definições. De


acordo com Silva e Silva (2009, p. 308):

Hoje, ao falarmos de Nação, normalmente estamos associando esse termo


a um contexto político, oriundo da formação dos Estados nacionais na
Europa Ocidental no início da Idade Moderna. Assim sendo, o conceito
mais corrente de Nação é aquele em íntima afinidade com a ideia de
Estado. Este, por sua vez, é o organismo político-administrativo que ocupa
um território determinado, sendo dirigido por governo próprio. A Nação, em
seu significado mais simples, é uma comunidade humana, estabelecida
neste determinado território, com unidade étnica, histórica, linguística,
religiosa e/ou econômica. O Estado seria, nesse sentido, o setor
administrativo de uma Nação.

66
De acordo com os autores, para a construção de uma identidade nacional,
muitas vezes recorre-se a elementos tradicionais oriundos de um passado
mitificado, com heróis e momentos épicos, apresentados como definitivos na
formação da “nação” e do “povo”, conferindo coesão e harmonia (SILVA; SILVA,
2009).
Já o sociólogo panamenho Beluche (2014) sugere que, para compreender
o conceito de nação e suas variantes, é necessária uma distinção entre “nação-
Estado” e “nação-cultura”. Por nação-Estado, entende-se a tradicional definição de
um território delimitado, com uma população definida e um governo soberano; já por
nação-cultura, entende-se uma população que se auto identifica por seus costumes,
tradições, história e identidades, que se expressa por uma mesma língua e que
pode ou não ter governo e território próprios. A nação-cultura seria aquilo que, em
termos antropológicos, é chamada de etnia ou identidade nacional, em um sentido
de uma comunidade imaginada (BELUCHE, 2014).
O autor afirma que os Estados nacionais surgidos a partir da emancipação
política da América espanhola não advêm de um Estado-nação comum, o Império
Espanhol, mas de uma nacionalidade, de uma nação-cultura comum, a hispânica.
A partir dessa ideia de uma origem comum, foram elaboradas as ideias de uma
unidade hispano-americana (BELUCHE, 2014). Assim, podemos afirmar que, nos
dias de hoje, as repúblicas latino-americanas, em sua maioria, são Estados-nação,
cuja identidade central é a hispânica, mas que contêm outras identidades nacionais
ou “nações”. Dessa forma, é compreensível que, na América espanhola, tenham
primeiro surgido as nações-estado, para só então se consolidar a formação das
nações-cultura. Em outras palavras, as independências não foram realizadas a
partir de um “projeto nacional”, mas como realização de projetos de setores das
elites coloniais.
Uma observação: chama a atenção o fato dos principais teóricos do
nacionalismo terem concentrado suas análises nos casos europeus, prestando
pouca atenção nos fenômenos latino-americanos, considerados um caso anômalo
da questão nacional europeia (CID, 2012). Contudo, outros pensadores da América
Latina vêm se dedicando desde os anos 1990 a refletir sobre o nacionalismo e a

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identidade nacional na região e suas particularidades, conferindo importância a um
fenômeno de difícil resolução após os processos de emancipação. Com essas
análises, a nação deixou de ser entendida por um viés essencialista, passando a
ser interpretada como uma construção cultural, discursiva, estética, política,
simbólica e social, em constante transformação e questionamento ao longo do
tempo. Assim, o nacionalismo pode ser entendido como o processo de formação
das nações; um sentimento de consciência ou de pertencimento a uma nação; a
linguagem e o simbolismo de uma nação; e, finalmente, como uma ideologia sobre
a nação (CID, 2012). No desenvolvimento das análises, destacam-se o estudo do
papel do Estado nesse processo, a relação entre a identidade nacional e os setores
populares, e o papel da cultura e dos intelectuais na construção dos imaginários
nacionais.
E de que forma esses conceitos aparecem na realidade da América Latina
após as independências? Segundo Claudia Wasserman (2011, documento on-line):

As primeiras discussões a respeito da identidade nacional, do surgimento


das nações e dos obstáculos para a sua constituição plena surgiram a
partir das independências e foram pautadas por uma preocupação política,
manifestada por parte dos protagonistas do processo. Depois das
independências, os países da América Latina foram palco dos debates
sobre a questão constitucional, sobre o povoamento e acerca das medidas
necessárias para implantação dos ordenamentos políticos e
administrativos não metropolitanos. Estas discussões também foram
realizadas por políticos e intelectuais que se propunham a compor as
administrações estatais.

Em outras palavras, podemos afirmar que esses debates se relacionam


diretamente com suas conjunturas culturais, econômicas, políticas e sociais de
elaboração. Se, durante o século XIX, estiveram diretamente relacionados com a
necessidade de se construir uma identidade nacional, e a enumeração de fatores
que dificultavam esse procedimento na América, ao longo do século XX as análises
adquiriram um contorno mais científico, desenvolvido por historiadores profissionais
e outros especialistas, diferindo das observações dos analistas do século XIX, que
consideravam as identidades nacionais como dados ontológicos e as nações como
entidades sociais originárias, presentes desde as motivações para a independência
(WASSERMAN, 2011, documento on-line):

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Muitas vezes, como no caso dos militares que participaram nos processos
de independência, essas ideias de existência prévia de identidades
nacionais emanavam de um desejo de que existissem nações e
nacionalidades nestes territórios, mais do que fruto da observação
empírica objetiva destes políticos. Em outros casos, os políticos e
pensadores que formularam estas ideias de identidades nacionais
originárias estavam atraídos pelos modelos francês, inglês ou norte-
americano. Diante do padrão estrangeiro, ao se deparar com a realidade
latino-americana e com as dificuldades de implantação de ordenamentos
políticos estáveis em todo o subcontinente, estes intelectuais acabavam
acreditando que a América Latina tinha desvios e deformações no
processo de formação nacional, ou que esses processos estavam ainda
inacabados.

Assim, autores contemporâneos defendem a ideia de que o “sentimento


nacional”, à época das independências, estava pouco delineado. Havia diferentes
níveis de identificação, como metropolitano ou colonial, e seus variantes, como
americano e peninsular, ou espanhol e extra espanhol, mais que o delineamento
das nações que hoje conhecemos. Isso porque a população desses países possuía
uma grande diversidade étnica, majoritariamente de não brancos, o que poderia
contrastar com os ideais e valores das elites independentistas.
Paralelamente às independências, foram sendo delineadas as estruturas e
as instituições dos Estados americanos. Essa organização reproduziu em grande
parte as configurações administrativas e políticas das elites criollas, além de suas
práticas econômicas, com a manutenção de práticas agroexportadoras. A
fragmentação política da América espanhola, dessa forma, explica-se pela
prevalência dos poderes locais militar e político dos caudilhos. Juntamente com
essas adequações de ordem econômica, política e social, iniciou-se um processo
de delineamento de identidades, do qual participaram artistas plásticos,
historiadores e literatos.
A partir de uma análise da formação do Estado e sua estruturação, autores
contemporâneos têm defendido que o Estado republicano precedeu a construção
da nação. Em um primeiro momento, entre as décadas de 1810 e 1820, os
habitantes das novas repúblicas se identificavam como “americanos” ou “patriotas”.
Foi somente depois de 1830 que identificações provinciais ou regionais começaram
a surgir, e muitos anos passariam até que se consolidassem como uma identidade
nacional (PÉREZ BRIGNOLI, 2018)

69
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