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Título original:
IN HIS IMAGE - THE JEWISH PHILOSOPHY OF MAN AS
EXPRESSED IN RABBINIC TRADITION
Copyright © 1960 by Samuel Belkin
Publicado pela Abelard-Schuman Limited - USA
em parceria com a
EDITORA E LIVRARIA SÊFER LTDA.
Alameda Barros, 893 CEP 01232-001 São Paulo SP Brasil
Tel. 3826-1366 Fax 3826-4508 sefer@sefer.com.br
Livraria Virtual: www.sefer.com.br
2003
ISBN 85-85583-51-7
Printed in Brazil
7
SAMUEL BELKIN
9
ÍNDICE
Introdução
Judaísmo: uma Teocracia Democrática....................................... 13
1 O Homem e o Mundo................................................................... 19
A Crença no Monoteísmo................................................................ 19
O Propósito das Mitsvot...................................................................21
Justiça Social: um Resultado, Não Uma Causa........................ 23
Mitsvot e Razão...................................................................................26
Eleição e “Pertencer a Deus”..........................................................29
A Crença em Deus como o Man’hig (Dirigente).........................31
2 O Homem e o Pecado....................................................................33
A Relação Íntima do Homem com o Seu Criador......................33
A Confissão como Forma de Expiação........................................ 37
Restituição e Arrependimento....................................................... 39
Punição Corporal e Indenização Monetária..............................41
Restituição: um Ato Moral.............................................................. 43
Restituição Depois de Aquisição Ilegal.......................................45
Crime Contra o Homem, Pecado Contra Deus..........................46
O Sacrilégio do Assassino...............................................................48
Crime: a Negação do Divino...........................................................50
O Arrependimento do Pecador e a Rebelião do Justo............. 53
O Pecador e Sua Penitência.............................................................54
Auto-Exílio do Penitente..................................................................55
9
10 A FILOSOFIA DO TALMUD
6 A Comunidade................................................................................115
O Indivíduo e a Comunidade.......................................................115
Os Direitos da Comunidade.........................................................117
As Leis das Multas..........................................................................119
Leis e Impostos da Comunidade.................................................121
Direitos dos Vizinhos......................................................................122
O Direito do Homem à Privacidade e à Paz.............................124
ÍNDICE 11
Notas.....................................................................................................247
Sobre o Autor................................................................................... 265
13
INTRODUÇÃO
13
14 A FILOSOFIA DO TALMUD
cado; algumas vezes decretavam leis rigorosas para a proteção das mulhe-
res. Estas leis práticas eram classificadas como tacanót, ou seja, estatutos
necessários para proteger e ajudar os penitentes, os pobres e os fracos. O
exemplo clássico de uma tacaná, o Prosbol,6 foi decretada para ajudar o
devedor necessitado de um empréstimo e não para proteger o credor.
Na medida em que se estuda essas inovações talmúdicas ou tacanót,
torna-se muito claro que os Sábios eram relutantes em decretá-las. Eles
teriam preferido muito mais manter intactas as práticas estabelecidas nas
leis da Torá, e somente decretavam tacanót quando se sentiam obrigados,
sobretudo para apoiar e fortalecer a conduta religiosa da comunidade.
Dada esta compreensão do corpo de práticas judaicas como uma lei
Divina projetada para a proteção e defesa do indivíduo, o judaísmo pode
muito bem ser caracterizado como uma “teocracia democrática”, usando
o termo “teocracia” no sentido que Josefo lhe deu, e não como é entendido
pelos intelectuais de hoje. É uma teocracia, pois a força motriz da
moralidade judaica não é a proteção do Estado ou da comunidade de
forma abstrata, ou de nenhuma forma de governo humana. Todo o sistema
da moralidade judaica deriva e é fundado no conceito da soberania de
Deus. É uma democracia pois, diferente de qualquer outro sistema legal, o
código talmúdico coloca toda a ênfase no valor e caráter sagrado infinitos
do ser humano. No judaísmo, o reconhecimento do demos – o valor
individual e infinito da sua personalidade – é uma conseqüência
necessária da aceitação do theos de Deus (do Seu governo), uma relação
resumida na frase “teocracia democrática”.
Se o segundo elemento na frase deve ser entendido no sentido dado
por Josefo, o primeiro elemento é usado conforme a definição de Filo,
que procurou explicar a constituição política da Torá a um mundo não
judaico. De acordo com Filo, a democracia é “a melhor e a mais tolerável
das constituições”. 7 Deve se entender que Filo não usou o termo
“democracia” no sentido moderno de um governo eleito por toda a
população, em que cada pessoa tem o direito de ter um mandato.8 Para
Filo, a democracia, como uma forma ideal de governo, “honra a igualdade
e tem a lei e a justiça como seus governantes”.9 Pouco importava a Filo
se, na antiga constituição política do judaísmo, o governo funcional
fosse baseado em uma monarquia, em uma aristocracia ou em uma casta
sacerdotal. Para ele, o judaísmo significava a soberania de Deus conforme
revelada na Torá, a constituição Divina que tem como objetivo a extensão
da justiça para todos. Foi neste sentido que Filo caracterizou o judaísmo
INTRODUÇÃO 17
Capítulo 1
O HOMEM E O MUNDO
A Crença no Monoteísmo
19
20 A FILOSOFIA DO TALMUD
aquele que está no topo da escala – o homem. O ser humano tem o dever
supremo, portanto, de sempre reconhecer e cultuar o Eterno, e estar
preparado para morrer, ao invés de cultuar qualquer objeto da Criação.
tanto, aquele que tem o usufruto não se torna com isso o proprietário,
pois há um Deus e Possuidor de tudo que dirá, com absoluta razão,
‘Toda a terra é Minha’, (que é o mesmo que ‘Toda Criação é Minha’),
‘mas vós sois para Mim peregrinos e moradores’.” 8
revela claramente que, por trás de todas as leis do ano sabático e do ano
do Jubileu (durante o qual a propriedade é devolvida aos seus proprietários
originais e os servos são emancipados) está o conceito de que a Criação
pertence ao Criador e de que o homem não pode adquirir a posse
permanente de patrimônio ou de seres humanos.
Enraizadas neste conceito religioso, estas leis devem por si mesmas
assegurar justiça aos pobres, aos servos, aos comerciantes e à comunidade
em geral. Mas este não é o seu principal objetivo: o que faz estas leis vivas
é a crença religiosa de que o homem não adquire a propriedade
permanente de coisa alguma neste mundo, pois este pertence a Deus.
Portanto, ao observar estas leis, o judeu, por meio de suas ações, reafirma
um dos princípios fundamentais da Torá.
Filo também compreendeu este verdadeiro significado das leis
relativas ao Jubileu. Ele escreve: “Não pague o preço da propriedade
completa, mas somente por um número fixo de anos e por um limite abaixo
de cinqüenta. Pois a venda não deve representar a propriedade real, mas
seus frutos... (pois) toda a terra é considerada propriedade de Deus e vai
contra a justiça que a posse de qualquer coisa que seja propriedade de
Deus esteja registrada por outros senhores”.12
De modo semelhante, a Mishná também expressa a idéia de que todas
as coisas da Criação são propriedade de Deus: “Rabi Elazar de Bartota
disse: ‘Dai a Ele o que é Dele, pois tu e o que possuís a Ele pertencem’. Isto
também foi dito por David: “Porque tudo vem de Ti e a Ti sacrificamos o
que recebemos de Tua mão” (1 Crônicas 29:14).13
Este conceito também se aplica à vida humana. Refletido em muitas
passagens midráshicas, encontra uma aplicação precisa e notável na
história da tragédia pessoal de Rabi Meir. Dois dos filhos de Rabi Meir
morreram no Shabat (sábado) enquanto ele estava ocupado com seus
estudos no Beit Midrash. Quando o Sábio voltou para casa no sábado à
noite, sua esposa Beruria, conhecida por sua sabedoria e bondade, não o
informou imediatamente da grande tragédia. Ao invés disso, fez uma
pergunta pontual: “Ontem, um homem me entregou um depósito; agora
ele pede que eu o devolva. Devo fazê-lo?” Rabi Meir respondeu: “Minha
esposa, que pergunta espantosa! Certamente o depositário deve devolver
o depósito”. Porém quando Rabi Meir viu seus dois filhos estendidos
mortos diante dele, ficou desesperado. Beruria então o consolou: “Você
não disse que o depositário deve devolver o depósito ao seu dono? Pois
bem, Deus deu e Deus tomou de volta. Que o nome do Eterno seja bendito!”14
O HOMEM E O MUNDO 25
Mitsvot e Razão
seu dízimo com plena consciência de que está devolvendo a Deus o que a
Ele pertence, desempenha um ato religioso genuíno. Se, no entanto, ele
acredita que está dando do que é seu, seu ato é, de certa forma, um sacrilégio.
O sacrifício de um indivíduo que considera a Criação propriedade
permanente do homem, e não como um depósito temporário do Todo-
Poderoso, é de fato uma forma de suborno e um ato de superstição.
Do mesmo modo, ao comentar a ênfase dada ao pronome “a Mim”
em frases como “Toma para Mim três novilhas”,25 e “que eles Me tragam
um sacrifício”,26 Filo declara:
“Ele nos diz: Não possuis coisa boa alguma que seja tua, mas o que
quer que penses possuir, Outro forneceu. Portanto, inferimos que
todas as coisas são propriedade Dele, e não da criatura, do pedinte
que sempre estende a mão para apanhar... mesmo se apanhares,
apanhes não para ti mesmo, mas considera aquilo que é dado como
um empréstimo ou depósito e devolva-o a Ele, quem o confiou e
emprestou a ti, e assim, como é certo e justo, pagando boa vontade
com boa vontade... e assim, no texto Ele diz, ‘Pegue-o para Mim’,
dando assim a Si Mesmo o que Lhe é devido e nos instando a não
adulterar os presentes, e sim guardá-los de um modo digno do
Doador... Ele ‘toma’ para nos treinar para a bondade e para implan-
tar um cuidado sagrado, e para nos incentivar a estar a Seu serviço”.27
Este conceito do domínio de Deus também joga uma luz, para nós,
sobre a idéia da “escolha” de Israel. O conceito da eleição do povo de
Israel, ou “Israel como o Povo Escolhido” é básico no judaísmo,
especialmente na relação do judeu com Deus. Isto implica que os judeus
apóiam a teoria da superioridade racial? Muito pelo contrário, este tipo
de pensamento é estranho à mente judaica. O judeu, seguindo a premissa
de que toda a Criação pertence ao Criador, acredita que foi como um
homem, ou seja, como a forma mais elevada da Criação, que ele fez um
pacto com Deus, seu Criador. O homem promete desenvolver uma grande
parcela de dedicação e um sentido maior de pertencer a Deus. O pacto é
cumprido somente através do cumprimento da lei Divina. É para este
propósito que o judeu é dedicado e escolhido.
Sendo verdade que todas as coisas da Criação são propriedades de
Deus, Ele designou determinadas partes da Criação como suas
propriedades privadas, com o intuito de projetar de forma mais vívida a
30 A FILOSOFIA DO TALMUD
Capítulo 2
O HOMEM E O PECADO
33
34 A FILOSOFIA DO TALMUD