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PADRE GASTON COURTOIS

A Arte de
Ser Chefe
Sumário

PREFÁCIO............................................................... 9

I. Missão do Chefe............................................................ 11
1. O que é ser chefe..................................................................... 11
2. Necessidade do Chefe............................................................ 14
3. A Grande Missão do Chefe: Servir....................................... 18
4. O que faz o chefe..................................................................... 22

II. Qualidade do Chefe...................................................... 27


5. Fé na sua missão..................................................................... 27
6. Sentido de autoridade............................................................ 32
7. Espírito de decisão e de iniciativa........................................ 36
8. Espírito de disciplina............................................................. 42
9. Energia realizadora................................................................ 45
10. Calma e domínio de si......................................................... 49
11. Sentido da realidade............................................................ 53
12. Competência......................................................................... 60
13. Espírito de Previdência........................................................ 62
14. Conhecimento dos homens................................................. 64
15. Benevolência de Espírito..................................................... 67
16. Bondade e coração................................................................ 73
17. Respeito da dignidade humana.......................................... 78
18. Espírito de justiça................................................................. 82
19. Firmeza.................................................................................. 86
20. Exemplo................................................................................. 89
21. Humildade............................................................................ 91

III. Exercícios da função de chefe...................................... 97


22. Arte de formar e de educar................................................. 97
23. Arte de organizar.................................................................. 103
24. Arte de Dirigir....................................................................... 109
25. Arte de “controlar”............................................................... 118
26. Arte de repreender............................................................... 121
27. Arte de punir......................................................................... 127
28. Arte de neutralizar as resistências..................................... 131
29. Arte de animar e de recompensar...................................... 136
30. Arte de se fazer ajudar......................................................... 139
31. Arte de trabalhar em grupo com outros chefes................ 151

IV. Conclusão....................................................................... 157


32. O segredo do chefe............................................................... 157
Resumos biográficos.................................................................. 163
Livretos Devocionais................................................................. 164
Divina eloquia cum legente crescunt

Em Nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo:


Ó Senhor Jesus Cristo, abre meu coração para que pos-
sa ouvir e entender Tua palavra e fazer Tua vontade, pois
sou um residente temporário nesta terra. Não oculte Teus
mandamentos de mim, mas abre meus olhos para que possa
compreender as maravilhas de Tua lei. Dizei-me as coisas
ocultas e secretas de Tua sabedoria. Em Ti deposito minha
esperança, ó Deus meu, de que Tu iluminarás minha mente
e meu entendimento com a luz de Tua sabedoria, não apenas
para cultivar as coisas que estão escritas, mas para cumpri-
-las, para que não peque ao ler as vidas, obras e provérbios
dos santos, mas para que sirvam à minha restauração, ilu-
minação e santificação, para a salvação da minha alma e he-
rança da vida eterna. Pois Tu és a luz daqueles que residem
nas trevas, e de Ti vem toda boa obra e dádiva. Amém.

† S. João Crisóstomo
† Pater Noster

† Gloria
Prefácio

O bom êxito de uma missão tem por exigência inafastável o coman-


do – sábio, reto, virtuoso, generoso, encorajado e prudente. O reco-
nhecimento de um Comando Divino e Supremo, Deus Pater Familias,
impele-nos a reconhecer a justa hierarquia da Sua obra criada com
desigualdade – e sendo, pois, a desigualdade existente em todos os
reinos do Universo, deduzimos a sua existência também entre os ho-
mens. É próprio da Beleza do Criador atribuir funções particulares
às respectivas vocações, dentre as quais a chefia ao homem.

Em um meio social profundamente secularizado, desmorali-


zador da justiça e da ordem, herdeiro de marcas profundas de de-
gradação do ensino de modo geral, o papel do chefe é cada vez mais
diluído, descredibilizado e não raramente repudiado. No pântano
enganoso dos conceitos modernistas, os falsos discursos de igualda-
de entre homem e mulher tornam ambos cada vez mais desprepara-
dos e incapazes de reconhecer e cumprir os propósitos de Deus para
cada um.

Nas famílias, essa desordem deixa uma lacuna ainda mais


prejudicial, pois a medida em que o chefe em questão avança em po-
sição hierárquica, responde também a responsabilidades mais com-
plexas sobre aqueles a quem comanda. E quem, depois de Nosso
A Arte de ser chefe

Senhor, exerce maior influência no seio da família senão o pai? O go-


verno da família é incumbência do marido – e para isso recebeu no
Sacramento uma graça de estado. Sua esposa terá então condições
de ser o auxílio desta união e os filhos nascerão em um lar ordenado
onde brotarão as virtudes. Vemos nisto então o quão grande é sua
responsabilidade.

É justamente nesse cenário que boa formação de um chefe


pode ser considerada uma raríssima nota de repúdio às maledicên-
cias ateias e um verdadeiro manifesto de amor à Deus e ao Seu cha-
mado prático de coragem heroica. No livro “A arte de ser Chefe”, as
palavras do padre Gaston Courtois, aptas à educação de exércitos e
formadora de líderes no comando de forças armadas no país, ganham
agora seu devido espaço na formação católica dos homens comuns.

O livro que temos em mãos direciona objetivamente ao bom


alcance das inteligências, à formação do homem de responsabili-
dade, ao fortalecimento de sua personalidade, forjar o seu caráter,
enobrecer a sua alma. O que se observa nas linhas deste livro é que
o Padre Gaston enfatiza a influência da moral e a vida espiritual no
bom êxito da direção. Deixou-nos, portanto, preciosos conceitos, os
quais podemos considerar um verdadeiro breviário dos costumes,
aclarado pelas luzes fidedignas da Doutrina Católica de Sempre.

Por fim, é preciso dizer que essa obra que vem em nosso auxí-
lio nas bibliotecas, nas cabeceiras e nas almas dos homens para a boa
formação do comando. A Editora Caritatem, que tem por missão
a boa formação das famílias, entrega este livro para que os precio-
sos conselhos do padre Cortouis sejam encadernados sob perfume o
cristão e destinados aos exércitos dos lares.

Editora Caritatem

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I. Missão do Chefe

1. O que é ser chefe

Chefe, etimologicamente, é aquele que está à cabeça ou, me-


lhor ainda, aquele que é a cabeça. A cabeça é que vê, pensa, promove
a ação no interesse comum de todo o corpo.

Chefe é aquele que sabe, quer e realiza, e também aquele que


faz saber, querer e realizar.

Chefe é aquele que, sabendo o que quer, sabe também pro-


porcionar o esforço ao efeito que pretende obter.

Não se é chefe senão na medida em que se é capaz de fazer


partilhar a qualquer grupo o ideal que se vive, levando-o a realizá-lo
através de todos os obstáculos.

Decidir não custa nada; o que importa é que as decisões se


volvam em ação; daí o concluir-se que para ser chefe não basta man-
dar, mas há que saber escolher os homens de ação, educá-los, animá-
-los, ampará-los, “controlá-los”.

Quando surge a hora das decisões que se hão de tomar, das


responsabilidades que se vão assumir, dos sacrifícios que se têm de
A Arte de ser chefe

suportar, onde descobrir os obreiros destas temerárias empresas, se-


não em naturezas superiores, impregnadas da vontade de vencer,
que veem com nitidez os únicos meios que conduzem à vitória, e
que têm coragem para arriscar tudo?!.1

Compreenda-se bem o sentido e a grandeza do nome “Che-


fe”. Chefe é aquele que sabe fazer-se obedecer e, ao mesmo tempo,
fazer-se amar. Não é aquele que impõe; mas aquele que se impõe.
Para comandar homens, há que saber dar-se.

Ser chefe não é somente fazer uma obra, é sobretudo fazer


homens, conquistá-los, uni-los; amá-los e ser amado por eles. Saint-
-Exupéry, em “Terre des Hommes”, diz: “A grandeza de uma função
está talvez, antes de tudo, em unir os homens”. A asserção é particu-
larmente verdadeira, quando aplicada à função do chefe.

O chefe é mais que presidente. Este é por definição não um


homem de pé, mas um senhor sentado que arbitra as opiniões da-
queles a quem preside e consegue uma maioria preponderante. Pode
ser hábil, influente; todavia, não comanda, não se trata de um chefe.

Deseja saber-se qual é o verdadeiro chefe de uma empresa?


Pergunte-se a quem, em caso de fracasso, caberia a responsabilidade.

Ser chefe não consiste em dar prova de vigor, de eloquên-


cia, de audácia ou de habilidade. Ser chefe não consiste de maneira
nenhuma em reunir à sua volta adesões sentimentais ou interesses.
Ser chefe consiste essencialmente em saber como levar os homens a
trabalhar em conjunto, em reconhecer e utilizar pelo melhor os re-
cursos de cada um, em indicar o lugar em que este ou aquele possa
render mais, em dar a todos o sentido da sua solidariedade e da sua
igualdade perante a tarefa que lhes está confiada nos diferentes pos-
tos de um mesmo grupo.

1. Foch.

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Padre Gaston Courtois

O chefe não se reconhece nem pelo magnetismo do olhar,


nem pela proeminência das maxilas, nem pela finura dos lábios,
nem pelo timbre da voz. Há chefes de olhos meigos, de aparência
modesta, de face apagada; há-os até, como S. Paulo, feios e defeituo-
sos, e os maiores detestam a ostentação. O chefe não se define por
sinais externos, mas por uma missão própria. Antes de tudo, chefe é
aquele que tem encargo de outros.

Conhecer o homem em geral, os seus homens em particular,


e a fundo os seus subordinados diretos; conhecer de modo exato os
seus compromissos e respeitá-los; lembrar-se de que, na ação, atua
sobre vontades e não sobre engrenagens; abrir, por consequência,
horizontes largos à sua iniciativa; obter deste modo a docilidade, o
zelo, o ardor em vez da passividade indiferente e mecânica; preferir
à violência a disciplina voluntária; manter a subordinação dos in-
teresses particulares ao interesse geral; levar sem desânimo as ten-
dências centrífugas a uma coordenação fecunda — tal é a função
essencial do chefe, para a qual se torna necessário e insubstituível.

O homem é um ser social e a liberdade individual deve ser


canalizada e disciplinada para o bem geral. Mas seria imprudente
deixar à razão de cada membro da sociedade o cuidado de determi-
nar o que o bem geral reclama dele, e ainda menos deixar apenas à
sua boa vontade o cuidado de conformar com esse bem geral a sua
conduta.

O chefe não é mais do que o mandatário do bem comum —


daquele bem comum que deve interpretar, defender e realizar, ao
serviço do interesse superior da comunidade e, portanto, finalmen-
te, da pessoa de cada um.

O verdadeiro chefe reconhece-se por este sinal: basta a sua


presença para levar os homens que dirige a entregarem-se por si
próprios ao serviço da causa comum.

Substitua-se “presença” por “lembrança”, e teremos os gran-


des chefes.

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A Arte de ser chefe

2. Necessidade do Chefe

Uma assembleia é incapaz de comandar. Grupo sem chefe é


corpo sem cabeça. Grupo sem chefe é rebanho, rebanho que anda à
deriva e à mercê do primeiro pânico.

Uma assembleia, excelente para fiscalizar, é sempre impró-


pria para agir. Um grupo não é capaz de comandar nada, nem mes-
mo um almoço.2

A despeito de todas as teorias igualitárias, muitos homens


sentem instintiva necessidade de apoiar-se em alguém que os supe-
re. Se não têm ninguém que os compreenda e encoraje, tornam-se
hesitantes e incertos. A presença do chefe digno deste nome consti-
tui para cada um apoio, força e segurança.

Sem chefe que ordene e coordene, sem chefe que pense e


transmita aos seus subordinados o seu pensamento, como a cabeça
transmite aos membros o seu influxo nervoso, qualquer grupo hu-
mano se esgota em esforços sobre esforços que, neutralizando-se,
acabam sempre em fracasso, tanto mais desanimador quanto maior
era a boa vontade de que cada qual estava impregnado, fracasso de
que Babel e a corte do rei Pétaud são imagens populares.

Quando falta o chefe, reina a anarquia, e a anarquia serve


apenas para destruir, nunca para construir.

O chefe, sinal sensível da autoridade, é o também da unidade.


Quando manda, coordena; impede que um grupo se desagregue, se
decomponha e morra.

Permita-se que um grupo fique, por algum tempo, sem chefe;


as melhores vontades se dividirão, as energias mais bem tempera-
das se dispersarão, e aos atritos seguir-se-á a apatia.

2. Maurois, Dialogues sur le Commandement.

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Padre Gaston Courtois

Para unir eficazmente os homens em roda de uma missão que


se tem de cumprir, há que descobrir um chefe, princípio de unidade
e de coesão, capaz de revelar e impor a todos o bem coletivo, capaz
também de os prender a todos e de os encorajar na consecução dele.

Em toda e qualquer sociedade existem tantos elementos de


discórdia quantos os membros, porque cada um traz consigo a ta-
canhez do seu egoísmo. Os conflitos, as desinteligências, a incúria
universal encarregar-se-ão de, bem depressa, tudo desagregar, se a
causa do bem comum ou da missão que se deseja cumprir em prol
do comum não estiver garantida por um chefe responsável.

Todo o agregado humano, seja ele qual for, tem necessidade


de um chefe, mas de um chefe que se faça obedecer. A ele compete a
coordenação das atividades, a fim de se obter o máximo rendimen-
to. Ainda que generosas e desinteressadas, as dedicações que não
são coordenadas levam fatalmente ao fracasso, tanto mais doloroso
quanto mais sinceras e bem-intencionadas forem as pessoas de que
se trate.

Para fazer obra de monta, há que reunir esforços que, disper-


sos, ficariam estéreis. Não é porque o caminho indicado pelo chefe
seja o melhor em si que é preciso segui-lo — há, por vezes, mil ma-
neiras de proceder, também boas — mas é o melhor porque ele o
indica e porque será o único que há de produzir a união fecunda das
vontades e dos corações.

Um grupo medíocre pode tomar alento e ultrapassar-se ao


sopro de um chefe de valor.

Um grupo excelente pode estiolar e desfazer-se na esteira de


um chefe medíocre cujas atitudes amolecem as boas vontades e ma-
tam o entusiasmo.

Não é necessário invocar, para justificação do princípio de


autoridade, qualquer contato social primitivo ou o consentimento

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A Arte de ser chefe

positivo dos súditos. Trata-se de uma visão superficial do problema.


Devendo a ação dos homens ser unificada, coordenada, para que
do esforço de muitos resulte um esforço único, a autoridade é uma
das condições da vida humana. Baseia-se na própria natureza das
coisas, consequentemente em Deus, princípio da nossa natureza e
do nosso ser.

Porque é Autor de todas as coisas, Deus é Supremo Senhor;


Sua autoridade é soberana; quis, porém, associar os homens à sua
ação no mundo. Reside aqui a grandeza da missão do chefe: a sua
autoridade participa da autoridade divina.

Não há dúvida de que o “espírito de grupo” é coisa excelen-


te. Um chefe, por mais dotado que seja, não pode saber tudo, tudo
conhecer e ver; e o zelo posto no trabalho por todos os seus colabo-
radores estará em proporção com o sentimento que tiverem da sua
responsabilidade na obra que têm de realizar. Há, no entanto, uma
falsa noção de equipe, que pretende fazer dela um absoluto absor-
vente e condicionador do papel do chefe.

“Na equipe, dizia-se na “Revue des Jeunes”, de outubro de


1935, o chefe está pronto a prestar a cada momento as suas provas e
a mostrar que só à sua capacidade deve o direito de mandar ou de
orientar, visto que não é ele, mas a aptidão que manda”.

Passa-se a narrar como o General de la Porte du Theil, então


Comissário dos Escuteiros de França, se manifestara contra tal afir-
mação:3

“O chefe só à sua capacidade deve o direito de comandar!”,


orgulho imenso daquele que se arvora em chefe, apenas porque se
atribui capacidade superior aos outros.

“Não é ele que manda, é a aptidão!” Mas isto é, afinal, a nega-


ção de toda a autoridade!

3. “Le Chef”, 15-1-36.

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Padre Gaston Courtois

“Negação no seu fundamento; todo o poder vem de Deus.


Todo o chefe é escolhido, sagrado pelo próprio Deus, e Deus escolhe
quem quer; não se trata forçosamente do melhor, do mais forte, do
mais inteligente. Além disso, como poderá avaliar-se do peso relati-
vo de todas estas qualidades na alma de um chefe?

“Negação nas suas consequências. Não é o chefe que julga o


seu trabalho, mas é o trabalho, a obra material que o julga; e como,
em definitivo, isto seria um absurdo, é o conceito que cada um tem
do trabalho que é preciso esclarecer. Quem não vê nisto um bom
pretexto para toda a dispersão, para toda a indisciplina? Construir
uma sociedade exclusivamente sobre o espírito de equipe levado a
estes extremos, é construir na areia.

“Toda a sociedade tem por base uma hierarquia, uma auto-


ridade legítima e divina na sua origem; autoridade cujo exercício se
tempera no espírito de equipe bem compreendido que liga os chefes
aos subordinados, mas que não obstante deixa ao chefe, pela inves-
tidura que recebeu, a sua iniciativa, o seu poder de orientação, a
sua responsabilidade. Em rigor, pode conceber-se um chefe que não
colabore com os seus subordinados, não pode, porém, conceber-se
uma equipe sem chefe”.

Um grupo sem chefe é um absurdo, mesmo — e sobretudo —


se é constituído por pessoas de grande valor.

Quanto mais forte for a personalidade dos membros do gru-


po, mais necessidade há de um chefe para canalizar as suas ener-
gias, orientá-los para objetivos determinados, aceites por todos, e
ajudá-los a sincronizar a sua ação; de outro modo, correr-se-á o risco
da perda de forças, da dispersão de esforços, da invasão de campo
alheio e, sobretudo, das brilhantes tiradas individuais, sem atender
ao vizinho, o que terá como resultado comprometer a harmonia e o
equilíbrio do conjunto.

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A Arte de ser chefe

“Não se espere nada de decisivo dos movimentos coletivos,


da atividade de associações generosamente votadas à elaboração de
um ideal. Todas estas boas vontades anônimas não conseguem mais
do que arrotear o terreno. São os grãos que produzirão a seara e os
grãos são os chefes, os homens de coração puro, e de vontade reali-
zadora”.4

Nada se adianta em imaginar que mandar é fácil e que, com


um rosto hermético e uma voz imperiosa, está ganha a batalha. Para
ser chefe, há que possuir aquele amor do próximo e aquela cultu-
ra que permite conhecer os homens e perscrutar os mais íntimos
recônditos da alma. Torna-se necessário pertencer também àquela
aristocracia espiritual que tem por divisa: servir. Mas servir desin-
teressada, perseverante e corajosamente — consequência de convic-
ções, entusiasmo e caráter.

3. A Grande Missão do Chefe: Servir

Para viver, um país tem necessidade que os indivíduos esco-


lham uma doutrina e a conservem, se fixem uma regra, um lema. Eu
escolhi, impus-me uma disciplina: “Servir”.5

Toda a autoridade vem de Deus, mas é dada ao chefe em be-


nefício dos outros e não em benefício pessoal.

A autoridade pode definir-se: direito de ordenar o que é mais


conforme ao interesse geral da sociedade.

O chefe não cumpre a sua missão senão na medida em que, ao


bem pessoal, antepõe o bem comum e ao interesse particular prefere
o interesse geral.

4. Paul Baudoin, em Revue des Jeunes, 10-4-39.


5. Weygand.

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Padre Gaston Courtois

O verdadeiro chefe não procura dominar por dominar. Não


se serve dos homens, mas auxilia-os a servir uma causa que os su-
pera; familiarizar-se com a obra a cumprir constitui o primeiro ele-
mento da alma do chefe.

Mandar é servir: servir a Deus em nome de Quem se exerce


o poder — porque toda a autoridade que, em última análise, não o
tenha como fundamento é ilusória ou usurpação; servir àqueles que
se comandam, os quais sem chefe correriam o risco de ser um reba-
nho sem pastor; servir a causa que nos supera e merece a adesão, a
obediência e, se for preciso, o sacrifício próprio.

Que bela missão a de ser chefe! É até mais do que uma mis-
são, é uma vocação, um chamamento, uma espécie de predestina-
ção; porque “toda a autoridade vem de Deus”, o que exerce a função
de chefe torna-se como que um intermediário entre Deus e os seus
subordinados. O texto escriturístico não admite restrições nem re-
servas. É se chefe “em nome de Deus” e, unicamente, para fazer com
que os outros homens se tornem mais semelhantes a Ele, ajudando-
-os a tornar-se mais homens, a tomar consciência da sua dignidade
de criaturas divinas, a desenvolver os talentos que providencial-
mente lhes foram distribuídos.6

A autoridade é um serviço, mas um serviço magnífico. Con-


siste, não em favorecer caprichos individuais, mas em fazer com que
um grupo humano realize o que a sua missão — e a sua vocação,
poderia dizer-se — exige.

Além disso, o chefe mesmo quando resiste a opiniões desvai-


radas e força o grupo a duros e necessários sacrifícios, nada tem de
déspota. Apenas serve, embora como corajoso e leal servidor.

A coletividade não tem que reclamar, mas que seguir. E se-


guirá, tanto mais voluntariamente quanto mais claramente vir que

6. Mgr. Pinson, Bispo de Saint-Flour.

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A Arte de ser chefe

o chefe, apesar da sua rudeza, ou até pela sua rudeza, não pretende
levá-la a fazer simplesmente o que ele quer, mas o que ela mesmo
quer verdadeiramente, como grupo organizado e não como conflito
de egoísmos.

Tendo por objetivo “servir”, o chefe dá, à sua maneira, exem-


plo de obediência, e, além disso, faz surgir nitidamente diante de
todos que tem autoridade para exigir dos outros a procura desinte-
ressada do bem comum.

O chefe não decide arbitrariamente; constitui norma para si


procurar ressonância no mais profundo daqueles que conduz. O
chefe não só orienta, ajuda também; que aqueles que sentem em si
uma vontade rejubilem: o chefe não é chefe senão para os ajudar a
querer.

Para prestigiar-se, basta que a autoridade se exerça segundo


a sua razão de ser.

No chefe, o indivíduo deve apagar-se de qualquer maneira e


desaparecer na função. Este apagamento, viril e corajoso, confere-
-lhe um prestígio e uma força que nenhuma outra reserva dá. Tor-
nando-se, mas de modo intenso e visível, pessoa pública, eleva-se,
pelo próprio serviço, acima de individualismos estreitos. A sua voz
possui um timbre diferente da dos outros: torna-se a voz da cons-
ciência moral em busca do bem superior da coletividade.

...A autoridade está ligada sobretudo à existência e à cons-


ciência de uma missão superior, de que o chefe tomou o encargo não
em proveito próprio, mas para bem daqueles que dirige e dos quais
tem a responsabilidade.

O chefe não manda “por prazer”, sem interesse, como um se-


nhor que domina escravos e colhe benefício do trabalho dos outros.
Não. Mas sim para conduzir uma comunidade, por uma engenho-
sa hierarquização de meios, ao seu alto valor moral. A sua missão

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Padre Gaston Courtois

domina-o, como uma vocação. Pertence-lhe. Dá-se à sua comuni-


dade — para que ela se volva no que pode e deve ser. Serve. E se
está compenetrado do pensamento da sua missão, tomado por essa
vocação, votado ao serviço dela, então, e então somente, é um chefe.7

O chefe não é principalmente o que anima, persuade, arrasta,


convence, mas aquele que manda em nome da autoridade de que
está legitimamente investido, e é para ele a mais nobre maneira de
servir. A sua missão é um autêntico serviço social.

Mandar é servir. O chefe está ao serviço da comunidade, mas


não quer isto dizer que deva estar às suas ordens: estas não são mui-
tas vezes senão a expressão de seus caprichos ou fantasias, quando
não são o fruto de sugestões estranhas, mais ou menos interessadas.

Com razão, deve dizer-se do chefe que ele deve ser o intér-
prete do bem comum: não significa isto, porém, que deva ser o in-
térprete da vontade geral. Esta, dadas as variações de sensibilidade
próprias da psicologia das multidões, não é muitas vezes outra coisa
senão a inconstante opinião pública, em frequente contradição com
o verdadeiro bem superior do conjunto.

O chefe não é um simples delegado da comunidade, mas o


seu guia em prossecução dos seus mais altos fins.

Mesmo eleito e designado por seus pares, a autoridade de


que é o depositário confere-lhe o direito de mandar sem que tenha
de usar sempre, para se fazer obedecer, de persuasão e de argumen-
tos pessoais.

Um chefe deve possuir, antes de tudo, o sentimento da sua


responsabilidade.

Ter o sentimento da responsabilidade não significa que espe-


re ser punido, se não cumpre o seu dever — um verdadeiro chefe

7. Dunoyer de Segonzac.

21
A Arte de ser chefe

não pensa nas sanções em que poderia incorrer a respeito de outros


chefes, colocados acima de si na hierarquia. Mas, quanto aos homens
a seu cargo, não deseja que sofram inutilmente, sejam injustamente
punidos, ou privados do pouco conforto que podem ter. Não deseja
que façam três quilômetros a mais, porque as ordens foram mal-
dadas. Não quer que, após longa caminhada, vagueiem pela aldeia
onde chegaram sem saber em que lugar devem acampar, sem pos-
suir um pouco de palha para descansar, sem ter, se é possível, uma
sopa quente que os reconforte.

Pensa em tudo, por tudo vela; não come nem se deita sem
que tudo esteja em ordem. Uma coisa há em que não pensa: na sua
própria fadiga.

Não sendo escravo de seus superiores é o, no entanto, do de-


ver de proteção que deve aos seus.

Este sentido de necessidade dos outros torna-o muitas vezes


capaz de trabalhos que parecem acima das suas forças.8

4. O que faz o chefe

O que dá ao chefe o direito de mandar, não é diretamente


a sua capacidade, é o mandato autenticamente recebido. Mas não
cumprirá eficazmente a sua missão de chefe a bem da coletividade,
sem que desenvolva em si as qualidades que o tornam digno de tal
título.

O exercício do poder é a prova em que aqueles que não pos-


suem as qualidades próprias dos chefes são encontrados em falso, e
dão aos subordinados a terrível tentação de os tratar como usurpa-
dores.

8. O. Clement.

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