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VENCENDO A CORRIDA DOS ESPERMATOZOIDES


Revivendo o Nível Celular de Consciência

GROF, Stanislav. Quando o impossível acontece. Histórias extraordinárias que


desafiam a ciência. S. Paulo :SP, Heresis. 2007

Enquanto voltamos ainda mais no tempo, os relatos de experiências


pré-natais em estados holotrópicos da consciência tornam-se cada vez mais
fantásticos e difíceis de acreditar. Ainda assim, eles às vezes trazem novas
informações que podemos conferir depois. Lembro-me de ter comparecido a
uma apresentação fascinante do terapeuta australiano Graham Farrant, na
conferencia da Associação de Psicologia Pré e Perinatal, em San Diego, na
Califórnia. Durante sua apresentação, ele exibiu uma fita de vídeo de sua
sessão de terapia primal, na qual revivia sua concepção.
Para sua surpresa, Graham descobriu em sua sessão que, como
espermatozóide, ele não atacava e penetrava o óvulo passivo, como se
ensinava nas faculdades de medicina na época, mas que o óvulo
cooperava, enviando uma extensão de seu citoplasma e o engolfando.
Enquanto Graham exibia a gravação de sua sessão, podíamos ver em
uma tela dividida o primeiro filme já feito da concepção humana, filmado no
Karolinska Institute em Estocolmo, Suécia, por Leonard Nielson, com o use
de um microscópio eletrônico quatro anos após sua experiência. Enquanto
Graham continuava descrevendo na fita em vídeo o que sentia,
podíamos ver o filme que confirmava suas descobertas durante a
experiência.
A seguir, apresento um excerto de uma sessão com alta dose de LSD de
um jovem psiquiatra, na qual ele descreve sua identificação convincente com o
espermatozóide e o óvulo em um nível celular de consciência. Tendo revivido a
competição entre os espermatozóides e a fusão das duas células germinais
durante a concepção, ele reviveu também as divisões celulares do óvulo fertilizado
e todo o desenvolvimento embrionário até tornar-se um feto maduro:
“Minha consciencia tornou-se gradativamente menos diferenciada e
minha imagem corporal passou por uma transformação radical. Parecia que
eu me tornara algum organismo primitivo, como uma ameba. Comecei a
sentir uma estranha excitação, diferente de tudo o que já vivera em minha
vida. Percebi que estava envolvido em uma supercorrida frenética após
receber algumas mensagens químicas, que possuíam uma qualidade
envolvente e irresistível. Uma parte de mim, localizada em algum ponto
onde minha coluna deveria estar, gerava pulsos rítmicos que
pareciam me impelir pelo espaço e tempo rumo a um destino
desconhecido. Eu tinha apenas uma vaga consciência desse destino
final, mas a missão parecia ter extrema importância. Depois de algum
tempo, comecei a suspeitar, surpreso, que me tornara um
espermatozóide e que os pulsos regulares e misteriosos vinham de seu
marca-passo. Eles estimulavam um longo flagelo que ondulava e me
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impelia à frente.
"Usando meu intelecto adulto, conclui que o objetivo que eu
perseguia com tamanho afã era alcançar o óvulo e impregná-lo. Apesar
de tal cenário parecer absurdo e ridículo para minha mente cientifica, eu
não conseguia resistir à tentação de mergulhar e ser totalmente absorvido
por essa competição com grande seriedade e investimento de energia.
Vendo-me como um espermatozóide competindo pelo óvulo, eu tinha
consciência da complexidade de todos os fatores envolvidos. 0 que
acontecia tinha a característica básica do processo fisiológico que é
ensinado nas faculdades de medicina. Entretanto, havia muitas
dimensões adicionais que iam bem além do que eu conhecia
intelectualmente e que minha fantasia teria sido capaz de conjurar em
meu estado ordinário de consciência.
"Esse espermatozóide que eu me tornara parecia-se com um
complexo microcosmo, um universo em si mesmo. Eu sentia os
processos bioquímicos no nucleoplasma e visualizava os cromossomos e
até mesmo a estrutura molecular do DNA. A configuração arquetípica
primordial das moléculas de DNA era entremeada com imagens
holográficas de varias formas de vida. As configurações fisioquímicas
pareciam estar intimamente ligadas com impressões filogenéticas
primordiais, recordações ancestrais, mitos e imagens arquetípicas, tudo
isso coexistindo na mesma matriz infinitamente complexa. A bioquímica,
genética, história natural e mitologia pareciam estar inextricavelmente
interligadas e ser apenas aspectos diferentes do mesmo tecido cósmico
tão complexo. A corrida dos espermatozóides também parecia ser
governada por algumas forças externas que determinavam seu destino
final. Eu senti que eles tinham algo a ver com a história e com as estrelas
e conclui que representavam influências cármicas e astrológicas
misteriosas.
"Em algum ponto dessa corrida eu também me identifiquei com o
óvulo. Minha consciência oscilava e se alternava entre a do
espermatozóide que rumava para seu destino e a do óvulo, com uma
expectativa vaga, mas intensa, de um evento altamente desejável e
importante. A excitação dessa corrida aumentava a cada segundo e seu
ritmo agitado finalmente aumentou em um grau que parecia lembrar o
vôo de uma nave espacial aproximando-se da velocidade da luz. Então
veio o ponto máximo da jornada, na forma da implosão triunfante e
fusão extática do espermatozóide como o óvulo. Nesse ponto, as duas
unidades divididas da consciência uniram-se e eu era as duas células
germinais a um só tempo.
"Estranhamente, tanto o espermatozóide quanto o óvulo pareciam ver o
mesmo acontecimento como um sucesso individual, bem como um triunfo
conjunto. Ambos haviam realizado sua missão - o espermatozóide, a de
alcançar e penetrar o óvulo, e este, de receber e incorporar o espermatozóide.
Um único ato envolvendo dois participantes, portanto, resultava em vitória e
total satisfação para ambos. Eu senti que essa situação de vitória mútua
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representava um modelo ideal, não apenas para a cooperação de homem e


mulher nas atividades sexuais adultas, mas também para as relações
interpessoais em geral. A tarefa parecia ser a de arranjar as circunstancias de
tal maneira que todas as partes envolvidas encontrariam a satisfação e veriam o
resultado positivo como seu sucesso pessoal.
"Após a fusão das células germinais, minha experiência continuou no
mesmo ritmo rápido que a corrida dos espermatozóides. De uma forma
condensada e imensamente acelerada, eu revivi toda a embriogênese que se
seguiu à concepção, do óvulo fertilizado até a primeira divisão celular,
mórula, blástula e além, seguindo até o feto desenvolvido. Eu tinha
plena consciência dos processos bioquímicos, divisões celulares e crescimento
dos tecidos envolvidos no processo. Era preciso executar numerosas tarefas,
enfrentar desafios e superar períodos críticos. Eu estava testemunhando e
experimentando a diferenciação dos tecidos e a formação de novos órgãos. Eu
me tornei os arcos branquiais, o coração embriônico pulsátil, colunas de
células hepáticas, membrana mucosa intestinal e muitas outras partes do
organismo em desenvolvimento. Este crescimento embriônico explosivo era
acompanhado por uma tremenda liberação de energia e luz dourada. Eu senti
que estava experimentando a energia bioquímica envolvida no crescimento
acentuado de células e tecidos.
“Em certo ponto tive a sensação muito distinta de ter completado meu
desenvolvimento fetal. Novamente, senti que havia realizado uma grande conquista
- o sucesso individual, assim como o triunfo da forca criativa da natureza. Quando
voltei ao meu estado habitual de consciência, estava convencido de que esta
experiência teria um efeito profundo e duradouro sobre minha auto-estima.
Não importando qual fosse minha trajetória de vida no futuro, eu já realizara
dois feitos extraordinários apenas completando minha encarnação: eu havia
vencido a corrida com milhões de competidores a completado com sucesso a
difícil tarefa da embriogênese. Embora o cientista em mim se divertisse com
esse raciocínio tolo e respondesse a ele com um sorriso de condescendência,
as emoções por trás dele eram fortes e convincentes."

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