Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
—Claríssimo.
—Não sei o que fazer contigo. És uma deceção constante para
esta família.
—Às vezes pergunto se deseja que eu nunca tivesse nascido —
expressou.
O rei Zahir olhou para ele intensamente. Sem mais palavras,
com dois passos, deixou o filho sozinho e fechou a porta.
Tahír observou o quarto e sentiu a garganta seca. Não diziam
que quem cala consente?, perguntou-se magoado.
Se ainda restava uma esperança de que o pai pudesse ver nele
algo mais do que problemas, nesse dia ficou claro. Aceitava,
derrotado, que o rei nunca seria capaz de o entender. Nem amá-lo…
A morte da mãe tinha-o afetado de uma maneira que jamais
poderia explicar. Os príncipes não tinham autorização para
demonstrar emoções em público… e parece que também não em
privado. E isso marcou-o.
Ninguém parecia entende-lo e tratavam-no como se fosse um
problema dele, e como algo normal aprender a lidar com uma perda
de essa magnitude sem se queixar. Nunca falava disso com os
irmãos. Cada um parecia viver a sua própria realidade do tema. De
facto, as atividades giravam em torno à preparação dos príncipes
como membros da família real Al-Muhabitti. O caminho a seguir
neste sentido parecia delimitado, exceto para Tahír.
Bashah, o príncipe herdeiro, tinha de seguir a tradição das
iniciações sexuais durante dois períodos da sua vida adolescente e
juvenil. Era o encarregado de dar um herdeiro ao trono e contrair
casamento com uma mulher que viesse bem aos interesses de
Azhat para trazer estabilidade e harmonia ao reino. Amir, o terceiro
dos irmãos, tinha uma capacidade inata para obter o que desejava
de uma forma equânime e encantadora; o rei considerou prepará-lo
para a administração das ligações sociais e para conseguir alianças
e benefícios comerciais futuros.
No caso de Tahír, ele parecia não ter um caminho traçado devido
sobretudo à sua constante rebeldia. E esta situação só conseguia
chatear ainda mais o príncipe, o único dos irmãos que tinha herdado
quer os luminosos olhos verdes da já desaparecida rainha Dhalilah
como o seu espírito aventureiro indomável. Talvez estes traços em
comum com a rainha a tenham feito, em vida, mostrar mais
paciência e compreensão para seu segundo filho do que tinha o rei.
***
—O que acha que está a fazer, Alteza? —perguntou a voz
inconfundível do conselheiro de Tahír quando o apanhou a abrir o
cofre do rei, onde se guardavam todas a joias, não apenas as
herdadas, mas também dos reis e dos seus filhos.
Com a altivez que o caracterizava, Tahír virou-se para o homem
de barba proeminente e olhos negros esbugalhados. Já tinham
passado cinco meses do acidente. Não participava mais em corridas
ilegais, mas isso não significava que ele parasse de escapar para
gozar da sua juventude e dos prazeres que podia usufruir.
—O óbvio —respondeu enquanto guardava num pequeno saco
castanho uns dos muitos anéis e pérolas—. Vou sair. E tenho direito
de levar algumas destas bugigangas —agitou o saco— porque são
tanto minhas como de qualquer outro membro da família.
O homem olhou para ele sereno.
—É melhor que saia agora, Alteza, se não deseja que Sua
Majestade se chateie e o castigue.
«O meu pai não tem tempo suficiente para dedicar a um filho que
acha que só serve para causar problemas», era o que ele tinha
vontade de dizer ao homem que se encarregava da sua agenda
real, mas não ia gastar saliva com isso. Ele estava cada vez mais
cansado daquela farsa em que o pai fingia interesse pelos filhos.
Talvez os irmãos estivessem dispostos a aceitá-lo; ele não.
Detestava viver confinado no palácio. Odiava ser príncipe
quando só era observado como um instrumento de imagem
monárquica. Preferia unir-se aos planos dos seus colegas de escola
e criar o caos, esquecer-se das responsabilidades… Preferia estar
no deserto, montar a cavalo, praticar artes marciais no ginásio ou
treinar com o exército real.
—Por acaso não és tu o meu conselheiro, Karim? —perguntou a
sorrir com malícia. O homem inclinou a cabeça com um
assentimento que não significava resignação, mas sim raiva contida,
porque qualquer deslize por parte do Tahír seria culpa de Karim—.
Já sabia que sim.
Tahír guardou as joias num dos bolsos e ajustou os laços
vermelhos de seu kuffiya branco. Naquela manhã, tinha estado a
praticar esgrima no pátio do palácio. A areia, o sol e a tensão
misturavam-se numa atividade que exigia todo o seu engenho e
coordenação. Todos os anos realizava-se uma competição nacional
de esgrima. Desde que começou a participar, aos treze anos,
venceu consecutivamente todos os concursos na sua categoria.
—Os ânimos estão exaltados pela reforma do novo preço do
petróleo, é preferível que fique no palácio. Fugir, como pretende
fazer, só vai pôr em risco os agentes que cuidam de si…
—Conheço melhor do que ninguém as medidas de segurança.
Por acaso não fujo delas constantemente? —perguntou com
petulância.
—Entendo que a sua vida não foi fácil depois da morte da rainha
Dhalilah, Alteza, nem vai ser, mas já é tempo de…
O príncipe levantou a mão para que ele se calasse.
Karim acatou a ordem silenciosa.
—Nem penses que podes dizer-me o que quiseres. O teu
comportamento está fora de lugar. Que não te volte a passar pela
cabeça falar sobre a minha mãe!
Karim Labouthy assentiu, mas o jovem príncipe não ignorou que
o homem continuava a apertar os punhos.
—Podem despedir-me se souberem que está em perigo e que
por minha culpa não foram capazes de evitá-lo. Lembra-se daquela
corrida de carros? —Tahír encolheu os ombros—. Passámos por um
grande susto. Como é muito bom a escapar-se dos seus guarda-
costas, quem lhe pretenda fazer mal pode aproveitar-se desse facto.
Pode colocar o país numa encruzilhada desnecessária, alteza.
Por um breve momento, Tahír pareceu reconsiderar a sua
intenção de ir ver a moça por quem se tinha encaprichado. Já sabia
como sair do palácio e ir ter com Freya pelas ruas da cidade. Ele
pensou em camuflar-se e passar por um cidadão mais... Era ciente
que tinha uma pequena margem de tempo antes dos guarda-costas
darem com ele, e era por isso que tirava o máximo de vantagem de
cada minuto roubado de liberdade.
—Não, não vão despedir-te se não disseres nada. Isto é tudo —
disse com o mesmo tom desagradável com que ouvia o pai falar
quando despachava alguém que o estava a incomodar.
Sem olhar para o conselheiro, o príncipe foi-se embora.
O sol já não era tão forte e a vontade de reencontrar a mulher
que lhe fazia o coração palpitar encorajava-o a saltar qualquer regra
para vê-la. Nunca tinha visto uma mulher tão bonita. Nem as
mulheres do harém se podiam comparar com ela. Ele sentia que era
a única mulher para ele. Estava apaixonado, não havia outra
explicação para o príncipe. Ele sentia-se invencível, importante
finalmente para alguém. Ele levava sempre a dele para a frente,
talvez não do jeito sutil que Amir costumava fazer, mas o resultado
favorecia-o sempre.
Tahír conheceu a Freya numa noite há três semanas, na festa de
aniversário do filho do embaixador da Suécia. Desde que posou os
olhos em Freya Wahmuh não voltou a interessar-se por nenhuma
outra mulher. Não queria outra mulher.
Depois da festa, eles encontraram-se em segredo em diferentes
eventos privados organizados pelo Tahír. Ele não queria vincular
uma pessoa tão especial como Freya com os temas do palácio,
porque não queria contaminar algo que considerava tão especial e
submetê-lo às bisbilhotices da casa real. Eles mantinham contacto
através do Skype, WhatsApp e com perfis criptografados do
Facebook com identidades falsas.
Ela era a primeira mulher que não se interessava por ele para
além da pessoa que ele realmente era: um jovem aventureiro,
seguro de si e com muitas ideias para o futuro de Azhat. Ambos
tinham os mesmos gostos pela arte, comida... A única diferença é
que Freya era um pouco tímida, mas de qualquer forma com ele era
doce e carinhosa.
—És especial para mim —disselhe ela uma vez.
—O teus gestos demonstram-no —respondeu ele preso pela
candura que emanava o olhar feminino.
—E penso continuar a fazê-lo se me permitires —sussurrou-lhe
ao ouvido antes de o abraçar e deixar-se acariciar com paixão.
Quando estavam juntos eran discretos. Raramente saiam em
público. Era o modo de Tahír a proteger da imprensa e ela estava de
acordo. Não lhe exigia nada. E ele não podia acreditar na sorte de
tê-la conhecido.
Apesar de viver num país que mantinha tradições machistas, ele
não se considerava parte daquele grupo de idiotas pouco
acostumados a entender o mundo de maneira cosmopolita. Por isso
não ficou surpreendido ao descobrir que ele não foi o primeiro
homem com quem a Freya esteve. No entanto, ele estava
apaixonado e queria ser o último a conhecer os segredos do prazer
nos braços dela. Foi por esta razão que ele roubou do cofre do
palácio a aliança de casamento da mãe, e as pérolas que
pertenceram à avó materna.
Ele ia pedir Freya em casamento. Ele seria um príncipe que se
casava jovem, e daí? Estava louco por tudo dela. Aquela pele verde-
oliva suave como a seda mais cara deixava-o cheio de desejos de
lhe tocar, mesmo depois de horas de carícias agradáveis. O cabelo,
que lhe caia em cascata ao ritmo de uma cachoeira furiosa
enquanto ela cavalgava sobre o seu corpo em busca de prazer e o
levava ao abismo do êxtase selvagem, era a cortina perfeita para
partilhar sussurros de prazer.
Tahír sentia o coração a bater a mil. Era um dia importante. Ia
marcar o princípio do resto da sua vida ao lado de Freya. Pensava
enfrentar-se a todo o mundo se fosse necessário para tê-la para
sempre ao seu lado.
Quando saiu do palácio a rir-se dos guarda-costas, Tahír
conduziu o carro, que um dos seus amigos lhe emprestou, pelas
ruas até chegar ao estacionamento subterrâneo de um hotel muito
elegante e exclusivo. Era o tipo de lugar onde os empregados
sabiam que não podiam falar sobre o que viam ou ouviam. Eram
bem pagos para isso.
Talvez ele não devesse ter usado um carro tão caro, mas
gostava da velocidade. Saiu do carro a assobiar uma melodia
alegre. Pressionou o código de segurança para ativar o alarme.
«Quero ver o rosto de Freya quando a peça em casamento»,
pensou animado. Reservou a penthouse, encomendou champanhe
e flores. Tudo o que uma moça podia pedir, e tudo o que uma moça
de 16 anos podia imaginar como "romântico".
Ele dirigiu-se para a porta que conduzia aos elevadores. Para
além da excitação, o que ele sentiu a seguir foi um duro golpe na
cabeça. Tudo ficou completamente às escuras.
***
Tahír recuperou pouco a pouco o reconhecimento.
O treino do dia anterior estava prestes a acabar com ele. Apenas
a força aprendida durante o treino das artes marciais e o estado
físico adquirido graças aos dias de exercícios com o exército real de
Azhat permitiram que ele encarasse a dor de outra maneira.
Não se lembrava há quantos dias estava em cativeiro e ignorava
onde se encontrava. Tinham-lhe batido e torturado.
Tinha de sobreviver. Precisava fazê-lo.
Esteve a ponto de fraquejar e pedir que parassem, implorar que
deixassem de lhe bater quando tiraram o capuz. Um príncipe jamais
implorava, lembrou-se ao encher-se de forças.
Os olhos começaram a habituar-se à luz. A primeira imagem que
viu à sua frente foi de um dos cinco homens que lhe tinham
espancado. Cada um deles era mais intimidante que o outro. Ele
não mostrou medo, nem interesse.
Em relação à comida, davam-lhe bocados do frango que —tanto
como pareciam— eram as sobras daqueles bastardos. Estava claro
que a intenção era matá-lo à fome… e talvez nem matá-lo. Queriam
dar cabo dele e humilhá-lo para obter algo que ele ignorava: uma
chave para aceder aos arquivos do palácio. Tahír disselhe, repetidas
vezes, que desconhecia os códigos de segurança.
—Olha, olha, o principezinho está acordado. —O tipo de barba
ruiva deu-lhe um pontapé no estômago que o fez encolher-se com
dores—. Oh, que pena, doeu-te?
—Ufff —Tahír expulsou ar quando voltou a sentir outro pontapé,
desta vez no braço. Tentava proteger a cabeça, pondo-se em
posição fetal, embora não servisse de muito porque tinha as mãos
atadas nas costas.
—Odiamos os da tua classe. Estamos cansados de ter de pagar
para que vocês levem o melhor para a mesa, e não duvido que para
a cama também —disse, depois cuspir-lhe— por isso vais falar de
uma vez por todas.
A dor e a fúria misturaram-se no interior do príncipe. Se vivesse
noutra época, o insulto que estavam a cometer contra ele seria
punido com decapitação pública. Uma pena que, nessas
circunstâncias, as leis se tenham transformado em algo mais
"civilizado".
—Eu…
—Cala-te, estúpido! —gritou o cretino antes de dar-lhe outro
pontapé—. Se não disseres o que queremos de ti, então é melhor
que não fales e continues a aguentar o castigo por ser um perfeito
inútil e arrogante. Andas de festa em festa, enquanto o resto da
gente que vive neste país tem de se conformar em ver-te…
—Ouve… Porquê… porquê eu? —quis saber com uma voz que
só o orgulho conseguia que tivesse um pouco de força.
—Para além de não saberes acatar ordens, a tua rotina é fácil de
entender. Por isso, foi impossível não te escolher como objetivo —
disse a rir-se—. Tenho vontade de mijar —expressou ao começar a
desabotoar as calças pretas.
«Que raios…» pensou Tahír com nojo. O bastardo ia urinar-lhe
em cima.
Perguntaram ao Tahír repetidas vezes, em cada ocasião com
murros e pontapés, qual era a chave que dava acesso ao escritório
onde estavam os arquivos eletrónicos criptografados das
identidades dos agentes especiais do palácio: os homens
encarregados de criar protocolos de segurança para a transferência
da família real dentro e fora de Azhat. Era uma equipa de elite que
também trabalhava em casos específicos com os altos
comandantes da polícia, nomeadamente aqueles especializados em
encontrar e desmantelar ataques terroristas e células de
vandalismo.
—Queres continuar a gozar do nosso tratamento amável
enquanto eu mijo para cima de ti, ou vais dar-nos o código de
acesso? —perguntou ao tirar o membro das calças.
Estava num lugar fedorento. E estava aterrorizado com a ideia
daquele imbecil começar a urinar-lhe em cima.
—Eu não…
Os pontapés pararam. Achava que não ia resistir muito mais
tempo com as mãos atadas. O homem tirou o cinto e bateu-lhe nas
costas.
—Eu…—Tahír ofegou respirando fundo. Mesmo que tivesse a
informação que eles queriam, não a dava. Ele preferia morrer a trair
o seu país.
—Não consigo compreender como é que o nosso incentivo não
te fez dar à língua, principezinho de merda. Talvez tenhamos que
levar mais a sério o teu gosto pelas mulheres —disse o tipo com um
tom de desprezo antes de apontar para ele com o membro.
Antes que o Tahír pudesse dizer alguma coisa, um barulho
alertou-o que já não estavam sozinhos naquele lugar. Ao mesmo
tempo apareceu a última pessoa que imaginou ver.
Freya.
—Guarda as tuas intimidades e fantasias —disse ela ao homem.
O torturador, perante a presença feminina, resmungou e virou-se
para ajeitar a roupa—. Podes obter mais dados com mel que com
fel.
—Contigo não funcionou muito bem, caso contrario não
estaríamos aqui —respondeu o ruivo antes de mostrar má cara e
apanhar o cinto do chão.
Atónito e chocado, Tahír olhou para ela com medo que também
tivesse sido raptada e lhe fossem magoar. Contudo, o breve diálogo
entre ela e o torturador tirou-lhe as dúvidas. Quando Freya sorriu
com vontade, Tahír uniu os cabos.
Quando todas as imagens e eventos começaram a vir-lhe à
cabeça, ele sentiu uma fúria incontida. As coincidências pelo modo
como ele a conhecera. O facto de ela ser sempre tão reservada ao
interagir com os seus melhores amigos, apesar de se ter encontrado
pela primeira vez em um círculo tão importante quanto a família de
um embaixador. A maneira como falava sobre o mundo como se o
conhecesse há mais tempo do que ele. As conversas...
Como foi estúpido! Como é que não suspeitou? Como é que não
pôs os sentidos em alerta? Ela nunca mencionou a família dele. E
ele, que achava que ela se interessava pelas suas aspirações como
pessoa e não como príncipe, quando na verdade só queria
informações sobre o palácio através de sexo. O truque mais
estúpido e mais antigo. E ele, que se achava invencível, tinha caído
no feitiço daquela mulher. Naquele momento, ele não podia sentir-se
pior e não tinha nada a ver com as contusões físicas.
Um erro de julgamento.
De que outra maneira podia catalogar o facto de se ter deixado
levar pelo beijo apaixonado do Tahír? Decidiu que isso não voltaria a
acontecer. Tirou o bikini e, debaixo do vestido curto de praia, usava
roupa interior de seda branca. Ela gostava de comprar roupa íntima
cara. Era um luxo que tinha, assim como o café de manhã na
cafeteria de Melbourne.
Inclinou-se para apanhar o elástico e fazer um rabo-de-cavalo,
quando sentiu que já não estava sozinha. Evitou fechar a porta, uma
vez que não gostava de estar em espaços fechados. Causavam-lhe
claustrofobia. Não era em vão que preferia trabalhar com a
natureza, ao ar livre, e respirar a liberdade que sua profissão lhe
dava.
Não precisava de falar. O corpo parecia ter exercido uma
conexão com Tahír depois daquele beijo horas antes.
—Está tudo bem por aqui? —perguntou ele apoiando o ombro
contra o umbral da porta com os braços cruzados.
—Sim… Foi um dia interessante —disse desde a cadeira
vermelha onde estava sentada.
—Adormeci. Desculpa ter-te deixado sozinha.
Beatriz riu-se.
—Já sou crescidinha para tomar conta mim, mas obrigada. Não
estive sozinha, Bob fez-me companhia e estivemos a conversar até
que desatou a chover.
Ele apertou a mandíbula. Tenso.
—Bob fez-te companhia, eh? — perguntou-lhe com um tom que
ela não conseguiu decifrar, nem tentou fazê-lo. Tahír olhou para o
relógio. Faltavam quatro minutos para chegarem ao cais —. Não
sabia que eras exibicionista —murmurou ao olhá-la de alto a baixo.
Tirando-lhe a roupa com os olhos. Fazendo-a sentir um formigueiro
intenso enquanto o seu corpo se recusava a recuperar a sanidade.
Os seios começaram a ficar pesados, os mamilos empurravam
contra a seda do sutiã como se quisessem chamar a atenção de
Tahír a todo custo, e o canal íntimo estava molhado. Muito molhado
porque ele olhou para ela possessivamente, como se quisesse
devorá-la naquele exato momento. E talvez, porque a parte menos
civilizada e cerebral dela, também o desejava.
Beatriz olhou para ele, estava incrédula com o comentário. Olhou
para ela mesma.
— Esta é a roupa que todas as mulheres usam quando vão à
praia. Não sei se sabes, mas até existem praias para nudistas. E se
te pareço exibicionista, a verdade é que não quero saber o que tu
fazes ou deixes de fazer, e nem me interessa a tua opinião sobre
qualquer assunto que me concerne. — Meu Deus, o coração batia
com tanta força, porquê?
Tahír só se deu conta que o seu corpo se tinha movido quando
as pontas dos moccassins roçaram as sandálias de Beatriz. Ela
levantou o queixo, desafiante.
—Ou seja, não te ia importar que neste momento decidisse tirar-
te a roupa e deslizar a minha boca no teu sexo para prova-lo,
lambê-lo e chupá-lo até que explodas de prazer?
Beatriz não conseguiu evitar de imaginar a cena. Que não
tivesse experiência física não significava que os seus
conhecimentos sobre as atividades na cama não estivessem
registadas no seu cérebro. Afastou o olhar.
Tahír inclinou-se e pôs as mãos nos braços da cadeira, uma a
cada lado de Beatriz, encurralando-a com a força, aroma e
territorialidade dele. Ela viu-se forçada a olhar para ele.
—O que faças com outras pessoas ou o que penses sobre elas;
o que penses sobre mim ou sobre as minhas ações, é da tua conta.
Mas o mais importante, convencido, para que me possas dar prazer
com a tua boca é preciso que eu queira, e sabes uma coisa?
Ele levantou uma sobrancelha à espera da resposta da Beatriz.
—Não me interessa.
Tahír aproximou-se do lóbulo da orelha de Beatriz, e mordeu-lho.
Ela sentiu um formigueiro a percorrer-lhe todos os pontos do corpo
ao sentir os dentes e o fôlego morno na pele.
—Mentirosa —sussurrou-lhe ao ouvido antes de deixar um rasto
de beijos até chegar à boca dela, mordiscou-lhe o lábio inferior. Ela
olhou para ele com os olhos muito abertos—. Com este beijo selaste
o teu destino!
Estava tão longe do seu estilo comportar-se assim na frente de
uma mulher, pensou Tahír. Não fazia ideia de como conter a
sensação de que deveria ficar claro que Beatriz era dele. Mas não
disse nada.
—Não voltará a acontecer —afirmou a tremer, perdida na
expressão confiante e cheia de desejo de Tahír—. Recomendo que
tomes uma dose extra de Xanax, porque este beijo não significou
nada.
Mesmo com os lábios quase separados dos dela, ele sorriu. A
bravata de Beatriz foi a resposta à vulnerabilidade e conseguiu
reafirmar o interesse que tinha por ela. Mas nem por isso deixou de
lhe incomodar que esses lábios tivessem sido beijados por outro
homem. Só a conhecia há dois dias. Dois malditos dias e parecia
um adolescente sem qualquer controlo hormonal.
Beatriz tentou empurrá-lo para afastá-lo, mas foi como tentar
mover uma pedra a vários metros de distância. Assoprou.
—Foi só um beijo —continuou ela— e vou voltar a Port Douglas.
Vou trabalhar e tu vais gozar as tuas férias onde o sol aqueça mais
ou onde a lua jogue às escondidas.
Ele inclinou a cabeça para um lado. Sem exaltar-se.
—Tudo tem um princípio. — disselhe com a voz rouca ao sentir
como palpitava o pulso delicado do pescoço— e aquele beijo, no
qual tu participaste tão ativamente, é nosso ...
—Bea, já vamos… Ups! Desculpem… Não sabia que estavas
aqui —disse Sufyan ao ver o melhor amigo inclinado sobre Beatriz,
que tinha as bochechas coradas.
Tahír afastou-se com uma calma incompreensível para Bea. Ah,
mas ele não saiu sem primeiro piscar-lhe os olho de forma bastante
eloquente. Ela levantou-se e suavizou as rugas inexistentes do
vestido.
—O que se está a passar? —perguntou Tahír fixando-se no
amigo.
Nesse momento, o catamarã moveu-se com força, atirando a
Beatriz para a cama e o Tahír contra o Mawaj.
—Que raio! —murmurrou Bea, antes de se pôr em pé.
Tahír moveu-se com rapidez.
—Estás bem? —perguntou-lhe enquanto a segurava pelos
braços para a ajudar a equilibrar-se. O movimento foi bastante forte
e o catamarã continuou a balançar enquanto o capitão amarrava as
cordas e lançava a âncora para fora.
—Sim… —murmurou, e afastou-se— vou buscar a minha roupa.
—Sem demoras, entrou na casa de banho e fechou a porta.
Majaw levantou uma sobrancelha, mas Tahír não comentou nada
perante a pergunta silenciosa sobre o que estava a acontecer.
—Vinha dizer à Beatriz que vamos passar a noite num hotel, e
saber se ela está de acordo. Assim não regressa sozinha.
—E isso o que é que te diz respeito…?
Majaw não se alterou. Começava a divertir-se ao ver Tahír tão
perturbado na procura de autocontrolo quando era evidente que lhe
faltava, pela primeira vez em muitos anos.
—Suponho que não faz sentido que Sufyan continue à tua
procura —respondeu em troca e ignorando de propósito o
comentário fora de lugar de Tahír—. Já tratei da estadia no hotel.
Seria melhor que perguntasses à Bea —apontou para a porta
fechada— se está de acordo. Caso contrário tentamos fazer a
viagem.
—É uma mulher inteligente, de certeza que sabe o que lhe
convém mais para a sua integridade nestes casos. E se quiser voltar
a Port Douglas, levo-a eu.
—Não duvido —murmurou Mawaj, encolhendo os ombros, antes
de sair do camarote de Beatriz.
De mau humor, Tahír pensou que de repente precisava de
apanhar ar. Um simples desejo sexual parecia ter-se transformado
numa frustração que lhe punha o humor ácido. Tinha de tomar as
rédeas da situação.
***
A última coisa que Bea tinha esperado era terminar num hotel
quando o que mais queria era distanciar-se daquele príncipe
vaidoso e arrogante. Aqueles eram dois adjetivos que ficavam
aquém de Tahír.
Se continuasse a permitir o prazer de tê-lo por perto, teria de
aceitar o caos que estava a começar a manifestar-se nas suas
emoções, porque quem é que ela queria enganar? Era agradável
olhar para ele e tinha sido mais do que delicioso beijá-lo. Mas tinha
de se concentrar no que era estável e duradouro: a sua vida em
Melbourne. Ela começava a abrir caminho profissionalmente, e seria
um grave erro colocar tudo a perder por distrações com uma pessoa
que desapareceria da sua vida em poucos dias...
Enquanto ouvia como as gotas de água pareciam capazes de
penetrar no vidro das janelas, pensou que podia ter apanhado um
táxi em vez de aceitar a suíte privada num hotel cinco estrelas que
Tahír lhe ofereceu. No entanto, o senso comum preferiu
desaparecer durante a tarde: não era seguro por causa da
tempestade elétrica. De qualquer maneira era apenas uma noite…
Quartos separados.
Entraram no hotel por volta das nove horas da noite. Depois
foram ao restaurante jantar e, quando começaram a pedir Tahír
recebeu um telefonema. Com um pedido de desculpas, saiu da
mesa e não voltou a vê-lo.
Ela aproveitou o jantar para conhecer um pouco melhor Mawaj e
Sufyan. Bea gostava de ouvir anedotas engraçadas sobre algumas
situações em Azhat. Estava curiosa sobre as tradições daquele país
no Médio Oriente. Sabia que era um país cujas políticas arcaicas
começavam a transformar-se em progressistas. Tal era incomum,
porque, geralmente, os países do Médio Oriente têm tendência a ser
repressivos e incoerentes com os direitos humanos, especialmente
com as mulheres.
—Podem usar roupa ocidental? —perguntou ela a Sufyan.
Apesar da sua aparência séria, quando sorria, os olhos dele
brilhavam. Ele parecia o tipo de homem que não gostaríamos de ter
como inimigo.
—Sim, há quase duas décadas. De facto, o hijab das mulheres é
mais usado para se protegerem do sol abrasador do deserto do que
pela estupidez da tentação ou de outras teorias não têm sentido. No
nosso país, as mulheres são respeitadas.
—Talvez algum dia visite Azhat —disse ao olhar à volta. Tahír
não estava em lado nenhum.
—Quando recebe chamadas no telemóvel particular
normalmente é Karim, o assistente e conselheiro dele. Nem sempre
são boas notícias, por isso o Tahír tem de atender sempre, até
quando está de férias —disse Mawaj quando a viu à procura do
príncipe com o olhar.
—Entendo —comentou—. Foi uma tarde divertida e uma
companhia agradável à mesa. Por favor, agradeçam ao príncipe em
meu nome. Estou exausta, vou descansar.
—Claro —responderam eles em uníssono.
Um trovão surpreendeu Beatriz, devolvendo-a ao quarto em que
ela estava. Virou a cabeça para ver a hora no relógio luminoso que
estava na mesinha de cabeceira. Eram onze e meia. Ela sabia que o
quarto do Tahír estava ao lado do dela. Foi esperança ou desejo que
fez o coração palpitar com a possibilidade de ele bater à porta da
suíte pedindo-lhe para entrar...?
Precisava de falar com Dexter. O conselho de um homem era
sempre necessário quando a perspetiva feminina parecia
tendenciosa. Será que lhe ia dizer para se deixar levar pelo instinto
ou deixar o "cenário" completamente? Ninguém a conhecia melhor
do que ele.
Surka entendia-a e era a sua confidente nas situações em que
não podia confiar no Dexter pelo simples facto de haver assuntos
que ela preferia falar com mulheres. Além disso, se dissesse à
Surka quem era o homem em questão, ela provavelmente ia insistir
para que se lançasse numa aventura sexual sem limites.
Dexter costumava ser mais cauteloso nos conselhos que lhe
dava, por isso precisava de saber a opinião dele. Não considerava a
virgindade o tesouro mais precioso ou um sinal de pureza. Não
acreditava nesses disparates típicos de sociedades
preconceituosas. Ninguém queria saber de homens virgens. O facto
dela ser virgem só tinha a ver com cautela e falta de oportunidades.
Para Beatriz o mais importante era o coração dela, por isso
protegia-o a sete chaves. Aceitava que o desejo era mútuo; desde
que o conheceu não parava de pensar nele. E se Tahír fosse
apenas a pessoa com quem teria prazer pela primeira vez? Dessa
forma, ambos poderiam obter o que procuravam. Ele tinha-a na
cama dele. E ela aprendia na prática o que era ter sexo. Não era
uma troca justa? Depois cada um podia seguir o seu próprio
caminho. Não?
Precisava de falar com o Dexter.
A tempestade ficou mais forte. Não gostava de estar sozinha
quando chovia tanto como naquele momento.
Surka costumava gozar com dela, até já lhe tinha dito para
adotar um animal de estimação para abraçar a ele nos dias de
tempestade. Beatriz preferiu pedir-lhe que lhe desse um comprimido
para dormir. Para quê ser enfermeira se não era para ajudar?
***
Esta situação inesperada foi a melhor, pensou Tahír, enquanto
observava o céu azul da janela de seu jato particular. Estavam no
avião há seis horas e ainda faltavam três para chegar a Paris.
Ele sentia que tinha voltado a recuperar o controlo de si mesmo
quando saiu do hotel em Cairns ao amanhecer. Pagou tudo e saiu.
Quando chegou na mansão em Port Douglas, a governanta tinha
instruções para devolver os carros ao concessionário de luxo.
Organizar as malas para deixar a Austrália foi rápido. A equipa
de serviço da mansão era contratada de forma perene. Por isso, ele
não precisava de se preocupar com nada para além de chegar ao
hangar a tempo. Como devia ser.
Durante o jantar da noite anterior, ele recebeu um telefonema do
pai. Esse maldito telefonema foi o motivo porque deixou de lado o
seu precioso tempo livre.
—Os príncipes não têm férias. Não me dececiones, Tahír —
disselhe em tom cortante quando o informou que tinha de ir para
França imediatamente—. Se me pudesse levantar desta maldita
cama iria eu atender aos meus deveres reais, mas estou doente,
raios, e os teus irmãos não me podem substituir. Tens de ir tu! Agora
telefona ao Karim, pede-lhe um brief da reunião. Vais representar-
me a mim e a Azhat.
—Que bom saber que está interessado no meu bem-estar, pai —
disse com sarcasmo.
—Não tenho tempo para disparates. És especialista em
segurança, sabes tomar bem conta de ti. Agora vai para França e
faz o teu trabalho. Sê um príncipe capaz.
E depois, desligou-lhe o telefone.
O pai era o crítico mais feroz dos seus atos. Não foi o pai quem
há uns anos insinuou que preferia que ele não fosse seu filho?
Ainda lhe custava muito essa facada no peito.
Se tivesse sido Karim a ligar, Tahír teria exigido que ele
comunicasse com Amir, ao até com o Bashah, para ir à reunião em
Paris. Mas com o pai não podia fazer birras. Nunca tinham estado
juntos no mesmo espaço sem discutir. Eles costumavam ter ideias
diferentes. Um relacionamento ácido. E agora que ele estava
doente, a distância entre eles aumentava no lugar de diminuir.
Irritado e sem apetite para voltar à mesa onde estavam a jantar,
Tahír telefonou ao conselheiro. Ao segundo toque, ele respondeu
com a mesma voz cerimonial e gentil de sempre.
Karim informou-o que a reunião em Paris era com líderes
mundiais para discutir as mudanças climáticas. Estavam à procura
de um compromisso para melhorar a qualidade de vida dos países
membros através do cuidado com os recursos naturais. Também
iam falar sobre as energias renováveis e sobre como controlar a
poluição.
—Devias tê-la acordado e dizer que tinhas de ausentar-te —
disse Sufyan.
Estavam sentados frente a frente num dos confortáveis assentos
de couro café.
—O quê? —perguntou Tahír ao afastar a vista da janela.
Também não havia uma paisagem muito diferente precisamente. Só
nuvens e mais nuvens.
—Beatriz. Não lhe disseste nada —Sou um prín…
—Sim, sim, já sei o que vais dizer, Tahír. Estamos entre amigos,
e estou farto de ver como as mulheres entram e saem da tua vida,
mas realmente nenhuma merece a pena. Beatriz não é igual à
outras com que passas uma noite.
—É melhor assim. Ela não pertence ao meu mundo. Teria sido
só uma queca durante as férias. Agora que o meu pai está mais
delicado que nunca, eu não preciso desse tipo de distrações.
Sufyan olhou para ele durante um longo momento.
—E isso significa que podes comportar-te como um cretino com
uma pessoa que, de facto, nem pediu a tua atenção? —suspirou—.
Ela é linda. De certeza que não lhe faltam pretendentes… —
encolheu os ombros—. Se consideras que isto seria uma coisa de
uma noite, fico contente por a teres deixado.
Tahír cerrou os punhos até que os nós dos dedos ficaram
brancos. Beatriz nublou-lhe o pensamento. Ele tinha a certeza de
que ela era o tipo de mulher que queria um relacionamento a longo
prazo e não algumas noites de luxúria. Ele só queria levá-la para a
cama. Dar rédea solta ao desejo e depois deixá-la ir. Mas como ela,
ele poderia encontrar muitas, é claro. Agora tinha as ideias mais
organizadas. Não ia amarrar-se a ninguém. Não era Paris a cidade
do amor? Bem, ia aproveitar isso ao máximo.
—Pensas que és a versão do Doctor Phill no Médio Oriente?
O amigo, muito disposto a responder-lhe ou a seguir a corrente,
simplesmente se inclinou para agarrar no livro que estava a ler.
Tahír passou a mão pelo rosto cansado.
Havia muitas mulheres disponíveis e à espera dele. Ele não
pretendia complicar a vida simplesmente porque não tinha tido nada
com uma em particular.
CAPÍTULO 8
—Não pensei que ia voltar aqui tão cedo —disse Bea sorrindo ao
Michael, o empregado do One Second, um bar da cadeia de
entretenimento do Dexter.
Na noite em que Dexter e Surka foram à sua casa, ela
embebedou-se até perder a consciência, deram-lhe conselhos
sábios. «Nem tudo tem de levar ao amor. Se encontrares alguém
que te atraia, avança", disse o melhor amigo dela. "Desde que
tenhas a certeza de que não é nenhum tarado", acrescentou Surka
muito séria.
Embora ambos lhe tenham oferecido dinheiro para ajudá-la
financeiramente a levantar o negócio, Bea preferiu fazer isso com
seus próprios recursos. Ela disselhes que a única coisa que
aceitava era a recomendação deles a potenciais clientes.
Como ela precisava já de dinheiro, aceitou a proposta de Dexter
para ajudá-lo servindo às mesas até que ela quisesse. Já tinha
trabalhado nisso antes, mas como Bea's Tulip progrediu deixou o
trabalho. Estava grata por não ser o tipo de pessoa que
menosprezava um emprego. Faltava receber o pagamento do
Creekon, que elogiou o bom gosto dela para a reforma da mansão
de Port Douglas. Ou seja, tinha uma almofada económica para
recuperar gradualmente o ritmo.
Dexter tinha-lhe oferecido a gestão do One Second, mas ela
recusou porque estar sentada num escritório a olhar para números e
calada lhe dava fobia. Ela gostava do contacto com as pessoas e de
estar ao ar livre. E como não podia estar ao ar livre atualmente, pelo
menos teria a possibilidade de interagir com outros e ganhar
dinheiro com gorjetas, ouvir boa música e estar perto de Dexter
quando fizesse rondas de controlo nas instalações. Era um bom
trato.
—Estás aqui há uma semana e já tens admiradores —comentou
Michael.
Ele trabalhava no One Second desde que abriu as portas, há oito
meses. Fazia deliciosos coquetéis e também era muito giro. Pena
que fosse gay, pensou Bea. Mas os clientes não sabiam disso, e ele
aproveitava para vender ainda mais bebidas alcoólicas ou ganhar
uma gorjeta extra. Um rapaz esperto.
—O português?
Michael encolheu os ombros.
—Não sei de onde é, mas acho que se continuar a vir vais saber
de mais coisas do sítio onde nasceu. Uma noite deixas voar a tua
roupa pelo ar e permites às tuas pernas ter uma queca tão boa que
vais dormir como um anjo.
Beatriz riu-se. Michael quando abria a boca não tinha filtros e ela
ria-se muito com ele.
—És terrível, sabes isso?
—Sim. O meu marido aproveita-se disso —respondeu-lhe e
piscou-lhe o olho.
Bea virou-se astutamente para o local onde o olhar de Michael
estava apontando. O cliente não era um homem bonito, mas
atraente no geral. Quando ele notou que ela estava a olhar para ele,
sorriu-lhe. Não era a primeira vez que o via no bar. Isso era verdade.
Passava por ali à noite e pedia sempre a mesma bebida. Tinha o
cabelo ondulado, loiríssimo, e olhos castanhos. Um sorriso fácil e
parecia muito simpático.
Pôs na bandeja duas cervejas e um mojito.
—Só sei de onde é e que se chama Fabrizzio. Não tem aliança…
Eu também não estou à procura de uma relação.
Michael serviu uma cerveja a um cliente que estava ao balcão.
—Tu é que sabes o que fazes com esse olhar incendiário que te
lança, bonita. Estas cervejas são para a mesa oito e o mojito para a
quinze. —Bea assentiu ajeitando a bandeja—. O concerto começa
dentro de 20 minutos. Isto vai ficar um caos. Ainda bem que já
chegaram todos os empregados de mesa.
—Menos mal —murmurou Bea antes de entrar dentro do caos
que significava um negócio com comida e música ao vivo.
Principalmente quando o grupo era Maroon 5, porque o vocalista era
um bom amigo de Dexter, e ia dar um concerto privado para os
donos de uma empresa, e para os clientes que quisessem até
esgotar a capacidade do bar de 120 pessoas.
Bea adorava os tons de fúcsia, camel e lilás intercalados nas
diferentes áreas do bar. As mesas eram espaçosas. O menu era
diversificado, desde a comida tradicional australiana, passando pela
gourmet alemã até vários pratos mediterrânicos. Também havia uma
área com mesa de snooker onde costumavam estar os clientes mais
jovens.
O balcão era de vidro e estava iluminado. A quantidade de oferta
alcoólica era impressionante, assim como a variedade das suas
origens. Dava a sensação de estar num filme futurista. Para a
Beatriz era divertido.
Dexter apareceu por volta das três horas da madrugada, depois
de toda a agitação com o concerto, quando os pedidos não paravam
de chegar. Ela encontrou-se com ele quando tirava a roupa do
trabalho. Uma saia preta curta, uma blusa branca de mangas curtas
com o logo do bar no bolso do lado esquerdo do peito e sapatos de
salto alto. Ela não gostava muito de saltos, mas fazia parte do
trabalho, por isso não reclamava.
A expressão facial de Dexter mostrava preocupação. Beatriz não
disse nada, ajudou os colegas a limpar as mesas, e quando
fecharam a caixa e terminaram o inventário do dia, esperou que o
amigo voltasse do escritório localizado no final do corredor onde
estavam os cacifos e lavabos para os trabalhadores.
Estava sentada ao balcão com um vestido até ao joelho
confortável de mangas e flats vermelhos, com um rabo-de-cavalo e
já sem maquilhagem.
—Ainda por aqui? —perguntou ele num tom pouco normal—.
Pensava que já se tinham ido embora todos.
Ela abanou a cabeça.
—Quando entraste parecias preocupado, queres falar?
—Hoje não sou boa companhia, Bea. —Tirou as chaves do carro
do bolso.
—Eu também não era quando voltei de Queensland, e aqui
estou. Duas semanas depois já começo a recuperar o sentido
comum —disse a sorrir.
—Levo-te a casa.
—Tu sabes que venho de carro.
Dexter passou-lhe a mão pelos cabelos. Era muito mais alto do
que ela. E quando se chateava, com outros não com a Bea, parecia
muito ameaçador.
—Sigo-te com o meu carro até à tua casa, assim tenho a certeza
que chegas sã e salva, e convido-te para almoçar amanhã. Amanhã
não estás de turno, pois não?
—Não. Nos próximos dois dias não venho aqui. Hoje fiz o turno
da Harriet. Ela está engripada.
—Bem me parecia que tu não vinhas à quarta-feira —disse com
um sorriso sem brilho—. Bora, Bea, vamos para casa.
***
Tahír acabava de voltar do ginásio.
O suor escorria-lhe pela pele e os músculos ainda estavam
sensíveis devido ao treino. Naquela manhã, tinha treinado com o
instrutor de boxe. Limpou o rosto com a toalha que pendia do
pescoço enquanto seguia para o quarto no rihad privado.
Nas últimas duas semanas, desde que voltou, ele duplicou o
tempo que passava no ginásio e pediu a Karim que aumentasse a
quantidade de trabalho em questões de representação como
membro da família real. O conselheiro apenas levantou uma
sobrancelha ao pedido tão estranho, e depois foi consultar as
próximas atividades.
Depois da noite em Montecarlo, quando pediu a Ivonne para que
se fosse embora, porque não parava de pensar que queria que ela
fosse uma australiana cujos lábios ele não conseguia esquecer, não
tirava da cabeça a forma como tinha deixado a Beatriz em Cairns.
Ele nem podia ter relações sexuais com outra mulher. Isso nunca
lhe tinha acontecido.
Não importava quantas mulheres já tinham passado pela vida
dele. Nenhuma era Beatriz. Nenhuma tinha conseguido prende-lo
tanto a ponto de não poder estar com outras. Maldição, tinha de se
controlar.
—Tahír —atrás dele alguém o chamava.
Ele estava no meio do corredor que dividia as áreas que levavam
aos quartos de cada membro da família. O som daquela voz
percorreu-lhe a espinha como uma espada de aço. Fria, pungente.
Ele fechou os punhos e virou-se.
Um fantasma do passado. A mulher que conseguiu destroça-lo.
Olhou para ela de cima a baixo. Ela estava vestida com uma
longa saia verde-esmeralda que abraçava a cintura estreita, em
conjunto com uma blusa branca de gola alta sem mangas. Levava
um hijab que combinava com a saia comprida e calçava uns
chinelos pontiagudos com pedrinhas coloridas. Tudo somado, era
uma roupa reservada e elegante. Nunca foi diferente.
Tahír sentiu a garganta seca. O coração acelerou. Não tinha
nada a ver com amor, só com desprezo que nunca deixou de sentir
por ela. Vê-la ali diante dele, tão bonita e vulnerável ao mesmo
tempo, era uma bofetada na ideia de que já tinha esquecido. Talvez
ele não sentisse nada por ela, mais do que repulsa pela traição, mas
a lembrança do insulto persistia.
—Alteza real, para ti. O que fazes nesta ala do palácio? —
perguntou-lhe. Tinha vontade de partir alguma coisa e de gritar com
o Bashah. Ela pensava que o irmão a tinha mandado trabalhar
numa das casas dos Al-Muhabitti longe de Tobrath. Não imaginou
que a instalasse no palácio sabe-se lá a fazer o quê.
—Alteza —murmurou Freya inclinando levemente a cabeça.
Ela olhou para ele com aqueles olhos com que Tahír se perdeu
muitas noites. Incontáveis tardes... Longe do facto de que o tempo
tinha feito estragos desagradáveis na Freya, o rosto parecia mais
maduro e bonito. As curvas agora eram menos exuberantes, mas
mesmo assim a figura dela conseguia atrair olhares com uma
surpreendente facilidade.
—Não respondeste.
—Eu… O príncipe Bashah deu-me a possibilidade de trabalhar
no palácio. Devo agradecer-te por isso... obrigado, Alteza —corrigiu
—. Deu-me a escolher entre a área dos correios ou como assistente
de protocolo.
— Nenhuma dessas duas zonas estão dentro do palácio, e
nenhum trabalho dessas duas zonas devem trazer-te para as áreas
privadas.
—Preciso de falar consigo…
—Não temos nada para falar.
—Queria explicar-me —continuou com cautela— o que
aconteceu naquela noite em que o sequestraram. Por isso, pedi
uma audiência. Por isso…
A mera menção acabou com a paciência de Tahír. Ele dirigiu-se
a ela em fúria e empurrou-a contra a parede. Com a mão na
garganta, tentando não matá-la com as próprias mãos. Ela respirava
com dificuldade e ele observava-a com um intenso repúdio.
—Não tentes a tua sorte, mulherzinha! —largou-a e ficou de
costas para ela—. Tu e eu não temos nada para falar. Nada. Se
queres este trabalho, terás de ser um fantasma. Não existes. Não
tentes voltar a falar comigo ou vais conhecer o meu pior lado.
—Ameaçaram matar a minha irmã… Vivíamos numa zona
humilde. Só nos tínhamos uma a outra, e uma amiga costumava
cuidar ela enquanto eu trabalhava. Conheci-te por acaso, Tahír, e
apaixonei-me por ti.
—Uma embaixada não é uma zona humilde.
— Naquela noite eu tinha acabado de terminar o meu turno
como empregada de mesa de uma empresa de catering que às
vezes me contratava... Os vestidos nunca foram um problema, se é
isso que te perguntas, porque eu tenho jeito para a costura. Na
prisão dediquei-me a ensinar a algumas das presidiárias que
queriam…
—Não me interessa a tua vida na prisão —voltou-se novamente
para olhá-la na cara. Odiava sentir-se inclinado a acreditar nela.
—Quando eles… —continuou. Quando os sequestradores me
viram contigo uma noite, no dia seguinte aproximaram-se de mim.
Investigaram-me... Deram-me um ultimato. Tu ou a minha irmã. E
eu… —disse com um fio de voz, mas o suficientemente forte para
que ele a ouvisse. Viu-o apertar os punhos—. No dia em que me
meteram na prisão, a Elmahi ficou a cargo dos serviços sociais. A
minha irmã só tinha seis anos. Não consigo encontra-la, e ela é toda
a família que tenho. Preciso de lhe explicar que não a abandonei.
Esta é a única razão pela qual eu criei uma suposta revolta contra a
monarquia... Era a única maneira de chamar a atenção, porque eu
sei como é importante a segurança deste país é para ti... Porque eu
sabia, e eu sei, que me odeias e ias reagir. Por favor... Por favor,
ouve-me... Alteza... Preciso que me ajudes a encontrar a minha
irmã…
Tahír não ia cair nas mentiras dela. Nem ter pena pela voz
quebrada da Freya. Ele não queria ouvir mais explicações.
—Regressa ao teu posto de trabalho. E não voltes a dirigir-te a
mim.
Sem mais demoras, Tahír continuou o seu caminho.
A ferida estava aberta e ardia.
***
—O que é que achaste que estavas a fazer ao pôr a minha ex-
amante no palácio? —perguntou o Tahír quando se encontrou com o
irmão Bashah, que estava a assinar uns documentos no seu
escritório privado.
Ele tinha tomado banho e estava vestido de smoking. Tinha de
assistir a uma festa para celebrar o nascimento de um famoso pintor
do país. Umel Pash. Tinha pouco tempo, mas quando o Karim lhe
disse que o irmão estava no escritório, decidiu que não ia adiar a
conversa com ele.
—Ver-te alegra-me o dia, irmãozinho — respondeu o príncipe
herdeiro sarcasticamente. Não era novidade que o humor sombrio e
beleza de Bashah eram muito solicitados pelas mulheres onde quer
que fosse.
Tahír sabia que o calcanhar de Aquiles de Bashah era a sua
amiga de infância Adara Rizik, que caso um dia voltasse ao reino
poderia fazer com que o irmão se ajoelhasse a ela. Nunca se falava
da história que envolvia Adara. Cada um dos irmãos lidou com os
seus fantasmas da melhor maneira, pensou Tahír.
—Responde, Bash —insistiu. Depois de ver a Freya custou-lhe
recuperar a compostura.
—Pediste-me que tomasse conta do assunto. Que lhe desse um
emprego. Eu dei.
—Mas não perto de mim!
Bashah deu uma gargalhada.
—Olha, nunca quiseste falar comigo sobre esta mulher, só me
pediste para lhe dar um trabalho para evitar problemas. Quais são
esses problemas?
—Uma manifestação contra a monarquia.
— Bem, então, como não houve essa manifestação ou nada
semelhante em Tobrath em muito tempo, acho que minha atitude
valeu a pena.
—Quero-a fora do palácio.
Bashah suspirou. Afastou-se da cadeira e encheu um copo com
um pouco de whisky. Também ofereceu em silêncio ao irmão, mas
Tahír rejeitou.
—Não quero meter-me na tua vida, como também não te permito
que te metas na minha, Tahír. Tenta perceber o que ela quer. Talvez
se lhe deres uma oportunidade para ouvi-la, pare de tentar chamar a
tua atenção. Neste momento não posso demiti-la. Tem quatro
meses de contrato para ver se serve para o posto. Já não tratamos
das questões laborais como antes. As regras são respeitadas à
letra. Agora existem normas e pô-la na rua sem causa implicaria
uma denúncia que eu não quero enfrentar, quando está claro que a
solução está nas tuas mãos. Desculpa, irmão. Vais ter de lidar com
a situação.
—Que chatice! —murmurou Tahír antes de dar a volta e fechar a
porta com força.
***
O escritório costumava estar cheio de funcionários que
trabalhavam a mil por minuto para atender a todos os pedidos
diários da família real. Agora, por volta das seis da tarde, foi o
momento em que começaram a fechar o dia, e toda a gente estava
um pouco mais insistente nas exigências interdepartamentais.
—Conseguiste falar com o príncipe? —perguntou-lhe Brunah. Há
três anos que ocupava o posto de assistente financeira do palácio e
dividia a mesa com Freya.
Estavam num edifício novo adjacente ao palácio, onde se
tratavam de assuntos administrativos. Os funcionários raramente
atravessavam a estrada de gravilha com lindos arcos de flores que
levavam à entrada lateral do palácio. À entrada, o primeiro escritório
era dos três conselheiros e secretários dos príncipes. Eram três
homens intimidantes e muito diferentes entre eles. No entanto,
aparentemente compartilhavam uma certa afinidade de caráter com
os príncipes a quem serviam e respeitavam muito.
—Sim…
Freya estava a verificar dados no computador do escritório que
tratava da correspondência do palácio. Já era quase hora de saída.
—O que aconteceu? —pressionou a moça de pele escura com
uns olhos pretos vibrantes.
—Odeia-me — suspirou, guardando na pasta as cartas
enviadas pelos cidadãos com saudações ou perguntas aos
membros da família Al-Muhabitti — e não foi nada fácil manter a
compostura sem ir-me abaixo e pedir-lhe ajuda. Disseme para fazer
o possível para ser invisível. —Deixou alguns envelopes sigilosos
para o chefe, que estava encarregado de enviar as anotações que
exigiam uma resposta urgente aos canais apropriados. A
correspondência diplomática e confidencial já tinha sido enviada
diretamente ao palácio. Ninguém tinha acesso a esses documentos,
exceto os conselheiros e secretários dos príncipes e do rei.
Brunah e Freya eram amigas há alguns meses. Um dia à tarde,
encontraram-se na sala de jantar dos funcionários no quinto andar e
começaram logo a conversar. Na prisão, não se podia confiar em
ninguém, e Freya guardou todos os segredos durante anos. Quando
saiu por bom comportamento, continuou a sentir a necessidade de
ser mais cautelosa e estar mais alerta. Mas havia algo na Brunah
que a fazia confiar nela. Além disso, também estava cansada de
viver na solidão do remorso e da tristeza pelo que teve e perdeu.
Ver Tahír cara a cara afetou-a muito. O tempo foi generoso com
ele. Parecia mais musculoso. Irradiava uma virilidade cativante e
uma sensualidade selvagem, mas contida. Ele amadureceu. Os
jornais ou a Internet já não mencionavam mais a vida louca do
príncipe. Só falavam sobre a boa gestão dele em questões altruístas
e projetos para o cuidado da frágil fauna de Azhat. Ele tinha-se
tornado num homem respeitado e num príncipe reservado em
relação à sua vida particular. Todo o oposto ao jovem de dezasseis
anos por quem ela se apaixonou anos atrás.
Se pudesse voltar atrás no tempo…
— Foi um capítulo complicado que podia ter causado uma
grande tragédia se aqueles homens tivessem matado o príncipe.
Freya apertou os lábios e baixou a cabeça.
— Quando eu o vi deitado no chão a sangrar, espancado e
amarrado, a minha alma partiu-se. Eu queria ajudá-lo, queria libertá-
lo, mas a vida da minha irmã estava em jogo —levantou o olhar—
afinal, perdi os dois.
Semanas antes, Freya deixou as memórias surgirem. Sentada à
mesa de um restaurante simples da cidade, ela e Brunah falaram
sobre as suas histórias. Brunah era mãe solteira e teve que lidar
com um marido drogado e abusivo. No final, ela ganhou a custódia
da única filha, mas as consequências psicológicas dos maus-tratos
ainda a atormentavam. Ela conseguiu o posto de trabalho no palácio
graças à amizade da mãe com a mulher que gere o harém, a
Yosoulah, Era do conhecimento de todos, que o harém era apenas a
lembrança de tempos passados e que nenhum dos príncipes
realmente lhe dava uso. Nem o rei quando enviuvou décadas atrás.
As jovens do harém só davam espetáculos de dança do ventre ou
participavam em eventos muito específicos como parte das
tradições de Azhat. Havia rumores de que o príncipe herdeiro,
Bashah, era a favor da abolição do harém, porque considerava-o
como um símbolo de decadência anacrónica.
—Ele nem sequer te deu o benefício da dúvida... O que vais
fazer agora?
Freya esboçou um sorriso tímido.
—Tudo o que estiver ao meu alcance para que me ajude a
encontrar a minha irmã. Ele tem muitos contactos. Mas mesmo
assim ele vai odiar-me sempre.
—O que queres dizer?
—Não vou ter escrúpulos. Talvez o Tahír não me volte a amar, eu
ainda o amo, mas vou fazer com que me oiça e me ajude a
recuperar a minha irmã.
CAPÍTULO 10
—Só posso ficar aqui mais dois dias, Bea —disse Tahír ao
regressarem da praia—. Já passei aqui muito tempo, e tenho o meu
pai a buzinar-me aos ouvidos.
—Ele não deve ser assim tão chato —comentou ao dar-lhe uma
leve cotovelada—. És filho dele, alguma coisa de bom deves ter
dele, não?
—Mmm —murmurou. Ainda não lhe tinha dito nada sobre a mãe
nem sobre a família dele em geral. Não era importante. A ardência
inicial que pensou que ia desaparecer enquanto a tivesse na cama
tinha aumentado. A cada momento sentia mais desejo por ela.
Ela tentou ensiná-lo a surfar, e ele tentou fazer frente ao desafio
e concentrar-se ao mesmo tempo que admirava o corpo cheio de
curvas de Bea. Contudo, acabou por cair várias vezes, engolindo
água salgada e mal dizendo. Até que, com a determinação nas
veias, conseguiu domar as ondas. Terminou a manhã acenando e
sentindo-se orgulho de si mesmo, a tal ponto que a autoconfiança
fez com que Bea se risse. Isso rendeu-lhe um beijo longo, sensual e
profundo.
Eles passaram três dias juntos. Na maioria das vezes, sob os
lençóis, descobrindo-se um ao outro e aprendendo o que excitava o
outro. Também tiveram longas conversas. Algumas transcendentais
e outras sem importância. Bea não mencionou, em nenhum
momento, o pesadelo que teve na primeira noite que passaram
juntos.
Durante aqueles dias, Bea percebeu que o príncipe era mais
complexo do que parecia, e possuía emoções tão fortes quanto a
sua vontade. Conheceu um Tahír mais calmo, apaixonado e
sincero… Não havia nenhum ponto de comparação com o tipo
arrogante a quem ela danificou um carro há algum tempo. Por outro
lado, era fácil lidar com a ideia de um príncipe arrogante prestar
pouca atenção aos outros, mas não era fácil para o coração dela
ignorar a vibração repentina da possibilidade de tocá-lo, beijá-lo ou
apenas ouvi-lo. Ela estava a apaixonar-se por ele e a situação
parecia-lhe incontrolável. Ele era o seu destino, não porque a mãe
lhe tivesse dito, mas porque o coração gritava por ele.
Ela prestava sempre atenção ao que lhe dizia o coração.
—Porquê, Tahír? —perguntou, beijando-lhe o pescoço, enquanto
subiam no elevador do hotel onde ele se hospedava—. Eu pensava
que os príncipes faziam o que lhes dava na veneta.
Ele riu-se.
Estavam no que tinha sido até há algumas semanas a loja de
Bea. As reparações já estavam em andamento. Embora ela não
achasse que fosse possível ter o negócio pronto em dois meses.
Tinha em vista fazer melhorias em alguns jardins pequenos, mas
eram apenas trabalhos de quatro horas, porque não precisavam de
muito. Eram trabalhos recomendados por Surka. Normalmente,
eram pacientes que recebiam alta e queriam algo agradável para se
divertir até que recuperassem completamente as habilidades físicas.
Bea não queria incomodar Dexter. A mera ideia de que o chefe
da família dos Louden morresse enchia-a de arrependimento. Sabia
que o amigo tinha muitas coisas com que se preocupar. Eles tinham
uma conversa pendente. Ela tinha que lhe dizer que deixava o
emprego temporário como empregada de mesa. Dexter dizia-lhe
sempre, que o emprego, o que ela quisesse, estaria disponível, bem
como o salário que ela quisesse ganhar. Beatriz não queria abusar,
por mais necessitada que estivesse, por isso costumava escolher
um emprego que lhe desse liberdade, boas gorjetas e que também
a mantivesse entretida. Ser empregada de mesa era divertido, mas
não era tanto como o que fazia com a natureza.
—Tenho de trabalhar num projeto comercial com o meu irmão
Amir, em Azhat, mas quero propor-te uma coisa —disse Tahír antes
de apertar o botão que parava o elevador—. Algo em que estou a
pensar nos últimos dias.
Agarrou-a pela cintura e apertou-a contra o corpo.
—Ui, o que será? —perguntou na brincadeira.
—Vem comigo. Trabalha para mim nos jardins do palácio. Eu
pago-te generosamente e, com esse dinheiro, não vais ter de parar
de fazer o que adoras fazer, em vez de trabalhar como empregada
de mesa. Sim, é um trabalho honesto, mas desperdiças a tua
criatividade, eu vi uma parte do trabalho que fizeste na casa de
Creekon. Parar é um verdadeiro crime.
Ela ficou a olhar para ele.
—Obrigada… —suspirou— Tahír, eu tenho uma vida aqui. Não é
tão fácil fazer as malas e ir-me embora… E quem é que vai precisar
de uma designer de jardins no deserto? As pessoas à tua volta vão
começar a especular e vão olhar para mim com olhos críticos. Não
tenho vontade de aguentar esse tipo de coisas… —disse frontal—.
O meu negócio é uma prioridade. Sempre segui em frente pelo meu
esforço, não posso colocar tudo em risco por causa da possibilidade
de um affaire em que não sei quanto me deixará em perdas.
Tahír tocou-lhe no rabo e acariciou-lhe o short de surf.
—Posso convencer-te. E este affaire, ou como lhe chames,
durará o que tenha de durar. Não vamos por limites. Tu és adulta tal
como eu. Não queremos algemas.
Beatriz sorriu.
—Sempre assumindo o que eu penso.
Ele parou de lhe acariciar o rabo e subiu as mãos até debaixo
dos seios. Moveu tentadoramente os polegares sem a tocar onde
ela mais ansiava.
—Desejo-te. E sei que tu a mim. Eu nunca pedi a nenhuma
mulher que ficasse ao meu lado. Mas a ti peço. Vamos apenas viver
o que temos. Adoro estar ao teu lado, adoro o teu corpo e a tua
mente excita-me. Queres arriscar? —perguntou com um sorriso
sensual.
—É um risco muito grande.
—Uma mulher como tu assusta-se com um desafio tão simples
como este?
—Isso não é justo, Tahír.
Ele sorriu.
—Eu sei, mas jogo as minhas cartas —agarrou no rosto de Bea,
absorvendo o aroma dela— não te quero longe de mim. Tenho a
certeza que te vou pagar melhor que esse Dexter no bar que agora
está na moda.
Beatriz riu-se.
—Estou a detetar ciúmes na tua voz?
—Podes apostar que sim — respondeu ao beijar-lhe a pele,
deixando uma pequena marca. Territorial. Este era um qualificador
ideal para Tahír Al-Muhabitti.
Ela afastou-se com suavidade.
Beatriz não queria que Tahír soubesse as emoções que sentia se
estavam a tornar mais profundas. Por isso, deixou-o assumir que o
brilho que certamente tinha no olhar se devia ao desejo e não ao
amor.
—Vou contigo a Azhat com uma condição.
—Sou todo ouvidos —disse ao abanar as ancas contra as de
Bea, para tentá-la. Ela pôs os olhos em branco.
—Não penso ter relações contigo durante as horas de trabalho.
—Mmm, estás a desafiar-me?
Ela riu-se, soltou ar e acariciou o lábio inferior de Tahír com o
polegar, depois colocou a palma da mão na face dele.
—Não, Tahír, falo a sério. Se me vais pagar para trabalhar, então
é só para isso. Caso contrário, vou sentir que me pagas para ter
relações contigo.
—Isso não é verdade, Bea. Porque distorces o significado das
coisas?
—Só quero deixar este ponto bem claro.
—Isso não tem sentido —insistiu ele, claramente contrariado.
—Temos um acordo? —perguntou. Ela manteve a mão na face,
acariciando-a, porque queria fazê-lo entender que embora o
desejasse, também merecia que ele a ouvisse e que no seu mundo
a respeitasse como profissional. O último não iria acontecer a
menos que ele aceitasse esta condição.
Ele olhou para ela. O que mais queria era estar com ela. Quando
estivessem no palácio, talvez se divertisse a tentar seduzi-la para
esquecer esta condição. Gostava de sentir que ela seria sempre um
desafio na vida dele.
—Sim senhora, temos um acordo — ele disse com uma voz
astuta, antes de pressionar o botão do elevador para reiniciar —. E
como ainda não trabalhas para mim, vou devorar a tua boca e fazer-
te gemer o meu nome nos próximos dias que passe aqui em
Melbourne. A todas as horas do dia! O que achas?
— Tenho de fazer os últimos turnos para Dexter, mas, no meu
tempo livre, espero que mantenhas a tua palavra. Embora, muito
provavelmente, sejas tu a gritar o meu nome.
—Gosto de mulheres atrevidas.
— Eu sou novata nas lides do sexo, mas aprendo rápido. Não
há dúvida sobre isso —disse ao piscar-lhe o olho.
O elevador deu lugar à suíte presidencial do hotel e, quando
Tahír fechou a porta, o mundo desapareceu e só ficaram eles.
—Vamos confirmar isso —sussurrou contra a boca de Beatriz
antes de se perder completamente no seu sabor.
***
Freya estava a terminar de organizar o arquivo. A
correspondência era guardada e digitalizada num disco rígido
externo e físico. Ambos os métodos eram uma exigência da
administração real, e fazia todo o sentido.
No palácio vivia-se uma intensa turbulência com a notícia de que
o rei abdicaria em favor do filho Bashah. Havia especulações de que
seria em breve, mas sob nenhuma circunstância essas suposições
saíram dos muros da fortaleza que abrigava a família real.
Naquela manhã, um dos guardas do palácio parecia
particularmente interessado nela. Estavam a conversar há algum
tempo, ou flertando, até que ela teve que entrar no escritório. Freya
não tinha todo o tempo do mundo. A prisão tirou-lhe anos valiosos
em que podia ter salvado a irmã. Todos os dias se perguntava se ela
estava a ser bem tratada, se a família que a tinha acolhido era boa
ou se a tratavam mal, e se ela se lembrava dela.
Conversar com alguém no palácio real, que quisesse ou fingisse
ser amigo, não era desperdiçar tempo. Para Freya qualquer aliado
podia ser útil a longo prazo. Já tinha verificado que os membros
serviçais eram mais acessíveis do que os sombrios seguranças que
estavam parados nas principais entradas e corredores externos ao
redor da fortaleza do palácio.
Graças a Phot, uma gentil empregada de limpeza, Freya
conseguiu encontrar-se com Tahír. Os funcionários costumavam
dizer que os príncipes eram muito acessíveis e amigáveis, e ela
aproveitou-se desse detalhe para perguntar a Phot se achava
possível ajudá-la a encontrar o príncipe Tahír de uma maneira que
parecesse uma coincidência, porque lhe dava vergonha pedir uma
audiência, principalmente, sendo uma funcionária do departamento
administrativo. Também acrescentou que era uma pessoa que o
admirava muito. A mulher ficou entusiasmada e ajudou-a.
Ela teve muita sorte a esse respeito, e também pelo fato da sua
tentativa de organizar uma manifestação ter sido encarada como
uma explosão de uma mulher ferida em vez de um insurgente para
criar o caos em Tobrath. A verdade é que Tahír podia tê-la prendido
ou algo semelhante. Não o fez. Talvez isso significasse que ele
ainda tinha um pouco de coração por ela, embora não quisesse
tentar o seu destino. Foi-lhe negada a audiência que solicitou como
uma das duas condições para deixar de lado a ideia de protestar
com um grupo que costumava apoiar todas as suas iniciativas, não
importa o quão tolas ou loucas elas fossem - eram conhecidos por
não terem nada melhor para fazer que lutar por causas sem sentido
- mas ela sentiu-se aliviada quando conseguiu um emprego.
Ela não sabia fazer muito mais, porque mal tinha uma
preparação académica, embora na prisão trabalhasse como uma
pessoa de confiança no departamento médico e mantivesse todos
os registos médicos dos reclusos com discrição e ordem. Pelo
menos essa meticulosidade serviu para trabalhar no departamento
administrativo adjacente ao palácio real. Nem todas as batalhas
podiam ser ganhas. O importante já estava no menu: tinha Tahír por
perto e com ele a possibilidade de recuperar Elmahi.
—Hey —disse uma voz nas costas dela.
Virou-se com um sorriso estudado e deixou de lado um conjunto
de canetas que acabavam de chegar do supermercado.
—Sim?
—Estás a ocupar muito espaço com essas pastas e canetas —
disse zangado um tipo com bigote e pele cor de azeitona. Ele tinha
uma aparência intensa, não no sentido atraente, mais pelo contrário.
—O teu sotaque é diferente —comentou amavelmente—. Sou a
Freya.
Os cidadãos de Tobrath têm um modo particular de pronunciar
as últimas letras das palavras que terminam em "e", parece que o
arrastam. Esse homem tinha uma pronúncia diametralmente
diferente.
—Sim? Isso não me interessa, a única coisa que quero é que
organizes isto — respondeu deixando-a com a palavra na boca
quando Freya quis responder —. E se continuares aí parada serei o
teu pior pesadelo.
«Idiota.» Freya encolheu os ombros e afastou-se com relutância.
Melhor ter os idiotas longe de vista.
Freya foi até ao WC e olhou-se ao espelho antes de sair. Tinha
trinta e três anos. Ela passou os dedos pelos contornos dos olhos.
Ao contrário de outras mulheres, ela já tinha sulcos marcados, até
na testa. Já não tinha o brilho de atrevida que um dia teve. O brilho
da vida e alegria. Ela teve de escolher entre a família e o amor. A
família venceu, mas ela nunca esperou pagar com a prisão. Aquela
noite, anos atrás, deveria ter terminado de maneira diferente. No
final, ela perdeu tudo.
—Freya, almoçamos juntas? —perguntou Brunah.
—Claro. —Olhou para o relógio—. Pensei que ainda faltavam
duas horas para o almoço. Há anos que não vou ao deserto… O
tempo ali parece que não existe.
Nos próximos dois meses vai haver um campo aberto para os
berberes. Devido a um acordo com o grupo que gere as áreas de
preservação cultural no país, eles concordaram em ensinar aos
cidadãos que desejam métodos para sobreviver no deserto e
técnicas de meditação—Mmm… Isso parece interessante. A
modernidade parece consumir-nos e estamos a perder de vista o
importante que é entender as raízes do que nos rodeia.
—Ui, estás muito filosófica — disse Brunah quando abriram a
porta da sala de jantar para os funcionários.
—Não —riu-se—. Talvez os príncipes estejam mais ligados ao
deserto do que nós, cidadãos comuns.
—Ouvi comentários de que o príncipe Tahír está fora do país há
vários dias ... Ninguém comenta nada. Quando se trata desse
príncipe, Karim é uma sepultura. Ele defende-o com capa e espada
como se fosse o seu próprio filho.
Freya encolheu os ombros.
— Deixemos o Al-Muhabitti de lado e vamos apreciar a comida.
Eu sei que vão mudar o chef desta temporada, porque querem
trazer um francês. E podemos sugerir o menu!
Freya não queria dar asas à curiosidade diante de Brunah. Não
queria que ela suspeitasse que havia um interesse pessoal pelo
Tahír, além daquele que despertava no público em geral. Ela sabia
que ele era um homem muito ocupado.
Freya esperava que ele voltasse rapidamente de onde estivesse.
Ambos tinham uma conversa pendente, e ela, além disso, uma irmã
para encontrar.
***
—Posso oferecer-te uma mala de viagem sem problemas —
disse Tahír, nu na cama, observando Beatriz com uma expressão
frustrada, porque acabava de estragar o fecho da mala que
costumava levar de viagem —. De facto, gostava muito que me
deixasses oferecer-te uma.
Ela cruzou os braços. Estava em cuecas e sutiã. As suas partes
mais sensíveis ainda sentiam a auréola das carícias de Tahír.
—Não quero que me ofereças nada. Talvez as tuas amantes
estejam acostumadas a receber coisas ou até mesmo esperar por
elas, mas eu sou diferente. Além disso, acho que vou ter de passar
na casa dos meus pais por uma das minhas muitas malas de
viagem que certamente estão num estado melhor do que as que
tenho aqui.
—Como és teimosa! — murmurou, sentando-se, muito
confortável e ciente de que o seu sexo estava a começar a ficar
ereto.
—Tahír…
Beatriz conhecia perfeitamente aquele olhar. Os olhos verdes
claros ficavam um pouco mais escuros quando ele estava animado.
Talvez não fosse algo notório para as outras pessoas, mas para ela,
sim. A ideia era ir o mais rápido possível para Azhat, já que ele a
seduzia sempre que queria, embora não naquele momento.
—Vem comigo para a cama. Depois resolvemos algo tão simples
como as malas… —pediu com voz sensual, esticando-lhe a mão.
«Como negar algo assim a um homem que fala contigo desta
maneira e te faz arder com os olhos?», perguntou-se Beatriz
sorrindo sem esforço.
—Depois soluciono este assunto — murmurou quando a pegou
nos braços e caíram juntos na cama.
Os beijos de Tahír eram apaixonados e Bea começava a viciar-
se neles. Gostava da maneira como ele a tratava. Cada carícia
daquela boca dava uma nova dimensão ao prazer e ao desejo.
Sentiu os lábios de Tahír percorrem o queixo, o pescoço e voltarem
para o lóbulo da orelha. Depois tirou a roupa com uma velocidade
incrível. Ela não se resistia, porque descobrir o prazer nos braços
daquele homem era uma experiência que queria repetir várias
vezes. Ela sentia que suas vibrações estavam na mesma sintonia e
isso fazia com que se sentisse mais confiante no novo campo físico.
—Dá a volta, Bea — perguntou. Tinha fantasiado em tê-la de
outra maneira, e não ia perder a oportunidade. Ela observou-o com
uma expressão de dúvida no rosto —. Dá a volta, nena. Confia em
mim— disse levantando um dedo e girando-o com lentidão
deliberada, enquanto acompanhava o gesto com um sorriso
travesso.
—De acordo… — respondeu com uma voz que mostrava desejo
e encorajava Tahír a deixar de lado o seu autocontrole e possuí-la
sem premissas.
Ela trocou de posição.
Ele percorreu com a ponta do dedo indicador da nuca até a parte
inferior das costas da pele sedosa de Beatriz, com muita delicadeza.
Ela tremia. Depois, inclinou-se sobre ela e substituiu os dedos pela
boca. Voltou a traçar o caminho para cima e para baixo,
atravessando as costas de Bea, decidido a manter o autocontrolo
perante os sussurros de prazer que ela emitia. Lambeu as pequenas
covinhas acima das nádegas.
—Tahír… —murmurou perdida nas sensações que ele lhe dava.
Bea sentia a ereção ardente roçando-lhe a pele, sentia-a quente e
latejante. Ele percorria-lhe a pele como se estivesse a memorizar
um mapa.
Bea virou levemente a cabeça e fixou-se nos olhos de Tahír.
O príncipe viu um forte desejo naqueles lindos olhos, e ele ia
explodir só com a ideia de tê-la naquela posição. Tal como
fantasiava. Pôs-se atrás dela. Com uma mão levantou-lhe uma
perna e colocou-a na anca dele. Quando Beatriz olhou para ele
novamente, ele beijou-a nos lábios.
—Tive a fantasia de ter-te assim desde a primeira vez. E quero
saber se gostas…
Sem mais delongas, ele investiu. Soltou um gemido plácido
quando sentiu os músculos internos de Bea se contraírem em torno
do seu sexo ereto. Agarrou-o firmemente com a mão, mantendo-a
aberta, enquanto investia repetidamente na carne húmida. Ela
gritou.
—Toca-te, Beatriz…—pediu-lhe—. Toca-te no peito… Aperta-os
como se fosse eu quem te estivesse a tocar enquanto te penetro.
Frente a Beatriz havia um amplo espelho. Ambos podiam ver-se
a partir da posição na cama. Era uma cena erótica e cheia de um
desejo primário.
Ela obedeceu, tocou-se e ouviu Tahír ofegar. O atrito dos corpos
chocantes era a nota alta de uma nota que começou como um
silêncio e que agora se tornou numa batida impossível de descrever
com palavras.
—Sinto-te mais profunda que em outras posições —disse ele
deixando-se levar pelas sensações.
—Diz-me se gostas…
—Sim. —Ele investiu com mais força e mais rápido—. Sim… Oh,
sim, Tahír…
Eles estavam perto do clímax. Tahír agarrou no lóbulo da orelha
de Bea entre os dentes, mordiscou-o com firmeza e logo começou a
sentir os espasmos femininos ao redor do seu sexo. Beatriz
empurrou os quadris para trás, as nádegas fizeram contato com a
pélvis de Tahír, enquanto ele segurava a perna dela e penetrava o
seu corpo com longas investidas.
—Bea… Sim, faz assim… grita para mim… Preciso de ouvir o
prazer da tua boca —murmurou na orelha dela.
—Tahír! — exclamou colocando os dedos sobre o antebraço
masculino.
O príncipe soltou um rugido que ofuscou os gritos de Beatriz.
—Oh, querida…
O orgasmo veio como uma avalanche, deixando-o vulnerável,
cobrindo todos os pensamentos que tinha em mente. Quando os
corpos se começaram a acalmar lentamente, ele beijou Beatriz e
abraçou-a com firmeza.
As horas seguintes passaram vertiginosamente.
Após fazerem amor, tomaram banho juntos e depois foram para
a praia. Tahír não se lembrava de se ter divertido tanto com uma
mulher como com Beatriz.
Eles caminharam, comeram num dos lugares mais exclusivos,
cujos pratos excediam os cem dólares australianos. Os pratos eram
exóticos e, segundo a ementa, afrodisíacos. Embora ele não
precisasse de nada disso para desejar a mulher que tinha ao seu
lado.
A ideia de voltar à Austrália foi mesmo boa. A Beatriz era uma
pessoa simples e ria-se facilmente. A comunicação com ela não era
difícil, e o melhor de tudo era que sabia respeitar os períodos de
silêncio que ele precisava de vez em quando. Não era muito curiosa
pela sua vida no palácio, e isso deixava-o um pouco inquieto, mas
não o suficiente para suspeitar de algo estranho.
Agora que tinha uma mulher que parecia interessada nele, e não
no título que trazia, entrar num esquema de cinismo desenfreado
não tinha nenhum sentido. Além disso, de que lhe servia? O melhor
que podia fazer era aproveitar ao máximo estes dias.
Ele pediu ao Karim, para que este pedisse à equipa jurídica, a
elaboração de um contrato de trabalho de dois meses para Beatriz.
O contrato era apenas uma formalidade. Nenhum cidadão
estrangeiro podia pôr os pés em Azhat para trabalhar sem um
contrato. E isto aplicava-se a todas as instâncias, incluindo a família
real. Fazia parte das políticas de "justiça social" que o rei elogiava,
regulada pela equipa jurídica do palácio e o Parlamento.
Aquele era o último dia antes de partir para Azhat.
A Tahír estava à espera que a Bea acabasse de se vestir.
Estavam na suite do hotel onde o príncipe estava hospedado. Os
dois iam a uma festa de gala para a qual ele tinha sido convidado e
que lhe custou convencer a Bea a acompanhá-lo. O que mais queria
era vê-la com o belo vestido azul claro. Um vestido de uma boutique
de Melbourne, que ele não pagou porque ela teimou em pagá-lo.
Habituado a comprar presentes às amantes, o facto de Bea não
lhe ter permitido dar-lhe um vestido atenuou a tendência que tinha
para desconfiar das mulheres. Será que ela era tão genuína como
parecia? Beatriz tinha-lhe dito que a sobrevalorização da virgindade
feminina era machista e insistiu que a primeira experiência sexual
era importante, mas não ao ponto de fazer dela um grande negócio
ou de ficar chocado com o número de parceiros sexuais que uma
mulher podia ou não ter.
Tahír vinha de uma cultura machista que, graças ao seu pai e
irmão, começou a mudar rapidamente. A virgindade de uma mulher
era uma das características mais importantes para escolher uma
rainha ou uma princesa. Ele não se importava com isso e, no caso
de Beatriz, ele sentia-se privilegiado por ter sido o primeiro.
No entanto, ele queria a paixão de Beatriz apenas para ele. E
pensava mantê-la assim. Era possessivo, sim. Um pequeno detalhe
que acabava de descobrir com a ideia de que Bea pudesse estar
interessada em viver uma paixão por o com outra pessoa. Estranho
para um homem com tanta experiência entre lençóis como ele, e
que pouco ou nada lhe importava o que as amantes faziam depois
que saíam da sua cama.
CAPÍTULO 13