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Atividade avaliativa de Intervenções Psicanalíticas ll: Análise sobre o episódio

“Breno” do seriado “Sessão de Terapia”


Alunas: Catarina Carneiro, Maria Luísa Leite e Shirleide Castro

O seriado “Sessão de Terapia”, disponibilizado na plataforma GloboPlay,


aborda, em cada temporada, os atendimentos de alguns pacientes de Theo, um
renomado psicanalista. Para realizar uma análise das intervenções utilizadas por este,
escolhemos assistir os episódios relacionados aos atendimentos de Breno, um atirador
de elite que estava afastado do trabalho por uma situação moralmente julgada pela
mídia e pela sociedade. No início da primeira sessão, por exemplo, o analisando
questiona Theo sobre o seu conhecimento em relação ao caso e acaba explicando o que
de fato aconteceu. Pelo que nós compreendemos, houve um embate entre os atiradores
de elite e um dos traficantes mais procurados do Rio de Janeiro em uma escola na
periferia. Em um dos momentos, Breno disse que recebeu uma ordem do seu superior
para atirar, atingiu o traficante, mas o tiro acabou batendo na parede e atingiu uma
criança que estava escondida embaixo da mesa, no pátio da escola. Tal situação gerou
uma indignação nacional e, apesar do analisando se mostrar orgulhoso por ter sido a
pessoa que assassinou o traficante, durante a sessão, o analista questiona se não existe
uma culpa envolvida pela morte da criança. De toda forma, tal culpa é atribuída ao seu
superior, que deu a ordem de atirar.
Ainda na mesma sessão, é visível como o paciente tem uma forma arrogante e
impaciente de se expressar. Chegou a dizer que pediu indicação do “melhor”
psicanalista da região para várias pessoas, incluindo outros dois pacientes e os seus
familiares. A partir de tal comentário, Breno demonstra desejar que Theo o “aconselhe”
em relação ao seu possível retorno para o local onde aconteceu os assassinatos, tendo
em vista que as pessoas da comunidade poderiam reconhecê-lo. O psicanalista, na maior
parte do tempo, traz novos questionamentos sobre a situação e isso parece aborrecer o
analisando, que chega a verbalizar que o valor da sessão não condiz com o trabalho do
profissional. Logo, ao associarmos o seriado com as percepções de Fink (2018, p. 18), é
possível perceber que “o analista tem de deixar claro que tudo na relação deles é
significativo, e que sua relação não se assemelha a nenhuma outra. O analista não é um
amigo que troque histórias ou segredos, que empreste livros ou fitas”. Os primeiros
encontros de uma análise, portanto, são dedicados para estabelecer que não há
reciprocidade entre analista e analisando.
Além disso, Breno chegou a comentar sobre um episódio que teve de “quase
morte”, enquanto estava correndo com o seu amigo Fábio – que ele comenta ser gay,
inclusive – e que, por eles terem se exercitado mais do que o comum, o paciente acabou
tendo uma parada cardíaca. Tal situação ocorreu antes do processo de Breno acontecer
e, por isso, Theo questionou se aumentar a frequência do exercício não foi um
mecanismo para evitar a sua presença no tribunal. Ao longo da sessão, o paciente ainda
traz que, após o acidente, a sua mulher, Milene, estava “enchendo o seu saco” com
tantos cuidados, inclusive, não permitindo que ele tomasse café. Novamente, o analista
questiona o motivo dele achar que ser cuidado por alguém é ruim e Breno diz que não
suporta mais a mulher. Afirma que não sabe o motivo de estar casado com a mesma
mulher há 10 anos e que o seu jeito metódico o irritava. Ainda segundo Fink (2018, p.
20), “diversos pacientes buscam a terapia com a demanda muito explícita de se livrarem
de um ou mais sintomas específicos. Entretanto, não se pode eliminar um sintoma de
um paciente sem sondar outros aspectos da vida da pessoa”. Ou seja, é interessante
perceber que Theo não compra a “ideia” da suposta insatisfação matrimonial de Breno e
tenta investigar outros aspectos de sua vida, como a relação com os seus pais.
Pela nossa perspectiva, Breno aparentou ser uma pessoa resistente a algumas
perguntas que Theo fazia e até mesmo as pontuações que eram colocadas sobre os fatos
trazidos pelo paciente. Segundo Fink (2018, p. 22), “a pontuação das manifestações do
inconsciente (repetir um lapso da fala do paciente, por exemplo) pode aborrecer alguns
pacientes, no começo, porque tais manifestações são aquilo que aprendemos a corrigir
rapidamente na conversa cotidiana, atribuindo-lhes pouco ou nenhum significado”.
Além disso, ao questionar o analista se ele realmente poderia ajudá-lo, escuta que não
há como prever e que não existe uma receita mágica. Tal resposta traz angústia ao
analisando, que comenta preferir o diagnóstico certeiro que um médico geralmente dá,
por exemplo. Ademais, trazendo uma comparação da fala de Breno com uma questão
colocada por Fink sobre a mentalidade norte-americana, é comum presumir-se que:

o psicoterapeuta é alguém que não conseguiu enfrentar a faculdade de


medicina, que foi reprovado em matemática ou ciências no bacharelado e
cuja experiência com a natureza humana pode não ser mais profunda que a
dos âncoras dos programas de entrevistas no rádio. Os norte-americanos
confiam tão pouco na psicologia ou na psicanálise quanto na astrologia e na
quiromancia (talvez confiem até menos, na verdade). É muito comum as
pessoas chegarem à terapia sem a menor convicção de que o terapeuta possa
ajudá-las e se manifestando francamente céticas quanto ao tipo de saber que o
terapeuta professa manejar (FINK, 2018, p. 36).

Theo, no final das contas, tenta fazer Breno compreender que o processo
psicanalítico exige comprometimento e que o passo a passo é uma conquista diária. Até
que este questiona para o analisando: “Você quer enfrentar esse passo a passo de
autoconhecimento?”. Este último, no entanto, é uma pessoa que tende a seguir as regras
de alguém, não é a toa que não assumiu a sua responsabilidade pela tragédia na escola,
apenas a atribuiu para o superior. Breno, após o questionamento, diz que pode ser
interessante ouvir mais o que o analista tem a dizer e deixar ser ajudado por ele. Além
disso, afirma que precisa mirar em outros alvos, sem necessariamente esperar a ordem
do seu comandante, como fez a vida inteira. Logo depois, traz outra questão: “se eu
mirar nesse passo a passo, não estarei, de toda forma, acatando a uma ordem?”. O
paciente, no final das contas, parecia estar tentando compreender qual era o sentido de
uma análise. Pela demanda que ele trouxe, a ideia era trazer mais autonomia para a vida
desse sujeito, questão que poderia e/ou deve começar no processo terapêutico. Theo
responde que pode ser, no máximo, o seu ajudante.

o paciente que chega ao analista num estado altamente sugestionável, certo


de que o analista é o detentor de todo o saber, tem muito menos
probabilidade de se dar conta de que é o paciente que deve empenhar-se no
sério trabalho analítico da associação. Tal paciente talvez se incline mais a
enunciar em termos sucintos o seu problema, formulado de modo consciente,
e a esperar pela solução indubitavelmente brilhante do analista (FINK, 2018,
p. 37)

Ainda de acordo com Fink (2018, p. 49), “também considerável é o poder do


analista como ouvinte, e, por “escutar” constantemente as afirmações do analisando
como algo diferente de “simples” demandas, ele pode abrir um espaço em que o desejo
é vislumbrado, por baixo ou por trás da demanda”. Logo, é importante pontuar que
existiram momentos, ao longo das sessões de Breno, em que houve uma tomada de
consciência sobre os seus desejos. Não sentir mais tesão pela esposa ou por Júlia
significava algo a mais? Ter vivido uma infância repressora e que não o permitia
expressar seus sentimentos trouxe sequelas para a vida adulta do analisando? São alguns
dos questionamentos feitos por Theo que, mesmo não sendo feitos exatamente nas
mesmas palavras, despertaram um olhar diferente de Breno sobre si mesmo. “Daí a
descrição lacaniana da verdadeira interpretação analítica como “fala oracular”. O
analista diz algo polivalente o bastante para que tenha repercussão mesmo não sendo
compreendido, para que desperte a curiosidade e o desejo de saber por que o analista
disse o que disse, e para que convide a novas projeções” (FINK, 2018, p. 52).

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