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INTOXICAÇÃO POR PARACETAMOL EM FELINOS – REVISÃO

DE LITERATURA

FERRARI, Priscila Aparecida Penteado


Acadêmicos do curso de medicina veterinária da FAMED/ACEG – Garça – SP.
e-mail: pri_ferrari27@hotmail.com
BISSOLI, Ednilse Damico Galego
Docente do curso de medicina veterinária da FAMED/ACEG – Garça – SP.
ednilse.bissoli@uol.com.br

RESUMO

O paracetamol (acetaminofeno) é um fármaco do grupo da aspirina, utilizado por sua ação analgésica
e antitérmica. Nas décadas de 60-70 esse medicamento foi amplamente utilizado, tanto em seres
humanos como em animais. Nos gatos há uma exceção, devido à deficiência na glicuronidação e à
rápida saturação da via de sulfatação, resultando numa produção de metabólitos tóxicos, causando
hemólise intravascular e metahemoglobinemia, reduzindo a capacidade do eritrócito de transportar
oxigênio. Outros sintomas são observados como mucosas de coloração azulada, salivação e vômitos,
icterícia, hemoglobinúria e hematúria. O tratamento consiste em lavagem gástrica que diminui a
absorção de paracetamol e administração da N-acetilcisteína (NAC), por via intravenosa ou oralmente
e tratamento suporte.

Palavras Chave: Acetaminofen, glicuronidação, N-acetilcisteína


Tema Central: Medicina Veterinária

ABSTRACT

Paracetamol (acetaminophen) is a drug from the aspirin group, used for its analgesic and antipyretic.
60-70 In the decades of this drug was widely used in both humans and animals. In cats there is an
exception, due to impaired glucuronidation and rapid saturation of the sulfation pathway, resulting in
production of toxic metabolites, causing intravascular hemolysis and methemoglobinemia, reducing
the ability of erythrocytes to carry oxygen. Other symptoms are seen as bluish discoloration of the
mucous membranes, salivation and vomiting, jaundice, hemoglobinuria and hematuria. Treatment
consists of gastric lavage which decreases the absorption of paracetamol and administration of N-
acetylcysteine (NAC), intravenously or orally and supportive car.

Keywords: Acetaminophen, glucuronidation, N-acetylcysteine

1. INTRODUCÃO

Uma vez que a popularidade do gato vem crescendo a cada dia e, em alguns
países, esses felídeos já são considerados como principal animal de estimação,
muito tem sido discutido, na Medicina Veterinária, em relação à sua terapêutica. De
acordo com as entidades do segmento Pet, no Brasil, há hoje uma população de
aproximadamente 12 milhões de gatos, número que tende a aumentar
consideravelmente nos grandes centros urbanos, visto que eles são animais mais
independentes e se adaptam facilmente a ambientes menores, como apartamentos
(ANJOS, 2009).
Vários são os agentes tóxicos capazes de provocar intoxicações tanto em
humanos como em animais. Os casos de intoxicação são atualmente atendidos com
certa freqüência em todas as clínicas veterinárias do país e representam emergência
clínica na maioria das vezes (HANSEN, 2006).
É considerada a principal causa de insuficiência hepática na Grã-Bretanha e
EUA, seja de forma acidental ou uso abusivo, e principal causa de morte por
medicamentos (ALVEZ, 2004).
Relatos toxicológicos são encontrados desde muito cedo na história do
homem (HANSEN, 2006).
No Brasil, uso do paracetamol pela população em geral teve início nos anos
80, passando a ser amplamente utilizado na década de 90 (SCHUH, 2007).
O paracetamol (acetaminofeno) é um fármaco do grupo da aspirina, utilizado
por sua ação analgésica e antitérmica. Seu emprego na medicina teve início com
Von Mering, no ano de 1893, porém somente nas décadas de 60-70 esse
medicamento foi amplamente utilizado, tanto em seres humanos como em animais,
especialmente em cães e gatos; entretanto, mas seu uso e dosagens foram
baseados nos estudos em serem humanos (SPINOSA, 1999).
O presente trabalho teve o objetivo de desenvolver uma revisão de literatura
sobre intoxicação por paracetamol em felinos, mostrando a absorção, metabolização
e excreção do medicamento, os sintomas e o tratamento após uma dose elevada de
paracetamol ocasionado uma intoxicação.

2. CONTEÚDO

O paracetamol, também conhecido acetaminofen, pertence ao grupo dos


antiinflamatórios não esteroidais (MOTTIN, 2009). Os paraminofenóis se
caracterizam por possuir um alto pKa e baixo grau de ligação com proteínas
plasmáticas, o que lhes confere características farmacodinâmicas distintas daquelas
obtidas na administração de AINEs .O paracetamol atua de forma mais especifica
sobre a prostaglandina sintetase no cérebro, promovendo ação antipirética que se
baseia no bloqueio na ação de pirógenos endógenos no centro do hipotálamo
regulador de temperatura (SPINOSA,1999 ).
A absorção do paracetamol após sua administração oral depende do tempo
de esvaziamento gástrico, sendo absorvido no intestino delgado de forma rápida e
praticamente total. A concentração plasmática atinge o pico em cerca de 30 a 60
minutos e a meia vida é de cerca de 2 horas após a ingesta de doses terapêuticas.
Tais valores são prolongados nas overdoses, havendo uma correlação direta com a
dose ingerida (SCHUH, 2007).
Na maioria das espécies animais, a metabolização do acetaminofeno envolve
reações de glicuronidação e sulfatação, e uma pequena quantidade é
biotransformada pelas enzimas da fase 1 (citocromo P450) á metabólitos tóxicos.
Estes são removidos pela conjugação com o glutation antes que possam causar
lesões no organismo. No gato, devido à deficiência na glicuronidação e à rápida
saturação da via de sulfatação, o acetaminofeno é desviado para as enzimas da
fase 1, o que resulta na formação de maior quantidade de metabólitos tóxicos para
serem inativados através da conjugação com o glutation. O glutation sofre depleção
rapidamente e os metabólitos tóxicos acumulam-se, causando injúria oxidativa à
hemoglobina e lesão hepatocelular (ANJOS, 2009).
Apresenta capacidade de atravessar a barreira hemato-encefálica, bem como
a barreira placentária, onde é metabolizada pelos hepatócitos fetais. A excreção é
através da eliminação renal, 90 a 100% do fármaco ingerido em doses terapêuticas
são encontrados na urina durante o primeiro dia de uso (SCHUH, 2007).
Sua ação limita-se às células que contem grande quantidade de peróxido,
como a que ocorre no caso das plaquetas. Seu leve efeito antiinflamatório reside na
capacidade de atuar sobre a remoção dos radicais livres participantes da reação
inflamatória e inibir a migração de leucócitos. Com relação aos efeitos colaterais, os
gatos são especialmente sensíveis a ação do paracetamol, pois esta espécie animal
não realiza bem a conjugação pela glicuroniltransferase, enzima hepática necessária
para a correta eliminação desde antiinflamatório; portanto, não se indica para essa
espécie animal a administração da substância (SPINOSA, 1999).
Gatos são mais susceptíveis ao desenvolvimento de metemoglobina do que
os cães, pois mais grupos sulfidril reativos estão presentes na sua Hemoglobina
(oito a vinte nessa espécie, contra dois a quatro em cães), tornando mais difícil
manter o ferro em estado reduzido sob condições de estresse oxidativo (MOTTIN,
2009).
O paracetamol é extremamente tóxico para os gatos e não deve ser
administrado em nenhuma situação. Ao contrário do que acontece nos seres
humanos, os gatos não morrem pela hepatotoxicidade do paracetamol, mas sim
porque em vez da formação de metahemoglobina, aparecem os corpúsculos de
Heinz nos glóbulos vermelhos, impedindo o aporte de oxigênio às células, acabando
por aparecer a hipóxia. Na intoxicação por este fármaco ocorre hemólise
intravascular e metahemoglobinemia, reduzindo a capacidade do eritrócito de
transportar oxigênio (ANJOS, 2009).
A dose tóxica para cães é de 200 a 300 mg/kg e para gatos é de 50 a 100
mg/kg. Enquanto que em cães a hepatoxicidade é o principal sinal clínico, em gatos
a intoxicação se manifesta pelos sinais de metemoglobinemia (MOTTIN, 2009).
Os gatos intoxicados apresentam inicialmente mucosas de coloração azulada,
salivação e vômitos, que se iniciam nas primeiras 4 horas de exposição; também se
observa depressão, anorexia e edema facial (após cerca de 3 dias)
(SPINOSA,1999).
Os sinais clínicos mais comuns em gatos são hemólise e anemia (por causa
do aumento da fragilidade das células vermelhas e da formação de corpúsculo de
Heinz), icterícia, hemoglobinúria e hematuria (podem aparecer quando os níveis de
meta-hemoglobina excedem a 20%), cianose (que é a mais marcante em gatos, que
se desenvolve a partir da meta-hemoglobinuria, 4 a 12 horas após a ingestão),
dispnéia, edema facial e de patas, depressão do SNC, hipotermia e êmese. Sinais
menos comuns incluem coma, fraqueza generalizada e morte (SPINOSA, 2008).
Casos graves levam a um quadro de coma e morte. A intoxicação de cães
também tem sido relatada, porém, associada a doses muito maiores do que as
observadas em gatos (SPINOSA, 1999).
O tratamento inicial, se ainda em tempo hábil, é a lavagem gástrica (ANJOS,
2009), afim de diminuir absorção do medicamento, devendo ser realizada em até 2
horas após a ingesta (SCHUH, 2007).
Adicionalmente administra-se a N-acetilcisteína (NAC), por via intravenosa ou
oralmente, ele funciona como antídoto, reduzindo a toxicidade do paracetamol, ao
fornecer grupos sulfídricos para serem oxidados no lugar da hemoglobina e das
proteínas estruturais dos hepatócitos. Dessa forma, a N-acetilcisteína repõe os
estoques de glutation e compete pelo intermediário tóxico, pois este se liga
preferencialmente ao glutation, quando disponível, ao invés de ligar-se às
macromoléculas celulares (ANJOS, 2009).
Outros medicamentos que podem auxiliar como adjuvante no tratamento por
intoxicação por paracetamol, embora de eficácia ainda não comprovada, são os
ácidos ascórbico ou vitamina C (reduz a quantidade de metabolitos tóxicos reativos
e auxiliar na conversão de metemoglobina em hemoglobina) e a cimetidina (inibe o
metabolismo oxidativo hepático do paracetamol) (SPINOSA, 2008).
O carvão ativado, ao adsorver o paracetamol, reduz a quantidade absorvida
pelo trato gastrointestinal. A administração de carvão ativado tem também a
vantagem sobre a lavagem gástrica de não permitir a aspiração pulmonar.
Inicialmente havia alguma relutância em utilizar o carvão ativado, porque este podia
também absorver a N-acetilcisteína (ANJOS, 2009).

3. CONCLUSÃO
O paracetamol, também conhecido como acetaminofen é tóxico para os
felinos, pois sua detoxificação por meio da glicuronidação é pobre, pois os gatos
possuem baixos níveis de glicuronil-transferase, resultando na produção de N-acetil-
p-benzoquinoneimina, um metabólito tóxico, por tanto não recomenda-se o uso
desta medicação para os felinos.

4. REFERÊNCIAS

ALVES, Antonio Vinicios; FRANCELINO, Eudiana Vale. PARACETAMOL: RISCOS


DE HEPATOTOXICIDADE E INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS. CENTRO DE
FARMACOVIGILÂNCIA DO CEARÁ (CEFACE), INFORME Nº 14, JULHO, 2004.

ANJOS, Tathiana Mourão. Peculiaridades Farmacológicas,Fisiológicas E


Terapêuticas Em Medicina Felina. Belo Horizonte, 2009.

HANSEN, Danielle Taborda Klug. Prevalência De Intoxicações De Cães E Gatos


Em Curitiba, Universidade Federal Do Paraná – Ufpr Setor De Ciências
Agrárias, Curitiba, 2006.

MOTTIN, Tatiane Da Silva. Tóxicos que interferem no transporte de oxigênio


pela hemoglobina. Seminário apresentado na disciplina BIOQUIMICA DO TECIDO
ANIMAL, no Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Professor responsável pela disciplina: Félix H. D.
González, no primeiro semestre de 2009.

SCHUH, Diego Callai. Intoxicações E Exposições Por Paracetamol Análise De


Seis Anos De Registros Do Centro De Informações Toxicológicas De Santa
Catarina – Cit/Sc, Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina, 2007.
SPINOSA, Helenice de Souza; GÓRNIAK, Silvana Lima; BERNARDI, Maria Martha.
Farmacologia Aplicada À Medicina Veterinária, Segunda Edição, Guanabara
Koogan, 1999.

SPINOSA, Helenice de Souza; GÓRNIAK, Silvana Lima; BERNARDI,PALERMO,


João Neto. Toxicologia Aplicada À Medicina Veterinária. 1 Edicão, Barueri – SP,
Editora Manole Ltda,. p.942, 2008

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