Você está na página 1de 10

Uma visão sobre

o projeto ERAS
Enhanced Recovery After Surgery

Luiz Fernando dos Reis Falcão


MD, MBA, PhD, TSA

Professor e Vice-chefe da Disciplina de Anestesiologia, Dor e Medicina


Intensiva, Universidade Federal de São Paulo, Escola Paulista de Medicina

Pós-doutorado pela Universidade de Harvard, Massachusetts


General Hospital

Sócio-Diretor de Operações do Grupo de Anestesiologistas Associados


Paulista, GAAP

Diretor de Relações Internacionais da Sociedade de Anestesiologia


do Estado de São Paulo, SAESP

O conteúdo inserido expressa a opinião do autor e é de sua inteira responsabilidade.


Anestesia | UMA VISÃO SOBRE O PROJETO ERAS 3

Em torno de cinco bilhões


de pessoas no mundo
não têm acesso adequado
a cuidados perioperatórios
com eficiência, segurança
e qualidade.1
4 Anestesia | UMA VISÃO SOBRE O PROJETO ERAS

O planejamento e a implementação de estratégias para


enfrentar esta dificuldade são temas imperativos à saú-
de pública. Há razões econômicas importantes para a
definição de prioridades em programas de cuidados pe-
rioperatórios. A ineficiência, a falta de padronização do
atendimento e a falta de auditoria dos processos envol-
vidos, compromete os recursos sem o adequado retorno
de eficácia e segurança ao paciente.

Este cenário de falta de acesso à saúde convive em para-


lelo com o paradigma para sustentabilidade e sobrevivên-
cia do próprio sistema de saúde.

No Brasil, vivemos uma grande mudança no relaciona-


mento dos financiadores da saúde com os hospitais, se-
jam eles públicos (Ministério da Saúde) ou privados (pla-
nos e seguradoras).

A medicina baseada na doença, onde o aumento do tem-


po de internação hospitalar acarreta o aumento da recei-
ta hospitalar, tem trazido impacto ao sistema de saúde
uma vez que não há recursos financeiros para manter o
sistema em funcionamento.

Para solução deste impasse, há um grande movimento


para mudança do modelo fee-for-service para fee-for-
-value onde os melhores resultados, menores taxas de
complicações e menor tempo de internação hospitalar
irão ser beneficiados. Desta forma, o sistema de saúde
passa não mais a valorizar a doença, mas sim, a saúde.

O programa ERAS® (Enhanced Recovery After Surgery) é


o pilar clínico na implantação deste processo de melhoria
e sustentabilidade ao paciente cirúrgico, agregando se-
gurança ao paciente, qualidade à assistência, otimização
dos recursos financeiros e valor às instituições parceiras.
Anestesia | UMA VISÃO SOBRE O PROJETO ERAS 5

O termo ERAS®, do inglês Enhanced Recovery After


Surgery, significa “otimização da recuperação pós-ope-
ratória”.2 Este termo é frequentemente utilizado para
descrever um programa de cuidado multimodal no peri-
operatório.3 Alguns autores utilizam o termo enhanced
recovery (ER) ou fast-track, sendo este último, o termo
mais comumente utilizado na América do Norte.

Estes programas são compostos por uma série de medidas


perioperatórias baseadas em evidências científicas que
têm o objetivo de serem benéficas ao paciente e que, em
conjunto, têm mostrado resultados de melhorar os desfe-
chos cirúrgicos. Uma recente metanálise demonstrou que
a implementação dos protocolos ERAS® em cirurgias de
grande porte reduziu o tempo de recuperação e interna-
ção hospitalar em 2 a 3 dias e complicações em 30 a 50%.4

A base filosófica do ERAS® é a percepção que o cuidado


ao paciente cirúrgico fornecido nos hospitais, tradicional-
mente funcionam de forma desconexa e independente,
não havendo interação e comunicação entre os diversos
setores. Este modelo deve ser quebrado para garantir um
atendimento linear e contínuo, otimizando o cuidado ao
paciente durante a sua jornada perioperatória na interna-
ção hospitalar.

O programa ERAS® preconiza a realização de medidas


pré-admissionais, pré-operatórias, intraoperatórias e
pós-operatórias com o objetivo da redução do estresse
metabólico e manutenção da homeostase.4,5

O primeiro programa sugerido foi para cirurgia de cólon,


no qual 24 elementos principais, todos com suporte cien-
tífico da literatura médica, foram reunidos em um pacote
perioperatório (tabela 1). Estes componentes foram dis-
tribuídos ao longo da jornada cirúrgica e realizados pela
equipe multidisciplinar.
6 Anestesia | UMA VISÃO SOBRE O PROJETO ERAS

Tabela 1. Diretrizes da Sociedade ERAS para ressecção de cólon.5


Anestesia | UMA VISÃO SOBRE O PROJETO ERAS 7

Nenhum elemento isoladamente irá melhorar de forma


significativa o desfecho. A abordagem perioperatória deve
ser multimodal, utilizando todos os elementos disponíveis
para otimizar a recuperação. A chave é achar a sinergia en-
tre os elementos do ERAS®.

A abordagem multidisciplinar sempre se faz necessária,


uma vez que os elementos deste programa são implemen-
tados por diferentes profissionais de saúde que trabalham
em áreas distintas. O resultado é a redução da taxa de com-
plicações em até 50%, como já demonstrado em metanáli-
se de estudos randomizados.6

Como consequência, há redução significativa de custos. Em


Alberta, no Canadá, os primeiros resultados demonstraram
redução do tempo de internação hospitalar (de 6 para 4
dias e meio) e redução de 11% em complicações.7 A taxa de
readmissão reduziu em 8%, economizando $ 2.800 a $ 5.900
dólares por paciente.
8 Anestesia | UMA VISÃO SOBRE O PROJETO ERAS

ERAS® Brasil

Durante a realização da 53ª JOSULBRA (Jornada Sul Brasi-


leira de Anestesiologia), em Julho de 2018 em Gramado-RS,
foi assinado o Memorando de Entendimentos entre a So-
ciedade Brasileira de Anestesiologia (SBA), a Sociedade de
Anestesiologia do Estado de São Paulo (SAESP), a ERAS®
Society (ERAS®) e ERAS® Society Latin America Chapter
(ERAS® LATAM).

Atualmente, existem 10 hospitais brasileiros com o progra-


ma ERAS®, são eles: Rede de Hospitais São Camilo de São
Paulo, Santa Casa de Porto Alegre, Hospital Vila Santa Ca-
tarina, Hospital Evangélico de Londrina, Instituto do Cân-
cer do Estado de São Paulo, Hospital São Lucas, Hospital
Brasília, Hospital 9 de Julho, Complexo Hospitalar de Ni-
terói e Hospital Santa Paula. Destes, dois hospitais realizam
a implementação no programa de cirurgia bariátrica (São
Camilo SP e Londrina) e os demais em cirurgias colorretais.
Além da implementação, forte atividade acadêmica tem
sido realizada pela SAESP, SBA e ERAS®, resultando no I
Congresso Latino Americano do ERAS que será realizado
em 2021.
Anestesia | UMA VISÃO SOBRE O PROJETO ERAS 9

Referências

1. Meara JG, Leather AJ, Hagander L, et al. Global Surgery 2030: evidence
and solutions for achieving health, welfare, and economic development.
Lancet 2015; 386: 569-624. 2015/05/01. DOI: 10.1016/S0140-6736(15)-
60160-X.

2. Zhuang CL, Ye XZ, Zhang XD, et al. Enhanced recovery after surgery
programs versus traditional care for colorectal surgery: a meta-analysis
of randomized controlled trials. Dis Colon Rectum 2013; 56: 667-678.
2013/04/12. DOI: 10.1097/DCR.0b013e3182812842.

3. Fearon KC, Ljungqvist O, Von Meyenfeldt M, et al. Enhanced recovery


after surgery: a consensus review of clinical care for patients undergoing
colonic resection. Clin Nutr 2005; 24: 466-477. 2005/05/18. DOI: 10.1016/j.
clnu.2005.02.002.

4. Ljungqvist O. ERAS--enhanced recovery after surgery: moving evi-


dence-based perioperative care to practice. JPEN J Parenter Enteral Nutr
2014; 38: 559-566. 2014/02/26. DOI: 10.1177/0148607114523451.

5. Ljungqvist O, Scott M and Fearon KC. Enhanced Recovery After Sur-


gery: A Review. JAMA Surg 2017; 152: 292-298. 2017/01/18. DOI: 10.1001/
jamasurg.2016.4952.

6. Varadhan KK, Neal KR, Dejong CH, et al. The enhanced recovery after
surgery (ERAS) pathway for patients undergoing major elective open
colorectal surgery: a meta-analysis of randomized controlled trials. Clin
Nutr 2010; 29: 434-440. 2010/02/02. DOI: 10.1016/j.clnu.2010.01.004.

7. Nelson G, Kiyang LN, Crumley ET, et al. Implementation of Enhanced


Recovery After Surgery (ERAS) Across a Provincial Healthcare System:
The ERAS Alberta Colorectal Surgery Experience. World J Surg 2016; 40:
1092-1103. 2016/03/02. DOI: 10.1007/s00268-016-3472-7.
SAC 0800 026 23 95 | sac@br.aspenpharma.com
farmacovigilancia@br.aspenpharma.com
AR: BR-PRO-032020-016 | 70004806 - MAIO/2020

Você também pode gostar