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R1000 CURSO DE REDAÇÃO PROFESSOR JULIÃO 2022

GRAMÁTICA INSTRUMENTAL COESÃO

“A coesão não nos revela a significação do texto, revela-nos a construção do texto enquanto edifício semântico.”

(M. Halliday)

A coesão textual é uma relação semântica e gramatical entre um elemento do texto e algum outro crucial para a sua
interpretação, seja ele do próprio texto ou não. Pode ser ainda um meio de conectar as ideias presentes em um discurso
de modo que elas tornem-se um todo inteligível e contundente.

Importante ressaltar que essas práticas podem ser tanto exigidas em provas de português como de redação. No último
caso, é um importante critério de correção de textos para a maioria absoluta das bancas de concurso.

Para tanto, é importante compreender os processos que tornam um texto coeso a partir de duas dimensões: a coesão
referencial e a sequencial.

1. A coesão referencial

Estabelece-se entre dois ou mais termos de um texto, de modo que um deles remete-se ao menos a outro elemento, o
qual é normalmente identificado como referente.

A coesão referencial é construída por meio de vários processos que envolvem mecanismos de reiteração, substituição,
repetição, síntese, etc., com o intuito de evitar a repetição de termos próximos o que pode denunciar pouco conhecimento
vocabular e gramatical por parte do autor do texto.

1.1 – Substituição de nomes por pronomes, numerais, advérbios, etc. (anáfora e catáfora) – uso de pronomes,
numerais e outros termos para evitar a repetição normalmente de um substantivo. Exemplos:

1.1.1. “A água é um dos bens mais preciosos que a humanidade possui. Essa, que há anos parecia ser infinita, estará
cada vez mais escassa.” (anáfora)

1.1.2. “Esta violência que aterroriza muitas crianças, a pedofilia, é objeto cada vez mais frequente de estudos da
Psiquiatria e de ciências forenses.” (catáfora)

1.1.3. “Várias cidades brasileiras tiveram o ‘privilégio’ de serem escolhidas como sedes da Copa do Mundo de 2014.
Entretanto, cinco foram – felizmente para elas – preteridas pelo comitê organizador do evento.” (anáfora)

1.1.4. “A Suíça tem se aproveitado de obscuras e imorais regras do seu próprio sistema bancário que permitem o depósito
de dinheiro das mais duvidosas origens em seus bancos. Nesse país, visto como civilizado e ordeiro, as aparências
realmente enganam.” (anáfora)

1.2 – Substituição por meio de “nominalizações” ou “verbalizações” – uso de substantivo que remete a um verbo
anteriormente enunciado ou o contrário. Exemplos:

1.2.1. “Muitos nazistas recusaram-se a confessar seus crimes durante a Segunda Guerra Mundial. Essa recusa provocou
ainda mais a comunidade judaica quanto à vontade dela de que se fizesse justiça nos julgamentos do Tribunal de
Nuremberg.”

1.2.2. “A necessidade de alimento fez com que, em muitos países ao longo do ano de 2020, milhares de pessoas fossem
às ruas protestar contra essa situação. Mostrar-se necessitado de algo tão essencial não é vergonhoso, a não ser para
a humanidade e para a ideia humanista de civilização cultivada ao longo da História, por muitas pessoas.”

1.3 – Substituição por epíteto – palavra ou frase que qualifica pessoa ou coisa individualmente ou em grupo. Exemplo:

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1.3.1. “Argentina, Uruguai e Colômbia são países que são vistos como entre os mais prósperos da chamada América
espanhola. Tais nações ,são em parte, produto, portanto, da cultura imposta pela Espanha durante a Colonização, mas
também dos horrores e das injustiças atribuídas por muitos historiadores aos conquistadores e colonizadores espanhóis.”

1.4 – Substituição por meio de perífrase ou antonomásia – expressão de conhecimento público ou peculiar
responsável por caracterizar de forma específica um lugar, uma pessoa, etc. Exemplo:

1.4.1. “Paris foi uma cidade em que se encontraram muitos dos maiores intelectuais e artistas da história da humanidade.
A Cidade Luz ainda tem esse perfil, ainda que a qualidade dos homens e mulheres do universo da intelectualidade e da
arte que lá se encontram não seja o mesmo de outrora.” (antonomásia)

1.4.2. “O Brasil tem se firmado como o maior país exportador de café do mundo. O maior território da América
Latina também é destacado produtor de outros produtos agrícolas.” (perífrase)

1.5 – Repetição de parte de um nome – uso do sobrenome de alguém como forma de se evitar a repetição do nome
completo. Exemplo:

1.5.1. “Charles Baudelaire foi um dos mais importantes poetas franceses. Sua obra máxima é o livro de poemas ‘As
Flores do mal’. Baudelaire também escreveu ‘Paraísos artificiais’, no qual trata de diversas questões acerca do ópio, do
haxixe e do vinho.”

1.6 – Reiteração por elipse – consiste na omissão de um termo ou expressão que pode ser subentendido pelas
referências contextuais ou por já ter sido citado anteriormente. Exemplos:

1.6.1. “O governo brasileiro investiu de forma intensa na criação de universidades públicas. Essa esfera
também estimulou a criação de centros federais de educação técnica e profissionalizante.”

ATENÇÃO, CUIDADO!!!

1.6.2. “Os EUA envolveram-se ao longo de sua história em vários conflitos pelo mundo. O Brasil, por sua vez, em poucos.”

1.7 – Reiteração por metonímia – nesse caso, a coesão é estabelecida por uma relação de contiguidade semântica
entre os termos, em que um remete-se ao outro por nome que representa genericamente parte de um todo. Exemplo:

1.7.1. “A monarquia ainda resiste em vários países do mundo. No Brasil, a função monárquica não tem praticamente
nenhuma importância na vida política do país.” (símbolo pela ideia significada)

1.8 – Reiteração por meio de palavras ou expressões sinônimas ou quase sinônimas – uso de sinonímia como
meio de se estabelecer coesão por meio do sentido igual ou semelhante entre dois termos de um texto. Exemplo:

1.8.1. “Automóveis com pouca eficiência energética perderam vertiginosamente mercado nas últimas décadas. Por causa
disso, carros híbridos ou com motores flexíveis tornaram-se uma opção viável economicamente para consumidores de
todo o mundo.”

1.9 – Reiteração por associação – uma palavra retoma outra porque mantém com ela, em determinado contexto,
vínculos que podem ser associados ao campo léxico, semântico ou estilístico ao qual ambas pertencem. Exemplo:

1.9.1. “As regiões de Santa Catarina e Maranhão foram pouco tempo atrás alvos de grandes enchentes responsáveis pelo
sofrimento e pela destruição dos lares de milhares. Entretanto, tais alagamentos foram tratados de forma muito diferente
pela mídia e, consequentemente, pelos brasileiros, pois aquela foi beneficiada por amplas campanhas feitas pelas maiores
redes de televisão brasileiras, já esta foi praticamente ignorada pela chamada grande mídia.”

1.10 – Reiteração por hiperonímia – relação estabelecida entre um termo mais genérico com outro mais específico ou
limitado. Exemplo:

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1.10.1. “A água é muito mais do que um recurso com que os seres vivos hidratam-se. Esse líquido, muitas vezes
banalizado, é essencial para a existência da vida no planeta. Desde nossa origem até a atual crise pela qual essa
substância passa, indiscutivelmente, sua história cruza-se com a da humanidade e a do mundo.”

2. A coesão sequencial

Esse processo coesivo diz respeito aos procedimentos linguísticos por meio dos quais se estabelecem, entre segmentos do
texto, diversos tipos de relações semânticas ou pragmáticas, à medida que o texto progride com o acréscimo de novas
ideias. É construída por meio de dois mecanismos: a recorrência e a progressão.

“O avanço tecnológico e suas implicações preocupam a sociedade ao menos desde o século XX, o que é denunciado pelo
físico Albert Einstein quando afirma que “Hoje, consigo perceber que nossa tecnologia ultrapassou nossa humanidade”.
Por meio desse conceito, Einstein permite a dedução de que no tempo em que ele vivia, os aparatos
tecnológicos avançavam mais rápido do que os sentimentos que definem os seres humanos.” (paráfrase)

2.2. – Coesão sequencial por progressão ou frásica

É produzida por mecanismos linguísticos capazes de estabelecer uma sequência lógica e inteligível entre as sentenças
utilizadas em um determinado texto, que podem expressar a ideia de oposição, adição, conclusão, finalidade, explicação,
concessão, etc.

Para melhor conhecer essas diferentes relações de sentido, indicamos o uso recorrente do quadro de elementos coesivos
abaixo como um meio de não apenas confirmar que o elemento coesivo pretendido tenha o sentido desejado, mas também
de diversificar o uso deles.

Esse recurso é fundamental para a inteligibilidade das informações presentes em um discurso e, evidentemente, das
intenções que se tem em relação ao fato de essas ideias terem sido escolhidas, de toda forma, para juntas produzirem um
sentido global que, em princípio, deve comunicar de forma coesa e coerente um determinado assunto, ponto de vista,
argumento, etc. Exemplos:

2.2.1.

“Se o terrorismo não é, como a História mostra, um fenômeno exclusivamente islâmico como muitos pensam, logo deve
ser repensado o preconceito acumulado em relação a esse povo que tanto contribuiu para o avanço tecnológico da
humanidade nos últimos séculos.” (condição e conclusão)

2.2.2.

“O homem é uma espécie aparentemente incapaz de antever seus erros, apesar da pretensa racionalidade
humana. Entretanto, um grupo seleto de indivíduos tornaram-se capazes de alertar a humanidade sobre seus principais
equívocos, sempre amparados pelo desejo inesgotável de conhecer. Portanto, o acesso às artes e à educação são os mais
confiáveis meios de o indivíduo e de a humanidade sobreviverem às suas próprias ambições e
inconsequências.” (concessão, oposição e conclusão)

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