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Introdução
Não propondo respostas, mas sim perguntas que caminham entre: quem somos,
para onde estamos indo e o que está acontecendo culturalmente, Abba T. Makama em
seu longa “The lost Okoroshi” nos leva a reflexão sobre o lugar da espiritualidade
tradicional africana na Nigéria moderna. Dessa forma, esse ensaio caminhará entre o
deslocamento e a recolocação cultural, o primeiro aspecto que é o causador do
desequilíbrio na consciência nigeriana em geral e que afeta diversos indivíduos que
necessitam enquadra-se em um espaço corporativo, capitalista e ocidental de uma Lagos
moderna. E o segundo aspecto proposto como solução por um dos personagens do
filme, a recolocação cultural representando um esforço consciente e inconsciente para
que de forma simbiótica, a espiritualidade possa coexistir frente às realidades
socioculturais modernas.
“Na noite passada, não consegui fazer com que os mascarados que
estavam na minha cabeça parassem de dançar. Eles dançaram por horas,
sem parar. Notei que não era uma dança comum. Era uma mensagem.
Uma mensagem de nossos antepassados.” 1
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MAKAMA, 2019.
Já que todas as lutas políticas na era pós-moderna passam necessariamente pelo
reino dos simulacros da cultura de massa, os meios de comunicação são
absolutamente fundamentais para qualquer estudo sobre o multiculturalismo.
(SHOHAT e STAM, p. 27)
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Fala do Chefe no filme. MAKAMA, 2019.
tradições ancestrais caso elas se materializassem na nossa vida diária contemporânea.
Teríamos alguma aproximação ou medo? Levaríamos para o campo tecnológico?
Lucraríamos com tal presença? E os limites entre o crer e o poder? Perguntas que
Makama não faz explicitamente, mas nos deixa a refletir a partir do elemento ficcional e
cômico de entrada do Okoroshi na cena pela Nigéria contemporânea.
“Qualquer tribo, ou clã, ou grupo étnico, ou qualquer país, até os EUA, país dos
homens brancos, não pode existir sem seu povo. Portanto, qualquer terra onde
uma comunidade Igbo estiver reunida é uma terra Igbo.” 3
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Fala do filme de um dos sacerdotes da “Igbo People Secrety Heritage Restoration and
Reclamation – IPSSHRR” (Sociedade Secreta do povo Igbo pelo Restauro e Recuperação das
Tradições). MAKAMA, 2019.
Na impossibilidade de partilhar um mundo comum entre eles e nós, a política
africana do nosso mundo não tem como ser uma política do semelhante. Ela
somente conseguirá ser uma política da diferença – a política do Bom
Samaritano, que se alimenta do sentimento de culpa, seja por ressentimento,
seja por piedade, mas nunca por justiça ou responsabilidade. (MBEMBE, p. 97)
Assim os laços entre seres semelhantes são abalados pela presença do Okoroshi,
não há mais partilha de um mundo comum entre a esposa e Raymond. O sentimento que
a mesma possui ressalta a diferença e o descrédito frente ao que aquele ancestral
representa, algo que leva a quebra total do vínculo construído e a afirmação de não
partilha de um mundo comum. Com esse entendimento e como um sopro, o Okoroshi
libertar-se e inicia sua caminhada livremente pelas ruas, mercados e espaços diversos da
Lagos contemporânea. Nesse sentido, nesse misto de perda identitária que autoriza a
possessão, o ancestral releva sua verdadeira forma, aquilo que Mbembe irá ressaltar
como a verdadeira natureza do fetiche, uma metamorfose que revela o devir-forma da
força e o devir-força da forma.
Mas antes de refletirmos sobre o final desse enredo e as diversas perguntas que o
Makema nos faz, cabe apresentar outras ligações que o mercado proporciona ao espírito
ancestral a partir do entretenimento, da tecnologia, da tradição e da busca em
enquadrá-lo em um viés ocidental científico. Para isso, três personagens são importantes
para compreender esses imbricamentos, são eles: Willy-Willy, os membros da “Igbo
People Secrety Heritage Restoration and Reclamation – IPSSHRR” (Sociedade Secreta
do povo Igbo pelo Restauro e Recuperação das Tradições) e o doutor.
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Fala do personagem “o doutor”. MAKAMA, 2019
essa força e forma do submundo não seria a própria contemporaneidade que suga a
potencialidade da força ancestral que perambula de maneira visível a esfera urbana na
Lagos Moderna.
Considerações Finais
Referências
Reportagens:
Native Exclusive: Into the mind of surreal 16 filmmaker, Abba T. Makama – Portal
Native - Disponível em: https://thenativemag.com/surreal-16-filmmaker-abba-makama/.
Acessado em 02 de Novembro de 2021
Audiovisual:
BBC Talking Movies: The lost Okoroshi Full segment, 2019. 1 vídeo (4min:59seg).
Publicado pelo canal Osiris Creatives. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=bh2qBDOBpiA . Acessado em 02 de Novembro de
2021
How 'The Lost Okoroshi' unmasks the disconnect between tradition & modernity, 2020.
1 vídeo (7min:33seg). Publicado pelo canal Guardian Nigeria. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=6O_P8nLSAmE . Acessado em 02 de Novembro de
2021
Bibliográficas
BÂ, Amadou Hampaté. A tradição Viva. In: Iskander, Z. (Org.) História Geral da
África. Vol. 1. São Paulo: Ática, Unesco, 1980. p. 181-218
MBEMBE, Achille. Crítica da razão negra. São Paulo: n-1 edições, 2018b.