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Introdução
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Metodologia
Resultados e discussões
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das ideias de "raça" e "civilização" fixava-se prioritariamente no índio.
(SANSONE, 1996, p. 18).
Talvez por isso, por causa de nossas projeções herdadas dessas perspectivas
–– do bom selvagem, dos povos bárbaros –– nossos enfrentamentos com
registros de novas formas de viver indígenas sejam tão inquietantes.
Há também as discussões trazidas na obra de Gilberto Freyre que
introduzem ideias acerca da miscigenação, e que reduz a diversidade dos povos
originários ao torna-los objeto homogêneo de análise. A visão freyreana
instaurou um marco na construção do imaginário popular sobre o Brasil em sua
formação, que ainda encontra ressonâncias e confrontos com o reconhecimento
da necessidade de reinvenção dessas posições catalogadas.
Para pensar sobre essa reinvenção de posições, a partir dos
tensionamentos criados, faz-se necessária uma digressão para compreender o
que estamos trazendo de discussão de nossas perspectivas enquanto não
indígenas, visto que sob herança europeia, virtualmente etnocida, perpetuamos
visões e comportamentos acerca da cultura indígena quando pensamos a partir
de nosso padrão, como Clastres (2004), diz: “Chama-se etnocentrismo essa
vocação de avaliar as diferenças pelo padrão da própria cultura.” .
A apropriação do cinema enquanto possibilidade desse espaço de
encontro cultural múltiplo e como instrumento de reinvenção de representações
pensada a partir do próprio indígena, surge então como um aliado, um
possibilitador de novas sínteses, e assim como traz Martins (2014): “(...) a escrita
e a câmera são vistas como instrumentos para a defesa da cultura, mas também
para a sua invenção, de acordo com as necessidades da comunidade”.
Itão kuegü: as hiper mulheres (2011) tem a direção compartilhada por três
cineastas: Takumã Kuikuro, Leonardo Sette e o antropólogo Carlos Fausto. O
filme narra a preparação e a realização do Jamurikumalu, considerado o maior
ritual feminino do Alto Xingu, no Mato Grosso. Como o título antecipa, as
mulheres estão na centralidade da obra.
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A narrativa se inicia com um relato de preocupação do companheiro de
Tahu, uma índia, que já idosa, é uma das poucas mulheres da tribo que guarda
consigo os cantos do ritual Jamurikumalu. Preocupado com a possibilidade da
morte iminente de Tahu, o velho índio vai até seu sobrinho fazer um pedido para
a realização do ritual, que seria uma possibilidade de preservação da tradição
através da transmissão oral dos cantos. Enquanto isso, Kanu, uma índia adulta
e jovem, também conhecedora dos cantos e ritos, está gravemente doente,
situação que desenvolve uma mistura de tensão e expectativa entre os demais
indígenas pela melhora de Kanu e pela realização do ritual, sendo esse o apoio
da primeira parte do filme.
Se a centralidade das mulheres na obra é algo inquestionável, faz-se
necessário abrir parênteses para o que o registro do ritual interpela enquanto
uma representação reveladora para o espectador não índio. No ritual, nos
deparamos com mulheres que ao experienciarem o mito que deu origem ao
ritual, encenam um movimento aparentemente catártico que se desenvolve na
segunda parte da narrativa.
A narrativa vai ganhando densidade através de fragmentos cotidianos e
em dado momento, ao anoitecer, elas saem em busca de possíveis parceiros
sexuais, desafiando e provocando-os ao se lançarem sobre eles nas redes. O
que se segue, são relatos dados entre risos sobre as reações dos homens. A
comunidade logo é tomada pela comicidade da relação que se estabelece
momentaneamente entre os gêneros. Os cantos das mulheres são eróticos,
envolventes, brincam com as relações sexuais, falam sobre os órgãos
masculinos e em vários momentos isso se torna motivo de piada. Todos se
divertem, incluindo os homens.
E então chega o dia da grande festa. Nele, mulheres adornadas,
transfiguram-se para a dança no pátio central da tribo. Assistida pelos homens,
elas cantam, dançam e se desafiam na luta. As mais jovens vão na frente com
palavras de incentivo de Kanu, a condutora do ritual: “vão lá, vocês não podem
ter vergonha!” ela diz.
É difícil escapar de uma comparação com a relação erótica comum aos não
índios, subvertida aqui através das posições de gênero.
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Em seu percurso, As Hiper Mulheres apresenta corpos femininos sob as
mais diversas circunstâncias: juventude, envelhecimento, doença e a
possibilidade da morte. O ritual aparece como um resgate da possibilidade de
renegociar relações e assim vemos na tela diálogos entre vulnerabilidade e
força, juventude e velhice, tradição e progresso, sensualidade e inocência.
Conclusão
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Referências Bibliográficas
LÖWY, Michael. Walter Benjamin: aviso de incêndio. Uma leitura das teses
“Sobre o conceito de história”. São Paulo: Boitempo, 2005. 160pp.
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SANSONE, Lívio. As relações raciais em casa-grande & senzala revisitadas
à luz do processo de internacionalização e globalização. In: MAIO, Marcos
Chor; SANTOS, Ricardo Ventura. Raça, Ciência e Sociedade.