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Viajantes naturalistas: imagens do Rio Grande do Sul no século XIX

SILVA, Alessandra da. 1


ale_s@unochapeco.edu.br

RESUMO

O presente trabalho possui o objetivo apresentar um estudo de caráter histórico sobre as


relações entre a arte, ciência e produção e imagem do Rio Grande do Sul do século XIX,
através da análise de imagens e relatos de viagem visando compeender as contribuições dessa
inter-relação na formação de uma iconografia histórica. A pesquisa teve como base a revisão
bibliográfica, análise de imagens e relatos de viagens, traçando um paralelo entre a arte,
ciência e história. Nesse cenário se destacam Augustin François César Prouvençal de Saint-
Hilaire, importante botânico naturalista escritor do livro Viagem a Rio Grande do Sul,
Nicolau Dreys, viajante observador de rigor científico que escreveu Notícia descritiva da
província do Rio Grande de São Pedro do Sul, Louis-Frédéric Arsène Isabelle escritor e
naturalista amador que escreveu o livro Viagem ao Rio Grande do Sul, Aimé Bonpland
médico e botânico francês reconhecido por seus escritos e descrições de plantas classificadas
como “úteis” dando ênfase as suas finalidades.

Palavras-chave: Arte. Ciência. Imagens.

Os fundamentos estéticos que nortearam a produção de imagens no Rio Grande do Sul no


século XIX estão embasados nos princípios do naturalismo científico, corrente surgida ainda
no Renascimento. O interesse pela divulgação de conhecimentos científicos influenciou os
naturalistas viajantes que percorriam os continentes, conhecendo e registrando os ambientes,

1
Mestranda no Curso Artes Visuais pela UFSM 2017/1. Pós-graduada no curso de Ensino de Arte Perspectivas
Contemporâneas pela UNOCHAPECÓ (2016). Graduada em Artes Visuais Licenciatura pela UNIASSELVI
(2012), Artes Visuais Bacharelado pela UNOCHAPECÓ (2009) e Pedagogia Licenciatura pela UDESC (2006).

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animais, plantas e modos de vida, produzindo os primeiros registros da flora latino-americana,
brasileira e rio-grandense, essas imagens se tornaram fundamentais para a compreensão de
uma identidade histórica. O contexto latino americano motivou grande interesse pelo cenário
exótico tropical, dando espaço para a chegada de missões artísticas, com o objetivo de retratar
o entorno e através da criação de registros portáteis, desenhos e pinturas, levar a
conhecimento para povo europeu as formas de vida na América.
As primeiras imagens do Brasil foram produzidas pelos viajantes naturalistas que
muito contribuíram na representação e difusão da imagem do país. Catlin, em um dos
capítulos do livro Arte na América Latina aponta os principais objetivos das missões
artísticas.

A realidade de um mundo que estava além dos horizontes europeus conhecidos foi
gradativamente despertando a atenção das principais nações navegadoras e, depois
no século XVIII, começou-se a buscar seriamente informações que fossem
confiáveis, capazes de proporcionar a posse e o comércio das riquezas americanas.
Aproveitando de maneira pragmática as oportunidades que agora entreviam, essas
nações passaram a enviar expedições marítimas que combinavam a exploração
geográfica com um trabalho cuidadosamente planejado por artistas a fim de que,
com objetividade fossem registradas formas desconhecidas da vida vegetal, animal e
humana. (CATLIN apud. ADES, 1997: p. 42-43)

Os artistas viajantes não se ativeram apenas às representações descritivas, acabando


por envolver-se profundamente por questões de grandeza maior, passando a expressar em
suas obras questões e valores culturais e sociais até então desconhecido na sociedade
europeia. Esse legado vai além dos conhecimentos científicos, pois tomados de encantamento
pelas belezas exóticas descobertas, esses artistas envolveram-se tanto na catalogação e
divulgação de espécies quanto na documentação de uma iconografia de caráter histórico.
Dentre os principais naturalistas que deixaram descrições bastante detalhadas da
paisagem do Rio Grande do Sul no século XIX podemos citar: Louis-Fredéric Arsène
Isabelle (1807-1888) nascido na França, veio para o Brasil em 1817 e aqui viveu vinte e cinco
anos; Escritor e naturalista amador que escreveu o livro Viagem ao Rio Grande do Sul; Viajou
também pela Argentina, Brasil e Uruguai, entre 1830 e 1835; Nicolau Dreys (1781-1843)
militar, comerciante e viajante francês que percorreu o Rio Grande do Sul no início do século
XIX. Veio para o Brasil após 1815, onde se dedicou ao comércio, tendo viajado de 1817 a
1827. Foi autor de Notícia descriptiva da província do Rio-Grande de São Pedro do Sul onde

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descreve sua viagem pelo estado; Augustin François César Prouvençal de Saint-Hilaire (1779-
1853) Importante botânico naturalista escritor do livro Viagem a Rio Grande do Sul; Escreveu
livros registrando costumes e paisagens brasileiras. Saint-Hilaire recolhia informações sobre o
uso de plantas na medicina, na alimentação e na indústria.
Os cadernos e anotações de viagem trazem o olhar para a paisagem e seus elementos
de composição essas descrições abordam nesse conjunto animais, plantas, minerais, condições
climáticas, topografia e descrições geográficas, geralmente descrevendo as relações entre os
seres vivos e a economia. Amaral desta a importância desses relatos como fonte de esquisa
sobre diferentes aspectos da saciedade.

Portanto a paisagem que os viajantes se referem é uma paisagem habitada por


muitas coisas inclusive por seres humanos, os quais também foram muito olhados.
Porém por mais importante que essas questões sejam, e reconhecendo que elas estão
também completamente atravessadas por discursos científicos que encerram debates,
representações e disputas importantíssimas sobre a “natureza humana” e aqui me
refiro as paisagens que encontramos nesses relatos sobre índios, negros, as mulheres
os habitantes locais. (AMARAL, 2003: p. 60)

O artista francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848) destaca-se o como pioneiros na


produção de imagens do Rio Grande.Registrando cenas rurais da lida nos campos e nas
charqueadas do Rio Grande do Sul, publicadas em seu álbum ilustrado Voyage pittoresque et
historique au Brésil, na França, em 1839.

Figura 1: Jean Baptist Debret. Campeiro dos Pampas, SP Biblioteca Municipal.


Fonte: http://www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo01/cont_rio_grande.html

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O artista Johann Moritz Rugendas (1802-1858) ficou conhecido como o pintor das
Américas, pois sua obra abrange o México, o Peru, a Bolívia, o Chile, a Argentina, o Uruguai
e o Brasil, ao contrário de Debret que tem sua obra mais focada no Brasil.

Figura 2: Rugendas. Peão em Rodeio. Viagem pitoresca através do Brasil.


Fonte: http://www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo01/cont_rio_grande.html

O alemão Alexander Von Humboldt (1769-1859), conhecido mundialmente por suas


contribuições para a ciência. Foi além de cientista, um explorador e aventureiro e em sua
viagem à América do Sul entre 1799 e 1804. O artista, geógrafo, naturalista e explorador
alemão, considerado o naturalista de seu tempo, Alexander Von Humboldt (1769-1859) foi
quem apresentou uma nova visão da botânica no início do século XIX. Humboldt, juntamente
com botânico francês Aimée Bonpland, foi o primeiro artista a visitar cuba, atravessar o
centro e o norte dos Andes e, em seguida, o México no intuito de estudar os aspectos físicos
da terra. Entre seus interesses, destacam-se os rios, montanhas, vulcões, vegetação, coleta de
espécies e dados sobre a atmosfera, correntes oceânicas e a avaliação das condições gerais da
sociedade. Os artistas que o sucederam passaram a representar uma natureza em
transformação.

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Figura 3: Retrato de Alexandre Von Humboldt, Friedrich Georg Weitsch, 1806, óleo sobre tela, 126x92,5 cm.
Fonte: BÖING, 2014.

O médico e botânico francês Aimé Bonpland (1773-1858), reconhecido por seus


escritos e descrições de plantas classificadas como “úteis” dando ênfase as suas finalidades.
Empreendeu viagens com Alexander Von Humboldt. Enquanto os demais coletavam
elementos que eram estudados posteriormente na Europa, Bonpland se diferencia ao realizar
estudos, enquanto residente estabelece viagens por um longo período, observando mais
detalhadamente, principalmente plantas e suas utilidades, sendo responsável pela catalogação
de diferentes espécies de erva-mate, araucárias e plantas medicinais.

Enquanto os demais coletavam elementos que eram estudados posteriormente na


Europa, Bonpland se diferencia ao realizar estudos, enquanto residente estabelece viagens por
um longo período, observando mais detalhadamente, principalmente plantas e suas utilidades,
sendo responsável pela catalogação de diferentes espécies de erva-mate, araucárias e plantas
medicinais. A convivência com colonizadores imigrantes e índios favorecia o

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desenvolvimento de seus estudos, através da troca de informações com as pessoas da região
sobre as plantas.

Figura 4: Daguerrótipo de Aimé Bonpland


Fonte: http://www.lpm-blog.com.br/?tag=aime-bonpland

Mesmo que, ocupando-se com a comercialização Bonplad dedicava boa parte do seu
tempo a estudos detalhados de espécies de plantas e animais. Após um período de sequestro
no Paraguai Bonpland se estabelece em São Borja, uma povoação fundada em torno de uma
antiga missão jesuítica as margens brasileiras do Rio Uruguai. Em 1850, muda-se
definitivamente para Santa Ana na Argentina de onde continua a fazer o trajeto até São Borja
coletando e catalogando espécies que eram enviadas para a Europa.
O artista Herman Rudolph Wendroth foi um soldado mercenário alemão e artista-
viajante amador que registrou entre os ano de 1851 e 1852 cenários do Rio Grande do Sul. A

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obra de Rudolph Wendroth permanece ignorada nos livros sobre a arte e a pintura brasileira
no século XIX, embora constitua uma coleção iconográfica de raro valor cultural e
documental sobre a paisagem natural e urbana e sobre os usos e costumes dos riograndenses
no século XIX, e sobretudo porque constitui-se num dos raros registros visuais do Rio Grande
do Sul da segunda metade do século XIX. (ZUBARAN, 2003, p. 2)

Figura: Wendroth: Vista de Porto Alegre, 1852


Fonte: https://www.researchgate.net/figure/314294073_fig2_Figura-6-Porto-Alegre-vista-da-zona-sul-1852-
Fonte

O uso da arte como meio facilitados das percepções do mundo visível e da


compreensão dos fenômenos da natureza desencadeou uma incessante busca por informações
específicas sobre as formas vistas na natureza das novas terras descobertas. Essas
representações entre outras, contribuem para afirmação cultural, enfatizando além da riqueza
da fauna e da flora já extinta, revelando costumes e culturas.

CONCLUSÃO

De acordo com os essa análise evidenciamos que os viajantes naturalistas tomados de


encantamento pelo exótico, pela exuberância das formas e das cores desenvolveram trabalhos
diferenciados que deixaram evidente o verdadeiro fascínio que o desconhecido exercia sobre

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eles. Os formatos portáteis dos estudos em desenho e pintura permitiam que esses fossem
deslocados, difundindo o conhecimento, construindo e estabelecendo um elo visual entre o
novo e o velho mundo. Essa extensa iconografia de caráter documental e histórico vai além de
meras representações naturalistas e compõem a visualidade e o imaginário do passado. Essas
representações entre outras, contribuem para afirmação cultural, enfatizando a riqueza da
fauna e da flora já extinta, revelando uma natureza espetacular e pitoresca de valor científico e
cultural. Essa rica produção dos artistas viajantes possui além seu valor artístico, elementos
descritivos que desperta a atenção de analistas de diversas áreas: geógrafos, antropólogos,
historiadores da arte e da cultura tornando-se importante fonte de pesquisa documental.

Referências
ADES, Dawn. Arte na América Latina. (trad) Maria Tereza de Rezende Costa. São Paulo:
Cosac &NaifyEdiçõs, 1997.
AMARAL, Marise Basso. Histórias de viagem e a produção cultural da natureza: a
paisagem do Rio Grande do Sul segundo os viajantes estrangeiros do século XIX. Porto
Alegre: UFRGS, 2003.
BÖING, Raul; RIBEIRO, Simone (0rg). Arte Botânica no Paraná. Curitiba, PR: Skeditora,
2014.
ISABELLE, Arsène. Viagem ao Rio da Prata e ao Rio Grande do Sul / Arsène Isabelle ;
tradução e nota sobre o autor Teodemiro Tostes ; introdução de Augusto Meyer. -- Brasília :
Senados Federal, Conselho Editorial, 2006.
MARTINS, Ana Cecília (Org). Flora Brasileira: história, arte & ciência. Rio de Janeiro:
Casa da Palavra, 2009.
MORAIS, Frederico. O Brasil na visão do artista. São Paulo: Prêmio Editora Ltda, 2001.
MARCHIORI, José Newton Cardoso, PONTES, Rodrigo Correa, NETO, Daniel Lena
Marchiori. Viagem às Missões Jesuíticas da Provícia de São Pedro do Rio Grande do Sul.
BALDUINIA, n. 51, p. 12-24, 10-III-2016
ZURABAN, Maria Angélica. A Iconografia de Viagem de Hermann Rudolph de
Hermann Rudolph Wendroth sobre o Rio Grande Wendroth sobre o Rio Grande do Sul
Oitocentista. Textua, Canoas RS 2003.

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