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A INEFICÁCIA DO TIPO PENAL DE FEMINICÍDIO EM RELAÇÃO ÀS CAUSAS

DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

José Augusto Mateus Graduando em Direito pela


(UNICESUMAR), Graduado em tecnólogo em Gestão
Pública pelo (INSTITUTO FEDERAL DO
PARANÁ), Pós Graduado em Administração pública
pela (UNICESUMAR), Pós Graduado em Segurança
Pública pela (UNINA), Pós Graduado em Gestão
Prisional pela (UNINA), Pós Graduando em
Inteligência Policial e Penitenciária pela (UNINA).
Policial Penal

MELISSA ANDRÉA SMANIOTTO - Doutoranda e


Mestre em Ciências Sociais Aplicadas pela
Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG).
Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de
Ponta Grossa (UEPG). Membro dos Grupos de
Pesquisa Cultura de Paz, Direitos Humanos e
Sustentabilidade (UEPG/CNPq). Professora de Direito
Civil (Família e Sucessões) na Unicesumar, sede de
Ponta Grossa, PR. Professora colaboradora do
Departamento de Direito Processual da Universidade
Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Advogada.

GT: DIREITOS HUMANOS/Diversidade sexual e de gênero e violência de gênero

RESUMO: A presente pesquisa visa analisar e estudar as concepções de vítimas em relação


aos motivos que os levam o criminoso à prática da violência doméstica, no que tange as
agressões realizadas contra mulheres. Trata-se de uma pesquisa cuja metodologia é de cunho
quali-quantitativo com base teórica e bibliográfica abarcando as questões de violência
feminina no contexto doméstico. Os instrumentos utilizados para a coleta de dados deste
trabalho foram à entrevista semiestruturada e artigos científicos relacionados ao tema aqui
apresentado. Analisa-se também o contexto em que homicídio cometido contra mulher tornou-
se um crime hediondo, sendo denominado de feminicídio pela Lei 13.104/2015. Desse modo,
a pesquisa busca responder à questão: “Que concepções as mulheres, vítimas de violência
doméstica, no contexto de investigação possuem acerca das causas que levam o agressor
cometerem seus crimes?” cujos resultados servirão de subsidio para aprofundamento em
estudos futuros.

Palavra-chave: Família; Violência; Mulher; Feminicídio.


INTRODUÇÃO

A pesquisa busca entender e contribuir para o esclarecimento dos motivos pelos quais
levam os homens a cometer crimes contra mulheres no seio familiar. Para tanto, não há
possibilidade de falar em violência doméstica sem destacar o Direito de família, pois a Lei
Maria da Penha traz em seu texto referências a esta área jurídica.

Pode se verificar ainda que esses ilícitos acontecem de forma geral entre pessoas, que,
de alguma forma, tenham vínculo afetivos entre si, podendo ser, por exemplo, esposa, ex-
namorada, mãe, filhas, irmãs, entre outras integrantes de um arranjo familiar ou que dividem o
mesmo espaço doméstico. Desse modo, abordaremos neste trabalho a violência contra pessoas
do núcleo familiar.

O gênero feminino, de certo modo, está mais exposto à violência doméstica


independente da forma que ela seja praticada. Pois existe um pré-conceito cultural, político e
social, nas histórias do feminismo, trazido pelo patriarcado, de que a mulher é subjugada na
sociedade.

Apesar de haver estudos voltados ao assunto de violência doméstica contra o gênero


feminino, o número de trabalhos realizados e levantados quanto da revisão literária, ainda é
reduzido comparando-os com outras abordagens do tema (SILVA, 2016).

A Lei 13.104 de 09 de março de 2015 traz em seu contexto inclusão de uma


circunstância qualificadora no artigo 121 do CP, incluindo neste o § 2º o Feminicídio o qual
resultada em um aumento de pena para a pessoa que vier cometer o crime contra a vida da
mulher, para tentar, pelo menos em tese, esmaecer o estigma do poder patriarcal, que
provavelmente permeia tais situações. Até então, o crime de homicídio praticado contra as
mulheres era tratado como motivo torpe ou fútil, desconsiderando o legado cultural que
perpassa o universo feminino.

Trazendo a discussão para o âmbito local, segundo a Polícia Civil, divulgado pelo G1,
Globo.com, no município de Ponta Grossa no ano de 2020 foram registrados cinco crimes
contra mulheres, sendo dois tipificados como feminicídio (Polícia civil, 2020).

Inúmeras podem ser as inquietações daí decorrentes, as quais são impossíveis de


esgotar e muito menos rotular. Assim sendo, a amplitude da temática impõe que se faça um
diminuto recorte que se justifica por propor uma reflexão sobre um dos aspectos dos bastidores
dos conflitos de tal natureza. Por conseguinte, um debate que pode ser iniciado é no sentido de
verificar quais são as concepções que as mulheres, vítimas de violência doméstica, possuem
acerca das causas que levam o agressor cometer seus crimes?

Quiçá a compreensão dos motivos de crimes pautados pela condição feminina possa
contribuir para elaborar e efetivar estratégias que coloquem as estatísticas do feminicídio entre
os menores possíveis dentro da delicada conjuntura social brasileira o que inclui, por óbvio, o
Município de Ponta Grossa, PR.
OBJETIVOS GERAIS

Analisar as concepções de mulheres, vítimas de violência no contexto doméstico,


para identificar as razões que levam um homem a agredir fisicamente, psicologicamente,
moralmente dentre outras, a esposa.

OBJETIVO ESPECÍFICO

Refletir sobre aspectos que apontam a ineficiência da Lei 13.104/2015 em relação à


violência doméstica em prol à mulher.

MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA

A metodologia utilizada foi quali-quantativa, desenvolvida por meio da pesquisa


bibliográfica, documental e de cunho dedutivo. De acordo com Creswell (2010, p. 26), se
denomina “quantitativa por apresentar uma descrição numérica de tendências, atitudes ou
opiniões de uma população, estudando-se uma mostra.” Em paralelo, qualitativa por ser
investigativa, fundamentada na pesquisa-ação, no qual o pesquisador in loco observa o
comportamento e as atividades dos indivíduos registrando suas observações de modo
estruturado ou semiestruturado (Creswell, 2010).

O público-alvo/ universo da pesquisa são mulheres vítimas de agressões domésticas


causadas por seus parceiros/cônjuges, pais e/ou irmãos registradas no município de Ponta
Grossa/PR.

Os instrumentos utilizados para a coleta de dados foram entrevistas com questões


semiestruturadas e posteriormente transcritas, para que deste modo, possibilitem observar e
analisar as concepções das vítimas sobre os crimes sofridos.

A entrevista se dá por meio de investigação social sobre informações de um


determinado assunto para coletas de dados, diagnóstico, ou solução de um problema social.
(LAKATOS E MARCONI, 2010)

Para esta pesquisa, a entrevista inicial será de forma semiestruturada, que para
Lakatos e Marconi (2010, p. 197) é aquela “em que o entrevistador segue um roteiro
previamente estabelecido”.

E por meio dela serão investigadas as informações necessárias, gerando categorias


variáveis para a formulação de hipóteses que respondera a questão base para o contexto
investigado.

Assim discorre a temática, com um aprofundamento, sobre o tema de violência


contra a mulher, no ambiente doméstico, de várias formas podendo ser psicológica, moral,
agressão física que causa lesão corporal, até o limite da violência que leva a morte da mulher.
Foram convidadas 6 vítimas a participar da entrevista. No entanto, apenas três
vítimas puderam contribuir. Todas em questão, vítimas de violência doméstica, com idade
variável entre 20 anos e 55 anos. Em todos os casos há um fator em comum, a violência está
ligada a algum tipo de vício por parte do agressor.

Por se tratar de dados sensíveis, ou seja, envolvendo pessoas no processo da pesquisa


científica, foram redigidos e assinados termos de autorização livre e esclarecido às
participantes, no qual foi destacada sua liberdade para responder ou não às questões na
entrevista.

Foram elaboradas 5 categorias de análise e após os dados coletados e compilados


emergem as variáveis causas indutivas à prática da violência contra a mulher em seu lar. Este
por sua vez, deveria ser o lugar de segurança.

RESULTADOS

De acordo com a análise realizada por meio do discurso das participantes, pode se
dizer que os crimes sofridos foram cometidos por pessoas vinculadas afetivamente. Em
relação a duas participantes, os criminosos eram parceiros/conjuges e a outra foi violentada
pelo amigo do pai.

Para tanto, observa-se que a violência doméstica no seio familiar é uma questão que
vai muito além do viés jurídico e daquilo que se traduz nos processos judiciais. Para tanto, há
necessidade de pesquisas contínuas e profundas relacionadas à temática com o intuito de
minimizar a violência doméstica.

DISCUSSÃO

Das seis participantes convidadas, três contribuíram com a entrevista ao quais os


dados foram analisados e aqui apresentados. A coleta neste trabalho se estruturou em 5 (cinco)
categorias para investigação, que foram transcritas afim de contribuir para melhor
interpretação e compreensão do conteúdo. Analisando os discursos das participantes de forma
explícita e implícita acerca do Corpus de análise. Para preservar a identidade das vítimas
participantes, serão descritas em números cardinais: 1,2,3 antecedidos pela palavra vítima.

No que diz respeito à categoria sobre vivenciar violência familiar na infância


Vitíma 1: “o meu pai batia na minha mãe com frequência, por ciúmes e
ela descontava em nós”.

Vitíma 2: “meu pai bebia bastante e quando chegava em casa batia na minha mãe.
Depois, a minha mãe falava mal dele para mim e meus irmãos”.

Vitíma 3: “não presenciei brigas físicas, poque meus pais eram solteiros. Mas
minha mãe vivia falando mal do meu pai.”
Na categoria sobre reflexo da violência na vida adulta

Vitíma 1: “após ser presa perdi a guarda do meu filho para minha tia, tenho direito
de visíta assistida, no entanto a tia dificulta as visitas, alegando algumas desculpas”.

Vitíma 2: “não confio em uma relação, tentei uma união estável mas eu e meu
companheiro brigavamos muito, brigas de ocorrem vias de fato, por isso, acabamos
separando”

Vitíma 3: “tive uma filha aos 18 anos, acabei indo presa e minha filha mora com
minha mãe e padrasto, minha vista é a cada 15 dias, atualmente vivo em um relacionamento
difícil, de muita agressões até mesmo física”

Nota se, que neste o uso do alcool ou outras substâncias psicoativas, tornan as
mulhres ainda mais vulneraveis, de acordo LEITE, F. M. C.; LUIS, M. A.; AMORIM, M. H.
C.; MACIEL, E. L. N.; “tornam nítido que a violência contra a mulher está intimamente
relacionada ao consumo de álcool. Desse modo, algumas ações na esfera dos serviços de
saúde e de políticas públicas devem ser adotadas, além daquelas já existentes para combater
especificamente a violência, como a Lei Maria da Penha, visando a que em nível primário de
atenção à saúde se estabeleçam protocolos e instrumentos de rastreamento específicos, não
apenas para vítimas de violência doméstica, mas também para pessoas dependentes de álcool
e/ou sua parceira”.

Considera-se que de forma implícita as vítimas deram subísidios para que nesta
pesquisa pudesse formular a resposta para a questão norte: verificar quais são as concepções
que as mulheres, vítimas de violência doméstica, possuem acerca das causas que levam os
agressores cometerem seus crimes?

As causas, pela análise inicial das falas das vítimas acima transcritas são inúmeras e
diversas, pois se identifica a dependência de bebidas, drogas ilícitas, ciúmes, sentimento de
posse e pensamento de que a vitíma deve ser submissa. Isto significa reconhecer que a questão
de gênero que inspira a tipificação penal do feminicídio é algo extremamente complexo, com
múltiplas facetas que exigem um aprofundamento teórico e empírico na construção dos
universos feminino e masculino que compõe a sociedade contemporânea.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Indiscutivelmente a violência doméstica integra uma violência estrutural que se


decompõe em matizes políticas, históricas, culturais, econômicas e sociais, as quais, por sua
vez, se desdobram em escandalosas desigualdades não apenas nos aspectos materiais mas
também em relação às oportunidades inerentes a cada pessoa de acordo com seus papéis na
sociedade.
Dessa percepção não escapam as expectativas sobre os padrões de comportamentos
atribuídos a homens e mulheres que integram um núcleo familiar e ocupam um espaço
doméstico.
Portanto, falar em femincídio impõe um diálogo com o Direito de Família e precisa
transcender o âmbito jurídico para interagir com outras áreas das Ciências Sociais tais como
a Sociologia, a Antropologia e a Psicologia, entre outras, com o intuito de desbravar as
densas camadas que se escondem atrás da superficialidade da violência, tanto na vitíma
quanto nos agressores envolvidos em violência doméstica.

Ao que parece, pela breve e desprentesiosa análise ora descrita, uma das
perspectivas que se pode extrair é uma tentativa de manter uma hegemonia masculina
orientada pelo capitalismo, patrimonialismo e patriarcado que ensejam frustrações quanto às
“falhas” no cumprimento dos papéis masculinos tão arraigados pela sociedade a ponto de
culpabilizar e punir aquelas mulheres que tentam romper com os questionáveis padrões que
lhe são trnasmitidos há gerações por meio dos processos de reprodução social.

Apesar de considerar o feminicídio como um avanço legislativo, o esforço deve ser


direcionado no sentido de desvelar os fatores implícitos que envolvem uma trama social
consideravelmente mais complexa do que a manifesta violência que se enquadra em um tipo
penal.

REFERÊNCIAS

LAKATOS, Eva CRESWELL, John W. Projeto de pesquisa: métodos qualitativos,


quantitativos e misto. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed. 2010.

Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Técnicas de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas. 2010.

LEITE, F. M. C.; Luis, M. A.; Amorim, M. H. C.; Maciel, E. L. N.; Gigante, D. P. Violência
Contra a Mulher e Sua Associação com o Perfil do Parceiro Íntimo: Estudo com Usuárias da
Atenção Primária. scielo.br. 2019 Acessado em 02/10/21.

NÚMERO DE HOMICÍDIOS AUMENTA 5% EM PONTA GROSSA, em 2020 em Relação


a 2019, Aponta Polícia Civil Campos Gerais e Sul. correiodoscampos.com.br. Acessado em
02/10/21.

SILVA, C. S. Masculinidades Possíveis em um Grupo de Homens Apenados Pela Lei Maria


da Penha. Periódicos UEPG, p. 16, 2016. Acessado em 02/10/21.

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