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cinema, tv e outras mídias • março de 2016

YOUTUBE:
MODO DE USAR
A ciência por trás dos negócios que
movimentam a maior plataforma
de vídeos da internet

Iberê Thenório e
Mariana Fulfaro,
do canal Manual
do Mundo

V O D : t end ên cias e impas s e s

ent revista: er ik b ar ma c k , d a ne t f l i x
Estúdio do Manual do Mundo, um dos
maiores canais do YouTube no Brasil

Foto: Luca Messer


índice
Editorial 5

Manual do youtube 6

Entrevista / Renata Brandão, da Conspiração 16

Caminhos do VOD 18

Entrevista / Erik barmack, da Netflix 26

Entrevista / Tara Sorensen, da amazon studios 28

próximos lançamentos da Netflix 30


FILME B | www.filmeb.com.br | Diretor: Paulo Sérgio Almeida
No planeta dos fãs 34 O Filme B é um portal especializado no mercado audiovisual no Brasil. Toda segunda e
terça-feira, o boletim Filme B apresenta os resultados das bilheterias nos cinemas e reúne
as principais notícias da indústria no Brasil e no mundo. O portal traz ainda as seções
Números do mercado / TV por assinatura 38 Calendário de Estreias, Quem é Quem no Cinema no Brasil e Database Brasil. A revista Filme
B, com reportagens mais aprofundadas dos assuntos de mercado, é publicada quatro vezes ao
Notas 42 ano, nas ocasiões do RioContentMarket (Filme B +, março), Show de Inverno de Campos do
Jordão (maio), RioMarket, do Festival do Rio (setembro), e ShowBúzios, no Festival de Búzios
(novembro).
ENTREVISTA / LIA BAHIA, PESQUISADORA 44
REVISTA FILME B +>>> Editores: Pedro Butcher e Gustavo Leitão Editor-assistente: Pedro
Números do mercado / cinema 46 Curi Repórteres: Tatiana Contreiras, Thayz Guimarães, Thiago Stivaletti Comunicação e marke-
ting: Denise do Egito, Cristiane Denik Revisão: Cristina Siaines, Bernardo Siaines Projeto Gráfi-
co: Cardume Design Diagramação: Ana Soares Pesquisa: Elizabeth Ribeiro Gráfica: Walprint
Navegando 52
Foto da capa: Luca Messer

De olho nas séries 54 PORTAL FILME B>>> Editor: Gustavo Leitão Editor-assistente: Thiago Stivaletti Repórter:
Thayz Guimarães Estagiária: Viviane Miranda
De olho no VOD 56

DE OLHO NO PÚBLICO 58

Revista Filme B + março 2016 • 3


editorial

Uma revista em busca


de um mundo novo
Paulo Sérgio Almeida

H
Há 18 anos atuando no mercado de cinema, a Filme B con-
quistou espaço criando um amplo mapeamento estatístico e
mercadológico dos setores de produção, distribuição e exibi-
ção. E agora, na ocasião do RioContentMarket, um evento que
se tornou obrigatório para qualquer pessoa que trabalha com
audiovisual, estamos lançando a FILME B +, nossa primeira
revista dedicada à televisão por assinatura, internet, VoD e às
no país, mas em todo o mundo: a chegada das plataformas
de streaming.
Em sua grande maioria, todas essas mídias têm, como ma-
téria-prima, a ficção que o cinema modelou e consagrou, em
seus diversos formatos. E, neste sentido, o cinema continua
sendo feito, mas exibido e negociado de maneiras às vezes
contraditórias ou até autofágicas.
chamadas novas mídias.
Dentro deste novo cenário, fica difícil saber as receitas de vei-
Por quê? culação de cada produto nesses setores, juntos ou separados.
Hoje não se pode mais falar de cinema sem falar neste novo O mundo do audiovisual virou uma enorme bolsa de valores
mundo em que os hábitos de consumo do audiovisual estão onde as cotações sobem e descem a cada nova invenção, às
se modificando em alta velocidade. Cresce o mercado de vezes inviabilizando a anterior, às vezes acrescentando mais
produção de cinema e seus derivados ligados à televisão e à valores.
internet; e cresce também, cada vez mais, o movimento con- Lidar com as diversas plataformas de mídia disponíveis nos
trário, isto é, produtos da TV e da internet que ganham a tela deixa cada vez mais atentos e ao mesmo tempo vulneráveis.
grande. Ao mesmo tempo, ainda são muitas as dificuldades Em outras palavras: o setor tem que ficar de olho nas movi-
de acesso a dados estatísticos, sejam de audiência, sejam de mentações do espectador, em busca sempre do melhor pre-
modelos de negócios. É preciso saber o mínimo sobre este ço. Voltamos à velha questão de custo & benefício, oferta &
mercado. A FILME B + pretende contribuir para preencher procura, ou, falando modernamente: curtir ou não curtir, eis
este vazio. a questão. Ou eis a solução. Esta batalha, ao que parece, está
apenas começando.
Afinal, qual é o tamanho deste mercado no Brasil? O cine-
ma demorou um certo tempo para ganhar transparência a Para navegar neste mundo novo, é preciso fazê-lo com a
ponto de qualquer player poder atuar com segurança. Como parceria da ABPITV, do RioContentMarket, de produtores
se sabe, novos mecanismos de aferição de audiência estão e distribuidores, enfim, de todos que acreditam neste novo
chegando por aqui no momento em que a TV aberta passa mundo. Nossa ideia é, com a Revista FILME B +, inaugural de
por sua maior crise, muito por conta do crescimento da TV nosso posicionamento neste novo mercado, partirmos para
por assinatura, que se expandiu nos últimos anos e chegou cada vez mais incluir todos estes assuntos em nosso conheci-
do Portal Filme B, que ganhará um novo layout e navegação.
perto de 20 milhões de assinantes, e que também começa a
se deparar com uma nova concorrência avassaladora, não só Mas calma: uma coisa de cada vez. Mas cada vez mais.

Revista Filme B + março 2016 • 5


capa

Manual do

Os segredos e os novos modelos de negócio que estão por trás da explosão dos youtubers

J
Por Tatiana Contreiras e Thayz Guimarães

Jornalista por formação, Julia Tolezano – do horário nobre da TV, como também gam diferentes atrações, numa grade de
conhecida por JoutJout em seu canal no ser remunerado por isso. Hoje, existem programação que só aumenta.
YouTube, onde já arrebanhou mais de várias formas possíveis de ganhar di-
O YouTube contabiliza, no Brasil, 31 ca-
690 mil assinantes – não pensa duas ve- nheiro no YouTube (a chamada “mone-
nais com mais de 500 milhões de visua-
zes ao preencher fichas de check-in em tização”), sendo a mais comum delas a
lizações e mais de cem com mais de um
pousadas e hotéis. No campo designado receita compartilhada de publicidade
milhão de assinantes. Mas como criar,
à profissão, escreve: “youtuber”. (veja mais detalhes na página 11).
crescer e se destacar no imenso univer-
O termo – um neologismo vindo do Ser um youtuber é a meta de muitos que so de youtubers? “Não existe fórmula
nome da plataforma que hoje, só no Bra- desejam produzir, ver e serem vistos, secreta para o sucesso, muito menos
sil, recebe 95% dos espectadores de ví- sem abrir mão de sua liberdade criati- uma previsão do que vai ou não estou-
deos online, segundo dados da própria va, falando diretamente com seu públi- rar”, avalia Eduardo Brandini, diretor de
companhia – é um dos sinais de que a co. É também uma trilha encontrada conteúdo do YouTube no Brasil. “Temos
produção de conteúdo audiovisual não é por grandes produtoras que, de olho na criadores que conquistaram sucesso
mais exclusividade da televisão. Na web, crescente e focada audiência da inter- com vídeos caseiros sem nenhuma so-
já é possível transmitir diretamente de net, investem em atrações online. Redes fisticação técnica, e outros que investi-
um quarto, de uma garagem ou do quin- de canais virtuais – as chamadas Multi- ram em superproduções desde o início;
tal e não só ter uma audiência tão gran- channel Networks, ou MCNs –, em gran- alguns só estouraram anos após lançar
de ou maior que a de muitas atrações de parte ancoradas no YouTube, já agre- o primeiro vídeo, outros levaram sema-

6 • Revista Filme B + março 2016


Fotos de Lucca Messer
Iberê Thenório e Mariana Fulfaro no

Fotos: Luca Messer


estúdio do Manual do Mundo

e aos fãs) e criatividade (os conteúdos


mais criativos têm mais chances de
gerar resultados positivos)”. Brandini
conclui ressaltando a importância de al-
guma forma de narrativa. “Todo mundo
gosta de ouvir e ver uma boa história, e
os youtubers mais bem-sucedidos são
grandes contadores de histórias”.

O CASO “MANUAL DO MUNDO”


Por falar em história, a de de Iberê The-
nório e Mariana Fulfaro, idealizadores
do canal Manual do Mundo, é um ótimo
exemplo de uma trajetória de sucesso
no YouTube. Ele um jornalista que sem-
pre gostou de ferramentas e experimen-
tos; ela uma terapeuta ocupacional que
nas para alcançar o mesmo status. Eu Eduardo Brandini aponta as caracterís- rodava a cidade por conta do trabalho,
diria que é uma combinação de talento, ticas básicas para que um canal comece começaram a fazer vídeos de forma im-
dedicação e um pouco de sorte. Mas é a se destacar. “Observando bem, algu- provisada, em casa, de madrugada, em
claro que uma boa gravação, edição e mas características acabam se tornando 2008, com uma câmera emprestada do
acabamento sempre ajudam”. pontos em comum entre todos os ca- chefe de Iberê. O tema? Ciência e experi-
O YouTube não divulga estatísticas ofi- nais de maior sucesso do YouTube”, diz mentos científicos, realizados em frente
ciais, mas de acordo com o ranking do ele. “O principal fator para o sucesso é à câmera, sempre de forma divertida e
site americano VidStatX, levantado no a autenticidade dos youtubers em seus descomplicada. Hoje, com oito anos de
fim de janeiro deste ano, o canal com vídeos, ou seja, a forma com que falam, vida, o Manual do Mundo é o nono canal
maior número de assinantes no Bra- colocam opiniões e conversam com seus do YouTube em número de assinantes
sil é o do coletivo de humor Porta dos fãs. Além disso, destacaria a consistên- (4,9 milhões, em janeiro de 2016).
Fundos, com mais de 11 milhões de as- cia (atualizar seus canais com frequên- O difícil e definitivo passo para se tor-
sinantes. Outros que figuram no top 10 cia e regularidade), dedicação (ao canal nar um fulltime youtuber aconteceu em
são o canal de esquetes Parafernalha,
idealizado por Felipe Neto, 5incominu-
“O principal fator
Fotos: divulgação
tos, da atriz e comediante Kéfera Buch-
mann, e o gamer RezendeEvil (veja a
lista completa na página 8).
para o sucesso é
A curitibana Kéfera sintetiza, como pou- a autenticidade
cos, a capacidade do YouTube de produ-
zir fenômenos. Ela iniciou seu vlog des-
dos youtubers
compromissadamente, em 2010, fazendo em seus vídeos,
comentários bem-humorados sobre a
vida cotidiana. Em pouco tempo, se tor- ou seja, a forma
nou campeã de audiência e, desde então,
já apresentou programas de TV, lançou
com que falam,
um livro que entrou para a lista dos mais colocam opiniões
vendidos (Muito mais que 5inco minutos)
e foi escalada para ser uma das protago-
e conversam com
nistas do filme É fada, adaptação do livro
de Thalita Rebouças Uma fada veio me
seus fãs”
visitar, com direção de Chris D’Amato e Eduardo Brandini, diretor de conteúdo do
produção de Daniel Filho. YouTube no Brasil

Revista Filme B + março 2016 • 7


capa

OS 10 MAIORES CANAIS DO YOUTUBE*


2012, quando os dois abandonaram de seu público é masculino, Canal Assinantes Visualizações
seus empregos e passaram a se dedicar dos quais surpreendentes
integralmente ao Manual do Mundo – 43% têm entre 35 e 44 anos. PORTA DOS FUNDOS 11,3 milhões 2,2 bilhões
que, àquela altura, já pagava as contas PARAFERNALHA 7,6 milhões 1 bilhão
No fim de janeiro deste ano,
da casa. “Postergamos muito essa deci-
o calendário de pautas do GALOFRITO 7,6 milhões 944,5 milhões
são. Em 2011, trabalhamos todos os fins
Manual do Mundo já estava
de semana”, conta Iberê. Hoje, a produ- 5inco MINUTOS 7,5 milhões 613,8 milhões
ocupado até março. “Tem
tora está situada em uma casa na Zona
que ter paciência e pé no WHINDERSONNUNES 6,3 milhões 438,6 milhões
Oeste de São Paulo, contando com uma
chão. É preciso montar uma
equipe de sete pessoas e eventuais free- CANALCANALHA 5,5 milhões 328,8 milhões
grade, planejar pautas. Não
lancers. A rotina é puxada: às segundas,
basta só ter conteúdo, tem REZENDEEVIL 5,4 milhões 1,7 bilhão
terças e quartas, o casal grava seus víde-
que ter técnica. Hoje temos
os. Às quintas e sextas, prepara roteiros MANUAL DO MUNDO 4,9 milhões 817,9 milhões
uma reputação que nos per-
e faz reuniões de pauta ou com clientes.
mite, por exemplo, gravar FELIPE NETO 4,8 milhões 320 milhões
Entre a ideia e a publicação de cada ví-
na DisneyWorld e na NASA”,
deo, a equipe leva de dois a três meses,
diz Mariana, que também se VENONEXTREME 4,7 milhões 717 milhões
incluindo testes e produção. Os vídeos
desdobra nas questões admi-
entram no ar sempre às terças, quintas
nistrativas do canal e nas res- * Por número de assinantes / em janeiro de 2016 Fonte: VidStatX
e sábados.
postas ao público nas redes
Os maiores sucessos do canal mostram a sociais. Porchat, Antônio Tabet, Gregório Duvi-
construção de barcos de origami, pape- vier e João Vicente Castro, o Porta já con-
Em seu estúdio, Iberê e Mariana gravam
lão e até silvertape; outros vídeos, mais tava com uma certa estrutura (eram 15
com uma câmera Canon 5D Mark III com
trabalhosos, pedem estruturas maiores funcionários). Hoje, menos de três anos
e mais tempo de produção. Um projeto microfone de lapela, kit Sony UWP-V1, e
depois, 50 pessoas trabalham para o gru-
de um motor feito de lata, por exemplo, dois refletores de 500W. Para a edição,
po, que também se transformou em pro-
chegou a levar três anos para ficar pron- usam o Adobe Premiere Pro CS6 e o Ado-
dutora e também tem explorado outras
to. A abordagem lúdica sobre a ciência be After Effects CS6. O apuro técnico veio
mídias. Desde o ano passado, assinou
faz com que o canal seja bastante que- com o tempo e também levou a dupla à
contrato com o canal de TV paga Fox Bra-
rido entre crianças e adolescentes, e um TV: em 2014, Iberê fez roteiro e atuou na
sil, para o qual produziu uma série iné-
levantamento recente revelou que 66% série Experimentos extraordinários, no
dita (O grande Gonzalez), e agora mira o
Cartoon Network. Em outubro de 2015,
cinema com o longa-metragem Porta dos
o conteúdo do canal do YouTube passou
Cena do filme Porta dos Fundos – Fundos – Contrato vitalício, que tem pre-
Foto: Rachel Tanugi Ribas

a ser exibido também na PlayTV, em 24


Contrato vitalício visão de estreia para 30 de junho, com
episódios de 15 minutos cada.
distribuição da Downtown/Paris.
Hoje, muito mais do que um canal do
YouTube, o Manual do Mundo é uma Diretor e cofundador do Porta, Ian SBF
produtora de conteúdo. “O canal é um conta que o grupo nunca planejou com
dos nossos braços, mas também cria- precisão sua carreira. “Sempre fomos
mos livros, vídeos institucionais, víde- movidos pelos nossos interesses pes-
os para marcas. Temos várias frentes”, soais e aspirações momentâneas”. Cada
aponta Mariana. vez mais, no entanto, reconhece que é
preciso planejar o futuro e escolher a pla-
O CASO “PORTA DOS FUNDOS” taforma mais adequada para cada proje-
O canal de humor Porta dos Fundos é to. “Mesmo assim, nosso foco principal
outro caso impressionante, não só pela nunca é a plataforma ou a mídia, e sim as
quantidade recorde de seguidores, mas histórias que queremos contar. Se temos
também pelas transformações que trou- uma história ou projeto que se adapta
xe para a produção humorística no au- melhor como filme ou série de TV, pro-
diovisual brasileiro. Quando foi criado, curamos os parceiros certos e a melhor
em 2013, pelos sócios Ian SBF, Fábio maneira de isso acontecer”, explica.

8 • Revista Filme B + março 2016


Fotos: divulgação
Cenário do YouTube Space, em São Paulo

como se especializar
De olho em outros potenciais sucessos de conteúdo online. Ainda
de audiência, o YouTube disponibiliza não há data definida para a
um estúdio e um espaço de aprendizado inauguração.
onde produtores de conteúdo online po- YouTube Space de Nova York
A ambientação do YouTube
dem se especializar de forma totalmen-
Space muda todo mês. Em
te gratuita. O YouTube Space, no bairro
janeiro, remetia ao balcão de um bar;
do Bom Retiro, em São Paulo, é o primei-
desde então já foi remontado com ele- https://www.youtube.com/yt/space/
ro do Brasil e o único do mundo em par-
mentos de filmes como Chappie e Snoo- pt-BR/events-saopaulo.html
ceria com outra organização, o Instituto
py & Charlie Brown. Se o produtor qui-
Criar de TV, Cinema e Novas Mídias, que
ser usar o estúdio, precisa adaptar suas
capacita jovens para funções ligadas ao
necessidades ao cenário, mas também vivo, iluminação, técnicas de áudio, me-
audiovisual.
pode optar por gravar com chroma key. dia training e até um básico “Como co-
No espaço – um galpão repleto de sa- Ainda estão disponíveis uma sala de edi- meçar no YouTube”. Enquanto algumas
las patrocinadas por outras empresas, ção e pós-produção. aulas são abertas até para quem não
como Spotify e Nestlé –, o YouTube tem um canal no ar, outras, como a de
Para agendar um horário, é preciso
montou seu estúdio, que recebe mais de fonoaudiologia, exigem um mínimo de
cumprir alguns pré-requisitos. “O es-
2,5 mil pessoas por trimestre, um nú- seguidores. No caso da turma de fono,
túdio pode ser utilizado por donos de
mero que engloba criadores que usam todos os alunos tinham mais de 10 mil
canais com mais de 2,5 mil assinantes,
o estúdio de gravação, alunos dos cur- assinantes. Para turmas mais avança-
desde que não tenham sofrido nenhu-
sos e workshops, e frequentadores das das, já foram disponibilizadas palestras
ma denúncia por violação de direitos
happy hours mensais promovidas pela de assuntos como branding (gestão de
ou diretrizes de comunidade. Também
plataforma. Em 2015, a empresa anun- marcas), marketing e relação de clientes
é preciso assinar um contrato de uso do
ciou que vai abrir um novo espaço no com executivos do próprio Google. Para
espaço”, explica Eduardo Brandini, dire-
Brasil: o YouTube Space Rio, localizado um youtuber brasileiro de férias no ex-
tor de conteúdo do YouTube.
no Porto Maravilha. Com mais de 2 mil terior, também é possível agendar um
m², a ideia é que a quantidade de estú- Os cursos e workshops oferecidos co- horário em algum dos YouTube Spaces
dios seja maior e que o local funcione brem temas variados: de câmera a pro- ao redor do mundo (Los Angeles, Nova
como uma incubadora para criadores dução, passando por transmissões ao York, Londres, Tóquio e Berlim).

Revista Filme B + março 2016 • 9


capa

como monetizar

Fotos: divulgação
Atualmente, os criadores interessados Uma forte tendência tem sido a busca de
em utilizar a plataforma do YouTube po- formas de integração da marca ao conte-
dem simplesmente carregar seus vídeos údo. Em atividade desde 2013, a NetCos
sem qualquer objetivo financeiro ou op- já realizou ações para grandes marcas
tar por um dos modelos de geração de como Sadia, Santander e Citroën. O de-
receita disponibilizados pelo Programa safio é fugir do “merchan” tradicional
de Parceria do YouTube. – uma herança dos formatos televisivos
– e promover uma associação convin-
O programa oferece um gerente que tra-
cente entre conteúdo e marca, sem com-
balha no desenvolvimento do canal de
prometer a reputação do criador com os
forma personalizada, utilizando como
famigerados “jabás”. “Nesse processo,
ferramenta principal o modelo de ex-
a marca sai do papel de interruptora e
ploração publicitária criado pelo Goo-
passa para o de viabilizadora de con-
gle, o Google AdSense. Para começar a
teúdo. A NetCos atua como uma inter-
receber, é preciso associar uma conta
mediária que entende a realidade dos
do Google AdSense à conta do YouTu-
dois universos, ajudando as marcas a
be. Ao aceitar que seus vídeos tenham
selecionarem os canais ideais para suas
publicidade, o criador permite que a
ações e negociando as condições com
plataforma gerencie a melhor forma de
estes canais. Há projetos pequenos, que
exibição dos anúncios (confira os for-
custam às marcas R$ 50 mil; médios, em
matos disponíveis no quadro ao lado). A
torno de R$ 200 mil, e grandes, que pas-
remuneração é baseada na visualização No processo de profissionalização dos
sam dos R$ 500 mil”.
dos anúncios. A empresa não revela de- youtubers, as redes que agregam canais,
talhes sobre a partição de receitas, mas como a Rede Snack e a Network Bra-
o que se comenta é que 55% ficam com sil, têm ganhado importância. As MCNs
o dono do canal, e 45% com o YouTube. gerenciam produtores de conteúdo
Para André Zimmermann, CEO e co-
fundador da NetCos, empresa especia-
“O YouTube não oferecendo ajuda técnica, conselhos e
interlocução comercial para quem está
lizada em aconselhamento para vídeos pode ser tratado começando. A Network Brasil, além de
distribuir, também produz conteúdo: os
em ambientes digitais, o chamado pre
roll (inserção de publicidade antes do e utilizado da canais Desimpedidos, Acelerados, Re-
vídeo), apesar de ser muito usado, tem
seus riscos. “O YouTube não pode ser
mesma forma que visão, Não é Sério TV, Fatality e o Canal
Oficial do São Paulo Futebol Clube são
tratado e utilizado da mesma forma que a TV, com o risco de produzidos pela NWB. Já Mano Coelho,
Manual do Mundo e Desce a Letra são
a TV, com o risco de perder o poder de
engajamento que a plataforma e seus perder o poder de canais associados. “Olhamos para o tema
criadores podem proporcionar às mar-
cas. Dentro desse modelo, o melhor é
engajamento que a do canal a ser desenvolvido e o poten-
cial de mercado para construção de uma
realizar produções próprias, usando a plataforma e seus marca consistente, bem como o potencial
de engajamento”, explica André Barros,
linguagem do meio digital, com mais ou-
sadia. Contudo, o pre roll ainda segue a criadores podem sócio-diretor da NWB, cujos canais so-
lógica da publicidade em outras mídias:
a interrupção da experiência do expec-
proporcionar às mam mais de 17 milhões de assinantes e
contabilizam dois bilhões de views.
tador, o que, no melhor dos casos, pode marcas” Muitos youtubers, no entanto, também
gerar indiferença, e, no pior, rejeição”, buscam formas de monetização que não
avalia. André Zimmermann, CEO da NetCos dependam de marcas, como licencia-

10 • Revista Filme B + março 2016


mentos de conteúdo, venda de produtos os youtubers usem os canais como tram-
físicos (camisetas, bonés, canecas etc), polim para outras fontes de receita. “Os
infoprodutos (cursos, vídeos exclusivos, produtores estão encontrando alterna- FORMATOS DE PUBLICIDADE
dicas), livros e eventos, entre outros. “Es- tivas criativas de ganhar dinheiro que DISPONIBILIZADOS NO YOUTUBE
timamos que há hoje aproximadamente extrapolam o virtual. Ser um youtuber
170 mil canais no YouTube no Brasil, o pode, sim, ser muito rentável, principal- DISPLAY ADS
segundo maior mercado para a empre- mente se os produtores souberem apro- Aparecem à direita do vídeo prin-
sa no mundo. Destes, possivelmente 200 veitar as oportunidades geradas a partir cipal ou logo acima da lista de su-
são realmente grandes. Mas muitos mé- gestões
da popularidade de seus vídeos. Vemos
dios e pequenos estão conseguindo se isso tudo como algo extremamente po-
rentabilizar”, completa Zimmermann. OVERLAY ADS
sitivo. Quanto mais bem-sucedidos os Anúncios semitransparentes que
Eduardo Brandini, do YouTube, garante youtubers, mais bem-sucedido é o pró- aparecem na parte baixa do vídeo e
que a plataforma vê com bons olhos que prio YouTube”. podem surgir em texto ou em flash

SKIPPABLE / NON SKIPPABLE VIDEO


ADS
Anúncios que podem ser “pulados”
em cinco segundos ou que são
obrigatórios. Normalmente, são
exibidos em pre roll, ou seja, antes
do conteúdo, mas também podem
ser inseridos no meio ou no fim do
vídeo

SPONSORED CARDS
Cartelas que podem, por exemplo,
mostrar produtos apresentados no
vídeo

MUITO ALÉM DA INTERNET

De olho no potencial dos youtubers e no seu retorno de audi- Freddie Wong, cineasta, especialista em efeitos especiais e
ência e engajamento, tanto o YouTube quanto outros canais gamer, também é um bom exemplo deste movimento. Seu
expandem e diversificam suas atrações. Com mais de 5,7 canal RocketJump, com mais de 7,5 milhões de assinantes,
milhões de assinantes na plataforma, a comediante ameri- o levou até o Hulu. Com episódios semanais de meia hora, a
cana Colleen Ballinger-Evans, de 29 anos, assinou contrato atração estreou em dezembro.
com a Netflix para estrelar a série de ficção Haters Back Off,
baseada na personagem criada para seu canal no YouTube, Já a HBO aprovou o projeto Insecure, série de ficção com a
Miranda Sings. Com oito episódios, a série mostrará a vida youtuber Issa Rae à frente do elenco, do roteiro e da produ-
em família de Miranda (interpretada por Colleen) e será a ção executiva. Rae fez sucesso na internet com a webserie
primeira série de ficção da Netflix estrelada por um youtuber. The Misadventures of an Awkward Black Girl.

Outros produtores de conteúdo online também estão fazendo No Brasil, o filme Os penetras 2, dirigido por Andrucha
o mesmo percurso. É o caso de Grace Helbig, 30 anos e Waddington e produzido pela Conspiração, que estreia em
quase três milhões de assinantes, que já lançou livro e ga- novembro, terá participações especiais dos youtubers Pc-
nhou um talk show no canal E!, cuja primeira temporada foi Siqueira, Julio Cacielo, Whindersson Nunes, Gabbie Fadel
exibida em 2015. e Maju Trindade.

Revista Filme B + março 2016 • 11


capa Kéfera, Felipe Neto,
Leon e Nilce

como influenciar
Na nova realidade das mídias digitais, Bia Granja, cofundadora do you-
tão ou mais importante do que atrair PIX, que investiga e analisa a cul-
um grande público é a capacidade de tura digital desde muito antes do
influência de um criador. Uma pesquisa boom da explosão dos youtubers,
realizada pela Provokers para o Goo- diz que tanto agências quanto
gle e a revista Meio & Mensagem, entre clientes ainda têm uma herança forte
outubro e novembro de 2015, apontou da métrica da televisão, e ressalta que
um rumo que já se vislumbrava: das “o influenciador de hoje é aquele que cria
20 personalidades mais admiradas por engajamento e uma comunidade ao seu
adolescentes entre 14 e 17 anos, dez redor, não necessariamente aquele com
são youtubers. O estudo, batizado de “Os a maior audiência”.
Para Bia, o boom dos youtubers é “a per-
novos influenciadores: quem brilha na
sonificação do conteúdo até o último
tela dos jovens brasileiros”, entrevistou
mil pessoas ligadas ao universo online
e televisivo. Os jovens deveriam indicar
“Não são só fio de cabelo. O youPIX tentou mostrar
para as pessoas que o que estava sendo
cinco personalidades admiradas da TV, moleques fazendo feito na internet não era baboseira. Ago-
ra, tentamos mostrar que não só é legal,
internet ou cinema.
vídeos. A tendência como também uma profissão. Essa é
No topo do ranking figurou a atriz Tatá
Werneck, conhecida deste público por é a compreensão uma grande tendência, muito mais pro-
funda do que se denominar youtuber.
sua carreira como comediante na MTV,
mas que também estava no ar, no mo-
de que isso é um Não são só moleques fazendo vídeos. A
tendência é a compreensão de que isso
mento da pesquisa, na novela I Love Pa- trabalho, uma é um trabalho, uma carreira, uma em-
raisópolis, na Globo. Os youtubers mais
bem colocados na lista são Leon e Nilce, carreira, uma presa. O conteúdo é rei, mas estamos fo-
cados em distribuição, em quais redes e
do canal Coisa de nerd, que conquis-
taram o 5o lugar, seguidos por Kéfera
empresa” plataformas se está presente, em estra-
tégias descentralizadas”.
Buchmann, do 5incominutos, em 6o, e Bia Granja, cofundadora do youPIX Bia aponta uma outra tendência do mer-
Iberê Thenório, do Manual do Mundo,
cado: a dos canais de médio porte, que
em 7o.
ainda têm espaço para crescer, angariar
Fotos: divulgação

Os outros youtubers que completam novos seguidores e ampliar sua influ-


o grupo são Felipe Castanhari (canal ência. Ou seja: na rebarba dos grandes
Nostalgia, em 9o), Felipe Neto (em 10o), youtubers, como Kéfera, cada vez mais
Christian Figueiredo (canal Eu Fico é possível produzir para um público em
Loko, em 11o), Gustavo Stockler (canal busca de assuntos específicos e ser rele-
Nomegusta, em 16o), a blogueira de vante dentro desse universo, mesmo sem
moda e beleza Taciele Alcolea (18o lu- milhões de assinantes. “Julia Jolie é uma
gar), Edu Benvenuti (Gameplays/BRKs promessa. Tem mais de 200 mil assinan-
Edu, em 19o) e, por fim, a blogueira de tes e ainda vai crescer muito. O canal da
beleza Camila Coelho (20o lugar). Um Foquinha (Fernanda Catania, ex-editora
ranking de relevância construído pelos da revista Capricho que migrou para o
entrevistados levantou as principais YouTube, onde faz desafios e entrevistas
características de uma celebridade in- com celebridades) também cresceu mui-
fluenciadora: autenticidade (15%), to rápido, e a galera do OK OK também é
originalidade (13%), senso de humor maravilhosa. Há um universo enorme de
(13%) e inteligência (12%). vários pequenos canais”, aposta.

12 • Revista Filme B + março 2016


breve história do youtube os números
Lançado em fevereiro de 2005, o YouTube
Estimativa de faturamento mun- No Brasil, existem 31 canais
surgiu como uma plataforma em que qual- dial em 2015: US$ 9 bilhões com mais de 500 milhões de
quer pessoa pode carregar, compartilhar e visualizações e mais de 100
visualizar vídeos de forma totalmente gra- O YouTube oferece hoje 19% dos
canais com mais de um milhão
vídeos da internet, mas apenas
tuita. Rapidamente, chamou a atenção de de assinantes
9% dos anúncios de vídeos
gigantes do setor. Em 2006, foi comprado
(Fonte: Google/Segundo semestre de
pela Google, por US$ 1,6 bilhão. A plataforma responde por cerca
2015)
de 15% da receita da Alphabet
Desde 2011, o YouTube passou a dar mais Inc, a holding a qual pertence, 80% das visualizações do You-
destaque para os canais em sua interface, o e essa fatia pode chegar a 25% Tube são de fora dos Estados
que, na prática, transformou a plataforma até 2020 Unidos
em uma grande programadora de conteú-
(Fonte: Valor Econômico) O YouTube lançou versões locais
do não linear. Com o tempo, foram desen-
em mais de 70 países
volvidas formas de geração de receita, e A cada minuto, 500 novas horas
graças à grande capacidade de comparti- de vídeo são carregadas no You- Mais de 50% das visualizações
lhamento e à facilidade de exibir seus víde- Tube são feitas em dispositivos móveis
os em outros sites e blogs, transformou-se Crescimento em horas vistas de O número de anunciantes que
também em uma ferramenta indispensá- 60% ano após ano em todo o utilizam anúncios em vídeo no
vel no universo do marketing online. mundo YouTube cresceu mais de 40%
ao ano
Em 2013, o YouTube começou a testar con- 69% dos brasileiros assistem a
teúdos pagos. No ano passado, lançou um vídeos online Desde março de 2015, os cria-
aplicativo para crianças, o YouTube Kids, e dores de conteúdo que filmaram
Desses 69%, 95% usam o You-
nos YouTube Spaces produziram
um serviço específico para entusiastas de Tube, fazendo da plataforma a
mais de 10 mil vídeos, gerando
videogames, o YouTube Gaming. Recen- mais popular no país
1 bilhão de visualizações e mais
temente, inaugurou seu serviço de strea- Em média, os brasileiros conec- de 70 milhões de horas de exi-
ming por assinatura, o YouTube Red. tados assistem a 15 horas sema- bição
Hoje, o YouTube faz parte da holding Al- nais de vídeos na web, quase o
(Fonte: YouTube/Primeiro semestre de
phabet Inc, que engloba o Google e outras dobro do tempo apontado pela
2015)
mesma pesquisa referente a
subsidiárias.
2014

SERVIÇO PAGO COMEÇA NOS EUA


Lançado nos Estados Unidos em fevereiro, ainda sem Felix Kjellberg – mais conhecido como Pew-
data para chegar ao Brasil, o novo serviço do YouTube, DiePie por seus mais de 42 milhões de assi-
batizado de YouTube Red, permitirá que seus assinantes, nantes. Além disso, estão prometidos também
a um custo de US$ 10 mensais, vejam todo o conteúdo filmes com outros youtubers de sucesso, como A Trip
do YouTube sem anúncios, tenham acesso ilimitado ao to Unicorn Island, com Lilly Singh (7,9 milhões de assi-
YouTube Music e assistiam a filmes e séries originais
nantes), Dance Camp, do AwesomenessTV (3,4 milhões)
estreladas pelos principais nomes da plataforma.
e Laser Team, do canal Rooster Teeth (8,4 milhões).
O primeiro produto exclusivo do novo serviço será Scare Esse último foi parcialmente financiado pelos fãs, que
PewDiePie, mistura de reality show e aventura estrelada levantaram US$ 2,48 milhões, e chegou a estrear nos
pelo youtuber mais bem-sucedido do mundo, o sueco cinemas americanos.

Revista Filme B + março 2016 • 13


entrevista
RENATA BRANDÃO
Diretora presidente de
negócios da Conspiração

Foto: divulgação
“O conteúdo e a audiência
precisam ser prioridade”
Uma das maiores e mais sólidas produtoras de audiovisual no país, a Conspiração comemora 25
anos em 2016 com uma estrutura reformulada, em que os projetos voltados para as plataformas
digitais ganharam novo peso. Uma das novidades é o canal da apresentadora Bela Gil no
YouTube, no ar desde 24 de fevereiro. “A Bela é nosso primeiro canal oficial no YouTube, um
projeto que não estamos fazendo para terceiros”, conta Renata Brandão, que em janeiro assumiu
o cargo de diretora presidente de negócios da Conspiração. Na entrevista a seguir, Renata explica
como funcionará o canal e analisa os desafios da produção de conteúdo na era digital.

Como a Conspiração tem se prepara- ou seja, o orçamento de lançamento de riência de marketing digital e mídias
do para as transformações do merca- um filme no cinema) em uma campa- sociais em todos os nossos produtos.
do audiovisual? nha de marketing tradicional, perto do
lançamento, criamos uma plataforma Pode dar um exemplo?
A Conspiração comemora 25 anos em
2016, e ao longo desse tempo, claro, de conteúdo que começou a funcionar Vai que cola – O filme teve um lança-
precisou se reinventar. Um desses mo- um ano e meio antes da estreia. Nesse mento muito ancorado nas mídias
mentos ocorreu em 2008, quando foi momento, a Conspiração deu um novo digitais, iniciado muito antes de o fil-
criado o selo Concept, que nasceu jus- passo e se tornou também publisher, me chegar aos cinemas. Estamos tam-
tamente para pensar projetos de pu- criando uma plataforma e realizando bém trabalhando toda a plataforma
blicidade que tivessem o ambiente di- uma espécie de curadoria de conteúdo de divulgação do filme Os penetras 2
gital como plataforma de distribuição. sobre a cidade. A partir da audiência no YouTube e nas mídias digitais. E a
Logo depois, vieram as mídias sociais que passou a orbitar em torno dessa evolução disso chegou ao núcleo de
com toda força, gerando nova deman- plataforma, direcionamos a campanha televisão da casa. Muitos projetos que
da. Em 2010, começamos a produzir do filme. Foi uma costura muito positi- talvez não encontrassem espaço na TV
o filme Rio, eu te amo, uma grande ce- va, não só para atrair os patrocinado- fechada e aberta podem ter um perfil
lebração do Rio de Janeiro. Em vez de res, mas também pela experiência que adequado de conteúdo para a inter-
usarmos o P&A (prints and advertising, ganhamos. Hoje, usamos essa expe- net. Começamos a perceber que existia

16 • Revista Filme B + março 2016


esse espaço para trabalharmos, não só to tradicional. Como consequência, “No YouTube, assim
levando para o YouTube spin offs (deri-
vados) de produtos da TV como tam-
os produtos e marcas estão tentando
se inserir nas narrativas. Como você
como em todas
bém buscando projetos especificamen-
te direcionados para o online.
vê esse processo? as mídias digitais,
É nisso que acreditamos, fortemente.
Temos um outro segmento dentro da
a audiência pula,
O canal da Bela Gil no YouTube é o pri-
meiro passo nesse sentido? Conspira, onde estamos desenvolven- deixa de seguir ou
Sim. É o primeiro que estamos lançan-
do um trabalho diretamente com as
marcas para criar conteúdo em que não se inscreve
do, mas já existem outros em desen-
volvimento. Bela tem um programa de
elas possam se comunicar com o públi-
co por meio das narrativas e dos artis-
no canal quando
culinária no GNT produzido por nós,
e a ideia é criar uma extensão dessa
tas, nos projetos de entretenimento. Os percebe que é
conversa no online.
canais do YouTube têm muito esse po-
der de abrir um espaço bacana para as
uma plataforma
Os programas da Bela Gil são exibidos
marcas. Mas, obviamente, isso precisa publicitária, e não
no GNT e ficam disponíveis na plata-
forma de VoD da Globosat e na inter-
ser feito com parcimônia, porque uma
vez errando no uso da marca no online, de conteúdo”
você pode prejudicar sua audiência.
net. Como é o canal do YouTube?
a audiência se sentir enganada, vai
É um material inédito e diferente do Quais os riscos? embora. Você tem que entender o
programa de TV. No canal do YouTu- que esse público aceita como marca.
Há um limite no equilíbrio dessa re-
be, Bela fala sobre as características Quanto mais transparente for o pro-
lação que estamos testando em cada
dos alimentos e entrevista pessoas cesso, melhor. Porque, obviamente, a
nova experiência. É preciso ser muito
do meio de alimentação e de saúde. audiência também sabe que é preciso
transparente, o tempo inteiro. No You-
Na televisão, ela recebe convidados,
Tube, assim como em todas as mídias patrocinar o conteúdo de alguma for-
apresenta receitas. No YouTube é a
digitais, a audiência pula, deixa de se- ma. Não existe fórmula – cada projeto
Bela mais nutricionista.
guir, ou não se inscreve no canal quan- é um projeto, cada audiência é uma
Como o canal foi viabilizado financei- do percebe que aquilo é uma platafor- audiência. Há erros e acertos durante
ramente? Vocês vão lançar mão dos ma publicitária, e não de conteúdo. E o processo, o que torna a experiência
modelos de monetização do YouTube? as marcas têm aprendido a valorizar incrível, porque você está muito pró-
isso, assinar um projeto verdadeiro, ximo à audiência. Se você faz um post
Temos proximidade com a equipe de em que elas possam ter o retorno do errado, ou sobe um post num horário
conteúdo do YouTube, mas não preci- qual gostariam. Com a própria Bela, equivocado ou faz um product place-
samos passar por essa equipe para lan- por exemplo, temos alguns critérios ment e não deixa isso muito claro, a
çar o canal. A plataforma do Google te para os patrocinadores que partici- consequência é imediata. Você vê a au-
deixa muito independente para deter- pam do projeto. A audiência e o conte- diência subindo ou descendo na hora,
minar os parâmetros. Temos um apoio údo precisam ser prioridade. Quando vê quando o post foi mais curtido ou
para fazer o desenho de mídia, mas essa relação dá certo, você constrói menos.
qualquer pessoa – e essa é a grande
uma base de seguidores, e, aí sim, as
vantagem do YouTube – pode definir Canal da Bela: no ar
marcas são atraídas. Não dá para in-
como seu canal será, e qual será o mo- desde fevereiro, no
verter a lógica. YouTube
delo de financiamento. Os nossos, não
terão monetização do YouTube, serão Pode acontecer, por exemplo, de uma
trabalhados com recursos de patrocí- marca se interessar, mas não ter o
nio e product placement. perfil adequado para aquele canal?
A publicidade sempre foi uma fonte Sim, claro. E há também a forma com
de receita importante para a TV, mas que você insere a marca no canal. Te-
os jovens estão vendo cada vez me- mos alguns formatos que são mais
nos comerciais, pelo menos no forma- aceitos, que ficam mais orgânicos. Se

Revista Filme B + março 2016 • 17


vídeo sob demanda

Novos caminhos do

VOD
Explosão do video sob demanda no país amplia modelos de negócios e atrai competidores para as novas
plataformas. Movimento também faz produtores repensarem suas estratégias de lançamento.

A
POR THIAGO STIVALETTI E GUSTAVO LEITÃO

A Netflix pode até ser a mais visível pla- exibidos na grade. O Telecine criou seu Segundo Karen Daylac, gerente de aqui-
taforma do momento quando o assunto VoD há cinco anos e hoje opera em for- sição de conteúdo do canal, os contratos
é o tão falado VoD (sigla para video on mato misto: transacional, com aluguel para a exibição dos filmes no VoD são di-
demand, ou seja, vídeo sob demanda), avulso de filmes mais recentes em pay ferentes e independentes daqueles fir-
mas está longe de resumir esse merca- per view (o Telecine On) e o aberto para mados com os estúdios para a exibição
do em ascensão. O serviço, organizado assinantes, com os filmes em exibição na TV. Do lado dos nacionais, uma estra-
como um catálogo de filmes e séries ofe- no momento nos canais da rede (Teleci- tégia do canal – entrar como coprodutor
recidos por meio de assinatura, cada vez ne Play). São cerca de 1,5 mil títulos no ainda no momento da filmagem – agora
mais apostando em produções originais total. garante não só a prioridade na estreia
exclusivas, é apenas um dos inúmeros na TV paga, mas estimula a primazia
Além da vantagem do “veja quando
players e modelos de negócio a operar no on demand em relação a outros con-
quiser”, as plataformas dos canais tam-
no país, em meio a uma tendência que correntes. “Quando a gente coproduz, já
bém oferecem a possibilidade do “onde
começou na trilha deixada pelo DVD e está dentro do filme desde o início. Os
quiser”: o espectador pode ver o filme
seguiu por muitas outras bifurcações. produtores nos procuram muito para
na TV, no computador, no tablet ou no
Essa multiplicidade de caminhos já afe- esse tipo de parceria”, diz Karen. “Os nú-
celular. Os números crescem exponen-
ta as estratégias de produtores, canais meros do VoD ainda não chegam perto
cialmente a cada ano, seguindo as novas
e tem reflexos nos contratos. Se ainda daqueles do homevideo de antigamente,
tendências de consumo: de 2014 para
não chega a ser a propagada revolução mas ele já se tornou uma etapa muito
2015, a quantidade de filmes para alu-
das janelas de exibição, certamente tem importante para os produtores”. O Tele-
guel no Telecine On cresceu 68%, che-
causado abalos nas velhas estruturas. cine já contabiliza coprodução em 120
gando a 560 títulos. O volume de filmes
longas nacionais até o momento.
Hoje, a grande maioria dos canais de alugados aumentou 57%. No Telecine
TV já lançou sua plataforma on demand Play, as visualizações cresceram 82% de Mesmo na seara de concorrentes fortes
para que os assinantes possam rever os um ano a outro – o canal não divulga nú- como Netflix e o Now, da Net, novas pla-
programas fora dos horários em que são mero absoluto de acessos. taformas tem surgido. É o caso da Looke,

Olmo e a gaivota: Que horas ela volta?:


estratégia diferente
disponível no Looke
Fotos: divulgação

Latitudes, produção da O2: estreia no YouTube

18 • Revista Filme B + março 2016


que começou a operar em setembro de
2015, sem muito alarde. São cerca de
“Os números do VoD
nove mil títulos, entre filmes, séries, ainda não chegam
shows e programas, em sistema misto:
por assinatura (R$ 18,90 para acesso perto daqueles
em três telas diferentes) ou transacio-
nal (locações de R$ 3,90 a R$ 9,90, além
do homevideo
de vendas para download). Iniciativa da de antigamente,
empresa de tecnologia Encripta, a plata-
forma surgiu como sucessora do extinto mas ele já se
comércio digital do grupo Saraiva. Hoje,
são 800 mil cadastrados (o número de
tornou uma etapa
assinantes não é divulgado). Este ano, a importante para os
entrada de um grupo americano na so-
ciedade deve capitalizar a empreitada. produtores”
Navegando pelo site, nota-se um acer- Karen Daylac, gerente de aquisição do
vo rico em títulos recentes, como Mad Telecine
Max – Estrada da Fúria, a comédia Um
senhor estagiário e o brasileiro Olmo e ência curta e pontual nos cinemas antes ta com canais de TV – uma venda única
a gaivota. Mas é inevitável a pergunta:
de irem para o VoD. Podem ser algumas por um valor acordado entre as partes.
como competir com a Netflix, que cobra
sessões apenas em parceria com uma Já nos transacionais, serviços como o
assinatura semelhante e tem no acervo
ONG, ou dez sessões em sala num único iTunes costumam ficar com 30% do
dezenas de produções originais? “Não
dia, com lançamento em VoD já no dia faturamento num primeiro momento,
sei se é o caso de se considerar concor-
seguinte”. passando depois a 40% e por fim 50%
rente. O que sabemos é que há espaço
– ou seja, elas ganham mais por filmes
para outros serviços e plataformas”, diz Latitudes, ficção com Daniel de Olivei-
que entram em catálogo do que sobre os
o diretor da Looke, Luiz Guimarães. ra e Alice Braga, foi concebido pela O2
recentes.
Play desde as filmagens como um pro-
Uma das alternativas, claro, é se dife-
jeto transmídia, destinado a cinema, TV Novas estratégias
renciar. A Looke está apostando em
paga e internet. O caminho foi o inverso
serviços como o Looke Kids, com filtros Mesmo sem lidar diretamente com as
da cadeia tradicional: primeiro estreou
de controle de conteúdo; um acervo de plataformas de VoD, os produtores bra-
shows exclusivos de artistas como Anit- num canal no YouTube, para depois ser
sileiros hoje repensam a trajetória de
ta, O Rappa e Chico Buarque; programas exibido no canal TNT e só no fim ter
seus filmes diante da nova realidade.
de canais de nicho como o Fish Channel, uma versão reduzida exibida nos cine-
“Vivemos um momento de reestudar
de pesca; e pretende expandir o acervo mas como longa.
toda essa sequência de janelas clássicas
dos títulos religiosos e de conteúdo re- Segundo Igor, o momento é de segmen- de lançamento dos filmes com as quais
gional, incluindo uma página dedicada a tação e curadoria. “É tanta gente produ- passamos cem anos acostumados”, diz
curtas brasileiros. zindo conteúdo que está cada vez mais Fabiano Gullane, produtor de longas
difícil encontrar o que tem a nossa cara”, como Até que a sorte nos separe, O lobo
Conteúdo segmentado
diz. “Uma saída é ir atrás de curadores atrás da porta e Que horas ela volta? “Até
Produtoras como a O2 também passa-
que nos ajudem a formar nossas grades entendermos como isso vai se moneti-
ram a navegar na maré de distribuição
individuais”. Para ele, a TV de antiga- zar, ainda levaremos alguns anos”.
digital. A empresa de Fernando Meirel-
mente deve continuar a reinar no uni-
les lançou recentemente a O2 Play, ex- Ele cita a trajetória do filme com Regina
verso das experiências ao vivo, como os
periência de cross media que tem como Casé, sucesso de público e crítica, como
jogos esportivos ou as finais de realities.
parceiros iTunes, Netflix e Now. Para algo diferente do que estavam acostu-
Igor Kupstas, diretor da distribuidora, A lufada de novidade trouxe outros mados a lidar na produtora. Ainda em
o momento é de testar dezenas de no- elementos para a mesa de negociação. cartaz nos cinemas, o longa foi lançado
vas alternativas para o lançamento de Kupstas explica que o contrato com ser- em DVD para as pré-vendas de Natal.
um longa. “Muitos vão ter uma experi- viços de SVoD é muito similar àquela fei- Enquanto isso, entrava no Telecine Play

Revista Filme B + março 2016 • 19


vídeo sob demanda

e no Now, para aluguel transacional. Aí adaptação para cada tipo de tela e sis-
reside a primeira diferença: no transa- tema operacional. Quando entrei nesse
cional, a renda para o produtor é maior, mercado, achei que meu trabalho maior CONHEÇA OS TIPOS
e ele recebe relatórios regulares de seria o licenciamento, mas metade da DE VOD
acesso e renda do filme. Para os SVoDs, minha equipe hoje é de engenheiros de
o filme é vendido só uma vez, e o produ- software”, explica Fábio Lima, da Sofá FVoD (free VoD) - VoD gratuito, ou
tor não tem mais controle da sua perfor- Digital, uma das mais requisitadas des- seja, o usuário não precisa pagar
mance. “Para entregar seu filme direto sas prestadoras. para assistir aos conteúdos. A
para o Netflix, avançando outras janelas, maior parte das plataformas as-
Para ele, o audiovisual chegou a uma socia anúncios aos vídeos, com
tem que haver uma negociação que va-
nova era com a distribuição digital. receita compartilhada (ou não)
lha a pena”, explica o produtor.
“Agora, a janela de exibição não é mais com os titulares desses conteú-
Segundo Fabiano, o mercado ainda está binária, ditada pela tradição. Ela de- dos. Exemplo: YouTube.
acomodando os novos players e não há pende do produto. Tudo é possível”, re-
regras definidas, mas os contratos cos- sume. SVoD (subscription VoD) - servi-
tumam respeitar o chamado revenue ço por assinatura. O usuário faz
share: de todo o faturamento do filme um pagamento periódico para ter
em qualquer mídia, o produtor fica com acesso a um catálogo. Os vídeos
cerca de 50%. “Num futuro de médio são licenciados para a platafor-
prazo, o VoD vai ser a janela de maior ma mediante pagamento aos ti-
renda da cadeia”, aposta. tulares. Exemplo: Netflix.
Para o produtor, as novas plataformas
TVoD (transactional VoD) - o pa-
não farão milagre – mas introduzem
gamento, aqui, é por título que
uma solução viável para a exploração
o usuário quer acessar. A tran-
dos filmes depois de esgotados outros
sação pode dar direito a um nú-
elos da cadeia. “A gente ouve dizer que
mero limitado de visualizações
as novas plataformas vão democratizar
(aluguel) ou a utilização perma-
o acesso, mas percebe que aquilo que
nente (eletronic sell through,
faz sucesso no cinema é o que se destaca
ou EST). Há um repasse das re-
no VoD. No entanto, esses novos canais
ceitas obtidas para os titulares.
são importantes para dar perenidade ao
Exemplo: iTunes.
filme”.
Segundo Walkíria Barbosa, da Total, é CATCH UP - também chamada de
vital que o cinema brasileiro ocupe logo replay TV. São conteúdos origi-
seu lugar nos novos meios de distribui- nalmente transmitidos na pro-
ção. “O VoD é a grande saída para nós, gramação de canais de TV que
depois que perdemos bilhões com o fim podem ser vistos mais tarde, por
do homevideo e o crescimento da pira- assinantes (no caso da TV paga).
taria”, diz a produtora, responsável pela “Agora, a janela O acesso pode ser feito sem pa-
franquia Se eu fosse você. “Mas o cinema
brasileiro não deve ser tratado como
de exibição não é gamento adicional além da assi-
natura. No caso da TV aberta, a
gueto. Agora é o momento de fortalecer
os players que já estão no mercado”.
mais binária, ditada reprise é gratuita. Exemplo: Net.

O on demand trouxe também um com-


pela tradição. OTT (over the top) - qualquer con-
teúdo ou serviço que requer uma
ponente tecnológico para essa equa- Ela depende do conexão à internet para ser aces-
ção. Agora, as produtoras recorrem
a serviços de agregadoras (empresas produto. Tudo é sado. Não se trata de um modelo
de negócio, apenas uma forma
que atuam na codificação e metadados
das obras) para chegar às plataformas.
possível” de entrega da obra audiovisual.
Exemplos: Netflix, YouTube.
“Cuidamos da formatação dos arquivos, Fábio Lima, diretor executivo da Sofá Digital

20 • Revista Filme B + março 2016


vídeo sob demanda

Desafios da regulação
Rosana Alcântara, diretora da Ancine, conta como tem sido a árdua missão de elaborar regras
para o conteúdo sob demanda no Brasil. Discussões incluem temas como cotas e tributação

q Quando os primeiros serviços de video


on demand surgiram no horizonte bra-

Foto: divulgação
sileiro, ao consumidor coube a parte
boa: o boom de novos conteúdos au-
diovisuais ao alcance do controle e do
mouse. Já o governo federal, responsável
por regular esse mercado, ganhou uma
batata quente. Que regras aplicar a um
serviço que não estava previsto na cria-
ção do Conselho Superior do Cinema,
em 2001? Como tributar essas novas
empresas, muitas delas estrangeiras? E
como assegurar que a produção brasi-
leira teria vez?
A tarefa tem exigido reuniões, fóruns e
discussões acaloradas entre os profis-
sionais do setor e dos representantes
da União, incluindo a Agência Nacional
do Cinema (Ancine). Nesta entrevista à
Revista Filme B+, a diretora da agência DESAFIO com todos aqueles que estão represen-
Rosana Alcântara explica as caracterís- tados no conselho, que inclui TV aberta,
Temos participado de vários seminários
ticas dessas novas plataformas e conta fechada, exibidores, distribuidores, pro-
e workshops aqui e fora do país. Essa
como o governo tem se articulado para dutores. E também as OTTs, que não têm
não é uma matéria simples, envolve
estabelecer regras claras para o VoD, representação ainda. Todos estão preo-
muitas inquietações de diferentes agen-
incluindo a garantia de oportunidades cupados em relação a uma definição
tes econômicos. E implica também ca-
para os filmes e séries brasileiros nessa mais clara dessa questão. E identificam
racterísticas locais, porque impulsiona
nova vitrine. Confira os principais tópi- um mercado muito promissor.
ou atravanca a produção regional. Por
cos da conversa. REGULAÇÃO MÍNIMA
outro lado, o vídeo por demanda tem
CARACTERÍSTICAS aspectos que rompem a territorialidade, Por que não partimos para uma regula-
daí os desafios importantes do ponto de mentação cinco anos atrás? Acho que o
Ao falar de VoD, não estamos falando de
vista regulatório. Estado tem que observar como o setor
qualquer conteúdo que vai parar na in-
ternet. São serviços que têm curadoria, caminha e não sair na frente, porque
CONSELHO DO CINEMA
produções com qualidade de roteiro, de pode aprisionar e criar dificuldades.
pesquisa. De plataformas que podem O Conselho Superior do Cinema, órgão Hoje esse é um mercado que pulsa e
ser rentabilizas e que têm publicidade. que discute as macropolíticas do audio- tem todas as condições de crescer for-
São empresas que quando fazem seus visual, tem conduzido esse debate. Essa temente. Por isso temos a ideia de uma
catálogos agregam valor, definem perfil, foi a pauta quase única durante o ano de regulamentação mínima, que ajude seu
fidelizam clientes. 2015. Foram três ou quatro reuniões, desenvolvimento.

22 • Revista Filme B + março 2016


NO MUNDO
“Hoje esse é um e de outras plataformas. O resultado é
que o segmento de vídeo por demanda
A Europa vem tratando desse tema há
mais de seis ou sete anos. Em setembro mercado que está na rubrica “outros mercados”. Esse
passado, foram colocados em consulta
pública regras e escopos de uma segun-
pulsa e tem todas valor, aplicado de forma literal, diferen-
tes agentes, alguns de nós também, en-
da diretiva para regulamentação de ser- as condições de tendemos que é pouco condizente com
o mercado. Valora demais. Uma das ten-
viços na internet, especificamente de ví-
deo por demanda. Vários países fizeram
crescer fortemente. dências que surge mais fortemente é a

regulamentações próprias e específicas, Por isso temos da contribuição percentual por empresa
que atua no mercado.
conceituando o que é VoD, detalhando
suas similaridades e diferenças para a a ideia de uma FUTURO
TV, trabalhando aspectos como cotas
para conteúdos locais, proeminência e
regulamentação Vários players internacionais procura-

tributação. mínima, que ram a Ancine para discutir regras e criar


a segurança jurídica para poder investir
PRODUÇÃO LOCAL ajude seu em seus negócios para o futuro. Da mes-
ma forma, produtores independentes
Um desses aspectos que temos discutido
é a proeminência, que a forma pela qual
desenvolvimento” começam a ficar atentos e alertas para,
diferentemente do que era há quatro,
o conteúdo local é disponibilizado. Iden- cinco anos, quando o VoD estava previs-
tificamos que os filmes brasileiros, em to em uma cláusula pequena de “outros
alguns casos, ficam quase perdidos. São linha de coprodução, mas isso ainda não
direitos”, com valores muito baixos, co-
vendidos como étnicos por esses gran- está na ordem do dia.
meçarem a ter contratos específicos.
des grupos econômicos. A forma pela EMPRESAS
qual empresta inteligência na curadoria TRÂMITE
e comunica para o público o que quer É importante que as empresas envolvi-
Essas questões do VoD dificilmente seriam
vender já constrói caminhos de indução. das nesse novo mercado tenham sede
supridas por uma instrução normativa. Fi-
A Europa construiu vários critérios em ou representação forte no Brasil, que se-
caria frágil. Pode até ser que aconteça em
relação a esses elementos visuais: tem- jam tributáveis. Além disso, é necessário
um horizonte em que não exista nenhuma
po de trailer, exposição nas plataformas, que cobrem em moeda brasileira, que os
outra solução. Mas achamos que o melhor
destaque para os conteúdos locais quan- contratos sejam em língua portuguesa. caminho é construir marcos claros. Este
do entram no catálogo. São aspectos que De tempos em tempos fazemos um le- ano será o do avanço do debate dentro
temos achado relevantes. vantamento dessas companhias em atu- do governo, vamos caminhar para termos
ação no Brasil. Diria que, hoje, cerca de um instrumento legal, um projeto de lei,
COTAS 80% delas têm registro na Ancine. para oferecer ao Congresso Nacional nes-
A política de cotas para o VoD não seria NOVOS PLAYERS te primeiro semestre.
uma reprodução da experiência bem-
Esse é um mercado com muitas possi- PRESERVAÇÃO
-sucedida da TV paga. As características
são completamente diferentes. Mas es- bilidades de entrantes e a gente acha O ministro da Cultura, Juca Ferreira, tem
tamos analisando as possibilidades de importante que eles existam. É um lugar dado uma atenção especial à proposta
ter um percentual dentro do catálogo e de oportunidades. É importante ofere- de criar uma plataforma semelhante ao
do que está sendo exposto durante um cermos uma harmonização regulatória papel que tem fisicamente a Cinemateca
período. Vários países construíram re- em que caibam todos esses diferentes Brasileira ou do próprio Centro Técnico
gras assim, como a França. agentes. Audiovisual (CTAv). Seria uma iniciativa
importante no campo da preservação e
COPRODUÇÕES CONDECINE
da difusão audiovisual, que não concor-
Vemos com bons olhos a ideia de esti- O marco legal para a cobrança da Conde- reria com os players comerciais. Mas ela
mular a parceria de produtores inde- cine, contribuição voltada para o setor, passa necessariamente por uma grande e
pendentes nacionais e esses provedo- é a Medida Provisória 2228, de 2001. complexa negociação com os detentores
res. É um caminho promissor. Estamos Naturalmente, ali não se podia prever a de direitos das obras audiovisuais que
estudando a criação de a criação de uma evolução e desenvolvimento da internet serão disponibilizadas.

Revista Filme B + março 2016 • 23


entrevista

ERIK BARMACK
Vice-presidente de conteúdo
original local da Netflix

Foto: divulgação
“Queremos que nossos produtores
sejam parte de uma iniciativa global”
Qualquer conversa sobre as novas maneiras Para a Netflix, qual a importância das produções feitas no Brasil? É
um fator-chave para garantir o interesse de seus assinantes no país?
de se consumir TV hoje passa pelo Netflix.
A plataforma de streaming conhecida por Procuramos oferecer o melhor conteúdo para os nossos assinantes,
e existem histórias fantásticas do mundo inteiro que merecem ser
séries originais como House of Cards e contadas. O fator chave é a satisfação do consumidor, e esse sempre
Orange is the New Black começou a operar foi nosso objetivo: oferecer um bom serviço, por um preço justo e
no Brasil e em outros países da América conteúdo de alta qualidade. Além disso, dar às pessoas a opção de
ver o que quiser, quando e onde quiser ajuda a aumentar nossa base
do Sul em setembro de 2011. Depois de
de assinantes no Brasil e no mundo. Dito isso, trabalhamos para ofe-
contratar José Padilha e Wagner Moura para recer não só conteúdo brasileiro para os assinantes daqui, mas para
a produção internacional Narcos, sobre o nossos assinantes no mundo inteiro. 3%, nossa primeira série ori-
ginal, estará disponível em 190 países para mais de 75 milhões de
traficante Pablo Escobar, que rendeu a Moura
assinantes [desse total, 45 milhões estão nos EUA. A empresa não di-
uma indicação para o Globo de Ouro, a vulga o número de usuários no Brasil]. O licenciamento de conteúdo
empresa dá em 2016 outro passo estratégico: local tem sido uma prioridade para nós desde que lançamos nosso
a produção de sua primeira série original no serviço no Brasil, em 2011. Temos uma ótima experiência com os
profissionais brasileiros. José Padilha e Wagner Moura foram fun-
Brasil, a ficção futurista 3%. Na entrevista damentais para o sucesso internacional de Narcos. E agora estamos
a seguir, Erik Barmack, VP de produções orgulhosos de trabalhar com Cesar Charlone, que já foi indicado ao
originais da Netflix, que atua há cinco anos Oscar e é um dos diretores de 3%, e com [os atores] João Miguel e
Bianca Comparato.
na empresa e é um dos palestrantes mais
aguardados do RioContentMarket, fala sobre Quais os fatores que levaram a empresa a escolher A toca, de Felipe
as estratégias da companhia para a produção Neto, e agora 3% como seus lançamentos exclusivos no Brasil? E por
que uma série de ficção científica?
de conteúdo e o crescimento da base de
São dois projetos diferentes. A toca foi um acordo de licenciamento
assinantes no país.
– fechamos um contrato para exibir a série em primeira mão para os
nossos assinantes, assim como fazemos para muitos outros títulos.
Por Thiago Stivaletti Já 3% é nossa primeira série original realizada no Brasil a ser exibi-
da no mundo todo. É um intenso drama pessoal dentro de uma pre-

26 • Revista Filme B + março 2016


“Dar às pessoas a
opção de ver o que
missa de ficção científica. Sabemos que passa por uma supervisão de profissio- quiser, quando e
o gênero tem fãs não só no Brasil, mas
no mundo inteiro.
nais da Netflix nos EUA?
onde quiser ajuda a
Tentamos ao máximo preservar a liber-
dade criativa, buscando colaborar com aumentar nossa base
Quanto foi investido em 3%?
Não divulgamos números.
os produtores e criadores. Quando pode
ser útil, apresentamos profissionais
de assinantes no
Que outros gêneros e públicos vocês
americanos e outros grupos criativos. Brasil e no mundo”
Queremos que nossos produtores sejam
gostariam de mirar nos próximos anos parte de uma iniciativa verdadeiramen-
no Brasil?

Fotos: divulgação
te global.
Estamos de olho em gêneros que sejam
locais e mostrem perspectivas únicas de O que a Netflix já sabe sobre seus assi-
histórias contemporâneas situadas es- nantes no Brasil?
pecificamente no Brasil. Atualmente, es- Sabemos que os brasileiros são apaixo-
tamos produzindo em muitos países, da nados por TV e grandes fãs da nossa pro-
África à América do Norte, e só vamos gramação original. Séries como Darede-
expandir esse movimento. Estamos or- vil, Orange is the New Black e Narcos são
gulhosos de nossos produtos feitos fora muito populares no Brasil.
dos EUA. Narcos foi uma grande surpre- 3%
sa, elogiada não só pela crítica e indica- Qual o mercado potencial que ainda
da a dois Globos de Ouro. Club de cuer- pode ser conquistado aqui?
Club de cuervos
vos, nossa primeira série fora dos EUA,
O desenvolvimento da infraestrutura de
foi um sucesso não só no México, mas
banda larga no Brasil vai continuar nos
com espectadores de língua espanhola
ajudando a fornecer um bom serviço
em outros países, incluindo os EUA. Em
por um preço justo, enquanto os consu-
2016, vamos lançar Marseille, produzi-
midores são apresentados aos muitos
da na França, The Crown, feita no Reino
benefícios da TV online, sendo o maior
Unido, e 3%. Teremos mais de 600 horas
deles o poder de controle [sobre a pro-
de programação original, incluindo as
gramação]. Esperamos ter um cresci-
novas temporadas de cerca de 30 séries,
mento constante do nosso negócio no
oito longas-metragens e 35 novas tem-
país nos próximos anos.
poradas de séries infantis.
Como se dá hoje a negociação dos direi-
Que conselhos você daria para os produ- tos de filmes brasileiros para o catálogo
tores interessados em fechar uma parce- da Netflix? Existe uma política formata- com o Now, plataforma on demand da
ria com a Netflix no Brasil? da de remuneração aos produtores e/ou operadora de TV paga do grupo Globo.
Procuramos histórias bem estrutura- integradores? Investimos em conteúdo local desde que
das, que tenham a capacidade de atra- A Netflix licencia individualmente todos começamos a operar no Brasil em 2011.
vessar fronteiras e unir fãs do mundo. os títulos oferecidos aos seus assinan- Um mix de conteúdo é um fator funda-
Não classificamos nem julgamos por tes. Cada acordo é formatado de acordo mental para crescer em qualquer região,
tipo ou gênero – desde que venha das com a legislação local. Estamos sempre por isso oferecemos um catálogo diversi-
melhores mentes criativas. Mas busca- atrás de bom conteúdo, mas, da mesma ficado. A Netflix ainda é vista como con-
mos séries que saibam tirar vantagem forma também somos bastante procura- corrente por alguns players locais que
de uma plataforma on demand. Histó- dos pelos produtores. não querem licenciar seu conteúdo. No
rias complexas e altamente serializadas entanto, temos uma forte relação com
sempre foram muito bem na Netflix. A Netflix ainda não possui um catálogo muitas emissoras locais e agregadores de
expressivo de filmes brasileiros recentes. conteúdo no Brasil. As produções locais
Como se dá a interação entre vocês e os A empresa pretende reforçar esse acer- originais também serão peça chave em
profissionais brasileiros responsáveis vo nos próximos anos? Imagino que nes- como pensar a programação no Brasil
pelas séries? O roteiro de cada episódio, se terreno exista uma forte concorrência daqui para frente.

Revista Filme B + março 2016 • 27


entrevista

TARA SORENSEN
Diretora de programação
infantil da Amazon Studios

“As crianças precisam


se apaixonar pela
história”
Ex-executiva de programação infantil do canal National Geographic, Tara Sorensen assumiu a
programação para crianças da plataforma de streaming Amazon. No RioContentMarket, ela vai falar
sobre os desafios de produzir conteúdo original para crianças num mercado altamente competitivo, com
dezenas de canais de TV paga e atrações online disputando a atenção da garotada.

Por que é importante para um serviço – mas as crianças também precisam se Quais são as principais atrações infan-
de streaming como a Amazon lançar apaixonar pela história e pelos persona- tis já lançadas pelo Amazon Studios?
programas exclusivos para crianças? gens. Para nossa programação pré-esco- A Amazon oferece uma série de progra-
As famílias formam uma parcela grande lar, trabalhamos com um consultor edu- mas originais para crianças de todas ida-
de nossa base de assinantes; por isso é cacional para se certificar que nossos des, da pré-escola à faixa dos 6 aos 11
importante fornecer conteúdo de primei- programas não sejam só entretenimen- anos. Depois de Tumble Leaf, nossa pri-
ra linha direcionado a crianças de todas to, mas inspirem o pensamento criativo meira série infantil vencedora dos prê-
e a educação por meio de um mundo de mios Annie e Daytime Emmy, lançamos
as idades, com o qual os pais se sintam
aventura e diversão. mais cinco séries originais, entre elas
bem. Como mãe, é muito bom ser res-
Gortimer Gibbon’s Life on Normal Stre-
ponsável por um conteúdo que a família Você vai participar de um painel no Rio et, série live action indicada ao Emmy;
inteira pode curtir e vivenciar junta.  Content Market. Tem alguma perspec- Creative Galaxy; Annedroids, indicada ao
Que características deve ter um proje- tiva de produzir no Brasil ou na Améri- Emmy; Wishenpoof, e mais recentemente
to de programa ou série infantil para ca Latina?  Just Add Magic. E já anuciamos uma leva
ser produzido e exibido pela Amazon? de novas séries: Thunderbirds Are Go,
Não temos novidades para divulgar nes- Danger & Eggs, Dino Dana, If You Give a
Em todas as nossas séries, precisamos te momento, mas esperamos encontrar Mouse a Cookie, The Kicks, Lost in Oz, The
saber que os pais se sentem bem em re- projetos inspiradores na região, que Stinky & Dirty Show e Niko and the Sword
lação ao que estão mostrando aos filhos possam interessar nossos assinantes. of Light.

Just Add Magic Annedroids


Fotos: divulgação

28 • Revista Filme B + março 2016


netflix 2016

the new black


Orange is

Vai faltar
tempo
Netflix tem calendário cheio
de estreias para os primeiros
meses de 2016

Por Pedro Curi

S Se a Netflix levou de 1997 a 2007 para passar de uma locadora


de DVDs com entregas pelo correio a um serviço de VoD por stre-
aming, os dez anos seguintes trouxeram mudanças bem maiores.
Presente hoje em 190 países, a empresa se aproxima cada vez de
um canal de televisão, investindo em conteúdo original e prome-
tendo dobrar a produção para esse ano.
Além da renovação de séries já consagradas pelo público e pela
MARÇO
Dia 4 – House of Cards (4ª temporada) – A primeira
série original da Netflix, com Kevin Spacey, está de
volta, já com uma quinta temporada encomendada.

Dia 11 – Flaked (nova série) – série cômica com Will


Arnett, produzida por Mitch Hurwitz (de Arrested De-
crítica, a Netflix investe na produção de novas histórias – mesmo
velopment).
que com personagens já conhecidos do público. É o caso de Fuller
House, lançada em fevereiro. A série dá continuidade a Três é de- Dia 18 – Demolidor (2a temporada) – Uma das pro-
mais (Full House), programa do fim da década de 80 sobre a rotina duções feitas em parceria com a Marvel, ao lado de
de um recém viúvo que recebe a ajuda de dois amigos para criar Jessica Jones (que também volta com uma nova tem-
as três filhas. porada, ainda sem data). O calendário de lançamento
Outro projeto que resgata personagens queridos do público é a depende das outras séries que irão explorar o universo
produção de quatro novos episódios de Gilmore Girls, que ainda dos quadrinhos.
não tem data de estreia, mas que já teve a maior parte do elenco
original confirmada. ABRIL
Em fevereiro também foi lançada a série Love, criada, escrita e pro- Dia 1º – The Ranch (nova série) – série cômica com
duzida por Judd Apatow, que depois das cultuadas Freaks and Ge- Ashton Kutcher.
eks (1999) e Girls (2012) promete um olhar realista sobre relacio-
namentos. A série já tem uma segunda temporada encomendada. Dia 1º – Lost & Found Music Studios (nova série) –
Voltada para o público adolescente, mostra um grupo
Veja o que mais a Netflix promete:
de jovens músicos em busca do sucesso.

30 • Revista Filme B + março 2016


Dia 15 – Unbreakable Kimmy Schmidt JULHO BoJack Horseman (3ª temporada) – Sé-
(2ª temporada) – Dos criadores de 30 rie cômica com Will Arnett.
Rock, Tina Fey e Robert Carlock, a sé- Dia 15 – Stranger Things (nova série)
rie foi indicada ao Emmy na primeira – Drama criado por Matt Duffer e Ross Marco Polo (2ª temporada) – Retorno da
temporada e já foi renovada para uma Duffer. aventura épica produzida pela Weinstein
terceira. Company, sobre o famoso explorador.
AGOSTO
Dia 15 – Kong: King of the Apes (nova Bloodline (2ª temporada) – Drama fami-
série) – Animação para crianças que 12 – The Get Down (nova série) – Criada liar com Kyle Chandler.
promete modernizar a clássica história por Baz Luhrmann (Moulin Rouge!, O
Between (2ª temporada) – Produção ca-
de King Kong. grande Gatsby), a série musical irá ex-
nadense.
plorar um eclético grupo de jovens do
MAIO Bronx em meio às transformações de Lady Dynamite (nova série) – Série cô-
Nova York na década de 1970. mica estrelada por Maria Bamford, fa-
Dia 5 – Marseille (nova série) – produ-
mosa stand up americana.
zida na França, estrelada por Gerard AINDA SEM DATA
Dépardieu. Green Eggs and Ham (nova série) – Sé-
3% (nova série) – Primeira série brasi- rie de animação infantil inspirada no
Dia 6 – Grace and Frankie (2ª tempo- leira produzida pela Netflix. livro de Dr. Seuss, produzida por Ellen
rada) – série cômica com Jane Fonda e
DeGeneres.
Lily Tomlin. Club de Cuervos (2ª temporada) – Pri-
meira produção original mexicana, já vai The OA (nova série) – Série dramática
JUNHO para a segunda temporada. criada por Brit Marling (Babylon) e Zal
Batmanglij.
Dia 3 – Word Party (nova série) – Volta- Sense8 (2ª temporada) – Série criada
da para crianças em idade pré-escolar, a pelos irmãos Andy e Lana Wachowski. Jessica Jones (2ª temporada) – Depois
série de animação conta com a ajuda de do sucesso da primeira temporada, a
The Crown (nova série) – Vencedor do
filhotes de animais que cantam e dan- personagem da Marvel está de volta.
Oscar de melhor roteiro por A rainha,
çam para desenvolver o vocabulário.
Peter Morgan é o criador dessa série
Dia 17 – Orange Is the New Black (4ª produzida na Inglaterra, sobre a família
temporada) – Vencedora de diversos prê- real britânica.
mios, incluindo o Screen Actors Guild
Awards deste ano por melhor elenco em Luke Cage (nova série) – Mais uma
uma série de comédia, a trama que gira aventura desenvolvida em parceria com
em torno da vida em uma penitenciá- a Mavel.
ria feminina já foi renovada até a séti-
Narcos (2ª temporada) – A série com
ma temporada com a garantia de que a
Wagner Moura na pele do traficante Pa-
criadora, Jenji Kohan, continuará como
blo Escobar ganha nova temporada, com
showrunner.
produção executiva de José Padilha.

Revista Filme B + março 2016 • 31


Fotos: Flávio Battaiola
comic con

no planeta
dos fãs
M
Unindo os universos dos
quadrinhos, cinema, TV e
internet num mesmo espaço,
Comic Con Experience atrai
Mesmo que você não se considere um nerd ou um geek,
é bem provável que já tenha ouvido falar das comic cons,
eventos que reúnem milhares de fãs de cultura pop, su-
per-heróis, games, seriados e cinema pelo mundo afora.
Fenômeno que começou nos EUA nos anos 1970, discre-
tamente, e viveu uma explosão a partir dos anos 1990, o
conceito da Comic Con chegou ao Brasil há apenas dois
anos, mas já alcançou força total.

mais de 140 mil fãs e se A primeira edição da Comic Con Experience (CCXP) acon-
teceu em 2014, em São Paulo. Ocupando 39 mil m² de um
torna espaço privilegiado de dos maiores centros de convenções da capital paulista (a
São Paulo Expo), atraiu 97 mil fãs. Na segunda edição, em
divulgação dos lançamentos dos dezembro passado, o evento viu expandir seu público e
seu espaço: 142 mil pessoas em 55 mil m2. Para 2016, um
grandes estúdios e da Netflix novo pavilhão está sendo construído ao lado do existente,
aumentando a área para 70 mil m2 – o equivalente a cerca
de sete campos de futebol. Desta vez, os organizadores
esperam movimentar 200 mil fãs.
Com seus números superlativos, em pouquíssimo tempo
Por Thayz Guimarães
o evento se tornou uma etapa fundamental da estraté-
gia dos grandes estúdios para divulgar seus blockbusters
e despertou o interesse de empresas como a Netflix e a
Rede Globo que, na última edição, fez questão de divul-
gar sua série inédita Supermax em um painel exclusivo.

34 • Revista Filme B + março 2016


O cinema nacional também marcou pre- marcar forte presença no evento, como buscamos encontrar a plataforma mais
sença com três produções: Reza a lenda, transformaram a maior e mais tradicio- adequada para a apresentação de cada
longa de ação ao estilo Mad Max; Zoom, nal convenção de Hollywood: o antigo conteúdo”, explicou.
que mistura live-action com animação; e ShoWest, encontro fechado entre exibi-
Califórnia, o primeiro longa de ficção da dores e distribuidores que se realiza em NETFLIX PRESENTE
cineasta Marina Person, que influenciou Las Vegas desde 1970, foi modernizado Uma das primeiras companhias a aceitar
uma geração inteira de jovens como VJ e rebatizado, a partir de 2011, como Ci- o convite da CCXP foi a Netflix. Em 2014,
da MTV. nemaCon. a estreia do evento foi a primeira vez em
Um dos segredos de tamanha repercus- Realizar um evento deste porte no Brasil que a empresa de streaming participou
são está no contato direto entre o públi- não foi tarefa fácil. A equipe organizado- de uma comic con no mundo. Na ocasião,
co e seus ídolos. Na CCXP, os frequenta- ra da CCXP é formada pelo Grupo Ome- ela trouxe para o Brasil parte do elenco e
dores têm a chance de ver ao vivo suas lete – dona do portal de mesmo nome material inédito da série Marco Polo. De
personalidades favoritas e assistir, em –, o estúdio de HQ Chiaroscuro Studios acordo com Ivan Costa, a estratégia foi
primeira mão, a materiais exclusivos. e a Piziitoys, importadora de bonecos tão bem-sucedida que, na segunda edi-
colecionáveis. Ivan conta que, em 2014, ção, eles dominaram a programação no
PÚBLICO AFICIONADO os parceiros fizeram um esforço enor- auditório principal com o elenco de duas
A primeira comic con do mundo, na me para convencer os estúdios, já que séries – Sense8 e Jessica Jones – e do longa
época conhecida como comic book con- o evento se propunha a ser um modelo The Ridiculous Six – entre eles, Adam San-
vention (algo como “convenção de qua- híbrido – voltado tanto para o público dler e Taylor Lautner, da franquia Crepús-
drinhos”), foi realizada em 1970, no his- em geral quanto para as empresas –, e culo. O evento promoveu uma pré-estreia
tórico U. S. Grant Hotel, em San Diego, havia a ideia de que uma convenção nes- surpresa do filme, depois lançado direto
Califórnia. Pouco mais de cem pessoas no streaming. “A Netflix entendeu muito
ses moldes seria um “negócio” exclusivo
compareceram ao evento. O primeiro bem e muito rápido a dinâmica do even-
dos EUA. “Nós tivemos que explicar que
boom veio em 1991, quando o evento se to. Eles não economizaram nenhum cen-
isso era apenas um modelo e que não
consolidou como o maior dos EUA e pas- tavo”, diz Ivan.
estávamos ligados a eles”, comentou.
sou a ser sediado no San Diego Conven- Depois, foi preciso provar que a CCXP Ao se percorrer os corredores da última
tion Center. Recentemente, a Comic-Con era um evento importante, que atrairia Comic Con, era evidente a importância
americana ganhou novo fôlego e ampli- mídia e funcionaria como uma platafor- da plataforma num evento geralmente
tude graças à popularização das fran- ma de promoção. “A gente dizia para as dominado pela presença de mega-es-
quias de super-heróis e fantasia pro- empresas ‘Vocês têm que estar lá! Vo- tandes dos estúdios Disney, Fox, Sony,
duzidos por Hollywood e pela Netflix, Universal e Warner. Na instalação da
cês têm que estar lá!’. Quando toparam,
fontes certas de bilheteria e alvo de um
público aficionado, disposto a consumir
muito além do próprio filme ou série.
Estande da Netflix na Comic
Para Ivan Costa, CEO da Comic Con Expe- Con Experience
rience – que não tem relação de licencia-
mento com a versão americana – a origem
do que hoje é mais popular no cinema, na
TV e na internet está nos quadrinhos, mas
o público já não é mais o mesmo dos anos
70. “Esse público não se resume mais a
nerds fãs de HQ. Agora estamos falando
de uma indústria rica, que movimenta mi-
lhões todos os anos”, explicou.

DO SHOWEST AO CINEMACON
O crescente sucesso da Comic-Con fez
os grandes estúdios americanos arrega-
larem os olhos. Eles não só passaram a

Revista Filme B + março 2016 • 35


comic con

empresa de VoD, uma das maiores e mais FILAS INTERMINÁVEIS Star Wars: Episódio VII – O despertar da
disputadas do evento, era possível parti- O perfil dos frequentadores também é força.
cipar de quizzes que valiam brindes ex- distinto. “Brasileiro adora um brinde,
clusivos; cantar num karaokê as músicas- A presença do tapete vermelho neste
um negócio exclusivo. É ostentação mes-
-tema de suas séries favoritas; tirar fotos tipo de evento é outra iniciativa brasilei-
mo”, Ivan se diverte. Um outro exemplo:
com personagens famosos por meio de ra. “Em outras Comic Cons, o convidado
os fãs daqui não dispensam uma foto. “O
interação virtual; e tentar “passar pelo entra pelos fundos do palco e só quem
público adora os ‘momentos Kodak’. Coi-
está no auditório consegue vê-lo. Nós
controle mental” do Kilgrave, o vilão da sas para tirar foto são com o brasileiro entendemos que se colocássemos o con-
série Jessica Jones, ao ter sua mente “con- mesmo. Vários estúdios entenderam isso vidado entrando pela porta principal,
trolada” por uma máquina. Um prato nesta última edição”. É comum ainda ver com acesso a todo o público, mesmo que
cheio para os fãs. os participantes circulando com elabora- de forma rápida, isso geraria uma como-
das fantasias de seus heróis preferidos, ção, as pessoas ficariam felizes”, explica.
Ivan afirma que o evento brasileiro tem
prática conhecida como cosplay. “E, afinal de contas, a gente está no mer-
um perfil mais descontraído do que o
americano, buscando estimular a inte- Quem foi ao evento pôde conferir as fi- cado do encantamento, não é?”.
ratividade dos fãs. “O que nós queremos las intermináveis de alguns estandes Mas é bom lembrar que na CCXP nenhu-
é criar uma experiência. Você vai ao es- como o da Warner, onde o público podia ma ideia é por acaso ou simples experi-
tande da Disney e tem uma piscina de entrar numa gaiola temática do filme mentação. “Tudo é friamente calculado,
bolinhas, vai ao da Fox e tem um ringue Esquadrão Suicida; o da Fox, em que se mas no bom sentido”, brincou Ivan, se
de patinação. Lá fora não é assim, os es- tinha, em tamanho real, um carro tom- referindo à pesquisa anual realizada pelo
túdios têm estandes mais burocráticos, bado pelo herói Deadpool e a casinha do Omelete, um dos organizadores do even-
com apresentação dos lançamentos, Snoopy; e o da Disney, com seus figuri- to, que reúne informações sobre esse pú-
sessão de autógrafos, no máximo”. nos de Capitão América – Guerra Civil e blico. Segundo o CEO, é com base nesses

Fotos: Daniel Déak


A Disney montou uma piscina
de bolinhas para promover
Procurando Dory

36 • Revista Filme B + março 2016


Fotos: Flávio Battaiola
Fotos: Daniel Déak
Os estúdios marcaram forte presença na CCXP. Acima, os estandes da Warner, Fox, Disney, Sony e Universal

resultados que o evento é calibrado, “mas reta, a crise não influenciou em nada. e apoio, operação e sistema de projeção
sem deixar de lado as questões comer- Nosso público é dedicado ao ponto de da Cinebrasil. Nele acontecem as princi-
ciais e de contrato”, esclarece. De acordo saber que não vai abrir mão daquilo”, pais apresentações do mercado de cine-
com o estudo mais recente, 55% dos fãs afirma. Muito pelo contrário: ainda ma, TV e VoD, além de pré-estreias. Na
da cultura pop no Brasil têm entre 20 e há uma demanda reprimida para um edição deste ano, que será de 1 a 4 de
29 anos e renda familiar média entre três evento dessa magnitude, já que exis- dezembro, a ideia é continuar investin-
e seis salários mínimos. tem outros do gênero no Brasil, mas do em infraestrutura e modernização
que não fazem a mesma convergência do encontro, que conta também com
CRISE? QUE CRISE? de quadrinhos, cinema, TV e internet outros dois auditórios menores, criando
Ivan cita uma frase do filme Campo dos num mesmo espaço. novos espaços.
sonhos (1989), com Kevin Costner, para Desde o ano passado, o evento conta Os organizadores têm planos para levar
explicar o sucesso do evento: “Se cons- com a parceria da Cinemark, que ad- a CCXP para outras cidades, mas a repro-
truir, ele virá”. Mesmo num período de quiriu o naming right (“direito de ba- dução de um evento deste tipo nas mes-
crise, com forte desvalorização do real, tismo”) do Auditório Thunder, o maior mas proporções é difícil, devido à nego-
que poderia tornar o entretenimento do evento. Agora chamado de Auditório ciação com os estúdios. A solução seria
algo supérfluo, os fãs vêm – e um even- Cinemark, o espaço é destinado a 2,5 investir em versões “de bolso”. Como di-
to como a Comic Con parece não ter mil pessoas e equipado com projeção ria o personagem do Campo dos sonhos:
motivos para se abalar. “De forma di- da Barco, sistema 3D da Master Image se construírem, os fãs virão.

Revista Filme B + março 2016 • 37


números do mercado

TV por assinatura
e banda larga

2015
O Brasil é o 7º
maior mercado de TV por
Crescimento do mercado da TV paga nos Projeção de domicílios
assinantes até o fim de 2020:
67%
últimos cinco anos:
assinatura do mundo
22,8 milhões
Crescimento da base de assinantes Total de domicílios assinantes:
em relação a 2014:
9% 19,6 milhões
Total de pessoas com acesso Número de pessoas alcançadas a cada
aos canais pagos: um ponto de audiência da TV paga: Total de assinantes de banda larga:
60,8 milhões 336 mil 8,5 milhões
Fonte: Mídia Fatos – Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA), disponível em www.abta.org.br

OS DEZ MAIORES MERCADOS DE TV POR ASSINATURA NO MUNDO


DOMICÍLIOS COM TV
PAÍS DOMICÍLIOS COM TV PENETRAÇÃO*
POR ASSINATURA

1 China 406.632.622 275.856.329 68%


2 Índia 178.382.235 141.488.074 79%
3 EUA 118.735.650 101.613.260 86%
4 Rússia 54.565.805 37.220.924 68%
Apesar de ser o sétimo
5 Alemanha 38.684.112 23.074.082 60% maior mercado de TV por
assinatura do mundo, o
6 França 27.148.446 22.497.478 83% Brasil ainda tem a menor
7 Brasil 64.009.078 19.638.138 31% taxa de penetração do
top 10: apenas 31%
8 Coreia do Sul 27.220.372 18.567.617 68%
9 México 29.432.352 16.820.379 57%

10 Reino Unido 26.276.699 15.845.141 69%

*assinante pelo total de domicílios


Fonte: ABTA / Dados SNL Kagan - Edição 2015 - dados 2014

38 • Revista Filme B + março 2016


DOMICÍLIOS COM TV POR ASSINATURA - DISTRIBUIÇÃO POR REGIÃO

A região Sudeste
concentra nada menos
que 62% dos domicílios
4% com TV por assinatura
do país

12%

7% 62% Sudeste
15% Sul
62% 12% Nordeste
7% Centro-oeste
4% Norte
15% Fonte: ABTA / Anatel

DOMICÍLIOS COM TV POR ASSINATURA - DISTRIBUIÇÃO POR ESTADO

São Paulo 38%


Rio de Janeiro 13%
2%
Minas Gerais 8% 2% 2%
Rio Grande do Sul 7% 2%
Paraná 5%
3%
Santa Catarina 4%
3%
Bahia 3%
Distrito federal 3% 2%
8%
Goiás 2%
38%
Ceará 2%
5% 13%
Pernambuco 2% São Paulo e Rio de Janeiro
Pará 2% concentram mais de 50% 4%
dos assinantes do país 7%
Amazonas 2%
Outros 9%

Revista Filme B + março 2016 • 39


números do mercado

DISTRIBUIÇÃO POR OPERADORA

OUTROS
VIVO TV
GVT 4% 2%
5%
OI
6%

NET
CLARO TV 37%
16%

SKY
30%

DISTRIBUIÇÃO POR TECNOLOGIA

FIBRA ÓTICA
1%

CABO
39%
SATÉLITE
60%

Fonte: Mídia Fatos – Associação Brasileira de TV por


Assinatura (ABTA), disponível em www.abta.org.br

40 • Revista Filme B + março 2016


OS MAIORES ANUNCIANTES DO FATURAMENTO
SETOR (2014)
total
UNILEVER BRASIL ano crescimento *
(em R$ bilhões)
MATTEL 2010 12,7 19%
RECKITT BENCKISER
2011 18,1 43%
FIAT
2012 23,8 32%
PEUGEOT CITROEN
2013 27,9 32%
PROCTER E GAMBLE
2014 32,2 15%
POLIMPORT
*em relação ao ano anterior
O BOTICARIO
Fonte: ABTA/SETA
CLARO O faturamento leva em conta as receitas
de mensalidade por assinatura de
CAIXA (GFC) programação, serviços de banda laga,
Fonte: Ibope Media - Monitor Evolution - taxa de adesão, serviços de pay-per-
banco de dados ME1412TOTALPTV view e outros de VoD, serviços de voz,
publicidade dos canais
PENETRAÇÃO

2010 2014

TOTAL 28% 47%


CLASSE A 79% 86%
CLASSE B 47% 65%
CLASSE C 16% 37%
CLASSE D 5% 13%

Fonte: ABTA

BANDA LARGA

8,5 8,5**

7,4

5,8
4,6
3,2 3,7
2,6
1,2 1,8

2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

* em milhões / ** estimativa
Fonte: ABTA

Revista Filme B + março 2016 • 41


notas

Uma década de Downtown


Bruno Wainer fez questão de escolher alguns casos anteriores, como Meu pas-
o RioContentMarket para dar início às sado me condena, que originalmente foi
comemorações do décimo aniversário uma série e gerou dois longas. Mas foi
da Downtown, a distribuidora dedica- um acidente não planejado. Agora, será
da exclusivamente ao lançamento de algo pensado desde o desenvolvimento”.
filmes nacionais que fundou em 2006
Durante essa década, os filmes da Do-
e que, desde então, se tornou uma das
wntown – em muitos casos lançados em
principais responsáveis pela nova onda
parceria com a Paris Filmes – já venderam
de blockbusters brasileiros. “Fui pela pri-
meira vez ao RioContent no ano passado, mais de 70 milhões de ingressos e tive-
para uma reunião, e me senti totalmen- ram faturamento total de R$ 1 bilhão, só
te humilhado (risos). Percebi na hora a nos cinemas. “Se a Downtown conseguiu
importância e a dimensão do evento, e o lugar que conquistou no cinema, onde
achei um absurdo estar de fora. Na ver- o ambiente de competição é o maior que
dade, achei um absurdo o cinema estar existe (afinal, vamos batalhar o ingresso
ausente do RioContent de maneira geral. do espectador com o blockbuster estran- mais ele será visto no video on demand,
Afinal, o cinema ainda é uma das progra- geiro), podemos levar essa experiência na TV paga e na TV aberta”. Bruno observa
mações mais valorizadas da televisão”. de sucesso também para outros espaços”. também que o VoD está explodindo e tem
Bruno conta que o cinema responde por gerado cada vez mais receita. “O VoD está
A presença no RioContent foi também
uma escolha estratégica, ligada aos pla- mais de 60% do faturamento anual da em- a um passo de substituir a arrecadação do
nos da distribuidora para um futuro bas- presa: “Ainda é nosso jackpot”, diz. “É tam- homevideo. Outro detalhe interessante é
tante próximo. “Estaremos cada vez mais bém a mídia que gera o preço e o sucesso que os preços entre TV paga e TV aberta,
ligados a projetos que já tenham, desde que o filme terá em outras mídias. Sabe- que eram muito distantes, estão cada vez
sua concepção, uma ligação entre cine- mos que, com poucas exceções, quanto mais próximos. Hoje, na verdade, já são
ma, TV e outras plataformas. Já tivemos maior o sucesso de um filme no cinema, praticamente equivalentes”.

Proibido para menores


Comédia e conteúdo adulto. Esses parecem ser os novos trunfos
que os executivos do cinema têm na manga para renovar o sa-
turado mercado dos super-heróis. A tendência surge depois dos
sucessos de Guardiões da Galáxia (US$ 773 milhões no mundo) e
do debochado Deadpool (US$ 257 milhões em sua abertura global,
US$ 325 milhões em duas semanas), que surpreenderam ao lançar
mão de personagens pouco conhecidos, piadas, violência, e, no
caso do segundo, classificação etária mais alta. Agora, pelo menos
duas adaptações dos quadrinhos, Wolverine 3 e X-Force, ambos da
Fox, também miram no selo R (17 anos). O diretor James Gunn já
trabalha na continuação de Guardiões. Sobre o fenômeno, polemi-
zou no Facebook: “Nos próximos meses, se você prestar atenção
nos modismos, vai ver Hollywood entendendo errado a lição que
Deadpool
Fotos: divulgação

deveriam ter aprendido e aprovando filmes ‘tipo Deadpool’. Vão


tratar você como estúpido, que foi algo que Deadpool não fez”.

42 • Revista Filme B + março 2016


Fotos: divulgação
Manchester by the Sea

O presente do futuro
A realidade virtual frequenta as previsões dos
futurologistas há anos. Mas esse futuro, final-
mente, está bem presente. Em 2015, iniciati-
vas de grandes empresas tiraram o conceito
dos laboratórios e o puseram nas prateleiras.
A Oculus, comprada pela Facebook, lançou
o Rift. A Samsung chegou com o Gear VR. A
Streaming dá novo fôlego ao Google despachou cinco milhões de cardbo-
ard viewers, formato barato feito de papelão
cinema independente e lentes. Já a Sony criou o Playstation VR e a
HTC, o Vive. Em comum, são dispositivos leves,
Principal plataforma do cinema in- os direitos de streaming de Tallulah, usáveis, sem a maçaroca de fios dos primeiros
dependente americano, o Sundance com Ellen Page, The Fundamentals of protótipos, e alguns com o smartphone como
Film Festival, que se realizou de 21 Caring, com Paul Rudd, e o filme de peça acoplável.
a 31 de janeiro, teve uma edição horror iraniano Under the Shadow.
E o conteúdo, alguém há de perguntar? Ao que
considerada histórica em 2016. Isso
parece, ninguém quer perder esse bonde. A
porque Amazon e Netflix, serviços A companhia também teria sido
Oculus fechou parceria com a Fox em setembro
de streaming que tiveram atuações responsável pelo maior negócio do
passado para lançar mais de cem filmes no for-
tímidas em edições anteriores, arre- festival, a aquisição, pela Fox Search-
mato, incluindo clássicos como Alien, o oitavo
gaçaram as mangas e foram às com- light, de The Birth of a Nation, de Nate
passageiro e novidades como Maze runner. Na
pras, em muitos casos por valores Parker, também considerado aposta
última edição do Sundance Festival, a seção
robustos. A Amazon, por exemplo, certa para o próximo Oscar. Rumores
New Frontier programou filmetes e instalações
bateu as ofertas da Fox Searchlight afirmam que a Netflix teria dado um imersivas, incluindo um mergulho no mundo
e Focus Features e arrematou, por lance de US$ 20 milhões, mas os pro- de Perdido em Marte. Para esquentar a estreia
US$ 10 milhões, Manchester by the dutores preferiram optar por um dis- de Star Wars: O despertar da força, a Lucasfilm
Sea, de Kenneth Lonergan. Segun- tribuidor com maior experiência em lançou uma série de curtas chamada Jakku spy.
do a Variety, o filme recebeu uma cinema, fechando com a Fox Search- Em abril, o Festival de Tribeca vai programar 23
ovação semelhante à de Boyhood, light por US$ 17,5 milhões. Segundo títulos interativos, que incluem documentários,
dois anos atrás, e a compra pode ter John Cooper, diretor artístico do Sun- narrativa e jornalismo.
garantido à Amazon “um ingresso dance, os serviços de streaming estão
Resta saber se a adaptação dos espectadores
na primeira fila para o Oscar do ano ajudando a dar novo fôlego ao cine-
será indolor ou se muita desorientação e en-
que vem”. A Amazon comprou ainda ma independente, depois dos baques
joo ainda virão até que a tecnologia de imer-
Love and Friendship, de Whit Stillman, com a crise do homevideo e a decisão
são radical esteja plenamente comercial.
e o documentário Author: The J. T. dos estúdios de acabar ou diminuir
LeRoy. A Neftlix, por sua vez, garantiu suas divisões de cinema de arte.

Gear VR, da Samsung

Woody Allen sob demanda


A Amazon encomendou a Woody Allen uma série de comédia para
seu serviço de streaming. Será o primeiro esforço do gênero por parte
do cineasta, que divulgou um comunicado temperado com sua ironia
Fotos: Getty Images

costumeira: “Não sei como me meti nisso”, escreveu. Serão seis episó-
dios de meia hora, ambientados nos anos 60. Estão confirmados no
elenco o próprio Allen, Miley Cirus e a veterana Elaine May.

Revista Filme B + março 2016 • 43


Foto: arquivo pessoal
entrevista

LIA BAHIA
Pesquisadora especializada em
cinema e televisão

A multiplicação dos ingressos


O ano de 2016 começou milagroso para o cinema brasileiro. Antes mesmo de sua
estreia, no dia 28 de janeiro, Os dez mandamentos, versão em longa-metragem da
novela da TV Record, já contabilizava mais de dois milhões de ingressos, só de venda
antecipada. Em um mês em cartaz, o novo blockbuster ultrapassou a marca de cinco
milhões de espectadores, superando outro fenômeno do cinema religioso, Nosso lar
(quatro milhões de ingressos). Mas com uma novidade: o filme é um derivado de
uma novela de TV e prepara o público para uma nova sequência, de volta à televisão. Na entrevista a seguir,
Lia Bahia, autora da pesquisa de doutorado A telona e a telinha: encontros e desencontros entre cinema e
televisão no Brasil, e atualmente Coordenadora de Audiovisual da Secretaria Estadual de Cultura do RJ, analisa
o fenômeno e os principais aspectos da atual relação entre cinema e TV no Brasil.

Qual foi a principal novidade no lança- buído por independentes, e nos surpre- da. São filmes que viram séries, séries
mento de Os dez mandamentos? ende. Não vamos entrar no mérito se que viram filmes, séries que viram te-
é bom ou ruim. No caso, o interessan- lefilmes. É uma estratégia de maximiza-
Acho que temos aí três movimentos im-
te de se observar é que o cinema não ção do conteúdo audiovisual nacional.
portantes. O primeiro é que o espaço au-
pode mais ignorar a TV e vice-versa. O Contudo, não podemos esquecer de Os
diovisual brasileiro entende que é cada segundo movimento é a estratégia de Trapalhões e Xuxa, que nos anos 1970
vez mais fundamental a necessidade pré-compras de ingressos (pela igreja? e 1980 tiveram uma sólida produção
de aliança entre cinema e TV no Brasil. pela emissora?) para alavancar a per- que deslizava entre cinema e televisão.
Uma das questões mais proeminen- formance e a permanência do filme nas O que muda é que, atualmente, a circu-
tes da política pública no país é a não salas de cinema. Sabemos que o cinema laridade entre cinema e TV se torna um
integração institucional entre cinema brasileiro se faz no boca a boca, e que é recurso positivo e inserido no processo
e TV. Com a Globo Filmes, temos uma uma luta para manter o filme em cartaz.
produtivo; não é mais visto como nega-
integração entre cinema e TV privada. Alguns produtores independentes usam
tivo e de exceção.
Com a Lei 12.485, tivemos um avanço dessa estratégia, mas em escala bem me-
importante, mas que não dá conta da nor. Os dez mandamentos também assus- O filme tem um final diferente do exi-
regulação da TV aberta. Aí vem Os dez tou por este fato. Por fim, não podemos bido na TV, que introduz a próxima no-
mandamentos, que não tem nada a ver ignorar que, nesse caso específico, ainda vela da Record. De que maneira você vê
com a Globo nem com o Estado, distri- entra a questão da religião, que é bastan- essa ligação?
te delicada e controversa e abre debates
É um gancho do filme para a novela. A
importantes sobre sua relação com o au-
convergência transmidiática, tendência
Os dez mandamentos diovisual no país.
mundial do modelo capitalista e tão ce-
Essa estratégia de lançar no cinema lebrada, se apresenta de maneira singu-
um conteúdo de sucesso na TV não é lar e contraditória no Brasil. Uma novela
novidade. De que maneira isso já foi que se desdobra em temporadas, mas
Foto: divulgação

feito no audiovisual nacional? mantém sua estrutura de novela? Uma


A TV Globo, com a Globo Filmes, faz hibridação clara de modelos. O audiovi-
isso muito bem, com uma metodologia sual brasileiro segue o fluxo de mudan-
própria de fortalecimento do conteúdo ças dentro de suas estruturas e conjun-
nacional, desde O auto da compadeci- turas políticas, econômicas e culturais.

44 • Revista Filme B + março 2016


Revista Filme B + março 2016 • 45
números do mercado

CINEMA
2015
A A crise que se abateu sobre a economia brasileira em
2015 não chegou a atingir o mercado de cinema do país,
que apresentou crescimento pelo décimo ano consecu-
tivo em arrecadação de bilheteria. A renda total chegou
a R$ 2,31 bilhões, uma alta de 17,1% em relação a 2014,
e o público foi de 170,7 milhões, alta de 8,5%.
exibidos comercialmente no circuito de salas do país, um
número 16% maior que o de 2014. Essa alta se explica,
pelo menos em parte, pelo próprio avanço da digitaliza-
ção, que tem facilitado a distribuição de filmes indepen-
dentes.
O cinema nacional também teve um ano de crescimento,
O circuito exibidor também continuou seu processo de com alta de 16,4% em renda e de 10,1% em público. Fo-
contínua expansão, chegando a 2.960 salas, e o proces- ram R$ 266 milhões arrecadados nas bilheterias e 21,6
so de digitalização, como esperado, avançou bastante. milhões de ingressos vendidos.
Nada menos que 97% das salas do país já trabalham com
Como também houve um crescimento proporcional dos
projeção digital.
filmes estrangeiros, o market share dos filmes nacionais
O número de estreias nos cinemas aumentou significati- se manteve estável, com participação de 11,5% em ren-
vamente. Nada menos que 435 longas-metragens foram da e 12,7% em público.

AS DEZ MAIORES BILHETERIAS DE 2015

FILME DISTRIBUIDORA ESTREIA SALAS ABERTURA RENDA PÚBLICO

Os Vingadores - Era de Ultron Disney 23/04/15 1359 145.989.000 10.122.961


Velozes e Furiosos 7 Universal 02/04/15 1163 142.480.000 9.880.086
Minions Universal 25/06/15 1137 119.801.000 8.921.138
Jurassic World - O mundo dos dinossauros Universal 11/06/15 1056 90.700.000 6.380.062
Cinquenta tons de cinza Universal 12/02/15 1199 87.570.600 6.686.340
Star Wars: Episódio VII - O despertar da força Disney 17/12/15 1504 74.167.600 4.589.744
Jogos Vorazes: A esperança - O final Paris 19/11/15 1274 62.923.300 4.344.687
Cinderela Disney 26/03/15 927 50.086.600 4.200.863
Bob Esponja - Um herói fora d´água Paramount 05/02/15 796 47.957.700 3.719.937

Loucas pra casar DTF/Paris 08/01/15 605 45.888.600 3.779.702

Fonte: Filme B/BoxOffice Brasil

46 • Revista Filme B + março 2016


Salas

2.819 2.960
2.645
2.529
2.225 2.346
2.045 2.050 2.063 2.096
1.997 2.045
1.817
1.620 1.635

+0,9% +11,1% +9,9% +2,4% +0,0% +0,2% +0,6% +1,6% +6,2% +5,4% +7,8% +5,0% +6,6% +5,0%

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Público
(em milhões)
170,7
148,9 151,2 157,2
141,7
134,9
117,4 112,7
105,0
90,8
75,0
93,6 90,2 89,3 89,1

+21,0% +15,6% +11,8% -20,3% -3,6% -1,0% -0,2% +26,5% +15,7% +5,0% +5,1% +1,5% +4,0% +8,5%

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Renda
(em milhões)
2.311,9
1.973,3
1.769,9
1.639,6
1.417,5
1.261,3
970,4
784,5 695,1 712,7 727,1
660,6
412,5 529,7
672,0

+28,4% +24,7% +18,7% -14,3% +3,4% +2,5% +2,0% +33,4% +30,0% +12,4% +15,7% +7,9% +11,5% +17,1%

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Revista Filme B + março 2016 • 47


números do mercado

Lançamentos

435
395
337 333
302 278 375
225 336 328 327
197 317 306
154

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Lançamentos nacionais
130
120

98
82 82 85 103
73
51 76 82
51
30 30 30

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Lançamentos estrangeiros

305
264 275 272
251 235 245
195
167 254
124 227 246 232 230

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

48 • Revista Filme B + março 2016


Público do filme nacional
(em milhões) 28,1
25,6

22,0 21,6

15,9 19,6
17,8
16,4
10,3 15,1
7,8
6,9
10,7 9,9
8,8
+13,0% +182,0% -25,5% -34,7% -7,4% +4,0% -14,6% +80,7% +61,0% -30,5% -15,2% +86,1% -30,6% +10,1%

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Renda do filme nacional


(em milhões) 300,0
266,0

225,7

166,9 228,5
134,0 131,4
110,1 154,0
79,0
35,5 40,3
73,8 73,7 69,3

+13,5% +232,5% -17,8% -32,9% -0,1% +7,2% -12,3% +89,6% +71,7% -26,1% -7,7% +94,8% -24,9% +16,4%

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Market share do filme nacional

21,4%
19,0% 18,6%

14,2%
12,6% 12,7%
11,6%
14,3%
9,3% 12,4%
12,0%
11,0% 10,2%
9,9%
8,0%

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Revista Filme B + março 2016 • 49


navegando
Internet, streaming e os novos hábitos do consumo audiovisual

Crédito: Marina Guido Guimarães


Fernando Toste
Roteirista, produtor e um verdadeiro “rato” da internet, Fernando Toste começou trabalhando
como crítico e curador de mostras e festivais. Com especial paixão pelo cinema de gênero, foi
um dos fundadores do RioFan – Festival Fantástico do Rio, que idealizou e dirigiu por quatro
edições. Agora, dedica-se ao roteiro (foi um dos autores de Aurora, longa dirigido por José
Eduardo Belmonte, em finalização) e prepara sua estreia na direção com A casa no fim da
estrada, para a RT Features, de Rodrigo Teixeira.

Quantas horas por dia você passa navegan- volto é o No Film School e o Cinephilia & da imaginação), eu já havia acumulado
do e como a internet ajuda seu trabalho? Beyond. uma considerável bagagem de literatu-
ra e audiovisual que devia tudo a ela – e
Não sei dizer ao certo, mas passo mais
Onde você busca informações sobre fil- foi como voltar para casa. É um marco
horas por dia conectado do que seria
mes, séries, etc? absoluto e uma fonte constante de ins-
desejável – ou mesmo saudável. Quan-
Além dos suspeitos usuais (Variety, piração. É impossível escolher um único
do escrevo, tenho como regra ficar des-
Hollywood Reporter, Filme B, etc), de episódio favorito, então vou me permi-
conectado. É claro que a internet pode
onde tiro minha dose diária de informa- tir selecionar dois: Time Enough At Last,
ser uma grande aliada na pesquisa e nas
ção, tenho predileção por sites como o escrito pelo próprio Serling e um exem-
ferramentas para o seu aprimoramento
TwitchFilm e o IndieWire, que me apre- plo perfeito do seu estilo irônico, e The
profissional, mas um dos grandes desa-
sentam novidades sobre o cinema inde- Howling Man, do Charles Beaumont, que
fios é separar o joio do trigo: sites dedi-
pendente internacional com qualidade. emprestou sua voz única aos avanços da
cados a técnicas de produção de roteiros
Descobri uma imensidão de filmes e série no terreno do horror.
e DIY filmmaking estão em toda parte e
quase sempre flertam com a mistifica- cineastas incríveis a partir dessas duas
ção motivacional e a autoajuda. Entre fontes.
os sites dedicados a roteiros que sem-
pre justificam a visita estão o de John Qual sua série favorita de todos os tem-
August e o Go Into the Story, que con- pos, qual a temporada favorita dessa série
seguem aliar bons conselhos práticos e (ou de outra), e qual o capítulo favorito de
profissionais a um trabalho analítico de qualquer temporada dessa série (ou de
primeira. Outra boa dupla à qual sempre outra)?
Entre as primeiras séries que vi estavam
DIY filmmaking: DIY é a sigla para “do it Galeria do Terror e o remake de Além da
yourself”, ou seja, faça você mesmo. DIY film- imaginação, além de outras antologias
making, portanto, significa algo como “faça como Amazing Stories e Contos da Cripta.
seu próprio filme” Quando, já adulto, finalmente tive aces-
so à série original do Rod Serling (Além

52 • Revista Filme B + março 2016


Qual sua série recente favorita?
A última que me pegou de jeito foi
Making a Murderer. Sendo um fã invete-
rado de true crime, é claro que não me
contive e me juntei à legião de investi-
gadores amadores que segue acompa-
nhando o caso pela internet. Assisti à
série inteira em dois ou três dias. E é
curioso: cheguei tarde ao universo das
séries contemporâneas pós-Sopranos,
e acho que só consegui me relacionar
a partir de longas jornadas dedicadas a Binge watching: hábito de assistir a
temporadas inteiras de Mad Men e Bre- séries de uma vez só
aking Bad (em DVD ou VoD). Para mim,
o binge watching é a melhor maneira de
se assistir a uma série. E mesmo admi- Como você imagina o futuro do consumo
rando as duas, só fui me convencer do audiovisual?
potencial do formato quando vi Ozy-
mandias, episódio de Breaking Bad que Acredito que o consumo de audiovisual > FAVORITOS
me deixou no chão. Ah, sim, Black Mirror num futuro próximo passa necessaria-
e Fargo também são magníficas. mente pela ideia de curadoria. Exibi- http://johnaugust.com
dores como o Grupo Estação, no Brasil, http://gointothestory.blcklst.com/
ou o Alamo Drafthouse, nos EUA, vêm http://nofilmschool.com/
experimentando com a ideia de salas de http://cinearchive.org/
repertório e inovando na programação http://variety.com/
– assim como o programa Clássicos Ci- http://www.hollywoodreporter.com/
nemark, do qual sou um grande fã. No http://www.filmeb.com.br/
terreno do consumo doméstico, se a Ne- http://twitchfilm.com/
tflix nos salva da nostalgia da antiga vi- http://www.indiewire.com/
deolocadora do bairro, iniciativas como https://www.netflix.com/
o Hulu (e seu acervo conectado à Crite- https://mubi.com/
rion) e o Mubi me lembram as visitas https://www.shudder.com/
àquelas locadoras especiais que tinham
Qual foi o último filme de longa-metragem
um acervo diferenciado de clássicos e
feito para cinema que você viu e em que
filmes de arte. Uma das iniciativas mais
suporte viu (cinema, TV, computador)?
interessantes nesse sentido é o Shudder,
O último filme “de cinema” a que assis- que reúne um acervo de filmes de hor-
ti foi o suspense O presente, estreia na ror clássicos e contemporâneos selecio-
direção de Joel Edgerton. Assisti no Ne- nados por especialistas no gênero, infe-
tflix – e, para ser totalmente honesto, lizmente ainda indisponível no Brasil.
nem sei se chegou a ser lançado comer-
cialmente em salas no Brasil (o filme es-
treou em dezembro de 2015). Quando se
trata de um filme independente de gê-
nero, ultimamente são raras as chances
de um lançamento comercial no cinema
e não me incomodo de esperar mais um
pouco para assistir nas plataformas de
VoD, como fiz a vida inteira nas video-
locadoras.

Revista Filme B + março 2016 • 53


de olho nas séries

O Santo Graal
Como alcançar o almejado mercado de TV nos Estados Unidos

Por Bárbara Rodrigues Mota

Produtora e roteirista com 13 anos de experiência, é consultora da rede americana ABC para o mercado brasileiro.
Foi Gerente de Programação da Globo e Diretora de Desenvolvimento da produtora Os Alquimistas, eleita uma das
100 empresas mais inovadoras do mundo. Tem passagens também por Telecine, Riofilme e Oi Futuro.

a
Após um ano morando nos Estados Uni- cinco anos. Em 2014, esse número pu- narrativas dos seriados, como uma tra-
dos, é difícil resumir as inúmeras dife- lou para 371. Hoje, são mais de 400. ma central clara e condensada, e menos
renças em relação ao mercado de televi- personagens. Avenida Brasil foi vendida
Nesse cenário altamente competitivo, ga-
são no Brasil. Mas estamos caminhando para mais de 130 países.
nham as melhores histórias. Segundo Eri-
para uma interseção nunca antes vista,
ka D. Kennair, Vice-presidente de Comédia Ao mesmo tempo, aqui nos EUA, ganhou
graças à combinação de dois fatores: o
e Desenvolvimento Internacional da ABC, força a dramaturgia mais soapy, mais no-
aumento da produção de séries de qua-
“a busca por talentos, histórias e perso- velesca e melodramática, com relações
lidade no Brasil e a busca por conteúdo
nagens maravilhosos tem que ir além das familiares complicadas, backstories ela-
internacional pelos canais americanos.
fronteiras do nosso país”. boradas e grandes viradas. É o caso das
Além de cinco canais de TV aberta e mais séries de Shonda Rhimes (ABC) e de Em-
A ABC tem uma rede de consultores de
de 180 canais a cabo, já é notícia velha o pire (FOX), a grande revelação de 2015.
diferentes nacionalidades, da qual faço
investimento e os resultados de serviços
parte, que a ajuda a encontrar essas his- Com um crescente diálogo entre a lin-
de streaming como Netflix, Hulu e Ama-
tórias. As possibilidades são reais: a con- guagem americana de seriados e a lin-
zon Studios. Apesar de não divulgarem
sultora britânica trouxe uma comédia guagem latino-americana de teleno-
seus dados de audiência, séries do Ne-
que está em desenvolvimento pela ABC, velas, o mercado dos EUA vê um bom
tflix como House of Cards, Unbreakable
sobre a relação disfuncional e codepen- potencial para a compra de produtos
Kimmy Schmidt, Orange is The New Black,
dente de uma lésbica e seu amigo hétero. brasileiros. “A televisão precisa de dinâ-
e do Amazon Studios, como Transparent
e Mozart in the Jungle tiveram reconhe- E os critérios usados pela rede, parte micas entre personagens que vão durar
cimento do público, da crítica e das pre- da Disney, deveriam ser a bússola de de temporada a temporada, e o Brasil
miações – dado que faltava para legiti- qualquer roteirista: “Nossos programas estabelece essas dinâmicas de forma ad-
mar seus esforços como produtores de precisam ter personagens incrivelmente mirável com suas novelas”, diz Michelle
entretenimento de qualidade. interessantes e originais”, explica Samie Woodmansee, Gerente de Comédia e De-
Falvey, Vice-presidente Executiva de Co- senvolvimento Internacional da ABC.
Diferentemente da televisão aberta
média e Desenvolvimento Internacional
(gratuita e dependente de anúncios e A venda de novelas prontas dubladas é,
do canal. “Obviamente, também estamos
números de audiência), os serviços de portanto, apenas um pedaço das pos-
atrás de histórias e mundos bem criados
streaming adotam, agora, a mesma es- sibilidades de receita para o conteúdo
e de autenticidade emocional, já que é
tratégia lançada pela HBO, desde a sua nacional, a exemplo da empresa Keshet,
necessário criar uma conexão emocio-
concepção, na década de 1970, e inves- de Israel, que exportou para o mundo
nal com os fãs”. E como isso começa?
tem em conteúdo exclusivo, original formatos como In Treatment (original-
“Sempre dizemos: tudo começa com os
e inovador, que justifique um desem- mente Be’tipul) e Homeland (origina-
personagens”, reitera Samie. Nosso his-
bolso mensal para o consumidor. Com lemente Hatufim). Alguns seriados da
tórico de exportação de novelas prontas
mais players competindo por atenção, Keshet fizeram sucesso nos EUA, outros
é antigo, como não poderia deixar de ser,
aumentou também o investimento em não. E assim é a vida em Hollywood,
já que o Brasil produz as melhores do
ficção seriada. uma terra em que o sucesso pode estar
mundo. Dentro desse filão, o campeão
Segundo um estudo do canal FX, a TV é João Emanuel Carneiro, que, não por na próxima esquina, desde que não se
americana tinha 280 séries de ficção há acaso, traz para suas novelas estratégias pare de produzir.

54 • Revista Filme B + março 2016


de olho no vod

Cenário de incertezas
Quais os desafios do ambiente de VoD no Brasil

Por Fábio de Sá Cesnik e Gilberto Toscano

Sócios do escritório Cesnik, Quintino e Salinas Advogados. Fábio Cesnik se formou em direito pela USP e se especializou na área de
mídia e entretenimento. É autor dos livros Guia do incentivo à cultura e Globalização da cultura, ambos da editora Manole. Gilberto
Toscano também se formou pela USP, com pós-graduação em Direito do entretenimento pela Escola Superior de Direito da OAB.

O O desenvolvimento tecnológico do
streaming tornou possível a disponi-
bilização de conteúdos fonográficos e
audiovisuais transmitidos em período
determinado pelo próprio usuário (o
VoD) por meio da internet. Mas a conti-
nuidade do crescimento desse mercado
no Brasil depende da implementação
Internet, e aproximá-la da ingerência do
próprio CSC e da Agência Nacional de
Cinema (Ancine). A regulação de tal ma-
téria e da agência competente para sua
regulamentação e fiscalização, de qual-
quer forma, depende da aprovação de
uma lei específica, a ser proposta na for-
ma do art. 61 da Constituição Federal.
análise, votação e posterior promulga-
ção permanecem incertos.
3 - A ausência de lei e de uma agência
governamental competente para regula-
mentar e fiscalizar o mercado de VoD. A
regulação do VoD envolve itens como
o registro de agentes econômicos e as
de um ambiente juridicamente seguro informações que deverão prestar, ques-
2 - A ausência de regulação do uso de tões concorrenciais, metodologia para
e economicamente viável. Atualmente,
dados pessoais, essencial na definição de eventual criação de cotas para conteú-
são entraves para essa implementação:
limites para o uso de dados de usuários dos brasileiros, etc. Se depender do teor
1 - A ausência de uma agência governa- de plataformas de VoD para mapeamento do documento “Desafios para a regula-
mental para regulamentação e fiscaliza- e sugestões de consumo de outros conte-
mentação do vídeo sob demanda” e da
ção da internet no Brasil, essencial para údos. O uso de dados pessoais em geral
atenção dedicada pela Ancine ao tema,
plataformas de VoD que operam sobre conta com poucos princípios e parâme-
poderá ser a Ancine tal agência, se assim
rede aberta (OTT). O conceito jurídico tros (a exemplo daqueles especificados
dispuser lei futura.
que mais se aproxima ao de plataforma no Marco Civil da Internet, aplicável ao
de VoD que opera sobre rede aberta é o uso de dados em redes abertas, na Cons- 4 - A definição de um modelo de tributação
de provedor de aplicações de internet, tituição e no Código Civil). Isso acarreta saudável para plataformas de VoD sobre
previsto no Marco Civil da Internet (Lei incertezas cujas informações são utili- rede aberta e rede fechada. O que pas-
12.965/14), cujo art. 5º, VII conceitua zadas (quais os limites e as condições sa – mas não se limita – pela redefinição
aplicações como “o conjunto de fun- para uso desses dados) e para as empre- do método de cálculo da Condecine a ser
cionalidades que podem ser acessadas sas que se utilizam desses dados (qual a cobrado pela disponibilização de conte-
por meio de um terminal conectado à viabilidade jurídica e a durabilidade no údos audiovisuais nessas plataformas.
internet”. O Conselho Superior do Ci- médio prazo das ferramentas em que in-
nema (CSC), a despeito disso, publicou, vestem para uso de dados de terceiros, a 5 - O enquadramento do direito autoral
em 17/12/15, um documento intitula- exemplo da indicação de obras audiovi- para comercialização de conteúdos por
do “Desafios para a regulamentação do suais baseadas nos elementos disponí- demanda do usuário. Dado o impacto da
vídeo sob demanda”, no qual declara veis do usuário de certa plataforma de sua possível classificação como comuni-
entender que “o VoD não se confunde VoD). A disciplina desses dados tam- cação pública na arrecadação de receitas
com serviços de provimento de conexão bém depende da aprovação de Lei no por associação musical de gestão coletiva.
de internet”. Um argumento questio- Congresso Nacional e, em outubro de A relevância dessas questões torna ne-
nável do ponto de vista técnico, com o 2015, o Ministério da Justiça encami- cessária a participação ativa de todos os
provável fim de afastar sua futura regu- nhou à Casa Civil um anteprojeto de lei interessados nos processos de constru-
lamentação do âmbito da Lei Geral das para disciplinar o assunto, cuja modifi- ção dessas políticas e das normas que as
Telecomunicações e do Marco Civil da cação e apresentação ao Congresso para lastrearão.

56 • Revista Filme B + março 2016


de olho no público

Universos paralelos
Até onde o público está disposto a ir por uma história

Por Pedro Curi

Doutor em Comunicação, pesquisa temas ligados a cultura de fãs, televisão, juventude e


convergência. É professor na ESPM Rio, onde coordena os cursos de graduação de Cinema e
Audiovisual e Jornalismo e a pós-graduação de Produção em Audiovisual.

M
“Mas eu só quero ver um filme”, comen- lineava dessa maneira há tempos, desde Nem toda história precisa de crossovers,
tou um amigo em uma discussão no a década de 1950. spinoffs e estratégias em múltiplas mí-
Facebook, que começou com um post dias. A lógica transmídia, tão comentada,
No seu livro mais conhecido, Cultura da
bastante empolgado sobre o trailer de não deve se impor ao conteúdo. E ainda
convergência, Henry Jenkins apresenta
Capitão América: Guerra civil. O desaba- tem a questão do público: você deve estar
a sinergia como a oportunidade econô-
fo veio depois de uma série de mensa- onde sua audiência está. Assim como não
mica representada pela capacidade de
gens explicando como o filme poderia adianta explorar mídias que não tenham
possuir e controlar manifestações de
influenciar a próxima temporada de aderência com sua narrativa, de nada
um conteúdo por diferentes sistemas de
Agents of S.H.I.E.L.D., em que lugar do adianta criar conteúdo para snapchat se
distribuição. Junto à extensão – a ten-
tempo estaria situada a história depois seus espectadores nem conhecem o apli-
tativa de expandir mercados potenciais
do último filme do Homem de Ferro e de cativo, por exemplo.
pelo movimento de conteúdos por esses
Vingadores: Era de Ultron, e quais as ex-
sistemas – e à franquia – o esforço em Da mesma forma, você pode ter um pro-
pectativas para o aparecimento do novo
imprimir uma marca e um mercado a duto que agrade a diferentes públicos e
Homem-Aranha.
conteúdos ficcionais –, a sinergia seria criar, para cada um deles, diferentes ca-
A mesma situação poderia ter aconteci- uma peça fundamental da cultura da minhos da história a serem descobertos.
do em alguma publicação em torno de convergência a que se refere o título. Assim, cabe ao consumidor decidir até
Legends of Tomorrow, série lançada no onde ele está disposto a ir. O principal
fim de janeiro nos Estados Unidos (e em Muita gente vê a convergência como cuidado que precisamos ter nesse mo-
fevereiro no Brasil), reunindo persona- uma questão essencialmente tecnológi- mento é não excluir ninguém. Um espec-
gens que já haviam aparecido em Arrow e ca, que acabou impactando o comporta- tador que não acessa uma determinada
Flash, dois grandes sucessos da TV ame- mento do público – mas o movimento na plataforma ou não conhece algum meio
ricana que, por muitas vezes, tiveram verdade é bem mais complexo que isso. não deve se sentir frustrado por estar
suas tramas cruzadas com o intercâm- Na verdade, esses padrões de consumo perdendo parte da história. Ele tem tanto
bio de personagens e histórias compar- já estavam ali há tempos, ainda que cer- direito ao conteúdo quanto o maior fã.
tilhadas – as primeiras cenas de Flash, tamente tenham sido imensamente po-
tencializados pelas novas possibilidades Em um mercado hipersegmentado, não
inclusive, apareceram em um episódio
podemos tratar os nichos como mains-
da segunda temporada de Arrow, antes tecnológicas.
tream. Há, sem dúvidas, um grupo de-
mesmo do lançamento do piloto da série A tecnologia fez com que pudéssemos le- dicado, que acompanha as histórias e
sobre o homem mais rápido do mundo. var diferentes conteúdos para qualquer corre atrás dos personagens, encarando
A sinergia entre diferentes meios na lugar e nos aproximou ainda mais dele. a experiência como um grande quebra-
indústria do entretenimento não é no- Assim, não necessariamente surgiram -cabeça narrativo que espalha peças em
vidade. Nas décadas de 80 e 90, acom- novas formas de assistir à TV, mas os há- diferentes plataformas; mas há, tam-
panhamos produtos voltados para o bitos foram adaptados à nova realidade. bém, aquele consumidor que se esforça
público jovem que eram uma mistura Uma realidade em que nos encontramos para conseguir dedicar uma hora da se-
complexa de diferentes mídias, incluin- conectados, e onde nossa vida se dá em mana a uma série, ou comemora quando
do filmes, programas de televisão, clipes diferentes plataformas. Nada mais natu- consegue um tempo para ir ao cinema. E
musicais, livros e videogames – uma ral, então, que as histórias nos acompa- todos, sem exceção, querem e merecem
cultura jovem que, na verdade, já se de- nhem, certo? Não necessariamente. se divertir.

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