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2º Ciclo em Química Industrial

Biocompósito de
polihidroxibutirato/cânhamo

Unidade Curricular: Ciência e Tecnologia dos Materiais


Trabalho realizado por: Beatriz Francisco, nºM12835
Docentes: Ana Costa e Joana Vieira
17 de novembro de 2022
Índice
1. Compósitos e biocompósitos ............................................................................................. 2
2. Origem/Estrutura química do material .............................................................................. 3
3. Síntese/Produção do material ........................................................................................... 5
3.1. Matérias-primas ........................................................................................................ 5
3.2. Síntese do agente compatibilizante ........................................................................... 5
3.3. Síntese do biocompósito de PHB/cânhamo ................................................................ 6
4. Propriedades do material .................................................................................................. 7
4.1. Estrutura multiescala dos biocompósitos ................................................................... 7
4.1.1. Morfologia ............................................................................................................. 7
4.1.2. Massa molar .......................................................................................................... 7
4.1.3. Comportamento térmico e de cristalização ............................................................ 8
4.2. Propriedades mecânicas ............................................................................................ 9
4.2.1. Sensibilidade à água............................................................................................. 11
4.2.2. Biodegradabilidade .............................................................................................. 12
5. Aplicações do material .................................................................................................... 12
6. Referências bibliográficas ................................................................................................ 13

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1. Compósitos e biocompósitos
Os materiais compósitos são formados pela combinação de, pelo menos, dois materiais,
que não se dissolvem ou misturam, com diferentes composições, estruturas e propriedades.
Estes contêm uma fase de reforço de material rígido e forte, geralmente particulado ou fibras
(contínuas ou descontínuas), dispersa numa matriz contínua (mais fraca que a de reforço), de
constituição cerâmica, polimérica ou metálica. (Fowler et al., 2006) (Materiais Compósitos,
2008) Ocorre ainda a formação de uma interface, devido ao efeito de processamento e às
interações químicas (M.Daniel & Ishai, 1996). A Figura 1 mostra as fases presentes num material
compósito e a Tabela 1 algumas características importantes sobre o reforço e a matriz.

Figura 1 – Fases do material compósito

Tabela 1 - Características do reforço e da matriz (Lobo, 2018)

Reforço Matriz

• Suporta as cargas que • Mantém o reforço


são exercidas no unido;
compósito; •Transmite e distribui a
• Confere aos força externa aplicada
compósitos para a fase dispersa
propriedades (reforço);
mecânicas, como • Dá a forma aos
rigidez, resistência, compósitos e
estabilidade térmica e proporciona uma boa
isolamento elétrico. qualidade de
acabamento superficial
aliada a uma proteção
do reforço contra
ataques químicos e
desgaste.

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As preocupações ambientais levaram à procura de novos materiais naturais, que
apresentassem o mesmo desempenho e substituíssem os de origem sintética, para serem
usados em materiais compósitos (Lobo, 2018). Deste modo, surgiram os biocompósitos.

Os biocompósitos são materiais compósitos que compreendem uma ou mais fases de


origem biológica. O reforço pode ser, por exemplo, de fibras vegetais (como o algodão, linho ou
cânhamo), madeira reciclada, resíduos de papel, subprodutos de processamento de culturas
alimentares ou fibras de celulose regeneradas e a matriz pode ser formada por polímeros
obtidos de recursos renováveis (entre os bioplásticos promissores estão os
polihidroxialcanoatos [PHAs], como o polihidroxibutirato [PHB]) ou não renováveis (derivados
do petróleo, como o polietileno, polipropileno, poliestireno e cloreto de polivinil) (Fowler et al.,
2006).

O objetivo principal da produção destes materiais é a obtenção de um material com


propriedades totalmente diferentes às dos componentes isolados, portanto a combinação dos
materiais constituintes é decidida a partir da aplicação específica que se pretende dar ao
material. (Moreira, 2008). Neste trabalho, o biocompósito a abordar será o
polihidroxibutirato/cânhamo.

2. Origem/Estrutura química do material


O biocompósito de polihidroxibutirato/cânhamo, apresenta uma matriz de
polihidroxibutirato e um reforço de cânhamo.

O polihidroxibutirato é um biopolímero termoplástico pertencente à família dos


polihidroxialcanoatos, sendo constituído por monómeros de 3-hidroxibutiril (Figura 2),
combinados em células vivas a longas cadeias poliméricas lineares, que podem conter até 10 a
20 mil monómeros por molécula (Ylinen et al., 2022). O PHB é produzido por microrganismos a
partir de vários substratos de carbono e a polimerização ocorre pelo processo apresentado na
Figura 3. Uma das vantagens do PHB é que pode ser produzido a partir de subprodutos da
indústria alimentícia e resíduos agrícolas ou urbanos, contudo a sua principal desvantagem, ao
nível comercial em larga escala, é o seu alto custo e, para algumas aplicações, as suas
propriedades funcionais não são apropriadas (Touchaleaume et al., 2019), pois devido à sua alta
cristalinidade (entre 55-80%), o PHB é rígido e quebradiço, resultando em propriedades
mecânicas pobres, com baixa extensão na rutura (Turco et al., 2021).

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Figura 2 - Estrutura molecular do
Polihidroxibutirato

Figura 3 - Síntese do biopolímero PHB

O cânhamo é uma planta pertencente à espécie Cannabis sativa e a sua estrutura é


formada por diversos componentes que podem ser aproveitados industrialmente, sendo um
deles as fibras (Figura 4). As fibras de cânhamo são extraídas dos caules da planta e são
compostas por celulose, hemicelulose, lignina e pectina (Promhuad et al., 2022).

Figura 4 - Cânhamo e fibras de cânhamo

De modo a modular as propriedades funcionais do PHB, reduzindo o custo final e


conservando a biodegradabilidade dos materiais, juntou-se o PHB com cargas lignocelulósicas
(constituídas principalmente por celulose e lignina) provenientes de cânhamo (Touchaleaume
et al., 2019). No entanto, a incorporação das cargas lignocelulósicas na matriz de PHB apresenta
baixa afinidade, resultando na baixa molhabilidade (capacidade de interação dos líquidos com
outros fluidos e/ou superfície sólida) das cargas pela matriz e na má dispersão das cargas devido
à formação de aglomerados. Por isso, tem-se desenvolvido estratégias que contrariem esse
problema, ou seja, que aumentem a similaridade das propriedades de superfície dos
componentes compósitos (Touchaleaume et al., 2019). Uma das estratégias possíveis é a
introdução de agentes compatibilizantes anfifílicos, uma vez que estes reduzem a tensão e
aumentam a adesão interfacial entre as diversas fases, possibilitando uma melhor
compatibilização entre fases (Antunes, 2018). Para compósitos de fibras de cânhamo/PHB, um

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exemplo de um agente compatibilizante de base biológica, é o oligo-PHB com grupos
aromáticos, que desenvolve interações com as fibras de cânhamo, por despolimerização do PHB
com funções de álcool de grupos aromáticos de base biológica. Um composto que demonstrou
ser um bom candidato para despolimerizar o PHB, é o álcool vanílico (álcool 4-hidroxi-3-
metoxibenzílico), que possui um álcool primário (Touchaleaume et al., 2019), como se pode ver
na Figura 5. Contudo, para se beneficiar completamente da introdução das fibras é necessário
dispersar as fibras homogeneamente dentro da matriz, utilizando, por exemplo, um agente
dispersante.

Figura 5 - Fórmula estrutural do álcool vinílico

3. Síntese/Produção do material
A síntese do material, descrita neste trabalho, é apresentada com base no artigo
científico Polyhydroxybutyrate/hemp biocomposite: tuning performances by process and
compatibilisation, do autor Touchaleaume.

3.1. Matérias-primas
Para a produção deste biocompósito as matérias-primas utilizadas foram: pellets de PHB
(P(3HB- co -4HB) com 5% de 4-hidroxibutirato), que foram secos a vácuo durante a noite a 60oC
antes do processamento; fibras de cânhamo, que foram maceradas, cardadas e cortadas em 2
a 4 mm de comprimento, com diâmetro médio 50-100 µm; acetato de zinco di-hidratado com
99% de pureza; e álcool vinílico com 98% de pureza.

3.2. Síntese do agente compatibilizante


O agente compatibilizante foi obtido através de uma reação de transesterificação
(processo de troca do grupo orgânico R″ de um éster com o grupo orgânico R' de um álcool)
entre o PHB e o álcool vinílico, num procedimento batch. O PHB e o álcool vinílico foram agitados
mecanicamente e aquecidos a 180oC com um catalisador de di-hidrato de acetato de zinco, para
obtenção de oligoésteres com uma extremidade fenol, como representado na Figura 6. A
reação foi mantida por 1,5 h e, ao fim desse tempo, durante o arrefecimento o material foi
colocado num recipiente a vácuo e depois triturado num almofariz.

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De seguida, o masterbatch do compatibilizador foi composto no aparelho extrusora de
dupla rosca e a velocidade da rosca foi ajustada para 500 rotações por minuto (rpm). O perfil de
temperatura foi um gradiente de 180°C no alimentador a 150°C na matriz. No final, o
masterbatch preparado foi seco ao ar e peletizado.

Figura 6 - Reação de transesterificação entre o PHB e o álcool vinílico

3.3. Síntese do biocompósito de PHB/cânhamo


Em primeiro lugar, secou-se, por uma noite, na estufa a vácuo a 45°C os pellets de PHB
virgem e o masterbatch compatibilizador e, de seguida, estes foram colocados na extrusora de
dupla rosca. As fibras de cânhamo foram secas a 80°C por 1 h e, ao fim desse tempo, foram
adicionadas à extrusora por um alimentador lateral diretamente no polímero/masterbatch
fundido. Para tal, escolheu-se um teor de fibra único e típico de 20% e a temperatura foi ajustada
moderadamente para 180°C ao longo de toda a rosca. Durante a extrusão, dois perfis de rosca
foram testados, utilizando três velocidade (250, 500 e 750 rpm), o que originou dois níveis
diferentes de cisalhamento ao material extrudado. A primeira rosca estudada era constituída
por cinco zonas de distribuição e uma zona de dispersão e foi chamado de perfil de baixo
cisalhamento. A segunda rosca foi chamada de perfil de alto cisalhamento, constituído por uma
zona de distribuição e cinco zonas de dispersão. Comparando ambos os perfis, o perfil de alto
cisalhamento apresentou tempos de residência superiores.

Os biocompósitos extrudados foram granulados e secos durante uma noite na estufa a


vácuo a 45°C e injetados numa máquina de moldagem por injeção. Os materiais não
preenchidos não puderam ser processados juntamente com esta última etapa, porque a
moldagem por injeção requer uma cinética de cristalização, que essas composições não
apresentaram, pois não foi adicionado nenhum agente de cristalização. De modo a distinguir as
amostras, estas foram identificadas da seguinte forma: com compatibilizador – PHB-CH; sem
compatibilizador – PHB-H; as condições de cisalhamento, como LS, para o perfil de baixo
cisalhamento e HS, para o perfil de alto cisalhamento; e, por fim, com o número da velocidade
de rosca (250, 500 ou 750 rpm).

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4. Propriedades do material
4.1. Estrutura multiescala dos biocompósitos
4.1.1. Morfologia
Para avaliar a morfologia dos biocompósitos utilizou-se um microscópio eletrónico de
varrimento (MEV), onde se observou que a dispersão das fibras de cânhamo dentro da matriz
de PHB era homogénea e o facto de se ter utilizado diferentes condições de processamento não
afetou a dispersão homogénea das fibras, pois tanto nas condições de alto cisalhamento a 750
rpm, como nas condições de baixo cisalhamento a 250 rpm, a dispersão foi uniforme. O nível de
adesão interfacial entre a matriz e as fibras também foi avaliado por MEV e constatou-se que,
para as mesmas condições de processamento (perfil de alto cisalhamento a 250 rpm), o
biocompósito preparado com compatibilizante exibiu uma interfase entre a fibra e o polímero
(maior nível de adesão), ao passo que o biocompósito sem compatibilizante apresentou lacunas
entre as fibras e a matriz (menor nível de adesão), confirmando assim a eficiência do
compatibilizador, como se pode observar na Figura 7, imagens (c) e (d).

Figura 7 - Imagens da microscopia eletrónica de varrimento dos biocompósitos


PHB/cânhamo ((a) PHB-H HS750; (b) PHB-H LS250; (c) PHB-H HS250; (d) PHB-CH HS250)

4.1.2. Massa molar


A determinação da massa molar foi realizada por cromatografia de permeação em gel,
num sistema de cromatografia líquida de alta eficiência equipado com um detetor de índice de
refração diferencial. A matriz de PHB pura apresentou uma massa molar média de 150,7 Kg/mol
e a análise demonstrou que todas as amostras sofreram uma redução da massa molar, que
variou entre 130,7 e 43,4 Kg/mol (Tabela 2). Comparando as amostras obtidas, dentro de cada

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grupo (baixo e alto cisalhamento), observa-se que com o aumento da velocidade de rosca a
massa molar diminui, como por exemplo, nas condições de baixo cisalhamento o PHB-H a 250
rpm apresentou uma massa molar de 122,2 Kg/mol e a 500 rpm 90,0 Kg/mol. Demonstrando
que a velocidade de rosca influencia a massa molar do biocompósito.

Analisando a influência do perfil de cisalhamento, observa-se que, para a mesma


velocidade de rosca, as amostras obtidas por alto cisalhamento apresentaram uma redução
maior na massa molar do que as amostras de baixo cisalhamento. Como por exemplo, para 500
rpm e sem compatibilizador, a massa molar obtida nas condições de baixo e alto cisalhamento
foi 90,0 Kg/mol e 59,9 Kg/mol, respetivamente. Por fim, a utilização de compatibilizador também
afetou a massa molar dos biocompósitos, verificando-se que os biocompósitos com
compatibilizante (PHB-CH) apresentaram massas molares menores, comparativamente com os
biocompósitos sem compatibilizante (PHB-H) correspondentes. Por exemplo, os biocompósitos
processados a 250 rpm, em condições de alto cisalhamento, apresentaram 77,2 Kg/mol para
PHB-H e 74,9 Kg/mol para PHB-CH. A redução da massa molar com a adição do compatibilizante
era esperada, porque as condições de processamento dos biocompósitos eram semelhantes às
da síntese do compatibilizante (transesterificação em extrusão reativa com catalisador ainda no
meio). A reação de transesterificação ocorreu durante o processo de composição, favorecendo
assim uma redução extra da massa molar do PHB.

Tabela 2 - Propriedades térmicas e moleculares dos biocompósitos PHB/cânhamo, para diferentes condições de
processamento

4.1.3. Comportamento térmico e de cristalização


De modo, a analisar estes dois parâmetros realizaram-se medições de calorimetria de
varrimento diferencial, num intervalo de temperaturas de –50 a 200oC, e análises
termogravimétricas, onde as amostras foram aquecidas deste a temperatura ambiente até 500

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o
C. Os valores da temperatura de transição vítrea (Tg) foram calculados no ponto médio do salto
da capacidade calorífica e o grau de cristalinidade também foi obtido.

Observando a Tabela 2, os valores de temperatura de transição vítrea, variaram entre -


1 a 4oC. Comparando o PHB puro, com o PHB com fibras de cânhamo, observa-se que a adição
das fibras resultou numa diminuição da Tg, sendo essa diminuição mais notável para os
biocompósitos sem compatibilizante (PHB-H). A redução da Tg foi atribuída à produção de
oligómeros de PHB durante o processamento, que atuaram como plastificantes da matriz.

Sobre o grau de cristalinidade, quando o biocompósito se esfria, começa a nucleação e


o crescimento dos cristais em diferentes pontos da amostra. Pela Tabela 2, os biocompósitos
apresentaram valores bastante superiores, entre 37,2 a 41,8%, comparativamente às matrizes
sem fibras de cânhamo (3,6% para o PHB puro e 9,6% e 16,9% para o PHB de baixo e alto
cisalhamento, respetivamente). Uma vez que, o grau de cristalinidade, para os biocompósitos,
rondou sempre os 40%, para as diferentes condições de processamento (baixo ou alto
cisalhamento e a adição ou não de compatibilizante), pode-se afirmar que estas não
influenciaram, significativamente, na percentagem de cristalinidade dos biocompósitos. Outro
fator que evidenciou o crescimento dos cristais nos biocompósitos, foi a temperatura de
cristalinidade (Tc), que apresentou picos de cristalização entre 74 e 78 oC e para as matrizes sem
as fibras, a Tc não foi detetada, indicando que estas dificilmente exibiram regiões de
cristalização.

Por fim, sobre a estabilidade térmica do material, pode-se visualizar (Tabela 2), pela
temperatura de início da degradação (T-5%), que o PHB puro apresentou maior temperatura,
seguido do PHB extrudado sem fibras e, por último, os materiais contendo fibras. Confirmando
que a adição de fibras favorece a hidrólise do PHB e intensificam o aquecimento interno da
matriz, aumentando a viscosidade de cisalhamento de fusão.

4.2. Propriedades mecânicas


As propriedades mecânicas estudadas foram: o módulo de Young, a tensão de rutura e
a ductibilidade. No módulo de Young (que mede a rigidez de um material), o intervalo de valores
para os biocompósitos com compatibilizante (PHB-CH) foi de, aproximadamente, 310 a 450 MPa
e para os biocompósitos sem compatibilizante (PHB-H) de 304 a 336 MPa, demonstrando que a
introdução de compatibilizante aumentou significativamente a rigidez dos materiais, com
exceção do PHB-CH HS500 que apresentou o módulo de Young menor que o PHB-H HS500.

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No caso da tensão de rutura (tensão máxima que o material suporta), esta diminuiu
quando a velocidade de rosca aumentou, tanto para PHB-H, como para PHB-CH. Essa diminuição
foi mais acentuada nos biocompósitos processados com perfil de alto cisalhamento, como por
exemplo, a tensão de rutura foi reduzida em 49%, quando a velocidade do parafuso aumentou
de 250 para 750 rpm para PHB-H de alto cisalhamento. Também se pode observar na Figura 8
que, para a mesma velocidade de rosca, os valores de tensão de rutura para PHB-H e PHB-CH
foram sempre muito próximos, indicando que a introdução de compatibilizante não alterou
significativamente esta propriedade mecânica.

A ductibilidade, que se caracteriza como sendo a deformação plástica total do material


até ao ponto de rutura, apresentou um comportamento semelhante à tensão de rutura. Ou seja,
também foi significativamente reduzida com o aumento da velocidade de rosca, a maior
diminuição também ocorreu nos biocompósitos de alto cisalhamento e a adição de
compatibilizante, mais uma vez, não alterou significativamente os valores de ductibilidade. Esta
tendência pode ser explicada, porque nas condições de processamento mais severas,
possivelmente, ocorreu degradação das fibras e dos polímeros.

Em suma, para os materiais processados com baixo perfil de cisalhamento, os


desempenhos mecânicos foram preservados e até mesmo melhorados com a adição do
compatibilizante, ao passo que no caso de condições severas de processamento, o estado de
dispersão da fibra foi melhorado, mas reações de degradação severas ocorreram ao mesmo
tempo, dificultando a possível melhoria proporcionada pelo compatibilizante.

Figura 8 – Propriedades de tração dos biocompósitos PHB/cânhamo, para diferentes


condições de processamento

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4.2.1. Sensibilidade à água
A análise deste parâmetro foi realizada através da secagem das amostras a 40oC, numa
estufa a vácuo durante 24 horas e depois deixadas para equilibrar a 0% de humidade relativa,
por uma semana antes da medição, numa balança de precisão. Como representado na Figura 9,
o teor de humidade adsorvido no equilíbrio, para todos os materiais PHB/cânhamo,
independentemente da composição e das condições de processamento, rondou os 2 e 3%.
Segundo Miguel & Iruin et al. 1999, em condições semelhantes, o PHB puro apresenta um teor
de humidade adsorvido inferior ao PHB contendo as fibras, isto porque as fibras são mais
sensíveis ao vapor de água.

A sorção do vapor de água dependeu do perfil de cisalhamento utilizado, como se pode


observar pelos valores de difusidade (D), presentes na Tabela 3. Para os biocompósitos
elaborados sob condições de baixo cisalhamento, as difusões de vapor de água foram menores
do que quando elaborados sob alto cisalhamento. Também o uso de menores velocidades de
rosca e a adição de compatibilizante influenciaram a difusidade, sendo notável que os materiais
com compatibilizante apresentaram valores menores aos sem compatibilizante. Isto porque, nas
condições de menor velocidade de rosca, o tempo de residência foi maior, possibilitando
melhores processos de compatibilização e, consequentemente, as fibras ficaram mais bem
revestidas na matriz, dificultando a difusão do vapor de água entre o material.

Tabela 3 - Parâmetros de sorção de vapor de água obtidos a


25°C dos biocompósitos PHB/cânhamo, para diferentes
condições de processamento

Figura 9 – Isotérmicas de sorção de vapor de água


dos biocompósitos PHB/cânhamo, para diferentes
condições de processamento

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4.2.2. Biodegradabilidade
Para determinar a biodegradação aeróbia dos biocompósitos realizaram-se testes
respirométicos, em meio de compostagem a 58oC e tendo como material de referência uma
celulose microcristalina em pó. Dos biocompósitos preparados, os estudados foram o PHB-H
LS250 e o PHB-CH HS750.

Analisando a Figura 10, o PHB puro degradou-se mais rapidamente que a celulose e a
adição das fibras de cânhamo ao PHB, resultou numa degradação ainda mais rápida deste
material. Isto revela que, a adição das fibras naturais, melhora a biodegradabilidade do
compósito, porque (fazendo a analogia do PHA, para o PHB) a adição de fibras naturais cria
caminhos adicionais para a entrada de humidade, enzimática e microbiana, levando ao inchaço
da fibra, aumento de danos na interface fibra/matriz e fendas, acelerando ainda mais a
degradação (Ryan et al., 2018). Comparando o PHB-H com o PHB-CH, o PHB-CH degradou-se
mais rapidamente, no entanto não houve uma diferença significativa entre eles e, por isso, pode-
se afirmar que independentemente da composição e das condições de processamento, a
biodegradação dos biocompósitos à base de PHB revelou-se rápida e elevada.

Figura 10 – Padrões de biodegradação de materiais baseados


em PHB em condições de compostagem

5. Aplicações do material
O polihidroxibutirato (PHB) e o cânhamo, possuem propriedades interessantes,
permitindo a sua aplicação em diversos produtos. O PHB pode ser utilizado na fabricação de
embalagens para cosméticos, limpeza, produtos farmacêuticos, higiene, produção de sacos e de
vasilhames para fertilizantes e ainda na produção de materiais que necessitem do processo de
extrusão por sopro, como por exemplo, os sacos de plástico (Ortega Filho, 2003). As fibras de
cânhamo podem ser utilizadas na produção de papel, tecidos, materiais de construção, biodiesel

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e biocombustível, entre outros. A junção destes dois componentes (PHB e cânhamo) resulta na
sua aplicação em embalagens de alimentos, pois a difusidade de vapor de água variou entre 10-
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a 10-12 m2/s, que são valores aceites para vários materiais de embalagens de alimentos.
Também a redução de custos na produção deste biocompósito, como as propriedades
mecânicas e biodegradabilidade obtidas, são pontos vantajosos para a sua aplicação na
fabricação de embalagens de alimentos.

6. Referências bibliográficas
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