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FORMAÇÃO DE PROFESSORES E SUSTENTABILIDADE: UMA ABORDAGEM

DO GOVERNO LULA

Rita de Cássia Falleiro Salgado 1

Sidney Reinaldo da Silva 2

Algunos piensan que la bioética es un genuino producto norteamericano, que solo


tiene aplicación en el contexto de esa sociedad neoliberal, caracterizada por un
desmedido crecimiento económico a expensas del desarrollo humano; que la
exaltación del principio de la autonomía, parte de la propia filosofía neoliberal,
centra su atención en la libertad individual desconociendo los intereses o derechos
sociales en general. Otros dicen que en la bioética se cuestionan problemas que
pueden ser reconocidos como universales. Hay quienes rechazan absolutamente, de
manera ahistórica, la génesis y desarrollo del fenómeno, los más, por el contrario,
afirman que si bien tuvo un marcado localismo al inicio, logró irse extendiendo por
la validación de diferentes enfoques. (CANO, 2008, p. 6)

A sustentabilidade, tal como a bioética, pode ser reduzida a uma manifestação


ideológica seja com sua associação aos interesses liberais bem localizados no atual quadro
mundial de expansão do capitalismo, seja dando a ela uma aura de universalidade e abstração
capaz de apresentar princípios para a ação válidos para todas as épocas e lugares. Contudo,
sua concepção pode ser reelaborada criticamente invertendo-se sua determinação ideológica.
Isso exige repensar suas determinações sociais e histórias a partir de categorias que permitam
abordam suas contradições.
A sustentabilidade tem sido um princípio orientador de práticas empresarias e políticas
públicas, pelo menos ela tem servido para avaliar e julgar tais práticas. Tornou-se um
consenso que os empreendimentos econômicos e sociais precisam ser limitados em nome da
garantia das condições de possibilidade de vida na terra. Dessa forma, a sustentabilidade tem
sido também ensinada na escola a fim de que ela se torne uma prática cotidiana dos
indivíduos, bem como a base para a formação de cidadão capaz de exigi-la e se organizar para
defender o “meio ambiente”.
Contudo há muitas controvérsias em torno do significado da sustentabilidade e da
forma como ela tem sido exigida na atualidade como base para se promover ou restringir
empreendimentos voltados para a ampliação do capital. Na forma de ideologia, ela tende a ser

1
Mestra e doutoranda em Educação - UTP PR; Psicologa; membro do Comitê de Ética em Pesquisa do Grupo
UNINTER e da Sociedade Brasileira de Bioética; Membro do Núcleo de Estudos em Bioética - NEB (Regional
Curitiba); Professora Orientadora e tutora na Área Educacional – Edusol/UNINTER. E-mail:
rcf.salgado@gmail.com
2
Doutor em Filosofia – Universidade Estadual de Campinas. Professor do Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Tuiuti do Paraná. E-mail: sreinald@uol.com.br
incorporada nas práticas cotidianas de pessoas, instituições, empresas, governos e partidos
políticos. A ideologia é aqui compreendida como uma força social organizadora, ou seja,
práxis constituidora de sujeitos portadores de crenças e valores básicos para a reprodução da
ordem social em sua totalidade (SILVA, 2012, p. 49). Dessa forma a concepção oficial ou
dominante de sustentabilidade mascara a percepção das relações de dominação social e de
acesso aos bens e de exposição aos males produzidos pelas sociedades humanas. São tais
relações que definem a forma como o direito a um “meio ambiente ecologicamente
equilibrado” passa a ser não/garantido. Contudo, no campo da educação e das práticas sociais
a luta pela sustentabilidade expressa conflitos ideológicos que vão delineando o contorno da
educação ambiental e de sua relação com a formação para o trabalho e para a cidadania.
Essas considerações acima apontam para a necessidade de se levar em conta os
antagonismos sociais e políticos que envolvem a questão da sustentabilidade na formação
crítica do professor, que, ao lado das questões econômicas (do desenvolvimento e da
exploração da natureza e do trabalho, da produção e consumo), técnicas e científicas,
constituem-se no aspecto mais amplo do conjunto de inquietações sobre as possibilidades de
vida na terra. Nesse sentido, quando se fala em paradigmas, epistemologia, valores e
competências, estão em jogo questões ideológicas, ou seja, hegemônicas, que envolvem
tomadas de posição teórico-práticas. Isso está presente, sobretudo, no âmbito da definição e
justificação das políticas públicas de formação de professores.
Essa investigação refere-se a um projeto de pesquisa sobre a formação profissional no
âmbito dos Institutos Federais, ou seja, a formação no âmbito da licenciatura em áreas que
passaram a ser consideradas estratégicas para a continuidade e o aprimoramento da Educação
Básica no Brasil, tais como, matemática, física, química, biologia. Mostra-se que a
abordagem da “sustentabilidade” demanda uma formação crítica que coloca os alunos das
licenciaturas em contato com abordagens humanísticas, ético-políticas e ideológicas que
exigem formas não preconceituosas e não ingênuas de lidar com questões polêmicas e
radicais. Isso exige a apropriação de um quadro categorial crítico para se abordar questões de
sustentabilidade na formação profissional. Este texto apresenta uma base teórica para se
analisar as políticas de formação de professores referente à questão da sustentabilidade e
examina a tendência ético-política, que prevaleceu na SECAD (Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão) sobre essa temática.

A sustentabilidade como ideologia


Segundo Marx e Engels (2012, p. 47), a revolução contínua das relações sociais de
produção, isto é, dos instrumentos de produção e de suas relações de produção correlatas é
uma condição básica para a existência da burguesia:
a transformação continua da produção, o abalo ininterrupto de todas as condições
sociais, incerteza e movimentos eternos, eis aí as características que distinguem a
época burguesa de todas as demais. Todas as relações sólidas e enferrujadas, com
seu séquito de venerandas e antigas concepções e visões se dissolvem, todas as
novas envelhecem antes mesmo que possam se solidificar. Evapora-se toda
estratificação, todo o estabelecido. Profana-se tudo que é sagrada, e as pessoas se
veem enfim obrigadas a enxergar com olhos sóbrios seu posicionamento na vida e
suas relações umas com as outras (2012, p. 47)

Os autores continuam analisando esse impacto histórico no processo de mundialização


do capitalismo. Destaca-se, sobretudo, para a presente análise, o que foi dito sobre a criação
das forças produtivas numerosas e gigantescas que superaram tudo o que se tinha até então
nesse âmbito. O que foi dito em relação ao século XIX continua sendo válido para o início do
milênio. Sobretudo em relação à subjugação das forças da natureza por meio das novas
técnicas de produção e comunicação. Mas o triunfo do capitalismo é perpassado por
contradições e sua insustentabilidade é inelutável. Como dizem Marx e Engels, “o
desenvolvimento da grande indústria tira da burguesia o próprio chão sobre o qual ela produz
e se apropria dos produtos. O que ela produz, é, sobretudo, o seu próprio coveiro” (2012, p.
58).
Segundo a leitura de Berman (2012), o que se tornou mais detestável no capitalismo
foi a forma como ele submeteu ao valor de troca a dignidade humana, ou seja, ele força as
pessoas a degradação “a fim de que possam sobreviver”. Berman reafirma que o capitalismo
“trocou a exploração envolta em ilusões religiosas e políticas pela exploração pura e simples,
aberta, desavergonhada e direta” (2012, p. 100). Entre a degradação do que se chama pessoa
humana e a degradação da natureza há um vinculo estreito de alienação e reificação. Nesse
sentido o livre desenvolvimento humano torna-se inviável no capitalismo, o que é necessário
levar em conta quando se discute a educação. A formação dos professores deve estar atenta ao
que Berman define como uma condição distorcida do desenvolvimento: “a moderna sociedade
burguesa obriga as pessoas a se desenvolver de acordo com as demandas do mercado: o que
vende é passível de desenvolvimento. O que não vende ou é reprimido ou jamais ganha vida.”
(2012, p. 107).
Berman (2012) lembra que depois da queda do Muro de Berlim, em 1989, foi
revitalizado um Marx não canonizado, nem santo padroeiro do que se fazia em nome do
comunismo. Marx continua sendo então um pensador necessário para se compreender as
contradições do capitalismo (p. 92). O que se toma como base crítica é que não se pode
sustentar como algo necessário, ou seja, inelutável a redução da natureza e de parte da
humanidade a condição de mercadoria. Qualquer proposta de sociedade sustentável que não
combate isso se compromete com a defesa do estado de coisas existente na atualidade e
servirá, sobretudo, como ideologia para justificá-lo. Não se pode, na atualidade, discutir os
limites do desenvolvimento ou do crescimento econômico sem abordar a sua natureza
enquanto expansão do capital, processo de acumulação e de aumento do lucro. Do ponto de
vista emancipatório, a sustentabilidade do sistema não pode ser discutida apenas do ponto de
vista ecológico, mas também ético-político, não meramente enquanto questão de garantia de
vida, mas de vida que se possa desenvolver livremente. O que se está em jogo é a forma do
metabolismo homem natureza que se quer.
Frente a isso, Mézáros (2011) aponta o aspecto ideológico do conceito de
complexidade e o modo como os seus “mercadores” o utilizam para defenderem a
irredutibilidade do livre mercado a qualquer outra forma de gestão do metabolismo sociedade-
natureza. Desse modo, afirma o autor, a uma manobra para ridicularizar os que não aceitam
“de modo realista” uma suposta ausência de “alternativa estrutural à ordem estabelecida”. O
autor aponta para um novo eixo de discussão da sustentabilidade e dos limites de suas práticas
nos marcos da sociedade atual:
Naturalmente, é inconcebível remover toda a complexidade de um modo de controle
sociometabólico que tudo abrange. Porém, não haveria razão para fazê-lo se o
sujeito social que realiza as funções vitais da reprodução societária pudesse
controlar positivamente os processos produtivos e distributivos dos quais dependem
o desenvolvimento e a autorrealização dos indivíduos da sociedade em questão
(MÉZÁROS, 2011, p. 928)

O que foi apontado acima se constitui numa base crítica não só para analisar a
formação dos professores, mas também para orientá-la em termos de como os docentes, ao
trabalharem a questão da “sustentabilidade”, devem situá-la a fim de melhor compreender
seus limites e a quem de fato ela serve, ou seja, a sua manifestação ideológica. Assim a
analise crítica exige abordar como tais discussões já surgiram no âmbito do Clube de Roma e
a forma como neste contexto se aventaram propostas que afetavam a autonomia ou livre
crescimento dos povos que ainda não tinham alcançado o “desenvolvimento” tal como os
países centrais do capitalismo.
Por outro lado, cabe analisar o que se propõe em termos de gerenciamento da
sustentabilidade por partes das empresas no capitalismo. Trata-se mapear um discurso que vai
desde a idéia de que a “responsabilidade social” também pode ser vendida e lucrativa até as
propostas que apelam para os direitos humanos. É ilustrativo o que propõe o Banco do Brasil
a este respeito. Segundo esta instituição financeira, a sustentabilidade significa:
avaliar a performance organizacional não somente com base em indicadores de
natureza econômica, mas complementá-los com outros que avaliem a geração de
valores sociais – como a defesa dos direitos humanos e do trabalho, o bem-estar dos
funcionários, a promoção da diversidade, o respeito às diferenças, a inclusão social e
os investimentos diretos na comunidade –, e a preservação ambiental – como os que
consideram os impactos diretos e indiretos de nossas atividades no ar, na água, na
terra e na biodiversidade. (BANCO DO BRASIL, 2012)

O que o Banco do Brasil propõe é uma tendência de toda a administração pública no


Brasil (BRASIL, 2012). Isso se firmou em normativas como, por exemplo, a Portaria
Interministerial nº 244 de 2012 o PES (Projeto Esplanada Sustentável). Com este documento
procurou-se manter a fidelidade ao princípio constitucional de garantia direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado para todos. Assim o governo reafirma seu compromisso
com a preservação e a defesa do meio ambiente para que as novas gerações atuais e futuras
possam desfrutá-lo adequadamente, ressaltando que é dever do Poder Público defendê-lo e
preservá-lo para todas as gerações de brasileiros.
Cabe lembrar que os compromissos nacionais com a sustentabilidade se afirmam num
determinado momento histórico e que pode significar avanços em termos de emancipação
nacional ou mera adequação a exigências externas. Com o mesmo rigor crítico se deve
analisar o que a UNESCO propõe no âmbito educação quando afirma que “everyone has the
opportunity to benefit from education and learn the values, behaviours and lifestyles required
for a sustainable future and for positive societal transformation.” (UNESCO, 2005). A
questão é a de como compreender tais exigências no contexto atual e a partir de quais
categorias.
Categorias críticas são fundamentais para se atuar no âmbito da formação de
professores, sobretudo, frente a uma temática contraditória como a da “sustentabilidade”, quer
ela se refira ao crescimento, ao desenvolvimento, à política, à gestão ou a própria sociedade.
A forma crítica como as questões são colocadas e analisadas e resolvidas depende das
categorias mobilizadas, o que se repercute também no âmbito da formação.
As categorias dizem respeito também à identificação dos sujeitos da
“sustentabilidade”. Falar em sociedade que se responsabiliza pela sustentabilidade é abstração
que nada diz. A sociedade é divida em classes e a própria sociedade civil é um mosaico de
configurações as mais diversas. Cabe lembrar, o que diz Frigotto (2009) a respeito da “elite”
brasileira, responsável maior pela condução da economia e política nacional, na atual forma
de governo que se tem no Brasil, assim como em épocas anteriores. Segundo o autor,
A classe burguesa brasileira, de cultura e mentalidade escravocrata e colonizadora, e
historicamente associada e subordinada à classe burguesa dos centros hegemônicos
do capitalismo, impediu, mediante ditaduras e golpes, reformas e programas
impostos pelo alto a construção de um projeto nacional de desenvolvimento,
mediante reformas estruturais que permitissem reduzir a desigualdade social e, num
horizonte mais profundo, a busca da superação dessa desigualdade mediante
rupturas das relações sociais capitalistas. (FRIGOTTO, 2009, p. 73)

Com isso, temos que a forma hegemônica que suplantou as demais tendências ético-
políticas no Brasil esteve comprometida com o “capitalismo central”. Frigotto reafirma a
importância de categorias como “nacional reformismo”, “dependência’ e “desigualdade”
como prioritárias para uma análise crítica da sustentabilidade e que vale também para se
propor uma formação de professores comprometida com a transformações das relações sociais
globais, nacionais e locais que geram economias insustentáveis, sobretudo quando se pensa
em equalizar o acesso à produção e ao consumo, destacadamente aos benefícios por elas
gerados e não apenas aos seus riscos, que parecem ser cada vez mais democratizados. Frigotto
fala em um “projeto popular democrático e de massa sustentável” perante o qual, afirma o
autor relembrando Hobsbawm, mobilizar-se-iam forças e recursos não para “funcionar por
meio do mercado, mas operar contra ele” (2009, p. 79).
Boito Jr. (2011) mostra a importância da “teoria da dependência”, da “luta de classes”
e do “imperialismo” para se compreender a realidade atual, sobretudo para se analisar a forma
como o capitalismo brasileiro e o latino-americano se inserem na economia mundial. Nesse
sentido, aponta o autor que o governo Lula no máximo teria desacelerado processo de
subordinação nacional, tornando-se até necessário para mantê-lo ao longo prazo, sobretudo
quando os governos populares são mais eficazes para implantar medidas nada populares. Eis o
que teria promovido o governo lula, segundo Boito Jr.:
O governo Lula, ao promover a ascensão da grande burguesia interna e ampliar
significativamente a política social voltada para a população que se localiza na faixa
de renda mais baixa promoveu, com essas mudanças, apenas uma reforma do
modelo liberal. (2011, p. 137).

Essa política foi de qualquer forma a vitrine do governo Lula. Contudo, em relação ao
que não foi evidenciado, o que não ficou exposto aos olhos, no caso das políticas de combate
a insustentabilidade do capitalismo, até que ponto se pode falar de avanço? Segundo Lisboa
(2011) a expectativa de que o governo Lula seria um marco na história ambiental do Brasil
não durou muito. Depois de fazer um balanço dos oito anos do governo Lula em torno dos
eixos ambientais, a autora destaca o seguinte ponto:
Tributários de uma mesma visão desenvolvimentista e premidos pelos mesmos
grupos de interesse internos e forças econômicas externas, certamente um governo
da oposição peessedebista não teria feito coisa muito diferente nesses últimos 8
anos. Assim, se houve um mérito na desastrosa política ambiental do governo Lula
foi o de provocar, com os seus desacertos, a emergência e fortalecimento de uma
visão alternativa sobre o que se poderia considerar como desenvolvimento
sustentável, manifesta fundamentalmente no crescimento dos movimentos de justiça
ambiental por todo o país, que certamente apostam em um outro tipo de futuro.
(LISBOA, 2011, p. 31)

Frente a essas considerações críticas é que a política de educação ambiental e o modo


como a formação do professor para as questões de “sustentabilidade” devem ser analisadas e
avaliadas ético-politicamente. Não se trata de uma avaliação para ver até que ponto as metas
e objetivos de tais políticas foram atingidos, mas sim para “apreciar” a quem ela serviu de
fato, sobretudo mostrando seus pressupostos conceituais e ao que ela efetivamente se propôs.
Assim, não se pode pensar a formação de professores para atuar com questões ligadas
à “sustentabilidade” sem situar tal formação no âmbito de uma sociedade marcada pela
ideologia da avaliação do rendimento como critério meritocrático de “premiação” e
bonificação. A isso se ligam práticas aligeiradas, precárias, de baixo custo, segundo as quais
vale mais, vende mais, a certificação conforme procedimentos flexíveis o aligeirados de
formação inicial e continuada. A este respeito afirma Freitas
A construção de novos processos formativos, que respondam às exigências e
necessidades sociais na atualidade, se situa no campo das contradições e das lutas
pelo anúncio de uma outra sociedade, justa e igualitária, de progresso e
emancipação. É o que nos move nestas circunstâncias. (FREITAS, 2007, p. 1225)

Sem levar isso em conta, estar-se-á formando professores alienados, comprometidos


com uma compreensão e um projeto de sustentabilidade que não leva em conta as
contradições das sociedades capitalistas e a forma como as empresas e os governos só se
envolvem com a “sustentabilidade” na medida em que esta gera dividendos políticos, lucro e
não compromete o processo global de acumulação de capital.

A formação dos professores nos marcos do governo Lula

Com o governo Lula (2003-2010), a indução e o fomento para a educação inicial e


continuada de professores para a Educação Básica querem presencial e ou à distância, passou
a ser capitaneada em boa medida pela CAPES (Coordenadoria de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior. Com a Lei 11.502/2007, foi criada a Nova Capes e com o Decreto
nº 6755, de 29 de janeiro de 2009, a missão da CAPES em relação à Educação básica se
consolidou, sendo instituída a Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério
da Educação Básica. Além do mais, foram criadas a Diretoria de Educação Básica Presencial
(DEB) e a Diretoria de Educação a Distância (DED). Em 28 de maio de 2009, o Plano
Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica tornou-se um novo marco para as
políticas de formação de professores centrada na CAPES. Esse plano focou, sobretudo, os
professores que atuavam na Educação Básica sem a formação adequada, cerca de mais de
330.000 docentes (BRASIL, 2013a). Essa nova política centrou-se especialmente na forma de
programas que visavam “estimular experiências inovadoras e o uso de recursos e tecnologias
de comunicação e informação nas modalidades de educação presencial e a distância”.
(BRASIL, 2013a)
Destaca-se no âmbito da formação de professores e pesquisadores o Prêmio Vale-
Capes, promovido pelo CAPES e a Vale. Este prêmio voltado para a valorização da ciência e
da sustentabilidade premia teses de doutorado e dissertações de mestrado capazes de
contribuir com “idéias, soluções e processos inovadores para questões como redução do
consumo de água e energia, redução de gases do efeito estufa (GEE), aproveitamento,
reaproveitamento e reciclagem de resíduos e/ou rejeitos e tecnologia socioambiental com
ênfase no combate à pobreza” (BRASIL, 2013c). Essa parceria entre a CAPES e a Vale foi
firmada durante a Rio+20, mostrando a abertura do governo para agir em sintonia com as
empresas.
Com o PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação), iniciado em 2007, o governo
lula buscou articular os estados e municípios numa política de colaboração entre os entes
federados nacionais para promover a formação considerada adequada para os professores da
educação básica. Assim foi criado o PAR (Planos de Ações Articuladas) como uma estratégia
de criar “arranjos educacionais”, envolvendo estados, municípios e instituições públicas que
formassem licenciados, como, por exemplo, os Institutos Federais, que então estavam sendo
criados para atuarem em todo o território nacional conforme ficou definido pela LEI Nº
11.892, de 29 de dezembro de 2008, que instituiu a Rede Federal de Educação Profissional,
Científica e Tecnológica e criou os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia.
Em 2009, O Ministério da Educação lançou o PARFOR (Plano Nacional de Formação
dos Professores da Educação Básica). Assim passou-se a atender, no âmbito da formação, os
professores que ainda não tinham formação superior, os professores que já tinham uma
primeira licenciatura, mas que atuavam e uma área diferente de sua formação inicial, e
bacharéis sem licenciatura a quem passaram a ser oferecidos estudos complementares que os
habilitassem ao exercício do magistério. (BRASIL, 2013a)
As universidades tradicionais formadoras da licenciatura foram também mobilizadas
para atuar como parceiras das referidas políticas públicas de formação de professores. A elas
foi solicitada a produção de materiais destinados aos professores em exercício, bem como
para a formação inicial e continuada dos docentes da Educação Básica. Com isso, se
intensificou o “conflito entre os saberes científicos e suas formas de divulgação e o desafio de
construção do discurso de formação” (LÚCIO, 2011). Esse conflito tem raízes profundas na
historia brasileira e reflete contradições sociais persistentes.

Educação e sustentabilidade

A base dos planos e programas de formação de professores no Brasil na era Lula não
rompeu ideologicamente com a forma irresponsável de gestão do metabolismo da sociedade
com a natureza tal como ocorre no capitalismo. Isso pode ser verificado na concepção, nos
planos e programas proposto pelo governo em questão. Nesse sentido é que se buscou
incorporar o que a UNESCO definiu como formação para a sustentabilidade, ou seja, uma
educação “that allows learners to acquire the skills, capacities, values and knowledge
required to ensure sustainable development” (UNESCO, 2013). Malgrado a polêmica em
torno do “desenvolvimento” sustentável, essa definição de educação como desenvolvimento
de habilidades, capacidades e valores foi associada à formação por “empoderamento”, no
sentido de tornar indivíduos e coletividades capazes de atuar localmente de maneira eficaz
para promover a sustentabilidade.
Desde a Rio 92, os governos brasileiros se comprometeram em complementar e
envolver-se com a legislação e as políticas destinadas a Educação Ambiental. Assim passou-
se a tomar como referencia do nível do comprometimento o que se definiu na Carta Brasileira
para Educação Ambiental, em especial o que nela ficou definido como a melhor forma de
viabilizar a sustentabilidade. Mas essa carta definiu exigências que poderiam suportar outras
políticas preteridas pelos governos brasileiros, sobretudo aquelas mais radicais de
enfrentamento da questão da sustentabilidade, especialmente quando se diz que
No momento em que se discute o desenvolvimento sustentável como estratégia de
sobrevivência do planeta e, consequentemente, da melhoria da qualidade de vida,
fica definido ser a Educação um dos aspectos mais importantes para a mudança
pretendida. A lentidão da produção de conhecimentos, a importação de tecnologias
inadequadas, a formulação de políticas de desenvolvimento cada vez mais
descomprometidas com a soberania nacional, consolidam um modelo educacional
que não responde às necessidades do país. (BRASIL, 1992)

Mas contar com a educação como ponto central para combater a insustentabilidade é
exigir muito mais do que ele pode. Essa ilusão não foi devidamente questionada no âmbito
das justificativas da política de formação de professores para a sustentabilidade. Pelo menos
isso não esteve presente no discurso da SECAD. A partir desta secretária do MEC, foram
implementadas, conjuntamente com outras pastas governamentais, ações de educação
ambiental e de formação para a sustentabilidade.
No discurso da SECAD, passou-se a falar em “vítimas da injustiça ambiental” como
uma expressão para se referir aos que mais diretamente sofrem com os danos ecológicos e os
que não têm vez nem voz perante as questões de sustentabilidade. Reafirmou-se então que a
educação ambiental não é neutra, mas ideológica, sendo portanto um “ato político, baseado
em valores para a transformação social”. (BRASIL, 2007, p. 18). Dai que se entendeu a
educação ambiental como um momento que deve ser superado; “o desafio da Educação
Ambiental” é “transmutar-se gradualmente em uma Educação política, até desaparecer a
necessidade de se adjetivar a Educação de ‘ambiental’” (Idem). Mas a força dessas expressões
se perdeu com a tendência conciliatória dada à educação ambiental.
A Política Nacional de Educação Ambiental capitaneada pela SECAD, iniciada em
2004, organizou-se em quatro eixos de ação estruturantes conforme o Programa Vamos
Cuidar do Brasil com as Escolas, os seja: a) Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio
Ambiente, b) Formação Continuada de Professores e Estudantes, c) Inclusão Digital com
Ciência de Pés no Chão, d) Ações Estruturantes – Com-vidas, Coletivo Jovens e Educação de
Chico Mendes. Trata-se de uma proposta de uma educação permanente envolvendo
Secretarias de Educação estaduais e municipais com escolas, universidades e a “sociedade
civil”. Para isso, lançou-se mão tanto da educação presencial quanto da educação à distância.
(BRASIL, 2007, p. 33) A base pedagógica assumida pela SECAD foi a freiriana, o que define
os marcos ideológicos (do diálogo e não do confronto direto, supostamente sectário) e o tipo
de enfrentamento da questão da sustentabilidade proposto:
Partindo da concepção freireana de Círculos de Cultura, esse sistema se fortalece na
medida em que estimula o diálogo da escola com a comunidade e movimentos
sociais por meio de um trabalho articulado de Secretarias de Educação, ONGs e
Coletivos Jovens. Todas essas dimensões são atualizadas com conteúdos ligados às
questões socioambientais relevantes e atuais, globais e locais, que propõem uma
reorientação dos estilos de vida coletivos e individuais na perspectiva de uma ética
de solidariedade, cooperação, democracia, justiça socioambiental, liberdade e
sustentabilidade. (BRASIL, 2007, p. 34)

O método de trabalho baseado na construção dialógica visou proporcionar


“transformações empoderadoras dos indivíduos e grupos”, o que ocorreria na medida em que
os temas geradores fossem trabalhados num envolvimento na forma de pesquisa-ação. Com
isso buscou-se oferecer “repertório, espaços estruturantes, orientação prática e sistematizada
para facilitar sua adequação criativa a cada realidade local.” (BRASIL, 2007, p. 36). A base
epistemológica foi dada pela abordagem a partir do que Morin denominou “conhecimento
pertinente”, como uma forma de inserir conhecimentos locais e parciais abordando problemas
mais globais e fundamentais (idem). Retomando Morin, afirma-se que
neste saber, tem-se implícita a busca de um conhecimento complexo, não
fragmentário, porém incremental. O conhecimento pertinente reconhece que, em
meio à complexidade do real, não é possível nunca a compreensão total. É por isso,
também, que a busca do conhecimento torna-se um esforço infinito, mas que pode se
tornar um círculo virtuoso (BRASIL, 2007, p. 37).

A base ético-política do programa é conciliatória, ou seja, evita radicalismo tomadas


de posição supostamente utópicas. Neste caso, a ética da responsabilidade de Jonas também é
apresentada como um referencial para se lidar com a sustentabilidade e para formar
professores para trabalhá-la como um tema transversal.

Considerações finais

As políticas de formação de professores para a “sustentabilidade” na era Lula foram


coerentes com a forma como tal governo buscou construir a seu modo a conciliação de
interesses como uma maneira de não se lidar com contradições mais profundas que dividem o
país. A própria criação da SECAD expressa essa tendência. O seu documento Educação
Ambiental: aprendizes de sustentabilidade é muito revelador a este respeito. As críticas
marxistas a tal programa são necessárias devido ao tipo de esperança que inicialmente
cimentou o Partido dos Trabalhadores e a ascensão de Lula ao poder. Trata-se de uma crítica
imanente, o que seria diferente no caso de uma análise do governo FHC.
Contudo, o debate em torno da formação de professores para a “sustentabilidade” é
aberto e seus princípios podem ser reinterpretados nos mais diversos âmbitos dessa formação.
Cabe lembrar que as políticas, os planos e projetos educacionais são resultados de disputas e
enquanto tais podem ser dis/torcidos para os mais diversos lados. Cabe, sobretudo, aos
professores que atuam na licenciatura, bem como dos que atuam nos programas de formação
continuada de professores, o esforço de pensar o que fazem e a que estão dispostos em termos
de engajamento e enfrentamento dos problemas relacionados com a “sustentabilidade”. Como
a própria SECAD assumiu, frente a isso não há neutralidade. De qualquer forma, a luta e a
formação para uma sociedade “sustentável” econômica, ambiental, política e eticamente não
pode deixar de exigir a constituição de “uma associação na qual o livre desenvolvimento de
cada um é a condição para o livre desenvolvimento de todos” (MARX; ENGELS, 2012, p.
69)

Referências
BANCO DO BRASIL. Sustentabilidade. Disponível em:
http://www.bb.com.br/portalbb/page4,8305,3912,0,0,1,6.bb?
codigoNoticia=28458&codigoMenu=15217 . Acessado em 11/03/2013.

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Rio de Janeira, MEC (mimeo), 1992.
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BRASIL. CAPES: História e missão. Disponível em: http://www.capes.gov.br/sobre-a-
capes/historia-e-missao. Acessado em: 12/03/2013 a.
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http://www.capes.gov.br/bolsas/premios/premio-vale-capes-de-ciencia-e-sustentabilidade.
Acessado em 2013c.

BRASIL. Portaria Interministerial Nº 244, de 6 de junho de 2012. Brasília/DF: MPOG,


2012. Disponível em:
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