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DO GOVERNO LULA
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Mestra e doutoranda em Educação - UTP PR; Psicologa; membro do Comitê de Ética em Pesquisa do Grupo
UNINTER e da Sociedade Brasileira de Bioética; Membro do Núcleo de Estudos em Bioética - NEB (Regional
Curitiba); Professora Orientadora e tutora na Área Educacional – Edusol/UNINTER. E-mail:
rcf.salgado@gmail.com
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Doutor em Filosofia – Universidade Estadual de Campinas. Professor do Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Tuiuti do Paraná. E-mail: sreinald@uol.com.br
incorporada nas práticas cotidianas de pessoas, instituições, empresas, governos e partidos
políticos. A ideologia é aqui compreendida como uma força social organizadora, ou seja,
práxis constituidora de sujeitos portadores de crenças e valores básicos para a reprodução da
ordem social em sua totalidade (SILVA, 2012, p. 49). Dessa forma a concepção oficial ou
dominante de sustentabilidade mascara a percepção das relações de dominação social e de
acesso aos bens e de exposição aos males produzidos pelas sociedades humanas. São tais
relações que definem a forma como o direito a um “meio ambiente ecologicamente
equilibrado” passa a ser não/garantido. Contudo, no campo da educação e das práticas sociais
a luta pela sustentabilidade expressa conflitos ideológicos que vão delineando o contorno da
educação ambiental e de sua relação com a formação para o trabalho e para a cidadania.
Essas considerações acima apontam para a necessidade de se levar em conta os
antagonismos sociais e políticos que envolvem a questão da sustentabilidade na formação
crítica do professor, que, ao lado das questões econômicas (do desenvolvimento e da
exploração da natureza e do trabalho, da produção e consumo), técnicas e científicas,
constituem-se no aspecto mais amplo do conjunto de inquietações sobre as possibilidades de
vida na terra. Nesse sentido, quando se fala em paradigmas, epistemologia, valores e
competências, estão em jogo questões ideológicas, ou seja, hegemônicas, que envolvem
tomadas de posição teórico-práticas. Isso está presente, sobretudo, no âmbito da definição e
justificação das políticas públicas de formação de professores.
Essa investigação refere-se a um projeto de pesquisa sobre a formação profissional no
âmbito dos Institutos Federais, ou seja, a formação no âmbito da licenciatura em áreas que
passaram a ser consideradas estratégicas para a continuidade e o aprimoramento da Educação
Básica no Brasil, tais como, matemática, física, química, biologia. Mostra-se que a
abordagem da “sustentabilidade” demanda uma formação crítica que coloca os alunos das
licenciaturas em contato com abordagens humanísticas, ético-políticas e ideológicas que
exigem formas não preconceituosas e não ingênuas de lidar com questões polêmicas e
radicais. Isso exige a apropriação de um quadro categorial crítico para se abordar questões de
sustentabilidade na formação profissional. Este texto apresenta uma base teórica para se
analisar as políticas de formação de professores referente à questão da sustentabilidade e
examina a tendência ético-política, que prevaleceu na SECAD (Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão) sobre essa temática.
O que foi apontado acima se constitui numa base crítica não só para analisar a
formação dos professores, mas também para orientá-la em termos de como os docentes, ao
trabalharem a questão da “sustentabilidade”, devem situá-la a fim de melhor compreender
seus limites e a quem de fato ela serve, ou seja, a sua manifestação ideológica. Assim a
analise crítica exige abordar como tais discussões já surgiram no âmbito do Clube de Roma e
a forma como neste contexto se aventaram propostas que afetavam a autonomia ou livre
crescimento dos povos que ainda não tinham alcançado o “desenvolvimento” tal como os
países centrais do capitalismo.
Por outro lado, cabe analisar o que se propõe em termos de gerenciamento da
sustentabilidade por partes das empresas no capitalismo. Trata-se mapear um discurso que vai
desde a idéia de que a “responsabilidade social” também pode ser vendida e lucrativa até as
propostas que apelam para os direitos humanos. É ilustrativo o que propõe o Banco do Brasil
a este respeito. Segundo esta instituição financeira, a sustentabilidade significa:
avaliar a performance organizacional não somente com base em indicadores de
natureza econômica, mas complementá-los com outros que avaliem a geração de
valores sociais – como a defesa dos direitos humanos e do trabalho, o bem-estar dos
funcionários, a promoção da diversidade, o respeito às diferenças, a inclusão social e
os investimentos diretos na comunidade –, e a preservação ambiental – como os que
consideram os impactos diretos e indiretos de nossas atividades no ar, na água, na
terra e na biodiversidade. (BANCO DO BRASIL, 2012)
Com isso, temos que a forma hegemônica que suplantou as demais tendências ético-
políticas no Brasil esteve comprometida com o “capitalismo central”. Frigotto reafirma a
importância de categorias como “nacional reformismo”, “dependência’ e “desigualdade”
como prioritárias para uma análise crítica da sustentabilidade e que vale também para se
propor uma formação de professores comprometida com a transformações das relações sociais
globais, nacionais e locais que geram economias insustentáveis, sobretudo quando se pensa
em equalizar o acesso à produção e ao consumo, destacadamente aos benefícios por elas
gerados e não apenas aos seus riscos, que parecem ser cada vez mais democratizados. Frigotto
fala em um “projeto popular democrático e de massa sustentável” perante o qual, afirma o
autor relembrando Hobsbawm, mobilizar-se-iam forças e recursos não para “funcionar por
meio do mercado, mas operar contra ele” (2009, p. 79).
Boito Jr. (2011) mostra a importância da “teoria da dependência”, da “luta de classes”
e do “imperialismo” para se compreender a realidade atual, sobretudo para se analisar a forma
como o capitalismo brasileiro e o latino-americano se inserem na economia mundial. Nesse
sentido, aponta o autor que o governo Lula no máximo teria desacelerado processo de
subordinação nacional, tornando-se até necessário para mantê-lo ao longo prazo, sobretudo
quando os governos populares são mais eficazes para implantar medidas nada populares. Eis o
que teria promovido o governo lula, segundo Boito Jr.:
O governo Lula, ao promover a ascensão da grande burguesia interna e ampliar
significativamente a política social voltada para a população que se localiza na faixa
de renda mais baixa promoveu, com essas mudanças, apenas uma reforma do
modelo liberal. (2011, p. 137).
Essa política foi de qualquer forma a vitrine do governo Lula. Contudo, em relação ao
que não foi evidenciado, o que não ficou exposto aos olhos, no caso das políticas de combate
a insustentabilidade do capitalismo, até que ponto se pode falar de avanço? Segundo Lisboa
(2011) a expectativa de que o governo Lula seria um marco na história ambiental do Brasil
não durou muito. Depois de fazer um balanço dos oito anos do governo Lula em torno dos
eixos ambientais, a autora destaca o seguinte ponto:
Tributários de uma mesma visão desenvolvimentista e premidos pelos mesmos
grupos de interesse internos e forças econômicas externas, certamente um governo
da oposição peessedebista não teria feito coisa muito diferente nesses últimos 8
anos. Assim, se houve um mérito na desastrosa política ambiental do governo Lula
foi o de provocar, com os seus desacertos, a emergência e fortalecimento de uma
visão alternativa sobre o que se poderia considerar como desenvolvimento
sustentável, manifesta fundamentalmente no crescimento dos movimentos de justiça
ambiental por todo o país, que certamente apostam em um outro tipo de futuro.
(LISBOA, 2011, p. 31)
Educação e sustentabilidade
A base dos planos e programas de formação de professores no Brasil na era Lula não
rompeu ideologicamente com a forma irresponsável de gestão do metabolismo da sociedade
com a natureza tal como ocorre no capitalismo. Isso pode ser verificado na concepção, nos
planos e programas proposto pelo governo em questão. Nesse sentido é que se buscou
incorporar o que a UNESCO definiu como formação para a sustentabilidade, ou seja, uma
educação “that allows learners to acquire the skills, capacities, values and knowledge
required to ensure sustainable development” (UNESCO, 2013). Malgrado a polêmica em
torno do “desenvolvimento” sustentável, essa definição de educação como desenvolvimento
de habilidades, capacidades e valores foi associada à formação por “empoderamento”, no
sentido de tornar indivíduos e coletividades capazes de atuar localmente de maneira eficaz
para promover a sustentabilidade.
Desde a Rio 92, os governos brasileiros se comprometeram em complementar e
envolver-se com a legislação e as políticas destinadas a Educação Ambiental. Assim passou-
se a tomar como referencia do nível do comprometimento o que se definiu na Carta Brasileira
para Educação Ambiental, em especial o que nela ficou definido como a melhor forma de
viabilizar a sustentabilidade. Mas essa carta definiu exigências que poderiam suportar outras
políticas preteridas pelos governos brasileiros, sobretudo aquelas mais radicais de
enfrentamento da questão da sustentabilidade, especialmente quando se diz que
No momento em que se discute o desenvolvimento sustentável como estratégia de
sobrevivência do planeta e, consequentemente, da melhoria da qualidade de vida,
fica definido ser a Educação um dos aspectos mais importantes para a mudança
pretendida. A lentidão da produção de conhecimentos, a importação de tecnologias
inadequadas, a formulação de políticas de desenvolvimento cada vez mais
descomprometidas com a soberania nacional, consolidam um modelo educacional
que não responde às necessidades do país. (BRASIL, 1992)
Mas contar com a educação como ponto central para combater a insustentabilidade é
exigir muito mais do que ele pode. Essa ilusão não foi devidamente questionada no âmbito
das justificativas da política de formação de professores para a sustentabilidade. Pelo menos
isso não esteve presente no discurso da SECAD. A partir desta secretária do MEC, foram
implementadas, conjuntamente com outras pastas governamentais, ações de educação
ambiental e de formação para a sustentabilidade.
No discurso da SECAD, passou-se a falar em “vítimas da injustiça ambiental” como
uma expressão para se referir aos que mais diretamente sofrem com os danos ecológicos e os
que não têm vez nem voz perante as questões de sustentabilidade. Reafirmou-se então que a
educação ambiental não é neutra, mas ideológica, sendo portanto um “ato político, baseado
em valores para a transformação social”. (BRASIL, 2007, p. 18). Dai que se entendeu a
educação ambiental como um momento que deve ser superado; “o desafio da Educação
Ambiental” é “transmutar-se gradualmente em uma Educação política, até desaparecer a
necessidade de se adjetivar a Educação de ‘ambiental’” (Idem). Mas a força dessas expressões
se perdeu com a tendência conciliatória dada à educação ambiental.
A Política Nacional de Educação Ambiental capitaneada pela SECAD, iniciada em
2004, organizou-se em quatro eixos de ação estruturantes conforme o Programa Vamos
Cuidar do Brasil com as Escolas, os seja: a) Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio
Ambiente, b) Formação Continuada de Professores e Estudantes, c) Inclusão Digital com
Ciência de Pés no Chão, d) Ações Estruturantes – Com-vidas, Coletivo Jovens e Educação de
Chico Mendes. Trata-se de uma proposta de uma educação permanente envolvendo
Secretarias de Educação estaduais e municipais com escolas, universidades e a “sociedade
civil”. Para isso, lançou-se mão tanto da educação presencial quanto da educação à distância.
(BRASIL, 2007, p. 33) A base pedagógica assumida pela SECAD foi a freiriana, o que define
os marcos ideológicos (do diálogo e não do confronto direto, supostamente sectário) e o tipo
de enfrentamento da questão da sustentabilidade proposto:
Partindo da concepção freireana de Círculos de Cultura, esse sistema se fortalece na
medida em que estimula o diálogo da escola com a comunidade e movimentos
sociais por meio de um trabalho articulado de Secretarias de Educação, ONGs e
Coletivos Jovens. Todas essas dimensões são atualizadas com conteúdos ligados às
questões socioambientais relevantes e atuais, globais e locais, que propõem uma
reorientação dos estilos de vida coletivos e individuais na perspectiva de uma ética
de solidariedade, cooperação, democracia, justiça socioambiental, liberdade e
sustentabilidade. (BRASIL, 2007, p. 34)
Considerações finais
Referências
BANCO DO BRASIL. Sustentabilidade. Disponível em:
http://www.bb.com.br/portalbb/page4,8305,3912,0,0,1,6.bb?
codigoNoticia=28458&codigoMenu=15217 . Acessado em 11/03/2013.
MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Pequin Classics,
2012.
MÉZÀROS, I. Para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2011.
SILVA. Estado, Educação e equidade no Brasil. A formação gerenciada da cidadania.
Campinas: Mercado das Letras, 2012.
UNESCO Education for Sustainable Development. Paris: UNESCO, 2005.