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A HISTÓRIA DE MARTINHO LUTERO

E A JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ

Eu fora tomado por uma extraordinária paixão em conhecer a Paulo na


Epístola aos Romanos. Fazia-me tropeçar não a firmeza de coração, mas
uma única palavra no primeiro capítulo: “A justiça de Deus é nele [no
Evangelho] revelada” (Rm 1.17). Isso porque eu odiava esta expressão
“justiça de Deus”, pois o uso e o costume de todos os professores me
havia ensinado a entendê-la filosoficamente como justiça formal ou ativa
(como a chamam), segundo a qual Deus é justo e castiga os pecadores e
injustos. Eu não amava o Deus justo, que pune os pecadores; ao contrário,
eu o odiava. […] Aí Deus teve pena de mim. Dia e noite eu andava
meditando, até que, por fim, observei a relação entre as palavras: “A justiça
de Deus é nele revelada, como está escrito: o justo vive de fé”. Aí passei a
compreender a justiça de Deus como sendo uma justiça pela qual o justo
vive através da dádiva de Deus, ou seja, da fé. Comecei a entender que o
sentido é o seguinte: Através do evangelho é revelada a justiça de Deus,
isto é, a passiva, através da qual o Deus misericordioso nos justifica pela
fé, como está escrito: “O justo vive por fé”. Então me senti como que
renascido, e entrei pelos portões abertos do próprio paraíso.

I. As Raízes da Reforma

a. A frase em latim post tenebras, lux (“após trevas, luz”) resume o mote da Reforma do
século 16. Essas “trevas” referem-se ao entendimento do cristianismo bíblico pela igreja,
que se desenvolveu gradualmente durante a idade das trevas ao longo da era Medieval
até o tempo da Reforma.

b. A teologia do sacerdotalismo dominava a igreja. O sacerdotalismo propõe que


a salvação ocorre principalmente por meio das ministrações da igreja, através do
sacerdórcio, e particularmente através da administração dos sacramentos.

c. Os Reformadores responderam a esse sistema da maneira mais enfática no século


16. Todavia, eles não viram sua reação como revolucionária, mas como uma obra de
reforma, chamando a igreja de volta às formas e teologia original da igreja apostólica.

II. As Raízes de Martinho Lutero

a. Lutero nasceu em 1483, na cidade de Eisleben (Alemanha), sendo seus pais antigos
camponeses: Hans e Magarethe. A natureza industriosa de Hans levou a família da
pobreza à riqueza, e ele desejou que seu filho, Martinho, se tornar-se um advogado
proeminente e rico.
b. Desde sua juventude, Lutero demonstrou uma aptidão por aprendizado, e
recebeu o grau de Mestre em Artes na Universidade de Erfurt e entrou no
programa de Direito na mesma universidade. Sua educação clássica (na qual
aprendeu Latim) bem como seus estudos legais o assistiriam poderosamente
pelo restante de sua vida.

c. Em julho de 1505, um raio quase atingiu Lutero quando ele voltava da


universidade para casa. Ele gritou: “Salve-me, Santa Ana; e eu me tornaria um
monge”. Interpretando essa crise como um sinal de Deus e desejando honrar o
seu voto, Lutero encontrou no monastério agostiniano local, que era muito
rigoroso, para extremo desgosto do seu pai.

d. Lutero comprometeu-se completamente aos seus deveres monásticos, procurando


ganhar acesso ao céu sendo um monge correto e rígido. Todavia, a despeito do
exercício perpétuo de disciplinas espirituais, Lutero não podia apaziguar a culpa
que experimentava constantemente. Sua mente legal aplicava os mandamentos
de Deus meticulosamente a si mesmo, e ele alegava pelo perdão real e duradouro
para o seu pecado sempre presente. O monastério não poderia oferecer nada
para aliviar a sua consciência.

O CONCEITO DE JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ

Lutero desenvolveu a Doutrina a partir deste único centro. Neste artigo


Lutero afirma a graça do nosso Deus misericordioso que vem ao nosso
encontro. É um artigo teológico que fala de Deus e de como este Deus nos
justifica e nos presenteia com a fé. Não se trata, pois, de um entre outros
artigos, mas do artigo central que perpassa todos os outros4.
Lutero usa o termo iustificare como o-ser-declarado-justo do ser humano
por Deus. Não que a pessoa seja justa, mas está no movimento e no
processo em direção à justiça, para então ser justificada plenamente. Na
Ressurreição a justificação alcança a perfeição5.
Para definirmos a Justificação por Graça e Fé é preciso partir da visão de Deus
em Lutero. É um só Deus, que ao mesmo tempo se revelou e permanece um
mistério. Lutero fala de Deus no binômio graça e ira. Quando Lutero fala da
Justificação por Graça. Deus em sua graça nos dá a fé. Da graça de Deus vem
a fé! Lutero fala da fé como uma dádiva, um presente. A este nível Lutero
não contrapõe fé e boas obras, mas fé e incredulidade.
A fé vem da graça de Deus e é fundamentalmente a confiança nesta graça
divina que nos justifica, apesar da situação do pecado (radical).
A mudança fundamental no relacionamento do ser humano com relação a
Deus, que Lutero chama de justificação, não acontece no sentido de que o
ser humano se torne algo que ele não é, mas somente no sentido de que
ele reconheça como verdade o que é (pecador) e o que não é (justo) e assim
dê a honra a Deus.7
Lutero contrapõe a uma compreensão radical de pecado uma com-preensão
radical de justificação. O NT e Lutero têm plena consciência de que o conceito
justificação se situa na terminologia judicial. Só que, ao contrário da justificação
no direito penal como processo de livrar-se da culpa comprovando a inocência e
a conseqüente não-penalização, trata-se justamente do reconhecimento da
culpa8.
O pecado tem um caráter universal e absoluto, caso contrário Cristo, assim
Lutero, teria morrido desnecessariamente. A humanidade não está mais
livre como no estado original, mas sob o domínio do pecado. A liberdade
depois da Queda não é mais liberdade. Como diz de forma contundente na
tese 13 da Disputação de Heidelberg, os seres humanos somente têm
liberdade para pecar:
Não podemos dizer que Lutero tinha uma antropologia e uma conseqüente
sociologia negativas a partir do seu conceito de pecado. Não podemos perder
de vista a distinção que Lutero faz entre o relacionamento com Deus (coram deo)
e o relacionamento com a sociedade (coram mundo). Com a Queda, a
humanidade perdeu a similitudo (ou imago) privata. Com a Queda, porém,
a humanidade conservou ainda a similitudo publica que se manifesta
principalmente através da consciência na creaturalidade. Por isto o ser
humano é capaz de ter grandes virtudes e, como pessoa, agir com
benevolência, mesmo que não tenha fé. Trata-se aqui do bem a partir da
perspectiva da sociedade. Não se trata, porém, ainda do relacionamento
com Deus.
A partir da sociedade o bem e mal são o critério de atuação. A partir da pessoa,
porém, não é o bem e o mal que são o critério, mas a fé. As boas obras podem
ser realizadas tanto por cristãos como por não-cristãos. Por isto as obras têm o
seu lugar no relacionamento com o próximo, na sociedade e nas suas
instituições políticas.
Resumindo, da perspectiva do relacionamento com Deus, a fé é o critério.
Da perspectiva do relacionamento com o próximo, a eficiência das obras é
o critério. O bem-estar do próximo se torna critério para minha ação
eficiente. A partir deste ponto de vista cristãos e não-cristãos devem agir
do mesmo modo, isto é, em benefício do próximo. Por um lado, a
justificação já aconteceu a partir da obra redentora de Cristo.
Por outro lado, ela é um processo de divinização dos cristãos, pela graça
de Deus, na dádiva da fé, da qual fluem o amor e as boas obras. A obra
redentora de Deus em Cristo nos justifica radicalmente. Toda vivência de
fé dos justificados por graça e fé é a atualização desta certeza dada por
Deus para a nossa vida. Neste sentido, para Lutero, a Justificação por
Graça e Fé é o início e o fim da vida cristã.
Finalizando, a Justificação por Graça e Fé alcança a perfeição na
ressurreição. A partir da Justificação por Graça e Fé estamos, segundo
Lutero, em um processo de divinização, isto é, a graça de Deus e a dádiva
da fé nos justificam e nos tornam, por fim, semelhantes a Deus. Lutero fala
que seremos gleychformig (semelhantes) com Deus ou homo deiformis' .
BASE BIBLICA PARA A JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ!

Habacuque 2:4

O ímpio está envaidecido; seus desejos não são bons; mas o justo viverá pela
sua fidelidade (Hab 2:4).

Atos 13:39

Por meio dele, todo aquele que crê é justificado de todas as coisas das quais
não podiam ser justificados pela Lei de Moisés (Atos 13:39).

Romanos 3:24-26

Sendo justificados gratuitamente por sua graça, por meio da redenção que há
em Cristo Jesus. Deus o ofereceu como sacrifício para propiciação mediante a
fé, pelo seu sangue, demonstrando a sua justiça. Em sua tolerância, havia
deixado impunes os pecados anteriormente cometidos; mas, no presente,
demonstrou a sua justiça, a fim de ser justo e justificador daquele que tem fé
em Jesus (Rom 3:24-26).

Romanos 4:25

Ele foi entregue à morte por nossos pecados e ressuscitado para nossa
justificação (Ro 4:25).

Romanos 5:1

Tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor
Jesus Cristo (Ro 5:1).

Romanos 5:9

Como agora fomos justificados por seu sangue, muito mais ainda, por meio
dele, seremos salvos da ira de Deus! (Ro 5:9).

Romanos 5:16-18

Não se pode comparar a dádiva de Deus com a conseqüência do pecado de


um só homem: por um pecado veio o julgamento que trouxe condenação, mas
a dádiva decorreu de muitas transgressões e trouxe justificação. Se pela
transgressão de um só a morte reinou por meio dele, muito mais aqueles que
recebem de Deus a imensa provisão da graça e a dádiva da justiça reinarão
em vida por meio de um único homem, Jesus Cristo. Conseqüentemente,
assim como uma só transgressão resultou na condenação de todos os
homens, assim também um só ato de justiça resultou na justificação que traz
vida a todos os homens (Ro 5:16-18).

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