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Neste capítulo são apresentadas ferramentas matemáticas desenvolvidas utilizando a teoria potencial e
a equação de Laplace, capazes de permitir a geração de funções que definem uma condição de contorno
de um corpo sólido genérico para, então, estabelecer as velocidades e forças de pressão associadas a esse
corpo. A função potencial dada pela condição de contorno do navio, uma vez definida, pode ser asso-
ciada a outros potenciais relacionados aos demais contornos espaciais, como a superfície livre da água,
águas rasas, bancos e outros navios, por exemplo. A solução da equação de Laplace é linear, e a soma de
qualquer número de soluções também é uma solução. Assim, diversos escoamentos potenciais podem
ser construídos superpondo-se configurações de escoamentos elementares. O objetivo da superposição
de escoamentos elementares é a produção de configurações semelhantes àquelas de interesse prático.
A procura de uma combinação de elegância matemática que tivesse utilidade no estudo do escoamento
potencial atraiu muitos pesquisadores.
∂∅
=0
∂n
∫
r1
m m m
ϕs = dr = (lnr1 - lnr0) = lnr + C
r0 2πr 2π 2π
m
C= lnr
2π 0
r1
Lembrando que lnr1 - lnr0 = ln
r0
FIGURA 28
Tem-se que a função potencial de uma fonte, fora da ori-
gem, em coordenadas polares é
m x
u=
2π (x2 + y2) m r1
ϕ (r, θ) = ln
2π r0
m y
v=
2π (x2 + y2) A função de corrente é dada por
m x ∂ϕ m y ∂ϕ m y m
u= = v= = ψ (x, y) = arctan = ψ (r, θ) = - θ
2π (x2 + y2) ∂x 2π (x2 + y2) ∂y 2π x 2π
A função potencial de velocidades, em coordenadas pola- Em que ϕ (x, y) e ψ (x, y) são a função do potencial de
res, é de fácil obtenção; basta integrar o potencial para a velo- velocidades e a função de corrente, respectivamente.
cidade radial
É fácil verificar que fora da origem (0, 0) essas funções
satisfazem à condição ∇2∅ = 0 e ∇2ψ = 0, necessária para um
ϕs = ∫ 2πr
m
dr = -
m
2πr
lnr + C escoamento irrotacional e incompressível.
Em que m é a quantidade volumétrica de fluido por uni- A representação das linhas equipotenciais e das linhas de
dade de comprimento que deixa o ponto central da fonte na corrente, com suas respectivas constantes, está na figura 29.
unidade de, e C uma constante a ser determinada.
�s = ∫ 2πr
m
dθ = -
m
2π
θ+C
ψ (r, θ) = V∞rsinθ
FIGURA 30
∫
r1
-m m r1
ϕ- s = dr = ln
r0 2πr 2π r0
FIGURA 31 FIGURA 33
ϕ = ϕU + ϕS
m
ϕ = V∞rCosθ + lnr
2π FIGURA 35
A velocidade radial, ur, no novo potencial é dada por então, a solução obtida para o problema de um potencial pode
ser diretamente empregada para gerar a solução do segundo.
∂ϕ m
ur = = V∞Cosθ +
∂r 2πr O potencial da linha de corrente que define o contorno do
corpo, ψSP, é dado pela soma
Quando θ = π, tem-se um ponto de estagnação em
ψSP = ψV∞ + ψS
m m
V∞Cosπ + = 0 → - V∞ + =0
2πr 2πr As velocidades radiais de uma fonte em função da linha de
corrente são dadas por
Então, a posição do ponto de estagnação, b, quando θ = π, é
1 δψ m
m vr = =
b= r δθ 2πr
2πV∞
δψ
Quando a velocidade radial é igual a zero, obtém-se um vθ = - =0
δr
ponto de estagnação. Fisicamente, isso significa que o fluxo
que saía da fonte contraequilibra o fluxo uniforme em b, con- Integrando o potencial para a velocidade radial, obtém-se
forme apresentado na figura 34. a linha de corrente radial associada à fonte
ψs = ∫ 2πr
m m
dθ = θ + C
2π
Vr = V∞rCosθ
Isolando r é obtida uma função que define a forma do contorno do meio-corpo de Rankine, para qualquer posição de θ
m π-θ
r=
2πV∞ Sinθ
π m π
Quando θ = ,r= = b
2 4V∞ 2
y
Quando θ = 2π, temos uma indeterminação matemática que pode ser resolvida substituindo r = , porque as linhas de
corrente da fonte e do escoamento incidente são horizontais. Sinθ
Então
y m π-θ m
= ⇒y= = πb
Sinθ 2πV∞ Sinθ 2V∞
m
= πb corresponde à largura do meio-corpo de Rankine.
2V∞
Na figura 36 pode-se verificar a geometria formada com um escoamento uniforme (u∞ = const) e uma fonte. Essa figura
forma um meio-corpo. Esse é o meio-corpo de Rankine.
FIGURA 36
A linha vermelha define o meio-corpo de Rankine e separa o escoamento livre do escoamento proveniente da fonte, exata-
mente como se fosse a linha de corrente divisória entre um corpo sólido semi-infinito e o escoamento sobre esse corpo. Todos
as geometrias sólidas criadas em um escoamento potencial com esse perfil-padrão de separação do escoamento livre são
conhecidas como corpos formados por linhas de corrente (streamlined body)
A velocidade radial e a angular, em coordenadas polares, definidas pela função linha de corrente, são dadas por
∂ψSP m
Vr = = V∞rCosθ +
∂θ 2πr
∂ψSP
Vθ = - = V∞Sinθ
∂r
V∞mCosθ m 2
V2 = V∞2 + +
πr 2πr
m
Lembrando que b = é a menor distância da fonte até o ponto de estagnação, pode-se simplificar a equação anterior por
2πV∞
ρ ρ
p∞ + V∞2 = p + V2
2 2
Rearranjando
p∞ - p V2
=1-
ρ 2 V∞
u
2 ∞
p∞ - p V2
cp = =1- FIGURA 38
ρ 2 V∞
V
2 ∞
FIGURA 39
FIGURA 37
FIGURA 40
2.1.5. O dipolo
A expressão seguinte é obtida somando, em coordenadas
Um dipolo é composto da soma de uma fonte e de um polares, o potencial da fonte e do sumidouro
sumidouro de intensidades iguais, como visto na figura 38.
m r1 m r2 m r1
ϕd = ln - ln = ln
O potencial do dipolo, ϕd, é dado pela soma do potencial 2π r0 2π r0 2π r2
da fonte e do sumidouro.
O mesmo tratamento pode ser dado para a determinação
m de ϕd quando no sistema de coordenadas cartesianas. Obser-
O potencial de uma fonte é lnr , e o de um sumidouro vando a figura anterior, verifica-se que os vetores r1 e r2, rela-
2π 1
m cionados à fonte e ao sumidouro, respectivamente, têm a
- lnr
2π 2 seguinte relação, no sistema de coordenadas cartesianas
Relacionando r1 e r2 com uma origem comum (0, 0), como
apresentado na figura 39. r12 = (x + c)2 + y2
m (x + c)2 + y2 ψ = ψ∞ + ψd
ϕd = ln
2π (x - c)2 + y2
Fazendo a operação em um sistema de coordenadas pola-
A função de corrente, em coordenadas polares, para o res, tem-se
dipolo é dada por
m 2crSinθ
ψ = V∞ rSinθ - tan- 1 2 2
m m m 2π r -c
ψd = - θ - θ = - (θ1 - θ2)
2π 1 2π 2 2π
Que, em um sistema de coordenadas cartesianas, corres-
Rearranjando ponde a
2πψd m 2cy
- = (θ1 - θ2) ψ = V∞y - tan- 1 2 2 2
m 2π x +y -c
Tomando a tangente de ambos os termos Uma linha de corrente particular é a que contém os dois
pontos de estagnação; ela define o contorno do corpo oval
2πψd tanθ1 - tanθ2 de Rankine.
tan - = tan(θ1 - θ2) =
m 1 + tanθ1tanθ2
Na figura 41 a linha de corrente ψsp (encarnada) descreve
Observando a figura anterior pode-se verificar que existe o corpo oval de Rankine.
uma relação trigonométrica entre θ1, θ2
rsinθ rsinθ
tanθ1 = tanθ2 =
rcosθ - c rcosθ + c
Substituindo
rsinθ - rsinθ
2πψd rcosθ - c rcosθ + c 2crSinθ
tan - = = 2 2
m rsinθ rsinθ r -c
1+
rcosθ - c rcosθ + c
m 2crSinθ FIGURA 41
ψd = - tan- 1 2 2
2π r -c
resultando em
x
ϕd = μ
x2 + y2
∂ψd ∂ϕ μcosθ
=r d=-
∂θ ∂r r
∫ μcosθ μsinθ
θ
∂ψd = - dθ + f(r) = - + f(r)
0 r r
μsinθ
ψd = - FIGURA 42
r
FIGURA 43
A soma do potencial do escoamento uniforme incidente, da esquerda para direita, com um doublet é dada por
μcosθ μcosθ μ
ϕ = V∞x + = V∞rcosθ + = cosθ V∞r +
r r r
μsinθ μsinθ μ
ψ = V∞y - = V∞rsinθ - = sinθ V∞r -
r r r
∂ϕ μ
Vr = = cosθ V∞ - 2
∂r r
Observando-se a expressão e a figura anterior pode-se verificar que, quando cosθ = 0, existe uma linha de corrente circular
fechada com raio c = R, para o qual a velocidade radial é zero.
μ
=V
R2 ∞
μ = V∞c2
1 ∂ϕ μ
Vθ = = - sinθ V∞ + 2
r ∂r r
Com conjugação das condições dadas pelas velocidades radial e tangencial são definidos os dois pontos de estagnação do
cilindro, representados por A e B na figura 44.
FIGURA 44
μ μ
A≡ ,π ,B≡ ,0
V∞ V∞
Ou
R2
ϕSP = V∞ 1 + rcosθ
r2
1 ∂ψSP R2
Vr = Vn̂ = = V∞ 1 - 2 cosθ
r ∂θ r
p - p∞ V2 + V 2 1
∫
2π
cp (r, θ) = = 1 - r 2θ Farrasto = ρV∞2b (1 - 4Sin2θ)(Cosθi)dθ
ˆ =0
1 2 V∞ 2 0
V
2 ∞
Este é o paradoxo de D´Alembert: "Parece-me que a teo-
No escoamento potencial a referência de pressão para ria (escoamento potencial), desenvolvida com todo o rigor
tomada do coeficiente de pressão geralmente é a associada à possível, dá um desaparecimento completo dos termos de
pressão de estagnação; com isso p∞ = p0 e V∞ = V0. A pressão resistência. Um paradoxo singular que deixo para futuros geô-
no ponto de estagnação é sempre correspondente à unidade. metras (matemáticos) elucidarem”. Devido a essa observação
a hidrodinâmica passou a ser vista com reservas pela comu-
Na superfície do cilindro a única velocidade existente é a nidade científica em relação ao emprego da teoria potencial
tangencial em função do que era observado na realidade. A reabilitação
surgiu com a introdução do conceito de camada-limite, em
p - p0 V2 1904, por Ludwig Prandtl. Os efeitos viscosos são importantes
cp (r, θ) = = 1 - θ2
1 2 V0 e ficam contidos em uma pequena região sob o seu domínio,
V
2 0 a camada-limite, mas fora dela; em todo o restante do domí-
nio fluido, os seus efeitos são desprezados, e o domínio é do
Lembrando que Vθ = - V∞2Sinθ e que Vθ = V0, no ponto de escoamento potencial.
estagnação, então, o coeficiente de pressão para o cilindro é
O termo da força na direção y, Sinθiĵ, corresponde à força
V 24Sin2θ de sustentação para um cilindro
cp (r, θ) = 1 - θ 2 = 1 - 4Sin2θ
Vθ
1
∫
2π
Fsustentação = ρV∞2b (1 - 4Sin2θ)(Sinθj)dθ
ˆ =0
Em que θ é ângulo medido a partir do ponto de estagnação 2 0
a ré do cilindro.
A força de sustentação também vale zero.
Na figura 47 tem-se um gráfico apresentando os valores de
cp (r, θ) sobre o cilindro. 2.3. O conceito circulação em um cilindro
No contorno do cilindro gerado pela soma do potencial da
velocidade incidente e um doublet, a vorticidade, Ω, é dada
pelo rotacional ∇ × V, e vale zero, como esperado
1 (∂(rVθ)) ∂Vr
∇×V=Ω= -
r ∂r ∂θ
Lembrando que:
Vr = Vnˆ = 0
1 ∂(rVθ)
A partir do coeficiente de pressão a força de pressão sobre =0
r ∂r
o cilindro pode ser calculada por
A vorticidade, Ω, é uma medida da rotação de um elemento
∫ 1
Fp = - (p - p0)nds = ρV∞ cp(r, θ)nds
S 2 S
∫ fluido enquanto ele se move em um escoamento.
dl = rdθ
∫
2π
Γ= Vθrdθ = 2πrVθ
A circulação está associada à força de sustentação. Quando 0
a circulação é diferente de zero existe a força de sustenta-
ção. Para a existência de uma circulação diferente de zero é k
Mas Vθ = , então
necessária, entretanto, a inclusão no escoamento de outro r
escoamento elementar: o vórtice livre.
∫
2π
Γ= Vθrdθ = 2πK
2.3.1. O vórtice livre 0
O potencial 2D de um vórtice livre ou irrotacional é dado Ou seja, a circulação é constante e diferente de zero para
a partir do conhecimento de suas velocidades radiais, Vr, e qualquer linha de corrente e está associada à intensidade do
tangenciais, Vθ. O vórtice livre ou irrotacional é caracterizado vórtice na origem, o que parece contraditório, uma vez que o
por um valor constante de sua velocidade tangencial ao longo fluxo é irrotacional, Ω = ∇ × V = 0. Para investigar essa aparente
de um raio r, e pelo fato de a velocidade radial valer zero, como contradição, pode-se avaliar a circulação em torno de qualquer
visto no item anterior. outro contorno que não inclua a origem e descobre-se que,
como esperado, essa circulação é de fato zero. Assim, conclui-se
A figura 48 representa o perfil de velocidades em torno de que há algo especial ou “singular” na origem, que é um ponto
um vórtice livre anti-horário, com seus respectivos sistemas de vorticidade infinita que tem uma contribuição finita para
de coordenadas. a circulação em torno de qualquer contorno que inclua a ori-
gem. Na verdade, é convencional caracterizar a força de um
vórtice livre pela magnitude da circulação, Γ, em vez de pela
constante, K.
Γ
Vθ =
2πr
∫
ϕv = Vθrdθ = ∫ 2πrΓ rdθ = 2πΓ θ + C 1
FIGURA 48
A função de corrente é dada por
A velocidade tangencial ao longo de cada círculo de raio
r é dada por ∫
ψv = Vθdr = - ∫ Γ
2πr
Γ
dr = - lnr + C2
2π
K
Vθ = Com C1 e C2 iguais a zero, da mesma forma como foi feito
r
para a fonte no item 2.1.1., tem-se:
Em que K é a intensidade do vórtice.
Γ Γ
ϕv = θ e ψv = - lnr
Cada círculo de raio r é uma linha de vorticidade, como se 2π 2π
fosse o contorno de um cilindro de raio r. Assim, como verifi-
cado no item anterior, para o contorno de um cilindro, quando 2.3.2. A força de sustentação em um cilin-
só existem velocidades tangenciais, o rotacional ∇ × V vale zero. dro – o teorema de Kutta-Joukowski
Em um escoamento irrotacional 2D, as velocidades em um A força de sustentação em um cilindro é obtida ao se sobre-
campo potencial são determinadas a partir do conhecimento por o potencial de um escoamento uniforme ao potencial de
da função ϕ um doublet e de um vórtice livre, como representado na figura
49.
∂ϕ , k 1 ∂ϕ
Vr = 0 = Vθ = =
∂r r r ∂θ
A soma do potencial do escoamento uniforme incidente, Os pontos de estagnação, diferentemente dos de um cilin-
de um doublet que forma um cilindro e de um vórtice livre, dro sem circulação, não têm posição fixa.
girando em sentido horário, é
A obtenção dos pontos de estagnação, com r = R, em
ϕ = ϕV∞ + ϕd + ϕv
Γ
Vθ = - 2V∞sinθ - =0
V R2cosθ Γ 2πr
ϕ = V∞rcosθ + ∞ + θ
r 2π
Ou seja, os pontos de estagnação são dados a partir de
Ou
Γ
θ = arcsin -
R2 Γ 4πV∞R
ϕ = V∞rcosθ 1 + 2 + θ
r 2π
Existem dois pontos de estagnação quando
A soma das funções de corrente
ψ = ψV∞ + ψd + ψv
V∞R2sinθ Γ
ψ = V∞rsinθ - + lnr
r 2π
Ou
R2 Γ
ψ = V∞rsinθ 1 - + lnr
r2 2π
1 ∂ψ R2
Vr = = V∞cosθ 1 - 2
r ∂θ r
∂ψ R2 Γ
Vθ = = - V∞sinθ 1 + 2 - FIGURA 50
∂r r 2πr
Verifica-se que apenas a velocidade tangencial é depen- •|Γ|<|4πRV∞|
dente da circulação Γ.
Um único ponto de estagnação localizado em
Em torno do cilindro r = R, que resulta em
π Γ
•θ= se 4πRV∞ e ϕv =
Vr = 0 2 2πr
Γ 3π Γ
Vθ = - 2V∞sinθ - •θ= se 4πRV∞ e ϕv = -
2πr 2 2πr
F D L
= ˆi + ĵ
1 2 1 2 1 2
ρV∞2R ρV∞2R ρV∞2R
2 2 2
CF = CDî + CL ĵ
FIGURA 51
Os coeficientes de arrasto e sustentação são então calcu-
lados por
Nenhum ponto de estagnação no cilindro se
1 p 1
CD = - ∮ n dA → CD = - ∮ c n dA
•|Γ|>|4πRV∞| 2R 1 2 x 2R p x
ρV∞
2
1 p 1
CL = - ∮ n dA → CL = - ∮ c n dA
2R 1 2 y 2R p y
ρV∞
2
Em que
nx = cosθ e ny = sinθ
dA = Rdθ
FIGURA 52
F = Diˆ + Ljˆ
1 2Γsinθ Γ 2
CL = - ∮ - 1 + 4sin2θ + + sinθdθ
2 πRV∞ 2πRV∞
Sabendo-se que
∮sinθdθ = 0
∮sin3θdθ = 0
∮sin2θdθ = π
Conclui-se que
FIGURA 54
Uma particularização do teorema da divergência de Gauss Na figura 55 tem-se um exemplo desse escoamento, escolhen-
é o teorema de Green, que sai do domínio 3D para 2D. Permite do-se como referência a origem da área de uma circunferência.
que se avalie o comportamento de campos vetoriais em relação
a uma linha de contorno ou trajetória fechada, viabilizando,
assim, trazer novos conceitos em relação à circulação.
FIGURA 56
FIGURA 57
Na forma tangencial o teorema de Green, cujo lado direito
descreve uma circulação, porque as velocidades consideradas Ou seja, o somatório de todas as rotações no interior do
serão sempre as tangenciais V = Vθ invólucro da superfície S tem o mesmo valor da circulação
medida ao longo da trajetória fechada c. Essa é outra forma
∂ux ∂uy de se entender o escoamento irrotacional, porque a circulação
- dA = ∮Vθdl
∂y ∂x seria zero ao longo da trajetória C; com esse teorema, porém,
a circulação pode ser diferente de zero em um campo poten-
Ou seja, aparece o conceito escalar do rotacional, Ω, dado cial, desde que a origem do rotacional esteja fora do mesmo.
por
2.4.4. As identidades de Green
∂u ∂u
Ω= x- y
∂y ∂x As identidades de Green são um conjunto de três igualda-
des aplicadas a campos vetoriais, todas com origem no teo-
associado a uma trajetória fechada, que pode ser o contorno rema da divergência de Gauss. Essas identidades funcionam
de um corpo sólido, em torno do qual só existam velocidades como uma “solução universal” para a equação de Laplace cuja
tangenciais. solução não seja trivial em todo domínio potencial. Funções
que possuem esse tipo de solução não trivial são conhecidas
2.4.3. O teorema de Stokes como funções harmônicas. Qualquer função harmônica pode
ser expressa em termos das identidades de Green.
O nome de Sir George Gabriel Stokes foi atribuído ao teo-
rema de Stokes; no entanto, não foi ele quem descobriu o Escolhendo-se duas funções potenciais quaisquer ϕ1, ϕ2
conceito matemático. Stokes já era um distinto professor de e sabendo-se que
matemática e física na Universidade de Cambridge quando
tomou conhecimento, por intermédio de seu amigo William ∇(ϕ1∇ϕ2) = ϕ1∇2ϕ2 + (∇ϕ1) . (∇ϕ2)
Thompson, de um teorema que relacionava uma integral 2D
a uma integral de linha, que era o teorema de Green. E resol- e que
veu investigar se o teorema de Green poderia ser estendido
para 3D; colocou, então, a solução desse problema como um ∇(ϕ2∇ϕ1) = ϕ2∇2ϕ1 + (∇ϕ2) . (∇ϕ1)
dos prêmios anuais para os pesquisadores das disciplinas de
física e matemática da Universidade Cambridge. O teorema Lembrando que o teorema da divergência de Gauss é dado
de Stokes se deve, portanto, a quem formulou o problema e por
não a quem o resolveu.
⃗
∇FdVol ⃗ˆ
= FndA
A ideia de Stokes era relacionar a integral das funções veto-
riais obtidas por Green para um plano com a linha de corrente Substituindo a primeira igualdade obtém-se a primeira
c à superfície S, como apresentado na figura 57. identidade de Green
A solução foi obtida por meio da seguinte igualdade (ϕ2∇2ϕ1 + (∇ϕ2)(∇ϕ1))dVol = ∇(ϕ1∇ϕ2)dA
∇(ϕ1∇ϕ2) - ∇(ϕ2∇ϕ1)
Escolhe-se um volume arbitrário Vol, que contém um corpo, Sabendo-se que o escoamento é irrotacional, pode-se defi-
cuja superfície é S, como apresentado na figura 58. nir, como ferramenta de apoio, um vetor velocidade função de
dois campos potenciais genéricos. Essa ferramenta de apoio
está relacionada a uma função de Green, dada por
V = ϕ1∇ϕ2 - ϕ2∇ϕ1
Que resulta em
A segunda condição de contorno impõe que a velocidade Substituindo o resultado anterior novamente no teorema
do escoamento tenda para a velocidade do escoamento não da divergência
perturbado à medida que nos afastamos do corpo.
∂ϕ2 ∂ϕ
∇ϕ = V∞ com r → ∞ (ϕ1∇2ϕ2 - ϕ2∇2ϕ1)dVol = ϕ1 - ϕ2 1 ds
∂n ∂n
∫ ϕ1
∂G
∂n
∂ϕ
- G 1 ds = 0
∂n
Devido ao trabalho inicial de Rankine, o potencial de uma A partir do teorema da divergência de Gauss, tem-se
fonte ou de um dipolo já eram conhecidos para uma esfera ou
um cilindro. Então, poderia ser identificada a função de Green
associada ao potencial de uma fonte para depois ser reutilizada ∫∫∫ (lnr∇2G - G∇2 lnr)dv =
R0
∫∫ ˆ
(lnr∇G - G∇(lnr))nds
S0
para outros potenciais associados a qualquer outra geometria.
O lado esquerdo da equação, como já visto, valeria zero,
A função de Green é válida para 3D. Como exemplo, será caso o ponto P fosse externo a uma superfície arbitrária S0,
feito, inicialmente, um estudo de caso, para 2D, de potenciais porque ∇2ϕ2 = 0, e ∇2lnr também seria zero, e a equação se
de uma fonte em um campo genérico ϕ1. Em coordenadas restringiria a
polares, o campo associado à fonte, é
ϕ1 = mlnr1
∫ ˆ =0
(lnr∇G - G∇(lnr)).nds
S0
- ∫ Sε lnr
∂G G
-
∂r r
. ds = - 2πG
∫ Sε lnr∇G - G
1
r
ds = - 2πG(p)
G(p) = -
1
2π
∫ S0
1
lnr∇G - G ds
r
FIGURA 60
Definição da circunferência em torno do ponto P
Esse conceito de Kelvin empregando a segunda identidade
de Green para a região interior do “corpo sólido” que contém a
Lord Kelvin de forma brilhante empregou novamente o descontinuidade no ponto P pode ser estendido para a região
teorema da divergência de Gauss em 2D, para a região R0, que exterior a V. Aplicando a solução encontrada entre a superfície
contém a área Sε, que corresponde à circunferência de raio ε. do corpo e uma superfície arbitrária A que envolva S e que
No contorno da circunferência a função de Green é associada venha a tender para o infinito, como pode ser visto na figura
ao potencial conhecido por a seguir, as integrais sobre A tenderão para ϕ∞, ou seja, para
o escoamento não perturbado pelo corpo, tal como estudado
∫ Sε lnr
∂G
∂r
1
- G ds =
r
∫ Sε lnr∇G - G
1
r
ds
inicialmente.
FIGURA 62
Q 1
ϕ(r, θ, φ) = -
4π r
FIGURA 61
O potencial de velocidades de uma fonte 3D é dado por No ponto r = 0, a solução será feita com o emprego da
função delta de Dirac.
ϕ(r, θ, φ) = ∫ ∂ϕ
∂r
dr =
m
r
2.8. Introdução à solução numérica: o
Para se determinar o potencial de uma fonte 3D a um método direto
elemento de superfície de uma esfera, pode-se empregar o
teorema da divergência de Gauss. A vazão volumétrica que A expressão final do potencial de duas dimensões para
flui pela superfície da esfera de raio r é qualquer ponto do escoamento é dada, como já visto, por
Q= ∫∫ Vnds = ∫∫ mr ds
S S 2
G(p) = ϕ∞ -
1
2π
∫
S0
lnr
∂G
∂n
1
- G ds
r
O elemento de superfície da esfera, apresentado na figura Essa equação está numa forma em que é possível interpre-
62, é tar o integral como função de uma distribuição de singularida-
des. O primeiro termo do integral pode ser interpretado como
ds = r2sinθdθdφ o potencial de uma fonte de intensidade
Então ∂G
∂n
Q= ∫∫
0
π 2π
0
m 2
r2
r sinθdθdϕ = - m4π → m = -
Q
4π e o segundo como o potencial de um dipolo de intensidade G.
G(p) = -
1
2π
∫ S0
lnr
∂G
∂n
ds
Em coordenas polares, ds = rdθ, o potencial entre os pontos
a e b, devido a uma fonte situada no ponto p, será dado por
G(A) = -
1
2π
∫ S0
lnr
∂G(A,B)
∂nB
ds
Em coordenadas cartesianas globais, tem-se
FIGURA 63
FIGURA 64
2.8.1. Distribuição de singularidades pelo No método indireto de análise, comumente citado como
método direto, a fonte está no interior do método das fontes, as incógnitas podem ser vistas como inten-
contorno sidades de fontes elementares distribuídas no contorno do
corpo, sem significado físico. O potencial é obtido pelo soma-
Essa fonte localizada no ponto p, vai exercer um potencial tório das fontes elementares centradas em cada elemento ds.
elementar de velocidade, dG(p) no contorno de S, dado por Esse é o método mais empregado.
G(p) =
1
2π
∫
a
b
lnrmds O resultado final será igual porque o somatório do potencial
de cada fonte elementar sobre o contorno da circunferência
Ou seja, subdividindo o contorno S, entre a e b, tem-se um será igual ao somatório dos potenciais aplicados na distância
número n de seções ds r em relação à fonte centrada na origem.
ρ
∇E =
ε0
ρ
∇2V = -
ε0
FIGURA 65
∇xE=0
E = - ∇V
FIGURA 66
Sabendo-se que a divergência do campo elétrico é dada Geometria para determinação da função potencial em uma
região limitada por uma superfície ∑
pela razão entre a densidade de carga elétrica, que é a quan-
tidade de carga elétrica existente em determinada grandeza
Na solução surge um problema: como representar uma
geométrica, e a constante de permissividade no vácuo, ε0, que
carga puntiforme? porque |r´- r| tenderia a zero, e a densidade
descreve como um campo elétrico afeta e é afetado por um
da carga iria para infinito.
meio, ou seja
Esse é o problema já visto em hidrodinâmica, porque |r´-r|
ρ
∇E = é o vetor vermelho, correspondendo então a um vetor associado
ε0
2) δ(x) = 0
∫
∞
3) -∞
δ(x)dx = 1
FIGURA 67 ∫ ∞
-∞
δ(x)dx = 0
A solução veio a partir da ideia do matemático inglês Oliver O matemático francês Laurent Schwartz(1915-2002) final-
Heaviside (1850-1925), que introduziu o cálculo operacional mente colocou a função de Dirac num contexto matemático
para resolver equações diferenciais de circuitos elétricos, tor- defensável, propondo a teoria das distribuições, também refe-
nando-as equações algébricas. A solução definitiva viria a ser rida como uma teoria de funções generalizadas.
matematicamente formalizada muito tempo depois. Uma fun-
ção apareceu naturalmente no processo, a saber a função com A função delta deve ser entendida como limite de uma
valores reais, definida para 0 ≠ t ∈ R dada por H(t) = 0, se t < 0, distribuição.
e H(t) = 1, se t ≥ 0. Representava então a função voltagem, que
assumia valor constante e superior a zero quando se fechava Para entendimento desse conceito, considere uma função
o circuito, a partir do instante t = 0, e era nula quando t < 0. com as seguintes características
1
1) f(r) = se |r|< a
2a
2) f(r) = 0 se |r|> a
FIGURA 68
-∞
f(r)δ(r)dr = 1
Essa é uma das representações da função delta de Dirac.
Ou seja, tem-se como resposta
Existem outras representações para a função delta; por
∫
+∞
exemplo, considere a seguinte função gaussiana f(0) -∞
δ(r)dr
r2
1 - Porque fora da origem tudo vale zero, e f(0) deixa de ser
f(r) = e σ2
σ π uma variável para ser uma constante e, portanto, pode sair
da integral.
A representação gráfica dessa função pode ser visualizada
∫
+∞
na figura 70. Mas -∞
δ(r)dr = 1, ou seja
∫ +∞
-∞
f(r)δ(r)dr = f(0)
∫
+∞
-∞
f(r)δ(r - a)dr
∫
+∞
-∞
f(r)δ(r - a)dr = f(a)
∫
+∞
FIGURA 70
-∞
δ(x)δ(y)δ(z)dxdydz = 1
Essa é a clássica distribuição de uma função centrada na Uma carga pontual ou uma fonte situada na origem pode
origem e com curva em formato de sino, razão pela qual então ser descrita pela função delta de Dirac.
é conhecida mundialmente como bell curve. A distância σ é
conhecida como a variância da distribuição. Essa função tem Fazendo uso da função delta de Dirac a fim de achar a
uma característica fundamental: sua integral de - ∞ a + ∞ solução da equação de Poisson, para o potencial de uma fonte,
também vale um. A função, devido ao valor da variância σ, tem-se
pode ficar mais achatada ou mais alongada, mas a área sob a
curva sempre valerá um. ρ
∇2V = ∇2G = - = f(r) = δ(r)
ε0
Ao se fazer σ cada vez menor aumenta-se a altura aumen-
tando e diminui-se a base, ou seja, no limite, tem-se a função
delta
No contorno S tem-se
∫∫ δ(r)dA = ∂G
A ∂nˆ
2πr
∫
∫ (∇.G)nds
S
ˆ = (∇.G)nˆ ∫∫ ds =
∂G
∂nˆ
S
∫∫ ds S
Ou seja
∫ ∫ δ(r)dv = ∂n
v
∂G
ˆ
∫∫ ds S
Então o potencial G é dado por
1
G=- +C
4πr
Com r → ∞, G = 0, então C = 0
1 1
G=- =-
4πr 4π(x - x0)