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Adolf Franz Heep:

edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação
coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950

Arq. Edson Lucchini Jr.


UNIVERSIDADE
PRESBITERIANA Orientadora: Drª Ruth Verde Zein
MACKENZIE São Paulo 2010
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Adolf Franz Heep:
edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação
coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950
Adolf Franz Heep:
edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação
coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950

Arq. Edson Lucchini Jr

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação


em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana
Mackenzie para obtenção do título de Mestre em Arquitetura
e Urbanismo

Orientadora: Drª Ruth Verde Zein

São Paulo 2010


Agradecimentos

Aos meus avós Vittoria e Domenico, que deram os primeiros


passos...

Aos meus pais Rosa Maria e Edson, que ampararam os


meus passos...

Aos queridos Renzo, Monica, Marilda, Dario, Luiz e Sonia,


que me ajudaram a desviar das pedras.

Ao meu amigo, irmão e sócio Ricardo Ruiz Martos, pelo


companheirismo, exemplo e paciência.

Ao amigo Friedrich Blanke e Marcia Prata, pela hospitalidade


e a imensa colaboração com meu trabalho, com materiais
e informações fundamentais.

À Diney e Reinaldo Martos pelo constante incentivo à


carreira acadêmica e às correções deste trabalho.

À Ruth Verde Zein, minha orientadora, pelas inúmeras


oportunidades oferecidas para a ampliação do meu
conhecimento, além de me ensinar a escrever tecnicamente
e analisar uma obra de arquitetura.

Ao amigo e professor Mario Arturo Figueroa Rosales, que


me ensinou a ver a arquitetura que estudo hoje.

Aos integrantes da minha banca de qualificação Paulo J. V.


Bruna, Mario Figueroa e Ruth Verde Zein pelas pertinentes
considerações que foram fundamentais para a evolução
deste trabalho.

Ao amigo Fernando Martinelli, pela cordialidade e o


fornecimento de um material precioso para esta pesquisa.

Aos engenheiros Aizik Helcer, André Gorenstein e equipe


da Construtora Auxiliar pelos depoimentos e materiais
fornecidos.

Ao arquiteto Ruy Debs Franco, que nem imagina o quanto


me motivou e inspirou para a execução deste trabalho.

Ao mestre Adolf Franz Heep, por ter deixado ótimos


edifícios que inspiraram esta dissertação.
para

Domenico Serio
1918-2010

Carlos Alberto Ferreira


1948 - 2010
V
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Apresentação
As razões que me levaram a escolher a obra
residencial vertical de Adolf Franz Heep como tema deste
trabalho, são fruto de referenciais oriundos da infância,
somados a uma considerável coincidência recente.

Nos anos 1980, eu morava na cidade de Jundiaí,


e visitava meus avós em São Paulo aos finais de semana.
Enquanto os meninos daquela vila da Mooca só queriam
jogar futebol, a minha alegria era passear de metrô com o
meu avô, principalmente em direção ao centro da cidade.
Embarcávamos na estação Belém e descíamos sempre
na estação República. O fato do nível da plataforma estar
muito abaixo do nível da cidade, faz com que a República
seja uma estação dotada de muitas escadas rolantes, e
isto, para uma criança, é muito atrativo.

Quando subíamos o último lance de escadas da


estação, que leva à superfície, a cidade ia aparecendo
gradualmente, e toda a sua pujança ia se revelando, na
velocidade da escada rolante. Neste momento, formava-
Uma das saídas da estação República do metrô de São Paulo se em minha retina a imagem do edifício que mais me
Foto: Edson Lucchini Jr
impressionava: o Itália, que, até então, eu nem imaginava
que era um projeto de Franz Heep. Hoje, depois de uma
certa vivência profissional e acadêmica, consigo justificar
o encantamento pelo Itália sob premissas arquitetônicas,
mas quando era criança, eu só conseguia dizer que adorava
aquele prédio, mas sem saber exatamente o motivo.

Posso dizer que a minha relação com o centro


da cidade, que desde criança era forte, se intensificou
no momento em que passei a estudar arquitetura na
Universidade Mackenzie. Em alguns momentos, quando
me dispersava da aula, olhava pela janela do prédio nove
e conseguia ver o topo do edifício Itália e um pedaço do
Copan; era um privilégio, para um aluno de arquitetura,
olhar para o lado e ver estes ícones da arquitetura
paulistana tão próximos.

No sétimo semestre do curso, o meu então


professor, Mario Figueroa, organizava passeios pelo centro
com os alunos. Nesta época, ele escrevia o seu doutorado
sobre edifícios residenciais modernos no centro de São
Edifício Itália - 1956 - Adolf Franz Heep
Paulo; com os passeios, Mario mostrava aos estudantes
Foto: Edson Lucchini Jr. estes edifícios in loco e contava um pouco da história de
cada um. Foi neste momento que entendi, de uma maneira
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

mais técnica e aprofundada, a importância de edifícios Este interesse pela habitação vertical, produzida
que desde criança me chamavam a atenção além do Itália, pela arquitetura moderna em São Paulo, me levou à escolha
como o Viadutos (Artacho Jurado) e a Galeria Metrópole deste tema para a elaboração da monografia final do curso
(Salvador Cândia e Gian Carlo Gasperini). de arquitetura; nela, fiz um fichamento pouco aprofundado
de treze edifícios modernos de habitação no centro de São
Dentre os edifícios residenciais que víamos nos Paulo, sendo que dentre eles, cinco eram de Franz Heep.
passeios, dois me despertaram um maior interesse: o
Ouro Preto, situado na avenida São Luiz, e o Lausanne, na Cinco anos após a conclusão do curso de arquitetura,
avenida Higienópolis. Quando Mario Figueroa me disse resolvi retomar o contato com os estudos e optei pelo
que estes edifícios haviam sido projetados pelo mesmo mestrado. A escolha do tema ocorreu de maneira muito
arquiteto do Itália, um alemão chamado Adolf Franz Heep, natural, devido ao meu grande interesse pela habitação
quis conhecer outras obras deste arquiteto, até então vertical moderna. Mas era necessário um recorte mais
desconhecido para mim. preciso de toda esta vasta produção; foi aí que meu amigo
e sócio, Ricardo Ruiz Martos, me disse: “Você não adora o
Com o doutorado de Figueroa, pude conhecer mais Heep? Então, estude só a obra do Heep! Neste momento,
dois edifícios residenciais de Heep: o Icaraí, situado na surgia o meu tema de mestrado: os edifícios residenciais de
praça Roosevelt e o Normandie, na 9 de Julho. Franz Heep em São Paulo.

Edifício Lausanne - 1953-58 - Adolf Franz Heep Edifício Ouro Preto - 1954-57 - Adolf Franz Heep
Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.
VII
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Edifício Jequitibá

Edifício Jequitibá e a intensa verticalização da orla de Santos e São Vicente


Foto: Edson Lucchini Jr. Com o mestrado já em andamento, uma grande
coincidência reforçou ainda mais a escolha do tema.
Nos anos 1960, minha avó, Vittoria Birolini, e meu avô,
Domenico Serio (o mesmo que passeava comigo de metrô)
adquiriram um apartamento de veraneio na cidade de São
Vicente, no litoral paulista; foi o local onde passei muitas
de minhas férias, na infância e adolescência.

Em meados do ano de 2008, Friedrich Blanke, um


amigo alemão que também estuda a obra de Franz Heep,
me mostrava uma relação de obras do arquiteto no Brasil;
ao observar a lista tive uma grande surpresa: o edifício
Jequitibá, onde eu passava minha férias em São Vicente, é
de autoria de Heep. Dentre as centenas de edifícios situados
na orla de Santos e São Vicente, meus avós compraram
justamente um apartamento num edifício de Franz Heep,
sem saberem a autoria do projeto e sem imaginarem que,
décadas mais tarde, eu viria a me interessar pela obra
deste arquiteto.

Além das justificativas citadas, outro fator que


contribuiu para escolha do tema é a ausência de estudos
mais aprofundados sobre a produção residencial vertical
de Heep. Encontram-se na internet, em dissertações de
mestrado, periódicos e livros, inúmeras publicações sobre
os edifícios mais famosos, como o Itália, o Lausanne e o
edifício do jornal O Estado de São Paulo; porém, ainda não
há uma obra que tenha como foco a produção de Heep
para o intenso mercado imobilário paulistano dos anos
1950.
Edifício Jequitibá - 1957 - São Vicente, SP - Adolf Franz Heep
Foto: Edson Lucchini Jr. Diante de todas estas considerações pessoais,
emocionais e arquitetônicas, creio ser válida e verdadeira a
escolha deste tema, que visa resgatar e difundir a imagem
de Adolf Franz Heep e a sua grande contribuição para a
arquitetura, através de seus edifícios residenciais.
1
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Sumário
Sinopse / Abstract 4
Parte I
Introdução
Acerca dos objetivos desta pesquisa 6
Metodologia de trabalho 7
Referenciais teóricos 9
Capítulo 1
Da necessidade de reconhecimento de uma 11
prática projetual
Capítulo 2
Modernidade de berço: a trajetória de Adolf 13
Franz Heep da Europa ao Brasil
Capítulo 3
Algumas obras não residenciais significativas 17
3.1 - Edifício do jornal O Estado de São Paulo 17
3.2 - Edifício Casa da França 18
3.3 - Edifício Souza Naves 18
3.4 - Edifício São Marcos 18
3.5 - Edifício Itália 19
3.6 - Igreja São Domingos 20
Capítulo 4
A cidade que mais cresce no mundo: panorama 21
da modernização e verticalização de São Paulo
no pré e pós 2ª guerra

Parte II
Os edifícios: objetos de estudo
Capítulo 5
5.1 - Critérios metodológicos de análise 26
5.2 - Critérios de ordenação das análises 27
5.3 - Tabela geral dos edifícios a serem 28
analisados
2
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Sumário

Capítulo 6
As análises 30
6.1 - Edifício Ouro Verde 31
6.2 - Edifício Normandie 50
6.3 - Edifício Icaraí 78
6.4 - Edifício Ibaté 94
6.5 - Edifício Lausanne 113
6.6 - Edifício Ouro Preto 142
6.7 - Edifício Lucerna - Cine Comodoro 160
6.8 - Edifício Araraúnas 183
6.9 - Edifício Guaporé 202
6.10 - Edifícios Lugano e Locarno 226
Capítulo 7
7.1 - Tabela com os demais edifícios de Heep 249
em São Paulo
7.2 - Considerações sobre os edifícios não 251
analisados

Parte III
Conclusões
Capítulo 8
8.1 - Inserção Urbana 253

8.1.1 - Valorização e entendimento de 254
esquinas

8.1.2 - Térreos elevados 255



8.1.3 - Implantação 256

8.2 - Insolação e conforto térmico 257

8.3 - Fachadas 261

8.3.1 - Grelhas 261

3
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Sumário

8.3.2 - Composição entre caixilhos, 263


guarda-corpos, floreiras e cobogós; célula
e todo
8.3.3 - Fachadas livres e caixilhos piso-teto 265

8.3.4 - Cobogós 266


8.3.5 - Uniformidade nas fachadas, 268
dissimulação das compartimentações
internas e aleatoriedade

8.3.6 - Ordem, simetria, assimetria e 270


hierarquia

8.3.7 - Coroamentos 271

8.3.8 - Fachadas laterais e de fundos 273

8.4 - Plantas 274

8.4.1 - Geometria e racionalização 274

8.4.2 - Setorização e fluxos 274

8.4.3 - Arranjos espaciais e racionalização 276
hidráulica

8.5 - Importância do detalhe bem resolvido 278



Capítulo 9

9.1 - Considerações finais 283



9.2 - Bibliografia 284

9.3 - Anexos - desenhos originais 287

4
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Sinopse Abstract

Adolf Franz Heep foi uma das mais importantes Adolf Franz Heep was one of the most important
personalidades a deixar sua marca no pujante cenário personalities to live his mark over the strong architectonic
arquitetônico paulistano e brasileiro dos anos 1950 e 1960; scenarios in São Paulo and Brazil in the years of 1950 and
neste período, ele projetou inúmeros edifícios, sendo 1960. Around that period, he had projected countless
que alguns deles se tornaram referências da arquitetura buildings in a way that some of than turn to be a reference
brasileira tendo contribuído para as transformações que of the Brazilian architecture along with a contribution to
elevaram a cidade de São Paulo ao patamar de metrópole transform São Paulo in one of the cities that reach status
moderna. of modern metropolis.

Nascido na cidade de Fachbach, Alemanha, no ano Born in the city of Fachbach in Germany on the year
de 1902, Heep forma a sua personalidade arquitetônica of 1902, Heep develops his architectonics personality during
num momento histórico em que as discussões sobre os a special moment in the history when appealing discussions
conceitos de moradia mínima e de racionalização eram about minimal dwelling places and rationalization were
recorrentes. Em Paris, nos anos 1930, após trabalhar frequent. In Paris during 1930 years, after have worked for
com Le Corbusier, desenvolve alguns edifícios verticais de Le Corbusier, he develops various vertical housing buildings,
habitação para a classe média, em sociedade com Jean focusing the middle class, together with Jean Ginsberg.
Ginsberg; esta experiência foi fundamental para a definição That experience was fundamental for the definition of the
das bases de sua produção paulistana, anos mais tarde. basis in his production in Sâo Paulo City later on.

Após a 2ª guerra mundial, Franz Heep chega a São After the 2º World War Franz Heep arrives in
Paulo, onde atuará na consolidação e racionalização de São Paulo were he worked on the consolidation and
um modelo vertical de morar, produzindo duas dezenas de rationalization of a vertical way of leaving the same time as
edifícios residenciais que serão o objeto desta pesquisa. he produced two groups of ten buildings, witch will be the
object of this research.
A partir de um reconhecimento sistemático dessa
produção foi realizado o estudo pormenorizado, de caráter Beginning from the systematic recognition of this
descritivo e analítico de uma amostra de dez edifícios production, it was accomplish a detailed scrutiny, focusing
projetados por Heep em São Paulo, destacando os seus analyses and description on a sample of ten buildings
aspectos espaciais, plásticos, técnicos e urbanos; como developed by Heep in São Paulo, enhancing its spatial,
método para aprofundar os estudos, os edifícios foram plastics, technical and urban aspects as a method to go
redesenhados em meio digital, não apenas com o intuito deeper on the dissection of the buildings itself. Those
de ilustrar as situações descritas no texto, mas também de buildings, chosen to be the object of the analyses, were
registrar graficamente as suas condições originais. redesigned by digital methods not only to illustrate the
diverse situation described in the text, but to record
Esta pesquisa visa não apenas gerar uma graphically the original conditions of the project made by
documentação gráfica de qualidade acerca dos edifícios Heep.
residenciais de Franz Heep, mas também identificar
elementos recorrentes, que revelam o perfil projetual This research aim, not only, generate quality
do arquiteto, contribuindo para o conhecimento mais graphical documentation about the residential buildings
aprofundado de sua obra e a ampliação do reconhecimento projected by Franz Heep, but also identify appealing
da arquitetura moderna brasileira e paulistana. elements that reveal the way of working profile attitude of
the architect. This is our contribution to go deeper in the
knowledge of his achievements and enlarge the recognition
of the modern architecture in Brazil and São Paulo city.
Adolf Franz Heep ao lado da maquete do Edifício Itália - final dos anos 1950
Fonte: Acervo pessoal de Friedrich E. Blanke

Parte I
Introdução
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Acerca dos objetivos desta pesquisa

O arquiteto e professor Marcelo Barbosa, concluiu


no ano de 2002 o seu mestrado pela FAU-USP, cujo título é “A
obra de Adolf Franz Heep no Brasil”. É um importantíssimo
trabalho sobre a obra deste arquiteto, que abrange toda a
sua produção em nosso país, inclusive muitos dos edifícios
que serão estudados neste trabalho.

A amplitude e complexidade do recorte escolhido


por Barbosa para o seu mestrado, definiu um caráter
panorâmico, enfatizando o reconhecimento da obra de Franz
Heep. Na atual dissertação se propõe, em contraponto, um
estudo pontual, que justamente busca dar continuidade
aos estudos já iniciados sobre a obra deste arquiteto. O
objeto de pesquisa será um estudo aprofundado, mas
apenas dos edifícios residenciais verticais, produzidos por
Heep em São Paulo.

Adolf Franz Heep é praticamente um desconhecido


do público em geral, talvez pelo fato dele não ter trabalhado
muito com obras públicas, como Oscar Niemeyer ou
Vilanova Artigas por exemplo, somado à ínfima difusão
que a arquitetura possui nos meios de imprensa do
Brasil. Porém, se pode afirmar que ele é bem reconhecido
no meio acadêmico, por ter projetado alguns edifícios
icônicos da metrópole paulistana, como o Itália, o do jornal
O Estado de São Paulo e o Lausanne; porém, a grande
maioria dos exemplares de sua considerável contribuição
para a arquitetura moderna paulistana e para a habitação
coletiva voltada ao pujante mercado imobiliário dos anos
1950, repousam no esquecimento.

Diante destes fatos, a presente pesquisa visa


estudar sistematicamente dez dos vinte e um edifícios
residenciais de Franz Heep em São Paulo, através da análise
pormenorizada dessas obras, com foco em seus aspectos
formais, construtivos e de detalhamento arquitetônico; as
análises contarão com o redesenho dos edifícios, afim de
produzir um conteúdo gráfico de linguagem uniforme.

A pesquisa visa também realizar análises mais


abrangentes sobre o conjunto dessa obra, de modo a
identificar elementos recorrentes do repertório de Heep,
utilizados em seus edifícios; com isso, será permitido traçar
muito do seu perfil como arquiteto e o seu modo de reagir
frente às inerentes condicionantes de um projeto.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Enfim, este trabalho se propõe a produzir um


conteúdo gráfico que contribua com a documentação da
arquitetura moderna paulistana e brasileira, difundindo-a
de modo a que todos os interessados por habitação
coletiva e pela obra de Franz Heep, contem com uma fonte
de pesquisa de qualidade e de fácil compreensão.

Metodologia de trabalho

Após a escolha do tema e a definição dos edifícios


residenciais de Franz Heep em São Paulo como recorte,
iniciou-se o primeiro passo da pesquisa: procurar a relação
exata de edifícios projetados por Heep em São Paulo. Esta
listagem foi encontrada, em grande parte, na dissertação
de mestrado de Marcelo Barbosa, e em pesquisas feitas
anteriormente para a elaboração da tese de doutorado de
Friedrich Blanke1.

Paralelamente a isso, se iniciaram estudos para


a elaboração de um capítulo introdutório. Este deveria
ser capaz de contextualizar, de forma concisa, a inserção
dos edifícios de Franz Heep na cidade de São Paulo, cujo
panorama, no pós 2ª guerra mundial, era de uma intensa
verticalização e modernização. Além disso, o trabalho
ainda conta com uma breve biografia, que traça a trajetória
profissional de Franz Heep, da Europa ao Brasil.

Em relação aos edifícios, como resultado da


primeira etapa de pesquisa foram identificados vinte e
um exemplares residenciais verticais projetados por Heep
na cidade de São Paulo. Consequentemente se definiu o
recorte temporal do trabalho, que abrange o período entre
1949 a 1959 (ver tabela na página 8).

Com a identificação e a localização destes vinte


e um edifícios, se iniciou o processo de visita a cada um
deles, para levantamento fotográfico e um primeiro
contato com os síndicos, em busca de algum material que
pudesse contribuir com a elaboração dos desenhos. Em
muitas situações, não foi permitido o acesso ao interior
dos edifícios e não foi fornecido nenhum tipo de material;
nestes casos, foi preciso contatar a construtora que
executou o edifício, porém, somente uma entre as quatro2
com quem Heep trabalhou, ainda funciona nos dias de
hoje e pôde fornecer algum tipo de material gráfico.

(1) - Friedrich E. Blanke, alemão residente no Brasil, está com sua tese de doutoramento em andamento com o título “O arquiteto Adolf Franz Heep e a influência dele na arquitetura de
São Paulo” pela Carl von Ossietzky Universität Oldenburg, na Alemanha
(2) - A construtora Auxiliar é a única que ainda atua na área da construção civil nos dias de hoje, dentre os dez edifícios escolhidos para análise; as demais, C.N.I, Otto Meinberg S.A e
Dacio. A de Moraes foram extintas.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Para as situações em que não se conseguiu material


referente aos edifícios, nem com os síndicos e nem com as
construtoras, se tentou recorrer ao DAMP3 da prefeitura
de São Paulo, porém, não foi obtido sucesso em nenhum
dos casos em que esta solução foi necessária; portanto, em
algumas situações, não foi possível coletar nenhum tipo de
material gráfico, o que prejudicou ou impediu a análise do
edifício.

A revista Acrópole foi uma importante fonte de


pesquisa; seis4 dos vinte e um edifícios, foram publicados
nesta revista, fator que contribuiu com a análise deles
neste trabalho. A revista Habitat também foi utilizada na
pesquisa, já que publicou dois5 edifícios de Heep.

Após a coleta de todo material possível sobre


os vinte e um edifícios, se iniciou uma pré-análise, em
que eles foram organizados segundo grupos tipológicos
distintos. Com isso, foi possível constatar que em cada
categoria tipológica identificada, havia um edifício-
chave, cujos elementos principais foram retomados em
outros exemplares de seu grupo. Dos vinte e um edifícios
conhecidos, se pode dizer que doze possuem elementos
tipológicos marcantes e distintos, que foram retomados
nos demais nove. Após esta conclusão, a idéia inicial de
analisar os vinte e um edifícios foi abandonada, pois o
trabalho poderia se tornar repetitivo; portanto, as análises
se concentrariam em doze edifícios-chave que definem
matrizes tipológicas indicadas pelo enfoque da pesquisa.

Infelizmente, em dois casos, o material conseguido


não foi suficiente para a elaboração de uma análise
completa; isto definiu, como amostra final, um grupo de
dez edifícios.

A partir daí se iniciavam as análises de cada caso.


A primeira fase é gráfica; foram redesenhadas o máximo
os dez edifícios selecionados de plantas, cortes e fachadas possíveis de cada edifício,
os dois edifícios que não entraram na
por meio vetorial computadorizado (CAD). A quantidade
amostra a ser analisada por falta de de desenhos de cada obra, dependeu necessariamente da
material
qualidade e quantidade de material primário conseguido.

Com as plantas concluídas, todos os edifícios


escolhidos foram modelados em três dimensões através
de um “software” específico para este fim. A modelagem
digital dos edifícios teve a intenção de resgatar suas feições
originais, que em muitos casos se perderam nos dias de

(3) - O DAMP ( Divisão de Arquivo Municipal de Processos) é um setor da Prefeitura de São Paulo que tem como atribuição conservar o acervo de processos administrativos encerrados,
dos exercícios de 1921 até hoje.
(4) - Os edifícios de Heep publicados na Revista Acrópole são: Normandie, Icaraí, Ouro Preto, Araraúnas, Lausanne e Lugano e Locarno
(5) - Os edifícios de Heep publicados na Revista Habitat são: Ibaté e Tucumàn
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

hoje através de reformas arbitrárias ou pela degradação


sofrida. Foram também desenhados diversos croquis
analíticos, que ilustram as situações descritas nos textos.

Cabe afirmar que todos os desenhos elaborados por
meio digital presentes neste trabalho, foram executados
pelo próprio autor; acredita-se que o domínio do processo
gráfico, contribuiu muito para a elaboração das análises
textuais, já que o redesenho de uma obra seja talvez a
maneira mais fácil de compreendê-la. Além disso, há uma
linguagem gráfica única para todos os edifícios analisados,
de modo a criar uma sistematização, que visa facilitar a
visualização e o entendimento dos projetos.

A primeira página de cada obra consiste sempre


numa ficha técnica, com informações sucintas sobre o
edifício. As páginas seguintes são destinadas aos textos, que
são divididos em alguns temas arquitetônicos; em cada um
há um momento meramente descritivo, sempre seguido
por conclusões analíticas, deduzidas das descrições.
Considerações mais detalhadas referentes à estrutura de
análise de cada edifício serão comentadas no capítulo 5,
na página 26.

Após as análises das dez obras há um capítulo de


conclusões gerais, onde se encontram as relações entre
os edifícios e a identificação de elementos recorrentes nas
obras.

Referenciais teóricos

A metodologia de análise presente nesta obra é


fruto da somatória de referenciais teóricos extraídos de
trabalhos anteriores, como artigos, livros, dissertações de
mestrado e teses de doutorado.

Os artigos escritos por Catharine Gatti para as


revistas Projeto (1987) e AU (1994) constituem pesquisas
importantíssimas e pioneiras sobre a obra de Adolf Franz
Heep e a sua contribuição para a arquitetura. Além de
abrirem caminho para estudos posteriores sobre Heep,
os artigos de Catharine serviram de base teórica para a
presente pesquisa.

A dissertação de mestrado de Marcelo Barbosa6,


cujo tema é a obra de Adolf Franz Heep no Brasil, foi muito

(6) - Marcelo Consiglio Barbosa é arquiteto e professor da FAU-MACKENZIE.


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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

importante para a elaboração do trabalho atual, pois conta


com muitas fontes primárias e uma primeira abordagem
sobre muitos dos edifícios que serão aqui estudados.

Outra importante fonte para a elaboração deste


trabalho foi a dissertação de mestrado da Drª Ruth Verde
Zein7, cujo título é ”Arquitetura brasileira, escola paulista
e as casas de Paulo Mendes da Rocha”. Apesar desta
dissertação contar com um tema bem diferente do trabalho
atual, ela foi fundamental para a definição dos parâmetros
metodológicos de análise arquitetônica que foram aqui
utilizados.

O livro “Arquitetura Metropolitana” de Denise


8
Xavier , também contribuiu com a elaboração do sistema
de análise desta dissertação, e com temas pertinentes à
contextualização das obras aqui estudadas.

A tese de doutorado do Mario Arturo Figueroa


Rosales9, cujo título é “Habitação Coletiva em São Paulo,
1927>1972”, além da similaridade com o presente tema,
também representa uma importante referência para a
elaboração desta dissertação. Além das razões teóricas, a
tese de Figueroa, com o seu pioneiro sistema de fichamento
de edifícios, inspirou a composição das fichas de análise de
cada obra desta dissertação.

(7) - Ruth Verde Zein é arquiteta pela FAU-USP (1977), mestre pela UFRS (1999) e doutora pela UFRS (2005) e pós-doutora pela FAU-USP (2008) e orientadora desta presente pesquisa.
(8) - Denise Xavier é arquiteta pela FAU PUCCAMP (1988) e mestre pela EESC- USP (2000).
(9) - Mario Arturo Figueroa Rosales é arquiteto formado pela FAU PUCCAMP (1988) doutor pela FAU-USP (2002)
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Capítulo 1
Da necessidade de reconhecimento de uma prática
projetual

Considera-se da maior relevância o reconhecimento


de uma prática projetual corrente entre os arquitetos da
geração de Adolf Franz Heep. Neste capítulo, haverá uma
breve reflexão sobre a qualidade projetual proposta por
essa geração de arquitetos, em contraposição às práticas
atuais, através do uso de exemplos relevantes da arquitetura
moderna paulistana, preferencialmente no âmbito dos
edifícios verticais habitacionais, já que estes são o objeto
deste trabalho.

As décadas de 40 e 50 marcaram um período áureo


da arquitetura paulistana. Nesses anos, promotores do
recém-nascido mercado de incorporações, incumbiram
muitos excelentes arquitetos da época, da missão de
projetar edifícios habitacionais verticais, principalmente
nas áreas centrais, num primeiro momento, e mais tarde
ao longo do setor sudoeste da cidade, onde alguns bairros
inteiros foram construídos com excelentes exemplares
habitacionais verticais.

Propaganda da Janela “Ideal” “Para mim, ela (arquitetura moderna)


Fonte: Revista Acrópole nº236, janeiro de 1958 depende de uma relação necessária entre três
determinantes: o programa de necessidades; a
técnica construtiva e a intenção plástica dentro
de uma condição indispensável, a atualização
sincrônica dessas providências”
(LEMOS, 2005)

Os edifícios projetados nesta época, por nomes


como Vilanova Artigas, Adolf Franz Heep, Abelardo de
Souza, Maurício Kogan, e muitos outros, destacam-se por
demonstrarem relações claras e elementos desenhados
segundo uma estrutura que acusa uma ordem categórica,
utilizando-se muitas vezes de um tipo de fechamento em
painéis modulados. Esses painéis são grandes caixilhos
que geralmente são do tipo piso-teto, dotados de
venezianas tipo “guilhotina”. No mercado da época, este
caixilho amplamente utilizado se chamava “Janela Ideal”.
Considerações mais completas sobre este tipo de caixilho
serão vistas na análise do edficío Ibaté (p.94), de Franz
Heep, que utiliza este recurso. (ESPALLARGAS GIMENEZ,
2009)
Edifício Louveira – J.B. Vilanova Artigas e Carlos Cascaldi – 1946.
Fonte: Vilanova Artigas – arquitetos brasileiros – brazilian architects. São Paulo:
Instituto Lina Bo e P.M. Bardi: Fundação Vilanova A.rtigas, 1997
12
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A boa qualidade projetual dos edifícios se dá por


muitos aspectos, como clareza, pertinência, eficiência
e economia, além do fato das fachadas não sugerirem
decisões associadas a estilos, figuras ou modelos, excluindo
a arbitrariedade e o exagero. São obras concisas e
consistentes, captadas pelo olhar e rapidamente associadas
à estética moderna. Além disso, “não há mediação entre
as partes porque há precisão construtiva e as medidas
justas correspondem a múltiplos” (ESPALLARGAS GIMENEZ,
2009).

Isso se aplica também aos ambientes, que são


uma “sucessão de quadriláteros regulares e íntegros a
partir da laje que é seu retângulo maior”, gerando plantas
sintéticas que resolvem a questão funcional. (ESPALLARGAS
GIMENEZ., 2009).

Hoje em dia, e já há alguns anos, nota-se uma


situação bem diferente O tema “habitação vertical” está
fatalmente vinculado à produção comercial voltada ao
lucro, menosprezando o projeto e colocando-o em um
papel secundário. Edifícios são indiscriminadamente
copiados por toda a cidade, resultando em obras que não
foram pensadas para o terreno onde elas se encontram,
Edifício Paulicéia - Jacques Pilon (colaboração de Gian Carlo Gasperini) - 1958 ignorando assim a relação com ele e com a cidade.
Fonte: Revista Acrópole nº246, 1958, p. 205

“Nessa modernidade cenográfica, a intenção


plástica se sobrepõe e é absolutamente
independente do programa de necessidades e
condiciona ou domina à sua vontade caprichosa
o sistema estrutural”. (LEMOS, 2005)

No início dos anos 60, com a consolidação do
modelo de morar em edifícios verticais, a demanda
cresceu abruptamente fazendo com que as construtoras
passassem a fazer uso de soluções mais simplificadas, com
o intuito de diminuir custos e prazos. Assim, as decisões de
projeto passaram das mãos dos arquitetos para as mãos do
incorporador resultando no tipo de edifícios massificados
que encontramos hoje por toda a cidade de São Paulo.
Edifício Paulicéia - Jacques Pilon (colaboração de Gian Carlo Gasperini) - 1958
Fonte: Revista Acrópole nº246, 1958, p. 206
Por um lado há este tipo de construção sem
atributos, e por outro, há o tipo de arquiteto que ao
tentar combater esta monotonia acaba esbarrando em
soluções “pretensiosas, caras e inclusive ineficientes”, que
podem surpreender pela imponência, elevando o nome
do autor, mas que na verdade ocultam grandes falhas no
uso dos materiais e nos demais aspectos construtivos.
(ESPALLARGAS GIMENEZ., 2009)
13
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Capítulo 2
Modernidade de berço: a trajetória de Adolf Franz Heep
da Europa ao Brasil
Este capítulo10 tratará brevemente da vida e obra
de Adolf Franz Heep, desde a sua formação européia à
sua produção no Brasil, para que se compreenda melhor
como o contexto de sua época definiu o seu perfil como
arquiteto, ressonando diretamente em seu trabalho na
cidade de São Paulo.

Adolf Franz Heep é natural da cidade de Fachbach,


Alemanha; nasceu no dia 24 de julho de 1902. Estudou
arquitetura na Escola de Artes e Ofícios de Frankfurt,
que assim como a Bauhaus11, foi uma escola que sofreu
profundas reformas no ensino da arte e da arquitetura;
entre outros fundamentos, a nova tendência enfatizava a
necessidade do projeto se voltar para uma prática afinada
com as realidades contemporâneas, baseada na separação
daquilo que é meramente arbitrário do que é essencial e
típico, sem abrir mão da criatividade e do design.

Na escola de Frankfurt, Heep teve a oportunidade


de ser aluno de Walter Gropius e Adolf Meyer, com quem
Bairro Höhenblick - Frankfurt - Alemanha
Fonte: http://farm3.static.flickr.com/2026/2303433900_5e48cab5e6.jpg?v=0 posteriormente trabalhou na prefeitura de Frankfurt, entre
1924 a 1928. Neste período, a construção dos bairros
de Höhenblick e Römerstadt12, de Ernst May, ocorriam
na cidade; lá já se utilizavam métodos de construção
industrializada com o uso de paredes em painéis pré-
fabricados e caixilharias padronizadas, elementos que
comparecerão em seu trabalho no Brasil, décadas depois.
Na mesma época em que Heep trabalhava em Frankfurt,
ocorria o II CIAM, em 1929, nesta mesma cidade, com o
tema “A moradia para o mínimo da existência”.

Diante desses fatos, é possível inferir que a


formação da personalidade arquitetônica de Heep se deu
num contexto em que racionalização, padronização e pré-
Bairro Römerstadt - Frankfurt - Alemanha fabricação, eram itens amplamente discutidos e difundidos
Fonte: http://farm3.static.flickr.com/2026/2303433900_5e48cab5e6.jpg?v=0
nas práticas profissionais arquitetônicas da Alemanha, que
se espalharam posteriormente para o mundo.

No ano de 1928, Heep se mudou para Paris.


Trabalhou por um curto período no escritório de André
Lurçat13, que o apresentou a Le Corbusier; Heep colaborou
com o mestre franco-suíço por quatro anos, devido à sua já
considerável experiência adquirida em canteiros de obras.
(10) - As informações presentes neste capítulo foram compiladas a partir das seguintes obras:
BARBOSA, Marcelo Consiglio. A obra de Adolf Franz Heep no Brasil. Dissertação [Mestrado em Arquitetura e Urbanismo] - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São
Paulo, 2002; GATTI, Catharine. Perfil do arquiteto - Franz Heep. Revista Projeto nº 97, São Paulo, março de 1987, p. 98-104
(11) - A Bauhaus foi uma escola de design, artes plásticas e arquitetura de vanguarda que funcionou entre 1919 e 1933 na Alemanha (ARGAN, Giulio Carlo; Arte moderna; São Paulo:
Editora Companhia das Letras, 1992)
(12) - Höhenblick e Römerstadt são bairros de Frankfurt cujos projetos foram desenvolvidos por Ernrst May, H. Boehm e C.H. Rudloff (BARBOSA, 2002, p.17)
(13) - André Lurçat, arquiteto modernista francês, estudou na Ecole des Beaux-Arts de Nancy, e possuia um escritório de arquitetura, design de móveis e urbanismo em Paris nos anos
1930. (COHEN, Jean-Louis. André Lurçat (1894-1970): l’autocritique d’un moderne, IFA, 1995.)
14
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Em 1932, Heep ficou sócio do polonês Jean


Ginsberg14. Eles tiveram a oportunidade de projetar alguns
edifícios residenciais em Paris que se tornariam referência
de qualidade para a arquitetura destinada ao mercado
imobiliário da época. O método racional, que conciliava
uma arquitetura capaz de atender às necessidades da
classe média com baixo custo de execução, primava pela
ausência de formalismos gratuitos, porém, sem abrir
mão de um bom aspecto estético, em concordância com
a época. No ano de 1945, Heep encerra a parceria com
Ginsberg e volta para a Alemanha, arrasada pela guerra.

O despedaçado ambiente europeu do pós-guerra,


fez com que muitos profissionais de várias áreas realizassem
uma verdadeira diáspora, em busca de campos de trabalho
Capa do livro “Brazil Builds”
Fonte: http://www.coverbrowser.com/image/dust-jackets/1653-5.jpg mais férteis. No âmbito da arquitetura, a Europa pouco
acesso em maio de 2009 tinha a oferecer, devido a um cenário econômico precário,
tornando a profissão do arquiteto subordinada a trabalhos
de reconstrução.

A divulgação na Europa do livro “Brazil Builds”


despertou o interesse desses profissionais desiludidos pela
destruição da guerra, soando como uma possibilidade da
produção de uma arquitetura de vanguarda, num pais em
desenvolvimento, com muito a se fazer.
Lina Bo Bardi Gian Carlo Gasperini
A arquiteta italiana Lina Bo Bardi, que imigrou da
Itália para o Brasil em 1946, descreve assim sua reação ao
ter contato com o livro “Brazil Builds”:
“Quando estava no último ano de faculdade, saiu
um livro sobre a grande arquitetura brasileira,
que, naquele tempo, no imediato pós-guerra,
foi como um farol de luz a resplandecer num
campo de morte (...) era uma coisa maravilhosa.”
(PROJETO, 1992, p.64)

Lucjan Korngold
Além de Lina, nomes como Lucjan Korngold
Gian Carlo Palanti
(Polônia), Hans Broos (Áustria), Giancarlo Palanti (Itália),
Gian Carlo Gasperini (Itália), Victor Reif (Polônia) entre
muitos outros, vieram ao Brasil, onde viveram e obtiveram
muito êxito na prática arquitetônica.

Com Adolf Franz Heep não foi diferente. Ele chegou
ao Brasil em 1947; passou alguns dias no Rio de Janeiro e
logo veio à capital paulista. Elgson Ribeiro Gomes15, que
trabalhou muitos anos com Heep em São Paulo, relata em
entrevista a Friedrich Blanke uma história sobre a chegada
Hans Broos do arquiteto a São Paulo:

(14) -Jean Ginsberg, arquiteto polonês, foi para Paris no ano de 1924; estudou na Ecole Spéciale D’architecture e abriu seu escritório na mesma cidade em 1930. Foi sócio de Franz Heep
de 1932 a 1945. (BARBOSA, 2002, p. 20)
(15) - Elgson Ribeiro Gomes é arquiteto formado pela Universidade Mackenzie. Trabalhou no escritório de Franz Heep nos anos 1950. Em 1959, se mudou para Curitiba, onde contribuiu
para a consolidação da arquitetura moderna local. (GNOATO, L. Salvador P. Arquitetura e urbanismo de Curitiba – transformações do Movimento Moderno. Tese de Doutorado: FAU USP,
São Paulo, 2002)
15
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

“Heep chegou em São Paulo de trem e se hospedou


num hotel próximo à estação da Luz. Ao olhar os detalhes
horrorosos das janelas do quarto em que ele estava, logo
pensou: “eu sei fazer detalhes de janelas muito melhores;
serei feliz neste país”.

Certamente, Heep buscava, no progresso


econômico que a cidade de São Paulo vivia e na citada
vanguarda arquitetônica que havia no Brasil de então, uma
atraente possibilidade para exercer a sua arquitetura. Além
disso, alguns familiares de sua esposa já residiam no Brasil,
fator que contribuiu para a sua vinda.

Heep foi procurar emprego; saiu pela cidade de


Figura de Jacques Pilon São Paulo olhando as placas de grandes obras, a fim de
Fonte: http://www.revistaau.com.br/arquitetura-urbanismo/176/
arquiteto-empreendedor-116503-1.asp
conhecer os escritórios. A placa com o nome de Jacques
acesso em maio de 2009 Pilon chamou a sua atenção, por ser um nome francês,
cuja língua era de total domínio para ele.

Franz Heep procurou Jacques Pilon, que possuía um


dos maiores escritórios de projetos de São Paulo na época.
A experiência adquirida por Heep em seus trabalhos com
Jean Ginsberg e Le Corbusier, além da fluência na língua
francesa, foram decisivas para a sua contratação por
Pilon, que também fora um arquiteto imigrante, mas em
condições totalmente diferentes das de Heep.

Trabalhando no escritório de Pilon, Heep contribui


muito para a mudança do perfil projetual do escritório,
ainda vinculado aos estilos acadêmicos e ao Art Decò. O
Edifício Davina Lara Nogueira
principal exemplo disso, é a alteração do projeto da nova
São Paulo - 1949 - J.Pilon e F. Heep sede do jornal O Estado de S. Paulo.
Foto: Edson Lucchini Jr.

Ainda no escritório de Pilon, Heep desenvolve


diversos edifícios comerciais e residenciais; entre os
destinados às moradias, encontram-se o edifício Davina
Lara Nogueira, situado na avenida São João e o Tinguá,
situado no largo do Arouche. Ambos encontram-se na
relação dos vinte e um edifícios residenciais de Heep em
São Paulo, pré-selecionados para análise neste trabalho.

Heep trabalhou no escritório de Pilon até 1950;


neste mesmo ano, montou uma sociedade com Henrique
Mindlin16, que durou pouco tempo. No ano de 1952,
Heep abre o seu prório escritório, situado na rua Barão de
Itapetininga, centro da cidade de São Paulo.
Edifício Tinguá
São Paulo - 1949 - J.Pilon e F. Heep
Foto: Edson Lucchini Jr.

(16) - Henrique Mindlin (1911-1971) formou-se engenheiro-arquiteto pela Universidade Mackenzie em 1932.
16
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

No mesmo ano da abertura de seu escritório,


Heep estabelece uma parceria com a construtora de
Otto Meinberg, voltada principalmente para o mercado
imobiliário habitacional, mas que também produziu
o edifício mais célebre de Heep: o Itália, de caráter
comercial.
“A atuação de Heep foi fundamental para
o sucesso dos empreendimentos de que
participou, graças ao método de trabalho, ao
profissionalismo, ao gosto pelo detalhe e à
preocupação com o rigor tecnológico no canteiro
de obras”. (BARBOSA, 2002, p. 89)

O período que vai de 1952 a 1962 foi o que


compreendeu a maciça produção de Heep como
arquiteto. Nestes anos foram projetados vinte e um
edifícios residenciais em São Paulo que atenderam, desde
as classes mais abastadas, com os luxuosos edifícios
de Higienópolis, até as mais humildes, com os grandes
edifícios de kitchenettes do centro. Além disso, Heep
projetou inúmeros edifícios comerciais, fábricas e casas. As
obras mais significativas deste período serão comentadas
mais adiante.

Dos dez edifícios a serem analisados neste trabalho,
Ed. Normandie - Adolf Franz Heep - 1953 - Kitchenettes cinco foram produzidos pela parceria Heep-Meinberg, que
Fonte: Revista Acrópole 219, 1957, p.95. durou até 1962. São eles o Ouro Verde, Icaraí, Ibaté, Ouro
Preto e Guaporé. Porém, dentre os vinte e um edifícios
residenciais conhecidos de Heep em São Paulo, doze são
fruto desta parceria com Meinberg.

Heep estabeleceu outras parcerias, além da que


tinha com Otto Meinberg; outra muito importante foi com a
Construtora Auxiliar17. Com ela, Heep teve a oportunidade
de projetar seu edifício residencial mais conhecido, o
Lausanne, além das torres gêmeas Lugano e Locarno e o
edifício Lucerna, que abrigava o cine Comodoro18. Os três
estão dentro da amostra a ser analisada neste trabalho.

No período entre 1958 e 1965, Heep envolve-se


com a área acadêmica, lecionando a disciplina de projeto
na Faculdade de Arquitetura da Universidade Mackenzie.

Em 1972, com problemas cardíacos, Heep muda-se


para a cidade do Guarujá, no litoral paulista, onde continua
trabalhando até 1975; neste ano, Heep inicia um processo
de arteriosclerose. Em 1978, sua esposa o leva de volta a
Ed. Lausanne - Adolf Franz Heep - 1953 - Alto padrão Paris, onde falece no dia 4 de março.
Fonte: Revista Acrópole 239, 1958, p.504.

(17) - Informações mais detalhadas sobre a Construtora Auxiliar estão presentes na página 278
(18) - Informações mais detalhadas sobre o Cine Comodoro estão presentes na página 160
17
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Capítulo 3
Algumas obras não residenciais significativas19
Apesar do objeto desta pesquisa serem os edifícios
residenciais produzidos por Franz Heep em São Paulo,
cabe realizar, de modo geral, um apanhado de outras
obras importantes do arquiteto, dentro e fora da capital
paulista.

3.1- Edifício do Jornal O Estado de São Paulo

Este icônico edifício da cidade de São Paulo foi


concebido inicialmente por Jacques Pilon, no ano de 1946,
em estilo Art Decò. Quando foi contratado para trabalhar
no escritório de Pilon, Heep teve a oportunidade de
desenhar uma nova proposta de fachada para o edifício,
encomendado por Julio de Mesquita, dono do jornal O
Estado de São Paulo.

Devem-se a Heep a inserção dos painéis de Di


Cavalcanti e a concavidade do chanfro que forma a
Ed. O Estado de São de São Paulo - 1948 fachada principal, conferindo ao edifício um interessante
Foto: Edson Lucchini Jr. entendimento da esquina e marcando-a incisivamente.
Outra grande contribuição de Heep para o projeto é a
solução dos brise-soleils móveis; foi a primeira vez que eles
foram utilizados numa obra deste porte em São Paulo.

Mesquita se entusiasmou com a nova proposta, que


começou a ser executada em 1948, elevando o patamar de
Heep dentro do escritório de Pilon, de mero desenhista,
para um cargo de chefia.

Ed. O Estado de São de São Paulo - 1948 Ed. O Estado de São de São Paulo - 1948
Foto: Edson Lucchini Jr. Fonte: Revista Acrópole 181, 1953, p.485.

(19) - As informações presentes neste capítulo foram compiladas a partir das seguintes obras:
BARBOSA, Marcelo Consiglio. A obra de Adolf Franz Heep no Brasil. Dissertação [Mestrado em Arquitetura e Urbanismo] - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São
Paulo, 2002;
GATTI, Catharine. Perfil do arquiteto - Franz Heep. Revista Projeto nº 97, São Paulo, março de 1987, p. 98-104, além de pesquisas realizadas por Friedrich Blanke para a realização de sua
tese de doutoramento.
18
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

3.2- Edifício Casa da França

Este também foi um projeto desenvolvido por Heep


dentro do escritório de Jacques Pilon; situa-se no centro
do Rio de Janeiro, muito próximo ao célebre edifício do
Ministério da Educação e Saúde. Foi construído com apoio
do governo da França e da colônia oriunda deste país
radicada no Brasil. O projeto data de 1950.


3.3- Edifício Souza Naves

O Souza Naves é um edifício público, desenvolvido
por Heep, já em seu próprio escritório, em parceria com
Elgson Ribeiro Gomes. O projeto era destinado ao Instituto
de Pensões e Aposentadorias dos Servidores do Estado
(IPASE). Está localizado na cidade de Curitiba e seu projeto
data de 1953.

3.4- Edifício São Marcos


O São Marcos é um edifício de escritórios projetado
por Heep em 1959, na cidade de São Paulo. Possui fachadas
voltadas para três alinhamentos sendo que a principal
Ed. Casa da França - Rio de Janeiro - 1950 - J. Pilon e F. Heep
Fonte: Revista Acrópole 217, 1956, p.22.
volta-se para a Praça da Sé. As demais voltam-se para a rua
XV de Novembro e Anchieta. Destacam-se neste edifício,
a fachada ritmada pela caixilharia. A predominância dos
envidraçamentos se dá pela orientação sul da fachada
principal, que se volta para a Praça da Sé. A fachada norte,
muito sombreada pelos edifícios vizinhos, também conta
com muitas superfícies envidraçadas.

Ed. Souza Naves - Curitiba - 1953 - F. Heep e Elgson R. Gomes Ed. São Marcos - São Paulo - 1959 - Adolf Franz Heep
Fonte:http://circulandoporcuritiba.blogspot.com/2010_03_01_ Foto: Edson Lucchini Jr.
archive.html - acesso em maio de 2010
19
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

3.5- Edifício Itália

O edifício Itália, além de ser a obra mais conhecida


de Adolf Franz Heep, é um dos maiores ícones da produção
edilícia vertical paulistana e brasileira do século XX.
“Representante da influência norte-americana
de crescimento vertical metropolitano, e mesmo
apresentando pouca altura em relação aos
marcos estrangeiros que lhe eram referências,
o edifício Itália representou para a época uma
conquista ímpar ao alcançar, em 1959, a altura
de 151 metros, sendo considerado o edifício mais
alto da América Latina e o mais alto do mundo
em estrutura de concreto armado (...)”.
(XAVIER, 2007, p. 75)
A inserção do Itália se deu em um terreno situado
numa das esquinas mais importantes do centro da cidade
de São Paulo: a da avenida Ipiranga com a São Luiz; o
entorno já era bastante ocupado por edifícios verticais,
levando Heep a uma habilidosa solução em que edifícações
Ed. Itália - São Paulo - 1956 Ed. Itália - São Paulo - 1956 mais baixas, pertencentes ao conjunto do Itália, dialogam
Foto: Edson Lucchini Jr. Fonte: Revista Acrópole 210, 1956, p.222. com o gabarito do entorno, liberando o corpo principal
para um desenvolvimento vertical pleno. Desta forma,
o resultado foi um conjunto harmonioso que possui um
grande entendimento do entorno e da esquina, e se tornou
um ponto focal no centro da cidade.
“O projeto exibe em cada decisão o seu evidente
comprometimento com os princípios modernos
de converter a ação projetiva numa ação
racional”. (XAVIER, 2007, p. 78)
Além da precisão de sua inserção urbana, o Itália
também conta com elementos inovadores no que diz
respeito à “dinâmica de circulação”20 do edifício , além de
questões espaciais, estéticas e estruturais.

Ed. Itália - São Paulo - 1956 Perspectiva do saguão do ed. Itália - São Paulo - 1956
Foto: Edson Lucchini Jr. Fonte: Revista Acrópole 210, 1956, p.229.

(20) - Termo extraído de (XAVIER, 2007, p. 78)


20
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

3.6- Igreja São Domingos

Em 1953 Heep projetou para os Dominicanos a


Igreja São Domingos, situada no bairro de Perdizes, em São
Paulo. A conclusão da obra se deu no ano de 1961.
“A volumetria baseia-se no conceito da nave única,
onde um teto de casca de concreto abobadada,
apoia-se em paredes estruturais em zigue-zague
alternando empenas cegas e vazadas, sendo que
as aberturas voltadas para as faces de maior
insolação projetam uma luz natural intensa no
sentido do altar proporcionando uma sensação
de amplitude e leveza no espaço interior (...)”.
(BARBOSA, 2002, p. 162)
O campanário situa-se no topo de volume que conta
com 34 metros de altura e uma planta quadrada, com seus
cantos arredondados. Este volume, todo perfurado por
losangos, contrapõe a horizontalidade do bloco que contem
Igreja São Domingos - São Paulo - 1953 a nave, tornando-se um marco visual para o bairro.
Fonte: Revista Acrópole 325, 1965, p.41.

Igreja São Domingos - São Paulo - 1953


Fonte: Revista Acrópole 325, 1965, p.43.

Igreja São Domingos - São Paulo - 1953 Igreja São Domingos - São Paulo - 1953
Fonte: Revista Acrópole 325, 1965, p.43. Fonte: Revista Acrópole 325, 1965, p.41.
21
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Capítulo 4
A cidade que mais cresce no mundo: panorama da
modernização e verticalização de São Paulo no pré e pós
2ª guerra.

Neste capítulo pretende-se abordar, através de


uma ampla, mas breve revisão bibliográfica, os principais
elementos que conformam a transformação e verticalização
da cidade de São Paulo. Estes processos se iniciam alguns
anos antes da 2ª grande guerra, e se consolidam após ela,
época em que a cidade vem a se afirmar como metrópole
industrial pujante.

As décadas de 1930 e 1940 foram marcadas pela


afirmação das propostas modernistas, concomitantemente
com os primeiros movimentos de verticalização de São
Paulo, não somente no centro histórico, mas também no
centro novo21, Bela Vista e Higienópolis.

A legislação já começava a se adaptar à nova


realidade emergente vertical da cidade. O Código Arthur
Saboya22, de 1929, permitiu a construção de edifícios fora
da área central.

O Plano de Avenidas, elaborado por Prestes


Maia, é um importante elemento que, além do papel de
estruturação viária da cidade, definiu vetores23 de expansão
da verticalização na cidade de São Paulo. Dois deles são a
avenida São João, alargada e reformada com o plano, e a
9 de Julho, que foi construída. Considerações um pouco
mais detalhadas acerca do Plano de Avenidas serão vistas
mais adiante na análise do edifício Normandie (ver p.50),
situado na 9 de Julho e de autoria de Adolf Franz Heep.

Durante o período da 2ª grande guerra, a indústria


da construção em São Paulo foi fortemente abalada pela
interrupção da importação de itens fundamentais. A
incipiente indústria nacional ainda não era capaz de suprir
todas as demandas do canteiro, não só pelo seu atraso
tecnológico, mas também pela incapacidade de produzir
chegando a preços finais competitivos com o material
importado.

Somando-se a isso, as sucessivas leis de inquilinato,


iniciadas a partir de 1942, congelaram os preços dos
São Paulo em 1949
aluguéis, e acabaram desestimulando um importante
Fonte: http://obviousmag.org/archives/2006/03/angulos_paulist.html nicho de mercado da época que era o da construção para
acesso em maio de 2010
aluguel, gerando uma enorme crise habitacional. Naquele

(21) - Entende-se por “centro novo” de São Paulo, a parte dele que transpôs o Vale do Anhangabaú em direção ao oeste.
(22) - O “Código de Obras Arthur Saboya” teve sua promulgação como lei municipal nº 3.427 em 1929
(23) - Termo extraído de (FIGUEROA, 2002)
22
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

momento, a promoção privada vinha sendo incapaz de


suprir as necessidades de moradia de uma cidade em
crescimento populacional descontrolado.

O quadro ao lado comprova, em números de


construções por ano, os efeitos da crise durante os anos
da 2ª grande guerra, seguida por uma grande recuperação
nos anos seguintes.

A grande massa proletária, agora engrossada pelos


migrantes nordestinos, foi obrigada a resolver os seus
problemas de habitação com os seus próprios recursos,
Fonte: AMARAL DE SAMPAIO, 2002 p.145 com a construção de casas feitas por eles próprios em
loteamentos clandestinos em terreno residuais entre as
áreas industriais juntos à orla ferroviária. Mesmo assim, a
carência de casas populares foi crescendo abruptamente
até os dias de hoje. Ao contrário, a classe média, incapaz
de construir com suas próprias mãos, encontrava-se sem
saída, devido à escassez de imóveis para comprar e alugar.
(AMARAL DE SAMPAIO, 2002 p.121)

Com o fim da guerra, São Paulo viveu um crescimento


industrial acelerado que impulsionava os demais setores
econômicos, intensificando o processo de verticalização da
cidade, que abriu as portas para a colocação em prática
de alguns dos ideais, formas e técnicas propostos pela
arquitetura moderna, graças à grande e intensa demanda
por projetos de edifícios de todos os tipos, porém agora,
Av. São João em 1952
Fonte:http://br.geocities.com/giba_fotografo/paginafotosdesp03.htm não mais para aluguel, e sim para venda. É o momento da
acesso em agosto de 2009 gênese do mercado da incorporação em São Paulo.

”Surge nesse momento a figura do incorporador


imobiliário, o promotor de ofertas de uma nova
mercadoria, o apartamento em condomínio.
E, até certo ponto, essa recente figura veio
também se definir como uma espécie de
agente cultural a condicionar as necessidades
ou as expectativas da classe média a soluções
programáticas ainda não experimentadas e até
a novas tendências arquitetônicas”. (AMARAL
DE SAMPAIO, 2002 p.121)

As feições da cidade de São Paulo passam por
profundas mudanças, já que o modelo de verticalização
muda do paradigma europeu, de “compleição compacta
e de verticalidade moderada” para o americano, que
Construção do Edifício Copan - Oscar Niemeyer - 1954 consiste na cidade “congestionada e vertical”. (SOMEKH,
Fonte: http://cidadecopan.zip.net/images/copan_construcao_baixa.jpg 1987, p.52)
acesso em maio de 2010
23
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Esta conjuntura de “boom” imobiliário configurou


um campo muito fértil para os arquitetos brasileiros, tanto
aqueles formados em escolas locais como os arquitetos
estrangeiros que se radicaram aqui devido às contingências
da guerra européia e graças às possibilidades abertas por
essa efervescência cultural e econômica.

São Paulo, nesses anos, é um local de transformações


rápidas, já que a população mais que duplica seu tamanho
entre 1940 e 1950. Ao mesmo tempo, via-se a verticalização
maciça do centro e a expansão horizontal dos limites da
cidade.
“É o momento da criação dos museus, das
comemorações do quarto centenário e da
instituição das bienais. Surgiram novos prédios
de apartamentos, teatros, salas de cinemas,
museus, etc. onde os arquitetos participavam
da construção das novas feições da metrópole.
Esse processo foi promovido especialmente
pelo mercado imobiliário, com os arquitetos
modernos disputando diretamente o gosto do
Cartaz com o símbolo das comemorações do IV Centenário - 1954
Fonte: http://www.sampa.art.br/images/142.jpg
público para os novos lançamentos”.
acesso em maio de 2010 (SANCHES, 2004, p.89)

Dentro deste contexto de verticalização e
modernização, é possível destacar o bairro de Higienópolis
como um exemplo de grande relevância. Na presente
pesquisa, serão estudados três edifícios de Adolf Franz
Heep construídos neste bairro; diante disto, se torna válida
uma breve introdução acerca dele.

A construção dos edifícios residenciais em


Higienópolis ocorreu mais precisamente em sua parte
mais antiga, onde predominavam os maiores palacetes,
com os maiores lotes, sendo assim, as áreas de maior
valor. Estes palacetes, já então com 40 ou 50 anos de
idade, encontravam-se abandonados por seus antigos
proprietários, que os alugavam para o uso de pensões,
e em alguns casos, cortiços. Suas dimensões generosas
demandavam uma enorme e onerosa criadagem, além do
programa arquitetônico e instalações obsoletos.

Construção dos edifícios Lugano e Locarno na av. Higienópolis - 1959 Esses fatores fizeram com que os casarões virassem
Verticalização avançando sobre os palacetes
Fonte: http://www.sampa.art.br/images/142.jpg
alvo do novo mercado imobiliário, já que esses terrenos,
acesso em maio de 2010 além de todas as suas boas características espaciais, ainda
se encontravam numa região da cidade já dotada de uma
boa infra-estrutura.
24
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

“Com a derrubada dos casarões e sua substituição


progressiva por prédios de apartamentos, o
bairro perde as suas características horizontais,
mas mantém o seu traçado original, suas ruas
arborizadas e o predomínio de boas construções.
As condições de vida talvez não sejam como as
do passado, mas o bairro ainda conserva um
modelo padrão e que se destaca dos demais
bairros que o cercam. O bairro ainda é uma
referência”. (GAGGETTI, 2000, p.121)

As novas construções verticais no bairro de


Higienópolis impulsionam um processo de modernização
de todos os serviços, no âmbito público e privado. Algumas
casas térreas e de dois pavimentos, que escaparam
da demolição para construção de edifícios, se tornam
comércios..
Ilustração da avenida Angélica nos anos 1940
Fonte: acervo de Marco Agneli “Os postos de gasolina, originalmente em estilo
neocolonial são reformados de modo a se
adaptarem ao prevalecente espírito moderno.
Outros mais são construídos nas esquinas de
maior movimento, em especial na Avenida
Angélica” (MACEDO, 1987, p.113)

Com o rápido crescimento do número de


automóveis, diversas mudanças nas regras de tráfego, como
mudanças em mãos de direção e alargamentos, começam
a ser adotadas.

“[...] a Avenida Angélica é alargada e perde a


sua arborização original. As ruas recebem novos
Avenida Angélica atualmente serviços públicos e os equipamentos urbanos
Fonte: www.artistaseartes.com.br/img/3465/3465_1.jpg são implantados de modo a facilitar a vida dos
acesso em maio de 2010
moradores”(MACEDO, 1987, p.113)

No início do processo de verticalização do bairro
de Higienópolis, as famílias que viviam nos casarões não
aceitaram prontamente a idéia de morar em edifícios
verticais, cujo modelo ainda não tinha se consolidado entre
as classes mais abastadas. A presente pesquisa conta, mais
adiante, com uma análise do edifício Lausanne (p.24),
em que serão comentados brevemente alguns aspectos
referentes a esta transição sobre o modo de morar; dos
palacetes aos edifícios.
Parte II
Os edifícios: objetos de estudo
26
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Capítulo 5
5.1 - Critérios metodológicos de análise

Este capítulo, onde se iniciam os assuntos referentes


ao objeto de estudo desta pesquisa, tem como objetivo a
instrução a respeito da estrutura de análise adotada para
os dez edifícios selecionados24.

A análise de cada edifício conta com a seguinte


estrutura metodológica:

• Fichamento inicial: a primeira página de cada


análise é uma ficha que identifica o edifício a ser estudado,
possuindo, sempre que possível, uma perspectiva ou foto
de época dele, além de informações resumidas sobre as
suas características fundamentais; são elas:

- Ano de projeto e conclusão da obra;


- Endereço e localização - foto aérea do edifício e
do entorno;
- Construção - construtora que executou a obra;
- Terreno - área e geometria do lote;
- Unidades - área e tipos de apto. do edifício;
- Publicações - períódicos, livros e revistas em que
o edifício tenha sido publicado;
- Coeficiente de aproveitamento - índice numérico
que revela em quantas vezes se multiplicou a área
do lote para se obter a área total do edifício.
- Taxa de ocupação - porcentagem de ocupação da
projeção do edifício no lote.
- Conservação - estado atual de conservação e
manutenção do edifício;
- Descaracterização - o quanto o edifício se
encontra atualmente descaracterizado em
relação ao projeto original.

• Contextualização: Cada análise conta com um


breve histórico sobre o bairro, a praça ou a via em que o
edifício se situa, além da menção à construções notáveis
próximas a ele, se existirem.

• Temas de análise: em todas as obras escolhidas,


serão identificados o maior número possível de elementos
que compõe o edifício, subdivididos em alguns temas de
análise; são eles:

(24) - Os Critérios sobre a escolha desta amostra de dez edifícios são comentadas no item de nome “Metodologia de trabalho”, na página 7
27
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

- Terreno, implantação, volumetria e entorno;


- Térreo e subsolo;
- Circulação vertical;
- Pavimento tipo e unidades;
- Estrutura;
- Fachadas;
- Detalhes construtivos;
- Situação atual.

• Desenhos técnicos: Todos os edifícios foram


modelados digitalmente, produzindo perspectivas que
foram dispostas de acordo com o texto. Após as análises
textuais, as páginas que seguem contam com desenhos
técnicos como plantas, cortes e fachadas, sempre que
possível em escala 1:250.

• Resumo: A última página de cada análise conta


com um breve resumo de alguns elementos do edifício,
exemplificados por perspectivas.

Fotos atuais e de época, desenhos extraídos de


revistas, livros e artigos, além de croquis e esquemas,
ilustram as situações colocadas nas análises e descrições
textuais, visando uma maior compreensão delas.

5.2 - Critérios de ordenação das análises

O critério de ordenação dos edifícios foi de cunho


cronológico, baseado no ano de início do projeto de cada
um. Alguns edifícios foram projetados no mesmo ano,
tornando-se difícil o arranjo deles pelo critério cronológico;
nestes casos, a ordenação foi aleatória. Deste modo, a
ordem adotada dos edifícios a serem analisados é:

1 - Edifício Ouro Verde, 1952;


2 - Edifício Normandie, 1953;
3 - Edifício Icaraí, 1953;
4 - Edifício Ibaté, 1953;
5 - Edifício Lausanne, 1953;
6 - Edifício Ouro Preto, 1954;
7 - Edifício Lucerna (cine comodoro), 1954;
8 - Edifício Araraúnas, 1955;
9 - Edifício Guaporé, 1956;
10 - Edifícios Lugano e Locarno, 1958.
28
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

5.3- Tabela geral dos edifícios a serem analisados


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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1952, Ouro Verde

1953, Normandie

1953, Icaraí

1953, Ibaté

1953, Lausanne

1954, Ouro Preto

1954, Lucerna
cine Comodoro

1955, Araraúnas

Capítulo 6
As análises 1956, Guaporé

1958, Lugano e
Locarno
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Foto: Edson Lucchini Jr.


6.1 Edifício Ouro Verde 1952-54
endereço e localização
Rua Piauí 359 (esq. R. Sabará) - Higienópolis
r. m
ara
nhã
o

á
bara
r. s


m
tai
r. p

r.
iauí
mackenzie

construção
Otto Meinberg S.A.

terreno
Retangular - 533 m²

unidades
Térreo:
1 ap. zelador de 50m², 1 ap. de 71m²,
1 ap. de 90m²
1º ao 8º pav:
1 ap. de 153m2, 1 ap. de 156m²
9º pav.:
1 ap. de 96m², 1 ap. de 113m²
10º pav.:
1 ap. de 160m²
Total: 22 unidades
c o e f. d e a p ro ve i ta m e nto
7.45 - Área total = 3970m²

taxa de ocupação
63 %

conservação
Boa

descaracterização
Média
32
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O edifício Ouro Verde situa-se no bairro de


Higienópolis25, cujas características serão vistas nas
análises posteriores dos edifícios Lausanne (p.113) e
Lugano e Locarno (p.226). Situa-se na esquina entre as
ruas Piauí e Sabará, a apenas um quarteirão do campus da
Universidade Presbiteriana Mackenzie. O edifício é um dos
primeiros a ser executado pela parceria Franz Heep - Otto
Meinberg26, além de ser o único que se encontra fora do
centro da cidade, de todos os projetados e construídos pela
dupla. O Ouro Verde conta com unidades que variam entre
70m² com um dormitório, a 160m², com três dormitórios,
o que leva a crer que o edifício possa ter sido pensado
para atingir públicos distintos, englobando moradias
destinadas à famílias das classes média e alta à estudantes
universitários.
Placa de Otto Meinberg no térreo do Ouro Verde
Foto: Edson Lucchini Jr.

Terreno, implantação, volumetria e entorno

O terreno, cuja geometria só não é perfeitamente


retangular devido ao chanfro que alinha-se à esquina,
possui uma face de 24,80m alinhada com a rua Piauí e
rua sabará

outra de 17,42m alinhada com a rua Sabará; o chanfro que


bloco principal acompanha a esquina mede 3,60m de comprimento. A face
oposta à da rua Sabará mede exatos 20,00m e a oposta à
rua Piauí, 26,80m. Quanto à topografia, há um leve aclive no
sentido diagonal do lote de aproximadamente um metro,
no sentido do chanfro da esquina à sua face oposta; deste
modo, o ponto mais baixo do terreno situa-se na região
rua piauí Pavimento térreo próxima à esquina.

O partido de implantação acompanha a geometria


do lote, com exceção do chanfro, definindo um volume
isolado, recuado em 2,00m do alinhamento com a rua Piauí
e 3,00m na face oposta, além de 3,70m do alinhamento com
a rua Sabará e mais 3,00m em sua face oposta. O volume
é composto por térreo mais dez pavimentos; a sua relação
proporcional é de 21,00m de comprimento por 16,00m
de largura e 28,35m de altura; porém, os 3,00m de altura
que correspondem ao térreo, possuem as faces voltadas
para a rua Piauí e Sabará recuadas 1,00m em relação às
mesmas faces nos andares superiores, definindo uma
separação clara entre o térreo e o corpo principal. Os dois
últimos pavimentos (9º e 10º) recuam-se sucessivamente
nas faces voltadas para as ruas Piauí e Sabará gerando
um escalonamento, fruto das imposições da legislação da
época.

(25) - Considerações sobre o bairro de Higienópolis também podem ser encontradas na página 23
(26) - Informações mais detalhadas sobre a parceria entre Franz Heep e Otto Meinberg podem ser encontradas na página 16
33
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

As duas fachadas principais do edifício, voltadas


para as ruas Piauí e Sabará, são orientadas a nordeste e
noroeste respectivamente; todos os ambientes de estar e
repouso dos apartamentos voltam-se para estas faces.

O entorno do Ouro Verde é densamente


verticalizado e composto por edifícios de gabarito
semelhante; todos os edifícios que o ladeiam ao longo
da rua Sabará possuem alturas parecidas, compondo
uma fachada uniforme para a quadra. Já na rua Piauí, há
um edifício de 20 pavimentos, cujo gabarito destoa dos
demais da mesma quadra, porém, o fato dele encontrar-se
recuado em 20,00m em relação ao alinhamento, faz com
que a percepção de sua altura seja amenizada.

Térreo e subsolo

90 m²

rua sabará
O pavimento térreo, sem pilotis, abriga três
apartamentos, sendo que um deles, com 50,00m², destina-
se ao zelador; este separa-se dos demais pelo acesso
ap. zel.
50 m² principal que situa-se deslocado à esquerda do eixo da
71 m² planta, para quem da rua vê o edifício de frente pela rua
Piauí; um corredor de 4,00m de largura conduz ao hall social,
situado na porção central do volume, de onde se acessam
os apartamentos térreos destinados aos moradores à
direita, os elevadores ao centro, e o apartamento do
rua piauí
zelador à esquerda. Atrás da caixa de elevadores há um
Esquema de distribuição do pavimento térreo
hall de serviço, onde se acessam as escadas e a saída para
circulação horizontal - hall social os fundos do lote.
circulação vertical
lojas
O subsolo, destinado às garagens, conta com dois
acessos feitos por rampas; um se dá pela rua Sabará,
ocupando o recuo entre a torre e a divisa do lote; o outro,
se dá pela rua Piaui, também ocupando o recuo lateral. Há
apenas a possibilidade da acomodação de 14 veículos na
garagem, número inferior ao de unidades, que somam 22.

Circulação Vertical


A caixa de circulação vertical do Ouro Verde está
contida dentro do volume único do edifício; ela se dá por dois
elevadores, sendo que um deles abre-se para o hall social,
e o outro, para o hall de serviço, que é onde se acessam as
Térreo do Ouro Verde - acesso social.
escadas em ferradura, sem patamar intermediário.
Foto: Edson Lucchini Jr.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Pavimento tipo e unidades

As duas unidades térreas, destinadas a moradores,


possuem dimensões e arranjos espaciais distintos; a menor,
com 71,00m², situa-se voltada para a esquina, abrindo-se
para as ruas Piauí e Sabará. Ao adentrá-la, a cozinha se
encontra à direita, cuja parede curva que a separa do hall
social do edifício torna a sua geometria irregular. Ladeando
a cozinha, há uma área de serviço com banheiro, cujas
aberturas, feitas por cobogós, voltam-se para a rua Piauí.
A salas de estar e jantar compatilham o mesmo espaço
Apartamento de 71m² do pavimento térreo retangular de 24,00m² e abrem-se também para a Piauí.
Há um único dormitório, de 15,00m², que possui abertura
para a rua Sabará, ladeado pelo banheiro, que volta-se
para a mesma rua; é a menor unidade de todo o edifício,
com exceção ao apartamento do zelador.

O térreo também conta com uma unidade de


90,00m², cujas aberturas voltam-se para a rua Sabará;
ao acessá-la, depara-se com um espaço retangular de
31,50m² que abriga as salas de estar e jantar; entre elas,
há um pequeno hall que conduz ao dormitório, à cozinha,
e ao banheiro. O domitório possui 16,50m², sendo o único
do apartamento. A cozinha, de 8,00m², abre-se para uma
área de serviço que conta com dormitório de empregada
e banheiro. Certamente uma unidade de 90,00m² poderia
contar com dois dormitórios, mas isso acarretaria em
problemas de iluminação e ventilação naturais para as
salas; a opção por apenas um dormitório fez com que as
salas ficassem com dimensões muito generosas e uma
geometria retangular. As unidades do térreo não se repetem
Apartamento de 90m² do pavimento térreo
ao longo do desenvolvimento vertical do edifício, sendo as
menores dele, pois possivelmente foram pensadas para a
habitação de estudantes.

Do 1º ao 8º andar, a conformação espacial


do pavimento é a mesma, onde encontram-se duas
unidade 2 unidades praticamente idênticas em suas dimensões e
rua sabará

arranjos espaciais, espelhadas entre si por um eixo de


simetria diagonal, como mostra o esquema ao lado. As
áreas comuns de circulação do pavimento possuem as
dimensões necessárias para a sua função, o que as tornam
unidade 1 bem enxutas.
ei
xo
de
sim
et
ria
rua piauí

35
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.


A unidades do 1º ao 8º andar possuem 153m²
e 156m², com arranjos espaciais muito semelhantes,
portanto, a descrição de uma se aplica à outra.

rua sabará
156 m² O acesso social do apartamento se dá pela sala de
jantar, que não possui divisões com a sala de estar; juntas,
elas conformam uma planta em “L” com 39,00m². Na sala
153 m²
de jantar, há uma passagem para um hall que distribui
os fluxos para dois dormitórios, cozinha e banheiro; os
dormitórios são idênticos e espelhados entre si, com
15,00m² cada. O banheiro, comum para os dois dormitórios,
possui 8,00m² de área e espaço para banheira, separada
rua piauí do box. A cozinha, retangular, com 11,00m², pode ser
Esquema de distribuição do pavimento tipo do 1º ao 8º andar
acessada pelo hall de distribuição, pela sala de jantar e
pela lavanderia, além de contar com o acesso de serviço
circulação horizontal - hall social
do apartamento, resultando num excesso de portas, que
circulação vertical
lojas
compromete sensivelmente a distribuição do mobiliário.
A sala de estar fragmenta o setor íntimo do apartamento,
separando a suíte dos demais dormitórios, o que confere,
de certo modo, mais privacidade para esta, porém, rompe
a setorização do apartamento.

Era pouco comum nos edifícios desta época


a utilização de suítes, mas nesse caso, Heep pode ter
optado por esta solução afim de obter um dormitório
mais privativo e isolado; o espaço de dormir conta com
15,00m², que se abre para um terraço privativo de 5,00m².
O banheiro conta com 4,00m², não permitindo a utilização
de banheira. O apartamento ainda conta com uma área
de serviço de 7,50m² que é acessada pela cozinha e conta
com um dormitório de empregada e um banheiro.

Em todos os edifícios estudados, se nota uma


postura muito racional do arquiteto, de modo que sempre
há uma separação muito clara entre as áreas molhadas
com as áreas de estar e repouso dos apartamentos. O
Ouro Verde constitui o único exemplo, dos dez edifícios
estudados, em que se encontra um banheiro isolado,
longe de outros ambientes dotados de equipamentos
hidráulicos. Nos demais casos a serem estudados, Heep
abre mão da utilização de suítes para não comprometer
a racionalização hidráulica, como poderá sem visto nos
Apartamento de 153m² do 1º ao 8º pavimento
estudos dos edifícios Lausanne e Ouro Preto (p.142).
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O 9º pavimento sofre o primeiro recuo que escalona


os dois últimos andares do Ouro Verde; o recuo da face
voltada para a rua Piauí é de 2,80m em relação aos andares
inferiores, e o recuo da face voltada para a rua Sabará é de
3,10m; estes recuos são ocupados por terraços descobertos
para os apartamentos. Os recuos obrigatórios trouxeram o

rua sabará
rompimento da simetria diagonal que ordenava os andares
113 m²
inferiores, produzindo duas unidades de arranjos espaciais
96 m² e dimensões diferentes no 9º pavimento.

A unidade que se volta para a rua Piauí, conta


terraço terraço
com uma conformação espacial muito semelhante à das
unidades de 153,00m² e 156,00m² dos andares inferiores,
diferindo-se delas na redução das dimensões de cada
rua piauí
ambiente e na diminuição de três para dois dormitórios,
Esquema de distribuição do 9º andar sendo eliminada a suíte isolada.
circulação horizontal - hall social
circulação vertical O apartamento que se volta para a rua Sabará
lojas possui 113,00m² e um arranjo espacial único em todo o
edifício, de modo a ser necessária a sua descrição; o acesso
principal se dá numa área de circulação onde à direita de
quem entra se acessam as áreas sociais, e à esquerda,
as áreas íntimas e de serviço. As salas de estar e jantar
situam-se num mesmo espaço retangular de 23,00m² que
abrem-se para o terraço descoberto. Ladeando as salas
há um dormitório de solteiros de 15,00m². O dormitório
de casal conta com 14,00m² mais closet. Há um banheiro
de 8,00m² que atende aos dois dormitórios; esta área
permite a utilização de uma banheira separada do box.
A cozinha, de 9,00m², conta com a entrada de serviço
do apartamento, mas também é acessada pelo mesmo
corredor íntimo que leva aos dormitórios. As aberturas
da cozinha voltam-se para uma área de serviço que conta
com banheiro e dormitório de empregada. Na resolução
da planta deste apartamento, se nota um desperdício
de área com circulações exageradas; adentrando o
apartamento, à direita há um espaço de 1,90m de largura,
que pode ser considerado muito largo para um corredor,
e ao mesmo tempo, muito estreito para um ambiente de
estar, resultando num espaço praticamente sem utilidade;
além disso, ele fragmenta e distancia a sala de jantar da
cozinha.
Apartamento de 153m² do 1º ao 8º pavimento
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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O 10º pavimento sofre mais um recuo em relação


ao 9º em 2,00m nas faces que se voltam para a rua Piauí
e Sabará. Estes recuos, assim como no 9º pavimento,
geraram terraços descobertos, e áreas menores para os
apartamentos, porém, neste caso, optou-se pela criação
de uma única unidade no pavimento, de 160m², que é a
maior em todo o edifício; o acesso principal se dá num
espaço retangular de 37,00m² que abriga as salas de jantar
e de estar, abertas para o terraço através de um caixilho
de 6,00m de comprimento; à esquerda de quem acessa o
apartamento, encontra-se o setor íntimo, composto por

rua sabará
dois dormitórios de solteiro de 15,00m² cada e um de casal,
com 18,00m². Há um banheiro que serve ao dormitório
160 m² de casal, sendo acessado pelo corredor, sem configurar
uma suíte; um outro banheiro, na outra extremidade
terraço
do corredor, serve aos dois dormitórios de solteiro. O
setor de serviços é composto pela cozinha, dormitório e
banheiro de empregada. A cozinha é acessada pela sala de
jantar e conta com 13,00m²; nela também se encontra o
rua piauí acesso de serviço do apartamento. Há uma fragmentação
da área de serviço, de modo que o dormitório e banheiro
Esquema de distribuição do 10º andar
de empregada separam-se da área de serviço pela caixa
circulação horizontal - hall social
de escadas do edifício, resultando numa situação onde
circulação vertical
o espaço para lavagem de roupas encontra-se fora do
lojas
apartamento. Nesta unidade, pode-se obrservar uma
setorização mais precisa e independente, ou seja, é possível
acessar os diferentes setores da planta sem ter que passar
por um setor para chegar a outro.

Planta da unidade de 160m² - 10º pavimento.


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Fachadas

A descrição e a análise das fachadas do edifício Ouro


Verde se concentrarão nas duas voltadas para a cidade: a
da rua Piauí, com orientação nordeste e a da rua Sabará,
com orientação noroeste. As outras duas, voltadas para
os fundos do lote, possuem aberturas mais simples e com
vãos menores, pois tratam-se de ambientes de serviço.

Ambas as fachadas, voltadas para as ruas Piauí e


Sabará, contam com três momentos distintos que podem
ser divididos em base, corpo principal e coroamento;
isto corresponde respectivamente a térreo, 1º ao 8º
pavimento e 9º e 10º pavimentos. O térreo destaca-se do
corpo principal por estar recuado dele em 1,00m nas faces
voltadas para as ruas Piauí e Sabará, conferindo mais leveza
ao volume superior e protegendo os acessos; além disso,
as paredes da fachada térrea são totalmente revestidas
por pastilhas verdes, contrapondo a predominância da cor
branca no corpo principal. O térreo ainda conta com uma
linguagem diferente de aberturas em relação ao restante
do edifício, com cobogós e tijolos de vidro, o que de certa
forma, prejudica a unidade da fachada, mas por outro lado,
realmente diferencia o térreo do restante da torre.

Fachadas do Ed. Ouro Verde atualmente


Foto: Edson Lucchini Jr.
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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O corpo principal, que corresponde do 1º ao 8º


pavimento, caracteriza-se, na fachada da rua Piauí, pelas
alternâncias de cheios e vazios. Os cheios correspondem
às faces em alvenaria, revestidas em pastilhas verdes,
que possuem as aberturas quadradas dos dormitórios
de solteiro. Os vazios se dão pela subtração que os
terraços proporcionam ao volume principal, conferindo
sombreamento. Além disso, estes vazios são intercalados
por faixas de cobogós quadriculados, que protegem os
ambientes de estar e repouso da insolação intensa da face
nordeste, funcionando como uma espécie de brise, além de
encobrirem as janelas de banheiros; as faixas de cobogós,
além dos fatores já mencionados, ainda representam
elementos de reforço à verticalidade, contrapostos pelas
linhas brancas horizontais que separam os pavimentos.

As janelas quadradas dos dormitórios de solteiro,


contam com venezianas que recolhem-se superiormente
por completo, permitindo insolação ou escuridão máximas;
além disso, elas basculam cerca de 30o, permitindo muita
flexibilidade quanto à insolação e a ventilação. Atrás das
venezianas, ainda encontram-se duas folhas de correr
em vidro. Os caixilhos das salas e quartos voltados para
os terraços são em ferro e grandes superfícies em vidro.
Hoje, muitos terraços estão fechados por esquadrias de
Fachada da rua Piauí alumínio e vidro, empobrecendo o jogo de cheios e vazios
Foto: Edson Lucchini Jr.
da fachada
41
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Os mesmos conceitos e elementos presentes na


fachada da rua Piauí, continuam presentes na fachada da
rua Sabará; a alternância de cheios e vazios, e a subtração
dos terraços criam um um jogo de sombras, porém, a
fachada da rua Sabará possui uma empena cega, de cor
branca, que extrapola a altura do corpo principal da torre
e o seu limite com o térreo, de modo a criar um elemento
forte de marcação da esquina, que realça a presença do
edifício no entorno.

O sentido de circulação de veículos colabora com a


percepção do edifício, reforçada pela empena, que é notada
de longe, principalmente para quem vem pela rua Piauí, de
carro, em direção ao edifício. Este recurso de marcação de
esquinas através de empenas cegas será visto em outros
edifícios de Heep, como por exemplo, o Ibaté, situado na
rua Augusta. Além dos fatores citados, a empena cega faz
com que a simetria da planta do pavimento tipo não se
transponha à fachada;
42
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Pode-se dizer que o coroamento do Ouro Verde


ocorre nos dois últimos pavimentos, que sofrem o
escalonamento obrigatório. Os recuos geraram terraços
descobertos em ambos os pavimentos. A linguagem das
fachadas dos andares do coroamento muda radicalmente
em relação à dos andares inferiores, já que se caracterizam
por muitas superfícies em alvenaria e aberturas mais
despojadas, livres de alinhamentos e intenções de realce
de horizontalidade e verticalidade. Apesar do coroamento
significar uma ruptura de unidade, ele não é percebido por
quem trafega pelas ruas, já que encontra-se alto e recuado,
porém, ele é percebido por quem se encontra em edifícios
do entorno, como mostra a foto ao lado.

Por outro lado é possível analisar a questão do


coroamento de maneira diferente; pode ter sido uma
intenção do arquiteto criar uma espécie de neutralidade
aos últimos dois pavimentos, fazendo intencionalmente
com que eles não participem da composição da fachada,
já que eles são pintados em branco e sem a linguagem
do restante da torre. Desta forma, o arquiteto pode ter
classificado como coroamento, a transição entre o 8º e 9º
pavimento, que é marcada por guarda-corpos de concreto
Ed. Ouro Verde, visto da cobertura do Ed. Cinderela, de Artacho Jurado.
com aberturas inferiores horizontais.
Foto: Edson Lucchini Jr.
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1
apto. zelador - 50 m²
1 - acesso principal 1 - sala de jantar
3
2 - hall de social 2 - sala-living
3 - hall de serviço 3 - banheiro
4 - depósito de lixo 4 - cozinha
5 - serviço

2 3
apto. 1 dorm. - 71 m² apto. 1 dorm. - 90 m²
1 - sala de jantar 1 - sala de jantar
2 - sala de estar 2 - sala de estar
3 - dormitório 3 - dormitório
4 - banheiro 4 - banheiro
5 - cozinha 5 - cozinha
6 - serviço 6 - serviço
7 - banh. empregada 7 - dorm. empregada
8 - banh. empregada
1 2
planta do pav. térreo
esc. 1:250

1 - rampas
2 - caixas d’água

planta do subsolo
esc. 1:250
45
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1
apto. 3 dorm. - 153 m²
1 - sala de jantar
2 - sala de estar
3 - hall de distribuição
4 - dorm. solteiro
5 - dorm. solteiro
6 - suíte casal
7 - banheiro casal
8 - banheiro social
1
9 - cozinha
10 - serviço
11 - dorm. empregada
12 - banh. empregada

planta do 1º ao 8º pav.
esc. 1:250

1 2
apto. 2 dorm. - 96 m² apto. 2 dorm. - 113 m²
1 - sala de jantar 1 - sala de jantar
2 - sala de estar 2 - sala de estar
3 - dorm. casal 3 - dorm. solteiro
4 - dorm. solteiro 4 - dorm. casal 1
5 - banheiro 5 - closet
6 - cozinha 6 - banheiro
7 - serviço 7 - cozinha
8 - dorm. empregada 8 - serviço
9 - banh. empregada 9 - dorm. empregada
10 - banh. empregada
planta do 9º pav.
esc. 1:250
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corte AA
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fachada rua piauí


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fachada rua sabará


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detalhe de fachada - térreo


Linguagem de aberturas diferente do
corpo principal da torre. Recuo que deixa
o volume principal em balanço de 1,00m

detalhe de fachada
Alternância de cheios e vazios entre ter-
raços, faixas verticais de cobogós e super-
fícies mais opacas em alvenaria.

detalhe de fachada - coroamento


Os dois últimos pavimentos são
escalonados e rompem com a tipologia
predominante; presença dos terraços
descobertos.
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Foto: Edson Lucchini Jr.


6.2 Edifício Normandie 1953-57
endereço e localização
Av. 9 de Julho 656 - Centro

pça. tes
rtins fon
roosevelt r. ma

r. ma
rtinh
lig. l

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o
julh

este
e
9d

ado
av.

-oes
te
construção
C.N.I.
(Engº resp. Roberto Zuccolo)
terreno
Irregular - 1360 m²
unidades
1º ao 7º pav.:
10 kitch. de 30m², 2 ap. de 52m²
8º ao 19º pav:
10 kitch. 30m2
20º pav.:
5 ap. de 52m²
21º pav:
5 ap. de 46m²
Total: 214 unidades
publicações
Acrópole 219, 1957, p.95-97
c o e f. d e a p ro ve i ta m e nto
7.5 - Área total = 10.220m²
taxa de ocupação
60 %
conservação
péssima
Fotos do ed. Normandie em
1955
Fonte: Revista Acrópole 219, descaracterização
1957, p.95. Média
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A Avenida 9 de Julho e o Plano de Avenidas edifício Guatemala, de 1955, do arquiteto Francisco Beck.
(AMARAL DE SAMPAIO, 2002 p.134)

Nos anos, 1930 e 1940, o modelo rodoviarista se O edifício Normandie, projetado por Franz Heep
consolidara através do Plano de Avenidas de Prestes Maia. em 1953 e entregue em 1957, também está inserido
Este plano expansionista baseava-se na adoção de uma neste importante vetor de verticalização criado pelo
estrutura viária radial-perimetral de modo a expandir a Plano de Avenidas, que é a avenida 9 de Julho. É o edifício
área central, além de possibilitar e ordenar o crescimento com o maior número de unidades projetado por Heep
vertical e horizontal da cidade em anéis sucessivos. O em São Paulo, totalizando 214, sendo que 209 são do
projeto previa a construção e alargamento de avenidas, tipo kitchenette27 . A reportagem da revista Acrópole nº
gerando fluidez ao tráfego entre o centro e os bairros; 219 destaca que a opção por se construir um edifício de
estas avenidas, além do papel viário, definiram vetores de kitchenettes na avenida 9 de julho se dá pelo fato dela ser
expansão vertical na cidade. Seu sucesso parcial se deu uma via de grande movimento, o que não atrai famílias, e
apenas com a nomeação de Prestes Maia como prefeito, sim, pessoas solteiras ou casais sem filhos.
que implantou o perímetro de irradiação, expandindo o
centro e conseqüentemente, a ocupação vertical. (AMARAL No Normandie, Heep inaugura algumas tipologias
DE SAMPAIO, 2002 p.133) que serão repetidas diversas vezes por ele mesmo em
outros projetos posteriores. A fachada, marcada pelas
Com Maia à frente da prefeitura foram executadas floreiras, por elementos curvos de concreto que separam
a Av. Ipiranga, o alargamento da Av. Senador Queiróz as unidades, e pelos caixilhos com peitoris e bandeiras
e São Luiz, projetos da 23 de Maio e da Radial Leste e móveis, será reproduzida com pequenas variações nos
construção da avenida Tiradentes e da 9 de Julho; esta foi edifícios Arapuã (1953), e no Japurá (1954). As soluções de
um importante exemplo de vetor de verticalização, onde planta das kitchenettes do Normandie, serão amplamente
mais de 100 edifícios foram erguidos por empreendedores reproduzidas em outros edifícios de Heep, como o Icaraí28
privados, voltados à habitação coletiva de baixo custo entre (1953), o Arapuã (1953), o Araraúnas29 (1955), o Marajó
1945 e 1960. Dentre esses edifícios, encontramos alguns (1955) e o Guaporé30 (1956).
interessantes exemplares da arquitetura moderna, como o

Plano de Avenidas de Prestes Maia - 1935


Fonte:www.usp.br/fau/docentes/depprojeto/c_deak//CD/5bd/1rmsp/
plans/h2pl-av/index.html
Acesso em abril de 2009
Edifício Guatemala – 1955 – Francisco Beck
Fonte: AMARAL DE SAMPAIO, 2002

(28) - Ver análise do edifício Icaraí na página 78


(29) - Ver análise do edifício Araraúnas na página 183
(30) - Ver análise do edifício Guaporé na página 202
(31) - O apartamento do tipo Kitchenette é o que possui geralmente como programa uma cozinha, um banheiro e um único espaço destinado a estar, comer e dormir. Este termo que o
designa é oriundo do nome dos “kits” de cozinha compactas utilizadas nestes apartamentos (p.56)
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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Terreno, implantação, volumetria e entorno


circ. vertical

O terreno, de topografia plana, onde situa-se o


Normandie, é conformado por um “L”, onde o maior lado,
de 43,65m, alinha-se com a avenida 9 de Julho. O lote,
apesar de irregular, possui todos os seus ângulos retos,
bloco principal
com exceção do que se forma entre a face principal e a face
lateral esquerda, para quem da 9 de julho o vê de frente.

O partido de implantação acompanha a geometria


do lote; o corpo elevado, disposto de modo transversal ao
terreno, está recuado no térreo, 11,60m do alinhamento
com a avenida 9 de Julho e encosta nas duas divisas
laterais; o pavimento nomeado de térreo, está na verdade
av. 9 de julho Pavimento térreo elevado em relação ao nível da avenida cerca de 2,00m, ao
passo que o subsolo encontra-se abaixo do nível dela com
a mesma medida. A partir do 1º pavimento, até o 18º, o
corpo elevado encontra-se recuado 9,65m do alinhamento,
circ. vertical
o que significa que estes pavimentos projetam-se cerca
de 2,00m em balanço sobre o térreo. Os primeiros oito
pavimentos, mais o térreo e o subsolo, faceiam as divisas
laterais; a partir do 8º pavimento, há recuos de 4,40m em
ambos os lados, soltando o restante da torre das laterais.
bloco principal
O 19º é o primeiro pavimento a sofrer interferência do
escalonamento obrigatório, recuando-se cerca de 1,00m
em relação ao alinhamento dos pavimentos inferiores.
A mesma situação ocorre sucessivamente com o 20º e o
21º pavimentos. O recuo de 9,65m do corpo elevado em
relação ao alinhamento, permitiu o ganho de altura do
av. 9 de julho 1º ao 8º andar
edifício e conferiu unidade à fachada, pois graças ao recuo,
o escalonamento da torre só ocorre nos últimos 9,45m,
dos 70,10m totais, tirando do observador, localizado no
térreo, a percepção deste escalonamento.

9º ao 18º andar circ. vertical

bloco principal

av. 9 de julho
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Edifício Itália - 1956 - Adolf Franz Heep -


Construções baixas “escoram” o entorno.
Foto: Edson Lucchini Jr.

Croqui do entorno do Ed. Normandie

Edifício Eiffel - 1954 - Oscar Niemeyer


Foto: Edson Lucchini Jr.

No projeto do Normandie, Heep se deparou com


Edifício Normandie - Terraços que “abraçam” e convidam.
Foto: Edson Lucchini Jr. um contexto já bastante construído, o que pode esclarecer
algumas soluções de ajuste ao entorno utilizadas por ele.
Nos primeiros sete pavimentos, onde a torre encosta nas
divisas laterais, surgem terraços trapezoidais que alinham-
se com os edifícios vizinhos “(...)como a escorar o entorno
para o desenvolvimento da torre” (BARBOSA, 2002, p.67).
Além disso, os terraços presentes nos primeiros sete andares,
“abraçam” a cidade, causando uma sensação convidativa.
Uma solução semelhante também foi adotada por Oscar
Niemeyer no projeto do edifício Eiffel, de 1954, localizado
na praça da República. No edifício Itália (1956), de autoria
do próprio Heep, “esta possibilidade será aperfeiçoada(...)
com suas construções baixas no alinhamento fazendo um
contraponto com a torre” (BARBOSA, 2002, p.67) e como
Edifício Normandie - Diálogo com o entorno - Alinhamento de terraços
Foto: Edson Lucchini Jr.
no Normandie, “escorando” o entorno.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Térreo e subsolo

O térreo do Normandie, como já mencionado


anteriormente, encontra-se 2,00m acima do nível da 9 de
Julho, ao passo que o subsolo situa-se 2,00m abaixo dela.
loja loja loja loja loja
Esta decisão projetual pode ser justificada por algumas
89 m² 96 m² 112 m² 93 m² 121 m²
hipóteses; a avenida 9 de Julho encontra-se no fundo de
loja um vale, onde passa um rio, hoje canalizado, fato que pode
58 m² sinalizar a presença de um nível d’água elevado, dificultando
e encarecendo escavações, e desta forma, induzindo a
uma opção por um subsolo semi-enterrado, minimizando
estas escavações. Ambos os pavimentos, térreo e subsolo,
são destinados à lojas comerciais; a opção por deixá-los
meio nível acima e abaixo da via faz com que o pedestre
av. 9 de julho consiga perceber visualmente a existência das lojas em
Esquema de distribuição do pavimento térreo ambos os pavimentos, além de favorecer o acesso a elas.
circulação horizontal Uma rampa curva vence o desnível entre a 9 de Julho e o
circulação vertical pavimento térreo, configurando um percurso de entrada,
lojas
desembarque, e saída de veículos, além de também
servir ao acesso de pedestres; a vantagem conseguida
com a adoção desta solução é a imponência que o térreo
do edifício ganha por estar 2,00m acima do nível da rua,
loja loja loja loja loja loja loja reforçada ainda mais pela simetria da planta, que reflete-
101 m² 110 m² 82 m² 100 m² 77 m² 110 m² 133 m² se na fachada. O pedestre ainda pode acessar o térreo por
escadas situadas em ambas as extremidades da planta e
cobertas pelos terraços trapezoidais dos apartamentos.

No térreo, o acesso social do edifício encontra-se


na porção central da planta; um corredor de 5,00m de
largura e paredes curvas, segue na diagonal em direção ao
Esquema de distribuição do subsolo
fundo do lote, chegando ao hall de elevadores e escadas,
que conduzem aos andares habitacionais. Os pavimentos
superiores projetam-se 2,00m em relação ao alinhamento
do térreo, criando um balanço que configurou um passeio
coberto para as cinco lojas deste pavimento, protegendo
suas vitrines e acessos das intempéries.

O acesso às sete lojas do subsolo se dá por três


escadas, sendo duas nas extremidades da planta e uma
na porção central, que vencem o desnível de 2,00m
existente entre este pavimento e a 9 de Julho. As áreas não
edificadas do subsolo, que correspondem ao recuo frontal,
são dotadas de jardins que possuem hoje árvores altas,
que chegam até o segundo pavimento de apartamentos.

Lojas do térreo e subsolo.


Foto: Edson Lucchini Jr.
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Circulação Vertical Pavimento tipo e unidades


A circulação vertical do edifício Normandie se dá em Em todos os andares destinados às habitações
um volume irregular de cantos arredondados, destacado (1º ao 21º), o arranjo espacial dos pavimentos se dá
da lâmina principal do edifício e situado na parte posterior por um corredor linear voltado para a face posterior da
desta, voltada para os fundos do lote. Este volume de lâmina principal, que iluminado e ventilado por cobogós
circulação vertical é o único elemento do projeto que rompe de concreto, distribui os fluxos para os apartamentos,
a simetria da planta, e consequentemente, da fachada voltados para a face principal. O Normandie conta com
posterior do edifício; essa quebra de simetria deu-se por seis situações distintas na distribuição e tamanhos dos
uma condicionante geométrica do terreno, como mostra o apartamentos nos pavimentos tipo, fruto dos recuos que
croqui abaixo. Quatro elevadores, sendo três sociais e um o edifício sofre ao longo do seu desenvolvimento vertical.
de serviço, levam do térreo ao 21º pavimento. Do 1º ao Do 1º ao 7º pavimento, o bloco principal de apartamentos
21º, as escadas são lineares sem patamar intermediário. alinha-se com as duas divisas laterais do lote, acarretando
Somente nas transposições do 1º pavimento para o térreo numa maior área do pavimento tipo e possibilitando a
e deste para o subsolo, ela se torna curva, em forma de distribuição de doze unidades do tipo kitchenette, dispostas
ferradura, também sem patamar intermediário. A adoção lado a lado, todas voltadas para a avenida 9 de Julho, com
de um volume destacado da lâmina principal para a orientação sudeste. As duas unidades das extremidades
realização da circulação vertical, era uma prática corrente da planta do pavimento tipo, do 1º ao 7º andar, contam
na época do Normandie, não só na obra de Heep, como na com 52m² de área e possuem largura 1,00m maior que
de muitos outros arquitetos contemporâneos a ele; esta as dez demais, que contam com 30m² cada. Além disto,
solução é encontrada na obra de Franz Heep nos edifícios as unidades das extremidades ainda possuem os terraços
Icaraí (1955), Arapuã (1953), Araraúnas (1955) e Arlinda trapezoidais, que projetam-se até o alinhamento com os
(1958), além de também ser utilizada no Ed. Copan, de edifícios lindeiros.
Oscar Niemeyer.

52m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 52m²

Esquema de distribuição do pavimento tipo do 1º ao 7º andar

circulação horizontal
circulação vertical
Fachada posterior do Ed. Copan - Oscar Niemeyer - 1951 - Corpo de
circulação vertical destacado da lâmina principal. unidades
Foto: Edson Lucchini Jr.
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Planta de uma unidade de 30m² do Normandie.


Projeto da cozinha de uma Kitchenette
Fonte: Revista Acrópole 219, 1957, p.113.

As plantas das kitchenettes de 30m² são compostas dotada de serviços coletivos, dispensando-os de estarem
por uma cozinha, um banheiro e uma sala-living. A cozinha dentro de cada apartamento. Neste caso paulistano, a
conta com 1,00m de largura por 0,80m de profundidade, unidade de habitação não é auto-suficiente, como a de
cujo detalhamento aparece na publicação da revista Le Corbusier, mas o fato do edifício de kitchenettes estar
Acrópole nº 219. Uma geladeira se encaixa sob a pia de inserido num contexto urbano bem servido de opções para
mármore, que conta com uma cuba e um espaço suficiente as refeições, a compactação da cozinha se torna viável. As
para a colocação de um fogão de duas bocas. Acima da lavanderias são ausentes nas kitchenettes, mais uma vez
cuba, encontram-se duas prateleiras de granilite. Heep pressupondo que serão utilizados os serviços da cidade.
desenhou este pequeno espaço em todos os seus detalhes, Outra possível explicação para se justificar as dimensões
com equipamentos muito compactos. O conceito de reduzidas da cozinha é o fato de não existirem na época
kitchenette desta época em São Paulo, se apropriava de tantos equipamentos eletro-eletrônicos disponíveis
alguns elementos da cartilha de habitação mínima de Le no mercado. Hoje, com a grande variadade desses
Corbusier, que tinha como prerrogativa a não necessidade equipamentos, muitas das cozinhas do Normandie foram
de espaços generosos para serviços como cozinha e reformadas, aumentando a sua área e diminuindo a do
lavanderia dentro do apartamento, afinal a célula31 de banheiro, que possuia medidas mais generosas devido à
habitação (termo para se definir uma unidade unifamiliar) presença do bidê, fato recorrente na época.
fazia parte de uma unidade de habitação auto-suficiente,

(31) - Termo extraído de SAMPAIO, Maria Ruth Amaral de (org.). A Promoção Privada de Habitação Econômica e a Arquitetura Moderna, 1930-1964. São Carlos: RiMa, 2002
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A sala-living é um espaço de 3,25m de largura por


5,20m de comprimento, que pode abrigar as funções de
dormir, estar e comer. Ainda há um espaço, de 1,00m de
largura por 1,30m de comprimento, ladeado pela cozinha,
que funciona como um closet, abrindo-se para a sala-
living.

É importante salientar que o termo “kitchenette”,


amplamente utilizado no Brasil para designar estas unidades
como as do Normandie, teve provável origem no nome do
“kit” de cozinha compacta para esse tipo de apartamento
(ver p.56) que se assemelha a um quarto de hotel,
possuindo além da cozinha, um banheiro e ambientes de
Planta da unidade de 52 m².
estar e dormir que se situam no mesmo espaço. Pela data
de projeto, acredita-se que o Normandie foi o primeiro
edifício, projetado por Heep, a possuir este tipo de planta,
que viria a ser largamente reproduzida posteriormente,
com pequenas variações, em sua obra residencial vertical
em São Paulo.

As unidades de 52m² das extremidades da plantas


do 1º ao 7º pavimento, também são kitchenettes, mas
possuem um arranjo espacial diferente das de 30m², pois
são mais largas em 1,00m; isto permite dimensões mais
generosas para a cozinha, o banheiro e a sala-living. Além
disso, nesta unidade há uma meia parede que separa o
ambiente de dormir do de estar. Há ainda a presença do
terraço trapezoidal de 13,00m².

Fachada do Ed. Normandie atualmente


Foto: Edson Lucchini Jr.
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No 8º pavimento, a lâmina principal sofre um recuo


de 4,40m em ambas as laterais; desta forma eliminam-se
as duas unidades maiores das extremidades, resultando
num pavimento tipo com 10 unidades do tipo kitchenette,
com 30m² cada, idênticas às dos pavimentos inferiores.
Esta situação se repete até o 18º andar. O que difere o
8º pavimento dos demais superiores até o 18º, é o fato
30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² 30m² dele possuir terraços nas extremidades da planta, onde
localizavam-se, nos pavimentos inferiores, as unidades
maiores.

O 19º pavimento é o primeiro a sofrer o recuo


Esquema de distribuição do pavimento tipo do 8º ao 19º andar de 1,00m em relação aos andares inferiores, no sentido
circulação horizontal longitudinal, devido ao escalonamento obrigatório.
circulação vertical
O arranjo das unidades não muda, em relação aos
unidades
pavimentos inferiores; a única variação é a diminuição dos
comprimentos das salas das unidades, para o ganho de
terraços.

No 20º pavimento, o recuo de mais 1,20m no


sentido longitudinal, em relação ao andar inferior, trouxe
52m² 52m² 52m² 52m² 52m²
a necessidade de uma mudança nas unidades; agora, ao
invés de dez kitchenettes, o pavimento conta com cinco
unidades de 52m² e um dormitório; são as únicas unidades
não-kitchenettes em todo o edifício. Os apartamentos
contam com um corredor de acesso que separa a cozinha
Esquema de distribuição do 20º pavimento do banheiro, chegando ao dormitório e à sala de estar;
uma área de serviço de 2,00m² ladeia a cozinha, de
5,20m². O banheiro é um espaço de geometria quadrada
com 4,90m² que permite uma boa distribuição das peças
sanitárias e do box. A sala de estar também é um espaço
de geometria praticamente quadrada, contando com 13m²
de área, abrindo-se para um terraço, cujo comprimento
de 6,65m coincide com a largura do apartamento. O
dormitório, também quadrado, com 11,00m², ladeia a sala
de estar e também se abre para o terraço. Este arranjo
espacial descrito tornou-se corrente na obra de Heep para
os apartamentos de andares escalonados de edifícios com
características semelhantes às do Normandie, como por
exemplo, o Araraúnas (1955) e o Guaporé (1956).

Planta da unidade de 52m² do 20º pavimento


59
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

No 21º pavimento, mais uma vez reduzido no sentido


longitudinal em relação ao 20º devido ao escalonamento, o
arranjo espacial é semelhante ao deste pavimento. Porém,
unidades passam a ter 46m² e voltam a ser kitchenettes,
com a sala de estar e o dormitório dividindo o mesmo
espaço. As áreas molhadas deste apartamento, não sofrem
alterações em relação às unidades do 20º andar.

Estrutura
46m² 46m² 46m² 46m² 46m²

A estrutura do Normandie possui, no sentido


longitudinal, um vão de 3,25m, que corresponte
exatamente à largura das kitchenettes. Do 1º ao 7º andar,
a presença dos apartamentos das extremidades que
faceiam as divisas laterais representa a única variação no
Esquema de distribuição do 21º pavimento
vão, que é de 4,25m, devido à necessidade de uma largura
maior para estes apartamentos. No sentido transversal há
circulação horizontal três linhas de pilares, separadas por um vão de 5,00m. A
circulação vertical
fachada do Normandie é livre, já que a primeira linha de
unidades
pilares encontra-se recuada 2,00m dela provocando um
balanço do bloco principal em sua porção frontal. Não há
transições estruturais, de modo que no térreo e no subsolo,
o módulo estrutural permanece o mesmo dos andares
superiores. Isto acarretou em lojas com muitos pilares em
seus interiores, prejudicando seus espaços; é possível que
a decisão da não utilização de transições possa ter ocorrido
por razões econômicas.

Planta da unidade de 46m² do 21º pavimento


60
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Perspectiva do Normandie, visto da av. 9 de Julho


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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Fachadas

O Normandie possui sua principal face voltada para


a av. 9 de Julho; esta, por ser a mais importante na interface
com a cidade, recebeu um tratamento arquitetônico
diferenciado. A fachada dos fundos, mesmo com o fato de,
hierarquicamente, ser menos importante que a primeira,
também é notada por quem trafega em ruas do entorno,
e por isso, também foi concebida de modo a contribuir
positivamente com a paisagem urbana.

No térreo e subsolo, predominam na fachada


principal as portas de acesso ao hall que conduz às moradias,
na porção central, e as portas das lojas, no restante da face
frontal. Separando o subsolo do térreo e este do primeiro
pavimento, há faixas de 1,00m de altura, compostas por
elementos vazados em concreto, que correm por todo o
comprimento da fachada.



Lojas do térreo e rampa de acesso.
Foto: Edson Lucchini Jr.


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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Do 1º ao 18º pavimento, a fachada do Normandie


segue a mesma tipologia, porém, os primeiros sete
andares possuem os terraços trapezoidais já mencionados
anteriormente, localizados nas extremidades do bloco
principal, que estabelecem uma relação do edifício com
o entorno, além de atribuírem ao edifício uma sensação
convidativa, no sentido de “abraçar” a cidade.

Destacam-se na fachada, ao longo do


desenvolvimento vertical do edifício, dois itens marcantes:
as floreiras e os elementos de concreto que separam
as janelas. As floreiras, além de exercerem o seu papel
funcional, também são elementos importantes na
atribuição de horizontalidade à fachada, com a intenção
de reduzir a sensação vertical que o edifício, com seus
vinte e um andares, fatalmente transmite. Ao se observar
a fachada do Normandie, num primeiro momento, crê-
se que as floreiras são vigas salientes que marcam as
transições entre os pavimentos, mas na verdade, elas
estão 60cm acima das lajes. A fachada do edifício é livre,
ou seja, a estrutura encontra-se recuada dela cerca de
2,00m, possibilitando liberdade quanto aos tamanhos
e quantidades de aberturas. Quanto aos elementos de
concreto, além de individualizarem as unidades, impedindo
Fachada do Ed. Normandie atualmente
Foto: Edson Lucchini Jr. a comunicação visual entre as kitchenettes tão próximas
64
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

bandeira ar quente

floreira

peitoril
ar frio

Sistema de ventilação natural.

Elementos de fachada.
Fonte: Revista Acrópole 219, 1957, p.112.

entre si, eles também servem como uma espécie de brise; correr, em vidro e aço, cujo comprimento corresponde
a orientação sudeste do edifício promove uma incidência à largura do apartamento. Sob a floreira há um peitoril
de luz solar na fachada principal de modo diagonal, desta basculante em vidro. A bandeira, sobre o caixilho principal,
forma, as lâminas de concreto, impedem que os raios também bascula; este sistema de peitoris e bandeiras
do forte sol da tarde incidam diretamente nas unidades basculantes tem a função de promover a troca de ar no
residenciais. Além das questões funcionais, as lâminas apartamento, de modo que o ar frio entra pela parte inferior
de concreto atribuem uma forte identidade à fachada do (peitoril) e o ar quente sai pela parte superior (bandeira).
Normandie, estabelecendo um interessante ritmo visual,
para quem vê o edifício de baixo para cima. Esta tipologia de fachada descrita será retomada
por Heep, com pequenas variações, no edifício Arapuã
As aberturas das unidades, voltadas para a fachada (1953) e no Japurá (1954).
principal, são compostas por caixilhos de duas folhas de


65
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O coroamento do Normandie se dá nos três últimos


pavimentos, que são os escalonados. Há uma ruptura com
a tipologia predominante; os elementos que separam
os apartamentos não são mais as lâminas de curvas de
concreto, e sim, muros com ângulos retos. Além disso, os
caixilhos são agora portas de correr e não ocupam mais
toda a largura do vão estrutural, resultando em uma
maior área de fachada preenchida por alvenaria. Nos
andares escalonados, os apartamentos possuem terraços
cobertos.

Na fachada posterior predominam os panos de


cobogós32 de concreto, presentes nos corredores. Esta
grande face permeável de cobogós é rompida pelo corpo
opaco de circulação vertical, que é deslocado do eixo do
edifício conferindo à fachada dos fundos uma conformação
assimétrica, ao contrário da fachada principal. Nota-se
a preocupação de Heep com a fachada dos fundos do
Normandie, já que ela é facilmente notada por quem
trafega na rua Avanhandava, situada atrás do edifício.


Situação Atual

Hoje, o Normandie se encontra muito degradado;
além da falta de manutenção, nota-se que os caixillhos
originais vêm sendo trocados por novos muito diferentes
Fachada dos fundos, vista da rua Avanhandava
Fonte: Revista Acrópole 219, 1957, p.97. entre si, comprometendo a unidade da fachada. Além
disso, o fechamento dos terraços trapezoidais trouxe um
empobrecimento considerável da volumetria.

(32) - Cobogó é um sinônimo de elemento vazado


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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

planta do pav. térreo


esc. 1:250

1 - rampa de acesso
2 - hall social - portaria
3 - hall de elevadores sociais
4 - zelador
5 - lojas
6 - estoques
7 - banheiros
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planta do pav. térreo


esc. 1:250

1 - lojas
2 - estoques
3 - banheiros
4 - medidores
5 - molas dos elevadores
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1 2

planta do 1º ao 7º pav.
esc. 1:250

1 2
kitchenette - 52 m² kitchenette - 30 m²
1 - cozinha 1 - banheiro
2 - banheiro 2 - cozinha
3 - ambiente de dormir 3 - closet
4 - ambiente de estar 4 - sala-living
5 - terraço
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planta do 8º pav.
esc. 1:250

1
kitchenette - 30 m²
1 - banheiro
2 - cozinha
3 - closet
4 - sala-living
70
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planta do 9º ao 18º pav.


esc. 1:250

1
kitchenette - 30 m²
1 - banheiro
2 - cozinha
3 - closet
4 - sala-living
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planta do 19º pav.


esc. 1:250

1
kitchenette - 30 m²
1 - banheiro
2 - cozinha
3 - closet
4 - sala-living
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planta do 20º pav.


esc. 1:250

1
apto. 1 dorm. - 52 m²
1 - cozinha
2 - área de serviço
3 - banheiro
4 - sala de estar
5 - dormitório
6 - terraço
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1
1

planta do 21º pav.


planta do 21º pav.
esc. 1:250
esc. 1:250

1
kitchenette - 46 m²
1 - cozinha
2 - área de serviço
3 - banheiro
4 - sala-living
5 - terraço
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corte AA
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fachada av. 9 de julho


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fachada posterior
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detalhe de fachada - térreo


Rampas de acesso ao térreo, meio nível
acima da 9 de Julho; imponência à fachada,
mesmo sendo um edifício destinado às
classes menos abastadas.

detalhe de fachada
Floreiras que conferem horizontalidade.
Lâminas de concreto que individualizam
as unidades trazendo privacidade, além
de proteção solar e um interessante
ritmo na fachada, para quem vê o edifício
de baixo e lateralmente.

detalhe de fachada - coroamento.


Os três últimos pavimentos são escalonados
rompendo com a tipologia predominante;
presença dos terraços descobertos.
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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Foto: Edson Lucchini Jr.


6.3 Edifício Icaraí 1953-55
endereço e localização
Praça Roosevelt 128 - Centro

pça.
roosevelt

na
pesta
stor
r. ne

construção
Incorporação: Otto Meinberg S.A.
Construção: George Doppler Ltda.

terreno
retangular - 382,5 m²

unidades
1º ao 24º pav.:
4 kitchenettes de 43,00m²
Total - 96 unidades

publicações
Acrópole 210, 1956, p. 234 - 235

c o e f. d e a p ro ve i ta m e nto
13.8 - Área total = 5354,61m²

taxa de ocupação
58%

conservação
Boa

descaracterização
Baixa
publicação na revista acrópole nº 210 - 1956
79
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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A Praça Roosevelt33

O terreno onde hoje situa-se a praça Roosevelt foi


ocupado, no final do século XIX, pelo Velódromo de São
Paulo, que logo deu lugar ao primeiro estádio de futebol do
Brasil em 1902, desapropriado em 1915 para a construção
da rua Nestor Pestana. Em 1920 foi construída a igreja Nossa
Senhora da Consolação, com sua face principal voltada
para a rua de mesmo nome. Nos anos 1950, praticamente
toda a superfície da praça foi asfaltada, onde foi criado um
grande estacionamento.

Estacionamento que ocupava o espaço da atual praça Roosevelt em 1967


Em 1967, o então prefeito da cidade de São Paulo,
Fonte: acervo pessoal de Dario Bueno José Vicente Faria Lima, anunciou o projeto para a praça,
que previa a construção de duas grandes estruturas
de concreto capazes de abrigar um supermercado,
estacionamentos, um mercado de frutas, bares e quatro
lojas; o projeto fora assinado por Roberto Coelho Cardozo,
professor de paisagismo da FAU-USP.

O projeto da praça Roosevelt sempre foi muito


criticado devido ao fato de possuir muito concreto e
poucas áreas verdes, além de um excesso de escadas,
rampas e becos. A superfície da praça está elevada
em aproximadamente 5,00m em relação às ruas que a
circundam, e os acessos não são marcantes, claros, não
propiciando uma situação convidativa para a superfície,
onde há espaços para eventos que quase nunca acontecem,
Construção da praça Roosevelt em 1968 tornando o local praticamente inóspito.
Fonte: acervo pessoal de Dario Bueno

Apesar destes problemas citados, a antiga rua


Martinho Prado, que ladeia a praça, possui um enorme
potencial cultural, com a presença de inúmeros teatros,
que atraem cada vez mais bares e restaurantes ao entorno.
Há um projeto de revitalização para a praça que vem sendo
discutido há alguns anos; alguns defendem a demolição
total das estruturas, liberando visualmente a praça, porém,
outros defendem a manutenção do pentágono principal,
por ser um teatro grego a céu aberto, que pode ser melhor
aproveitado, à medida que houver uma agenda de eventos
mais constante.

Inauguração da Praça Roosevelt - 25 de janeiro de 1970


Fonte: acervo pessoal de Dario Bueno

(33) - As informações sobre a praça Roosevelt são provenientes do site http://pt.wikipedia.org acessado em abril de 2010
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Praça Roosevelt em 1986


Fonte: acervo pessoal de Dario Bueno

Inauguração da Praça Roosevelt - 25 de janeiro de 1970 Inauguração da Praça Roosevelt - 25 de janeiro de 1970
Fonte: acervo pessoal de Dario Bueno Fonte: acervo pessoal de Dario Bueno
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O edifício Icaraí, produzido pela parceria entre Franz


ed. Icaraí
Heep e Otto Meinberg, está situado na praça Roosevelt,
próximo a vários outros empreendimentos realizados pela
dupla no início dos anos 1950. É um edifício onde as unidades
são todas do tipo kitchenette, cujas plantas possuem
pequenas variações em relação às já desenhadas por Heep
para o edifício Normandie. No Icaraí, Heep inaugura uma
tipologia de fachada que será utilizada em vários outros
projetos posteriores, como no edifício Araraúnas (p.183) e
Jequitibá34 (1957), onde grelhas quadriculam a fachada e
definem terraços.

Terreno, implantação, volumetria e entorno

O Icaraí está localizado na praça Roosevelt, num


terreno de 15,00m de frente por 25,50m de profundidade.
Conta com subsolo, térreo e 24 pavimentos, resultando num
volume com proporção de 15,00m de largura por 85,00m
Construção da praça Roosevelt em 1968 de altura e 18,25m de profundidade no corpo elevado. O
Fonte: acervo pessoal de Dario Bueno
aproveitamento vertical do edifício foi possível graças à
legislação da época, onde a altura máxima era definida
por uma relação com a largura da rua, ou seja, quanto
circ.
vertical mais larga ela fosse, mais alto poderia ser o edifício. Sendo
assim, pelo fato do Icaraí estar em frente a uma praça, foi
possível que ele pudesse ter, assim como os edifícios que o
ladeiam, um gabarito elevado, em comparação a edifícios
que não são lindeiros à praça Roosevelt. O térreo é o único
pavimento que ocupa a totalidade do lote, com exceção
volume
principal de dois vazios para iluminação natural. O corpo principal
da torre faceia o alinhamento, não possui recuos laterais e
desloca-se 7,25m da divisa de fundo do lote.

praça
roosevelt

(34) - O edifício Jequitibá é um projeto de Adolf Franz Heep datado de 1957, situado na cidade litorânea de São Vicente, SP. (p. XX)
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Térreo e subsolo

O Térreo é composto por duas lojas, separadas entre


si pela entrada social do edifício situada na porção central
da planta, conformando um corredor em leve aclive que
leva ao hall dos elevadores, cuja cota de nível é de 0,40m
acima da cota da rua; a planta térra, assim como as dos
demais níveis, possui uma conformação simétrica. Há um
loja loja
subsolo que ocupa menos de um terço do terreno e está
140 m² 140 m²
situado em sua parte posterior, sendo destinado apenas a
estoque das lojas; o subsolo ainda conta com duas caixas
d’água.

praça roosevelt Circulação Vertical


Esquema de distribuição do pavimento térreo

circulação horizontal
Situada em um volume destacado do principal
circulação vertical
lojas
localizado na parte posterior do terreno, a circulação
vertical é composta por dois elevadores e uma escada em
três quartos de volta sem patamar intermediário.

Pavimento tipo e unidades

O pavimento tipo é dividido em quatro kitchenettes,


totalizando 96 ao longo dos 24 andares do edifício, todas
voltadas para a praça Roosevelt, com face noroeste. As
unidades são praticamente idênticas, porém rebatidas,
Corredor de acesso às unidades sendo as duas da esquerda, para quem da praça vê o edifício
Foto: Edson Lucchini Jr. de frente, com o acesso pelo lado direito e vice-versa; a
ventilação e iluminação dos banheiros e cozinhas dos dois
apartamentos do meio, são voltadas para o corredor; já nos
apartamentos das extremidades, a ventilação e iluminação
são voltadas para o exterior.

As duas unidades do meio possuem robustos


pilares que diminuem um pouco a cozinha, em relação às
43 m² 43 m² 43 m² 43 m² unidades das extremidades. Os apartamentos possuem
uma planta retangular de 11,50m de profundidade por
3,50m de largura, fato que foi possível devido à divisão
do lote de 15,00m de frente por quatro unidades, e não
por cinco, o que resultaria num apartamento de 2,75m
Esquema de distribuição do pavimento tipo, do 1º ao 24º andar de largura, medida mais comum entre as kitchenettes
circulação horizontal produzidas neste período. O pé-direito de 3,00m, comum
circulação vertical na época mas muito generoso para os dias de hoje, resulta
unidades num espaço confortável visual e sensorialmente.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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As plantas são compostas por uma cozinha, um


banheiro, uma sala-living e um terraço. Os croquis ao
lado comparam a planta do Normandie, pioneiro desta
tipologia na obra de Heep em São Paulo, com a do Icaraí;
neste, o banheiro de 5,00m² possui uma geometria em “L”,
resultado da subtração do espaço retangular da cozinha, de
1,35m². No normandie, o banheiro é um retângulo íntegro;
a cozinha é menor, e seu espaço é resultado da subtração
de um closet.

A sala-living do Icaraí é um espaço retangular de


3,50m de largura por 6,60m de profundidade, que possui
um armário embutido junto à parede que a separa do
banheiro, e um caixilho piso-teto que a divide com o
terraço. É um ambiente cujas dimensões permitem uma
distribuição de um mobiliário que contemple um ambiente
de dormir, um de comer e um de estar. Na revista acrópole
nº 210 foi publicado um croqui com uma possibilidade de
ocupação do espaço de um apartamento do Icaraí. O lay-
out foi desenhado pela “Mobília Contemporânea”, uma
famosa loja de móveis dos anos 1950, que era localizada
no térreo do próprio Icaraí; um item interessante deste
lay-out, é a mesa bipartida, com uma parte no interior do
Planta da unidade de 30 m² Planta da unidade de 40 m² apartamento e outra no terraço.
ED. NORMANDIE ED. ICARAÍ

Lay-Out feito pela loja “Mobília Contemporânea”


Fonte: revista acrópole nº 210 - 1956 - p. 234
84
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O caixilho piso-teto que separa a sala-living do


terraço é composto por uma porta de madeira com
veneziana superior de ventilação permanente, além de
duas folhas de vidro de correr com bandeira e peitoril
também em vidro. É do mesmo tipo utilizado por Heep em
outros edifícios, como o Marajó e o Araraúnas. Este caixilho
confere uma boa ventilação e iluminação à sala-living, além
de integrá-la visualmente ao terraço, que é um espaço de
3,50m de largura por 1,20m de profundidade, o qual, além
de funcionar como uma espécie de brise, impedindo que
o caixilho da sala-living fique diretamente exposto ao sol
poente, também é um espaço para se contemplar a praça
e a cidade.

Detalhe do Caixilho do Ed. Icaraí. Na comparação com outros edifícios de kitchenettes


Fonte: revista acrópole nº 210 - 1956 - p. 235
projetados por Heep, e até com outras unidades do centro
da cidade, pode-se dizer que sem dúvida o Icaraí se destaca
no que diz respeito aos seus atributos plásticos e espaciais,
além da localização privilegiada, fazendo dele um dos mais
procurados apartamentos de seu porte até hoje.

Interior das unidades e vista do terraço


Fotos: Edson Lucchini Jr.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Estrutura


As exigências de uso de um pavimento térreo
podem frequentemente condicioná-lo a um arranjo
espacial diferente daquele dos pavimentos tipo. Essas
diferentes demandas de espaços sugeriram a adoção de
dois diferentes ritmos de distribuição estrutural no edifício
Icaraí.

No pavimento tipo, os pilares estão distribuídos


de maneira uniforme, sempre com o mesmo ritmo, afinal,
há uma divisão igual do espaço em quatro apartamentos,
pilares no pavimento tipo determinando quatro vãos. Já no térreo, a divisão do
espaço em duas lojas iguais e uma entrada social central,
obrigaram uma mudança no ritmo de distribuição
estrutural, inevitavelmente, acarretando em duas
transições. A primeira, e mais importante, acontece na
fachada; a grelha, que define os terraços nos pavimentos,
é composta por cinco pilares delgados que descarregam
suas cargas numa viga de transição no térreo, apoiada
agora por quatro pilares mais robustos, permitindo um
vão estrutural maior para a entrada das lojas e definindo a
entrada social entre dois apoios.

A segunda linha de pilares, no sentido do


alinhamento para o centro do terreno, é composta por
quatro vãos, ou cinco pilares, sendo que no do centro,
ocorre uma segunda transição, adotada para dividir a carga
dele em dois pilares menores, liberando o eixo de simetria
da planta térrea para a circulação. Nesta linha, os pilares das
extremidades são da espessura da parede, sendo portanto
mais finos que os do meio, porém mais compridos. A
terceira linha possui três vãos, intercalando a posição de
seus pilares com os da segunda linha, contribuindo assim
para o travamento da estrutura.
pilares no pavimento térreo

transições
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Fachadas

O edifício Icaraí não conta com recuos laterais,


possuindo apenas duas faces com aberturas, porém, a face
posterior do volume, que volta-se para o interior da quadra,
não recebeu um tratamento arquitetônico relevante; já a
face que se volta para a praça Roosevelt assume o papel
de fachada principal e divide-se em base, corpo principal
e coroamento. A base, correspondente ao térreo, tem
como elemento marcante a viga transição situada sobre
as portas das lojas e do acesso social, bem destacado por
dois robustos pilares que o ladeiam. O corpo principal, que
corresponde aos 24 andares de apartamentos, tem como
elemento principal uma grelha de pilares e lajes que vão
se tormando mais delgados no sentido do fundo do lote à
fachada principal, conferindo leveza à composição; as lajes
dos terraços também se afinam no mesmo sentido. Esta
grelha estrutural, que abriga os terraços, possui 3,50m
de largura por 3,00m de altura e 1,20m de profundidade,
sendo portanto composta por elementos retangulares, mas
que ao observador, são percebidos como quadrados. Por
mais que, em termos construtivos, se saiba que a grelha é
um elemento adicionado ao corpo principal da edificação,
em termos perceptivos, ela pode ser vista como quadrados
subtraídos de um volume maior.

As cinco linhas verticais presentes na fachada


praticamente se unem no ponto de fuga quando se olha
o edifício de baixo para cima, o que exacerba o senso de
verticalidade da torre; para se reduzir essa percepção
demasiadamente vertical, surgem os guarda-corpos,
compostos por um elemento horizontal mais espesso
e marcante, e mais quatro tubos metálicos, também
horizontais, na parte inferior.

Originalmente, todas as paredes internas dos


terraços eram pintadas em cores vivas e variadas, gerando
um interessante movimento cromático. Além disso, essa
pintura intensificava a sensação do vazio criado pela
subtração do terraço, trazendo tridimensionalidade à
fachada e enriquecendo, portanto, a volumetria. Diante
dessas considerações, parecia ser uma preocupação de
Heep, a visão que o observador, situado no térreo, em
frente ao edifício, teria ao olhá-lo de baixo para cima.
Apesar de não existirem textos do autor que comprovem
essa hipótese, a análise do todo de sua obra é um indício
dessa preocupação.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Além das referências à Le


Corbusier já citadas na análise do
edifício Normandie no que diz respeito
a conceitos sobre arquitetura e cidade,
pode-se dizer que a fachada do Icaraí
também é impregnada de elementos
oriundos da obra deste arquiteto.
Neste caso, é muito clara a referência
à Unidade de Habitação de Marselha35
no emprego de terraços coloridos
e subtraídos do volume principal;
em ambos os casos, o resultado
alcançado foi uma volumetria mais
rica através dos sombreamentos, que
é reforçada mais ainda pelas cores
vivas e variadas.
Unidade de Habitação de Marselha - Le Corbusier - 1945 Capa da revista Acrópole
Fonte: http://2.bp.blogspot.com/8Rightee_2%252529.jpg nº 210 - 1956
acesso em outubro de 2009

(35) - As Unidades de Habitação (Unité d’Habitation) são grandes edifícios modulares projetados por Le Corbusier após a 2ª guerra mundial. Elas foram construídas em Nantes-Rezé,
Briey-en-Foret, Meaux, Belim e Firminy, porém, a mais célebre é a de Marselha; nela, Le Corbusier teve, pela primeira vez, liberdade total para expressar suas concepções sobre a
habitação moderna destinada à classe média. (BOESIGER, Willy. Le Corbusier. São Paulo: Martins Fontes, 1998.)
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

planta do pav. térreo planta do subsolo


esc. 1:250 esc. 1:250

1 - acesso social 1 - estoques/lojas


2 - hall elevadores 2 - caixas d’água
3 - lojas
4 - banheiros

planta do pav. tipo


1º ao 24º pav.
esc. 1:250

1
kitchenette - 43 m²
1 - cozinha
2 - banheiro
3 - sala-living
4 - terraço
1
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

corte AA
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Edifício Icaraí atualmente


Foto: Edson Lucchini Jr.

Edifício Icaraí atualmente


Foto: Edson Lucchini Jr.

fachada praça roosevelt


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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

detalhe da modulação da fachada


Fachada modulada pelos terraços, cuja
medida corresponte exatamente ao vão
da estrutura. Utilização de caixilho piso-
teto

detalhe do coroamento
O coroamento segue as linhas verticais
e horizontais da fachada, criando um
guarda-corpo para a cobertura igual aos
demais, porém opaco, sem os gradis.

detalhe do térreo
No térreo há uma robusta viga de tran-
sição que possui uma leve inflexão. As
portas da entrada social e das lojas são
recuadas afim de serem protegidas da
chuva.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Foto: Edson Lucchini Jr.


6.4 Edifício Ibaté 1953-55
endereço e localização
Rua Antonio Carlos 396 - Bela Vista

bo
klo
oc
ad

r.
a
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on
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ta
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ug
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a
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r.
o

construção
Otto Meinberg S.A.

terreno
Retangular - 668 m²

unidades
1º ao 6º pav.:
2 kitch. de 30,75m², 5 ap. de 62m²,
1 ap. de 90,20m²
7º pav:
6 ap. de 54m2, 1 ap. de 73m²
8º pav.:
5 ap. de 42,25m², 1 ap. de 80,30m²
Total: 61 unidades
publicações
Habitat 29, 1956, p.62-63

c o e f. d e a p ro ve i ta m e nto
7.2 - Área total = 4815m²

taxa de ocupação
83 %

conservação
Boa

descaracterização
Foto do ed. Ibaté em 1956 Fonte: Revista Habitat 29, 1956, p.62.
Baixa
95
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A Rua Augusta36

A rua Augusta, onde situa-se o edifício Ibaté, além


de siginificar uma importante conexão viária entre o centro
da cidade, a avenida Paulista e a zona sul, destaca-se pela
intensa vocação comercial, cultural e de lazer na cidade
de São Paulo, além do seu valor simbólico. As primeiras
referências históricas relacionadas à via são do final do
século XIX, quando ela se chamava rua Maria Augusta,
passando a se chamar rua Augusta em 1897.

Rua Augusta nos anos 1960


Nos anos 1950, a Augusta tornou-se um importante
Fonte: http://centrosp.prefeitura.sp.gov.br/projetos/augusta.php vetor das transformações sociais, econômicas e culturais
acesso em março de 2009 que elevaram a cidade de São Paulo ao patamar de
metrópole moderna pujante; o edifício que simboliza
esta transformação é o Conjunto Nacional, projetado por
David Libeskind em 1954. Situado em um terreno que
corresponde à quadra delimitada pelas ruas Augusta,
Padre João Manoel, alameda Santos e avenida Paulista, o
Conjunto Nacional é possivelmente o mais bem-sucedido
projeto de edifício multifuncional já concebido na cidade
de São Paulo.

O edifício Ibaté situa-se a duas quadras do Conjunto


Nacional, na esquina da rua Augusta com a Antonio Carlos,
que é a segunda paralela à avenida Paulista na direção do
Mier van der Rohe olhando a maquete do Conjunto Nacional de David Libeskind –
São Paulo
centro da cidade. É mais um edifício projetado por Franz
Fonte: TOMBI BRASIL, Luciana; David Libeskind; Coleção olhar arquitetônico; São Pau- Heep e executado por Otto Meinberg, sendo o mais distante
lo; Romano Guerra Editora, 2007
do centro da cidade já produzido por esta parceria.

Terreno, implantação, volumetria e entorno

O terreno, de geometria retangular, onde situa-


se o edifício Ibaté, possui 46,65m de comprimento, que
acompanha o alinhamento com a rua Antonio Carlos, por
14,32m de largura, que se alinham com a rua Augusta. A
rua augusta

bloco principal maior face do terreno, voltada para a rua Antonio Carlos,
sofre um desnível de 3,00m, no sentido da esquerda para
a direita, para quem desta rua vê o edifício de frente,
portanto, o ponto mais baixo do terreno, situa-se na
rua antonio carlos esquina com a rua Augusta.
Pavimento térreo

O partido de implantação acompanha a geometria


do lote, definindo um volume cuja relação proporcional do
corpo elevado é de 46,65m de comprimento por 14,32m
de largura e 34,00m de altura. O térreo ocupa quase

(36) - As informações sobre a rua Augusta foram compiladas a partir de informações provenientes do site http://pt.wikipedia.org acessado em fevereiro de 2010
96
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

a totalidade do lote, com exceção de três vazios para


iluminação das lojas, além de um chanfro no cruzamento
com a rua Augusta, que subtrai área interna, liberando
circ. vertical circ. vertical
mais espaço para a esquina e encurtando o percurso do
pedestre que vem pela rua Augusta em direção à Antonio
Carlos e vice-versa.

rua augusta
bloco principal
A partir do primeiro pavimento, o corpo elevado
segue faceando os alinhamentos do terreno, porém, ele
rua antonio carlos
recua-se da divisa dos fundos em 3,20m; somente as caixas
1º ao 6º andar
de escadas e elevadores, além de um pequeno trecho
da planta na extremidade direita, continuam faceando a
divisa dos fundos. O sétimo pavimento sofre recuos, que
o desloca em 1,60m do alinhamento com a rua Antonio
Carlos e 1,20m do alinhamento com a rua Augusta.
No oitavo pavimento há um novo recuo em relação ao
sétimo em mais 1,75m no sentido longitudinal e 1,35 no
transversal. O edifício, portanto, conta com térreo mais oito
pavimentos, sendo que os dois últimos são escalonados. A
altura total da face do volume voltada para a rua Augusta
é de 34,00m, porém, devido ao desnível que ocorre no
térreo, a face oposta do volume conta com 31,00m de
altura. Esta diferença de 3,00m, fez com que fosse possível
a adoção de uma sobreloja apenas na porção direita, para
quem vê o edifício da rua Antonio Carlos, como mostra o
corte esquemático abaixo.

O entorno do Ibaté, de modo geral, é composto


por edifícios de gabarito semelhante, porém há algumas
variações; o edifício que o ladeia na rua Antonio Carlos
possui altura condizente, porém o edifício vizinho na rua
Augusta possui um gabarito muito inferior; o mesmo
ocorre com outras construções próximas, ainda na rua
Augusta, fazendo com que haja uma descontinuidade na
composição da fachada da quadra.

sobreloja
3.00

0.00

Corte esquemático do térreo r. augusta


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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Térreo


O pavimento térreo acompanha o desnível de
3,00m que o terreno sofre em seu sentido transversal,
loja na direção da esquerda para a direita, para quem, da rua
90m² Antonio Carlos, vê o edifício de frente; deste modo, as seis

rua augusta
loja loja loja loja lojas acompanham este desnível, estando cada uma numa
83m² 97m² 88m² 95m² loja
86m²
cota diferente. Destas seis lojas, quatro estão totalmente
voltadas para a rua Antonio Carlos, uma está voltada para a
rua Augusta, e uma está na esquina, abrindo-se para ambas
rua antonio carlos as ruas. O acesso dos moradores se dá na porção central da
circulação horizontal - hall social planta térrea, onde um corredor de 4,00m de largura por
circulação vertical 12,00m de comprimento conduz aos elevadores. Ladeando
lojas à direita o acesso principal de moradores, encontra-se
uma entrada independente que conduz à sobreloja, cujo
uso se destina a escritórios. Sem dúvida, a adoção de lojas
no térreo foi uma decisão acertada por se tratar de um
projeto implantado em uma das ruas de comércio mais
intenso da cidade.

As lojas, da esquina e a que se volta para a Augusta,


sofrem um chanfro que tira a ortogonalidade das suas
plantas, mas que atribui ao edifício um entendimento
da esquina, aumentando a sua área para os pedestres e
encurtando o caminho deles quando o trajeto é da Augusta
para a Antonio Carlos e vice-versa. Um pilar de seção
circular marca e organiza a esquina37, além de conferir
leveza ao volume, já que este pilar redondo afasta-se da
linha dos demais, soltando a quina.

Térreo do Ibaté - Lojas


Foto: Edson Lucchini Jr.
O bom entendimento da esquina, alcançado por
Heep em outros edifícios com as mesmas características
do Ibaté como o Araraúnas, o Iporanga e o Ouro Verde,
mostra a preocupação do arquiteto com a necessidade de
se entender a esquina e o contexto urbano, valorizando as
visuais do edifício e o conforto do pedestre.

Circulação Vertical


A circulação vertical do Ibaté, assim como na maioria
dos edifícios laminares projetados por Heep, é feita em
volumes secundários, destacados do principal, que faceiam
a divisa de fundos do terreno, porém, neste caso em
análise, as escadas e elevadores estão em caixas separadas
Térreo do Ibaté - valorização da esquina. e independentes entre si. A caixa de elevadores situa-se na
Foto: Edson Lucchini Jr.
porção central da planta; já a de escadas, desloca-se mais
(37) - Termo extraído de (BARBOSA, 2002, p. 92)
98
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

à esquerda. Há dois elevadores, um social e um de serviço,


que servem do térreo ao oitavo andar. A escada é linear
na transição do térreo para o 1º pavimento, assumindo a
forma de “U” com patamar curvo intermediário, do 1º ao
8º andar.

rua augusta
Pavimento tipo e unidades
62m² 30m² 30m² 62m² 62m² 62m² 62m² 90m²

Em todos os andares destinados às habitações (1º


rua antonio carlos
ao 8º), o arranjo espacial dos pavimentos se dá por um
Esquema de distribuição do pavimento tipo do 1º ao 6º andar corredor linear voltado para a face posterior da lâmina
circulação horizontal
principal, que, iluminado e ventilado por cobogós de
circulação vertical
concreto, distribui os fluxos para os apartamentos, voltados
unidades para a face principal de orientação sudoeste, que abre-
se para a rua Antonio Carlos. Do 1º ao 6º andar, o Ibaté
conta com o mesmo arranjo espacial dos pavimentos, e
com a mesma distribuição e dimensões das unidades.
Nestes andares, há oito unidades em cada, sendo duas
kitchenettes de 30,75m² e cinco apartamentos de 62,00m²,
todos voltados para a rua Antonio Carlos. Há uma unidade
maior que conta com 90,20m² e se abre para a rua Augusta
e para a Antonio Carlos.

As unidades do tipo Kitchenette, que são minoria no


Ibaté, possuem um arranjo espacial muito semelhante ao
de outras já experimentadas por Heep em outros edifícios
como o Icaraí e o Normandie, portanto, já descritos e
analisados anteriormente.

Os apartamentos de 62m² são os que predominam


no edifício Ibaté; o acesso se dá por um corredor que
distribui os fluxos para os setores de serviço, social e
íntimo de maneira independente. Logo que se adentra
o apartamento, à direita situa-se o banheiro de 2,50m
de comprimento por 2,10m de largura; estas medidas
permitem a colocação de um bidê, um vaso sanitário,
uma pia e uma banheira, com espaços generosos entre
eles. Seguindo pelo corredor, mais adiante, à esquerda,
conforma-se um pequeno hall que distribui o fluxo para
uma lavanderia, para a cozinha, para a sala de estar e para
o dormitório. A lavanderia é um espaço retangular de
1,00m de largura por 2,50m de comprimento, suficiente
para a colocação de um tanque, porém, o uso de uma
máquina de lavar roupas não seria possível. A cozinha
Planta das unidades de 62m² é um ambiente também de geometria retangular, que
conta com 2,00m de largura por 3,65m de comprimento,
suficientes para as funções normalmente atribuídas a este
99
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

espaço. As salas de jantar e estar compartilham de um


único espaço retangular de 3,15m de largura por 5,20m
de comprimento, que permite a distribuição de um lay-
out suficiente para atender as funções de estar e comer. O
dormitório conta um espaço idêntico ao da sala de estar,
porém, ainda possui um closet.

No edifício Ibaté, é possível identificar uma postura


racional em relação à hidráulica dos apartamentos; isto
Esquema de distribuição de áreas molhadas, estar e repouso poderá ser notado em quase todos os edifícios analisados,
entre eles o Lausanne (p.113) e o Ouro Preto (p.142).
áreas molhadas
Nota-se que há uma separação clara das áreas molhadas
áreas de estar e repouso
das de estar e repouso nos apartamentos, com a intenção
de racionalizar os elementos hidráulicos, concentrando-os
numa mesma região da planta, o que siginifica economia
com tubulações e facilidade de manunteção.

As maiores unidades do Ibaté possuem cerca de


90,00m² e situam-se na extremidade direita do edifício,
para quem o vê de frente pela rua Antonio Carlos. Assim
como nas unidades de 62,00m² já descritas, neste caso,
um corredor também distribui os fluxos para os diferentes
setores da planta, porém, há uma fragmentação da área
íntima, já que os dois dormitórios não se ladeiam e não
estão muito próximos, causando um conflito entre os
setores da planta.

Este conflito é, mais uma vez, um forte indício de


que na obra de Heep, o ímpeto racional prevalece sobre
as questões espaciais, já que esta fragmentação da área
íntima se deu pela manutenção das áreas molhadas na
mesma porção da planta em que elas aparecem nas
demais unidades, fato que neste caso, prejudicou o arranjo
da planta, mas não agrediu a racionalização das prumadas
hidráulicas.

As dimensões dos ambientes não se diferem muito


das descritas no apartamento de 62,00m², com exceção
das salas de estar e jantar, que são 5,00m² maiores. Há
um terraço de 6,00m² que, acessado pelo dormitório de
solteiro e pela sala de jantar, projeta-se sobre o passeio
da rua Augusta. Estas unidades são as únicas em todo o
edifício que possuem dois dormitórios, sendo que o de
casal volta-se para a rua Antonio Carlos, e o de solteiro,
para a rua Augusta.

Planta das unidades de 90m²


100
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O 7º pavimento é o primeiro a sofrer o recuo


obrigatório de 1,60m no alinhamento dele em relação
aos inferiores. O arranjo do pavimento e a distribuição
das unidades não muda significativamente; este andar
não conta mais com as kitchenettes, pois com o recuo
54m² 54m² 54m² longitudinal de 1,60m elas ficariam muito pequenas. Deste

rua augusta
54m² 54m² 54m² 73m²
modo, o 7º pavimento conta com seis unidades de 54,00m²
e uma de 73,00m². O recuo não interferiu muito no arranjo
rua antonio carlos das plantas das seis unidades de 54,00m² em relação às
Esquema de distribuição do 7º pavimento de 62,00m² dos andares inferiores, sendo que a única
diferença entre elas, além da perda de 8,00m², é o fato
circulação horizontal da sala de estar e do dormitório terem se transformado
circulação vertical em terraços abertos, que não contam na área total do
unidades apartamento.

A unidade de 73,00m² também possui um arranjo


espacial muito semelhante às de 90,00m² dos pavimentos
infeiores, porém, o fato dela também se voltar para a rua
Augusta, fez com que ela sofresse um recuo de 1,20m no
sentido transversal, além do recuo de 1,60m no sentido
42m² 42m² 42m² 42m² 42m² 80m²
longitudinal, como nas demais do 7º pavimento; isto gerou
rua augusta a perda de um dormitório na unidade de 73,00m² em
relação à de 90,00m².
rua antonio carlos

Esquema de distribuição do 8º pavimento O 8º pavimento sofre um novo recuo em relação


ao 7º, de 1,75m no sentido longitudinal (em relação à rua
Antonio Carlos) e de 1,35m no sentido transversal (em
relação à rua Augusta), gerando uma nova distribuição das
unidades ao longo do pavimento, além de um novo arranjo
nas plantas dos apartamentos. Agora, são cinco unidades
de 42m² e uma de 80m². As unidades de 42,00m² possuem
um arranjo semelhante às de 54,00m² do 7º andar e às
de 62,00m² do 1º ao 6º, porém, a dimensão reduzida no
sentido longitudinal, obtida graças ao recuo do pavimento,
trouxe a perda da área de serviço e do closet, além de
dimensões reduzidas para a sala de estar e o dormitório.

A unidade de 80,00m² do 8º andar possui uma


distribuição singular em todo o edifício. O acesso a ela se dá
por um corredor, onde à direita, de quem entra, situa-se o
banheiro e à esquerda, a cozinha, de onde se acessa a área
de serviço. Ao final do corredor, há um espaço retangular
de 22,00m² que corresponde às salas de jantar e estar,
que abrem-se para um terraço contínuo e descoberto. Na
porção extrema direita da planta, para quem vê o edifício
de frente pela rua Antonio Carlos, situam-se os dois
Planta da unidade de 80m² dormitórios, sendo que o de solteiro volta-se para esta rua
e o de casal, para a rua Augusta.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Perspectiva do Ibaté - esquina entre as ruas Antonio Carlos e Augusta


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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Fachadas

A descrição e a análise das fachadas do edifício Ibaté


se concentrarão nas duas que se voltam para a cidade: a
da rua Antonio Carlos, com orientação sudoeste e a que
se volta para a rua Augusta, com orientação nordeste. A
terceira fachada que recebeu tratamento arquitetônico é
a dos fundos, onde predominam os cobogós de concreto
que iluminam e ventilam os corredores.

A fachada da rua Antonio Carlos pode ser


considerada a principal; apesar de estar voltada para
uma rua de menos significado simbólico para a cidade, a
fachada da Antonio Carlos é a maior e para onde se voltam
a maioria das aberturas do edifício. No térreo predominam
na fachada as portas das lojas, com bandeiras superiores
de ventilação e iluminação. A entrada social ocorre na
porção central da fachada da Antonio Carlos e se dá por
uma grande abertura de cantos arredondados que quebra
o ritmo estabelecido pelas portas das lojas, marcando
significativamente a entrada do bloco residencial. Na
fachada da rua Augusta, também predominam no térreo
as portas das lojas. Como já mencionado anteriormente,
a esquina recebeu um tratamento especial, já que o recuo
das lojas em relação ao alinhamento, produziu uma área
Fachada do Ed.Ibaté atualmente
Foto: Edson Lucchini Jr.
coberta, que aumenta e valoriza o importante espaço
de encontro entre duas vias. Além disso, o pilar redondo
deslocado da quina, solta o volume, conferindo leveza.
103
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

No corpo principal da fachada, que corresponde a


seis andares de apartamentos, uma grelha não-estrutural de
concreto se sobressai no volume do edifício; ela é composta
por retangulos de 6,45m de comprimento por 3,00m de
altura e 60cm de profundidade, que correspondem a um
apartamento, e enquadram duas aberturas. Os elementos
horizontais da grelha são floreiras, que possuem 35cm de
altura; elas são os elementos mais espessos da fachada,
que enfatizam a horizontalidade da composição; este
recurso já foi utilizado por Heep no edifício Normandie,
onde a floreira saliente ajuda na diminuiçao da sensação
vertical. Ao se observar a fachada do Ibaté, num primeiro
momento, crê-se que as floreiras são vigas salientes que
marcam as transições entre os pavimentos, mas na verdade,
elas estão 55cm acima das lajes, iludindo a posição exata
desta transição entre os andares. Os elementos verticais
da grelha são prolongamentos das paredes internas que
separam as unidades, projetando-se na fachada, de modo
a individualizar os apartamentos. Pode-se dizer que a
grelha é um elemento que atribui volume, cheios, vazios
e sombras à fachada. Além disso, ela também exerce um
importante papel de proteção solar; a orientação sudoeste
faz com que o sol da tarde incida diagonalmente sobre
a fachada. Desta forma, a grelha, com seus elementos
salientes verticais e horizontais cria um anteparo à luz e ao
Grelha da fachada do Ibaté
Foto: Edson Lucchini Jr. calor.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O edifício Ibaté representa uma exceção na obra


de Franz Heep no que diz respeito aos caixilhos. Em todas
as demais obras estudadas, eles foram desenhados pelo
próprio arquiteto, porém neste caso, Heep optou por um
caixilho disponível no mercado da época: a “Janela Ideal”,
amplamente utilizada em projetos de apartamentos
residenciais nos anos 1940, 1950 e 1960. A “Janela Ideal”
é um painel de madeira pré-fabricado que, na maioria
dos casos, ocupa todo o vão estrutural, praticamente
eliminando os fechamentos em alvenaria nas fachadas.

“Essa condição encerra vantagens formativas


excepcionais para as fachadas dos edifícios,
pois iludem a figura da janela e a conseqüente
perfuração da parede e oferecem elementos
fabricados como painéis que definem planos
quadriláteros regulares completados com
alvenarias íntegras [...]”.
(ESPALLARGAS GIMENEZ, 2009.)

A “janela Ideal” é composta por bandeira e peitoril


fixos de ripas de madeira que fazem o papel de venezianas
ou brises. As duas folhas móveis, também ripadas de
madeira, abrem como “guilhotina”. Duas folhas em vidro
Propaganda da Janela “Ideal” correm por trás das venezianas.
Fonte: Revista Acrópole nº236, janeiro de 1958
105
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A fachada da rua Augusta pode ser dividida em


quatro faixas verticais que compõe seu todo. A primeira
faixa, da esquerda, para quem vê o edifício de frente pela
rua Augusta, é uma empena cega branca, que extrapola
a altura do edifício. Este é um recurso de marcação de
esquina já utilizado por Heep no edifício Ouro Verde, de
1952. Logo acima do térreo, surge na empena um volume
sobressaliente que caracteriza uma janela de banheiro
do tipo “indevassável”, que também será utilizada por
Heep no edifício Araraúnas (p.183), de 1953. Ladeando a
empena cega, surge uma faixa de terraços sobressalentes,
que projetam-se sobre o passeio da Augusta; a leveza e
o jogo de volumes e sombras promovido pelos terraços,
contrapõe a austeridade e opacidade da empena ao lado,
que marca a esquina. O desenho dos guarda-corpos dos
terraços, com sua parte frontal em alvenaria e as laterais
vazadas e protegidas por grades tubulares, viria mais tarde
a ser utilizado por Heep em outros edifícios, como por
exemplo o Ouro Preto, de 1954. Ao lado dos terraços,
há uma faixa de caixilhos (Janela Ideal) e por fim, uma
última empena cega, bem mais estreita que a da esquina,
deixando clara uma noção de hierarquia entre elas.

Ed. Ouro Verde - Adolf Franz Heep - 1952


Foto: Edson Lucchini Jr.

Ed. Ouro Preto - Adolf Franz Heep - 1954


Foto: Edson Lucchini Jr.

Ed. Ibaté - fachada da rua Augusta atualmente


Foto: Edson Lucchini Jr.
106
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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O coroamento do Ibaté ocorre nos dois últimos Considerações e hipóteses acerca da postura de
pavimentos, que sofrem o escalonamento obrigatório. Heep em relação aos escalonamentos e coroamentos dos
Os recuos geraram terraços descobertos, separados entre edifícios serão comentadas de forma mais detalhada nas
si por muros de 2,00m de altura que individualizam as conclusões deste trabalho (p.271).
unidades residenciais. Não há mais o uso da “Janela Ideal”
e sim, portas balcão de abrir com bandeira superior de
ventilação permanente. O 7º pavimento ainda conta com Situação Atual
a floreira da grelha dos andares inferiores, porém, no
8º, ela dá lugar a um guarda-corpo de concreto e tubos
metálicos. Atualmente, o edifício Ibaté encontra-se num
estado satisfatório de conservação e num nível baixo de
No coroamento do edifício Ibaté, como em quase descaracterização em relação ao projeto original. Como
todos os demais estudados, o escalonamento obrigatório em quase todos os edifícios estudados, os fatores que mais
surge como uma forte condicionante de projeto, que agridem as fachadas são os fechamentos de terraços com
desafia a capacidade do arquiteto em obter uma solução caixilhos variados e de péssima qualidade, que empobrecem
harmoniosa. Só o escalonamento em si já representa uma a volumetria original do edifício e comprometem a unidade
ruptura com a unidade do corpo principal da fachada, mas da fachada. Os andares escalonados estão com seus
aqui neste caso, e em quase todos os projetos de Heep, terraços quase todos cobertos com materiais diversos,
esta ruptura se reforça com a adoção de caixilhos, guarda- atribuindo um aspecto negativo ao edifício.
corpos e floreiras diferentes dos utilizados no restante da
torre.
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planta do pav. térreo


esc. 1:250

1 - hall de social - portaria


2 - hall de elevadores sociais
3 - depósito de lixo
4 - áreas descobertas
5 - banheiros
6 - lojas

planta do 1º ao 6º pav.
esc. 1:250
1 2 3

1 2 3
kitchenette - 30,75 m² apto. 1 dorm. - 62 m² apto. 2 dorm. - 90,20 m²
1 - cozinha 1 - cozinha 1 - cozinha
2 - banheiro 2 - serviço 2 - banheiro
3 - sala-living 3 - banheiro 3 - sala de jantar
4 - sala de jantar 4 - sala de estar
5 - sala de estar 5 - dormitório casal
6 - dormitório 6 - dormitório solteiro
7 - closet 7 - terraço
8 - serviço
108
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

planta do 7º pav. 1 2
esc. 1:250

1 2
apto. 1 dorm. - 54 m² apto. 1 dorm. - 73 m²
1 - cozinha 1 - cozinha
2 - serviço 2 - banheiro
3 - banheiro 3 - sala de jantar
4 - sala de jantar 4 - sala de estar
5 - sala de estar 5 - dormitório
6 - dormitório 6 - serviço
7 - closet 7 - terraços

planta do 8º pav.
esc. 1:250
1 2
1 2
apto. 1 dorm. - 54 m² apto. 1 dorm. - 73 m²
1 - cozinha 1 - cozinha
2 - serviço 2 - banheiro
3 - banheiro 3 - sala de jantar
4 - sala de jantar 4 - sala de estar
5 - sala de estar 5 - dormitório
6 - dormitório 6 - serviço
7 - closet 7 - terraços
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

corte BB
110
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

fachada rua augusta corte AA


111
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

fachada rua antonio carlos


112
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

detalhe de fachada - térreo


Ritmo das portas das lojas é rompido pela
imponência do acesso social.

detalhe de fachada
Grelha cujas unidades retangulares
correspondem a um apartamento. Seus
elementos horizontais são floreiras que
iludem a transição entre os pavimentos.

detalhe de fachada - coroamento.


Os dois últimos pavimentos são escalonados
e rompem com a tipologia predominante;
presença dos terraços descobertos.
113
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Foto: Edson Lucchini Jr.


6.5 Edifício Lausanne 1953-58
endereço e localização
Av. Higienópolis 101/111 - Higienópolis


baa
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o mackenzie

construção
Construtora Auxiliar S.A.
(Engº resp. Elias e Aizik Helcer)
terreno
Retangular - 1635,00 m²
unidades
Térreo: 2 ap. de 165 m²
1 ap. zelador de 80 m²
1º ao 13º pav.: 4 ap. de 175 m²
14º pav.: 4 ap. de 152 m²
15º pav.: 1 ap. de 263 m²
2 ap. de 133 m²
Total - 62 unidades
publicações
Acrópole 239, 1958, p. 504 a 509

c o e f. d e a p ro ve i ta m e nto
8,50 - Área total = 13.960m²

taxa de ocupação
49,5 %

conservação
Ótima
Perspectiva original do Edifício Lausanne
Fonte: Fotografia de Fernando Martinelli do quadro que contém o desenho original, desenhado
descaracterização
por Franz Heep, encontrado no escritório do engenheiro Aizik Helcer em São Paulo. Baixa
114
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Higienópolis e o edifício Prudência

O edifício Lausanne está situado na avenida


Higienópolis, no bairro de mesmo nome, que sempre
foi marcado pela elegância de suas construções desde
a sua primeira ocupação, no início do século XX, pelos
luxuosos casarões, até a sua verticalização, iniciada de
maneira tímida no final dos anos 1930 e com seu apogeu
nos anos 1950. Higienópolis se tornou uma referência
na substituição de casas por edifícios residenciais dentro
Avenida Angélica no começo do século XX
Fonte: www.verbeat.org/blogs/donizetti/2009/03/avenida-angelica.
de novas exigências legais que garantiam uma ocupação
html - Acesso em março de 2009 de qualidade, favorecendo a inovação arquitetônica e
associando prestígio à construção vertical, que fora num
primeiro momento alvo de preconceito por parte das
classes mais abastadas. Sem dúvida, o edifício que simboliza
esta transformação do bairro de Higienópolis, tornando-se
um marco, é o Edifício Prudência (1944-1948), projetado
por Rino Levi. (GAGGETTI, 2000, p.100)
“O Prudência (...) era considerado um artigo de
luxo e seus aluguéis eram caríssimos. O projeto
levava para o edifício todo o luxo e conforto
das antigas residências, seja nas dimensões
Edifício Prudência- 1944- Rino Levi
Fonte: www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/imagens/311_08. generosas ou nos acabamentos requintados”..
jpg - Acesso em abril de 2009 (GAGGETTI, 2000, p.102)
O edifício Lausanne, cujos projetos datam de 1953,
e a entrega em 1958, também foi muito importante para
a consolidação do modelo vertical de moradia de luxo. O
terreno onde ele foi erguido é o resultado da incorporação
de dois lotes, sendo que cada um deles possuia um grande
sobrado; foi adquirido por Nachman Helcer, dono da
Construtora Auxiliar S.A. e pai dos engenheiros Elias e Aizik
Helcer, que assinaram o projeto de Heep.
“No auge de sua maturidade profissional e de
produção de seu escritório, Heep desenvolve (...)
esse prédio de apartamentos, onde resume seu
ideário racionalista”. (BARBOSA, 2002, p.139)

Carimbo dos Irmãos Helcer


Construção do Edifício Lausanne - 1956
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
115
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Terreno, implantação, volumetria e entorno

O terreno onde situa-se o edifício Lausanne possui


topografia plana, conseguida por terraplanagem, já que
o seu perfil natural era caracterizado por um desnível de
aproximadamente 5,00m no sentido da rua Maranhão
para a avenida Higienópolis. A geometria retangular do
lote conta com 50,00m de frente, voltados para a avenida
Higienópolis, por 32,70m de fundo, totalizando 1635,00
m² de área. A ocupação dos lotes lindeiros laterais também
é dada por edifícios verticais residenciais; o lote lindeiro
ao fundo, separado do lote em questão por um muro de
arrimo, possui cota 5m acima do nível do térreo do edifício
Lausanne e é ocupado pelo edifício da Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo38.

O partido de implantação do edifício acompanhou


a geometria do lote e definiu um bloco cuja face principal
está voltada para a avenida Higienópolis e orientada a
nordeste. Além disso, este bloco está, em todas as suas
faces, recuado dos limites do terreno. O recuo frontal, que
circ. vertical circ. vertical separa o volume 9,30m do alinhamento com a avenida
Higienópolis, permitiu o ganho em altura e a minimização
dos escalonamentos obrigatórios, que no caso do edifício
Lausanne ocorre somente nos dois últimos pavimentos.
bloco 1 bloco 2 O volume ainda recua-se 3m das duas divisas laterais do
lote e 4,50m da divisa de fundo, resultando numa relação
proporcional no corpo elevado de 44,00m de largura por
32,70m de profundidade, além dos 51,55m de altura,
divididos em térreo mais 15 pavimentos, porém, os
av. higienópolis dois últimos sofrem o escalonamento, que diminui as
suas profundidades em 2,15m no 14º e 3,60m no 15º
pavimento. O volume é composto por dois blocos unidos
e espelhados entre si, com acessos e circulações verticais
independentes. A existência desses dois blocos distintos
é percebida apenas na fachada dos fundos; na fachada
principal a sensação é de um volume monolítico, suspenso
do chão por pilotis

O edifícios do entorno do Lausanne, por terem


sido construídos sob as mesmas premissas da legislação,
possuem gabarito semelhante, sem grandes distorções,
porém, o edifício que o ladeia à esquerda, de quem da
avenida Higienópolis o vê de frente, possui um gabarito
muito mais elevado que conta com 25 pavimentos, fato
possível por ele ter sido construído sob as premissas atuais
da lei, onde a altura da edificação não é mais relacionada à
largura da via.
(38) - O edifício da rua Maranhão abrigou o curso de arquitetura e urbanismo da USP até 1968, quando este se mudou para a Cidade Universitária; de 1973 até hoje funcionam no edifício
os cursos de pós-graduação (mestrado e doutorado) além da biblioteca.
116
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Térreo e subsolo

O pavimento térreo encontra-se 1,60m acima do


nível da avenida Higienópolis, o que permitiu a decisão
por um subsolo semi-enterrado, 1,60m abaixo da cota
da mesma avenida. Esta solução reduziu as escavações e
minimizou o comprimento de rampas de acesso aos níveis
ap. zel. do subsolo e do térreo, cuja elevação em relação à rua,
165 m² 80 m² 165 m²
trouxe mais visibilidade e imponência ao edifício.

Duas rampas curvas vencem o desnível entre a cota


da avenida Higienópolis e a do térreo, caracterizando um
percurso de entrada, desembarque e saída de automóveis.
Há também escadas que possibilitam o acesso de pedestres,
separando-os dos veículos. Outras duas rampas, situadas
em ambas as extremidades do terreno, acessam o subsolo,
av. higienópolis
vencendo outros 1,60m de desnível em relação à avenida
Esquema de distribuição do pavimento térreo Higienópolis. A existência dessas duas rampas caracteriza
circulação horizontal - hall social um percurso de entrada e saída de veículos no subsolo,
circulação vertical destinado às garagens, que contempla 61 vagas, porém,
unidades este número só é conseguido com o auxílio de manobristas;
o número de vagas condiz com o de apartamentos, fato
corrente na época apenas em edifícios de alto padrão.

Os moradores do Lausanne que possuiam


automóvel, o deixavam com manobristas na área de
desembarque do térreo, defronte aos acessos sociais
principais do edifício. Os manobristas conduziam o veículo
para o subsolo e retornavam à área de desembarque
pelas próprias rampas de veículos; os nichos de circulação
vertical do edifício não chegavam ao subsolo e não havia
escadas independentes para acessá-lo, tornando clara a
intenção de fazer com que as garagens fossem acessadas
apenas pelos manobristas. Posteriormente, foi construída
uma escada que liga o térreo ao subsolo, facilitando o
acesso dos moradores a este pavimento, já que não há
mais manobristas trabalhando no Lausanne.

No nível do térreo, antes de adentrar ao edifício, o


observador depara-se com a linha de pilotis que compõe
uma colunata permeada por jardins, que suspende o
volume e enquadra cheios e vazios. Dois destes vazios, são
os acessos principais, espelhados entre si e levemente
deslocados da porção central da planta. O nível térreo, assim
como quase todos os demais, organiza-se em simetria,
cujo eixo encontra-se no ponto médio da face frontal do
terreno, lindeira à avenida Higienópolis. Os dois blocos que
Capa da revista Acrópole nº 239 - 1958 compõe o edifício, espelhados entre si, possuem acessos
117
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

independentes, separados pela casa do zelador, situada


na porção central do térreo, cuja planta conforma um
trapézio; a base menor está voltada para a parte frontal
do edifício, desta forma, os lados inclinados deste trapézio,
que seguem no sentido da frente para os fundos do lote,
induzem o fluxo para o hall dos elevadores e de acesso aos
dois apartamentos térreos. Além disso, pode-se dizer que
os acessos principais do térreo ocorrem nos espaços vazios
entre a casa do zelador e os apartamentos, cujas paredes
curvas que os separam das áreas sociais, junto às paredes
inclinadas da casa do zelador, conformam um percurso de
acesso ao edifício, que possui momentos distintos, afinal,
a conformação geométrica descrita promove, ora um
estreitamento, ora uma abertura do percurso causando
diferentes percepções e sensações de espaço. A casa
Edifício Lausanne em 1958 do zelador tem em sua porção frontal, na base menor
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
do trapézio, uma sala de estar com um grande caixilho
que também atribui ao ambiente a função de guarita; o
espaço destinado à casa do zelador ainda conta com dois
dormitórios, cozinha, banheiro e um quintal descoberto,
que é conformado pelo vazio entre os dois blocos do
edifício.

As áreas não ocupadas do térreo, resultantes dos


recuos, são caracterizadas em sua maioria por canteiros.
Além deles, há um passeio em mosaico português que
circunda toda a edificação.


Circulação Vertical

Edifício Lausanne em 2009


Foto: Edson Lucchini Jr Como descrito anteriormente, o edifício Lausanne
possui dois blocos distintos. Cada um deles conta com
uma caixa de circulação vertical contida dentro do volume
principal; elas são espelhadas entre si e compostas por dois
elevadores sociais, dispostos lado a lado, e um de serviço,
ladeado por uma escada em formato de “U”, sem patamar
intermediário, que se torna linear na transição do 1º andar
para o térreo, devido à existência de uma laje de transição
entre estes dois pavimentos, que obriga o aumento do
número de espelhos. Além disso, somente entre o térreo
e o 1º pavimento, a escada se encontra em um volume
sobressaliente em relação à fachada posterior.

Edifício Lausanne em 2009 - Cobogós - Casa do Zelador


Foto: Edson Lucchini Jr
118
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Pavimento tipo e unidades

A distribuição das unidades no edifício Lausanne


ocorre segundo quatro conformações. O térreo conta com
175 m² 175 m² 175 m² 175 m² duas unidades idênticas, ambas com dois dormitórios e
165m², espelhadas entre si e situadas nas extremidades
laterais da planta. Do 1º ao 13ª pavimento, são quatro
av. higienópolis
unidades por andar, todas com 175m² e três dormitórios.
As duas situadas nas extremidades são idênticas, diferindo
Esquema de distribuição do 1º ao 13º andar das duas centrais apenas na disposição e tamanho dos
circulação horizontal - hall social banheiros e dormitórios de empregada. No 14º pavimento,
circulação vertical a necessidade de um recuo obrigatório de 2,15m com
unidades relação ao alinhamento dos pavimentos inferiores,
trouxe uma diminuição da área das unidades para 152m²,
com dois dormitórios, porém, com o arranjo espacial
semelhante ao dos apartamentos dos andares inferiores. O
15º pavimento sofre o segundo recuo obrigatório, de mais
2,15m em relação ao alinhamento do 14º andar, trazendo
a necessidade de um arranjo espacial diferente; o 15º
andar possui três unidades, sendo que uma delas ocupa
todo o bloco esquerdo do edifício e conta com 264m² de
área e três dormitórios. O bloco direito é divido em duas
unidades de 133m², com arranjos espaciais diferentes,
porém, com dois dormitórios cada. O edifício totaliza 61
unidades, sendo duas no térreo, 52 do 1º ao 13º andar,
quatro no 14º e três no 15º.

As unidades que mais se repetem no Lausanne são


as de 175m², presentes do 1º ao 13º andar. Junto à entrada
social do apartamento, há um biombo que induz o percurso
às áreas íntimas, sem que haja necessidade da passagem

Sala de Jantar e estar do apartamento de 175m²


Planta da unidade de 175m² - 1º ao 13º pavimento. Foto: Edson Lucchini Jr
119
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

pelas áreas sociais; além disso, o biombo conforma um hall


de entrada. As áreas sociais são definidas por um espaço
de 40m² sem compartimentações, cuja geometria em “L”
invertido, permite dois ambientes de estar e um de jantar.
Um caixilho de ferro e vidro, que vai do piso ao teto, separa
o terraço da sala de estar localizada na extremidade inferior
do “L” invertido. Este terraço, de geometria retangular e
área de 6,50m², é fechado pelos brises móveis coloridos
que compõe a fachada e serão descritos detalhadamente
mais adiante. Uma estante de concreto e madeira, solta
do piso e do teto, separa a sala de jantar de um corredor
íntimo, que confere privacidade à circulação entre os
dormitórios e os banheiros. Dois dos três dormitórios,
Edifício Lausanne em 1958 - Dormitório de solteiro sendo um de solteiro e um de casal, estão voltados para
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer a face principal do edifício, orientada a nordeste; ambos
possuem as mesmas dimensões, com 16m² e a mesma
geometria retangular O terceiro dormitório, destinado à
um solteiro e com dimensões menores, está voltado para
a face lateral do edifício; ele conta com 12,5m² e separa-se
do dormitório de casal apenas pelos armários embutidos
de ambos, sem o uso de parede de alvenaria. A copa e a
cozinha dividem um mesmo espaço retangular de 18m²,
separando-se apenas por armários. O acesso de serviço
do apartamento é feito pela cozinha, numa área próxima
à área de serviço, que conta com 6,70m² e funciona como
hall de distribuição para o dormitório e o banheiro de
empregada.

As plantas dos apartamentos do edifício Lausanne,
Edifício Lausanne em 1958 - Banheiro - Janela com cantos arredondados
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
independentemente de suas dimensões e arranjos
espaciais, possuem uma clara divisão entre as áreas que
concentram as instalações sanitárias, das áreas de estar e
circ. vertical circ. vertical
repouso. Isto, mais uma vez, reforça a postura racionalista
de Heep, que, na maioria dos casos, prioriza a economia
com elementos hidráulicos e a facilidade de manutenção
dos mesmos, deixando em segundo plano alguns confortos,
como por exemplo, o emprego de suítes. Desta forma, essa
racionalização hidráulica proposta por Heep acarreta em
arranjos espaciais em que os banheiros de casal e social
ladeiam-se e são acessados pelo corredor39. No caso do
edifício Lausanne, esta postura de racionalização hidráulica,
Esquema de disposição das áreas molhadas, estar e repouso e circulação vertical em detrimento do conforto é muito evidente, já que os
usuários do dormitório de casal tem que atravesar todo o
áreas molhadas corredor íntimo para acessar o seu banheiro.
áreas de estar e repouso

(39) -Este tipo de diposição, em que se prioriza a proximidade entre banheiros, é recorrente nos apartamentos de Heep. Os edifícios Ouro Preto (p.142) e Lugano e Locarno (p.226) que
são do mesmo porte do Lausanne, contam com arranjos espaciais semelhantes.
120
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Os dois apartamentos do térreo contam com uma


conformação espacial concebida sob as mesmas premissas
das utilizadas nos apartamentos dos andares superiores;
eles possuem 165m², o que não simboliza uma redução tão
significativa de área com relação aos demais apartamentos,
porém, eles possuem apenas dois dormitórios e uma sala
de estar maior, definida pelas paredes curvas que a separa
das áreas sociais do térreo.

Os apartamentos do 14º andar possuem um arranjo


espacial muito semelhante aos dos pavimentos inferiores,
porém, o escalonamento que o edifício sofre a partir deste
andar, reduz a área interna do apartamento, acarretando
num grande terraço descoberto que se estende por toda a
porção da planta que abriga o dormitório de casal e a sala de
estar, ambos voltados para a avenida higienópolis. Os dois
apartamentos das extremidades do 14º andar constituem
uma exceção na questão descrita na página anterior acerca
da racionalização hidráulica; nestes apartamentos, Heep
situa os banheiros entre os domitórios de solteiro e de
casal, criando uma suíte para este. Não foram idenficadas
limitações espaciais ou construtivas capazes de justificar
esta mudança na locação dos banheiros do 14º andar
em relação aos dos andares inferiores; ela pode ser fruto
de uma intenção de se criar plantas variadas, capazes de
Planta da unidade de 165m² - pavimento térreo atender a diferentes demandas.

152 m² 152 m² 152 m² 152 m²

terraço terraço terraço terraço

av. higienópolis

Esquema de distribuição do 14º andar

circulação horizontal - hall social


circulação vertical
unidades

Planta da unidade de 152m² - 14º pavimento.


121
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O 15º pavimento, devido ao escalonamento do


edifício, recua-se mais uma vez em relação ao andar
inferior, o que acarreta em um novo arranjo das plantas dos
apartamentos. Em todo edifício há dois apartamentos por
263 m² 133 m² 133 m²
bloco, porém, no 15º andar, o bloco da esquerda, de quem
152 m² da avenida Higienópolis vê o edifício de frente, é ocupado
por apenas um apartamento de 263m² de área, o maior
terraço terraço terraço do Lausanne. O bloco da direita continua dividido em duas
av. higienópolis unidades, porém diferentes entre si; ambas contam com
Esquema de distribuição do 15º andar 133m², as menores do edifício.
circulação horizontal - hall social
circulação vertical O apartamento de 263m² é o maior, não só do
unidades Lausanne, como de todos os edifícios projetados por Heep
em São Paulo; junto ao seu acesso social, há um hall de
11,00m² que, além de ser um espaço de recepção, também
desempenha um importante papel de distribuição dos
fluxos, de maneira independente, para todos os setores
do apartamento, como mostra o esquema ao lado; o hall
setor de serviço
de entrada ainda conta com um lavabo (ambiente que
acesso aparece somente neste apartamento em todo o edifício).
O setor social, definido por um retângulo de 12m de
distribuição comprimento por 5m de profundidade, totaliza 62m² de
setor íntimo
área e contempla uma sala de estar com dois ambientes e
uma sala da jantar. Há uma lareira, definida por um volume
setor social deslocado de paredes, que separa os ambientes de estar
da sala de jantar sem segregá-los visualmente, conferindo
uma considerável amplitude ao espaço. Caixilhos de correr
Setorização do apartamento de 263m² do 15º andar.
e blocos de vidro separam as salas do terraço, cuja extensão
é equivalente ao comprimento do apartamento. Em toda a
sua extensão, o terraço é coberto por dômus, que além do
papel de iluminação natural, desenham um interessante
coroamento ao edifício. Porém, o espaço destinado ao
terraço foi, logo após a inauguração do edifício, fechado
por caixilhos de vidro, ampliando as salas de estar e jantar
e minimizando a percepção do escalonamento do volume,
porém, empobrecendo o desenho original do coroamento;
com isso, os dômus de iluminação natural ficaram dentro
das salas, como mostram as fotos da próxima página.
Acredita-se que essa decisão de se fechar os terraços tenha
sido tomada após o deferimento do “habite-se” do edifício,
já que os projetos de prefeitura e executivo contam com os
terraços abertos.

O setor íntimo é composto por três dormitórios,


sendo que um de solteiro e o de casal são voltados para a
face principal do edifício e abrem-se para o terraço; o outro
dormitório de solteiro está localizado na porção superior
Planta da unidade de 263m² - 15º pavimento. esquerda da planta e possui a sua abertura na fachada
lateral esquerda, orientada a sudeste; este dormitório
122
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Edifício Lausanne em construção - 1956 - Vista do 15º andar Edifício Lausanne em 1958 - Sala do apartamento de 263m² do 15º andar
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

possui um banheiro privativo. No dormitório de casal planta do apartamento, está localizada a copa e a cozinha
surge, pela primeira vez, neste projeto, um closet; é por ele com despensa, além da área de serviço, com dormitório e
que se acessa o banheiro do casal e o ambiente de dormir. banheiro de empregada.
Pode-se dizer que o dormitório de casal é uma suíte, pois
possui um banheiro privativo, porém, este banheiro se O 15º pavimento ainda conta com duas unidades de
abre para o corredor, de onde se deduz que ele também 133,00m² e dois dormitórios cada; seus arranjos espaciais
possa ser usado socialmente, caracterizando uma situação diferem entre si não conceitualmente, mas na disposição
um tanto quanto inusitada. Na porção superior direita da de alguns ambientes, como mostram os desenhos abaixo.

Planta da unidade Planta da unidade


de 133m² de 133m²
15º pavimento. 15º pavimento.
123
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Perspectiva do Edifício Lausanne - Av. Higienópolis


124
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Fachadas

O edifício Lausanne caracteriza-se por um bloco


isolado, portanto, possui quatro fachadas passíveis de
tratamento arquitetônico. Na fachada voltada para a
avenida Higienópolis, identificam-se três momentos
distintos, que definem claramente o térreo, o corpo principal
e o coroamento do edifício. O térreo é caracterizado pela
sequência de pilotis, que revela o ritmo estrutural do
edifício, oculto nas demais partes superiores da fachada.
Os pilotis enquadram situações distintas, já que por trás
deles intercalam-se situações de cheios e vazios; as partes
que, em planta, correspondem aos apartamentos térreos
e à casa do zelador, recebem na fachada superfícies de
cobogós octogonais, rasgados esporadicamente por
aberturas retangulares que correspondem às janelas dos
apartamentos. Há momentos em que os pilotis enquadram
Edifício Lausanne em 1958
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer vazios; estes correspondem aos dois acessos do edifício,
separados pela casa do zelador, que também utiliza os
cobogós no fechamento de sua parte frontal.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Suspenso do chão pelos pilotis do térreo, o corpo


principal do edifício, que corresponde a 13 pavimentos,
é dominado pela presença das venezianas coloridas,
separadas ao longo dos andares por linhas brancas
horizontais de 30 cm de altura, que correspondem às
lajes. Entre o térreo e o primeiro pavimento, há uma laje
de transição estrutural, que possui 60 cm de altura. Pode-
se dizer que não há fechamentos em alvenaria na fachada
principal do edifício Lausanne. As venezianas, ou brises
de alumínio que predominam na fachada, são de correr;
as aletas que compõe os brises também são móveis,
permitindo um controle muito significativo de iluminação
e ventilação. Atrás das venezianas, ainda existem caixilhos
de madeira e vidro, que correm sobre uma barra, também
de madeira, que separa o caixilho de correr de um peitoril
de vidro que vai até o chão e também se abre como um
maxi-ar invertido. Os caixilhos do edifício Lausanne são
fruto de projetos exaustivamente detalhados, com muitos
elementos em escala 1:1. Aizik Helcer, um dos engenheiros
responsáveis da obra, relata em entrevista concedida em
janeiro de 2010, algumas experiências vividas por ele
durante o projeto e a execução do Lausanne:

“Meu pai (Nachman Helcer, dono da construtora


Auxiliar) e meu irmão (Elias Helcer) achavam o Heep um
louco e diziam para eu não ir atrás das idéias dele, mas eu
sou um engenheiro que deveria ter estudado arquitetura,
pois adoro, e por isso, queria ver onde as loucuras do Heep
iriam dar. Eu acreditava nas idéias do Heep, pois sabia que
ele era um grande arquiteto, um obstinado, e por isso eu
vivia brigando com meu pai e meu irmão. Segundo eles, a
idéia de uma fachada inteira com venezianas de alumínio
coloridas, sem nenhuma alvenaria, nem terraços e
reentrâncias, tornaria o edifício caro pra executar, além de
siginifcar um fracasso de vendas. Porém, definitivamente,
não foi isso que aconteceu. Tivemos muito lucro com o
Lausanne. Claro que os caixilhos ficaram caros, porém,
meu bom relacionamento com a Ajax (empresa de caixilhos
de alumínio) fez com que o preço fosse mais baixo que os
de mercado. Além disso, o que gastamos nos caixilhos,
economizamos no resto, pois o projeto era tão racional
e foi tão bem detalhado, com mais de 250 pranchas, que
não tínhamos perdas na execução. O Heep não ligava pra
dinheiro. Ele cobrava os seus honorários pra 50 pranchas; se
dessem 250 pranchas, o preço do projeto era o mesmo”.


127
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A idéia de Heep era que cada ambiente voltado O coroamento do Lausanne tem como elemento
para a fachada principal tivesse suas venezianas pintadas marcante uma laje perfurada por elementos trapezoidais
com cores diferentes. As cores propostas eram: creme, de cantos arredondados, que caracterizam dômus; no
azul-claro, vermelho e verde, dispostas de maneira início eles eram externos, cobrindo os terraços do 15º
aleatória. A simetria do edifício, claramente percebida andar como uma espécie de pergolado, porém, com o
em planta, seria fatalmente transposta à fachada. Porém, fechamento dos terraços, os dômus passaram a fazer
esta simetria é quebrada pela aleatoriedade das cores parte do interior dos apartamentos, perdendo uma de
das venezianas e pelas inúmeras posições diferentes que suas atribuições originais, que era a de coroar o edifício,
elas se encontram a todo momento, ora abertas, ora resultando no empobrecimento da fachada.
fechadas, conferindo um forte dinamismo à fachada. Além
disto, as venezianas fazem com que se perca a noção das Nas duas fachadas laterais, que se diferem apenas
compartimentações internas do edifício, conferindo uma pela disposição de algumas aberturas nos 14º e 15º
absoluta uniformidade à sua principal face. As linhas pavimentos, predominam superfícies cegas em alvenaria,
brancas que se sobressaem na fachada, correspondem sempre revestidas com pastilhas cerâmicas brancas, porém,
às lajes, assumindo um importante papel na atribuição destacam-se uma faixa de caixilhos similares aos da fachada
de horizontalidade ao conjunto. Hoje, as venezianas estão principal, que representam as aberturas dos dormitórios de
pintadas em apenas três cores: vermelho, verde e branco. solteiro dos apartamentos, além das janelas dos banheiros
Apesar da descaracterização, o conceito da aleatoriedade, com cantos arredondados, que simbolizavam um elemento
desejada por Heep, não se perdeu totalmente. corrente na obra de Franz Heep.
128
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A fachada dos fundos obviamente recebeu um


tratamento arquitetônico mais simples, porém, o fato dela
ser facilmente notada por quem trafega pela rua Maranhão
fez com que ela tenha sido concebida sob premissas de
ordem e ritmo; simétrica e predominantemente feita
em alvenaria revestida por pastilhas brancas, a fachada
dos fundos é bem organizada e composta por aberturas
generosas, que correspondem aos ambientes de serviço e
banheiros. Na porção central, há aberturas de domitórios
prejudicadas pelo fato de estarem voltadas para a face
sul e pelo sombreamento causado por se situarem numa
reentrância do volume. Ao contrário da fachada principal,
na face em questão é possível notar a presença dos dois
blocos distintos que compõe o edifício.

Detalhes construtivos

Heep desenvolveu para o Lausanne uma série de


elementos únicos e personalizados. Um deles é uma grade
contínua protetora da escada, que atravessa os pavimentos
e substitui os corrimãos.

Fachada dos fundos do Lausanne e a FAU-Maranhão - 1958


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

Detalhe da grade protetora da escada


Fontes: Desenho - Acervo do Ed. Lausanne - cedido por Fernando Martinelli
Foto: Edson Lucchini Jr.
129
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

No entanto, os itens mais exaustivamente


detalhados e que mais se destacam no edifício são os
caixilhos, com seus brises móveis que compõe a fachada
principal. Além destes, todos os demais foram desenhados
e detalhados, já que foram criados exclusivamente para o
Lausanne.

Caixilho dos dormitórios - Foto: Edson Lucchini Jr

Caixilhos dos terraços - Foto: Edson Lucchini Jr Detalhe da alavanca do brise - Fonte: Acervo do Ed. Lausanne - cedido por Fernando Martinelli

Detalhe dos caixilhos dos dormitórios


Fonte: Acervo do Ed. Lausanne - cedido por Fernando Martinelli
130
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Há também desenhos detalhados de elementos como


móveis e cobogós, além de itens mais incomuns, como
luminárias e arandelas.
“(...) 257 folhas, entre plantas, cortes, elevações
e detalhamento, demonstrando a intenção de ter
um controle total da obra (...) assegurando uma
perfeita execução da edificação”. (BARBOSA,
2002, p.141)

Croqui de Adolf Franz Heep - Arandelas e bancos


Hall social dos apartamentos Fonte: Acervo do Ed. Lausanne - cedido por Fernando Martinelli
Foto: Edson Lucchini Jr

Croqui de Adolf Franz Heep - Detalhe das arandelas do hall dos aptos.
Fonte: Acervo do Ed. Lausanne - cedido por Fernando Martinelli
131
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Elementos artísticos

Conceitos de integração entre arquitetura e artes


plásticas, provenientes da Bauhaus, eram correntes na
época em São Paulo, através da adoção de painéis ou
esculturas localizados preferencialmente nos térreos dos
edifícios modernos. No edifício do jornal O Estado de São
Paulo (p.17) projetado por Heep quando ele trabalhava
com Jacques Pilon em 1948, um painel de Di Cavalcanti40
nomeado “A imprensa” destaca-se na porção térrea da
fachada principal. No térreo do Lausanne, nas paredes
que separam a casa do zelador dos acessos e halls dos
elevadores, há um painel pintado com tinta a óleo, de
autoria de Clovis Graciano41 e restaurado recentemente.
Painel de Di Cavalcanti “A Imprensa” no Ed. do jornal O Estado de
São Paulo-1948
Foto: Edson Lucchini Jr.
Situação Atual

Pode-se afirmar que existem apenas três mudanças


principais, ocorridas no Lausanne ao longo dos anos, que o
descaracterizam com relação ao projeto original. A primeira,
ocorrida logo após a entrega do edifício, foi o fechamento
dos terraços do 15º andar, influindo diretamente no
desenho do coroamento. A segunda foi a diminuição do
número de cores das venezianas da fachada principal;
originalmente, eram cinco cores: Verde, branco, vermelho,
creme e azul. Agora são apenas três: Verde, vermelho e
branco. A terceira mudança é fruto da insegurança dos
dias atuais; foram colocadas grades e uma guarita, no
Painel de Clovis Graciano no térreo do Ed. Lausanne - 1958 alinhamento com a avenida Higienópolis.
Foto: Edson Lucchini Jr.
Apesar destas poucas mudanças, o edifício Lausanne
conserva até hoje os principais elementos de seu projeto
original, graças à boa manutenção e principalmente, ao
conhecimento, por parte dos moradores e síndicos, da
importância e relevância arquitetônica do edifício.






Painel de Clovis Graciano no térreo do Ed. Lausanne - 1958
Foto: Edson Lucchini Jr.

(40) - Di Cavalcanti (1897-1976) foi pintor, desenhista, ilustrador e caricaturista brasileiro.


(41) - Clóvis Graciano (1907-1988) foi pintor, desenhista, cenógrafo, figurinista, gravador e ilustrador brasileiro.
fontes: http://pt.wikipedia.org acessado em maio de 2010
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1 2

planta do pav. térreo


esc. 1:250

1 2
áreas comuns apto. 2 dorm. - 165 m² apto. zelador - 80 m²
1 - rampas de acesso ao 13 - sala de jantar 7 - sala de estar/guarita
desembarque de veículos 14 - sala de estar 8 - dorm. casal
2 - escadas de acesso de 15 - dorm. de solteiro 9 - dorm. solteiro
pedestres 16 - dorm. de casal 10 - cozinha
3 - rampas de acesso ao 17 - banhos 11 - banheiro
subsolo 18 - copa 12 - quintal descoberto
4 - halls de acesso ao 19 - cozinha
edifício 20 - serviço
5 - halls sociais 21 - dorm. empregada
6 - halls de serviço 22 - banho empregada
133
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

planta do subsolo
esc. 1:250

1 - rampas de acesso ao
térreo
2 - caixas d’água
3 - depósitos
4 - lixeiras

Croqui de Adolf Franz Heep - distribuição de vagas


Fonte: Acervo do edifício Lausanne
Cedido por Fernando Martinelli
134
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1 1
planta do pav. tipo - 1º ao 13º pav.
1 esc. 1:250

apto. 3 dorm. - 175 m²


1 - hall social 5 - sala de estar 2 9 - copa 13 - banho empregada
2 - hall de serviço 6 - dorms. de solteiro 10 - cozinha 14 - terraço
3 - sala de estar 1 7 - dorm. de casal 11 - área de serviço
4 - sala de jantar 8 - banhos 12 - dorm. empregada

Perspectivas axonométricas dos


apartamentos 1º ao 13º pavi-
mento
Fonte: Acervo do edifício Lausanne
Cedido por Fernando Martinelli
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1 1
planta do 14º pavimento
esc. 1:250

1
apto. 2 dorm. - 152 m²
1 - hall social 8 - copa
2 - hall de serviço 9 - cozinha
3 - sala de estar 10 - área de serviço
4 - sala de jantar 11 - dorm. empregada
5 - dorm. de solteiro 12 - banho empregada.
6 - dorm. de casal 13 - terraço
7 - banhos
136
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1 2 3
planta do 15º pavimento
esc. 1:250

1 2 3
apto. 3 dorm. - 263 m² apto. 2 dorm. - 133 m² apto. 2 dorm. - 133 m²
1 - hall social 10 - suíte solteiro 1 - hall social 8 - banho casal 1 - hall social 7 - banho
2 - hall de serviço 11 - banho solteiro 2 - hall de serviço 9 - banho social 2 - hall de serviço 8 - cozinha
3 - hall de entrada 12 - copa 3 - hall de entrada 10 - cozinha 3 - sala de estar 9 - serviço
4 - estar/lareira 13 - cozinha 4 - sala de jantar 11 - serviço 4 - sala de jantar 10 - dorm. empr.
5 - sala de jantar 14 - despensa 5 - sala de estar 12 - dorm. empr. 5 - dorm. solteiro 11 - banho empr.
6 - dorm. solteiro 15 - serviço 6 - dorm. solteiro 13 - banho empr. 6 - dorm. casal 12 - terraço
7 - suíte casal 16 - dorm. empr. 7 - suíte casal 14 - terraço
8 - closet 17 - banho empr.
9 - banho casal 18 - terraço

Perspectiva axonométrica do apartamento de 263 m²


do 15º pavimento
Fonte: Acervo do edifício Lausanne
Cedido por Fernando Martinelli
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

corte AA
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fachada av. higienópolis


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fachada lateral esquerda fachada lateral direita


140
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fachada posterior
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detalhe de fachada - térreo


Pilotis enquadram um pano de cobogós
octogonais que fazem o fechamento dos
apartamentos térreos.

detalhe de fachada - corpo principal


Venezianas coloridas que dominam a
fachada desprovida de fechamentos em
alvenaria. Aleatoriedade na distribuição
de cores trazem dinamismo.

detalhe de fachada - coroamento


Uma laje perfurada por dômus
trapezoidais caracterizam o coroamento
do edifício e minimizam a percepção do
escalonamento obrigatório do 15º andar.
142
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Foto: Edson Lucchini Jr.


6.6 Edifício Ouro Preto 1954-57
endereço e localização
Av. São Luiz 97 - Centro

a
ng
ra
.ipi
av

av. são
iz lu
pça. dom
josé gaspar

construção
Otto Meinberg S.A

terreno
Trapezoidal - 560 m²

unidades
1º ao 11º pav.:
2 ap. de 197 m²
12º ao 19º pav.:
2 ap. de 145 m²
Total - 36 unidades
publicações
Acrópole 240, 1958, p. 554-555-570

c o e f. d e a p ro ve i ta m e nto
14.7

taxa de ocupação
95 %

conservação
Razoável

descaracterização
Média
fotos da publicação na revista acrópole nº 240 - 1958
143
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A Avenida São Luiz

A atual avenida São Luiz teve o seu primeiro registro


em planta no ano de 1810; com o nome de Beco Comprido,
ela cortava as terras do Coronel Luiz Antônio de Souza.
Com o falecimento do Coronel, as terras foram divididas
em lotes, que em 1920 já somavam 16 unidades; em
1930 já havia 17 palacetes construídos, isolados em seus
lotes. Em 1940, as obras do Plano de Avenidas de Prestes
Maia chegaram à São Luiz, que teve sua calha alargada
de 13,00m para 33,00m, transformando a via, até então
de caráter local, numa avenida de maior influência na
região central da cidade. Com isso, iniciava-se o processo
de verticalização da São Luiz, especialmente voltado para
moradias destinadas às classes mais abastadas. (LEFÈVRE,
2006)

A São Luiz tornou-se palco da produção de diversos


exemplares relevantes da arquitetura moderna paulistana,
como os edifícios Itália42 e o do Jornal O Estado de São
Paulo43, ambos de Adolf Franz Heep; os Edifícios Louvre
e Viadutos de Artacho Jurado; a Galeria Metrópole de
Giancarlo Gasperini e Salvador Cândia, além de outros
Av. São Luiz em 1956
Fonte: http://www.abril.com.br/especial450/materias/lorca/imagens/025.jpg
edifícios proto-modernos como a Biblioteca Municipal
acesso em maio de 2010 Mário de Andrade de Jacques Pilon, com quem Franz Heep
trabalhou quando chegou ao Brasil em 1947.

A partir da década de 1970 a São Luiz começa a


perder o seu caráter residencial de alto padrão; surgem os
escritórios, em inúmeras salas comerciais, que resultaram
num inchaço do centro, com excesso de trânsito para
poucas vagas de estacionamento. Isto, entre outros fatores,
trouxe a desvalorização imobiliária. Apesar disto, a São Luiz
preserva até hoje as suas características de generosidade
de espaços públicos associada à boa arquitetura; passeios
largos e muita arborização ainda estão presentes nesta
avenida, que é de importante valor simbólico para a cidade
de São Paulo. (LEFÈVRE, 2006)

Edifício Itália - Adolf Franz Heep - 1956


Foto: Edson Lucchini Jr.

(42) - Maiores informações sobre o edificio Itália estão na página 19


(43) - Maiores informações sobre o edificio O Estado de São Paulo estão na página 17
144
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Av. São Luiz vista do terraço do Ed. Louvre de João Artacho Jurado - 1953
Foto: Edson Lucchini Jr.

Ed. Viadutos - João Artacho Jurado - 1951 Ed. do jornal O Estado de São Paulo - Adolf Franz Heep - 1948
Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.

Cobertura do Ed. Viadutos - João Artacho Jurado - 1951 Av. São Luiz vista da cobertura do Ed. Viadutos (João Artacho Jurado - 1951)
Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.
145
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O edifício Ouro Preto, cujos projetos datam de


1954 e sua entrega em 1957, foi produzido pela parceria
entre Franz Heep e Otto Meinberg; assim como o Ouro
Verde, estudado anteriormente, este edifício, situado num
tradicional reduto da burguesia paulistana, alia “técnica,
materiais duráveis e um detalhamento primoroso”
(BARBOSA, 2002, p.97) da mesma forma que os edifícios
produzidos por Heep e Jean Ginsberg em Paris nos anos
1930.

Terreno, implantação, volumetria e entorno

O terreno onde situa-se o Ouro Preto possui a


topografia plana e uma geometria trapezoidal; a face
principal, voltada para a avenida São Luiz, e a dos fundos,
voltada para a rua Basílio da Gama, são os lados menores
e não paralelos do trapézio, medindo 15,30m e 15,45m
respectivamente. As faces maiores e paralelas do terreno,
que são lindeiras ao lotes vizinhos, medem 35,90m e
circ.
37,30m, totalizando aproximadamente 560 m² de área.
r. basílio da gama
vertical
O edifício conta com térreo mais 19 pavimentos,
av. são luiz

volume principal sendo que do 1º ao 11º a relação proporcional do volume


é de 44,00m de altura por 15,30m de largura e 31,50m
de profundidade no corpo elevado. Do 12º pavimento ao
19º, a necessidade de recuos laterais de 2,50m definiu
um volume superior cuja largura passa a ser de 10,30m
por 27,75m de altura e a mesma profundidade do volume
inferior. Desta forma, verticalmente, indentifica-se na
volumetria do Ouro Preto uma bipartição; horizontalmente,
pode-se dizer que há uma tripartição, onde os dois
blocos maiores, que faceiam os alinhamentos da avenida
pça. São Luiz e dua rua Basílio da Gama, correspondem aos
D. José apartamentos, sendo unidos entre sí por um terceiro bloco
Gaspar
menor, correspondente à circulação vertical. À partir do
13º andar, a face do volume voltada para a rua Basílio da
Gama sofre um escalonamento imposto pela legislação da
época, já que a via em questão possui uma menor largura
av. são luiz
que a avenida São Luiz.

O gabarito do edifício condiz com o dos vizinhos,


av. ipiranga
que possuem assim como o Ouro Preto, um volume
pça. da república superior recuado das laterais; porém, a alguns metros do
Ouro Preto, junto à praça Dom José Gaspar, encontra-se o
edifício da Galeria Metrópole, que, por estar recuado do
alinhamento, pôde atingir um gabarito mais elevado.
146
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Térreo e subsolo

loja loja
O térreo do edifício, que ocupa a totalidade do

r. basílio da gama
98 m² 101 m²
lote, conta com quatro lojas, sendo duas voltadas para
av. são luiz

loja loja a avenida São Luiz e duas para a rua Basílio da Gama. O
82 m² 137 m² subsolo, assim como o térreo, também ocupa todo o
terreno, porém ele se destina apenas a estoque das lojas
e é acessado por escadas independentes. O acesso social
localiza-se na porção direita do terreno, para quem da
Esquema de distribuição do pavimento térreo avenida São Luiz olha o edifício de frente, e possui junto ao
circulação horizontal alinhamento, 4,70m de largura, conformando um hall de
circulação vertical entrada que vai gradualmente se estreitando no sentido
lojas do centro do terreno, através de uma parede curva que
cria um corredor de 2,70m de largura e conduz ao nicho
de circulação vertical. O acesso de serviço se dá pela rua
Basílio da Gama, onde se inicia um corredor de 18,00m de
comprimento por 1,40m de largura que, longo e desprovido
de iluminação natural, também conduz aos elevadores e
escadas.

Apesar do terreno possuir duas frentes, uma para a


avenida São Luiz e outra para a rua Basílio da Gama, o térreo
não foi contemplado com uma conexão urbana entre essas
duas vias, através de uma possível galeria comercial, um
elemento paradigmático no centro da cidade de São Paulo
nos anos 1950, resultando num empobrecimento da relação
do edifício com a cidade, em seu ponto nevrálgico.

Circulação Vertical

A circulação vertical do edifício Ouro Preto é feita


em um volume independente, situado na porção central
do terreno, que divide o corpo elevado da torre em dois
blocos e conforma dois poços de iluminação e ventilação
naturais entre eles. É composta por três elevadores, sendo
dois sociais e um de serviço, além de uma escada em
forma de ferradura, sem patamar intermediário. Os dois
elevadores sociais, dispostos lado-a-lado, são acessados
por um hall exclusivo e separado do nicho de serviço, que
contém o terceiro elevador e a escada.
147
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Pavimento tipo e unidades

A conformação volumétrica bipartida verticalmente


do Ouro Preto, onde, do 1º ao 11º pavimento o bloco
principal está encostado nas divisas laterais e, do 12º ao
19º ele está recuado 2,50m em ambos os lados, reflete-
se diretamente nas plantas das unidades. Desta maneira,

r. basílio da gama
o volume inferior conta com unidades de 197m², e o
av. são luiz

197 m² 197 m²
superior, com unidades menores, de 145m². Em ambos
os volumes, os pavimentos contam com duas unidades
cada, espelhadas entre sí; uma voltada para a avenida
São Luiz com orientação oeste, e a outra voltada para a
rua Basílio da Gama com orientação leste, separadas pelo
Esquema de distribuição do pavimento tipo, do 1º ao 13º andar
corpo de circulação vertical e pelos 2 poços de iluminação
circulação horizontal e ventilação naturais.
circulação vertical
unidades
As unidades de 197m² contam com hall de entrada,
salas de estar e jantar, terraço, 3 dormitórios, 2 banheiros,
copa/cozinha e área de serviço com domitório e banheiro
de empregada. O hall de entrada social, de 2,15m de
comprimento por 2,60m de largura, possui uma abertura
voltada para o poço menor de iluminação e ventilação
naturais do edifício. As salas de jantar e estar compartilham
o mesmo espaço retangular de 9,20m de comprimento
por 4,50m de largura. A ausência de compartimentação
deste espaço, garante uma boa amplitude visual e diversas
possibilidades de distribuição do mobiliário. Isto também
propicia uma melhor iluminação e ventilação das salas,
feitas por duas aberturas voltadas para a fachada do
edifício, através uma porta de vidro que separa a sala do
terraço e uma veneziana fixa de ventilação permanente do
tipo piso-teto; ambas são alinhadas com outra abertura do
lado oposto, voltada para o poço central do edifício, que
permite a ventilação cruzada.

A parede que separa a sala de jantar da cozinha


possui, em seu último terço, no sentido do centro do
terreno para o alinhamento, um chanfro que induz e
diminui o percurso de quem adentra o apartamento, em
direção ao corredor íntimo. Além disso, o chanfro suaviza o
encontro do corredor com as áreas sociais e contribui para
uma melhor iluminação deste, já que permite a captura
Planta das unidades de 197m², do 1º ao 11º andar
de mais luz proveniente das salas. O uso do chanfro como
elemento encurtador e indutor de percursos, aparece nesta
obra na escala da domesticidade, dentro de uma unidade
residencial. Na análise do todo da obra de Adolf Franz Heep,
este conceito se repete muitas vezes, mas na escala da
148
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

cidade, em obras que demandaram uma inserção urbana


mais rica, onde o chanfro, além de encurtar percursos de
pedestres, valoriza esquinas.

O terraço, de 2,50m de comprimento por 3,30m


de largura, é acessado somente pela sala de estar, sendo
separado desta por uma porta de correr em vidro, que
possibilita uma continuidade entre os dois espaços. Além
disso, pode-se dizer que o terraço exerce uma contribuição
ao conforto térmico do apartamento; ele evita que o
caixilho envidraçado que separa o terraço da sala fique
diretamente exposto à insolação excessiva da face oeste,
no bloco voltado para a São Luiz, e a leste, no bloco voltado
para a Basílio da Gama. Esses fatores contribuem, junto
com a ventilação cruzada, para a manutenção de uma
temperatura mais amena nas salas de estar e jantar. Além
disso, o terraço é um importante elemento na composição
da fachada e um espaço em que se contempla a elegante a
Ed. Ouro Preto atualmente arborizada avenida São Luiz.
Foto: Edson Lucchini Jr.

Os três dormitórios da unidade de 197m² estão


dispostos sequencialmente ao longo de um corredor
íntimo. Os dois primeiros, mais próximos às salas, possuem
as mesmas dimensões de 3,25m de largura por 6,50m
de comprimento. O terceiro dormitório, provavelmente
designado ao casal, possui a mesma largura dos demais,
porém com 7,10m de comprimento. Todos possuem as
suas aberturas voltadas para as fachadas principais, e
consequentemente, a mesma orientação oeste, para os
apartamentos voltados para a avenida São Luiz, e leste,
para os apartamentos voltados para a rua Basílio da Gama.
Essa solução foi alcançada graças à largura do terreno , que
permitiu que principais espaços de permanência pudessem
ter suas aberturas voltadas para as fachadas principais,
deixando abertos para os poços centrais de iluminação
e ventilação do edifício, apenas as áreas molhadas.
Porém, esta solução acarretou em salas e dormitórios
com uma conformação espacial cuja proporção da planta
é acentuadamente retangular, onde o comprimento é
sempre maior ou igual ao dobro da largura.

A porção íntima da planta conta ainda com dois


banheiros dispostos lado-a-lado, sendo um de 7,00m²,
provido de espaço para banheira, e um menor, de 4,00m².
O conceito de suíte, amplamente utilizado nos dias de hoje
em edifícios de diversos padrões, aparece no universo
Ed. Ouro Preto atualmente
Foto: Edson Lucchini Jr. das obras de Heep, apenas nos edifícios Ouro Verde e
Lausanne, ambos em Higienópolis e destinados às classes
mais abastadas.
149
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A planta da cozinha é derivada de dois polígonos distribuição do pavimento tipo continua idêntica, com a
de tamanhos diferentes. O menor, que pode ser utilizado caixa de circulação vertical dividindo o volume em dois
como copa, é praticamente trapeizoidal, com 6,15m² de blocos, um voltado para a av. São Luiz e outro para a rua
área, cuja forma foi definida pelo chanfro da parede que Basílio da Gama.
o separa da sala de jantar. O espaço maior, praticamente
quadrado, conta com 11,50m² e abriga todas as funções Os apartamentos deste bloco superior possuem um
necessárias para uma cozinha, porém, o fato de possuir 3 arranjo espacial muito semelhante aos do bloco inferior,
passagens, sendo uma para a lavanderia, outra para o hall pois as funções sociais, íntimas e de serviços continuam
de serviço, e outra para a copa, prejudica a distribuição dispostas da mesma maneira, porém com um dormitório
do mobiliário. A área de serviço é conformada por um a menos, uma sala de estar mais estreita, que conta agora
corredor de 1,30m de largura por 6,50m de comprimento, com 3,20m de largura por 11,30m de comprimento; perda
onde realizam-se as funções de lavagem e secagem de do hall de entrada, e transformação do banheiro social
roupas. Este corredor, ventilado e iluminado naturalmente em um lavabo. Além disso, a unidade de 145m² perde a
por cobogós, recebe as aberturas dos banheiros social e ventilação cruzada da sala de estar, que é compensada de
íntimo, além de conduzir a um banheiro e a um dormitório certa forma pela presença de algumas aberturas laterais,
de empregada. possíveis agora graças aos recuos. Não há mais o chanfro
na parede que separa a sala de jantar da cozinha, devido
Assim como em outros edifícios de Heep estudados, à menor largura desta, se comparada à cozinha dos
nota-se que o arranjo espacial do apartamento concentra apartamentos de 197m². As áreas de serviço também
todas as áreas molhadas em uma única porção da planta, foram reduzidas, mas abrigam as mesmas funções. Os
enfatizando a postura racionalista do arquiteto, que ao terraços das unidades do volume superior contam com
adotar esse tipo de solução, garante uma economia com 1,20m de largura por 9,70m de comprimento, possuindo
elementos hidráulicos, além de facilitar a manutenção. agora uma conformação mais contínua, que abrange toda
a largura do apartamento; são acessados não só pela sala
À partir do 12º pavimento, a necessidade de recuos de estar, como nos apartamentos inferiores, mas também
laterais de 2,50m de cada lado acarretou na diminuição pelos dormitórios.
das unidades para 145m². Apesar da redução da área, a
r. basílio da gama
av. são luiz

145 m² 145 m²

Esquema de distribuição do pavimento tipo, do 12º ao 19º andar

circulação horizontal
circulação vertical
Planta das unidades de 197m², do 12º ao 19º andar
unidades
150
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.
151
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Fachadas

O edifício Ouro Preto possui duas fachadas que


receberam tratamento arquitetônico: uma voltada para a
avenida São Luiz e outra voltada para a rua Basílio da Gama;
isto ocorreu pois o edifício está contido entre edificações
vizinhas do térreo ao 11º pavimento. À partir do 12º, até
o 19º pavimento, há recuos laterais de 2,50m em ambos
os lados, criando faces com algumas aberturas, passíveis
de elaboração, porém, como são raramente percebidas
pelo observador localizado no térreo, essas faces laterais
receberam um tratamento arquitetônico mais simples.

Na fachada voltada para a avenida São Luiz, são


identificados três momentos distintos, que, analogamente
à uma coluna clássica, podem ser chamados de base,
fuste e capitel. Deste modo, pode-se dizer que a base
corresponde ao térreo, o fuste são os apartamentos do 1 º
ao 12º andar, e o capitel é o volume sobrelevado. Porém,
cabe afirmar que essa relação não tem a intenção de
sugerir que o arquiteto possa ter feito qualquer remissão
à arquitetura clássica, servindo apenas para nomear as
partes, facilitando a descrição da fachada.

A base, que corresponde ao térreo e possui 5,50m de


altura, é composta pelas portas das três lojas, que ocupam
o mesmo vão estrutural dos dormitórios dos apartamentos
superiores, além da entrada social, localizada à direita de
quem da avenida São Luiz vê o edifício de frente, que é
protegida e marcada por um pórtico que corresponde à
largura dos terraços das unidades residenciais acima. Essas
correspondências citadas, são necessárias para demonstrar
que há um alinhamento preciso dos elementos da base com
os do fuste, que são interrompidos por um brise horizontal
de 2,00m de altura, que rasga toda a largura do edifício e
localiza-se logo acima das portas das lojas. Hoje, a base
do edifício Ouro Preto é o elemento mais descaracterizado
com relação ao projeto original, devido à retirada do brise
e à colocação de granito marrom no pórtico de entrada,
além da troca da porta principal por uma que destoa
radicalmente das linhas do edifício.

O fuste, que corresponde aos apartamentos do 1º


ao 11º andar, é composto por uma grelha não-estrutural,
sobressalente cerca de 20cm da fachada, cuja medida
de 3,20m por 3,20m corresponde ao vão estrutural e
enquadra as aberturas dos dormitórios, que são compostas
por um caixilho de vidro piso-teto de 3,20m de altura por
152
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1,60m de largura, ou seja, o caixilho possui a mesma altura


da parte interna da unidade da grelha e metade da sua
largura. A outra metade restante é preenchida por uma
parede de alvenaria. Venezianas em aço, que correm em
trilhos fixos nas partes superior e inferior da grelha, estão
sempre em posições variadas, ora escondendo o caixilho,
ora escondendo a parede, conferindo um aspecto de
constante mutação e movimento à fachada. Os terraços,
que estão à direita de quem da avenida São Luiz vê o edifício
de frente, são os elementos que rompem a continuidade
da grelha, apesar de possuirem a mesma largura desta e
um comprimento cuja metade cria uma reentrância na
sala de estar, e a outra, projeta-se além do alinhamento,
provocando um jogo de cheios e vazios na fachada. Os
guarda-corpos, opacos, por serem de alvenaria na parte
frontal, contrapõe a transparência da porta de vidro que
separa a sala do terraço. As laterais dos guarda-corpos são
vazadas, protegidas por um gradil de barras horizontais.

“(...) numa fachada dominada por um grafismo


de venezianas móveis, Heep desloca o eixo
de simetria para a direita por meio de um
elemento de subtração - a varanda - reforçado
pela sua projeção além do limite da fachada,
Ed. Ouro Preto atualmente
formando um volume intermitente que acentua
Foto: Edson Lucchini Jr. a verticalidade da torre”. (BARBOSA, 2002,
p.102)
153
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A porção da extremidade direita da fachada, de


quem vê o edifício de frente, é definida pelo único elemento
que não possui a mesma largura de 3,20m, presente na
grelha e nos terraços, sendo composto por uma veneziana
fixa de aço de 1,00m de largura, porém, com a mesma
altura deles.

O 12º pavimento é uma espécie de transição


entre o fuste e o capitel; não possui, no que diz respeito à
fachada, a linguagem de nenhum dos dois, tornando-se um
elemento que “solta” o volume sobrelevado do inferior.

O capitel, cujo volume contém os apartamentos do


13º ao 19º andar, tem como elemento marcante os terraços,
que abrangem toda a parte frontal dos apartamentos.

“ O volume superior (...) sofre uma inversão, pois


o terraço domina a fachada, estando os caixilhos
recuados e sem expressão, formando uma série
de linhas que acentuam a horizontalidade deste
volume anexo”. (BARBOSA, 2002, p.102)
154
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Além da análise de Barbosa, o fato dos terraços


dominarem a fachada do volume sobrelevado pode ser
justificada pela questão da forte insolação que esta face
recebe, por ser orientada a oeste e por estar num ponto
elevado, onde não há mais o sombreamento causado
pelos edifícios que estão do outro lado da avenida São Luiz.
Desta maneira, o uso dos terraços ocupando toda a largura
da fachada, protege as aberturas das salas e quartos da
exposição direta ao sol da tarde.

A fachada voltada para a rua Basílio da Gama, possui


o fuste idêntico à da São Luiz, porém a base e o capitel
possuem diferenças. O volume posterior está recuado
6,00m do alinhamento com a Basílio da Gama, porém, o
pavimento térreo avança até o limite do lote com a rua.
Esta conformação gerou um terraço sobre o pavimento
térreo, que é utilizado pelo apartamento do 1º andar. Este
terraço possui fechamentos em elementos vazados com
uma abertura quadrada central, cuja solução lembra as
adotadas por Lúcio Costa no Parque Guinle, e por Affonso
Eduardo Reidy no Residencial Pedregulho44.

Fachada da Rua Basílio da Gama - Ed. Ouro Preto


Foto: Edson Lucchini Jr.

(44) - As ressonâncias de elementos da obra de Lúcio Costa e Affonso Eduardo Reidy em fachadas de Franz Heep são mais evidentes no edifício Guaporé (p.202)
155
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Situação Atual

O edifício Ouro Preto se encontra hoje


num estado de conservação razoável, porém, a
descaracterização vem aumentando, à medida
em que os terraços vem sendo fechados por
vidros, empobrecendo o jogo de sombras, cheios
e vazios do projeto original. As venezianas,
originalmente em alumínio pintado na cor
creme, estão sendo trocadas aleatóriamente
por outras, ora de alumínio prateado, ora de
alumínio anodizado, simbolizando um descaso
com a preservação da fachada original; além
disso, o edifício teve a fachada do andar térreo
totalmente descaracterizada com a retirada
dos brises e com a colocação de uma porta de
Ed. Ouro Preto atualmente acesso social num estilo que não condiz com o do
Foto: Edson Lucchini Jr. restante do edifício.
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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1 - acesso social
2 - áreas descobertas
3 - acesso de serviço
4 - lojas

planta do pav. térreo


esc. 1:250

1
apto. 3 dorm. - 197 m²
1 - hall de entrada
2 - sala jantar
3 - sala estar
4 - terraço
5 - dorm. solteiro 1
6 - dorm. casal
7 - banho casal
8 - banho social
9 - cozinha
10 - área de serviço
11 - banho empr.
12 - dorm. empr.

planta do pav. tipo


1º ao 11º pav.
esc. 1:250
1
apto. 2 dorm. - 145 m²
1 - hall de entrada
2 - sala jantar
3 - sala estar
4 - terraço
5 - dorm. solteiro

1
6 - dorm. casal
7 - banho social
8 - lavabo
9 - cozinha
10 - área de serviço
11 - dorm. empr.
12 - banho. empr.
planta do pav. tipo
12º ao 19º pav.
esc. 1:250
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corte AA
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fachada r. fachada
basílio da gama av. são luiz
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detalhe de fachada
Bipartição da fachada: do 1º ao 11º há
uma modulação através de uma grelha
quadrada com terraços salientes. Do
12º ao 19º há um volume sobrelevado,
recuado das laterais, com terraços
subtraídos do volume principal.

detalhe de fachada
Uso de caixilhos que ocupam a totalidade
do módulo da grelha. A extremidade
direita, de quem vê o edifício de frente,
rompe a modulação da grelha criando
elementos retangulares que acentuam a
verticalidade.

detalhe de fachada - térreo


Uso de um brise horizontal sobre as
portas das lojas, que enfatiza a separação
entre térreo e os pavimentos. Há um
pórtico saliente que rompe o brise,
marcando a entrada social.
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Foto: Edson Lucchini Jr.


6.7 Edifício Lucerna (cine comodoro) 1954-59
endereço e localização
Av. São João 1452/1474 - Centro

cintra
r. ana

r. br.
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teidel

amp
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jo
ão
r. dr. fre
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caxia
q. de
av. d
construção
Construtora Auxiliar S.A.
(Engº resp. Elias e Aizik Helcer)
terreno
Irregular - 1428m²
unidades
1º pav.:
4 ap.: 57m², 60m², 64m² e 71m²;
2º ao 13º pav:
4 ap. de 56m²;
4 ap.: 57m², 60m², 64m² e 71m²;
14º pav.:
4 ap. de 56m²;
4 ap.: 49m², 52m², 56m² e 62m²;
15º pav.:
2 ap. de 56m² e 1 apto. de 112m²
4 ap.: 37m², 40m², 45m² e 50m²;
Total: 115 unidades
c o e f. d e a p ro ve i ta m e nto
7.35 - Área total = 10.514m²
taxa de ocupação
99 %
conservação
Edifício Lucerna em 1959 -
Ruim
Térreo ocupado pelo Cine
Comodoro. descaracterização
Fonte: Acervo pessoal de
Aizik Helcer Alta
161
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A avenida São João e a cinelândia paulistana:

As novas avenidas, abertas ou alargadas com o Plano


de Prestes Maia, ajudaram a elevar a cidade de São Paulo
ao patamar de metrópole moderna, com a ascensão do
modelo rodoviarista, baseado principalmente no automóvel
como uma das expressões máximas da indústria moderna.
As novas avenidas, além de revolucionarem a circulação
na cidade, também definiram vetores de verticalização,
como já estudado na análise do edifício Normandie. Além
do arranha-céu e do automóvel, outro fator fundamental
que compunha o ideário de modernização das cidades
era o cinema. A televisão chegou ao Brasil em 1950, mas
demorou ainda alguns anos para se afirmar como um meio
de comunicação relevante. Desta forma, pode-se dizer que
a grande janela para a percepção do mundo era o cinema.
A cinelândia paulistana se apropriava do que havia de
melhor em tecnologia cinematográfica.
“A cinelândia não só lançava filmes, mas também
tecnologia e ditava os melhores padrões de
qualidade das salas. As salas são símbolo deste
momento, elas se adequam aos avanços técnicos
Fachada do Cine Metro em 1938 - Av. São João ao mesmo tempo que procuravam simbolizá-
Fonte: http://salasdecinemadesp.blogspot.com/2009/05/as-mais-belas- los. Não é à toa que entram da discussão da
fachadas-dos-antigos.html - acesso em abril de 2010
arquitetura moderna; são exemplares dessa
nova estética ligada à funcionalidade e avanços
tecnológicos.” (SANTORO, 2005, p.9)
Da década de 1930 à de 1960, ir ao cinema era um
acontecimento social, que exigia vestimentas adequadas;
além disso, “os espectadores dirigiam-se ao cinema e
não ao filme - iam assistir a um tipo de filme e não uma
determinada película” (SANTORO, 2005, p.9). Deste modo,
as salas eram especializadas em um determinado tipo
de filme, por exemplo, algumas só exibiam musicais da
Broadway, outras, só filmes de faroeste, etc.

O arquiteto Rino Levi foi fundamental neste


perídodo de ascensão dos cinemas em São Paulo; ele
desenvolveu projetos específicos para salas de cinema,
aprofundando-se nas questões acústicas, tornando os
seus desenhos menos empíricos e mais técnicos, além de
afastar definitivamente os projetos de salas de cinema dos
de salas de teatro. Rino tornou-se referência em projetos
de edifícios que, além de cinemas, abrigam diversos usos,
como habitação e serviços como hotéis. Os exemplos são
Fachada do Cine UFA-Palácio - Arq. Rino Levi - 1936 - Av. São João
Fonte: http://salasdecinemadesp.blogspot.com/2009/05/as-mais-belas-
os edifícios UFA-Palácio (1936) e o cine Ipiranga (1941).
fachadas-dos-antigos.html - acesso em abril de 2010 (ANELLI; GUERRA; KON, 2001)
162
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O Cine Comodoro

O cine Comodoro, inaugurado no dia 14 de agosto


de 1959, situou-se até 1997 no térreo e no subsolo do
edifício Lucerna, foco desta análise. A sala para 1400 lugares
foi especialmente projetada para receber uma inovadora
tecnologia cinematográfica da época chamada “Cinerama”;
esta consistia numa projeção feita simultaneamente
por três aparelhos, sendo um central e dois laterais, que
projetavam as imagens numa enorme tela de 20,00m de
comprimento por 7,00m de altura e 146º de curvatura,
produzindo um efeito tridimensional. O jornalista João
Luiz Vieira descreve em seu “blog”45 as sensações causadas
Inauguração do Cine Comodoro - 1959 pela nova técnica de exibição:
Fonte: Jornal “Folha da Manhã”, de 15 de Agosto de 1959

“Os espectadores iam enchendo a sala aos poucos


e, em seguida, as luzes começavam a diminuir enquanto
que as cortinas se abriam o suficiente para mostrar uma
imagem quadrada, correspondente ao tamanho dos 35
mm., normal. Na tela, em preto e branco, aparecia um
documentário que fazia um breve histórico cronológico
e evolutivo das imagens em movimento, indo até a pré-
história e o homem da caverna até, claro, o Cinerama, a
‘maior conquista do homem’, etc. Mostrava as câmeras,
descrevia o processo de filmagem até que finalmente
Esquema Ilustrativo do sistema Cinerama
Fonte: http://salasdecinemadesp.blogspot.
anunciava a novidade aos espectadores: ‘...e agora,
com/2008/06/o-cine-comodoro-cinerama- senhoras e senhores... vamos ao Cinerama!’ conclamando
parte-1.html - acesso em abril de 2010 a platéia e inscrevendo-a diretamente dentro do
espetáculo. Aí, já colorida, surgia a imagem do trenzinho
subindo uma célebre montanha russa de Coney Island, no
Brooklyn, imagem que se formava aos poucos, diante de
nossos olhos maravilhados, exatamente sincronizada com
as cortinas que, então, se abriam completamente. Quando
o trenzinho chegava à parte mais alta da estrutura da
montanha russa, a imagem estava completa e a tela curva
completamente aberta com os três projetores em ação.
Começava a queda vertiginosa do trenzinho ao mesmo
tempo em que, por toda a sala, o som estereofônico se
abria, num envolvimento com o espetáculo absolutamente
inédito até então. Era uma sensação física, os espectadores
se agarravam nos braços das poltronas. Você, digamos,
estava “dentro do espetáculo” e dele fazia parte, como a
publicidade não cansava de enfatizar.”

O Comodoro encerrou suas atividades em 1997.


No ano 2000, um incêndio destruiu totalmente a sala, que
Cine Comodoro - 1974
Fonte: http://salasdecinemadesp.blogspot.com/2008/06/o-cine-comodoro-
permanece, até os dias de hoje, fechada e sem previsão
cinerama-parte-1.html - acesso em abril de 2010 para uma reforma ou um novo uso.
(45) - Disponível em http://salasdecinemadesp.blogspot.com/2008/06/o-cine-comodoro-cinerama-parte-1.html
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Terreno, implantação, volumetria e entorno

O terreno onde situa-se o edifício Lucerna conta


com 1428m² de área e uma geometria irregular; na porção
frontal, voltada para a avenida São João, a geometria do
lote se assemelha a um trapézio, com o lado inclinado
medindo 24,85m de comprimento e alinhado com a São
João. A face lateral esquerda, para quem da avenida vê o
edifício de frente, mede 52,75m de comprimento e a face
cinema
direita, 62,30m. O fechamento do polígono que define
o lote se dá, nos fundos, por cinco faces irregulares e
angulosas. No sentido transversal do lote há um desnível
de aproximadamente 1,00m, da direita para a esquerda
(para quem da rua vê o edifício de frente), que acompanha
o declive da avenida São João no sentido centro-bairro.
bloco A bloco B
O partido de implantação acompanha a geometria
do lote, sem recuos em nenhum dos lados, de modo que
o subsolo e o térreo, destinados ao cinema, ocupam a
totalidade do terreno, desprovido, portanto, de áreas
permeáveis. O corpo elevado, destinado às moradias, ocupa
o primeiro terço do lote no sentido longitudinal; é dividido
bloco A bloco B
em dois blocos (A e B) com torres de circulação vertical
independentes. Ambos os blocos são definidos por dois
volumes, separados por um vazio e pelas caixas de escadas
av. são joão
e elevadores, sendo um voltado para a face principal que
se abre para a avenida São João, com orientação sudoeste,
e o outro, voltado para os fundos do lote, com orientação
nordeste. O volume que contém as porções frontais dos
blocos A e B possui uma geometria trapezoidal, já que sua
face principal alinha-se com a face inclinada do lote; as
demais faces do volume seguem a ortogonalidade.
164
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Ambos os volumes (frontal e posterior) possuem


51,00m de altura, sendo térreo mais 14 pavimentos, porém,
os dois últimos do volume frontal sofrem o escalonamento
obrigatório, por estarem voltados para a via pública. O
volume posterior, voltado para os fundos do lote, possui
geometria perfeitamente ortogonal.

O entorno do edifício Lucerna é densamente


verticalizado, porém, os edifícios que o ladeiam possuem
variações de gabarito, trazendo uma ausência de
homogeneidade à fachada da quadra.

Térreo e subsolo

Uma colunata composta por quatro pilares


redondos de 70cm de diâmetro cada, marca os acessos ao
cinema na porção central e frontal da planta térrea, e aos
blocos residenciais A e B espelhados entre si e situados em
ambas as extremidades laterais. A colunata confere, além
Edifício Lucerna e seu entorno atualmente de imponência à fachada, um alargamento do passeio
Foto: Edson Lucchini Jr.
público, propiciando, junto à uma marquise em balanço
de 3,00m de largura, uma considerável área coberta, que
protege das intempéries as pessoas que compram bilhetes
ou que aguardam ao início de uma exibição cinematográfica.
Esta solução descrita está diretamente ligada à legislação
construtiva da época, que incentivava os alargamentos
de passeios e a adoção de reentrâncias e colunatas nas
fachadas de edifícios destinados a cinemas. Desta forma,
cinema cabe enfatizar que a adoção desta solução arquitetônica
não é apenas fruto de decisões projetuais do arquiteto,
afinal, nota-se que a maioria dos edifícios destinados ao uso
de cinema nesta época possuem situações semelhantes,
bloco A bloco B
evidenciando a influência da legislação46.

Na reentrância térrea, que aumenta a área do


passeio, há uma bilheteria que divide em duas partes
os acessos ao inteior do cinema, controlados por portas
de madeira e vidro. Após a transposição das portas, há
escadarias que conduzem ao foyer principal, meio nível
av. são joão abaixo do térreo, e ao foyer do balcão, meio nível acima. O
foyer principal é um espaço de geometria trapezoidal, que
conta com 230m² de área (aproximadamente um terço da
Esquema de distribuição do pavimento térreo
área da sala de exibição). Há um café, que se comunica
halls de acesso aos blocos residenciais com o foyer, mas se encontra 90cm abaixo dele. A sala de
circulação vertical exibição conta com 35,00m de comprimento por 23,90m
espaço livre - acesso ao cinema de largura e pé-direito de 10,00m, com capacidade para
hall do cinema 1100 assentos no nível principal e mais 300 no balcão. A
(46) - O texto exato da lei é: “Art. 9 º - Parágrafo único - Estudará a prefeitura a concessão oportuna de favores especiais para os prédios que não possuírem corpos super-elevados (art.
4º) e cujos térreos apresentem recuos, galerias, colunatas ou arcadas, equivalentes a uma ampliação dos passeios, utilizáveis para mesas de cafés, bars, etc”.
(SÃO PAULO, Decreto Lei nº 40, de 03 de agosto de 1940. Regulamenta as construções na avenida Ipiranga e dá outras providências.Anais da Cãmara Municipal de São Paulo, 1940,
p.42-47)
165
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

curva de visibilidade faz com que o meio da sala, no sentido


longitudinal, tenha uma cota de nível 60cm mais baixa
que a dos acessos, e 77cm mais baixa que a cota próxima
à tela. A organização das plantas, não só no térreo, mas
em todo o edifício, sempre busca a simetria, que somente
é quebrada em alguns momentos por condicionantes do
terreno irregular; desta forma, os banheiros destinados
ao público, situados atrás da tela de projeção encaixam-se
na geometria irregular e angulosa dos fundos do terreno,
rompendo a simetria presente na maioria dos setores da
planta.
Corte do ed. Lucerna e cine Comodoro
O foyer do balcão situa-se meio nível acima do térreo
(1,92m); é um espaço retangular com cerca de 70m²; dele,
se acessam banheiros, masculino e feminino, espelhados
entre si, além de duas escadas, também espelhadas, que
conduzem ao nível do balcão, cuja cota é a mesma da cabine
de projeção e demais espaços destinados à parte técnica e
administrativa do cinema. O balcão projeta-se sobre cerca
de um terço da sala de exibição e tem capacidade para
300 lugares, divididos em três colunas e doze fileiras; ele
se apoia nas paredes laterais e em duas fileiras de pilares
situadas bem próximo aos acessos principais, liberando uma
grande área sem nenhum apoio, a fim de não prejudicar a
visibilidade.

A combinação de uma torre residencial, ou para


uso de um hotel, com um cinema dentro de uma mesma
edificação resulta em alguns desafios estruturais que
demandam grandes transições, já que a sala de exibição
deve possuir uma planta o mais livre possível, sem a
presença dos pilares que descem dos andares superiores.
ocupação do torre em rela- O arquiteto Rino Levi já desenvolvia nos anos 1930 e
ção à sala de projeção no 1940 situações como esta, e já propunha, no projeto dos
cine Ipiranga cines UFA-Palácio (1936) e Ipiranga (1941), esta mesma
disposição posteriormente adotada no edifício Lucerna e
cine Comororo, onde evita-se ao máximo que os blocos
residenciais elevados fiquem sobre a sala de exibição, e
sim, sobre o foyer, já que este espaço pode receber mais
pilares, minimizando as transições. Se a torre residencial
estivesse sobre a sala de exibição, que demanda uma
planta mais livre, certamente a resolução estrutural seria
muito mais complexa e de alto custo.

Os acessos aos blocos residenciais situam-se em


ambas as extremidades laterais da porção frontal da planta
Planta térrea e corte longitudinal do Cine Ipiranga - Rino Levi - 1941 térrea; eles se dão por corredores que conduzem a halls de
Fonte: (ANELLI; GUERRA; KON, 2001, p.121)
elevadores e escadas, cujas cotas de nível estão a 2,40m
acima do nível da rua no bloco A, e a 1,44m no bloco B.
166
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Circulação Vertical

A circulação vertical do edifício Lucerna, em ambos
os blocos (A e B) é feita em duas caixas que unem os
volumes frontal e posterior. Em cada bloco, há um nicho
de circulação vertical composto por dois elevadores que
se ladeiam e se separam das escadas lineares por um
hall de geometria retangular e 12,00m² de área. Apenas
na transição entre o térreo e o 1º pavimento, a escada é
em forma de “U” sem patamar intermediário; isto ocorre
porque devido ao pé-direito mais elevado do térreo, há
a necessidade de um maior número de espelhos para a
escada.

Carimbo dos Irmãos Helcer com um croqui do ed. Lucerna Pavimento tipo e unidades
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

O Lucerna conta com quatro distribuições distintas


de pavimentos ao longo do seu desenvolvimento vertical.
O primeiro pavimento, conta com quatro unidades
residenciais, apenas no volume voltado para a avenida São
João. O volume posterior, separado do frontal pelas caixas
de circulação vertical e pelos vazios, abriga a área técnica e
administrativa do cinema; neste mesmo nível, encontra-se
o acesso ao balcão do cinema.

As unidades residenciais do primeiro pavimento


possuem o mesmo arranjo espacial, porém, da esquerda
balcão para a direita, para quem da avenida São João vê o edifício
de frente, as unidades vão aumentando de tamanho
área técnica - cine devido à inclinação da face do terreno voltada para a São
João; desta forma, a unidade da extrema esquerda conta
com 57m² de área e a da extremidade direita, com 71m².
Esta situação se repetirá em todos os pavimentos, do bloco
voltado para a São João.

As plantas das unidades, independentemente das


dimensões, possuem a mesma distribuição; ao se acessar
57m²
o apartamento, um corredor conduz a um hall que distribui
60m² 64m² 71m²
os fluxos para as salas, cozinha, banheiro e dormitório. As
salas de estar e jantar compartilham o mesmo espaço de
geometria trapezoidal e 22,50m² de área; elas se abrem
para o terraço, presente somente nas unidades do 1º
pavimento. O terraço se situa sobre a marquise em balanço
Esquema de distribuição do 1º pavimento de 3,00m, que protege o acesso ao cinema, no térreo. Os
circulação horizontal terraços, em todas as quatro unidades do 1º pavimento,
circulação vertical
contam com 3,00m de largura por 6,00m de comprimento.
unidades
O dormitório, de geometria trapezoidal e 19,50m² de área,
167
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

também se abre para o terraço. Portas de correr em aço e


vidro, fazem a separação do dormitório e sala dos terraços.
Banheiro e cozinha se ladeiam, mais uma vez concentrando
as situações hidráulicas numa mesma porção da planta.
A cozinha, retangular, possui 7,00m² e dá acesso a uma
lavanderia; ambos os espaços possuem aberturas para
um dos vazios internos do edifício. O banheiro, também
retangular, permite que em seus 4,10m² de área sejam
colocadas todas as peças sanitárias necessárias (lavatório,
bidê e bacia), além de uma banheira.

No segundo pavimento, o volume posterior,


voltado para os fundos do lote, também passa a contar
com apartamentos, ou seja, a partir deste andar não
existem mais funções relacionadas ao cinema. Agora são
oito apartamentos por piso, situação que se repetirá até
o último (15º), sendo quatro situados no volume frontal,
já descritos, e mais quatro no volume posterior, voltados
para os fundos do lote. Ao contrário do volume frontal,
o posterior é perfeitamente ortogonal, resultando em
unidades de tamanhos e arranjos espaciais idênticos. A
única diferença do 2º pavimento em relação aos demais
superiores, é o fato dos quatro apartamentos do volume
posterior possuírem terraços descobertos, situados sobre
Planta da unidade de 64m² a laje do cinema.
1º pavimento -

O 14º andar é o primeiro a sofrer o recuo que


escalona o edifício em seu volume frontal; os arranjos do
pavimento e das unidades são idênticos aos dos inferiores,
porém, os apartamentos sofrem uma diminuição dos
56m²
comprimentos das salas de estar e dormitórios, situação
56m² 56m² 56m²
que resulta num terraço descoberto de 1,50m de largura,
cuja medida corresponde ao recuo obrigatório.

No 15º pavimento há uma variação na distribuição


e nas dimensões de algumas unidades; na extremidade
direita (para quem da rua vê o edifício de frente) do
volume posterior, o que nas unidades dos andares
inferiores eram dois apartamentos, torna-se um, que é o
maior de todo o edifício com 112m² e dois dormitórios.
57m² 60m² 64m² 71m²
Junto ao acesso, há um corredor que serve como elemento
principal para a distribuição independente de todos os
setores da planta. Logo à esqueda, quando se adentra ao
apartamento, se situa a cozinha retangular, com 8,00m²
Esquema de distribuição do 2º ao 13º pavimento de área; dela, se acessa a área de serviço, que conta com
banheiro e dormitório de empregada, além do espaço para
circulação horizontal
circulação vertical
o tanque e para se estender roupas. Ao final do corredor
unidades principal encontra-se, à esquerda, o acesso à área social,
disposta em um espaço retangular de 29,00m² composto
168
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

por uma sala de jantar e uma sala de estar. À direita, no


final do corredor, encontra-se o setor íntimo, que possui
um dormitório de casal, um de solteiro e um banheiro
comum para os dois. O dormitório de casal, assim como
as salas, abre-se para os fundos do lote e possui geometria
retangular, com 23,00m² de área. O dormitório de solteiro
conta com 13,00m² e tem sua abertura voltada para um
56m² 56m² 112m²
dos vazios internos do edifício. A grande medida transversal
do apartamento (12,00m) permitiria a presença de mais
um dormitório ladeando a sala de estar e voltado para a
fachada dos fundos, porém, a opção foi por áreas sociais e
domitório de casal mais generosos.

No volume frontal, o recuo de mais 1,90m em


relação ao 14º pavimento fez com que o apartamento da
37m² 40m² 45m² 50m² extremidade esquerda, para quem da rua vê o edifício
de frente, sofresse uma mudança siginificativa em sua
distribuição e se tornasse o menor em todo o edifício, com
37m²; pode-se dizer que esta unidade é uma kitchenette,
pois não há divisão entre o espaço de estar e o de dormir.
Esquema de distribuição do 15º pavimento

circulação horizontal
circulação vertical
unidades

Planta da unidade de 37m²


15º pavimento.
Planta da unidade de 112m² - 15º pavimento.
169
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Perspectiva do Ed. Lucerna e Cine Comodoro - Vista da Av. São João


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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Fachadas

No edifício Lucerna, são duas as faces que receberam


tratamento aquitetônico: a que se volta para a avenida
São João, considerada a principal, com orientação sudeste
e a que se volta para o meio da quadra, com orientação
nordeste.

A fachada principal possui situções distintas que


marcam cada etapa do desenvolvimento vertical do edifício;
no térreo, a presença do Cine Comodoro trouxe à fachada
um toque de monumentalidade, conseguido entre outros
fatores, pelos pilares redondos que marcam o acesso ao
interior da edificação. Como já explicado anteriormente,
uma reentrância que alarga o passeio público foi criada
atrás dos pilares redondos gerando uma área coberta para
proteção contra intempéries, mas que também confere
leveza ao volume do edifício, que toca mais sutilmente
o chão. O segundo momento da fachada, logo acima do
térreo, é composto por uma superfície de 24,70m de
comprimento por 5,00m de altura, feita em cobogós
Edifício Lucerna em 1959 quadrados, que enquadram um volume em balanço que
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer funciona como marquise e terraço para os apartamentos
171
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

do 1º andar, projetando-se em 3,00m sobre o alinhamento;


além disso, este volume contribui com a monumentalidade
da fachada, sustentando os luminosos que anunciavam os
fimes em cartaz. A simetria, que só não é perfeita devido
às angulosidades do terreno, é outro elemento que ajuda
a reforçar a monumentalidade da fachada, principalmente
em sua porção inferior.

Logo acima da superfície de elementos vazados,
que também pode ser entendida como um elemento
de transição entre o público e o privado, surge o corpo
principal da fachada, que é dominado pelas aberturas
dos apartamentos do 2º ao 13º pavimento. O recuo da
estrutura em relação ao alinhamento do edifício com a
avenida São João, criando um balanço de 1,50m das lajes,
permitiu a adoção de uma fachada livre, de modo que o
arquiteto pôde criar aberturas generosas e linhas delgadas,
já que não há vigas na fachada. A orientação sudeste, de
pouca insolação, também foi um fator que pode ter levado
à decisão pelo envidraçamento abundante da fachada.
Edifício Lucerna atualmente
Foto: Edson Lucchini Jr.
172
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Na maioria dos edifícios estudados, se nota


que Heep frequentemente optava por sombreamentos
na fachada, através de volumes salientes, por razões
perceptivas e de conforto térmico, entre outras. No edifício
Lucerna, a fachada não possui terraços, grelhas e nem
outros elementos salientes, já que não há a necessidade
de sombreamentos, devido à orientação sudeste. Porém, a
falta de volumetria da fachada é em partes compensada por
um simples tratamento cromático que trouxe movimento
a ela; as linhas brancas compõe uma grelha, que dá a
impressão de estar sobreposta de maneira desencontrada
a uma outra grelha secundária, de cor amarela; ambas as
grelhas não possuem profundidade, não se salientando
na fachada, porém, a impressão causada é que realmente
uma está sobre a outra.

No edifício Lucerna Heep adotou uma solução, em


relação aos caixillhos, semelhante à do edifício Normandie,
Edifício Lucerna em atualmente - descaracterização onde os peitoris e as bandeiras das janelas são envidraçados
Foto: Edson Lucchini Jr.
e basculantes, possibilitando uma troca de ar. Os peitoris
envidraçados, são protegidos por tubos metálicos. Mais
uma vez, Heep compõe uma fachada onde os elementos
horizontais são mais marcantes; neste caso não há floreiras,
que habitualmente são os elementos horizontais preferidos
do arquiteto, mas sim linhas horizontais que, mais fortes
que as verticais, representam as lajes e os guarda-corpos.
173
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Assim como na maioria dos edifícios estudados,


o escalonamento obrigatório dos últimos andares acaba
assumindo um papel de coroamento ao edifício. No
Lucerna, a solução adotada para os dois últimos pavimentos
escalonados é semelhante à de outros edifícios de Heep;
no corpo principal da torre, ele sempre opta pelo mínimo
de alvenaria possível na fachada, utilizando grandes
caixilhos, porém, nos coroamentos escalonados a tipologia
e dimensões dos caixilhos mudam, predominando nas
fachadas as superfícies lisas em alvenaria, ou seja, o
escalonamento por sí só já confere uma diferenciação
ao coroamento do edifício, reforçada ainda mais pelas
decisões projetuais descritas.


Situação Atual

O edifício Lucerna acompanhou a degradação do


centro da cidade, principalmente nesta região da antiga
cinelândia. A fachada atualmente encontra-se muito
deteriorada, sem a menor manutenção; além disso, os
caixilhos originais vêm sendo trocados por esquadrias de
alumínio. Nota-se que em muitas unidades, as bandeiras
superiores de ventilação dos caixilhos vêm sendo retiradas
e preenchidas com alvenaria. As cores utilizadas também
agridem a idéia original de superposição de grelhas. Porém,
a grande perda para o edifício e para todo o entorno
foi o fechamento do Cine Comodoro em 1997, que era
considerado por muitos o melhor cinema da cidade, mas
que assim como todos os outros da região, perdeu lugar
para os cinemas em shopping centers.

Edifício Lucerna em atualmente Edifício Lucerna em atualmente


Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.
174
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

planta do pav. térreo


esc. 1:250

cine comodoro edifício lucerna A e B


1 - bilheteria 1 - acesso - bloco A
2 - foyer do balcão 2 - hall de elevadores - bloco A
3 - banheiro fem. 3 - acesso - bloco B
4 - banheiro masc. 4 - hall de elevadores - bloco B
5 - dep. de lixo
6 - vazio
175
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planta do subsolo

cine comodoro
1 - foyer principal
2 - vitrines
3 - café
4 - sala de exibição
5 - banheiro fem.
6 - banheiro masc.
7 - manut. tela
8 - depósito
9 - ante-câmara

edifício lucerna A e B
1 - medidores
2 - caldeira
3 - caixas d’água
4 - dep. de óleo
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planta do 1º pav.
1
esc. 1:250

1
cine comodoro apto. 1 dorm. - 64 m²
1 - acesso ao balcão 1 - cozinha
2 - cabine de projeção 2 - banheiro
3 - administração 3 - sala de jantar
4 - enroladeira 4 - sala de estar
5 - wc do operador 5 - dormitório
6 - banheiro masc. 6 - serviço
7 - banheiro fem.
8 - depósito
177
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planta do 2º pav.
esc. 1:250
1

1 2
apto. 1 dorm. - 64 m² apto. 1 dorm. - 56 m²
1 - cozinha 1 - cozinha
2 - banheiro 2 - banheiro
3 - sala de jantar 3 - sala de jantar
4 - sala de estar 4 - sala de estar
5 - dormitório 5 - dormitório
6 - serviço 6 - terraço descoberto
7 - serviço
178
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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1 2
apto. 1 dorm. - 64 m² apto. 1 dorm. - 56 m²
1 - cozinha 1 - cozinha
2 - banheiro 2 - banheiro
3 - sala de jantar 3 - sala de jantar
4 - sala de estar 4 - sala de estar
5 - dormitório 5 - dormitório
6 - serviço 6 - serviço
planta do 3º ao 13º pav.
esc. 1:250 1
2

1 2
apto. 1 dorm. - 56 m² apto. 1 dorm. - 56 m²
1 - cozinha 1 - cozinha
2 - banheiro 2 - banheiro
3 - sala de jantar 3 - sala de jantar
4 - sala de estar 4 - sala de estar
5 - dormitório 5 - dormitório
6 - serviço 6 - serviço
7 - terraço planta do 14º pav.
esc. 1:250 1
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3 4

1
2
planta do 15º pav.
esc. 1:250

1 2 3 4
kitchenette - 37 m² apto. 1 dorm. - 45 m² apto. 1 dorm. - 56 m² apto. 2 dorm. - 112 m²
1 - cozinha 1 - cozinha 1 - cozinha 1 - corredor de distr. 8 - serviço
2 - banheiro 2 - banheiro 2 - banheiro 2 - cozinha 9 - banh. empregada
3 - sala 3 - sala de jantar 3 - sala de jantar 3 - banheiro 10 - dorm. empregada
4 - dormitório 4 - sala de estar 4 - sala de estar 4 - sala de jantar
5 - terraço 5 - dormitório 5 - dormitório 5 - sala de estar
6 - serviço 6 - serviço 6 - dormitório casal
7 - terraço descoberto 7 - dormitório solteiro
180
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corte AA
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fachada av. são joão


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detalhe de fachada - térreo


Colunata composta por quatro pilares
redondos marcam o acesso ao cimena e
conferem monumentalidade.

detalhe de fachada
Volume saliente que serve como marquise,
ampliando a área coberta para quem
compra bilhetes ou aguarda ao início do
filme.

detalhe de fachada
Corpo principal da torre com uma fachada
livre, muito envidraçada, com grelhas que
enquadram as aberturas.
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Foto: Edson Lucchini Jr.


6.8 Edifício Araraúnas 1953-55
endereço e localização
Av. São João 1821-1845 Centro

ele
co vado
sta
es
ilv
a

av.
sãoj

o

tte
gle
al.
construção
Dácio A. de Moraes S.A
terreno
Irregular de esquina - 570 m²

unidades
1º ao 13º pav.: 11 kitch. de 25m²
1 ap. de 1 dorm. - 42 m²
14º pav.: 10 kitch. de 23 m²
15º pav. : 5 ap. de 1 dorm. - 39 m²
Total: 171 unidades

publicações
Acrópole 234, 1958, p. 212-213

c o e f. d e a p ro ve i ta m e nto
10.8 - Área total = 6152,70m²

taxa de ocupação
69 %

conservação
Ruim

descaracterização
Folheto de vendas do Ed. Araraúnas - 1955
Alta
184
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A Avenida São João

A avenida São João é uma das mais importantes


vias da cidade de São Paulo não só no âmbito viário como
no simbólico. Foi a primeira via pavimentada da cidade,
e em sua conformação atual, pode ser considerada uma
Av. São João em 1976
Fonte: http://drivaneios.files. via arterial que liga o centro da cidade à zona oeste. Nos
wordpress.com/2009/02/aveni- anos 1940, o Plano de Avenidas de Prestes Maia incluiu
dasaojoao19701.jpg - acesso em
maio de 2010 a São João no perímetro de irradiação, resultando no
seu alargamento e em outras reformas que atribuíram à
avenida uma maior fluidez de tráfego, além de definirem
um importante vetor de expansão vertical na cidade. A
São João foi também, dos anos 1930 aos anos 1970, um
dos principais núcleos culturais da cidade, principalmente
pelo seu caráter de cinelândia, como foi visto na análise do
edifício Lucerna e cine Comodoro (p.160). (TOLEDO, 2004)

A topografia da cidade de São Paulo é


predominantemente acidentada, o que de certa forma
definiu ruas e avenidas com características mais curvas,
Av. São João em 1942 - Edifício repletas de aclives de declives, com exceção das que
do BANESPA como ponto focal.
Fonte: Revista Life, nº123, 1942
ocuparam os leitos ou várzeas de rios e córregos; estas
são planas, mas nem sempre lineares. A São João é uma
das poucas avenidas da cidade que tem sua conformação
integralmente linear, que a definiu como um grande eixo,
cujo ponto focal é o imponente edifício Altino Arantes, sede
do Banespa47, inspirado no célebre Empire State Building48
de Nova Iorque. A construção do elevado Costa e Silva49 ,
em 1970, trouxe inúmeras consequências negativas para o
centro da cidade, já amplamente conhecidas, porém, talvez
Av. São João atualmente - Eleva-
do tira a percepção da avenida a pior delas seja o fato do elevado ter tirado da São João
como um eixo visual. o caráter de eixo visual, já que quando se trafega sob ele,
Foto: Edson Lucchini Jr
perde-se a noção do todo e não se enxerga o ponto focal.
O edifício Araraúnas, foco desta análise, é um dos muitos
prejudicados pelo elevado, que está a apenas 5,00m de
sua fachada.

A ocupação vertical da São João, assim como em


quase todo o centro da cidade, foi intensa e acelerada a
partir do início da década de 1940. Um exemplar notável,
e precedente do edifício Araraúnas, é o edifício Trussardi,
projetado por Rino Levi em 1941; este edifício possui
elementos que serão incorporados por Franz Heep em
vários projetos posteriores, como a subtração do volume
principal por terraços, e fechamentos parciais com cobogós,
Ed. Trussardi - Rino Levi - 1941 atribuindo movimentos de cheios e vazios à fachada.
Fonte: FIGUEROA, Mário. Habitação coletiva
em São Paulo 1928 -1972. Tese de doutora-
mento. São Paulo: FAU/USP, 2002, p.203

(47) - Banco do Estado de São Paulo, atual Santander S.A


(48) - O Empire State Building é um arranha-céu de 102 andares de estilo Art déco situado na cidade de Nova Iorque, Estados Unidos. De 1931 a 1972 foi o edifício mais alto do mundo.
(49) - Também conhecido por “minhocão”, o Elevado Costa e Silva é uma via expressa da cidade de São Paulo que liga o centro a zona oeste. Foi construído sobre a rua Amaral Gurgel e
avenida São João e responsável, em parte, pela degradação do centro da cidade.
185
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Terreno, implantação, volumetria e entorno

O terreno onde localiza-se o Edifício Araraúnas


te
gle
t
situa-se na esquina da Alameda Glette com a Avenida
São João e possui sua maior face voltada para esta. Conta
da

com 570m² de área e uma geometria irregular, sem faces


me
a la

paralelas. O edifício possui térreo e mais 15 pavimentos,


definindo uma proporção de 49,00m de altura por 36,00m
volume principal de largura e aproximadamente 11,30m de profundidade
corpo de circulação no corpo elevado. A relação proporcional quase quadrada
vertical da fachada principal resultou numa volumetria onde a
sensação de verticalidade não é tão intensa ao observador
localizado no térreo, em frente ao edifício, fato reforçado
av. são joão pelo recuo obrigatório dos dois últimos pavimentos, por
imposição legislativa da época. O gabarito não possui
- percurso de pedrestres sob marquise
discrepâncias com o entorno, já que a grande maioria
dos vizinhos foram construídos na mesma época, sob as
mesmas premissas da legislação.

O edifício foi construído junto a três alinhamentos


do terreno com os lotes lindeiros e com a Alameda Glette,
porém, a principal face do volume, que é voltada para a
avenida São João e orientada ao leste, é levemente curva,
sendo portanto a única que não acompanha o alinhamento,
deslocando-se gradativamente dele. A curvatura da fachada
principal, assim como todos os demais elementos do
edifício, resulta de decisões de projeto que revelam certo
interesse; embora não haja como comprovar as verdadeiras
intenções do arquiteto, restam algumas interpretações
possíveis. O primeiro dos benefícios conseguidos pela
curva é espacial, já que ela gera o aumento da superfície de
fachada, consequentemente resultando numa maior área
do pavimento tipo, e por fim, num maior número possível
de unidades, ou em espaços mais generosos para elas. O
segundo resultado importante obtido pela solução curva
é o aumento da amplitude visual do edifício para quem
trafega no sentido centro-bairro da avenida São João, ou
para quem vem ao encontro dele pela Alameda Glette.
Outro item a ser considerado é o fato de que a curvatura do
volume principal o desloca gradualmente do alinhamento,
liberando e ampliando o passeio da esquina, onde uma
marquise também curva, cobre o espaço vazio criado. Além
disso, esta curvatura também resulta num encurtamento
do percurso do pedestre que vem na Avenida São João em
direção à Alameda Glette, enaltecendo a inserção urbana
do edifício. Hoje, com o fechamento lateral desta marquise
de esquina para ganho de espaço interno das lojas, os
conceitos de encurtamento de percursos e valorização da
esquina se perderam.
186
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Térreo e subsolo

O térreo ocupa praticamente a totalidade do lote,


com exceção de dois pequenos vazios para a iluminação
natural que beneficia cinco das seis lojas existentes. Todas
estão voltadas para a Avenida São João, com exceção de
uma, que é acessada pela alameda Glette. O subsolo do
edifício não é destinado à garagens e não é servido pelos
elevadores, funcionando apenas como estoque para as
loja lojas. É acessado por escadas individuais, presentes em
te

51 m² cada uma delas.


t
gle


da

O edifício conta com dois acessos no térreo. O


me

loja
ala

49 m²
social é feito pela avenida São João e se dá através de um
loja
loja
corredor de 2,55m, que corresponde à largura de uma das
49 m²
49 m² loja loja
kitchenettes dos pavimentos superiores. Este corredor leva
49 m² 68 m²
à parte posterior do terreno, onde se encontra o corpo
de circulação vertical. O acesso de serviço ocorre pela
Alameda Glette. Um corredor, adjacente à divisa do lote,
conduz ao hall de elevadores.
av. são joão

Esquema de distribuição do pavimento térreo


Circulação Vertical
circulação horizontal
circulação vertical
lojas
Situada em um volume destacado do principal,
a circulação vertical do edifício é composta por dois
elevadores e uma escada em forma de ferradura, sem
patamar intermediário. Na transposição do primeiro
andar para o térreo, a escada torna-se linear, já que o pé-
direito mais elevado deste resulta num maior número de
degraus.

Estrutura

O Araraúnas possui, assim como o edifício Icaraí


(p.78), uma grelha que abriga os terraços, se tornando
o principal elemento da fachada em ambos os edifícios.
Porém, no Icaraí esta grelha é estrutural pois as paredes
Térreo do Araraúnas atualmente
Foto: Edson Lucchini Jr.
que dividem os terraços são pilares que sustentam as suas
lajes e travam a estrutura do edifício. Já no Araraúnas,
essas paredes que dividem os terraços não possuem
papel estrutural; os terraços estão em balanço, com os
pilares recuados da fachada e com um vão de 2,55m, que
corresponde à largura das kitchenettes. No térreo há uma
mudança no ritmo estrutural, de modo que o vão passa a ser
187
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

de 5,10m, correspondendo exatamente à largura de duas


das kitchenettes superiores. Esta mudança, possibilitada
pela adoção de uma viga de transição, foi necessária para
42 m²
tet
tornar as lojas maiores e com a planta livre.
gle
da

Pavimento tipo e unidades


me
a la

25 m²
25 m²
25 m²
O Edifício Araraúnas possui o mesmo arranjo
25 m²
25 m² espacial do 1º ao 13º andar, contando com 11 kitchenettes
25 m² 25 m²
25 m²
25 m² 25 m²
situadas na face curva do volume, todas voltadas para a
25 m²
avenida São João e orientadas ao leste. Além disso, são
organizadas em pares, espelhadas entre si, definindo
uma parede hidráulica comum para os seus respectivos
av. são joão
banheiros. Na face voltada para a alameda Glette, com
Esquema de distribuição do pavimento tipo, do 1º ao 13º andar orientação sul, encontram-se unidades maiores, de um
circulação horizontal dormitório. A circulação horizontal nos pavimentos é feita
circulação vertical por um corredor que, ventilado e iluminado por cobogós,
unidades acompanha a curvatura do volume principal. Esta solução,
corrente em grande parte dos edifícios laminares da época,
é fundamental para a ventilação natural das cozinhas e
banheiros, já que eles estão voltadas para o corredor.

As unidades do tipo kitchenette possuem plantas


compostas por uma cozinha, um banheiro, uma sala-living
e um terraço, totalizando 25m². A cozinha conta com
1 metro de largura por 70cm de profundidade, espaço
suficiente para abrigar uma pia com cuba, um fogão de
Planta das unidades de 25m², do 1º ao 13º andar duas bocas e uma pequena geladeira sob o tampo. O
banheiro possui planta em “L”, derivada da subtração
do espaço da cozinha. As medidas mais generosas do
banheiro, são decorrentes da necessidade deste espaço
também ser utilizado como uma opcional área de serviço,
além do uso do bidê, muito comum na época. A sala-living
é um espaço retangular de 2,55m de largura por 5,20m
de profundidade, que possui um armário embutido junto
à parede que a separa do banheiro, além de um caixilho
piso-teto que a separa do terraço. É um ambiente cujas
dimensões obrigam a compactação da função de dormir
com a de estar, sugerindo o uso de um sofá-cama.

O caixilho piso-teto que separa a sala-living do
terraço é composto por uma porta de madeira com
veneziana superior de ventilação permanente, além de
Caixilho - sem a bandeira original com duas folhas de vidro de correr com bandeira e peitoril
veneziana também em vidro. Este caixilho, do mesmo tipo do
Foto: Edson Lucchini Jr.
utilizado no edifício Icaraí, confere uma boa ventilação e
iluminação à sala-living, além de integrá-la visualmente ao
188
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

terraço, que é um espaço de 2,55m de largura por 1,10m


de profundidade e funciona como uma espécie de brise,
impedindo que o caixilho da sala-living fique diretamente
exposto ao sol nascente. As kitchenettes do Edifício
Araraúnas possuem um arranjo espacial muito semelhante
às do edifício Icaraí, porém com dimensões bem inferiores.
Pode-se afirmar que são as menores unidades de todas as
demais estudadas nesta obra, e possivelmente, as menores
projetadas por Heep em São Paulo.

Ao se observar o arranjo espacial em pares


espelhados das kitchenettes, nota-se que a unidade da
extremidade direita, para quem da avenida São João vê
o edifício de frente, poderia ser maior que as demais,
apropriando-se do espaço do corredor. Porém isso não
ocorre, pois esse aumento de espaço traria uma mudança
total no acesso e nas áreas molhadas desta unidade. Esta
opção por mantê-la igual às demais pode ser justificada
através de uma análise do método projetual de Heep, que,
adepto ao ideário racionalista, priorizava a padronização e
Planta das unidades de 42m², do 1º ao 13º andar a repetição de elementos arquitetônicos e construtivos ao
máximo possível. Assim sendo, o arquiteto optou por não
mudar a planta desta unidade da extremidade do corredor,
para não perder a vantagem da parede hidráulica comum
para dois banheiros, já que o ganho de espaço não seria
tão significativo.

Os apartamentos voltados para a alameda Glette


possuem um programa definido por um hall de entrada,
uma sala de estar e uma de jantar que compartilham o
te

mesmo espaço , além de um dormitório, uma cozinha e um


let

banheiro, somando 42m² de área útil. As aberturas em fita


ag
ed

da sala e dormitório estão voltadas para a face sul, o que


m

talvez explique o fato delas serem bem menores que as das


ala

23 m²
kitchenettes, dotadas de caixilhos piso-teto envidraçados.
23 m²
23 m²
23 m²
23 m²
Os recuos impostos pela legislação geraram um
23 m² 23 m²
23 m² 23 m² 23 m² escalonamento dos últimos dois pavimentos do edifício,
tornando os seus arranjos espaciais diferentes dos demais
inferiores. No 14º andar as kitchenettes são dispostas da
mesma maneira que as dos andares inferiores, porém com
av. são joão
a sala-living medindo 1,00m de comprimento a menos, e os
Esquema de distribuição do 14º pavimento seus terraços descobertos; as dez unidades do pavimento
circulação horizontal contam com 23m² cada, sendo portanto as menores do
circulação vertical edifício. Este andar possui uma kitchenette a menos na
unidades extremidade esquerda, para quem da avenida São João
vê o edifício de frente, graças ao escalonamento também
necessário na fachada da alameda Glette; por este mesmo
motivo, o 14º andar não conta mais com o apartamento de
189
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

42m² voltado para alameda Glette, resultando num terraço


de uso comum.

A diminuição de 1,40m no sentido longitudinal do


15º pavimento, graças a mais um recuo em relação ao 14º,
acarretou na necessidade do aumento das dimensões das
te

unidades no sentido transversal, porém, a consequência


t
gle

foi a redução do número delas no pavimento, que conta


da
me

agora com apenas cinco unidades de um dormitório, com


a la

39m² cada.
39 m²
39 m²
39 m²
O arranjo espacial das unidades do 15º pavimento
39 m²
39 m² conta com um corredor de acesso, situado na porção
central da planta, que separa a cozinha do banheiro; este
conta com 3,30m², área suficiente para a colocação de vaso,
pia, bidê e banheira. A cozinha possui 4,40m², podendo
av. são joão abrigar uma geladeira comum, sem a necessidade dos
“kits” de cozinha compacta vistos na análise do edifício
Esquema de distribuição do 15º pavimento
Normandie (p.50). O corredor termina num hall onde se
circulação horizontal
acessa o dormitório e a sala; esta possui 10,00m² e pode
circulação vertical
abrigar as funções de estar e comer. O dormitório, cuja
unidades
medida é de 8,40m², possui armário embutido. Tanto a
sala como o dormitório, possuem ligação com o terraço
descoberto. Esta distribuição de planta para apartamentos
de um dormitório e dimensões semelhantes, repete-se
com frequência na obra de Heep, como já visto no edifício
Normandie, além de outros que foram estudados, como o
Ibaté (p.94) e o Lucerna (p.160).

Planta das unidades de 39m² do 15º andar


190
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Perspectiva do Araraúnas em sua condição original


191
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Fachadas

Na fachada principal do edifício Araraúnas,


verificam-se três momentos distintos, que caracterizam
uma base, correspondente ao térreo, um corpo principal,
correspondente aos pavimentos de 1 a 13, e um coroamento,
que corresponde aos dois últimos pavimentos (14º e 15º)
escalonados. No térreo, predominam na fachada as portas
metálicas das lojas, com bandeiras superiores em cobogós
quadriculados de concreto para ventilação permanente. O
acesso social é feito por uma porta de altura maior que a das
lojas e de linguagem bem distinta delas, a fim de destacar
a posição de entrada para a torre de apartamentos. No
térreo também se destaca a marquise curva que protege
a esquina, já mencionada anteriormente. Na porção
térrea da fachada lateral, voltada para a rua Glette, não
há elementos de destaque; apenas há a porta de uma loja,
na mesma linguagem das da fachada principal, além do
Edifício Araraúnas
Foto: Edson Lucchini Jr. acesso de serviço do edifício.
192
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O corpo principal da fachada do Araraúnas, que


é voltada para a avenida São João, tem como elemento
principal uma grelha, onde cada unidade, que corresponde
a um apartamento, possui de 2,55m de largura por 2,80m
de altura e 1,20m de profundidade. A grelha abriga os
terraços e segue a curvatura do volume principal, além
de que perceptivamente, ela atribui cheios e vazios à
fachada, criando terraços sombreados. Por mais que, em
termos construtivos, se saiba que a grelha é um elemento
adicionado ao corpo principal da edificação, em termos
perceptivos, ela pode ser vista como quadrados subtraídos
do volume maior. Os guarda-corpos dos terraços são
compostos por tubos metálicos na parte inferior e por um
elemento mais marcante e espesso em concreto na parte
superior, que reforça as linhas horizontais da fachada.
As kitchenettes da extremidade direita, de quem da
avenida São João olha o edifício de frente, não possuem
terraços, quebrando o ritmo corrente da fachada e
definindo um elemento vertical que contrapõe a marcante
horizontalidade, já citada dos terraços.
193
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

A kitchenette da extremidade esquerda, de quem


da avenida São João vê o edifício de frente, não pôde ter
a abertura de seu banheiro voltada para o corredor como
as demais. Portanto, a solução adotada para se resolver a
ventilação e a iluminação dele foi voltar a sua abertura para
a fachada lateral, através de uma “janela indevassável”.
Este termo encontrado na matéria da revista Acrópole
nº 214 sobre o edifício Araraúnas, se refere aos volumes
retangulares salientes que se destacam na fachada
lateral, ventilando e iluminando os banheiros sem deixá-
los expostos. Além disso, são elementos que conferem
volume, sombras e ritmo à fachada da alameda Glette.
Esta, além dos volumes descritos, também é composta
pelas janelas em fita dos apartamentos de um dormitório
e por estreitas aberturas sem caxilho, que ventilam
lateralmente os terraços das kitchenettes da extremidade
esquerda, para quem da avenida São João vê o edifício de
frente. A fachada da rua Glette, por estar orientada ao sul,
de pouca insolação e ventos frios, possui mais superfícies
opacas em alvenaria, além de caixilhos menores.
194
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

No 14º andar, o recuo da fachada faz com que O Araraúnas possui uma grande semelhança
a grelha, que predominava nos andares inferiores, se tipológica ao edifício Icaraí, já estudado, não só no que
transformasse em pórticos que separam as unidades, diz respeito à planta, mas também com relação à fachada.
conferindo um elegante coroamento ao edifício; os Em ambos edifícios, Heep utilizou a idéia dos terraços,
pórticos, que ajudavam a minimizar a percepção do obrigando o recuo do caixilho, tirando-o da exposição
escalonamento dos últimos pavimentos, eram percebidos direta ao sol. Como no Icaraí, os terraços criam uma fachada
por quem trafegava na avenida São João e ruas do repleta de cheios e vazios. Porém hoje, com a presença
entorno. Foi sem dúvida uma solução criativa que o do elevado Costa e Silva a menos de 6,00m do edifício, os
arquiteto encontrou para lidar com o escalonamento dos terraços foram em sua maioria fechados por caixilhos de
últimos pavimentos, imposto pela legislação da época; na alumínio de diversos tipos, descaracterizando a fachada e
maioria dos casos presentes na cidade, os edifícios com as empobrecendo o seu volume original, agora desprovido
mesmas caraterísticas não possuem nenhum tratamento do jogo de sombras e da sensação de profundidade que os
arquitetônico em seus escalonamentos, resultando numa terraços abertos promoviam.
estética desagradável.
195
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Situação Atual

O Edifício Araraúnas encontra-se hoje num estágio


muito elevado de descaracterização com relação ao projeto
original de Adolf Franz Heep, além da má conservação, muito
comum no entorno e agravada certamente pela presença
do elevado Costa e Silva a 6,00m da fachada principal. O
fechamento dos terraços por caixilhos variados e a escolha
de cores sem critérios, são os principais elementos que
descaracterizam o edifício, originalmente pintado na cor
branca. Além disso, os pórticos do coroamento foram
fechados por diferentes tipos de caixilho e telhas de
amianto, para ganho de área nos apartamentos dos dois
últimos pavimentos, criando no topo do edifício uma
desuniformidade visual, semelhante à de uma favela. No
térreo, o principal fator de descaractarização é o fechamento
lateral da marquise curva para ganho de mais uma loja.
Isto prejudicou o conceito original de generosidade com
o espaço público, já que o projeto tornava o passeio da
esquina mais amplo e coberto.

Fotos do edifício Araraúnas atualmente -


Descaracterização e degradação
Fotos: Edson Lucchini Jr.
196
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

planta do pav. térreo


esc. 1:250

1 - acesso social
2 - áreas descobertas
3 - acesso de serviço
4 - lojas

planta do pav. tipo


1º ao 13º pav.
esc. 1:250
1
1
apto. 1 dorm. - 42 m²
1 - sala estar/
jantar
2 - cozinha
3 - banho
4 - dormitório

2
kitchenettes - 25 m²
1 - banho
2 - mini cozinha
3 - sala-living
4 - terraço
2
197
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

planta do 14º pav.


esc. 1:250

1
kitchenettes - 23 m²
1 - banho
2 - mini cozinha
3 - sala-living
4 - terraço

planta do 15º pav.


esc. 1:250

1
apto. 1 dorm. - 39 m²
1 - cozinha
2 - banho
3 - sala
4 - dormitório
5 - terraço

1
198
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

corte AA
199
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

fachada av. são joão


200
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

fachada al. glette


201
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

detalhe do térreo
Marquise curva cobre a esquina; acesso
social destacado das portas das lojas.
Grelha dos terraços em balanço sobre o
térreo.

detalhe da modulação da fachada


Fachada modulada pelos terraços, cuja
medida corresponte exatamente ao vão
da estrutura. Utilização de caixilho piso-
teto

detalhe do coroamento
Os Pilares do 14º andar tornam-se pórticos
para conferir um coroamento elegante
202
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Foto: Edson Lucchini Jr.


6.9 Edifício Guaporé 1956-59
endereço e localização
R. Nestor Pestana 87 - Centro
o
o laçã
cons
r. da

r. ne
stor
pça.

pest
roosevelt
s
te

ana
fon
s
tin
ar
r. m
construção
Otto Meinberg S.A
terreno
Irregular - 2780 m²
unidades
1º pav.: 2 kitch. de 44m², 9 kitch. de 35m2
2 ap. de 62m², 1 ap. de 71m2, 1 ap. 105m²
2º ao 8º pav:
4 kitch. de 44m2, 8 kitch. de 35m2
4 ap. de 62m²
9º pav.: 2 kitch. de 44m², 8 kitch de 35m²
2 ap. de 66m², 3 ap. de 52m²
10º pav.: 2 kitch. de 44m², 8 kitch de 35m²
2 ap. de 70m², 2 ap. de 62m²
Total: 155 unidades
c o e f. d e a p ro ve i ta m e nto
7.3 - Área total = 20.240m²
taxa de ocupação
99 %
conservação
Razoável
descaracterização
Média
observações
Térreo com 3 lojas e garagens, 2 sobrelojas,
2 subsolos - 292 vagas para autos
203
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O Edifício Guaporé está situado na rua Nestor


Pestana, uma via de calha estreita, trânsito local e muito
arborizada. É uma via de usos muito diversificados; num
trecho de 400m encontram-se diversos bares, boates,
edifícios comerciais, institucionais, residenciais e religiosos.
A rua Nestor Pestana ainda conta com o teatro Cultura
Artística, projetado por Rino Levi em 1942.

O Guaporé é mais uma de muitas obras da parceria


Franz Heep - Otto Meinberg; num raio de 1,5km, são nove50
edifícios residenciais projetados por Heep e executados
por Meinberg nos anos 1950. O Edifício Guaporé pode
ser considerado híbrido, pois concentra usos comerciais,
Teatro Cultura Artística - Rino Levi - 1942
Fonte: http://lucianasabbag.files.wordpress.com/2008/08/02.jpg
residenciais e institucionais; o térreo possui três lojas
acesso em janeiro de 2010 voltadas para a rua. Além disso, há duas sobrelojas que
abrigam uma das sedes do CREA-SP. Há quatro níveis de
garagens, totalizando 292 vagas para automóveis, o que
representa um fato incomum na época, não só na obra de
Heep, mas como nas demais situadas na região central da
cidade, que na maioria dos casos nem sequer possuiam
garagens.

Terreno, implantação, volumetria e entorno

O terreno onde situa-se o Guaporé possui a


topografia plana no sentido perpendicular à rua Nestor
Pestana e um desnível de 50cm no sentido da direita para
a esquerda, para quem da rua, vê o edifício de frente. A
garagens geometria do terreno é irregular; na sua porção frontal,
ele possui ângulos retos entre a face principal e as laterais,
porém, nos fundos, o fechamento do polígono que define
o lote se dá por divisas não paralelas, sem ângulos retos.
A principal face do terreno, voltada para a rua Nestor
Pestana, não é a maior e possui 33m; a face lateral direita
mede cerca de 85m, configurando um terreno de 2780m²
de área.
bloco 2
circ. circ.
vertical vertical O corpo elevado, situado no terço frontal do
terreno e disposto de modo transversal em relação
a ele; é composto por um embasamento de 33,00m
bloco 1 de comprimento que faceia o alinhamento com a rua
Nestor Pestana, por 34,20m de profundidade e 14,35m
de altura, compreendendo o térreo mais dois andares
embasamento de sobrelojas. O volume mais alto, que compreende os
apartamentos residenciais, é divido em dois blocos, ambos
rua nestor pestana
situados sobre o embasamento; o bloco voltado para a
rua Nestor Pestana está recuado 5,50m do alinhamento
(50) - Ver tabela completa com a relação de edifícios e suas respectivas construtoras na página 8
204
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

com ela e possui 33,00m de comprimento por 11,20m de


profundidade e 28,70m de altura, porém, este bloco frontal
sofre o escalonamento obrigatório, que abrange o 9º e o
10º andares; o fato deste bloco estar recuado 5,50m do
alinhamento, minimizou este escalonamento dos andares
superiores. O volume posterior, voltado para os fundos
do lote, se separa do frontal por um vazio de 5,00m de
largura por 20,00m de comprimento, e possui uma relação
proporcional de 33,00m de comprimento por 12,60m de
largura e os mesmos 28,70m de altura do volume frontal,
porém, não sofre escalonamento. A disposição transversal
do corpo elevado em relação ao terreno, possivelmente
deve-se à orientação com relação à insolação; as faces
do volume onde se localizam as áreas de estar e repouso
dos apartamentos voltam-se para oeste no bloco frontal,
e a leste no bloco posterior, favorecendo a insolação das
unidades. Se a disposição dos blocos fosse no sentido
longitudinal, certamente teria sido possível um melhor
aproveitamento em termos de área construída, resultando
em mais apartamentos, porém, isto acarretaria em blocos
com faces orientadas no sentido norte-sul, prejudicando
a insolação de metade das unidades residenciais, já que
a orientação sul não é recomendada para ambientes de
longa permanência. Isto é um indício de que a arquitetura,
naquele momento, ainda era capaz de se impor em relação
ao mercado, privilegiando a qualidade e a salubridade dos
espaços, mesmo que isto gerasse menos lucro.

O embasamento e os dois blocos não possuem


recuos laterais, conformando empenas cegas e
possibilitando assim, a construção de edifícios vizinhos
também sem recuos laterais. O lote lindeiro à lateral
direita do Guaporé, para quem da rua o vê de frente, é
ocupado por um edifício de gabarito semelhante; do lado
esquerdo há um lote sem edificações, fato que permite
a visão da empena cega lateral do edifício em análise.
O entorno, apesar de possuir alguns terrenos vazios ou
com construções de gabarito muito baixo, é composto
predominantemente por edifícios verticais de gabarito
maior ou igual ao do Guaporé.

Térreo, embasamento e subsolo

Como já citado anteriormente, o Guaporé é um


edifício híbrido, sendo que o térreo e as sobrelojas possuem
usos comerciais e institucionais. A porção frontal do térreo,
voltada para a rua Nestor Pestana, é dividida, no sentido
205
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

transversal, em cinco partes de larguras semelhantes; a


parte da extremidade direita, para quem da rua vê o edifício
de frente, é destinada à portaria dos blocos residenciais
garagens
e das sobrelojas. A parte central representa o acesso de
veículos às garagens e as demais partes correspondem às
lojas. No sentido longitudinal, pode-se dizer que as lojas
ocupam um terço do terreno; os dois terços restantes são
ocupados por garagens cobertas, o que resultou numa
taxa de ocupação do terreno de praticamente 100%.
loja loja loja
Há quatro níveis de garagens, que totalizam 292 vagas
140 m² 125 m² 115 m²
de estacionamento; no térreo, elas ocupam a área do
terreno restante das áreas das lojas e dos acessos sociais.
Sobre esta mesma projeção, há um pavimento destinado
exclusivamente às garagens. O edifício ainda conta com
dois subsolos, cujas plantas são praticamente idênticas;
r. nestor pestana ambos ocupam a totalidade do lote.
Esquema de distribuição do pavimento térreo
circulação horizontal
circulação vertical
Circulação Vertical
lojas

A circulação vertical do edifício Guaporé possui duas


situações distintas; o embasamento possui um elevador
independente, assim como escadas, que possuem uma
largura de 2,50m; estas dimensões generosas devem-se
ao fato delas servirem às sobrelojas, que abrigam o CREA-
SP, e portanto, possuem um intenso fluxo de pessoas. Nos
blocos residenciais, a circulação vertical situa-se entre o
bloco frontal e o posterior; há três elevadores dispostos
lado-a-lado e escadas lineares, sem patamar intermediário,
porém, diferentemente dos demais edifícios estudados, os
elevadores e escadas não estão agrupados em um único
Acesso ao hall de elevadores no térreo
nicho; a caixa de elevadores situa-se próxima à extremidade
Foto: Edson Lucchini Jr. esquerda da planta, para quem da rua vê o edifício de
frente, e as escadas localizam-se na extremidade oposta.

Pavimento tipo e unidades

O pavimento tipo do edifício Guaporé apresenta-


se disposto espacialmente do seguinte modo: a circulação
horizontal, feita através de corredores, circunda o vazio
existente entre os dois blocos, distribuindo os fluxos para os
apartamentos. Os corredores são iluminados e ventilados
naturalmente por cobogós retangulares de concreto;
esta solução se faz necessária pelo fato das aberturas das
Escadas de acesso às sobrelojas
cozinhas e banheiros das unidades estarem voltadas para
Foto: Edson Lucchini Jr. o corredor.
206
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

No 1º pavimento de apartamentos, situado logo


acima do embasamento do edifício, é possível acessar o
vazio central entre os blocos. Neste espaço, hoje utilizado
44 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 44 m²
como uma espécie de praça comum do edifício, quando se
olha para cima, pode-se observar os fechamentos com os
cobogós de concreto dos corredores de todos os pavimentos
superiores. Ao analisar o projeto original, acredita-se que
este espaço não tenha sido pensado para ser uma área de
pátio interno lazer do edifício, pois nele encontrava-se o depósito de
lixo, cujo espaço hoje é ocupado pelo escritório do síndico;
era comum em edifícios contemporâneos ao Guaporé a
presença de dutos de lixo, por onde os sacos eram jogados
71 m² 35 m² 62 m² 62 m² 105 m² de cada pavimento, caindo em um depósito térreo.

Há várias distribuições distintas das unidades ao


longo dos pavimentos do Guaporé; o bloco posterior,
terraços voltado para o fundo do lote e orientado a leste, possui
descob.
sempre a mesma distribuição de unidades do tipo
kitchenette em todos os pavimentos, com duas unidades
r. nestor pestana
de 44m² nas extremidades da planta e oito unidades de
Esquema de distribuição do 1º pavimento
35m² na porção central. Já no bloco frontal, voltado para
circulação horizontal a rua Nestor Pestana e orientado a oeste, as unidades
circulação vertical
variam nas dimensões e nos arranjos espaciais de acordo
unidades
com o pavimento. O fato do primeiro andar estar logo
acima do embasamento permitiu que os apartamentos
tivessem terraços descobertos de 5,50m de comprimento,
que corresponde ao recuo da torre de apartamentos em
relação ao alinhamento com a via. As cinco unidades do
primeiro pavimento no bloco frontal possuem quatro
arranjos espaciais e dimensões distintas; na extremidade
direita da planta do primeiro pavimento, para quem da
rua vê o edifício de frente, há um apartamento de 105m²,
o maior de todo o edifício, além de ser o único a possuir
dois dormitórios e área de serviço com dormitório de
empregada. Ao acessá-lo, depara-se com um corredor que
distribui os fluxos para a área de serviço, cozinha e para
as áreas sociais. Um único espaço de geometria retangular
e 25m² de área abriga a sala de estar e de jantar, que,
assim como os dois dormitórios, abrem-se para o terraço
descoberto de 53m².

Planta da unidade de 105m² do 1º andar


207
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Na extremidade esqueda da planta do pavimento


tipo, situa-se o segundo maior apartamento de todo o
edifício com 71m² de área, contando com um dormitório;
esta unidade também possui a sala de estar e o dormitório
voltados para o terraço descoberto. Na porção central
da planta do bloco frontal do primeiro pavimento ainda
encontram-se duas unidades de 62m² e um dormitório,
cujo arranjo espacial se repetirá nos andares superiores. Há
também uma kitchenette de 44m²; ambos possuem abertura
para o terraço descoberto sobre o embasamento.

Planta da unidade de 71m²


do 1º andar

Vazio central do Edifício Guaporé - cobogós de concreto dos corredores


Foto: Edson Lucchini Jr.

Planta da unidade de 62m² “Praça” do 1º pavimento Cobogós de iluminação e ventilação


do 1º andar Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.
208
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Do 2º ao 8º pavimento, a distribuição das unidades


ao longo dos andares é a mesma; o bloco frontal conta com
duas kitchenettes de 44m² nas extremidades da planta e
44 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 44 m²
quatro apartamentos de 62m² e um dormitório, na porção
central. As kitchenettes das extremidades do pavimento
possuem um arranjo espacial muito semelhante ao das
menores, de 35m², porém, contam com uma cozinha maior
e disposta de maneira diferente. As kitchenettes menores
possuem a distribuição espacial e conceitos iguais aos dos
edifícios Araraúnas e Icaraí, projetados também por Heep
e já estudados anteriormente. Os quatro apartamentos de
62m² contam com um corredor de entrada de 3,45m de
comprimento, que separa o banheiro da cozinha, além de
44 m² 62 m² 62 m² 62 m² 62 m² 44 m²
conduzir ao dormitório e à sala, ambos com saídas para os
terraços cobertos, que do 2º ao 8º pavimentos possuem
3,00m de comprimento por 1,50m de largura.
r. nestor pestana

Esquema de distribuição do pavimento tipo, do 2º ao 8º andar

circulação horizontal
circulação vertical
unidades

Planta das kitchenettes de 44m² Planta das kitchenettes de 35m² Planta das unidades de 62m²
do 1º ao 10ª pavimento do 1º ao 10ª pavimento do 2º ao 8ª pavimento
209
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O 9º pavimento possui, no bloco frontal, uma


distribuição diferente das unidades devido ao fato de ser
o primeiro pavimento a sofrer o recuo obrigatório; não há
44 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 44 m² mais kitchenettes, existindo apenas apartamentos de um
dormitório, sendo que os dois das extremidades possuem
66m² e os três do centro possuem 52m², totalizando cinco
unidades. Não há relevantes variações no arranjo espacial
destes apartamentos com relação aos demais, também de
um dormitório, descritos anteriormente.

O 10º pavimento sofre o segundo recuo obrigatório,


causando uma diminuição do pavimento no sentido
66 m² 52 m² 52 m² 52 m² 66 m²
longitudinal; isto fez que se diminuíssem de cinco para
quatro o número de unidades, agora, menores que as dos
pavimentos inferiores no sentido longitudinal, mas maiores
r. nestor pestana no sentido transversal. As duas unidades das extremidades
Esquema de distribuição do 9º pavimento
são idênticas e espelhadas, contando com 70m² de área
circulação horizontal cada. As duas do centro também são iguais, espelham-se,
circulação vertical e possuem 62m² cada; o arranjo espacial destas é único
unidades
em todo o edifício. Elas contam com um hall de entrada
de 3,50m², que também funciona como distribuidor de
fluxos para todos os ambientes do apartamento, que
são: sala de estar, dormitório, cozinha e banheiro. Há um
44 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 35 m² 44 m²
terraço descoberto de 8,00m de comprimento por 1,85m
de largura que é acessado pela sala e pelo dormitório. Os
dois apartamentos das extremidades contam com 70m²
de área e uma distribuição espacial onde não há hall de
entrada; se adentra ao apartamento pela sala de jantar, que
está contida no mesmo espaço retangular de 18,00m² que
também abriga a sala de estar. Um corredor de 3,15m de
comprimento distribui os fluxos para a cozinha, dormitório
70 m² 62 m² 62 m² 70 m² e banheiro.

r. nestor pestana

Esquema de distribuição do 10º pavimento

circulação horizontal
circulação vertical
unidades

Planta das unidades Planta das unidades


de 62m² do 10ª pavi- de 70m² do 10ª pavi-
mento mento
210
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Estrutura

Do 1º ao 9º andar, o ritmo de
distribuilção estrutural do edifício
Guaporé é o mesmo; nos apartamentos
das extremidades o vão é de 3,90m,
e nos demais, o vão é de 3,00m, que
define a largura das kitchenettes no
bloco posterior, e a largura dos quartos
e salas no bloco frontal. Apenas no
10º pavimento, o que sofre o segundo
recuo obrigatório, a necessidade
de um novo arranjo espacial dos
apartamentos obrigou uma mudança
neste ritmo, apenas no bloco frontal,
como mostram os esquemas ao lado.

Esquema estrutural do 1º ao 9º pav. Entre o primeiro pavimento e


o embasamento existe uma transição
estrutural que reduz o número de
vãos de dez para cinco no sentido
transversal. No sentido longitudunal,
os vãos permanecem os mesmos. As
necessidades espaciais que os usos
presentes nas sobrelojas e no térreo
possuem são obviamente diferentes
dos usos residenciais, portanto, a
transição se fez necessária para que as
lojas do térreo e as sobrelojas fossem
menos compartimentadas. O mesmo
ritmo estrutural presente no térreo
e sobrelojas, também é aplicado aos
subsolos.

Esquema estrutural do 10º pav.


211
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Perspectiva do Guaporé - vista da rua Nestor Pestana


212
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Fachadas

O edifício Guaporé, por não possuir recuos laterais,


possui duas faces passíveis de tratamento arquitetônico;
a frontal, orientada a oeste e voltada para a rua Nestor
Pestana, e a posterior, orientada a leste e voltada para
os fundos do terreno. A fachada principal possui cinco
momentos distintos, que são um reflexo das conformações
das plantas, adotadas para os diferentes usos do edifício.No
térreo, a face que compreende as portas de acesso às lojas,
garagens e portaria, está recuada 1,70m do alinhamento;
como os dois andares superiores de sobrelojas faceiam o
alinhamento, criou-se um passeio coberto no térreo junto
às vitrines das lojas, protegendo-as de intempéries.

O segundo momento a ser destacado na fachada


é o corpo de cobogós de concreto que, permeado por
aberturas quadradas, possui 33,00m de comprimento
por 11,20m de altura, correspondendo aos dois andares
de sobrelojas. Este pano de cobogós, que marca o
Lojas do térreo e embasamento do Guaporé
Foto: Edson Lucchini Jr.
embasamento do edifício, se sobressai na paisagem da rua
213
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Nestor Pestana, tornando-se um elemento marcante, cuja


imponência condiz com o uso institucional das sobrelojas,
ocupadas pelo CREA-SP. Além disso, o embasamento
confere uma forte identidade visual ao Guaporé e marca a
transição vertical dos pavimentos de uso público para os de
uso privado. Este elemento possui claras ressonâncias de
obras cariocas como o Parque Guinle de Lúcio Costa e do
Residencial Pedregulho, de Affonso Eduardo Reidy. Estas
soluções também aparecem em outros edifícios de Heep
em São Paulo, como no Ouro Preto, da avenida São Luiz e
no Buriti, da rua Maria Antonia.

O terceiro momento da fachada corresponde ao


Parque Guinle - Lucio Costa - Rio de Janeiro - 1948-54 1º pavimento de apartamentos, situado logo acima do
Foto: Nelson Kon; Fonte: http://www2.nelsonkon.com.br - acesso em dez. 2009
embasamento do edifício; isto fez com que os apartamentos
deste pavimento pudessem ter grandes terraços, que
ocupam o recuo que há entre a torre e o alinhamento. Desta
forma, os apartamentos do 1º pavimento não contam com
os terraços de 1,50m de largura, presentes nas demais
unidades superiores, acarretando num desenho de fachada
diferente, somente para este andar. As perspectivas da
página seguinte ilustram as situações descritas.

Res. Pedregulho - Affonso Eduardo Reidy - Rio de Janeiro - 1947-1950


Fonte: http://www.educatorium.com
acesso em dez. 2009

Edifício Buriti - Adolf Franz Heep - 1956 Edifício Ouro Preto - Adolf Franz Heep - 1954
Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.
214
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.
215
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O quarto, e predominante, momento da fachada é


o que corresponde aos apartamentos do 2º ao 8º andares;
aqui Heep adota mais uma vez a idéia da grelha que abriga
os terraços, mesma solução já utilizada em outros edifícios
estudados anteriormente, como o Icaraí e o Araraúnas, além
de outros como o Marajó (Rua Santo Amaro) e o Jequitibá,
em Santos. Ao analisar estes edifícios, nota-se que todos
eles possuem orientação oeste ou leste, o que reforça o
indício de que os terraços, na obra de Heep, funcionam
como uma espécie de brise, que protege os caixilhos de salas
e quartos da exposição direta ao sol. No caso do Guaporé,
orientado a oeste e leste, além da adoção desta grelha
de terraços como proteção solar, Heep também cria um
brise feito com os mesmos cobogós de concreto presentes
no embasamento do edifício, que, além de impedirem a
penetração excessiva dos raios solares, conferem unidade
à fachada do edifício. Os mesmos cobogós ainda compõe
os guarda-corpos dos terraços. O desenho abaixo mostra
como é feita a organização da fachada do 2º ao 8º
pavimentos, destacando-se a grelha que abriga os terraços,
composta pelos cobogós que funcionam como brises e
guarda-corpos. Hoje, o fechamento dos terraços com
caixilhos de diferentes modelos, fez com que a fachada
perdesse a sua unidade visual e a contenção dos intensos
raios solares presentes na face oeste.
Fachada do edifício Guaporé atualmente.
Foto: Edson Lucchini Jr.
216
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O quinto e último momento a ser analisado na


fachada são os recuos sucessivos do 9º e 10º andares,
que caracterizam um coroamento, mais compulsório que
intencional. Afim de tentar manter a unidade com as
demais partes da fachada, Heep utiliza os mesmos guarda-
corpos de cobogós presentes nos andares inferiores,
porém, nestes andares não foi possível que se colocassem
os brises, já que a legislação impedia que esses terraços
fossem cobertos, deixando os caixilhos das salas e quartos
diretamente expostos ao sol. Hoje, o fechamento dos
terraços do 9º e 10º andares está presente em quase todas
as unidades, conferindo um aspecto negativo ao edifício, já
que os materiais utilizados são de baixa qualidade e variam
muito, eliminando a unidade original. A fachada do bloco
posterior é, do 1º ao 10º andares, uniforme, seguindo as
mesmas características presentes do 2º ao 8º pavimentos
no bloco frontal.

Situação Atual
Fachada do edifício Guaporé atualmente.
Foto: Edson Lucchini Jr.
O edifício Guaporé se encontra hoje num estado
satisfatório de conservação em suas áreas sociais, porém
a fachada necessita de reparos. Como ocorre na grande
maioria dos edifícios da cidade, os terraços vem sendo
fechados com caixilhos variados, empobrecendo a
volumetria e a unidade da fachada.
217
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

planta do pav. térreo


1 - portaria
2 - elevador de acesso às
sobrelojas
3 - hall de elevadores
sociais
4 - banheiros
5 - lojas
6 - grelhas de ventilação
dos subsolos
218
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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planta dos subsolos 1º e 2º


1 - molas dos elevadores
2 - medidores
3 - vazio de ventilação
4 - banheiros
219
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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1 2

3 1 4 5

planta do 1º pav.
esc. 1:250

1 2 3 4 5
kitchenette - 44 m² kitchenette - 35 m² apto. 1 dorm. - 71 m² apto. 1 dorm. - 62 m² apto. 2 dorm. - 105 m²
1 - cozinha 1 - cozinha 1 - hall de entrada 1 - cozinha 1 - cozinha
2 - banheiro 2 - banheiro 2 - cozinha 2 - banheiro 2 - banheiro
3 - sala-living 3 - sala-living 3 - banheiro 3 - sala de jantar 3 - sala de jantar
4 - terraço 4 - terraço 4 - sala de jantar 4 - sala de estar 4 - sala de estar
5 - sala de estar 5 - dormitório 5 - dorm. solteiro
6 - dormitório 6 - terraço descoberto 6 - dorm. casal
7 - terraço descoberto 7 - dorm. empregada
8 - banho empregada
9 - serviço
220
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1 2

1 3
planta do pav. tipo
2º ao 8º
esc. 1:250

1 2 3
kitchenette - 44 m² kitchenette - 35 m² apto. 1 dorm. - 62 m²
1 - cozinha 1 - cozinha 1 - cozinha
2 - banheiro 2 - banheiro 2 - banheiro
3 - sala-living 3 - sala-living 3 - sala de jantar
4 - terraço 4 - terraço 4 - sala de estar
5 - dormitório
6 - terraço
221
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1 2

3 4
planta do 9º pav.
esc. 1:250

1 2 3 4
kitchenette - 44 m² kitchenette - 35 m² apto. 1 dorm. - 66 m² apto. 1 dorm. - 52 m²
1 - cozinha 1 - cozinha 1 - cozinha 1 - cozinha
2 - banheiro 2 - banheiro 2 - banheiro 2 - banheiro
3 - sala-living 3 - sala-living 3 - sala de jantar 3 - sala de jantar
4 - terraço 4 - terraço 4 - sala de estar 4 - sala de estar
5 - dormitório 5 - dormitório
6 - terraço descoberto 6 - terraço descoberto
222
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

1 2

3 4
planta do 10º pav.
esc. 1:250

1 2 3 4
kitchenette - 44 m² kitchenette - 35 m² apto. 1 dorm. - 70 m² apto. 1 dorm. - 62 m²
1 - cozinha 1 - cozinha 1 - cozinha 1 - hall de entrada
2 - banheiro 2 - banheiro 2 - banheiro 2 - cozinha
3 - sala-living 3 - sala-living 3 - sala de jantar 3 - banheiro
4 - terraço 4 - terraço 4 - sala de estar 4 - sala de estar
5 - dormitório 5 - dormitório
6 - terraço descoberto 6 - terraço descoberto
223
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corte AA
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fachada r. nestor pestana


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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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detalhe de fachada - térreo


Lojas, acesso social e acesso às garagens
cobertos por projeção das sobrejojas,
conferindo um passeio protegido de
intempéries

detalhe de fachada - embasamento


Cobogós em concreto, permeados
por aberturas quadradas, marcam
o embasamento do Guaporé, com
ressonâncias de Lúcio Costa e Affonso
Eduardo Reidy.

detalhe de fachada - 2º ao 8º pavs.


Uso dos mesmos cobogós do embasamento,
conferindo unidade à fachada. Brises e
guarda-corpos compondo as unidades da
grelha que abriga os terraços
226
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Foto: acervo pessoal de Aizik Helcer


6.10 Edifícios Lugano e Locarno 1958-62
endereço e localização
Av. Higienópolis 324, 360 - Higienópolis

ca
éli
ng

r. marim francisco
.a
av.

av
higie

po
lis

i
lomo
tac
r. i
construção
Construtora Auxiliar S.A.
(Engº resp. Elias e Aizik Helcer)
terreno
Retangular - 3484,37 m²
unidades
Térreo:
1 ap. zelador de 51m², 2 ap. de 170m²,
1 ap. de 141m²
1º ao 12º pav.:
2 ap. de 181m², 2 ap. de 188m²
13º pav.:
2 ap. de 155m², 2 ap. de 175m²
Total: 56 un. x 2 torres = 112 unidades
publicações
Acrópole 287, 1962, p. 347 a 349

c o e f. d e a p ro ve i ta m e nto
7.2 - Área total = 25.224m²

taxa de ocupação
46 %
conservação
Ótima

Perspectiva original dos Edifícios Lugano e Locarno desenhada por Franz Heep. descaracterização
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer. Baixa
227
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Os edifícios Lugano e Locarno são mais um exemplo


da intensa verticalização que mudou o conceito de morar
das classes mais abastadas; os palacetes davam lugar aos
edifícios verticais no bairro de Higienópolis nos anos 1950,
como já estudado no caso do edifício Lausanne (p.113).
A foto ao lado, tirada em 1959 durante a construção dos
edifícios Lugano e Locarno, retrata precisamente o contexto
da época; a verticalização intensa avançando sobre os
palacetes.

O projeto dos edifícios Lugano e Locarno foi o último


da parceria entre Franz Heep e a Construtora Auxiliar, da
Rua Augusta nos anos 1960 família Helcer, que já havia produzido anteriormente o
Fonte: http://centrosp.prefeitura.sp.gov.br/projetos/augusta.php edifício Miri51, o Lucerna (p.160) e o Lausanne. Porém,
no Lugano e Locarno, pela primeira vez Heep assinou um
Av. Higienópolis - Construção dos edifícios Lugano e Locarno em 1959
Foto: Acervo pessoal de Aizik Helcer projeto de edifício vertical desde a sua chegada ao Brasil,
já que conseguira finalmente um número de CREA.

Vista da rua Itacolomi em 1959 - ao fundo o terreno já com a placa da obra. Carimbo do projeto de prefeitura com a assinatura de Adolf Franz Heep.
Foto: Acervo pessoal de Aizik Helcer Foto: Acervo pessoal de Aizik Helcer

(51) - O edifício Miri situa-se na praça Júlio Prestes, bem próximo à estação de mesmo nome. Algumas imagens e informações básicas sobre este edifício podem ser vistas na tabela da
página 250
228
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Terreno, implantação, volumetria e entorno

O terreno de geometria retangular onde situam-


se os edifícios Lugano e Lucarno, possui 50,00m de
frente que acompanham o alinhamento com a avenida
Higienópolis, por 70,45m de fundo, totalizando 3484,37m²
de área; o perfil natural do lote possui uma declividade
de aproximadamente 2,00m no sentido longitudinal,
da avenida Higienópolis para os fundos. A implantação
é configurada por dois blocos laminares, idênticos e
bloco B bloco B espelhados, dispostos longitudinalmente ao terreno e
separados por um espaço vazio de 18,00m, que pode ser
entendido como uma rua interna; o eixo longitudinal de
torre torre
simetria do terreno praticamente coincide com o eixo da
lugano
locarno
rua
calha da rua Itacolomi52. Desta forma, pode-se dizer que
interna de a rua interna criada pela disposição dos blocos, é uma
pedestres
e jardins
continuidade da rua Itacolomi para dentro do lote, de
modo a criar uma interessante relação do público com o
privado, perdida nos dias de hoje graças à colocação de
grades, que impedem que a cidade permeie o lote, além
bloco A bloco A de barrar visual e fisicamente a continuidade da Itacolomi
para o interior do terreno.

Deve-se considerar que a definição do partido


arquitetônico, que gerou a implantação descrita, atribuiu
uma inserção urbana mais rica aos edifícios, porém, a
av. higienópolis
orientação solar das lâminas, resultante deste partido,
trouxe uma situação a qual um bloco sombreia o outro
durante os períodos da manhã e da tarde, como mostra
o esquema abaixo; nestes períodos do dia, a rua interna
r. itacolomi

presente no espaço entre os blocos, recebe muito pouca


luz solar. Na maioria dos edifícios de Heep estudados, a
orientação solar sempre teve um papel fundamental
nas decisões projetuais, porém, neste caso, os atributos
urbanos do lote se impuseram sobre a insolação na
definição do partido arquitetônico.

N
N
O
O L
L
S
S
manhã tarde

(52) - A rua Itacolomi, situada no bairro de Higienópolis, está disposta perpendicularmente à avenida Higienópolis.
229
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Os dois blocos laminares, idênticos e espelhados,


contam com 61,50m de comprimento por 13,00m de
largura e 43,45m de altura; a parte inferior do volume,
que corresponde ao térreo, conta com 3,60m de altura
e possui pilotis na porção frontal da planta, próxima ao
alinhamento com a avenida Higienópolis. As demais partes
do térreo não possuem pilotis, pois são ocupadas por
apartamentos. O corpo principal do volume, que vai do
1º ao 12º pavimento, possui 36,40m de altura e projeta-
se 1,20m em balanço, no sentido transversal da lâmina,
sobre o térreo, na face voltada para a rua interna. O 13º
pavimento recua-se em relação aos inferiores em 1,15 no
sentido longitudinal e em 0,80m no sentido transversal. Os
blocos recuam-se 5,75m da divisa frontal do lote, 3,00m
das divisas de fundo e laterais; além disso, os dois blocos
separam-se em 18,00m, configurando a rua interna de
pedestres.

O entorno do Lugano e Locarno é composto


por edifícios de gabarito semelhante, sem grandes
variações, porém, no bairro de Higienópolis, apesar da
intensa verticalização, os edifícios são espaçados entre
si, e geralmente não possuem empenas cegas, podendo
contar com aberturas em todas as faces, o que favorece
a insolação e a ventilação; esta situação é oposta ao que
Edifícios Lugano e Locarno - Rua interna
Foto: Edson Lucchini Jr. ocorre na grande parte dos exemplares estudados no
centro da cidade, onde é comum a presença de edifícios
sem recuos laterais, de modo que em muitos casos, a
ventilação e iluminação de ambientes de estar e repouso
acabam se voltando para vazios internos.
230
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Térreo e subsolo

141 m² 141 m²
No térreo dos edifícios Lugano e Locarno, a
rua interna de pedestres situada na porção central do
terreno distribui os fluxos para os acessos aos blocos de
moradia, cobertos por marquises que conduzem aos halls
sociais; estes são compostos por uma escada disposta
diagonalmente, que induz o fluxo aos elevadores. A parte
frontal das lâminas conta com pilotis que suspendem os
170 m² 170 m²
volumes principais, e marcam o acesso ao conjunto. O nível
rua
dos acessos aos blocos residenciais, encontra-se 0,50m
interna de acima do nível da avenida Higienópolis; esta elevação do
pedestres térreo, somada à declividade natural do terreno, ajudou
e jardins
a minimizar escavações para a execução do subsolo. A
diferença de nível é vencida por uma rampa que se situa na
170 m² 170 m² porção central da planta e se alinha com a rua interna. Cada
lâmina conta com quatro apartamentos térreos, sendo um
para o zelador na porção frontal, próximo aos pilotis, e
mais três que ocupam o restante da planta térrea. Como já
mencionado anteriormente, a rua interna presente entre
os blocos pode ser entendida como uma continuidade da
ap. ap.
zel. zel. rua Itacolomi, e a ausência de grades nos primeiros anos
51m² 51m² de existência dos edifícios, possibilitava uma continuidade
do espaço público para dentro do lote. O térreo conta com
canteiros que acompanham a rua interna de pedestres,
resultando numa grande área verde passível de tratamento
paisagístico.
av. higienópolis
Esquema de distribuição do pavimento térreo
Há um nível de subsolo destinado às garagens que
circulação horizontal - hall social
ocupa praticamente toda a projeção do lote, com exceção
circulação vertical
apartamentos térreos
dos recuos laterais e frontal; sua cota é de 3,25m abaixo
do nível térreo. Os veículos o acessam por duas rampas
lineares, espelhadas entre si e separadas pela rua interna.
As quatro caixas de elevadores e escadas chegam a este nível
de garagens, que tem capacidade para aproximadamente
80 vagas, número inferior ao de apartamentos, que é de
112.

Circulação Vertical

Os edifícios Lugano e Locarno possuem dois blocos


cada, com uma caixa de circulação vertical interna para
cada um deles, totalizando quatro. Os nichos de circulação
vertical são compostos cada um por dois elevadores e uma
escada semi-circular sem patamar intemediário; apenas na
transição do primeiro pavimento para o térreo, a escada
Edifícios Lugano e Locarno em 1959 muda para uma conformação linear, disposta de modo
Fotos: Acervo pessoal de Aizik Helcer diagonal.
231
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Pavimento tipo e unidades

Os edifícios Lugano e Locarno apresentam, do 1º


181m² 181m² ao 12º andar, o mesmo arranjo espacial do pavimento
tipo; são quatro apartamentos por andar para cada
lâmina, agrupados em dois pares espelhados entre si e
separados por uma junta de dilatação; cada par possui um
hall comum, onde se acessa o nicho de circulação vertical.
O 13º andar possui exatamente a mesma conformação; o
188 m² 188 m²
recuo escalonado apenas diminui a área das unidades, sem
causar mudanças em sua distribuição espacial. Edifícios
de conformação laminar que possuem muitas unidades
de pequenas dimensões por pavimento, necessitam de
longos corredores para que elas sejam acessadas; neste
188 m² 188 m²
caso, como as unidades são de dimensões generosas, não
houve a necessidade da adoção de corredores, e sim um
hall que distribui fluxos para apenas duas unidades.

O pavimento tipo conta com duas unidades de


181m² 181m² 181m², situadas em ambas as extremidades da lâmina, e
duas de 188m², na porção central. Os arranjos espaciais de
ambas são semelhantes. O apartamento de 181m² conta
Esquema de distribuição do pavimento tipo do 1º ao 12º andar
com um acesso de serviço e um social, que se abrem para
o hall comum do andar. Ao se adentrar à unidade pelo
circulação horizontal
acesso social, o primeiro ambiente é um hall de entrada
circulação vertical
unidades
de 4,50m², de onde se acessa a cozinha, à direita de quem
entra, e as salas de estar e jantar à esquerda. No projeto do
edifício Lausanne, Heep concebeu plantas onde era possível
acessar os diferentes setores do apartamento de maneira
independente, de modo que um hall de entrada distribuia
os fluxos para cada setor (social, íntimo e de serviços) sem
interferência, ou seja, não era preciso passar por um setor
para chegar em outro. Neste caso em análise, esta situação
não foi possível, talvez devido à conformação mais laminar
do edifício, que obrigou os ambientes a serem distribuídos
de modo mais vagonar. Porém, Heep manteve alguns
princípios que se notam em plantas de outros edifícios,
como por exemplo, o de se concentrar as áreas molhadas
numa única porção da planta. As salas de jantar e estar
ocupam o mesmo espaço retangular de 44,50m², cujas
aberturas voltam-se para a rua interna, com orientação
oeste na torre Lugano e leste na torre Locarno. Sob a
mesma orientação, situam-se um dormitório de solteiro de
17,50m² e um de casal, com 20m² e closet. Há um terceiro
dormitório, de 16,50m², que é o único ambiente de estar
ou repouso que não se abre para a rua interna, e sim para
a av. Higienópolis, no caso das unidades da extremidade
Planta das unidades de 181m²
sul, e para os fundos do lote, no caso das unidades da
extremidade norte.
232
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

No corredor íntimo, se acessa à esquerda os


dormitórios e à direita os banheiros. Mais uma vez Heep
não utiliza o conceito de suíte, colocando o banheiro do
casal e o social abertos para o corredor. A cozinha é um
espaço retangular de 15m² que pode ser dividida, de
modo a se criar uma copa. A área de serviço, que conta
com dormitório e banheiro de empregada, é acessada
pela cozinha e abre-se para a face leste da lâmina na torre
Lugano e a oeste na torre Locarno.

A unidade de 188m², ao contrário das de 181m²,


possui aberturas apenas para as orientações leste e oeste;
Heep dispôs os domitórios em sequência, todos voltados
para a rua interna, assim como a sala de estar. Na resolução
da planta da unidade de 188m², a sala de jantar continua
se situando num espaço contíguo à sala de estar, porém,
voltada para a face oposta à da rua interna. Esta solução
resultou numa situação onde a entrada de serviço do
apartamento não acessa a cozinha, e sim, a sala de jantar.

O 13º pavimento sofre o recuo obrigatório; a face


Planta das unidades de 188m² voltada para a rua interna recua-se 0,80m e a voltada
para a av. Higienópolis, 1,15m. Esta situação não causou
mudanças na distribuição do pavimento ou no arranjo
interno das unidades, que apenas perderam área, passando
de 181m² e 188m² para 155m² e 175m².

No térreo há quatro apartamentos por lâmina,


sendo que um, de 51m², situado próximo ao alinhamento
com a avenida Higienópolis, destina-se ao zelador. As duas
unidades espelhadas, na porção central da lâmina, contam
com 170m² cada e possuem arranjo espacial idêntico ao
das unidades dos pavimentos superiores que situam-se
na mesma porção da planta. A unidade da extremidade
norte na lâmina, é a menor de todo o edifício, com
141m², e possui um arranjo espacial um pouco diferente
das demais. A escada em diagonal que liga o térreo ao
primeiro pavimento trouxe uma conformação espacial
trapezoidal à cozinha. As salas de estar e jantar se situam
no mesmo espaço retangular de 33,00m², e se voltam
para a rua interna. O dormitório de casal ladeia a sala
de jantar e também se abre para a rua interna; o outro
dormitório, de solteiro, abre-se para os fundos do lote.
Neste caso, ao contrário das demais unidades, há somente
um banheiro que atende aos dormitórios, porém, ele pode
ser considerado grande, com uma área de 11m²; o fato
dele ser o único banheiro fez com que suas funções fossem
Planta das unidades térreas de 141m²
compartimentadas, afim de possibilitar o uso simultâneo
delas, com relativa privacidade.
233
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Edifícios Lugano e Locarno em 1959


Fotos: Acervo pessoal de Aizik Helcer
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Perspectiva dos edifícios Lugano e Locarno


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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Fachadas

Os edifícios Lugano e Locarno, por terem sido


implantados com recuos frontais e laterais, contam com
todas as faces de seus volumes passíveis de tratamento
arquitetônico. A fachada principal possui três momentos
distintos que caracterizam um embasamento, um corpo
principal e um coroamento. O embasamento, que
corresponde ao térreo, alterna cheios e vazios; os cheios
correspondem às fachadas dos apartamentos térreos,
caracterizadas por aberturas centralizadas em superfícies
de blocos de vidro, que dispensam as alvenarias; estas
superfícies, que separam os apartamentos térreos dos
jardins, recuam-se em 1,20m em relação ao alinhamento dos
andares superiores, configurando um balanço, que ajuda a
destacar mais ainda o térreo do corpo principal. Os vazios
se dão graças aos pilotis presentes nas extremidades das
lâminas próximas ao alinhamento com a av. Higienópolis,
Apartamentos térreos dos edifícios Lugano e Locarno em 1959
Foto: Acervo pessoal de Aizik Helcer
que conferem leveza ao volume e permeiam o térreo.
236
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Os pilotis possuem forma trapezoidal, cujas bases


menores são os apoios; eles só aparecem no trecho térreo
mais próximo à avenida Higienópolis, de modo a estabelecer
a moderna relação entre térreo, pilotis e cidade.

Outros elementos de destaque no térreo são as


marquises que protegem os acessos sociais dos edifícios.
As duas que marcam as entradas dos blocos mais
próximos à avenida Higienópolis são lajes sustentadas
por uma viga invertida que se apoia em um único pilar
Marquises frontais
do térreo central. A extremidade mais próxima à entrada do edifício
Foto: Acervo pessoal é sustentada por dois tirantes, presos à laje nervurada
de Aizik Helcer
que separa o térreo do primeiro pavimento; o resultado
estético foi uma peça leve, que marca elegantemente o
acesso ao edifício. Porém, as duas marquises que marcam
as entradas dos blocos mais próximos aos fundos não são
as mesmas utilizadas para os blocos frontais; são estruturas
menos arrojadas, com quatro apoios convencionais e
uma linguagem bem diferente das outras duas frontais,
como mostram as fotos ao lado. Talvez, a opção por uma
solução mais simples tenha sido pelo fato das marquises
dos fundos não serem percebidas facilmente por quem
Marquises dos fundos
trafega na avenida Higienópolis, mas sem dúvida, este
do térreo fator prejudicou levemente a unidade do térreo, porém,
Foto: Acervo pessoal
de Aizik Helcer
sem comprometê-la.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O corpo principal da fachada, que corresponde a 12


pavimentos, é marcado pelas janelas em fita; a fachada é
livre, ou seja, o fato da estrutura estar recuada possibilitou
liberdade ao arquiteto na concepção dela, porém, Heep não
optou por caixilhos piso-teto como fez no edifício Lausanne,
mas sim, janelas em fita com peitoris de alvenaria de 80cm
de altura e uma faixa de 50cm de cobogós quadrados
acima delas, que ajudam na ventilação. As janelas em fita
e a faixa de cobogós são elementos que atribuem uma
forte sensação de horizontalidade ao conjunto. A decisão
por uma rua interna que separa os dois blocos permitiu, ao
observador que adentra ao conjunto, uma percepção do
todo; além disso, as linhas horizontais das janelas em fita e
das faixas de cobogós, conduzem o olhar da frente para o
fundo do lote, onde pode-se dizer que se encontra o ponto
de fuga das linhas horizontais das lâminas, reforçando mais
ainda a percepção do conjunto, como ilustra a perspectiva
abaixo.

Os caixilhos são de alumínio e, ao contrário do
edifício Lausanne, não foram pintados, permanecendo
na cor original do metal, porém, sem brilho; na fachada
dos edifícios Lugano e Locarno a opção cromática foi por
sobretons de cinza. As aberturas dos dormitórios possuem
Fachada dos edifícios Lugano e Locarno em 1959
venezeianas de correr, e as salas, apenas esquadrias de
Foto: Acervo pessoal de Aizik Helcer alumínio e vidro. .
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Outro elemento de
destaque na fachada são
as floreiras; elas são peças
de concreto, cuja elevação
assemelha-se a um “H” e situam-
se sob os peitoris das janelas dos
dormitórios das extremidades
norte e sul das lâminas. Logo após
o projeto do Lugano e Locarno,
Heep desenvolveu o edifício
Arlinda, no largo do Arouche, cuja
tipologia de fachada é semelhante;
neste projeto, Heep produz uma
variação do desenho da floreira,
como mostra a foto ao lado. No
projeto do Arlinda, o arquiteto
se apropria do mesmo tipo de
composição entre o caixilho, a
floreira e o elemento vazado,
Composição caixilho - floreira - cobogó na fachada dos edifícios Lugano e Locarno
porém, o resultado dá indícios
de um aprimoramento do desenho, já que as floreiras
ganham um desenho assimétrico e se dispõe sob todas
as janelas, conferindo um intenso movimento à fachada.
Tanto no projeto do Arlinda como no do Lugano e
Locarno, as floreiras conferem, além de movimento,
sombras e volumetria, visuais interessantes para quem
vê o edifício de baixo para cima.

Composição caixilho - floreira - cobogó no edifício Arlinda - 1959 Composição caixilho - floreira - cobogó no edifício Arlinda - 1959
Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.
240
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

O coroamento dos edifícios se dá no 13º pavimento composta também por aberturas em fita, interrompidas
que se recua dos demais inferiores em 80cm na face que por faixas verticais de alvenaria. As aberturas desta
se volta para a rua interna; o espaço resultante do recuo fachada correspondem aos ambientes de serviço dos
foi aproveitado como floreira. Na face que se volta para apartamentos
a avenida Higienópolis, o recuo foi de 1,15m, cujo espaço
resultante foi aproveitado para terraço. Heep utilizou o
mesmo tipo de caixilhos e de cobogós do restante da torre,
de modo a conferir unidade. Acima da faixa de cobogós de
ventilação dos apartamentos, encontra-se outra sem este
caráter funcional, servindo apenas de elemento estético
que marca o cume do edifício.

O fato da estrutura estar recuada da fachada,


possibilitou que as janelas em fita da fachada principal
a extrapolassem, girando 90º em direção à fachada da
avenida Higienópolis, soltando a quina, como ilustra o
desenho acima; a composição desta fachada de dá por
estas janelas descritas, por uma faixa vertical cega e pelas
aberturas de dormitórios com os mesmos cobogós de
ventilação sobre elas.
Fachada dos fundos dos
A fachada dos fundos das lâminas também foi edifícios Lugano e Locar-
no em 1959
concebida sob critérios de organização e ritmo, já que ela Foto: Acervo pessoal de
é percebida por quem trafega na avenida Higienópolis. É Aizik Helcer
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Situação Atual

Os edifícios Lugano e Locarno se encontram hoje


muito bem conservados e com suas características originais
satisfatoriamente bem preservadas, porém, nota-se que
em alguns apartamentos as floreiras estão sendo utilizadas
como suporte para condensadoras de ar condicionado e não
para receber plantas, gerando um aspecto desegradável.

A colocação de guaritas e grades na maior parte dos


edifícios, não só de Higienópolis como em toda a cidade,
vem sendo um dos principais fatores de descaracterização
deles, porém, no caso do Lugano e Locarno, este fator
empobreceu radicalmente o caráter de generosidade com
o espaço público que o projeto original contemplava. O
fechamento da rua interna por grades dimunuiu muito a
percepção de continuidade da rua Itacolomi para dentro
do lote, no aspecto físico e visual. Além disso, a escolha do
local de implantação de guaritas, sob os pilotis, prejudicou
sensivelmente a percepção original de vazio e de interface
com a cidade que havia neste espaço.

Edifícios Lugano e Locarno atualmente - grades e guaritas


Fotos: Edson Lucchini Jr.
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planta do pav. térreo

1
ap. zelador - 51 m²
1 - hall
2 - cozinha

3 3 - banheiro
4 - dorm. solteiro
5 - dorm. casal
6 - serviço

2
ap. 3 dorm. - 170 m²
1 - hall
2 - sala de jantar
3 - sala de estar
4 - cozinha
5 - dorm. solteiro
6 - dorm. casal
7 - banheiro casal
8 - banheiro social
9 - serviço
10 - dorm. empregada
11 - wc empregada

3
ap. 2 dorm. - 141 m²
2 1 - hall
2 - cozinha
3 - sala de estar
4 - sala de jantar
5 - dorm. casal
6 - dorm. solteiro
7 - banheiro
8 - serviço
9 - dorm. empregada
10 - wc empregada

1
243
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planta do subsolo
1 - hall de circ. vertical
2 - depósito de lixo
3 - caixas d’água
4 - medidores
5 - rampas
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1 1

planta do 1º ao 12 º
pav. planta do 13º pav.
esc. 1:250 esc. 1:250

1 1
ap. 3 dorm. - 181 m² ap. 3 dorm. - 155 m²
1 - hall 1 - hall
2 - cozinha 2 - cozinha
3 - sala de jantar 3 - sala de jantar
4 - sala de estar 4 - sala de estar
5 - dorms. solteiro 5 - dorms. solteiro
6 - dorm. casal 6 - dorm. casal
7 - banheiro casal 7 - banheiro casal
8 - banheiro social 8 - banheiro social
9 - serviço 9 - serviço
10 - dorm. empregada 10 - dorm. empregada
11 - wc empregada 11 - wc empregada

2 2
ap. 3 dorm. - 188 m² ap. 3 dorm. - 175 m²
1 - hall 1 - hall

2
2 - sala de jantar 2 - sala de jantar
3 - sala de estar 3 - sala de estar 2
4 - cozinha 4 - cozinha
5 - dorms. solteiro 5 - dorms. solteiro
6 - dorm. casal 6 - dorm. casal
7 - banheiro casal 7 - banheiro casal
8 - banheiro social 8 - banheiro social
9 - serviço 9 - serviço
10 - dorm. empregada 10 - dorm. empregada
11 - wc empregada 11 - wc empregada
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corte AA
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fachada rua interna


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fachada av. higienópolis


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térreo - rua interna


A implantação de duas lâminas residenciais
definiu uma rua interna, que pode ser
entendida como um prolongamento da
rua Itacolomi

detalhe do térreo - marquises


Marquises com um apoio central feito por
um pilar que sustenta uma viga invertida,
criam um percurso coberto de acesso aos
halls sociais.

detalhe do térreo - pilotis.


Os pilotis são trapezoidais, com a base
menor servindo de apoio. Eles liberam o
térreo apenas na parte frontal, que faz a
interface com a cidade.
249
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Capítulo 7
7.1-
7.1 -Tabelas
Tabelascom
dos os demais
demais edifícios
edifícios residenciais
residenciais dede Heep
Heep
em São Paulo
250
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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7.2- Considerações sobre os edifícios não analisados

Nas considerações a respeito dos critérios que


definiram a amostra de edifícios a ser analisada neste
trabalho (ver p.7), comentou-se que as escolhas se deram,
na maioria dos casos, por razões tipológicas; logo, os dez
exemplares escolhidos para análise foram considerados
edifícios-chave, portadores de matrizes tipológicas,
retomadas nos demais onze.

Porém, cabe afirmar que há duas exceções claras,


Ed. Tucumàn -1950 Ed. Lausanne -1953
em que os critérios de escolha não foram determinados pela
Fonte: Revista Habitat 18, 1954, p.28. Fonte: Revista Acrópole 239, 1958, p.504. tipologia, mas pela importância do edifício. Por exemplo:
o edifício Tucumàn53 (1950) possuia, em sua conformação
original, uma fachada dominada por venezianas coloridas
dipostas aleatoriamente; estes elementos foram retomados
no projeto do célebre edifício Lausanne (1953). De acordo
com os critérios de escolha da amostragem, o edifício que
deveria ter sido analisado é o Tucumàn, mas neste caso, a
importância e notoriedade do Lausanne prevaleceram.

O mesmo ocorreu no caso da escolha do edifício


Icaraí (1953) como parte da amostragem. No edifício Marajó
(1952), ocorrem pela primeira vez, dentro do universo
de obras de Heep, os elementos de fachada que seriam
retomados no Icaraí; porém, o fato deste ter sido publicado
Ed. Marajó - 1952 Ed. Icaraí - 1953 na revista acrópole54 e de estar situado num local de mais
Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.
visibilidade, atribuiu a ele mais notoriedade. Ademais,
o Icaraí se encontra atualmente com as características
originais bem preservadas, ao contrário do Marajó, cuja
fachada foi totalmente descaracterizada55.

(53) - O edifício Tucumàn, situado na rua Martins Fontes, é hoje um hotel; as venezianas da fachada foram retiradas, dando lugar a uma pele de vidro.
(54) - O edifício Icaraí foi publicado na revista Acrópole nº 210, 1956, p.234-235.
(55) - A fachada original do ed. Marajó possuia a mesma conformação do ed. Icaraí. A foto acima mostra o Marajó atualmente; nota-se, por trás dos novos vitrôs, o mesmo tipo de
caixilhos presentes no Icaraí.
Parte III
conclusões
253
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Capítulo 8
Conclusões

Mesmo com a escolha de dez obras tipologicamente


diversas, é possível identificar semelhanças conceituais
entre elas, em que se pretende concluir que há situações
recorrentes nos edifícios residenciais de Heep que,
independentemente de variações estéticas e funcionais,
se repetem, deixando claras certas posturas do arquiteto. A
análise das dez obras selecionadas permitiu traçar um perfil
projetual de Adolf Franz Heep quanto ao enfrentamento
do problema da habitação vertical e a sua relação com o
contexto urbano de São Paulo.

As análises possibilitaram a identificação e o


aperfeiçoamento de algumas tipologias de plantas, fachadas
e volumes, dentro do universo de sua obra residencial
vertical paulistana nos anos 1950. Foi possível também
identificar o posicionamento do arquiteto frente a questões
técnicas, onde fica clara a sua postura racionalista, oriunda
de sua formação e de suas experiências profissionais na
Europa.

A seguir destacam-se alguns temas arquitetônicos


relevantes extraídos das análises; são eles: inserção
urbana, insolação e conforto térmico, fachadas, plantas e
importância do detalhe bem resolvido.

8.1- Inserção Urbana



Pode-se afirmar que as obras selecionadas para
análise neste trabalho são de cunho privado e voltadas ao
mercado imobiliário. Sabe-se que em muitos casos, este
tipo de obra tem demonstrado uma ruptura da arquitetura
com a cidade, com edifícios que se individualizam em seus
lotes, ignorando o contexto urbano. Nas obras analisadas
de Heep nota-se, sempre que possível, uma preocupação
com a inserção na cidade; em alguns casos, os terrenos
não propiciaram situações que levassem o arquiteto a
desenvolver situações interessantes de relação com a
urbanidade, pelo fato desses lotes situarem-se no meio
das faces das quadras e comprimidos entre edificações já
existentes. Porém, quando a situação do lote propiciava
algum tipo de situação em que o projeto pudesse contribuir
com o enriquecimento do âmbito urbano, pode-se dizer
que Heep o fez.
254
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

8.1.1- Valorização e entendimento de esquinas

Das dez obras estudadas, três são situadas em lotes


de esquina; são elas os edifícios Ouro Verde (p.31), Ibaté
(p.94) e Araraúnas (p.183). No Araraúnas, a curvatura da
te
lâmina principal a desloca gradualmente do alinhamento,
t
gle

liberando e ampliando o passeio da esquina, onde uma


da
me

marquise também curva, cobre o espaço vazio criado. Além


a la

disso, esta curvatura também resulta num encurtamento


do percurso do pedestre que vem na Avenida São João em
direção à Alameda Glette, enaltecendo a inserção urbana
do edifício. Há também uma clara preocupação de Heep
com as visuais do edifício; a curvatura da lâmina aumenta a
amplitude visual dele para quem trafega no sentido centro-
av. são joão bairro da avenida São João. A questão do encurtamento
Edifício Araraúnas do percurso do pedestre na esquina também está presente
no edifício Ibaté, onde Heep chanfra uma loja do térreo,
alargando o passeio na esquina e desta forma, cedendo
rua augusta um espaço à cidade.

O Ibaté e o Ouro Verde, também situados em lotes


de esquina, contam com conceitos de valorização das
visuais, mas desta vez, através de empenas cegas brancas,
rua antonio carlos que extrapolam a altura do edifício, criando um elemento
Edifício Ibaté contundente de marcação e de identificação do edifício à
distância.
- encurtamento do percurso de pedrestres na
esquina

Empenas cegas brancas que marcam as esquinas


Edifícios Ouro Verde e Ibaté
255
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

8.1.2- Térreos elevados Mesmo com estas grandes diferenças em seus


públicos-alvo, ambos os edifícios contam com um recurso
semelhante de diálogo com a cidade; os seus térreos
encontram-se meio nível acima da cota da rua. Este
Os edifícios Lausanne (p.113) e Normandie (p.50) desnível, nos dois edifícios, é vencido por rampas curvas
são destinados à classes sociais muito distintas; o primeiro que configuram um percurso de entrada, parada e saída
situa-se no bairro de Higienópolis e possui apartamentos de veículos e pedestres. Os térreos elevados em relação ao
com áreas muito generosas; o segundo está situado na nível da rua, juntamente com as rampas curvas, atribuem
avenida 9 de Julho e suas unidades são quase todas do tipo imponência aos edifícios e visuais interessantes, que
kitchenette, destinadas às classes menos abastadas. enriquecem a relação com suas respectivas ruas.

Térreo do edifício Lausanne

Térreo do edifício Normandie


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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

8.1.3- Implantação

Os edifícios Lugano e Locarno (p.226), situados


na Avenida Higienópolis, são compostos por dois blocos,
separados por 18,00m, configurando uma rua interna,
cujo eixo coincide exatamente com o da rua Itacolomi,
perpendicular à face principal do terreno. Este alinhamento
rua interna
cria uma sensação de continuidade da Itacolomi para
dentro do lote, de modo a criar uma interessante relação
do público com o privado, fundindo a arquitetura à cidade.
Na análise dos edifícios Lugano e Locarno, identificou-se
que a implantação dos blocos, que definiu esta interessante
simbiose urbana, se sobrepôs à questão da insolação, que
ficou prejudicada nas faces dos blocos voltadas para a rua
interna.

Atualmente, a colocação de grades limitando o


av. higienópolis acesso à rua interna empobreceu a relação urbana original
do edifício e prejudicou a continuidade visual da rua
rua
Itacolomi para dentro do lote.
itacolomi
257
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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8.2-Insolação e conforto térmico

“O partido arquitetônico, como Heep ensina, é


claro e objetivo. Baseia-se em premissas fixas,
das quais a primeira é a orientação correta em
função da latitude, garantindo luz e insolação
adequadas”.. (GATTI, 1994, p.102)

Outra situação identificada na análise das dez


obras é o posicionamento de Heep frente às questões da
orientação solar dos edifícios e como ela influi, desde a
escolha do partido arquitetônico, à resolução de caixilhos,
Terraços do Icaraí - proteção solar brises e demais elementos que, além das suas atribuições
funcionais, compõe as fachadas dos edifícios.

No universo das obras analisadas foi possível


constatar que os edifícios que possuem terraços frontais
estão sempre orientados para as faces de maior insolação.
Isto dá indícios de que na obra de Heep, estes espaços,
além da sua função espacial habitual, também funcionam
como elementos de proteção solar, fazendo com que os
caixilhos de quartos ou salas de estar fiquem recuados
da fachada, evitando assim a sua exposição à insolação
direta.

Dos dez edifícios analisados, o Araraúnas, orientado


a leste, e o Icaraí (p.78), orientado a oeste, são os primeiros
na obra residencial vertical de Franz Heep, a utilizarem
este recurso do terraço servindo como um elemento de
proteção à insolação excessiva. No edifício Ouro Verde,
esta preocupação também é notada, mas não de forma tão
contundente, afinal, nesta obra os terraços não dominam a
fachada como nos anteriormente citados. No edifício Icaraí
Terraços do Araraúnas - proteção solar
pode-se dizer que o terraço impede a entrada excessiva
dos raios solares até por volta das 15:00 horas; depois
deste horário, eles incidem de maneira acentuada, graças
à orientação oeste da fachada principal.

No edifício Guaporé (p.202), surge um indício de


aperfeiçoamento na questão das preocupações com a
insolação; a fachada principal do edifício possui a mesma
orientação oeste da fachada do Icaraí, o que levou Heep
à mesma opção pelo uso dos terraços, porém, neste
caso surgem brises feitos em cobogós de concreto, que
diminuem de modo mais eficiente, a penetração dos raios
solares nos ambientes de estar e repouso no período da
tarde. Fora da amostra de dez edifícios escolhida, esta
Terraços e brises em cobogós no Guaporé - proteção solar solução do terraço como elemento de proteção solar
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também é percebida nos edifícios Marajó56


e Jequitibá (p.VII), ambos também com suas
fachadas principais orientadas à oeste.

Ao longo das análises das dez obras,


nota-se que os terraços não são a única forma
de contenção dos excessivos raios solares da
manhã e tarde. O edifício Ouro Preto (p.142)
possui suas fachadas orientadas à leste e
oeste; nesta obra, do 1º ao 11º andar, os
elementos predominantes de proteção solar
são as venezianas móveis de alumínio; já
nos pavimentos superiores, situados num
volume sobrelevado, os terraços dominam
toda a fachada, novamente assumindo o
Terraços e brises em cobogós no Guaporé - proteção solar papel de proteção solar.

No edifício Ibaté, orientado a oeste, a


proteção contra o sol da tarde se dá por uma
grelha sobressaliente de concreto situada na
fachada, que sombreia as partes superiores
das aberturas. Somente a grelha não seria
eficiente na contenção solar; a adoção da
“Janela Ideal”, composta por venezianas de
madeira, protege os ambientes de estar e
repouso da exposição direta à luz solar.

No edifício Lausanne, cuja fachada


principal é orientada à nordeste, a
preocupação com as questões de incidência
Grelha e Janela Ideal no Ibaté - proteção solar solar levaram Heep à adoção das soluções
mais sofisticadas, de todas as encontradas nas
demais análises. Neste caso, as venezianas
móveis de alumínio dominam a fachada
em sua totalidade; além de correrem, elas
são compostas por aletas basculantes que
permitem um controle muito mais preciso
da iluminação e ventilação.

Após todas essas considerações,


pode-se concluir que em todos os edifícios
estudados, cujas orientações são de forte
incidência solar, Heep adotou alguma forma
de contê-la.

As preocupações do arquiteto frente


Venezianas do Lausanne - proteção solar
às questões de fachadas que recebem
pouca luz solar também são percebidas
(56) - O edifício Marajó, situado na rua Santo Amaro, bairro da Bela Vista, não está presente na amostra de dez ediícios selecionados para esta pesquisa, porém, nas páginas 249 e 251
se encontram algumas informações sobre ele.
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na análise das dez obras; os edifícios orientados


a sul, sudeste e sudoeste, contam com maiores
superfícies envidraçadas em suas fachadas, sem
reentrâncias ou sobressaliências volumétricas
que as sombreiem, como por exemplo terraços ,
de modo a um maior aproveitamento da luz solar
e do calor, mais escassos nestas orientações. No
edifício Lucerna (p.160), cuja fachada principal
está voltada para o sul, os caixilhos não possuem
venezianas ou brises, predominando as superfícies
em vidro; não há, na fachada do Lucerna, nenhum
tipo de elemento sobressaliente que a sombreie.

No item 8.1.3, que falava sobre implantação,


ressaltou-se a a interessante disposição no lote
que os edifícios Lugano e Locarno possuem, em
Fachada do Lucerna - sem reentrâncias ou saliências
que se cria uma rua interna entre as duas lâminas,
configurando uma continuidade da rua Itacolomi.
Porém, a adoção deste partido que privilegia as
visuais e a integração com a cidade, prejudica a
insolação dos blocos, principalmente em suas faces
N voltadas para a rua interna, já que uma lâmina
O
L sombreia a outra durante os períodos da manhã
S manhã
e da tarde; isto simboliza, dentro da amostragem
de obras deste trabalho, o único projeto de
Esquema de insolação nos
Heep onde as questões de insolação não foram
edifícios Lugano e Locarno
as mais importantes para a definição do partido
arquitetônico.
N
O
L O edifício Normandie possui sua fachada
S principal orientada à sudeste; a incidência diagonal
tarde de raios solares levou Heep a inaugurar neste projeto
uma solução de proteção solar que se transformou
num elemento tipológico marcante em sua obra;
são abas de concreto, chamadas popularmente de
“orelhas”, que se situam entre as aberturas e estão
dispostas perpendicularmente à fachada, atuando
como uma espécie de brise lateral, barrando os
raios solares que incidem diagonalmente, devido à
orientação sudeste. Além de atuarem como brise,
as “orelhas” possuem outras funções estéticas e
funcionais que serão descritas posteriormente;
esta solução se repetirá nos edifícios Arapuã (1953)
e Japurá (1954), cujas fachadas principais possuem
orientações semelhantes à do Normandie.

Fachada do Normandie - “orelhas” como brises laterais


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As questões relacionadas à incidência de luz


solar nas fachadas está diretamente ligada, não só à
iluminação, mas ao conforto térmico dos apartamentos.
Esta preocupação aflora na medida em que se analisam
as soluções adotadas por Heep no que diz respeito aos
caixilhos, que, até mesmo em obras destinadas às classes
menos abastadas, possuem desenhos elaborados. Neles,
notam-se claramente preocupações com trocas de ar, afim
de propiciar um maior conforto térmico.

Os caixilhos do edifício Normandie, utilizados


também nos edifícios Lucerna, Arapuã e Japurá, são
um exemplo disso; eles são compostos por elementos
envidraçados que consistem num peitoril basculante, um
corpo principal com duas lâminas de correr e uma bandeira
superior, também basculante; este sistema tem a função de
promover a troca de ar no apartamento, fazendo com que
o ar frio entre pela parte inferior (peitoril) e o ar quente
saia pela parte superior (bandeira). Nos dias frios, fecha-
se a parte superior, impendindo-se que o ar quente saia.
Os caixilhos do edifício Lausanne, além das venezianas já
descritas, possuem em sua parte voltada para o interior
Corte dos caixilhos utilizados nos do apartamento, um peitoril basculante em vidro, que
edifícios Normandie, Arapuã e
Japurá
aumenta a área de ventilação da abertura.

Edifício Arapuã - Foto: Edson Lucchini Jr.

Edifício Japurá - Foto: Edson Lucchini Jr. Edifício Normandie - Foto: Edson Lucchini Jr.
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8.3- Fachadas

É possível afirmar que as fachadas de um


edifício também são elementos importantes na
relação da arquitetura com a cidade, já que são
elementos ímpares na composição da paisagem
urbana.

No item anterior, foram identificados


fatores relacionados à orientação solar e conforto
térmico, cujas soluções resultam em elementos de
composição estética das fachadas, que serão agora
comentados mais profundamente.

Grelha da fachada do Icaraí


8.3.1- Grelhas

Dos dez edifícios estudados neste trabalho,


seis possuem grelhas de concreto como elementos
principais na composição de suas fachadas frontais;
são eles os edifícios: Icaraí, Araraúnas, Ibaté,
Ouro Preto, Lucerna (p.160) e Guaporé. Com isso,
pode-se concluir que as grelhas são elementos
recorrentes na obra residencial vertical de Franz
Heep.

A seguir serão vistas diversas variações


do uso das grelhas nas fachadas dos edifícios de
Heep, porém, cabe afirmar que em todos eles, as
grelhas funcionam como um elemento atribuidor
de ordem e unidade às fachadas, enquadrando as
Grelha da fachada do Araraúnas
aberturas, conferindo sombreamentos e volume,
além de individualizar os apartamentos.

Nos edifícios Icaraí, Araraúnas e Guaporé
as grelhas que compõe suas fachadas possuem
funções semelhantes; elas abrigam os terraços,
sendo que cada unidade que a compõe é
praticamente quadrada e corresponde a um
apartamento, ou a um ambiente, como ocorre
no Guaporé. A diferença entre as grelhas destes
edifícios é que no caso do Icaraí ela é estrutural,
ou seja, os elementos que a compõe são pilares e
lajes; já no Araraúnas e no Guaporé, os elementos
verticais da grelha são fechamentos em alvenaria.
No Icaraí, é possível notar um afilamento da grelha
no sentido da sua extremidade, conferindo mais
Grelha da fachada do Guaporé esbeltez e leveza.
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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O edifício Ibaté não possui terraços em sua


fachada principal, mas também conta com uma
grelha como elemento marcante. Ela é composta por
elementos retangulares que enquadram duas aberturas e
correspondem a um apartamento; no Ibaté, os elementos
horizontais da grelha são floreiras de concreto.

Na comparação entre as grelhas dos edifícios


Icaraí e Ibaté surge uma diferença; no Icaraí, os elementos
horizontais da grelha são lajes, que marcam claramente
a transição entre os pavimentos; no Ibaté, os elementos
horizontais da grelha são floreiras, de modo a se criar uma
ilusão da posição exata da transição entre os pavimentos.

Grelha da fachada do Ibaté A fachada do edifício Ouro Preto possui uma grelha
com elementos quadrados e levemente sobressalientes,
que enquadram as aberturas dos dormitórios e sustentam
as venezianas de correr; porém, neste caso, a grelha é
interrompida pelos terraços das salas, que são elementos
atribuidores de volumes mais ricos e sombras à fachada.

No edifício Lucerna, como já explicado


anteriormente, a orientação sul da fachada principal
fez com que Heep não utilizasse nenhum elemento
sobressaliente, que pudesse sombrear ainda mais a
fachada que naturalmente recebe pouca luz. Mesmo assim,
ele cria duas grelhas sobrepostas, desencontradas e não
sobressalientes, feitas apenas por variações cromáticas.

Grelha da fachada do Ouro Preto

Grelha da fachada do Lucerna


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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

8.3.2- Composição entre caixilhos, guarda-corpos,


floreiras e cobogós; célula e todo

Ao analisar as fachadas projetadas por Heep, surgem


indícios de uma preocupação na resolução da unidade ou
célula, em um primeiro momento, para posteriormente,
arranjá-las de modo a criar um todo hamornioso, com
ritmo, ordem, cheios e vazios.

Em todos os casos estudados, há uma composição


clara entre os caixilhos, guarda-corpos e eventualmente
floreiras e cobogós, compondo células que correspondem
geralmente a um apartamento; posteriormente, estas
células são arranjadas de modo intercalado, espelhado, ou
Célula compositiva da fachada do ed. Arlinda - 1959 simplesmente dispostas lado a lado, compondo o todo da
Fonte: Revista Acrópole nº 286, 1962, p. 325 fachada.

O edifício Arlinda (1959), mesmo estando fora dos


dez selecionados para análise neste trabalho, representa
uma das mais interessantes composições, não só das
células, mas como do todo. Cada célula conta com uma
composição entre o caixilho, o guarda-corpo, uma faixa
superior de elementos vazados e uma floreira assimétrica.
O arranjo de todas estas células, intercalando a posição
das floreiras entre os pavimentos, gera na escala do todo,
uma fachada com um intenso movimento e volumetria.

Composição das células - Edifício Arlinda - 1959


Foto: Edson Lucchini Jr.

Células criam o todo - Edifício Arlinda - 1959 Células criam o todo - Edifício Arlinda - 1959
Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.
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Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Um interessante exemplo
deste tipo de composição ocorre
na fachada do edifício Normandie.
Cada apartamento, que corresponde
a uma célula da fachada, possui um
arranjo entre a floreira, o caixilho e as
“orelhas”, citadas anteriormente como
elementos de proteção solar, mas que
também servem para individualizar as
unidades e atribuir mais privacidade,
já que os apartamentos são muito
próximos. Na escala da célula, a
floreira assume um papel de guarda-
corpo, separando o peitoril do corpo
principal do caixilho.
Composição da fachada privilegia visão do observador situado no térreo - Edifício Normandie
Saindo da escala da célula para
a escala do todo, as “orelhas” atribuem
ritmo à fachada do Normandie e
um interessante jogo de sombras e
volumes, principalmente para quem
vê o edifício de baixo para cima.
Também na escala do todo, as floreiras
assumem o papel de importantes
elementos horizontais da fachada,
que ajudam a contrapor a sensação
vertical excessiva da torre, com seus
21 pavimentos.

Nos edifícios Icaraí e


Araraúnas, as células que compõe a
Composição da fachada privilegia visão do observador situado no térreo - Edifício Icaraí
fachada são definidas pela grelha, já
mencionada; “o guarda corpo é uma
viga de concreto a sublinhar a grelha”
(BARBOSA, 2002, p.150), além de
atribuir horizontalidade à fachada.

Enfim, após todas essas
considerações, surge a hipótese de que
poderia ser uma preocupação de Heep
a percepção que o observador, situado
no térreo, tem ao olhar os edifícios
de baixo para cima; os elementos
que compõe cada célula da fachada
propiciam visuais muito interessantes
do todo para este observador, repletas
de cheios e vazios, movimento, ritmo
e sombreamentos, como mostram as
Composição da fachada privilegia visão do observador situado no térreo - Edifícios Lugano e Locarno
imagens ao lado
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8.3.3- Fachadas livres e caixilhos piso-teto

Adolf Franz Heep, assim como outros arquitetos


de sua geração, utilizava em seus edifícios o recurso
da fachada livre; isto consiste no recuo da estrutura em
relaçâo à fachada, conferindo mais liberdade compositiva
à ela. A leveza, resultante da retirada de pilares e vigas das
faces principais dos edifícios, é um dos principais fatores
conseguidos pela adoção da fachada livre; deste modo, os
únicos elementos estruturais que aparecem nas fachadas
são as lajes, que, devido às suas espessuras mais delgadas,
marcam suavemente a transição entre os pavimentos.

Nos edifícios estudados de Heep, é possível notar


que praticamente não há utilização de alvenarias nas
fachadas principais. Em quase todos os casos, elas são
compostas por caixilhos pré-fabricados, do tipo piso-teto,
que preenchem todo o vão estrutural, resultando numa
composição mais limpa e homogênea.

Os edifícios Icaraí, Araraúnas, Lausanne, Ibaté, Ouro


Preto, Lucerna e Normandie, apresentam caixilhos piso-
teto compondo suas fachadas. Nas torres gêmeas Lugano e
Locarno, há um peitoril em alvenaria, criando aberturas de
Ed. Lausanne - Lajes são os únicos elementos estruturais na fachada - menor altura, mas que são importantes na atribuição de
Caixilhos piso-teto horizontalidade à fachada. No edifício Ouro Verde, nota-
Foto: Edson Lucchini Jr
se uma exceção, já que as aberturas dos dormitórios são
cavidades em uma grande empena de alvenaria.

Ed. Ouro Preto - caixilhos piso-teto enquadrados por grelha Ed. Ouro Verde - Janelas com peitoril e bandeira em alvenaria - exceção
Foto: Edson Lucchini Jr
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8.3.4- Cobogós

O uso de cobogós é um fato recorrente, não só nas


dez obras selecionadas para este trabalho, como em toda
a sua produção no Brasil, seja em residências, edifícios ou
fábricas.

As análises deixam claro que para Heep, o cobogó


é um elemento que assume múltiplas funções; são elas:
composição de fachadas, dissimulação de aberturas
pequenas, proteção solar, iluminação e ventilação.

Cobogós da fachada do edifício Ouro Verde O edifício Ouro Verde, de 1952, é o primeiro, dos
exemplos paulistanos, em que Heep utiliza o cobogó de
concreto, com um desenho quadriculado. Neste edifício, ele
assume um papel importante na composição da fachada,
já que atua como um elemento que intercala cheios e
vazios; além disso, os cobogós do Ouro Verde dissimulam
as aberturas de banheiros na fachada principal e também
funcionam como elementos de proteção solar.

No edifício Lausanne, o cobogó conta com um


desenho mais requintado, servindo de fechamento para os
apartamentos térreos e enquadrando suas aberturas; além
disso, os cobogós do térreo diferenciam este pavimento do
restante da torre.
Cobogós da fachada do edifício Ouro Verde

Foto: Edson Lucchini Jr.

Cobogós da fachada térrea do edifício Lausanne Foto: Edson Lucchini Jr.


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No edifício Guaporé, os cobogós retangulares de


concreto possuem um papel marcante na composição
da fachada do edifício, já que dominam o seu imponente
embasamento. No corpo da torre, os cobogós atuam
como fechamentos inferiores dos guarda-corpos e como
elementos de proteção solar. No caso do Guaporé, notam-
se ressonâncias da arquitetura de Lucio Costa e Affonso
Eduardo Reidy, nos residenciais Parque Guinle e Pedregulho,
com os elementos vazados enquadrando aberturas. Esta
mesma linguagem será utilizada por Heep nos edifícios
Ouro Preto e Buriti, situado na rua Maria Antonia, mas fora
da amostragem selecionada para este trabalho.

Res. Pedregulho - Affonso Eduardo Reidy - Rio de Janeiro - 1947-1950


Fonte: http://www.educatorium.com/images/projetos_referenciais/
Embasamento do Guaporé - cobogós AFONSO%20EDUARDO%20REIDY_CONJ%20PEDREGULHO.jpg
Foto: Edson Lucchini Jr. acesso em dez. 2009

Ed. Ouro Preto - Foto: Edson Lucchini Jr.

Cobogós do corpo da torre são do mesmo tipo do embasamento - obtenção de unidade Ed. Buriti - Foto: Edson Lucchini Jr.
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8.3.5- Uniformidade nas fachadas, dissimulação das estrutural e não permitem que as paredes que separam os
compartimentações internas e aleatoriedade ambientes e os apartamentos apareçam, ou seja, os caixilhos
dissimulam totalmente as compartimentações internas do
edifício, resultando numa forte uniformidade da fachada.
Em praticamente todos os edifícios estudados, Porém, esta perfeita uniformidade poderia acarretar numa
a composição da fachada deixa clara a idéia de que cada monotonia, que foi rompida pelo tratamento cromático
célula dela corresponde a um apartamento, ou a um dado aos caixilhos.
cômodo, pois estas células são bem definidas, ou seja, as
compartimentações das plantas se refletem nas fachadas. Heep escolheu duas cores claras e duas escuras que
Porém, dentro da amostragem escolhida, pode-se dizer foram aplicadas de maneira totalmente aleatória. Desta
que apenas o edifício Lausanne simboliza uma exceção. forma, o arquiteto conseguiu, apenas pelo fator cromático,
movimento, cheios e vazios à fachada; a percepção dos
No Lausanne, a fachada não apresenta nenhum tipo cheios se dá pelos caixilhos escuros, e a dos vazios, pelos
de divisão horizontal pois os caixilhos preenchem todo o vão caixilhos claros.

Dissimulação das compartimentações internas na fachada do Lausanne

Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.
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No edifício Icaraí, Heep utilizou


o mesmo recurso de aleatoriedade
cromática presente no edifício Lausanne,
mas desta vez, através da pintura das
paredes internas dos terraços. Neste
caso, além da atribuição de movimento,
as cores reforçam o vazio causado pela
subtração do terraço, enriquecendo a
volumetria.

Pode-se afirmar que o


movimento cromático da fachada do
Icaraí e os terraços subtraídos do volume
principal fazem uma clara remissão à
Unidade de Habitação de Marselha, de
Le Corbusier.

Hoje, os terraços do Icaraí


encontram-se totalmente pintados na
cor branca, o que representa o maior
fator de descaracterização do edifício.

Unidade de Habitação de Marselha - Le Corbusier - 1945


Fonte: http://2.bp.blogspot.com/8Rightee_2%252529.jpg
acesso em outubro de 2009
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8.3.6- Ordem, simetria, assimetria e hierarquia

Todos os dez edifícios analisados neste trabalho


contam com fachadas que podem ser divididas em
base, fuste e capitel, estabelecendo uma analogia com
a ordenação de uma coluna clássica, mas sem querer
insinuar que Heep tenha tentado atribuir às suas fachadas
ressonâncias dos estilos acadêmicos. Em todos os edifícios,
pode-se afirmar que a base corresponde aos térreos e
embasamentos; o fuste corresponde aos corpos principais,
onde se situam os apartamentos; os capitéis correspondem
CAPITEL
aos coroamentos, que na maior parte dos casos, consistem
nos andares recuados pelo escalonamento obrigatório dos
edifícios.

Da amostragem escolhida para análise, cinco


exemplares possuem uma conformação simétrica e outros
cinco possuem uma conformação assimétrica, deixando
claro que não há uma predileção gratuita do arquiteto por
uma situação ou outra, e desta forma, enfatizando que
esta escolha se dá por fatores inerentes a cada situação
específica.

O edifício Ouro Verde exprime uma interessante


situação em que a simetria das plantas, ordenada por um
eixo diagonal, não se repete na fachada graças à decisão
do arquiteto de voltar as aberturas de um dormitório para
outra face, criando-se uma empena cega, que além de ser
FUSTE um elemento de marcação da esquina, rompe a simetria
da fachada, criando uma hierarquia entre as faces voltadas
para duas vias.

BASE

Tripartição compositiva na fachada do Ed. Ouro Preto Ed. Ouro Verde - a simetria das plantas não se transpõe à fachada
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Coroamento do edifício Araraúnas

8.3.7- Coroamentos a uma grande praça possibilitou um gabarito elevado


(24 pavimentos). Os outros nove edifícios analisados
possuem andares escalonados, que surgem como uma
A análise das amostras escolhidas neste trabalho forte condicionante de projeto, que desafia a capacidade
permitiu a elaboração de hipóteses a respeito da abordagem do arquiteto em obter uma solução harmoniosa.
que o arquiteto possui com relação aos coroamentos de
seus edifícios. Há algumas abordagens distintas nos
escalonamentos superiores dos edifícios de Heep; nos
Sabe-se que nos anos 1950, a legislação construtiva edifícios Araraúnas e Lausanne, fica clara a intenção do
vigente determinava que a altura máxima dos edifícios arquiteto em associar o escalonamento obrigatório a um
deveria ser extraída através de uma linha imaginária, coroamento elegante. No Araraúnas, a grelha que domina
traçada a partir do alinhamento do lado oposto da via, com a fachada é finalizada no 14º andar (o primeiro a sofrer
um ângulo de 60º com o solo; esta linha determina a altura o recuo obrigatório), por elegantes pórticos que separam
do edifício e a partir de qual pavimento deveria ocorrer as unidades, sendo percebidos por quem trafega pela
o escalonamento. Isto resulta numa situação em que o avenida São João. No Lausanne, Heep coroa o edifício no
gabarito é determinado pela largura da via, ou seja, quanto segundo andar escalonado, o 15º do edifício, através de
mais larga ela fosse, mais alto poderia ser o edifício. aberturas zenitais trapezoidais. Em ambos os edifícios,
as soluções adotadas para os andares escalonados,
Diante da situação descrita, da amostra escolhida minimizam a percepção esteticamente negativa que estes
para análise neste trabalho apenas o edifício Icaraí não escalonamentos geralmente produzem.
possui escalonamento, pois o fato dele estar em frente

Coroamento do edifício Lausanne


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Nos demais edifícios estudados (Ouro Verde, Ibaté,


Normandie, Lucerna, Guaporé, Lugano e Locarno) os
escalonamentos dos andares superiores são tratados de
maneira diferente. Neles, nota-se uma clara ruptura com
a linguagem do restante do edifício, já que são utilizados
caixilhos diferentes e grandes superfícies lisas em alvenaria,
sem nenhum tipo de tratamento; isto permite a elaboração
de hipóteses sobre o que realmente os escalonamentos
significavam para Heep, na composição da fachada de um
edifício.

Coroamento do edifício Normandie A primeira hipótese consiste na intenção proposital


do arquiteto em projetar os andares escalonados com uma
linguagem diferente do restante da torre afim de destacá-
los, deixando bem definido que o escalonamento é o
coroamento. Com isso, há uma diferenciação clara entre o
coroamento e o corpo principal, que também sempre se
diferencia da base do edifício.

A outra hipótese identificada é a de que à partir do


momento em que Heep desenha os andares escalonados
de modo diferente do restante da torre, e sempre com
uma linguagem bem mais simples, ele deseja atribuir uma
intenção de neutralidade destes pavimentos, para que
Coroamento do edifício Ibaté
eles interfiram o menos possível na composição do corpo
principal da fachada, que é onde o arquiteto coloca em
prática seus conceitos compositivos plenos. Ao se aceitar
esta hipótese, pode-se concluir então que os coroamentos
nos edifícios de Heep situam-se na transição entre o último
andar do corpo principal e o primeiro andar escalonado. No
edifício Ouro Verde, por exemplo, há cavidades horizontais
que marcam bem esta transição.

Coroamento do edifício Lucerna

Coroamento do edifício Guaporé Coroamento do edifício Ouro Verde


273
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

8.3.8- Fachadas laterais e de fundos

Uma outra preocupação notada constantemente


nas obras estudadas de Heep é a elaboração de fachadas
laterais e de fundo, principalmente quando a implantação
do edifício faz com que elas sejam vistas por quem trafega
em ruas do entorno; isto deixa clara a preocupação do
arquiteto com a paisagem urbana, já que estas fachadas
também são elementos que a compõe. Os exemplos
mais relevantes de elaboração de fachadas laterais e de
fundos ocorrem nos edifícios Lausanne, Lugano e Locarno
e Normandie.

A fachada dos fundos do edifício Lausanne é


facilmente percebida por quem trafega pela rua Maranhão,
por isso, ela foi concebida cuidadosamente baseada em
alinhamentos, ritmos. hierarquias e sombras, além de
possuir caixilhos de bom padrão estético, todos desenhados
e detalhados por Heep. Nos edifícios Lugano e Locarno,
as fachadas dos fundos das lâminas são vistas por quem
trafega pela avenida Higienópolis, fator que contribuiu
para o seu desenho elaborado, com grandes superfícies em
tijolos de vidro que enquadram as aberturas. A fachada dos
fundos do edifício Normandie é evidentemente percebida
por quem trafega pela rua Avanhadava; isso levou Heep a
uma solução elegante para esta face, onde predominam
grandes panos de cobogós de concreto que iluminam e
Fachada dos fundos do Ed. Lausanne
ventilam os corredores.

Fachada dos fundos do Ed. Normandie Fachada dos fundos dos Edifícios Lugano e Locarno
274
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

8.4- Plantas

Este item tratará de conclusões a respeito de


elementos recorrentes nas decisões projetuais de Franz
Heep no âmbito das plantas dos edifícios.

8.4.1- Geometria e racionalização

Na análise das obras selecionadas para este trabalho,


algumas posturas de Heep com relação à resolução de
plantas tornam-se claras. Assim como outros arquitetos de
sua geração, Heep sempre buscava, na resolução de suas
plantas, situações racionais, em que se privilegiavam os
alinhamentos e disposições de ambientes que condiziam
com o vão estrutural do edifício. Além disso, os projetos
exigiam precisão construtiva, já que as medidas justas
correspondiam a múltiplos. Os espaços eram uma sucessão
de quadriláteros regulares e íntegros a partir da laje, que
era seu retângulo maior, gerando plantas sintéticas que
resolviam a questão funcional, sem chanfros, “dentes” e
demais mesquinharias.

Estes elementos citados estão presentes em todos


os dez edifícios analisados, com exceção do Ouro Verde;
este edifício não possui a racionalidade na divisão dos
espaços que os demais edifícios possuem, principalmente
nos apartamentos dos andares escalonados, por razões
desconhecidas que podem ter fugido do domínio do
arquiteto.

8.4.2- Setorização e fluxos


Perspectivas axonométricas de apartamentos do Ed. Lausanne
Fonte: Acervo do edifício Lausanne
Cedido por Fernando Martinelli
Nas plantas dos edifícios estudados, principalmente
nas que possuem programas maiores, se nota uma
preocupação constante do arquiteto na busca de uma
setorização bem definida. Esta condição visa separar
claramente os setores íntimo, social e de serviços, sem
interferências entre eles, e de preferência, sem que se
tenha que passar por um para chegar ao outro, deixando-
os bem independentes.
275
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Observando as plantas dos apartamentos, mesmo


setor de
nos de menores dimensões, nota-se a recorrência de halls
serviço de distribuição, que permitem o acesso aos diferentes
setores da planta de modo independente.

distribuição No maior apartamento do edifício Lausanne,


setor íntimo
situado em seu último pavimento, Heep consegue uma
setor social setorização perfeita e totalmente independente, como
mostra o esquema ao lado; um hall de entrada distribui os
Setorização da unidade de 263m² do Lausanne fluxos para todos os setores, sem interferências.

É evidente que há situações em que esta perfeita


e independente distribuição dos setores da planta, como
ocorreu no Lausanne, se torna praticamente impossível, por
condicionantes físicas do pavimento tipo. Porém, é possível
notar na obra de Heep, uma tentativa máxima de sucesso
neste sentido, como ocorre nos apartamentos dos edifícios
Lugano e Locarno. Neste caso, não foi possível a adoção de
um hall de distribuição que conduzisse a todos os setores da
planta sem interferências entre eles, porém, há uma clara
tentativa de fazer com que se interfira o menos possível
num setor para chegar a outro, como mostra a planta ao
lado. Para chegar ao setor íntimo, é preciso passar pelo
social, mas a distribuição escolhida, faz com que o usuário
o cruze discretamente, sem interferir muito nas salas de
estar e jantar. A mesma situação ocorre nos apartamentos
predominantes do edifício Lausanne.
Planta da unidade de 263m² do Lausanne

setor íntimo
distribuição

setor de
serviço

setor social

Setorização da unidade de 181m² do Lugano e Locarno

Planta da unidade de 181m² do Lugano e Locarno


276
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

8.4.3- Arranjos espaciais e racionalização hidráulica


Ao analisar as plantas dos apartamentos projetados
por Heep, é possível concluir que ele possuía premissas
fixas para a resolução de cada tipo de planta, dependendo
do padrão do edifício.

As kitchenettes, por exemplo, possuem os mesmos


conceitos em todos os edifícios em que foram utilizadas,
porém, sofreram pequenas variações; a disposição mais
usual caracteriza-se por uma cozinha de dimensões
mínimas, cujo espaço, é subtraído do banheiro; este conta
com medidas mais generosas, capazes de abrigar as peças
sanitárias convencionais e box. A sala-living situa-se num
espaço geralmente mais amplo e retangular, que possui um
armário embutido junto à parede que a ladeia ao banheiro;
em alguns casos, a sala-living se abre para um terraço.

Este modelo descrito foi o mais utilizado por Heep,


no que diz respeito a plantas de kitchenettes, e aparece
pela primeira vez no edifício Icaraí. Esta diposição se
Esquema de Kitchenette 1 repetirá no Araraúnas, Ibaté e Guaporé. O arranjo espacial
Utilizado no Ed. Normandie
utilizado nas unidades do edifício Normandie, o primeiro
a ser construído, não se aplicou aos empreendimentos
posteriores, dando indícios de um aprimoramento do
desenho. No Normandie, o banheiro é um retângulo
íntegro, impedindo que a cozinha tenha uma abertura para
o corredor, como no Icaraí.

Sala-living de uma Kitchenette Cozinha de uma Kitchenette


Foto: Edson Lucchini Jr. Foto: Edson Lucchini Jr.

Esquema de Kitchenette 2
Utilizado no Ed. Icaraí. Araraúnas,
Ibaté e Guaporé
277
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Os apartamentos de um dormitório também


contam com um arranjo espacial muito semelhante em
quase todos os edifícios que se destinavam a este tipo de
unidades. O acesso se dá pelo eixo da planta, onde surge
um corredor que separa a cozinha do banheiro e conduz a
um pequeno hall que distribui os fluxos para a sala de estar
e o dormitório. Esta disposição é a que mais se repete na
obra de Heep, sendo utilizada nos edifícios Ibaté, Lucerna
e Guaporé, além de aparecerem nos andares escalonados
dos edifícios Araraúnas e Normandie.

Ao longo das análises das plantas desenhadas por


Heep, é possível notar que não era uma prática comum em
sua obra a utilização de suítes, mesmo em apartamentos
destinados às classes mais abastadas. Esta situação pode
Planta de um apartamento de 1 ser observada em edifícios de padrão mais elevado como o
dormitório mais recorrente na Ouro Preto, o Lausanne e o Lugano e Locarno.
obra de Heep.

A hipótese mais provável para a não utilização das


suítes tem a ver com a questão da racionalização hidráulica,
presente em nove, dos dez edifícios estudados. No Lausanne,
por exemplo, as plantas dos apartamentos possuem uma
clara divisão entre as áreas que concentram as instalações
sanitárias, das áreas de estar e repouso. Isto reforça a
postura racionalista de Heep, que, na maioria dos casos,
prioriza a economia com elementos hidráulicos e a facilidade
Esquema de disposição das áreas molhadas - Ed. Lausanne de manutenção dos mesmos, deixando em segundo plano
alguns confortos, como por exemplo, o emprego de suítes.
Desta forma, essa racionalização hidráulica proposta por
Heep, acarreta em arranjos espaciais onde os banheiros de
casal e social ladeiam-se e são acessados pelo corredor. No
caso do edifício Lausanne, esta postura de racionalização
hidráulica, em detrimento do conforto é muito evidente, já
que os usuários do dormitório de casal têm que atravessar
todo o corredor íntimo para acessar o seu banheiro.
Esquema de disposição das áreas molhadas - Ed. Ibaté

Apenas no edifício Ouro Verde, um banheiro foi


colocado numa região da planta que não conta com outros
equipamentos hidráulicos próximos, configurando uma
suíte isolada. Este é o único edifício estudado que não
conta com uma racionalização hidráulica plena.

áreas molhadas

áreas de estar e repouso

Esquema de disposição das áreas molhadas - Ed. Ouro Verde


278
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

8.5- Importância do detalhe bem resolvido

“(...) Heep não detalha obstinadamente seus


trabalhos porque era minucioso ou compulsivo;
detalha para garantir qualidade e cobrar
resultados”.. (BARBOSA, 2002, p.147)

Nos anos 1950, em suas experiências paulistanas


com habitação vertical, Heep teve a oportunidade de
colocar em prática suas premissas, sendo que uma das
principais era a que primava pela excelência do detalhe,
como um modo de controle total da obra.

Dos dez edifícios analisados, três foram construídos


por uma parceria entre Franz Heep e a construtora Auxiliar:
o Lausanne, as torres gêmeas Lugano e Locarno e o edifício
Lucerna, que abrigava o cine Comodoro. Nestes projetos,
Heep teve liberdade para aplicar de maneira plena os seus
conceitos arquitetônicos e técnicos.

Em entrevista com Aizik Helcer, engenheiro e


sócio da construtora Auxiliar, foi possível entender alguns
elementos importantes do método de trabalho de Heep
e o quanto era difícil colocar em prática a sua filosofia de
trabalho, na realidade precária e artesanal da construção
civil brasileira da época, somada a uma indústria
incipiente.

Aizik Helcer comandava a construtora em parceria


com seu irmão, Elias Helcer e o pai, Nachman Helcer, dono
da Auxiliar. Aizik ressalta o quanto era difícil convencer
o pai e o irmão de que as idéias de Heep eram boas e
inovadoras, e resultariam em edifícios referenciais para o
mercado da época. Portanto, Heep teve em Aizik Helcer,
um aliado para a execução de suas idéias. Helcer não
hesita em dizer que os edifícios feitos pela parceria com
Heep deram muito lucro na vendas; por mais que o tempo
destinado ao projeto fosse muito longo, a quantidade e a
precisão e dos detalhamentos garantiam rapidez às obras,
além de economia.

O projeto do edifício Lausanne totaliza 257 pranchas,


sendo que a maioria dos projetos para edifícios de porte
semelhante contavam com no máximo 80. A construtora
Auxliar, cordialmente, contribuiu com a elaboração deste
trabalho, fornecendo os projetos executivos completos das
três obras feitas pela parceria com Heep. Abaixo, algumas
O engenheiro calculista do Lausanne - Aizik Helcer - fev. 2010 folhas de detalhes dos edifícios Lausanne, Lucerna e Lugano
Foto: Edson Lucchini Jr e Locarno.
279
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Detalhe do cobogó do Edifício Lausanne - 1956


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

Detalhe do cobogó do Edifício Lausanne - 1956


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

Detalhe das escadas do Edifício Lausanne - 1956


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Detalhe da guarnição das portas dos elevadores do Edifício Lausanne - 1956


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Detalhe de caixilhos do Edifício Lausanne - 1956


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

Detalhe da escada do Edifício Lucerna - Cine Comodoro - 1957


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Corte do Cine Comodoro - 1957


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

Projeto executivo do Cine Comodoro - 1957


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Capítulo 9
Considerações finais

Heep chegou ao Brasil em 1947 com 45 anos de volumes e sombras, presentes em suas fachadas. Logo,
idade e uma bagagem profissional respeitável; a sistemática a beleza na obra de Franz Heep, provém da própria
de trabalho utilizada por ele aqui foi desenvolvida nos anos arquitetura, pura, sem ornamentações ou figuras que
1930 em Paris, quando produziu alguns edifícios verticais possam associá-la a estilos ou modelos.
de habitação para a classe média, junto com seu então
sócio Jean Ginsberg. A produção de Heep em Paris baseava- As análises também revelaram indícios de
se em soluções que visavam atender aos anseios da classe um pensamento que tratava arquitetura e cidade
média de modo racional; as premissas de seus projetos como elementos em constante simbiose, onde uma,
baseavam-se na durabilidade dos elementos e na facilidade inevitavelmente, depende da outra. Isto se percebe no
de manutenção, além de outros fatores conceituais, que cuidado de Heep com todas as fachadas de um edifício,
seriam recorrentes na sua produção paulistana dos anos afinal, elas não pertencem só a ele, mas principalmente, à
1950. composição da paisagem urbana.

Após a análise da amostra de dez edifícios Ademais, sempre que as condições do lote
produzidos por Heep em São Paulo, é possível identificar permitiram, Heep criou conexões urbanas, encurtamento
uma imensa coerência entre eles sob vários aspectos. de percursos para pedestres e cessões de área de terrenos
Em todos os edifícios, pode-se afirmar com propriedade, para o ganho de passeios públicos; notam-se ainda precisas
que não há exageros, tampouco, arbitraridade. Todos inserções em esquinas, sempre tratadas como pontos
os elementos que compõe um edifício de Heep estão lá focais, onde a arquitetura a entende de modo especial.
porque têm que estar; sempre há uma justificativa para o
emprego de um determinado item. Enfim, se espera que este trabalho tenha colaborado
de alguma forma para enriquecer o conhecimento sobre a
Desta forma, sem exageros e elementos obra de Adolf Franz Heep, a fim de que seu nome e a sua
desnecessários, surge a beleza em sua obra; uma beleza imensa contribuição para a arquitetura ocupem, cada vez
proveniente da geometria, dos alinhamentos e jogos de mais, o lugar de destaque que eles merecem.


284
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

9.2 - Bibliografia

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Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
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Periódicos

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PRESTES MAIA, F. Casas populares III. Digesto Econômico, ano 3, maio de 1947.

Revista Acrópole, nº 181, p.485-492, 1953 (Edifício do jornal O Estado de São Paulo)

Revista Acrópole, nº 210, p.222-229, 1956 (Edifício Itália), p.234-235 (Edifício Icaraí)

Revista Acrópole, nº 217, p.22-25, 1956 (Casa da França no Rio de Janeiro)

Revista Acrópole, nº 219, p.95-97, 1957 (Edifício Normandie), p.112 (Elemento de fachada), p.113 (Kitchenette p/ apto)

Revista Acrópole, nº 234, p.212-213, 1958 (Edifício Araraúnas)

Revista Acrópole, nº 239, p.504-509, 1958 (Edifício Lausanne), p.531 (esquadria)

Revista Acrópole, nº 240, p.554-555, 1958 (Edifício Ouro Preto)

Revista Acrópole, nº 246, p.205-207, 1959 (Edifício Paulicéia)

Revista Acrópole, nº 287, p.347-349, 1962 (Edifícios Lugano e Locarno)

Revista Acrópole, nº 325, p.40-44, 1965 (Igreja São Domingos)

Revista Habitat, nº 18, p.28-29, 1954 (Edifício Tucumàn)

Revista Habitat, nº 29, p.62-63, 1956 (Edifício Ibaté)

Textos na internet

ESPALLARGAS GIMENEZ, Luis. A Propósito do juízo da arquitetura paulistana. www.vitruvius.com.br, 2009.

LEMOS, Carlos Alberto Cerqueira. O modernismo arquitetônico em São Paulo. www.vitruvius.com.br, 2005.
287
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

9.3 - Anexos - desenhos originais

Maçanetas - Ed. Lugano e Locarno - 1958


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
288
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Escadas - Ed. Lugano e Locarno - 1958


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
289
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Apartamento do ed. Lugano e Locarno - 1958 Croqui de Franz Heep - Ed. Lausanne 1953
Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

Fachada av. Higienópolis do ed. Lugano e Locarno - 1958


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
290
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Caixilho de banheiro - Ed. Lausanne 1953


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
291
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Fachada - Ed. Lausanne 1953


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

Rampas frontais - Ed. Lausanne 1953


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
292
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Grade da porta do elevador - Ed. Lausanne 1953


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

Grampa da cozinha - Ed. Lausanne 1953


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
293
Adolf Franz Heep: edifícios residenciais
Um estudo da sua contribuição para a habitação coletiva vertical em São Paulo nos anos 1950 Edson Lucchini Jr.

Planta de forro - Cine Comodoro 1954


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer

Vista do fundo da sala de exibição - Cine Comodoro 1954


Fonte: Acervo pessoal de Aizik Helcer
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