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Linguagem visual em livros didáticos infantis

Solange Galvão Coutinho


Ph.D, Departamento de Design, Universidade Federal de Pernambuco
José Fábio Luna da Silva
Bacharel em Programação Visual, UFPE

Resumo
Uma eficaz apresentação gráfica do conteúdo pedagógico no livro didático infantil dependerá
do conhecimento prévio dos elementos estruturais da linguagem visual. Para isso, buscou-se
neste artigo, investigar os parâmetros de produção gráfica, legibilidade e ergonomia
informacional, além de identificar as divergências, através da análise dos livros adotados em
duas escolas do Recife (Pernambuco, Brasil) no ano de 2005. Os resultados apontam a
necessidade em se adequar forma e conteúdo, interagindo profissionais da área de Design e
de Educação, para que o processo de aprendizagem, nesses livros, seja eficiente e satisfatório.
Palavras-chave: linguagem visual, legibilidade, aprendizagem.

Abstract
An efficient graphic presentation of pedagogical content in children's textbooks will depend on
previous knowledge of visual language structural elements. To that end, this paper aimed to
investigate the parameters of graphic production, legibility and informational ergonomics,
identifying divergences through the analysis of textbooks adopted by two schools in Recife
(Pernambuco, Brazil) in 2005. The results point out to the need of adjusting form and content,
and the promotion of professional interaction in the fields of design and education so that the
learning process in these books turns out to be efficient and satisfactory.
Keywords: visual language, legibility, learning.
Introdução

O livro didático ainda é um dos artefatos de aprendizagem mais


utilizados, e em muitos casos, o único instrumento empregado em sala de aula.
Dessa forma, entendemos que se faz necessário um estudo acerca da sua
configuração gráfica, pois a partir desta avaliação a criança poderá adquirir, de
maneira mais eficiente, os conhecimentos escolares necessários ao Ensino
Fundamental.
A realidade da sociedade capitalista racionaliza o sistema
produtivo, privilegiando o universo adulto, tornando o lúdico - aspecto
fundamental no processo criativo da criança - num elemento descartável, sem
objetivos concretos. Aliado a isso observamos que o crescimento econômico
das cidades acarreta num processo de desintegração dos grupos infantis, pela
falta dos espaços livres e conseqüente isolamento da criança. As implicações
são traduzidas na repressão e enfraquecimento da produção cultural infantil.
Este fato é também refletido no tratamento gráfico empregado aos livros
didáticos infantis, que em muitos casos, não são reconhecidos ou identificados
pelo universo lúdico das crianças (CORDEIRO, 1987). Da mesma maneira, o
tratamento (conteúdo-forma) imposto ao livro pouco respeita o repertório e o
contexto sócio-cultural do aluno.
Verifica-se, portanto, que o estudo da linguagem e percepção visual é
primordial para a concepção de um projeto gráfico baseado no universo lúdico
e cultural da criança. Também é coerente lembrar que os demais profissionais
envolvidos, como autores, professores, ilustradores e editores, estejam
conscientes da importância da ‘experiência visual’ para a assimilação das
mensagens gráficas na fase inicial de aprendizagem.
Diante do exposto, este artigo propõe uma investigação dos parâmetros e
recomendações direcionadas à peça gráfica em questão e, assim, identificar os
problemas nos livros adotados nas escolas durante o ano de 2005. Isto é
discutido à luz do design através da análise dos aspectos de produção e uso da
linguagem gráfica1.

Experiência visual e psicologia da Gestalt

A construção de um sistema visual que auxilie na configuração de uma


mensagem tanto para quem emite como para quem recebe é fundamental, pois

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com o avanço tecnológico e com a velocidade de emissão da informação, o
sentido da visão está cada vez mais sendo requisitado. Tal qual a linguagem
verbal, é preciso tornar a visual um dos meios de comunicação que constitua
um conjunto de normas, códigos e preceitos para se alcançar uma ‘experiência
visual’ plena, defendido por Dondis (1999) como “alfabetismo visual”. Na busca
desse ‘alfabetismo’ e no aperfeiçoamento de regras para a composição da
mensagem visual, ele nos afirma que:

“[...] A sintaxe visual existe. Há linhas gerais para a criação de


composições. Há elementos básicos que podem ser aprendidos e
compreendidos por todos os estudiosos dos meios de comunicação
visual, sejam eles artistas ou não, e que podem ser usados, em
conjunto com técnicas manipulativas, para a criação de mensagens
visuais claras. O conhecimento de todos esses fatores pode levar a
uma melhor compreensão das mensagens visuais” (DONDIS, 1999,
p. 18).

Porém, o autor complementa que o referido sistema jamais poderá ser


tão lógico e preciso quanto a linguagem, já que esta é composta de elementos
criados pelo homem para codificar, armazenar e decodificar informações. A
lógica da estrutura que compõe as linguagens não é alcançada pela
‘experiência visual’, já que a característica dominante da sintaxe visual é a
complexidade, sustentada pelos estados psicológicos e condicionamentos
culturais de cada indivíduo.
Os elementos básicos para a comunicação visual, além de objetos e
experiências, são ferramentas imprescindíveis no processo de construção
dessas mensagens. O ponto, a linha, a forma, a direção, o tom, a cor, a textura,
a escala (ou proporção), a dimensão e o movimento são planejados e
expressos, através de manipulação por via de técnicas visuais (ou leis visuais),
todas as variedades de manifestações visuais, objetos, experiências e
ambientes.
Essas técnicas devem ser aplicadas com o objetivo de encontrar
soluções gráficas no processo de comunicação visual, garantindo a
transmissão da mensagem. Observa-se que o contraste é a mais dinâmica
delas por ter uma grande variedade de aplicação e proporcionar um melhor
entendimento visual em várias situações. Uma observação que precisa ser
enfatizada é que o uso do contraste deve ser sempre relacionado às variantes

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da harmonia, sua técnica oposta, em decorrência do tipo de mensagem a ser
composta graficamente (DONDIS, 1999).

Percepção visual

Perceber e produzir imagens são qualidades inerentes à natureza


humana. Isto é observado através dos registros figurativos nas cavernas, desde
os tempos Pré-históricos. Partindo desse princípio, podemos evidenciar o
potencial educacional dos elementos visuais e reafirmar, junto a Dondis (1999)
e Calado (1994), que é necessário preparar e conscientizar os indivíduos da
necessidade da ‘experiência visual’, fazendo-os entender a relação desses
elementos como uma linguagem de comunicação efetiva.
Dondis (1999) nos esclarece que o processo de composição é o passo
mais difícil para se obter às soluções de problemas visuais, já que é o resultado
das decisões, nesta etapa, que determina o objetivo e o significado da
mensagem visual, influenciando definitivamente na compreensão obtida pelo
receptor. Mas como devemos, no modo visual, oferecer sistemas estruturais
definitivos e absolutos para perfeita compreensão da mensagem, diante dos
complexos meios visuais?
É certo que, em termos lingüísticos, as regras são definidas através da
sintaxe, que distribui as palavras segundo a forma e uma ordenação adequada.
Isso não ocorre no campo das mensagens visuais, pois não há regras
absolutas e o potencial sintático neste caso, provém da investigação do
processo da percepção humana. Sob esse aspecto, a psicologia da Gestalt tem
contribuído com preciosos estudos no campo da percepção visual, ajudando a
formular ou conhecer padrões visuais para a compreensão da organização
visual de determinada mensagem.

Princípios da Gestalt

Por volta de 1910, se deu início ao desenvolvimento da relação entre a


psicologia e o design, com base na Escola de Psicologia Experimental. Este
fato é decorrente das grandes mudanças na arte e no design. De acordo com
Gomes Filho (2004), a Gestalt, palavra alemã que pode ser traduzida como
“estrutura”, “figura” ou “forma”, constitui a combinação de vários elementos para
formar um todo e isso é essencial para o design gráfico. Estes pressupostos

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estão calcados no princípio de Max Wertheimer, que em 1912 publica um
ensaio sobre percepção visual, onde afirma que “o olho humano tem a
tendência natural de agrupar as várias unidades para formar um todo e isso
conceitua a visão como uma experiência criativa” (HURLBURT, 1986, p. 136).
Em seguida, apresentaremos sinteticamente, os princípios mais
relevantes da psicologia da Gestalt, tão importantes para a ‘experiência visual’
plena:
• Atração e agrupamento
A lei do agrupamento tem grande valor para a composição gráfica, pois
proporciona a força de atração nas relações visuais, onde o homem tem
a necessidade de construir conjuntos a partir de unidades, ligando pontos
próximos (Figura 1A). No contexto desta lei, a ligação é feita por atração,
por proximidade ou por similaridade das formas, tamanho, textura ou tom
(Figura 1B).
• Positivo e negativo
Em linguagem visual, podemos dizer que o que domina a visão humana,
ou seja, o que mais chama a atenção na composição gráfica é
considerado como elemento positivo. Ao contrário, o que se apresenta de
maneira mais passiva, considera-se de elemento negativo. Mas há
momentos em que há pouco predomínio de um elemento sobre o outro e,
na busca pela solução mais simples do que se vê, o olho pode confundir
ou ter ambigüidade na tradução da mensagem (Figura 1C).
• Fechamento
Segundo Wertheimer (apud Gomes Filho, 2004) outro princípio da Gestalt
que é fundamental para a formação de unidades, além de possuir um
fator organizador da forma, é o fechamento. O senso de organização
espacial do olho humano faz com que exista uma tendência à unidade,
segregando uma superfície do resto do campo. Ou seja, esse princípio
traz no ser humano uma pré-disposição psicológica de unir intervalos e
estabelecer ligações por meio de formas já conhecidas do repertório
visual. Também estabelece unidades diferentes de intervalos (Figura 1D).

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Figura 1

• Áreas de percepção visual na página


Collaro (1996) nos esclarece que a vista humana, numa página impressa,
tende sempre a caminhar da seguinte forma: de cima para baixo, da
esquerda para a direita (ver Figura 2).
1 3 Sendo assim, classifica o lado superior
esquerdo de Zona Óptica Primária (ZOP)
do impresso (1). A descida, na diagonal,
para a esquerda, de áreas de maior
percepção visual (2), ou seja, a área que o
leitor privilegia precisa conter elementos de
informação importantes, porém nas demais
4 2 áreas (3 e 4), onde ocorre um menor foco
Figura 2 visual, é que o designer deve ter a
COLLARO,
1996, p.156. preocupação à sua valorização e
aproveitamento.

Parâmetros gráficos recomendados para livros infantis

Os aspectos que envolvem a configuração gráfica do conteúdo


informacional precisam estar coerentes quanto aos padrões ou recomendações
de legibilidade e ergonomia pré-estabelecidas pela literatura especializada.
Apresentaremos, a seguir, alguns desses aspectos, relevantes para o livro
didático infantil.

Cor:
Um projeto de comunicação visual bem elaborado trabalha com
compensações, levando em consideração o comportamento do olho humano
de acordo com a idade do leitor. A capacidade de acomodação do cristalino
diminui com o avanço da idade, provocando a presbiopia (dificuldade em ver
mais de perto), que solicita o uso de cores mais sóbrias e escuras para um

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maior relaxamento dos músculos ciliares. No caso contrário, o emprego de
cores luminosas, intensas e contrastantes, exige uma maior participação do
leitor, sendo adequado para leitores com pouca idade, caso específico das
crianças (GUIMARÃES, 2002).

Tipografia:
Dentre os vários estudos realizados entre os anos de 1902 a 1959, sobre
legibilidade nos livros infantis, iremos apresentar as diretrizes estabelecidas
pelas pesquisas de Burt (1959), que foram adotadas como referência para a
investigação realizada por Costa (2003) sobre legibilidade e tipografia nos livros
infantis.
Os padrões estabelecidos por Burt (1959) são referentes aos tamanhos
adequados do corpo da tipografia para determinada idade, considerando que
palavras para crianças com menos de nove anos devem ser bem espacejadas,
levando a uma melhor compreensão do conteúdo (Tabela 1).

Nº DE LETRAS POR
IDADE CORPO COLUNA ENTRELINHA
LINHA
(anos) (pontos) (cm) (cm)
(linha 10,16 cm)

Menor que 7 24 32 12.7 0.66


7-8 18 38 10.16 0.432
8-9 16 45 8.89 0.406
9-10 14 52 9.52 0.33
10-12 12 58 10.16 0.305
Maior que 12 11 60 11.43 0.254
Tabela 1: Parâmetros tipográficos para livros infantis, recomendados por Burt (1959).

Quanto às variações tipográficas, Walker (1992) menciona que o contato


com os vários tipos existentes, nos primeiros anos de aprendizagem escolar,
fará com que a criança fique mais ciente e confortável ao se deparar com as
possibilidades existentes à apresentação do texto, em várias situações do
cotidiano.

Imagem Pictórica:
Lins (2002) destaca o caráter da ilustração como característica peculiar
do livro infantil, pois assim como o texto - e, em alguns casos, até mais -, ela
possui grande importância às interpretações produzidas pelas crianças. Isso

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aliado a técnicas e recursos gráficos que enriquecem visualmente, atraindo o
olhar e aprimorando a percepção de seu público.
A importância das ilustrações nos livros infantis supera a condição única
de auxiliar o texto e passa a desempenhar uma função mais ativa na leitura, na
compreensão e no desenvolvimento da criança leitora (WERNECK, 1998).

Metodologia e análise

Pesquisa exploratória:
A pesquisa exploratória foi realizada no período de 7 a 29 de julho de
2005, através de visitas realizadas a duas escolas (uma da rede pública
municipal e uma da privada), com o objetivo de reunir o material para a análise.
O critério adotado para a escolha destes estabelecimentos foi o da
representatividade e/ou aceitação que cada um tem na sua respectiva rede de
ensino. Para a análise dos livros da rede pública, foi escolhida a Escola
Municipal Padre José de Anchieta2 e para a análise dos livros da rede privada,
o Colégio Boa Viagem3.
Os livros de 1ª série (Ensino Fundamental) coletados para análise,
adotados para o ano letivo de 2005 pela Escola Padre José de Anchieta (que,
para efeito do estudo, será considerada como Escola (1) foram os seguintes:
Português - Uma proposta para o letramento (Ed. Moderna); Caminhos da
Ciência – uma abordagem sócio-construtiva (Ed. IBEP); História e Geografia
(Ed. Ática); Vivência e Construção – Matemática (Ed. Ática). Já os livros do
mesmo nível escolar, adotados em 2005 pelo Colégio Boa Viagem Escola (2)
foram: Português - Uma proposta para o letramento (Ed. Moderna);
Redescobrir Ciências (Ed. FTD); História (Ed. Moderna); Geografia (Ed.
Moderna); Aprendendo e Compreendendo Matemática (Ed. Solução).
Para complementar a pesquisa exploratória foi realizada entrevista com a
coordenação pedagógica de cada escola com o objetivo de compreender o
processo de seleção, conhecer os profissionais envolvidos e os critérios
utilizados à escolha dos livros adotados.
A análise dos oito livros da amostra adotados pelas escolas 1 e 2, para o
ano letivo de 2005, foi realizada em duas etapas: a primeira, nomeada de
Análise Macro, contemplou os aspectos da produção gráfica e dos elementos
estruturais que compõem o livro como um todo; a segunda, chamada de
Análise Micro, fez uma abordagem mais específica e detalhada dos elementos

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que fazem parte da composição gráfica nas páginas características do livro
(capa, folha de rosto, sumário, unidade, capitular, página tipo).

Análise Macro: o livro


Dentre os vários tipos de impressões, acabamentos, formatos e tipos de
papéis utilizados para se confeccionar um livro, além das diferentes
possibilidades de estrutura em que o texto ou conteúdo informacional é
dividido, se pode afirmar que não existe uma regra ou um único padrão na qual
essa peça gráfica é apresentada.
Diante da amostra para a análise, observa-se a necessidade em avaliar
os aspectos acima mencionados, considerando que os livros são provenientes
de diferentes editoras, autores e, conseqüentemente, diferentes formas e
conteúdos. Para isso, foram elaboradas duas fichas para a Análise Macro: ficha
1: Produção gráfica; ficha 2: Elementos estruturais do livro.

Análise Micro: o projeto gráfico


A análise de um projeto gráfico não é uma tarefa simples, visto que ele
envolve vários elementos como: tipografia, formas, tonalidades, cores,
ilustrações, configurações e modos de simbolização da linguagem visual, entre
outros fatores que irão determinar a eficácia e coerência entre o conteúdo e a
forma.

Figura 3

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Para a realização dessa análise, foi elaborada a Ficha 3 (Figura 3), na
qual pode ser registrado o comportamento gráfico dos elementos acima
citados. Com o objetivo de identificar (ao comparar com os parâmetros e
padrões gráficos pré-determinados da linguagem visual, aliados às
considerações dos profissionais da área educacional), as possíveis falhas dos
projetos gráficos presentes no livros.
Partindo da informação de que cada livro possui, aproximadamente 200
páginas, a seleção destas foi elaborada seguindo os seguintes critérios:
1) As páginas que fazem parte da estrutura comum a todos os livros:
capa, folha de rosto, sumário, unidade e/ou capitular.
2) As páginas correspondentes ao conteúdo e atividades dos capítulos
foram chamadas de “páginas tipo”. Foram analisadas pelo menos quatro
‘páginas tipo’ da cada livro, escolhidas a partir da freqüência com que a
estrutura gráfica mais se repete. O posicionamento ou a numeração destas
páginas esteve distribuído ao longo do livro, contemplando os diferentes
momentos do conteúdo.
Após a análise individual das páginas e a análise geral dos livros, os
resultados obtidos foram tabulados, revelando o nível de ocorrência dos
diferentes aspectos gráficos já mencionados.

Discussão dos resultados

A pesquisa exploratória possibilitou ao presente estudo, uma breve


análise dos aspectos de produção e apresentação gráfica dos livros de 1ª Série
do ensino fundamental, oriundos das diferentes editoras neles representados.
Considerando que a produção gráfica dos livros da amostra não possui o
mesmo tipo de acabamento, pondera-se que: tendo como base os parâmetros
de produção gráfica mencionados por Oliveira (2000), os exemplares adotados
pela Escola (2) possuem uma maior resistência por apresentarem
acabamentos de laminação, plastificação ou encadernação em espiral. Neste
sentido, Lins (2002, p. 45) afirma que essa resistência é relevante tanto no
material (tipo de papel, impressão) como no acabamento (encadernação,
plastificação) para o manuseio característico das crianças da 1ª série, que, em
muitas ocasiões, “interagem com o livro tal qual um brinquedo”.
Esse tratamento mais resistente, apresentado nos livros da Escola (2),
deve-se ao fato de que a aquisição - segundo a coordenadora pedagógica,

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Profª Maria Aparecida da Costa - “é feita diretamente pela instituição e
conseqüentemente, possui autonomia junto às editoras”. Já na rede pública, de
acordo com a Profª Coema Maria Oliveira de Santana, coordenadora
pedagógica da Escola (1), essa aquisição acontece de maneira diferente: “os
livros devem estar na lista do PNLD (Plano Nacional do Livro Didático) do
Ministério da Educação e, além disso, indicados pela equipe técnica da
prefeitura”. Isso evidencia que o tratamento de produção gráfica dado aos livros
didáticos da rede pública está condicionado, ou deve se adequar, aos recursos
orçamentários do Governo Federal Brasileiro.
Introduzindo, agora, os aspectos pertencentes à Análise Micro, observa-
se através da Tabela 2, que todos os livros da amostra, foram utilizadas fontes
com corpo maior que 14 pontos e número de letras por linha entre 41 e 60. A
partir destas informações, verifica-se que o tamanho da letra está coerente
para os alunos da 1ª Série, já que Burt (1959) recomenda o corpo dos
caracteres entre 14 e 18 pontos com o objetivo de acomodar ou proporcionar
um maior conforto à leitura.

TIPOGRAFIA - Fonte Quantidade %


Uso de 1 tipo - -
Uso de 2 a 3 tipos 03 37,5%
Uso de mais de 3 tipos 06 75%
Tamanho do tipo (corpo) entre 10 e 12 - -
Tamanho do tipo (corpo) maior que 14 08 100%
Nº de letras por linha: 0 a 20 - -
Nº de letras por linha: 21 a 40 - -
Nº de letras por linha: 41 a 60 08 100%
Nº de letras por linha: 61 a 80 - -
Uso de fonte cursiva (tipo manuscrita) 03 37,5%
Uso de fonte display (tipo decorativa) 02 25%

Tabela 2: Resultados referentes à Tipografia.

Em relação ao número de caracteres utilizados por linha, os resultados


obtidos na análise não correspondem aos padrões recomendados por Burt
(1959), que aconselha o máximo de 38 letras por linha para alunos da 1ª Série
(ver Tabela 1). Percebe-se, então, que esse parâmetro não foi respeitado nos
livros da amostra, já que o número de caracteres por linha está entre 41 e 60.
De acordo com Burt, isso torna a coluna longa e, como conseqüência, um
ponto negativo à legibilidade, atração e comodidade do leitor infantil.

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Outro aspecto importante que deve ser registrado nesta discussão é o
uso da cor nos livros da amostra. Quanto à tonalidade, 62,5% deles
apresentaram a cor opaca (pura, forte) e, na mesma proporção, matizes frias
prevalecendo sobre as quentes. Este último resultado demonstra que esses
livros podem distanciar as crianças na medida em que se excede o emprego de
cores frias. Guimarães (2002, p.43) justifica essa afirmativa quando diz que: “o
emprego de cores luminosas, intensas e contrastantes, exige uma maior
participação do leitor, sendo adequado para leitores com pouca idade, caso
específico das crianças.”Se faz necessário, então, que nesses livros as cores
quentes tenham considerada participação, seja nas ilustrações ou com a
função de destacar e organizar a leitura.
Quanto à ocorrência dos tipos de simbolização do modo pictórico
encontrados nos livros da amostra, constatou-se que a fotografia foi bem mais
utilizada quando comparada com a ilustração (desenho), principalmente nos
livros de Ciências, História e Geografia. O uso exagerado de fotografias nesses
livros pode distanciar ou desestimular o aprendizado da criança, pois Lins
(2002, p.45) aconselha que “os livros destinados às crianças pequenas, em
fase inicial de aprendizagem, devem ser mais
coloridos, contendo bastantes ilustrações e com
pouca massa de texto para que o aprender caminhe
em conjunto com o prazer”. Ainda a esse respeito,
Cordeiro (1987) acredita que o livro para criança
deve ser diferenciado do livro para adulto, através
do uso de ilustrações próximas do seu repertório.
Seguindo o raciocínio dos autores citados
nesta discussão, ainda foram identificados
Figura 4: Capa Livro problemas consideráveis de legibilidade e atração
Matemática
(Fonte: editora SOLUÇÃO). visual na capa do livro de Matemática (Figura 4),
bem como a ausência de um projeto gráfico consistente no livro de Ciências da
Escola (2), possuindo vários desenhos, texturas, tamanhos e cores da
tipografia.

Conclusões

O trabalho do designer no planejamento visual dos livros didáticos infantis


é um fator determinante à boa assimilação da informação, principalmente para

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a criança da 1ª série do Ensino Fundamental, devido à participação qualitativa
deste profissional que utiliza, de forma lógica e criativa, os recursos legíveis e
funcionais da linguagem visual.
Através das análises da amostra, foi possível identificar a existência de
um acabamento gráfico diferenciado entre o livro oriundo da rede pública e o da
privada. As diferenças na qualidade e gramatura do papel, no revestimento da
capa (inexistente nos livros coletados na escola municipal) se deve ao fato de
que a instituição privada tem mais autonomia na compra desses livros,
enquanto que a pública depende dos recursos do Ministério da Educação.
Alguns aspectos relevantes da linguagem visual, obtidos na amostra: o
tamanho da coluna de texto é superior ao recomendado; a linguagem pictórica
predominante é a fotografia; e, as cores mais presentes são de matizes frias.
Esse resultado demonstra que os livros didáticos para crianças podem estar
perdendo o fator lúdico que tanto atraem sua atenção. Este é um dos pontos
que pode ser aprofundado, em pesquisa posterior, abrangendo um número
representativo de livros didáticos, para se chegar a um resultado significante
sobre esta questão.

Referências Bibliográficas

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Currículos Resumidos

Solange Galvão Coutinho. Professora e pesquisadora do Curso de Design da


UFPE (1984-atual). Ph.D em Tipografia e Comunicação Gráfica, Universidade
de Reading, Inglaterra (1998). Presidente da Comissão de Especialista da
área de Design SESu-MEC, Consultora do INEP-MEC. Membro da Equipe do
Centre de Recherche Images et Cognitions (CRIC) da Université Paris 1 -
Panthéon Sorbonne.

José Fábio Luna da Silva. Bacharel em Programação Visual, Coordenador da


Equipe de Design Editorial para livros didáticos (Educação infantil e Ensino
Fundamental – 1ª a 4ª série) do Colégio Boa Viagem e membro do Núcleo
Audiovisual do Tribunal de Justiça de Pernambuco.

Notas

1
Para o estudo da linguagem gráfica, adotamos os conceitos propostos por Twyman (1979,
p.118), sendo ‘gráfico’ aquilo que é desenhado ou feito visível em resposta a decisões
conscientes e ‘linguagem’ como o veículo de comunicação.
2
Endereço: Rua Capitão Adolfo Taquis, s/nº, Mustardinha - Recife - PE - Telefone: 81 3232-
2273.

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3
Endereço: Rua Professor Eduardo Wanderley Filho, 539, Boa Viagem - Recife - PE -
Telefone: 81 3465-4444.

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