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Semiótica e

Percepção Visual
Prof. Jorge Elias Dolzan

Indaial – 2020
1a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2020

Elaboração:
Prof. Jorge Elias Dolzan

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

D665s

Dolzan, Jorge Elias

Semiótica e percepção visual. / Jorge Elias Dolzan. – Indaial:


UNIASSELVI, 2020.

217 p.; il.

ISBN 978-65-5663-289-6
ISBN Digital 978-65-5663-284-1

1. Semiótica. - Brasil. 2. Percepção visual. – Brasil. II. Centro


Universitário Leonardo da Vinci.

CDD 745.2

Impresso por:
Apresentação
Para iniciar o estudo relacionado à disciplina de Semiótica e à
Percepção Visual é necessária uma breve contextualização destas duas
temáticas, tão pertinentes à formação de profissionais ligados às áreas de
projeto, planejamento e criação. A noção de que processos criativos resultem
em produtos/serviços para o mercado, que precisa perceber estes produtos
não apenas como necessários utilitariamente, mas como carregados de
significados e sentidos, pode contribuir para demonstrar a importância da
semiótica e da percepção visual na formação de profissionais ligados às
áreas de projeto de produto (seja ele gráfico, industrial, moda, interiores,
arquitetura, entre outros).

Afinal de contas é preciso ter um vasto repertório visual para dar


forma às ideias que serão geradas nos processos criativos de projeto. Ainda,
é preciso entender que existe uma teoria que dá conta dos processos de
significação e da linguagem visual, na qual temos pouca formação em nossa
passagem escolar – há um peso considerável no letramento, mas poucas
são as metodologias de ensino escolar que dão ênfase à linguagem visual. E
quando optamos por áreas profissionais ligadas ao projeto – e aqui entram
a arte (em todos os seus manifestos); a arquitetura; o design; entre outras;
carecemos de tal formação.

Em paralelo à importância do “letramento” visual – da capacidade de


ler e produzir formas e elementos visuais; somos cobrados profissionalmente
pela capacidade de entregar conceitos – dar e entender os significados por
trás dos textos visuais, ou seja, de que nossos produtos possam se vender
por si só, que o resultado de nosso trabalho seja entendido pelo nosso cliente.
Além de que precisamos, de certa forma, buscar muitos destes conceitos nos
contextos em que está inserido o público-alvo dos nossos projetos. De certa
forma, além de ter o “letramento” visual precisamos saber o que vamos
“escrever” visualmente. E aí entra a semiótica, como uma ciência que dá
conta, sob certa perspectiva, desta leitura de mundo e de como podemos
produzir para que este mesmo mundo compreenda.

Cada vez mais nos vemos inseridos em uma sociedade onde as


relações sociais estão pautadas na imagem e na capacidade de comunicação
que o mundo visual (e audiovisual) proporciona. Dentro disso, a percepção
visual se torna impactante, à medida que o entendimento de como
percebemos e compomos o mundo à nossa volta vem se tornando ferramenta
diferenciadora para o sucesso pessoal e profissional. Em outra perspectiva,
mas referente ao mesmo objeto, vemos que a capacidade de interpretar
coerentemente os elementos de comunicação e a inteligência de darmos
sentido ao que queremos comunicar, tem base operacional na Semiótica –
que de forma introdutória pode ser entendida como a “ciência que estuda
os signos”.
A junção destas duas áreas (Semiótica e Percepção Visual) tem
coerência, mas nos coloca num cenário complexo e denso em abordagens a
ser trabalhada em uma disciplina. Desta forma, além de fazer um recorte dos
teóricos, vamos, num primeiro momento, dividir as duas temáticas, tratando
da semiótica e depois da percepção visual, para então ao final unir as duas,
dando conta do objetivo geral da disciplina: desenvolver a capacidade de
análise e crítica a partir da noção de percepção visual com base na semiótica.

O livro didático está estruturado em três unidades, com a pretensão de


discutir os temas: a semiótica, a percepção visual e a semiótica e a percepção
visual nos processos de design.

Na Unidade 1, estudaremos a semiótica. Serão tratados os conceitos


introdutórios de semiologia e semiótica. E, de forma específica, serão
trabalhadas definições sobre a semiologia e o plano de expressão e plano de
conteúdo; e sobre a semiótica e a tricotomia do signo: ícone, índice e símbolo.

Na Unidade 2, estudaremos a percepção visual. Abordaremos a


percepção visual e aprofundamentos nas leis da organização da forma:
Gestalt; e nos princípios, técnicas e elementos básicos da composição.

Na Unidade 3, estudaremos a semiótica e a percepção visual nos


processos de design; com análise de casos que permitam a aplicabilidade da
semiótica na percepção visual, identificando as categorias de conteúdo nos
formantes da macroestrutura dos textos não verbais.

Estas unidades dão conta de suportar a disciplina Semiótica e Percepção


Visual que tem como objetivo geral o desenvolvimento da capacidade
do discente de analisar e criticar projetos de design, a partir da noção de
percepção visual com base na semiótica. Contextualizando estas duas áreas,
esta apresentação permite que sejam observados que a disciplina pretende
proporcionar aos alunos a instrumentalização necessária ao desenvolvimento
de exercícios teóricos e práticos relacionados à semiótica e à percepção
visual; promover o entendimento da semiótica como ciência base para
o desenvolvimento de projeto de design; sensibilizar e instrumentalizar
o discente para o uso, intencional, de elementos da linguagem visual; e
potencializar a capacidade analítica e crítica do discente com base em
fundamentos que suportem seus posicionamentos profissionais.

Ciente de que alcançar estes objetivos está relacionado diretamente


com o comprometimento de todos os envolvidos, desejamos bons estudos e
sucesso!

Prof. Jorge Elias Dolzan


NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

LEMBRETE

Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela


um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro


que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá
contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares,
entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


Sumário
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA................................................................................................................ 1

TÓPICO 1 — EFEITOS DE SENTIDO NO PROCESSO SEMIÓTICO........................................ 3


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................................... 3
2 EFEITOS DE SENTIDO NO PROCESSO SEMIÓTICO............................................................... 3
RESUMO DO TÓPICO 1....................................................................................................................... 8
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................. 9

TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA.................. 11


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 11
2 BASES INICIAIS DE SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA................................................................. 11
3 SEMIOLOGIA..................................................................................................................................... 15
4 SEMIÓTICA......................................................................................................................................... 19
4.1 A PRIMEIRIDADE......................................................................................................................... 21
4.2 A SECUNDIDADE........................................................................................................................ 22
4.3 A TERCEIRIDADE........................................................................................................................ 22
5 CATEGORIAS DO SIGNO.............................................................................................................. 23
6 TRICOTOMIA DO SIGNO.............................................................................................................. 24
6.1 REPRESENTÂMEN....................................................................................................................... 25
6.2 INTERPRETANTE......................................................................................................................... 31
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 40
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 41

TÓPICO 3 — A SEMIOLOGIA E A SEMIÓTICA.......................................................................... 43


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 43
2 A SEMIOLOGIA E O PLANO DE EXPRESSÃO E PLANO DE CONTEÚDO....................... 43
3 A SEMIÓTICA E A TRICOTOMIA DO SIGNO: ÍCONE, ÍNDICE E SÍMBOLO................. 47
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 52
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 55
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 56

REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 63

UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL............................................................................................. 65

TÓPICO 1 — PERCEPÇÃO VISUAL – FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA VISÃO..................... 67


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 67
2 PERCEPÇÃO VISUAL – FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA VISÃO..................................... 68
3 FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA VISÃO................................................................................... 72
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 79
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 80
TÓPICO 2 — AS LEIS DA ORGANIZAÇÃO DA FORMA: GESTALT...................................... 83
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 83
2 AS LEIS DA GESTALT....................................................................................................................... 83
3 PRINCÍPIOS DA COMPOSIÇÃO DA GESTALT........................................................................ 88
3.1 UNIDADE....................................................................................................................................... 88
3.2 SEGREGAÇÃO.............................................................................................................................. 89
3.3 PROXIMIDADE............................................................................................................................. 90
3.4 SEMELHANÇA............................................................................................................................. 90
3.5 UNIFICAÇÃO................................................................................................................................ 91
3.6 FECHAMENTO............................................................................................................................. 92
3.7 CONTINUIDADE.......................................................................................................................... 93
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 94
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 95

TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO....... 101


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 101
2 OUTROS PRINCÍPIOS E TÉCNICAS.......................................................................................... 101
2.1 HARMONIA................................................................................................................................. 101
2.2 CONTRASTE................................................................................................................................ 102
2.3 EQUILÍBRIO................................................................................................................................. 105
2.4 EQUILÍBRIO E INSTABILIDADE............................................................................................. 108
2.5 REGULARIDADE E IRREGULARIDADE............................................................................... 108
2.6 SIMPLICIDADE E COMPLEXIDADE...................................................................................... 109
2.7 UNIDADE E FRAGMENTAÇÃO............................................................................................. 109
2.8 ECONOMIA E PROFUSÃO....................................................................................................... 110
2.9 MINIMIZAÇÃO E EXAGERO................................................................................................... 111
2.10 PREVISIBILIDADE E ESPONTANEIDADE.......................................................................... 111
2.11 ATIVIDADE E ESTASE............................................................................................................. 112
2.12 SUTILEZA E OUSADIA........................................................................................................... 112
2.13 NEUTRALIDADE E ÊNFASE.................................................................................................. 113
2.14 TRANSPARÊNCIA E OPACIDADE....................................................................................... 113
2.15 ESTABILIDADE E VARIAÇÃO............................................................................................... 114
2.16 EXATIDÃO E DISTORÇÃO..................................................................................................... 114
2.17 PLANURA E PROFUNDIDADE............................................................................................. 115
2.18 SINGULARIDADE E JUSTAPOSIÇÃO.................................................................................. 115
2.19 SEQUENCIALIDADE E ACASO............................................................................................ 116
2.20 AGUDEZA E DIFUSÃO........................................................................................................... 116
2.21 REPETIÇÃO E EPISODICIDADE........................................................................................... 117
3 ELEMENTOS VISUAIS................................................................................................................... 118
3.1 O PONTO...................................................................................................................................... 118
3.2 A LINHA....................................................................................................................................... 120
3.3 A FORMA..................................................................................................................................... 121
3.4 A DIREÇÃO.................................................................................................................................. 122
3.5 O MOVIMENTO.......................................................................................................................... 123
3.6 A ESCALA.................................................................................................................................... 124
3.7 A DIMENSÃO.............................................................................................................................. 126
3.8 A TEXTURA.................................................................................................................................. 127
3.9 O TOM........................................................................................................................................... 128
3.10 A COR.......................................................................................................................................... 129
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 132
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 138
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 139

REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 143
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL.............................................................. 145

TÓPICO 1 — A PERCEPÇÃO VISUAL E OS PRINCÍPIOS DE ESTILO................................. 147


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 147
2 PRINCÍPIOS E HABILIDADES DE ESTILO.............................................................................. 148
3 OS DOIS ESTÁGIOS DO PROCESSAMENTO VISUAL........................................................ 148
4 A PRIMEIRA PERCEPÇÃO GLOBAL.......................................................................................... 150
5 A HIPÓTESE VISUAL..................................................................................................................... 151
RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 158
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 159

TÓPICO 2 — ANÁLISE DICOTÔMICA........................................................................................ 163


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 163
2 ANÁLISE DICOTÔMICA: A LEITURA COM BASE NA SEMIOLOGIA OU
SEMIÓTICA SAUSSUREANA...................................................................................................... 163
3 PLANOS DE EXPRESSÃO E CONTEÚDO................................................................................. 164
3.1 PLANO DE EXPRESSÃO........................................................................................................... 164
3.2 PLANO DE CONTEÚDO........................................................................................................... 166
4 ANÁLISE DICOTÔMICA: PLANO DE EXPRESSÃO E PLANO DE CONTEÚDO........... 166
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 175
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 176

TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA...................................................................................... 179


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 179
2 ANÁLISE TRICOTÔMICA: A LEITURA COM BASE NA SEMIÓTICA DE PEIRCE....... 179
3 ANÁLISE TRICOTÔMICA: AS CATEGORIAS DO OBJETO – ÍCONE, ÍNDICE
E SÍMBOLO........................................................................................................................................ 185
4 REFERÊNCIAS ICÔNICAS............................................................................................................ 194
5 REFERÊNCIAS INDICIÁTICAS .................................................................................................. 195
6 REFERÊNCIAS SIMBÓLICAS....................................................................................................... 196
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 197
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 203
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 204

REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 207
UNIDADE 1 —

SEMIÓTICA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender as noções de sentido dentro da noção de representação


sígnica;

• aprender o que é signo e como se dá o processo de significação;

• conhecer os conceitos de semiologia e semiótica como fundamento para o


entendimento de semiótica;

• refletir acerca da capacidade humana de interpretar e produzir signos;

• potencializar a capacidade analítica e crítica de leitura de objetos sígnicos


com base na semiologia (plano de expressão e plano de conteúdo) e na
semiótica (ícone, índice e símbolo).

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – EFEITOS DE SENTIDO NO PROCESSO SEMIÓTICO

TÓPICO 2 – CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E


SEMIÓTICA

TÓPICO 3 – A SEMIOLOGIA E A SEMIÓTICA

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

1
2
TÓPICO 1 —
UNIDADE 1

EFEITOS DE SENTIDO NO PROCESSO SEMIÓTICO

1 INTRODUÇÃO
Desde sua origem, o ser humano se questiona como as coisas são capazes
de significar outras coisas. Tanto que organizou pensamento para explicar
inúmeros fenômenos naturais, alguns atribuiu às divindades, outros à observação
do próprio fenômeno e, para alguns se utilizou de métodos, que chamou de
ciência. As divindades gregas, por exemplo, davam conta de explicar fenômenos
naturais. A observação do amanhecer e do anoitecer deu conta de explicar que o
sol girava em torno da Terra, que depois pelo método científico foi reorganizando
colocando a Terra como um astro que gira sobre si mesmo e ao redor do Sol.

Tanto o movimento dos astros quanto os fenômenos naturais observados


são objetos que surgiram da capacidade de investigação humana. Parecendo suprir
a necessidade e a vontade humana de dar conta de explicar, de alguma forma,
o que lhe atinge. E a semiótica ocupa posição privilegiada nesse processo, se
entendermos, inicialmente, que se trata da ciência geral dos signos. Veremos que,
onde houver abordagens acerca de coisas e seus significados, ela se fará presente.

Neste primeiro tópico vamos compreender as noções de sentido dentro


da noção de representação sígnica, contribuindo para a reflexão acerca da
capacidade humana de interpretar e produzir signos. Também potencializamos
a capacidade analítica e crítica de leitura de objetos sígnicos com base na
semiologia (Plano de Expressão e Plano de Conteúdo) e na semiótica (Ícone,
Índice e Símbolo).

2 EFEITOS DE SENTIDO NO PROCESSO SEMIÓTICO


Somos seres capazes de dar sentido a tudo que nos relacionamos. Quantas
vezes você vivenciou situações onde o uso de uma determinada roupa durante o
êxito de um time de futebol fez com que esta mesma roupa fosse usada nas próximas
partidas do mesmo time, na ideia de existir sentido entre o uso de determinada
peça do vestuário e a vitória dele? Note, que as duas coisas provavelmente não
tenham sentido algum, passam a ter sentido para uma determinada pessoa em
uma determinada ocasião – aí está um exemplo de como o ser humano é um
produtor de sentido por excelência.

3
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

Esta mesma lógica ocupa o fazer promocional de um projetista que, ao


definir uma cartela de cores visa dar um sentido a sua coleção. Isso vale também
para a cartela de tecidos, de texturas, de aviamentos. Todavia, diferente do
exemplo do time de futebol, os sentidos aqui deverão ser partilhados por outros
– pelo mercado, pelo público-alvo.

Esta noção de “sentido” é importante ser entendida para que possamos


iniciar nosso entendimento sobre a semiótica. Então, de forma introdutória,
trataremos sobre o “sentido”.

NTE
INTERESSA

A abordagem sobre “sentido” pode se limitar ao entendimento que você tem


do dia a dia. Que tal buscar o conceito do termo “sentido” em um dicionário? Quanto tem
relação com o seu fazer profissional?

Veja os que podem ser encontrados:

1. Que se ofende ou melindra facilmente; suscetível, sensível.


2. Que causa pesar; plangente, lamentoso, "canto SENTIDO".
3. Repassado de mágoa; ressentido, magoado.
4. Que está em começo de decomposição, um tanto podre ou estragado.
5. Substantivo masculino (FISIOLOGIA) – faculdade de perceber uma modalidade
específica de sensações, que correspondem a órgãos determinados [são cinco os
sentidos: tato, visão, audição, paladar e olfato.].
6. Substantivo masculino – faculdade de sentir ou perceber, de compreender; senso.
7. Substantivo masculino – faculdade de julgar; bom senso, tino.
8. Substantivo masculino – aquilo que se pretende alcançar quando se realiza uma ação;
alvo, fim, propósito. "suas últimas ações não tiveram SENTIDO nenhum".
9. Substantivo masculino – ponto de vista, modo de considerar; aspecto, face. "em que
SENTIDO você está falando?"
10. Substantivo masculino – encadeamento coerente de coisas ou fatos; lógica, cabimento.
"a renúncia do ministro não tem SENTIDO".
11. Substantivo masculino – consciência, razão, discernimento (mais us. no pl.). "recuperou
os SENTIDOS depois de meses em coma".
12. Substantivo masculino – concentração da atividade mental; atenção, pensamento. "ele
estuda, mas com o SENTIDO na televisão".
13. Substantivo masculino – aplicação dos sentidos para evitar (algo ruim); cuidado, cautela.
"tenha SENTIDO no que faz".
14. Substantivo masculino – orientação segundo a qual se efetua um movimento. "SENTIDO
horário".
15. Substantivo masculino (FILOSOFIA) – faculdade de captar determinada classe ou
grupo de sensações, estabelecendo um contato intuitivo e imediato com a realidade, e
assentando desta maneira os fundamentos empíricos do processo cognitivo.
16. Substantivo masculino (LEXICOGRAFIA•LEXICOLOGIA) – cada um dos significados de
uma palavra ou locução; acepção.

4
TÓPICO 1 — EFEITOS DE SENTIDO NO PROCESSO SEMIÓTICO

17. Substantivo masculino (LINGUÍSTICA•LÓGICA) – aquilo que uma palavra ou frase


podem significar num contexto determinado; significado. "falam em relatividade, no
sentido einsteiniano do termo".
18. Conjunto de funções da vida orgânica que buscam experimentar o prazer físico, a
sensualidade.
19. Faculdades intelectuais; o raciocínio.
20. Interjeição expressa cautela, advertência, recomendação.
21. Interjeição (MILITAR – TERMO) – voz de comando para chamar a atenção da tropa.

São muitos os conceitos, atenção aos de número: 5, 6, 7, 15, 16, 17, 18 e 19; estes
ficam mais em linha ao SENTIDO que se quer para “sentido” em nossa abordagem.

FONTE: https://www.google.com/search?q=SENTIDO&oq=SENTIDO&aqs=chrome.
.69i57j0l7.980j1j4&sourceid=chrome&ie=UTF-8. Acesso em: 23 set. 2020.

O termo sentido pode ser compreendido como o processo fisiológico de


receber e reconhecer as sensações e os estímulos que nos chegam através dos
cinco sentidos – visão, audição, olfato, tato e paladar.

Este processo ancora a base conceitual de semiótica, afinal, se estamos


tratando, como já foi dito, da ciência que estuda o signo; a capacidade de receber
e reconhecer as sensações e os estímulos que nos chegam e acabam tendo algum
significado, é relevante. O entendimento para esta atividade de dar sentido aos
fenômenos se ajusta à ideia de “semiose”.

TUROS
ESTUDOS FU

O significado de semiose vai aparecer mais à frente. Neste momento, é


interessante considerar que semiose é o processo cognitivo humano, ou seja, é o processo
que ocorre quando elaboramos qualquer raciocínio lógico para interpretar fenômenos que
nos chegam pelos sentidos.

É importante considerar então que os seres humanos são produtores de


sentido por excelência (HOHLFELDT; MARTINO; FRANÇA, 2014), para que se
possa assegurar que haverá sentido em tudo, basta que o ser humano interfira
de forma intencional. Ao passearmos na rua, encontramos inúmero objetos, e
aplicamos, de alguma forma, uma atividade semelhante à da leitura: no nosso
dia a dia passamos nosso tempo a ler. Lemos primeiro imagens, formas, gestos,
posturas, comportamentos: tal cor nos chama a atenção, tal celular nos diz o
status social de seu proprietário, tal roupa nos diz da dose de excentricidade de
seu portador. Sim! Nestas leituras, além de receber os estímulos, reconhecemos
em nosso repertório e damos certo sentido – ou seja, certo significado.

5
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

Ao olharmos para a história, encontraremos exemplos do ser humano ser


um produtor de sentidos – um bom exemplo disso está na arte, na arquitetura,
na própria indumentária. Cada um em sua época, a partir dos fenômenos
vividos, produziu objetos de acordo com seus contextos – e, em alguns casos,
entregaram para a humanidade documentos capazes de representar (de
significar) seu período.

DICAS

Escolha uma obra de um artista famoso! Uma pintura, uma escultura, uma
música. Faça uma busca na internet e veja o quanto esta obra representa para a época em
que foi criada – note que ela é capaz de representar uma época!

A capacidade de dar sentido às coisas coloca o ser humano na condição de


ser um ser significador, pois para ele uma cor, um desenho, um cheiro, um barulho,
tudo pode significar alguma coisa. Este processo está diretamente relacionado com
a capacidade deste ser humano de interagir com seu ambiente. Afinal, o processo
de significação – a princípio – é um processo de interação do ser humano com os
fenômenos de seu ambiente, conhecido como processo fenomenológico.

DICAS

Para ajudar neste entendimento da capacidade de significarmos através de


processos fenomenológicos, assista ao curta de comédia romântica “Signs”, de 2008.
Apresentado no Schweppes Short Film Festival 2009, o curta-metragem foi premiado com
o Ouro na categoria Cyber, do Cannes Lions International Advertising Festival, em 2009. Foi
dirigido por Patrick Hughes, estratégia proposta pela agência neozelandesa Publicis Mojo
para a subsidiária do Coca-Cola Group. Foi um dos vídeos mais vistos na Internet naquele
ano (2009). Acesse o link: https://youtu.be/H0QoU59B37E. Acesso em: 15 ago. 2020.

6
TÓPICO 1 — EFEITOS DE SENTIDO NO PROCESSO SEMIÓTICO

Ainda abordando a noção de sentido, podemos fazer a seguinte reflexão:


“um objeto só tem sentido se for sentido”. Perceba que o verbo sentir aqui oferece
duas maneiras de ser interpretado, a primeira na capacidade de representar (de
significar); e a segunda na capacidade de tocar nossos sentidos – seja o da visão,
da audição, do olfato, do tato e/ou do paladar.

O ponto de honra desse pensamento que interessa à abordagem semiótica


é a noção de efeito de sentido. Os objetos, não apenas têm sentido, mas são
sentidos. “Produzir sentido não é transmitir algo já dado, mas construir uma
dimensão sensível em ato de troca” (HOHLFELDT; MARTINO; FRANÇA,
2014, p. 290). Interessante isso, pois muitas coisas que passam a ter sentido para
a gente, ganham sentido quando nos permitimos interagir (promover “atos de
troca”) com esta coisa. Mais interessante é que a cada nova interação com esta
mesma coisa, podemos construir novos sentidos. Fica evidente aqui que é a ação
intencional que parece mover esta capacidade de dar sentido.

Perceba que um produto de moda, carregado de conceito e em linha com


uma tendência de consumo, precisa apresentar em sua composição elementos que
produzam o sentido desejado pela marca, e construam um espaço sensível de troca.
Como exemplo, podemos pensar este produto composto não apenas pela roupa,
mas com um tag, uma arara, com uma vitrina, posicionado em uma loja, que tem
uma iluminação, uma música ambiente, uma fragrância, que se bem trabalhado
estimularão o ato de troca – ou seja, vão promover discursos e interações que serão
experenciados por parte do consumidor, induzindo-o ao entendimento do conceito
de coleção e ao estilo que a marca está comercializando. Desta forma, o processo de
significação é resultado de um processo relacional onde se tem as propriedades da
coisa e as potencialidades de significar desta coisa.

7
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• O ser humano é um ser produtor de sentido por excelência.

• Sentido tem uma variedade de significados, mas é importante entendê-lo


como a faculdade de perceber uma modalidade específica de sensações, que
correspondem a órgãos determinados; faculdade de sentir ou perceber, de
compreender; senso; como a faculdade de julgar; bom senso, tino, e como
faculdade de captar determinada classe ou grupo de sensações, estabelecendo
um contato intuitivo e imediato com a realidade, e assentando desta maneira
os fundamentos empíricos do processo cognitivo.

• É importante entender o sentido como cada um dos significados de uma palavra


ou locução; acepção; como aquilo que uma palavra ou frase podem significar
num contexto determinado; seu significado; tem a ver como o raciocínio.

• A noção de “sentido” é importante para que possamos iniciar o entendimento


sobre a semiótica, à medida que esta noção tenha relação com a semiose.

8
AUTOATIVIDADE

1 Uma forma de exercitar o conteúdo até agora é aproveitar uma saída sua
pelas lojas de sua cidade. Escolha uma vitrine específica e procure tirar
delas algumas afirmações. Qual é o público-alvo da loja? Que tipo de
produto vende? É possível arriscar o valor médio de um produto? Qual
seria o diferencial da loja? E, então, aponte quais os elementos da vitrine
que deram estes sentidos para você?
Vamos praticar tomando como base uma das vitrines da rede De Fursac:

VITRINE E SEUS SENTIDOS

FONTE: <https://i2.wp.com/farm6.static.flickr.com/5301/5660386039_bde9ceb848.
jpg?zoom=2>. Acesso em: 12 abr. 2020.

Qual o público-alvo da loja? Que tipo de produto vende? É possível arriscar


o valor médio de um produto? Qual seria o diferencial da loja? Com base nos
elementos da vitrine que dão sentidos é possível afirmar:

I- Uma primeira coisa: o que é sentido para você é correto, afinal, sentimos
coisas diferentes, o que importa neste momento é que exista lógica.
II- A vitrine da imagem nos declara alguns sentidos: o do público-alvo ser
masculino; vende trajes masculinos, como ternos. Dá para arriscar que a
alfaiataria seria um diferencial, e que os valores colocam a loja como de
produtos caros.
III- Os objetos que dão sentido, são: os dois manequins masculinos; o traje que
cada um está vestido; os elementos explodidos que fazem menção a camisaria
e acessórios (caso das gravatas) sugerem alfaiataria, e o conceito clean –
minimalista, cujo estilo (tanto no design, quanto na arquitetura) induz a um
determinado perfil de consumidor, voltado mais para a classe A.
IV- É impossível perceber que uma vitrine é uma peça de comunicação,
pois, mesmo bem trabalhada, ela não dá conta de dizer (declarar) um
determinado conteúdo.

9
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Somente a alternativa I está correta.
b) ( ) Todas as alternativas estão corretas.
c) ( ) Somente a alternativa III está correta.
d) ( ) As alternativas I, II e III estão corretas.

2 O termo “semiose” surge de forma introdutória neste tópico. Ao que foi


declarado, ele tem relação com a noção de dar sentido às coisas. Noção de
excelência do ser humano. Dentro disso é possível afirmar:

a) ( ) Que o ato ou efeito de dar sentido é exclusivo do ser humano. Nem um


outro ser vivo dá conta disso.
b) ( ) Que o ser humano somente dá sentido aos fenômenos que lhe chegam
pela visão. Ao ver o homem é um significador por excelência.
c) ( ) O processo de sentir só terá sentido se for sentido.
d) ( ) Que sentir é uma abstração e apenas existe no campo das ideias.

3 Ainda que de forma introdutória, o termo “processo fenomenológico”


apareceu no conteúdo, que afirmação abaixo dá conta de explicar o mesmo?

a) ( ) Trata da noção espiritualizada dos fenômenos extraterrenos.


b) ( ) Trata de um processo de interação do ser humano com os fenômenos
de seu ambiente.
c) ( ) Trata de um processo de interação do ser humano com os fenômenos
internos de sua psiquê.
d) ( ) Trata de um processo de interação fenomenológica do ser humano com
ele mesmo, desconsiderando qualquer agente externo.
e) ( ) Trata da noção ativa do ser humano ao excluir acontecimentos que
estão agindo no ambiente onde ele está operando.

4 Os seres humanos são produtores de sentido por excelência. Explique como


se dá a noção de efeito de sentido, dentro do pensar um projeto:

5 A noção de “sentido” é importante para que se possamos iniciar o


entendimento sobre a semiótica, a medida que esta noção tem relação com
a semiose. Que relação é essa?

10
TÓPICO 2 —
UNIDADE 1

CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

1 INTRODUÇÃO
Iniciamos o segundo tópico desta unidade. Nela aprenderemos o
que é signo e como se dá o processo de significação. Contribuiremos para
a reflexão acerca da capacidade humana de interpretar e produzir signos e,
potencializaremos a capacidade analítica e crítica de leitura de objetos sígnicos,
com base na semiologia (Plano de Expressão e Plano de Conteúdo) e na semiótica
(ícone, índice e símbolo).

Como já vimos o ser humano é produtor de sentido por excelência. Sentido


que tem uma variedade de significados, e que neste momento é importante
entendê-lo como a faculdade de perceber uma modalidade específica de
sensações, que correspondem a órgãos determinados. São cinco os sentidos: tato,
visão, audição, paladar e olfato; faculdade de sentir ou perceber, de compreender;
senso; como a faculdade de julgar; bom senso, tino, e como “faculdade de captar
determinada classe ou grupo de sensações, estabelecendo um contato intuitivo e
imediato com a realidade, e assentando desta maneira os fundamentos empíricos
do processo cognitivo.

Esta noção de “sentido” é importante para que se possamos iniciar o


entendimento sobre a semiótica, à medida que esta noção tem relação com a
semiose, e que a mesma se dá no processo dar significação as coisas – sendo a
semiose o objeto principal de toda abordagem semiótica.

2 BASES INICIAIS DE SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA


O ponto de partida da ciência que estuda os signos é o axioma de que toda
esta capacidade de dar sentido às coisas se faz essencialmente por um processo
que a semiótica aborda. Seu objeto de estudo – o signo, pode ser considerado uma
ideia que se refere a outras ideias e objetos do mundo, tendo assim “sentido”.
Desta forma, somos levados a criar e acumular repertório à medida que vamos
significando nosso mundo.

Um signo precisa ser percebido por pelo menos um dos nossos sentidos.
Podemos ver (uma forma, uma cor), podemos escutar (um som, uma fala),
podemos cheirar (um perfume, uma fumaça), podemos tocar (uma superfície
quente, áspera) ou ainda podemos saborear (um amargor, um cítrico), podemos

11
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

absorver fenômenos do mundo e ainda dar a eles sentidos outros – que passam a
significar algo naquele instante. Quando sentimos o cheiro de fumaça podemos
deduzir que estamos perto do fogo (sem mesmo ver o fogo) – a fumaça, neste
momento, significa fogo. É com isso que a semiótica se ocupa.

Veja que interessante isso no campo da moda: quando uma coleção quer
falar de liberdade e romance, deve ser capaz de apresentar peças de roupa,
acessórios que conseguem representar isso. Que no momento que o cliente vê a
peça, prova-a, sente estes conceitos, e se somarmos então um editorial, a vitrine,
a loja, o tag, a abordagem de vendas – constatamos o quão importante é ter a
semiótica em nossa formação.

Para Elisabeth Walther-Bense (2000), as primeiras noções de signo são


encontradas nos gregos, que sustentavam sua existência como: sinal – sobretudo
verbal. Tendo em vista que ao sinalizar, o verbo duplicava uma coisa, um
fenômeno, uma realidade; permitindo debates acerca do original e da cópia, ou
seja, a palavra “maçã”, que dá conta de duplicar a coisa (a fruta), é mais original?
É cópia? Em comparação com a fruta que passa a representar (perceba que ao ler
a palavra “maçã”, deve ter vindo uma imagem na sua cabeça que dá conta do
“seu” real de maçã).

O termo “semiótica” vem do grego “seme” – semeiotikos: “intérprete de


signos”. Enquanto o termo “signo” deriva do latim “signum”, que vem do grego
“secnom”: “extrair uma parte de”, “seccionar”, portanto, a “semiótica”, como
disciplina, dá-se na análise do funcionamento dos sistemas de signos e de suas
interpretações.

A ideia platônica de signo é de que o mundo real não passava de uma


imitação do mundo das ideias. Seu modelo se mostrou triádico com os seguintes
componentes: nome; noção (ou ideia) e coisa (WALTHER-BENSE, 2000). Quando
exemplificamos anteriormente com “maçã”, dá para perceber este modelo triádico
acontecendo – o nome [“maçã”]; fez surgir a noção/a ideia [imagem da maçã na
cabeça], que nos leva à coisa [a fruta].

Já a ideia aristotélica de signo, estava pautada na crença de que Aristóteles


tinha do mundo perceptível sensorialmente. Acreditava que prevaleciam as
funções intelectuais do homem, desta forma o signo era fruto de convenções
e davam conta de representar realidades nas quais os homens se inseriam
(WALTHER-BENSE, 2000). Assim, delineou uma separação entre “signo certo” e
“signo incerto”, sendo o primeiro resultante das interações naturais – no sentido
de prova: se tem febre, logo está doente (febre significa estar doente); e o segundo
resultante de hipóteses, de generalizações – que ele considerava “signo fraco”:
se tem lábios estourados, então tem febre (nem sempre lábios estourados tem
relação com febre).

12
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

Por volta do ano 300 a.C., ainda na Grécia, a abordagem aconteceu em


diferenciar “signos naturais” (aqueles que ocorrem livremente na natureza) dos
“signos convencionais” (aqueles que foram criados para dar conta dos fenômenos
de comunicação) (WALTHER-BENSE, 2000).

Na Idade Média, Santo Agostinho estabeleceu bases ocidentais sobre o


signo, apresentando uma definição interessante, em que signo seria uma coisa
que além de produzir sensações, faz com que estas tragam à mente, de quem
está sentido, uma outra coisa como consequência de si mesma. E conseguiu
dar uma distinção aos “signos naturais” e “signos convencionais”, em que os
primeiros são produzidos sem intenção, mas são capazes de remeter a outras
coisas. E os segundos são os que os seres humanos partilham, intencionalmente,
para dar conta de serem compreendidos. Desta forma expressou a capacidade de
as palavras parecerem correlatos das ideias – das palavras mentais; o que afetaria
muitos estudos futuros sobre os signos (WALTHER-BENSE, 2000).

Esta noção de sentido e capacidade de dar significado aos fenômenos


que nos circulam, como já foi dito, nos acompanha historicamente. Durante o
século XVII, várias abordagens trouxeram o entendimento sobre esta noção de
sentido que abordamos aqui, de maneira a dar um nome para ela (WALTHER-
BENSE, 2000). Caso do médico Eric Henry Stubbes, que, em 1670, tratando da
ideia de sintomas, organizou suas abordagens nominando-as de “semiótica” –
num sentido bem restrito à ciência médica dedicada ao estudo e a interpretações
de sinais patológicos (dentro da lógica que uma dor pode ser sintoma de uma
enfermidade). Vinte anos depois, John Locke usou o mesmo termo, em sua obra
o “Ensaio acerca do Entendimento Humano”.

Ao nos aproximarmos do século XIX, a teoria do signo se consolidava


cada vez mais com as questões do conhecimento – dando conta do contexto
que se formava como moderno, e muitas demandas relacionadas à sociedade
da informação, no movimento das mensagens – como eram produzidas e
compartilhadas. Um contexto que contribuiu para afirmar a “semiótica” como
a ciência que se ocupa da vida dos signos no interior da convivência social. Indo
dos mecanismos relativos ao conhecimento até as orientações formais – dos
conteúdos, dos sentidos.

E, foi neste século (XIX) que as correntes contemporâneas da semiótica


surgiram, em especial duas delas: uma europeia – mais restritiva tendo como base a
linguística, e outra norte-americana – mais abrangente, com base em todo e qualquer
fenômeno capaz de representar algo em seu lugar, inclusive o signo linguístico.

13
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

NOTA

Dois termos que apareceram neste momento precisam ser apresentados:


“Linguística” que é a ciência que tem por objeto: a linguagem humana em seus aspectos
fonético, morfológico, sintático, semântico, social e psicológico; as línguas consideradas
como estrutura; de forma bem grosseira: a língua escrita; as palavras, e “signo linguístico”
que é um elemento representativo que tem dois aspectos: o significado e o significante.
Exemplo da palavra “maçã”: quando a escutamos, vem a nossa mente uma imagem do
objeto, e não a palavra (ao escutar a palavra “maça” é pouco provável que em nossa mente
se construa o “M”, o “A”, o “Ç” e “A” com “~”, rapidamente visualizamos a fruta maçã). Aí está
a noção de signo, pois um termo linguístico (uma palavra), é capaz de representar algo em
seu lugar.

A capacidade de representar algo é a base primeira para o entendimento


de signo. São muitos os exemplos possíveis e todos levam à lógica de que ao
entrarmos em contato com algum fenômeno (um objeto, um cheiro, um som, uma
palavra escrita/falada), somos levados a lembrar alguma coisa que não está a nossa
frente, estando então em contato com um signo. Todos já vivemos momentos em
que falamos: “Isto me fez lembrar de uma coisa” – um perfume que fez lembrar
de uma pessoa; um barulho que nos fez afirmar que uma motocicleta se aproxima;
uma fumaça que nos fez crer que havia fogo. Em todos estes momentos: o cheiro
do perfume; o barulho do motor; a visão da fumaça – fizeram lembrar de uma
pessoa sem que estivesse ali (no caso do perfume); fez afirmar que estava se
aproximando uma moto sem se quer vermos tal veículo (no caso do barulho do
motor); e fez pensar no fogo (vendo apenas fumaça).

Tal qual um detetive, nos relacionamos com os fenômenos que nos circulam,
desvendando-os e assumindo posturas frente às pistas. Uma dada situação nos
oferece fenômenos que sugerem leituras (que sejam identificados) – perceba que
o barulho do motor, no exemplo anterior, para ser assumido como de moto, tem
certas peculiaridades, que diferem de um carro, de um liquidificador. Há quem
já tenha vivenciado muito este determinado fenômeno que pode ter maiores
informações sobre ele – assim, um mecânico de motocicletas ou um motociclista
experiente em motos, pode não só afirmar que está se aproximando uma moto,
mas dizer o tipo de moto, quiçá até sua marca e potência. Neste momento, vale
o entendimento de que signo tem a capacidade de representar algo para alguém
em determinado contexto.

No design de moda, disciplinas técnicas como modelagem, costura nos


habilitam a decifrar elementos do vestuário, da mesma forma que o mecânico/
motociclista consegue dar considerações mais específicas apenas ouvindo um
barulho de motor. Percebe-se neste caminho, à medida que vamos estudando
um determinado conteúdo, ficamos mais aguçados em identificar elementos e
afirmar conceitos que dão conta de explicá-los.

14
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

O ser humano significa o que lhe é significante. Esta afirmação nos dá


a primeira noção para entendermos a lógica europeia, em que a partir do
entendimento das palavras, elas passam a significar. À medida que vamos
aprimorando o nosso vocabulário, vamos permitindo significar e fazer com que
muitas palavras nos sejam significantes, ou seja, uma palavra tem a capacidade
de representar algo em seu lugar, quando escutamos a palavra “praia”, somos
capazes de trazer o conceito que temos de praia – com nossa vivência de praia.
Deixando evidente que se trata de um processo dicotômico, escuto a palavra e
penso em seu conceito.

Toda e qualquer palavra será signo quando este processo dicotômico


ocorrer – ou seja, uma palavra (significante) tem que ter significado (seu conceito,
seu entendimento) para que se possa afirmar que é signo.

NOTA

Vale ressaltar que todo e qualquer termo que você lê ou escuta e tem pouco
entendimento sobre ele parece que ele não faz tanto sentido para você. Perceba aqui um
exemplo legal para signo linguístico, perceba o desconforto de entrar em contato com
uma palavra que você nunca ouviu (ou leu), ela não tem sentido, não faz sentido – ou seja,
ela não tem capacidade de representar algo em seu lugar – aí é bom pesquisar sobre ela.
No caso de palavras, o dicionário (que pode ser on-line) é um lugar bom para pesquisar –
que tal fazer isso para o termo “dicotômico”, lido anteriormente? Você pode pesquisa por
“dicotomia”. O entendimento deste termo ajudará como base conceitual para o conteúdo
que estamos tratando aqui.

A noção do signo linguístico está veiculada diretamente com a corrente mais


restritiva das duas que surgiram no século XIX – a europeia, que ficou conhecida como
semiologia e tem como principal expoente Ferdinand de Saussure.

3 SEMIOLOGIA
O filósofo e linguista suíço Ferdinand de Saussure (1857-1913) elaborou
teorias que contribuíram para o desenvolvimento da linguística como ciência
autônoma, exercendo grande influência sobre o campo literário e dos estudos
culturais. Para Saussure, signo tem sua base conceitual e organizativa na estrutura
linguística de uma determinada cultura, ou seja, na língua – principalmente
falada (WALTHER-BENSE, 2000).

15
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

Aqui fica evidente pensarmos que, à medida que nos letramos (que vamos
estudando e aprendendo) mais significativa fica nossa linguagem – tal raciocínio
ajuda no entendimento de que o signo para Saussure tem arbitrariedade inerente,
pois precisa das convenções linguísticas. Perceba que quando buscamos, no
dicionário, o entendimento de uma palavra, entramos em contato com seu
significado convencional e quando damos uso a ela em nosso processo de
comunicação, estamos sujeitos à arbitrariedade do termo, da capacidade de ele
representar o que queremos expressar – ou seja, estamos sujeitos à arbitrariedade
do signo. Por isso que é muito inteligente saber para quem estamos falando,
assim podemos escolher as palavras mais coerentes para este perfil de pessoas.
É claro, existem palavras cuja convenção não é arbitrária, elas são transmitidas
de diferentes tipos de estruturas gramaticais, percebidas de forma funcional –
caso das onomatopeias – a partir da reprodução aproximada, com os recursos
que se dispões da língua, de um som natural a ela associado, um exemplo se dá
quando imitamos um animal para nominá-lo: “miau-miau” para gato; “au-au”
para cachorro.

Voltamos à noção de signo linguístico e, de como a palavra enunciada


(significante) precisa de seu conceito (significado) para que, dicotomicamente, o
signo exista.

FIGURA 1 – SIGNO DICOTÔMICO

FONTE: O autor

O significado é o conceito que é assimilado mentalmente quando lemos


ou ouvimos a palavra. O significante tem a ver com a forma semântica e fonética
da palavra que, por sua vez, é composta por letras e sons. O olhar de Ferdinand
de Saussure tratava de noções meramente psicológicas, mas, atualmente, o
significante seria a forma material perante o significado.

16
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

TUROS
ESTUDOS FU

No tópico a seguir vamos ampliar a visão saussuriana, dando conta de tratar


do significante como forma material perante o significado.

Para Saussure (1990, p. 124), signo não une:

uma coisa e um nome, mas um conceito e uma imagem acústica.


Esta última não é o som material, puramente físico, mas a marca
psíquica desse som, a sua representação fornecida pelo testemunho
dos sentidos, é sensorial e se, por vezes, lhe chamamos material é
neste sentido e por oposição ao outro termo da associação, o conceito,
geralmente mais abstrato.

Dentro disso, “imagem acústica” / “significante” é arbitrário, não


motivado, pois não existe relação entre ele e a coisa que representa. Para Saussure
(1990), o signo é sempre mental, sendo uma representação que um sujeito tem de
algo na sua mente em determinado momento de sua vida.

FIGURA 2 – IMAGEM ACÚSTICA E CONCEITO

FONTE: O autor

17
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

Se a palavra “gato” for pronunciada, o som desta pronúncia cria na mente


de quem escuta algo correspondente a ela, perceba que existe na mente deste
sujeito uma estrutura capaz de reconhecer o som da palavra e, a sua maneira, cria-
se uma imagem referente à palavra – esta seria a “imagem acústica” – existindo
assim uma imagem da palavra na mente de quem a escutou. Desta forma, o
significante é a imagem mental de uma rede sonora (repertório de quem escutou).
Então, toda vez que chega um som (que é sentido por um dos sentidos – no caso o
auditivo) e tem sentido no cérebro tendo significado, estamos na presença de um
processo de signo. Dentro desta lógica, o signo é sempre mental.

Se, neste momento, entendermos que o som que ouvimos não é


puramente físico, mas também a impressão deste som em nossos sentidos, e que
quando recebido se torna significante por ter, de alguma forma uma “imagem
mental” associada a ele, nos levando a um significado (conceitos relacionados ao
determinado som), estamos em linha com o pensamento de Saussure.

Ao tornar o signo uma entidade mental, Saussure faz com que o signo
sempre associe um significante a um significado, possibilitando que esta
concepção tenha papel central na distinção histórica entre “signos naturais”
(que ele entende como motivados) e “signos arbitrários” (ou convencionais).
Esta arbitrariedade “deve dar a ideia de que o significante não depende da livre
escolha do sujeito falante”, este não tem motivação alguma, pois não existe “na
realidade, qualquer ligação material” entre a palavra e a coisa que ela representa
(SAUSSURE, 1990, p. 83).

Esta corrente considera que o signo é resultado do [significante] +


[significado], sendo ele sempre mental, e é a representação de algo que se tem
na mente. Em se pensando na língua, essa se fecha em regras e convenções de
um determinado sistema significante, perceba que para o mesmo significado
vamos ter significantes diferentes dependendo do sistema cultural que estamos
inseridos – fica evidente quando pensamos a palavra “gato” no português, e
“cat” no inglês; mas da mesma forma nos regionalismos – em nosso país temos
inúmeras palavras que significam a mesma coisa, mas são diferentes dependendo
da região em que estamos. No mercado de moda isto pode ser pertinente quando
nos reportamos às tribos e aos estilos.

Estas regras e convenções colocam a existência do signo, para Saussure,


como arbitrária. Colocando a perspectiva estruturalista como fundamento, em
que o significante surge, primeiro, a partir de uma imagem mental – de um
conceito, ou seja, um objeto (um fenômeno) só será signo se já existir um conceito
relacionado a ele – aí temos a arbitrariedade deste signo.

18
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

NTE
INTERESSA

Quantas vezes você se perguntou por que tal palavra está atribuída para um
determinado objeto? Por que “mesa” é “mesa”? Note que a resposta não tem uma lógica
(caso de palavras como as onomatopeias: au-au para cachorro; miau para gato). Mesa tem
um significado atribuído por convenções, por regras, ou seja, ela foi atribuída e é usada de
forma arbitrária na língua portuguesa.

Esta capacidade dicotômica de significante e significado do signo no


pensamento saussuriano apresenta dois grandes problemas:

Primeiro: não considera a matéria externa, ficando somente com a palavra.


Segundo: ao afirmar que o significado é o conceito da coisa, não especifica
a coisa, pois se existem significantes diferentes, haverá variações nos significados.

Estes dois problemas mostram uma vontade de expandir para que


possamos assumir sons, cores, gestos, odores, gostos, texturas, formas, ou seja,
toda e qualquer coisa (inclusive as palavras) que sejam capazes de representar
algo em seu lugar. E aí entramos na corrente mais abrangente – a norte-americana
–, que tem como base todo e qualquer fenômeno capaz de representar algo em
seu lugar, inclusive o signo linguístico – esta corrente é a Semiótica.

4 SEMIÓTICA
O filósofo e físico norte-americano, Charles Sanders Peirce (1839-1917),
assentou as bases da semiótica alicerçado em um pensamento: “O simples ato de
olhar está carregado de interpretação". Trazendo uma abordagem mais ampla, ao que
vinha sendo construído por Ferdinand de Saussure, na Europa no mesmo período.

Quando analisamos o pensamento “alicerce de Peirce”, percebemos que


a corrente norte-americana tem fundamento nos processos fenomenológicos,
ou seja, na fenomenologia, que pode ser entendida como uma postura frente
ao mundo. Como uma metodologia que dá importância aos fenômenos em si, e
quanto afetam nossos sentidos. Se pararmos para pensar, muito do que sabemos
sobre nosso mundo vem deste método: os cheiros; as texturas; as formas; um
ruído; uma imagem em uma revista; até mesmo uma palavra. Enfim, tudo que se
apresenta a nossa mente através de nossos sentidos. Lembra a “maçã”, é possível
afirmar que a imagem que se forma na sua cabeça tem a ver com as experiências de
maçãs como fenômenos – se você só viu imagens desta fruta – terá uma imagem

19
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

mais visual, mas se já comeu uma, conseguirá atribuir barulho, gosto, acidez.
Imagina se você já colheu uma na macieira. Perceba que a fenomenologia pode ser
encarada como uma postura frente ao mundo – ao se pesquisar um público-alvo,
só ver imagens na tela pode dar uma noção diferente, do que poder participar
de momentos, dos fenômenos que este público vive em seus contextos. Trazer o
pensamento de Peirce como um de seus alicerces pode ajudar: “O simples ato de
olhar está carregado de interpretação".

Para Peirce (2005, p. 46) signo é aquilo que representa algo para alguém.
É alguma coisa que se dirige:

a alguém, isto é, cria, na mente da pessoa, um signo equivalente, ou


talvez um signo mais desenvolvido. Ao signo assim criado denomino
interpretante do primeiro signo. O signo representa alguma coisa, seu
objeto. Representa esse objeto não em todos os seus aspectos, mas com
referência a um tipo de ideia que eu, por vezes, denominei fundamento
do representâmen.

Para Peirce (2005), é irrelevante discutir o que é mental e o que não é mental
no debate sobre o signo, mas se torna importante determinar se o pensamento
é dirigido ou não aos objetos reais, afinal real é o que significa, que tem sentido,
em qualquer coisa de real. Esta postura ajuda a evitar posicionamentos falsos de
dar a uma palavra, por exemplo, um sentido universal externo ao pensamento
e se afastar da ideia de que se pode conceber coisas de forma independente das
relações que se tem no espírito (capacidade inventiva do ser humano). A noção
de signo para Peirce, é toda e qualquer coisa que representa uma outra coisa
em seu lugar – objeto, e que produz um efeito interpretativo. Se pensarmos
dentro da lógica da semiologia vemos que aqui a semiótica peirciana dá conta
dos problemas saussurianos: Peirce considera a matéria externa e dá conta de
especificar a coisa. Com isso, se a semiologia era dialógica, aqui vamos ter um
posicionamento triádico – em que o signo é composto de três partes, que serão
chamadas de categorias: a primeiridade, a secundidade e a terceiridade.

Estas partes podem ser assim pensadas:

FIGURA 3 – PARTES QUE COMPÕEM O MODELO TRIÁDICO

FONTE: O autor

20
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

Interessante perceber que essa “alguma coisa” é captada pelos órgãos dos
sentidos, mas também percebida de forma intencional – dentro de uma noção
de que perceber é traduzir “alguma coisa” (fenômeno, evento, objeto) captado
pelos sentidos em um julgamento. Uma vez captada, é levada a um processo
de comparações com outras coisas já percebidas, chegando até a capacidade de
nominá-la. Pensando estas três partes como categorias, temos a primeiridade
(como aquele momento de percepção primeira, inicial – quando captamos
“alguma coisa”), temos a secundidade (como o momento de comparação com o
que já fora percebido), e temos a terceiridade (como o momento de construção, de
definição, de nominação).

Como já mencionado, a teoria do signo de Charles S. Peirce está alicerçada


à fenomenologia, permite alargar as capacidades interpretativas à medida que
entende o intérprete, o observador, o sujeito com autonomia em relação ao
produtor de sentido, ao enunciador. Em outras palavras, a noção e efeito de
sentido nesta teoria é fugidia à medida que o enunciador pode ter pensado
em “dizer” algo, mas seu intérprete não precisa necessariamente entender da
maneira que enunciador pretendia. Esta liberdade faz com que o enunciador
esteja preparado para isso e tenha competência para ajustar o signo para tenha
êxito em sua comunicação.

A teoria de Charles S. Peirce está concebida como doutrina em que todo e


qualquer tipo de semiose é possível. Ela “é tão geral e abstrata a ponto de poder
dar conta de qualquer processo sígnico, esteja ele no invisível mundo físico [...]
nos movimentos sociais” (SANTAELLA, 2002, p. 36).

A noção peirciana é pragmatista, está pautada num processo lógico-


semiótico de como as ideias surgem. Tal processo é pensado em três ramos
(SANTAELLA, 2002): o primeiro que se ocupa da fisiologia das formas, das
funções e dos elementos formais – a gramática especulativa; o segundo que
consiste na abordagem classificatória e de comparações – a lógica crítica; e o
terceiro que se dá no estudo dos métodos, nas fórmulas que os mais variados tipos
de raciocínio dão origem – a retórica especulativa. A abordagem do signo por
Peirce, por ser pragmatista, baseia-se na noção de que o sentido de um conceito
pode ser explicado ao considerarmos seus efeitos práticos, desta forma, ela se
mostra metodológica, tendo uma ordem e procedimentos que são as categóricas:
de primeiridade, secundidade e terceiridade.

4.1 A PRIMEIRIDADE
É a primeira das categorias de uma experiência de mundo. É a categoria do ser.
Está nas qualidades das coisas. Relativa às propriedades de um fenômeno que podem
ser descritas, por exemplo: tal coisa é azul. Esta categoria direciona para a ideia de
primeira concepção sígnica de Peirce, que é pré-reflexiva – o da abstração pura. De
forma prática, é mais ou menos como um sentimento, uma sensação primeira – não é
consciente nem elaborada. É aquilo que é, nada mais que isso.

21
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

4.2 A SECUNDIDADE
Em contraposição à primeiridade (categoria do ser), a secundidade
é a da ocorrência, da existência segundo ao que já se sentiu. Diferente da
primeiridade, na secundidade já existe uma elaboração consciente, já se faz
comparações, já se enseja particularidades do fenômeno em análise. Enquanto
a primeira é atemporal, na secundidade existe a noção de tempo, afinal para se
chegar às comparações é preciso ter passado pela primeiridade. Nesta categoria
só se tem consciência da qualidade de algo, pois é possível constatar com outra
qualidade. Acidental e singular, a secundidade tem na existência, no registro de
sentimento, um fato. Se a primeira é da qualidade, esta, a segunda, é da relação.

4.3 A TERCEIRIDADE
Completa a tríade. Se a primeiridade é a do ser, a secundidade é do existir,
a terceiridade é do interpretar – na capacidade de a coisa ser signo – ou seja: tem
a ver com o que o fenômeno é (primeiridade), no que existe nele em comparação
a outros (secundidade) e no quanto é possível construir algo que não está ali
– de significar. Se a primeira é da qualidade, a segunda da relação, esta é da
representação – do que Peirce vai chamar de signo em si.

De forma geral, a primeiridade sempre será a percepção (algo rápido


e abstrato), a secundidade está relacionada ao fato quanto o que foi percebido
permite ensejar particularidades (processo de comparação, de dúvida) e a
terceiridade está atrelada à capacidade, do que foi percebido e fez pensar,
representar algo em seu lugar (de ser signo).

Esse processo triádico, em que se tem o signo, o elemento designado e a


pessoa a quem ele se destina como signo, se chama semiose: que para Peirce é “o
processo no qual o signo tem um efeito cognitivo sobre o intérprete” (NÖTH,
1998, p. 128). Se a semiótica é a ciência que tem por tarefa estudar todos os tipos
possíveis de ações sígnicas, a semiose é o seu objeto de estudo.

Se no projeto de produtos para o mercado estamos mergulhados em


processos de desenvolvimento de conceitos que planejam causar algum efeito
cognitivo no público-alvo de uma marca, fica evidente o valor da semiótica para os
profissionais desta área. E quanto a entender os processos de significação (de semiose)
dos consumidores frente aos valores comercializados é definidor do sucesso.

Dentro da teoria de Charles S. Peirce essas três categorias são chamadas,


no âmbito fenomenológico, de faculdades. Sendo a primeira condicionada à
capacidade de ver (de sentir); conduzindo à segunda faculdade, que implica um

22
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

esforço, ou seja, quando se atenta para (ensejando particularidades); chegando


então na terceira faculdade, que faz com que tal aspecto incidental (do sentir da
primeira) e consciente (das relações da segunda) possa ser generalizado, cabendo
poder chegar a um conceito (de nominar o fenômeno sentido, por exemplo).

Interessante perceber que as faculdades que devemos entender para dar


conta das categorias e principalmente para compreendermos a semiótica como
uma metodologia dos processos cognitivos que vivemos cotidianamente, são três:

A primeira é a rara faculdade de sentir o que está diante da gente. Tal como
se apresenta, sem qualquer interpretação. Veja se consegues exercitar tal faculdade
observado uma cena, um objeto, um evento, uma música e descrevendo-a como
ela é, sem atribuir nenhum valor.

A segunda faculdade é mais como um compromisso. Um comportamento


que deve ser treinado, uma postura frente ao fenômeno observado de detetive, de
busca de aspectos específicos ao fenômeno em observação que só pode estar nele
e em nenhum outro similar. Buscando o que o faz único, detectando os elementos
desta unicidade sob todos os seus disfarces. Esta faculdade nos pede tempo,
quanto mais tivermos mais vamos construir relações possíveis.

A terceira faculdade é a de generalizar, como um matemático devemos


buscar definir fórmulas que sejam capazes de da conta dos elementos que
fazem do fenômeno, agora único, ser pensado de forma generalizada. Esta
fórmula abstrata, garantirá a compreensão do fenômeno purificando-o de todos
os elementos estranhos e irrelevantes, nos dando bases para construção de
conceitos. Esta faculdade, se bem trabalhada, nos coloca como construtores de
novos conhecimentos.

Com base nestas faculdades e nas categorias, Peirce classifica o signo


como Representâmen; objeto e interpretante.

5 CATEGORIAS DO SIGNO
A variação e a quantidade dos signos são tão grandes que, Charles S
Peirce organizou-os em categorias, classificando-os a partir das faculdades em
uma tríade composta pelo representâmen – aquilo que funciona como signo; pelo
objeto – o que é referido pelo signo; e pelo interpretante – no efeito do signo de
quem o interpreta.

23
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

FIGURA 4 – TRICOTOMIA DO SIGNO EM PEIRCE

FONTE: O autor

A ideia central é que dentro das faculdades já discutidas, o signo é composto


pelas três categorias simultaneamente, mas de forma didática (pragmatista) Peirce
apresenta cada uma delas numa sequência. Dentro disso, a primeira categoria é a
capacidade de ser signo, ou seja, a capacidade de funcionar como signo – de ser
representativa: o representâmen. É através dele que o signo tem sentido (seja por
semelhança, por alguma relação ou por convenção). O objeto é a coisa externa
do signo (o fenômeno que toca os sentidos) enquanto o interpretante dá conta do
processo interpretativo (e não deve ser confundido com o ser humano).

ATENCAO

Estas nomenclaturas são importantes para o entendimento da semiótica


peirciana. Uma dica legal é pegar uma folha A4 e montar este triângulo bem no centro dela
– e a partir desta parte, ir completando com as novas nomenclaturas que surgirem.

6 TRICOTOMIA DO SIGNO
A noção tricotômica fica declarada na figura anterior, onde para que o
signo exista é preciso ter os três pontos – representâmen, objeto e interpretante,
porém, Peirce (2005) organizou um raciocínio em sua teoria que em cada um
destes pontos, existem outros três pontos – cada ponto é tricotômico, ou seja,
que no representâmen existem três categorias internas a ele; da mesma forma no
objeto e no interpretante.

Parece confuso! Mas vamos por partes.

24
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

Se até agora foram apresentadas as faculdades: primeiridade, secundidade


e terceiridade; que pelas categorias seriam, respectivamente: representâmen,
objeto e interpretante. E que na primeira estarão relacionadas às capacidades e
às qualidades iniciais de já serem representativas – ou seja, de serem signo; na
segunda estarão relacionadas às condições de sentido, como sugestões possíveis
de representar – de ser signo; e na terceira a capacidade de afirmar, de como
convenção garantir a representação – de ser signo.

E
IMPORTANT

Perceba que o conteúdo parece repetitivo. E é isso mesmo, por isso a dica
anterior é boa, pois a repetição vai construindo o entendimento.

6.1 REPRESENTÂMEN
A capacidade de ser signo é a primeiridade dele. Ela terá as três faculdades
também, condicionadas aos fatores que dão capacidade de ser signo: suas
qualidades, suas propriedades que lhe são singulares, e suas características que o
legitimam – em caráter de lei. Assim, temos:

FIGURA 5 – TRICOTOMIA DO REPRESENTÂMEN

FONTE: O autor

25
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

Qualissigno é a qualidade que já é signo. Diz respeito aos elementos


menos particulares, como cores, texturas, formas, entre outras. Para assumir
esta capacidade é preciso expor os sentidos aos fenômenos sem nenhum juízo,
somente sentir os fenômenos pelos fenômenos.

O qualissigno está nas qualidades. Como descreve Santaella (2002, p. 12):

uma cor, qualquer cor, um azul-claro, sem considerar onde essa cor está
corporificada, sem considerar se é uma cor existente e sem considerar
seu contexto. Tomemos apenas a cor, nela mesma, só cor, pura cor.
Quantos artistas não fizeram obras para nos embriagar apenas com
uma cor? Por que e como uma simples cor pode funcionar como signo?
Ora, uma simples cor, como o “azul-claro”, imediatamente produz uma
cadeia associativa que nos faz lembrar céu, roupa de bebê etc.; por isso
mesmo, esse tom de azul costuma ser chamado de azul-celeste ou azul-
bebê. A mera cor não é o céu, não é roupa de bebê, mas lembra, sugere
isso. Esse poder de sugestão que a mera qualidade apresenta lhe dá
a capacidade para funcionar como signo, pois quando o azul lembra
o céu, essa qualidade da cor passa a funcionar como quase-signo de
céu. O mesmo tipo de situação, também se cria com quaisquer outras
qualidades, como o cheiro, o som, os volumes, as texturas etc.

Nos projetos de design de moda, os qualissignos predominantes estão


nas formas e elementos puros: cores, tons, manchas, brilhos, contornos, formas,
texturas, movimentos, ritmos, contrastes, entre outros, sendo que a combinação
destes não vem de conexão alguma extraída da experiência externa. Podem ser
entendidos como formas não objetivas, por não representarem nenhum objeto
identificável – ficam no campo das abstrações: a cor pela cor, a textura pela
textura, a forma pela forma.

Exemplos práticos para qualissigno são encontrados nas experiências


estéticas modernistas, caso da obra Delicate Tension no 85, de Wassily Kandinsky:

FIGURA 6 – REPRESENTAÇÃO EM TONS DE CINZA DA OBRA: DELICATE TENSION Nº 85,


DE WASSILY KANDINSKY

FONTE: <https://i.pinimg.com/originals/42/23/ec/4223ec9ee31a88ee6b462a6279186996.jpg>.
Acesso em: 14 abr. 2020.

26
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

Em obras como essa, as qualidades sensíveis se fazem presentes,


permitindo visões de formas nunca vistas em experiências externas. Cores (no
caso da imagem gradações de cinzas), formas, linhas, planos nos oferecem uma
experiência totalmente nova – nada de semelhante existe e por isso então tudo
pode se assemelhar – aqui está o “frescor” da primeiridade do representâmen da
possibilidade de ser signo – do qualissigno.

DICAS

Acesse o link que está como fonte da figura acima, ou pesquise na internet
pelo nome da obra para poder ver a imagem colorida.

A partir do momento que os fenômenos sentidos fazem pensar, ganham


juízo de valor (mesmo que bem inicial), estamos na secundidade – no sinssigno
em que o aspecto de ser signo já o particulariza, já o individualiza. Para assumir
esta capacidade é preciso assumir a observação do modo particular como o signo
se forma – observando características existenciais, que no fenômeno observado é
irreptível, é único.

A noção de que se está na experiência de sinssigno quando, abandonada


a abstração do qualissigno, é possível, de um modo ou de outro, de alguma
maneira identificar representações reconhecíveis fora do objeto experenciado.
No campo da moda, o desenho de moda terá elementos gráficos – cores, linhas,
texturas, formas que combinadas nos permitem ver representado um corpo, um
tecido. Nos desenhos do estilista Christian Lacroix é possível ter a secundidade
do representâmen declarada, à medida que as linhas se organizam para dar a
sugestão de braços, de rosto, de volume, de movimento. Da mesma forma que a
representação do vestido, se dá pela singularidade das manchas cromáticas e das
texturas do conjunto de linhas do desenho.

27
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

FIGURA 7 – REPRESENTAÇÃO EM TONS DE CINZA DE UM DESENHO DO ESTILISTA


CHRISTIAN LACROIX

ONTE: <https://i.pinimg.com/474x/eb/55/89/eb55892fd2817193da0de8ac5a00ec53.jpg>. Aces-


so em: 14 abr. 2020.

Havendo a capacidade de observar as particularidades do fenômeno pode


ser possível, a partir destas particularidades abstrair o geral deste particular,
colocando-o em uma classe geral, potencializando o fenômeno à uma convenção,
uma regra, uma norma. Esta seria a terceiridade – o legissigno.

O legissigno é uma convenção que representa algo em seu lugar, é uma


lei que é signo. Não é algo singular, mas alguma coisa que se tem acordado ser
significante. São predominantes nas formas que só podem ser entendidas com
a ajuda de alguma convenção cultural. Um exemplo interessante aqui está nas
representações gráficas de moda – é preciso entender as convenções para saber
o que é um desenho estilizado ou croqui; um desenho técnico; uma ilustração de
moda; um desenho de figurino. Cada uma dessas representações gráficas, tem
suas convenções que as legitimam dentro de determinado conceito.

OBJETO

Dependendo do representâmen, ou seja, da propriedade do signo será


diferente a maneira como o signo se faz representar pelo objeto. São três tipos de
propriedade: qualidade, singularidade (existência) e lei, também são três os tipos
de propriedades, de relações que o signo poderá ter com o objeto a que se aplica.
Quanto ao objeto, o signo pode ser denominado como ícone, índice e símbolo.

28
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

FIGURA 8 – TRICOTOMIA DO OBJETO

FONTE: O autor

Como ícone, o signo aparece como semelhança ao que representa e tem


autopoder de sugestão – já pelas qualidades é possível afirmar o que representa.
Tem fortes condições de substituir a coisa que representa (caso de um desenho de
mulher para representar mulher).

O ícone mantém relação de analogia com aquilo que representa. O desenho


figurativo, uma fotografia, a imagem de uma casa são ícones por se assemelharem
com os objetos reais.

FIGURA 9 – REPRESENTAÇÃO DE CASA

FONTE: <https://desenhospracolorir.com.br/wp-content/uploads/Casas-16.jpeg>.
Acesso em: 14 abr. 2020.

29
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

Importante lembrar que a relação de semelhança não é somente visual, ela


pode ser tátil, auditiva, olfativa e gustativa. Se não houver semelhança, poderão
existir duas condições do objeto ser signo, uma delas é por relação, ou seja, pela
capacidade que alguns elementos singulares (algumas particularidades) sugerirem
o que representam. Haverá alguma conexão que liga uma coisa com outra. (Caso
da fumaça para fogo, de um chão molhado para chuva) – ou seja, quando as
particularidades indiciam o que está possível de representação – o índice.

Na ilustração anterior, icônica de casa, temos uma representação


indiciática, onde a imagem nos sugere que dentro da casa tenha um fogo aceso.
No desenho, os elementos gráficos que saem da chaminé nos remetem ao ícone
de fumaça, mas indiciam fogo. Não vemos o fogo, mas se há fumaça, há fogo.

E a outra é por convenção – o símbolo, em que de forma arbitrária o


objeto representa a partir de uma associação de ideias, ou seja, existe uma lei,
uma convenção, um pacto coletivo que determina que aquele signo represente
seu objeto, ou seja daquela maneira representado. Um objeto representa alguma
coisa como símbolo, não porque é semelhante (ícone), nem porque tem alguma
particularidade que permita relações (índice), mas sim porque algum sistema
definiu, por convenção tal, representação (símbolo). Na figura anterior, algumas
convenções estão declaradas, uma delas é que a imagem ilustra um dia ensolarado
– dadas as convenções da representação gráfica circular que remete ao sol, pois tem
cinco formas triangulares ao seu redor sugerindo, por convenção, raios solares.

DICAS

Se formos pensar na ideia de símbolo peirciana, ela é muito parecida com a


ideia de signo linguístico de Saussure – por mais que estes pensadores elaboraram suas
teorias na mesma época, eles nunca se encontraram, nem se conheceram – Peirce no
Estados Unidos da América e Saussure na Europa formularam teorias, que tratam de um
mesmo tema, mas se apresentam, em alguns momentos, até de forma contraditória.
Isto pode ficar melhor entendido a partir da leitura do artigo “A Semiótica: A base para a
linguagem visual”, de Deivi Eduardo Oliari.

FONTE: <http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2004/resumos/R2115-2.pdf>. Acesso


em: 22 set. 2020.

30
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

6.2 INTERPRETANTE
Já vimos que o representâmen é a condição primeira do signo existir.
Que o objeto é aquilo que determinará o signo e é o que o representa, sendo a
segunda condição. Agora vamos para a terceira, que é o interpretante – o efeito
interpretativo que o signo produz em uma mente, ou em um sistema capaz de
interpretar (este último comentário é necessário, para seguirmos a sugestão de
Peirce: de não limitarmos o interpretante ao ser humano).

Se existe a capacidade de ver semelhança (ícone), relações (índice) e


assumir convenções (símbolo); ou de pelas qualidades termos signo (qualissigno);
ou através de singularidade de certas qualidades termos (sinssigno); ou ainda
de sermos capazes de generalizar em convenções (legissigno); é por que existem
efeitos sobre o interpretante, que ocorrem em três momentos: um primeiro –
rema; um segundo – discente; e um terceiro – argumento.

FIGURA 10 – TRICOTOMIA DO INTERPRETANTE

FONTE: O autor

Rema é efeito primeiro que um signo provoca no intérprete. Trata-se


de uma simples qualidade de sentido que permite um valor emocional. Uma
determinada situação em uma circunstância, que faz um fenômeno ser percebido
é condição do rema, porém quando este fenômeno solicita do interpretante alguma
ação física ou mental, ou seja, exige um dispêndio de energia está na condição de
discente, mas quando o signo é interpretado por meio de regras e convenções
internalizadas pelo intérprete tem-se a condição do argumento.

31
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

No discente há um esforço, uma vontade de buscar relações. Se voltarmos


à figura anterior, da casa, vamos perceber que a capacidade remática está na
condição de que o desenho provoca no observador – ao passar o olho pela
página, o desenho chama sua atenção, indiferente da emoção causada houve a
primeiridade (rema); quando assumimos que o desenho ilustra um dia – é porque
a terceiridade está declarada, como um argumento – é possível afirmar, sem
dúvida que é dia! Todavia, a secundidade sempre sugere, ela pode ser discutida.
O índice de fogo (formas que representam a fumaça) não nos afirma fogo, nos
sugere, e então como detetives, percorremos a imagem, em suas possibilidades,
questionando-a, provocando idas e vindas, para tomar conclusões que, nem
sempre serão seguras. Este é o discente.

NTE
INTERESSA

Você sabe que professores são chamados de docentes nas universidades. E


que alunos são chamados de “discentes”. Olha que interessante! Se alunos formam o corpo
discente, eles devem ser os questionadores, os que não se conformam e que se permitem
mudar de opiniões, desde que exista lógica e coerência para isso.

O processo em que signo tem um efeito cognitivo sobre o intérprete –


que o estimula a pensar – a semiose; para Peirce, desenvolve-se em três etapas:
a “primeiridade”, a “secundidade” e a “terceiridade” ocorrem sucessivamente
e são interligadas de maneira que na “primeiridade” ocorrem o qualissigno, o
ícone e o rema. Compreendendo o campo do possível, do sensível, do qualitativo
(emocional) se trata da apresentação de algo para os sentidos, imediata e
integralmente, por onde se captam as qualidades deste algo, como um sentimento
instantâneo, fugaz, precedido de qualquer elaboração posterior.

Passada a primeira etapa, que é pura impressão, vem a sensação, o


confronto, a consciência de algo concreto – vem a “secundidade”, em que ocorrem
o sinssigno, o índice e o discente. Compreendendo o domínio da experiência, da
realidade, da ação (energético).

O momento em que o sujeito da semiose por meio de níveis progressivos


de consciência, passa de um pensamento de impressão pura e instantânea de algo
(primeiridade), alcança um pensamento de constatação, resultante de uma
sensação desse algo como presença concreta (secundidade) e então chega na
percepção da realidade exterior, ele está na (terceiridade), em que ocorrem
legissigno, o símbolo e o argumento. Compreendendo tudo que dependa da
consciência, da inteligência (racionalidade).

32
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

A semiótica peirciana pode ser organizada pelo esquema a seguir – as


relações sígnicas:

QUADRO 1 – CATEGORIAS DO SIGNO

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade Qualissigno ícone rema
Secundidade Sinssigno índice discente
Terceiridade Legissigno símbolo argumento

FONTE: O autor com base em Peirce (2005)

As três categorias, em conjunto, permitem uma divisão do signo em dez


classes de signos, que são para Peirce (2005) possíveis relações categóricas por
onde passam as possibilidades interpretativas. A primeira classe de signo é:
qualissigno, icônico, remático.

QUADRO 2 – QUALISSIGNO, ICÔNICO, REMÁTICO

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno ícone rema
Secundidade Sinssigno índice discente
Terceiridade Legissigno símbolo argumento

FONTE: O autor com base em Peirce (2005)

É quando uma qualidade já é signo, caso do tom de cinza. Pura


sensibilidade – entramos em contato com o fenômeno cromático “cinza”.

FIGURA 11 – TOM DE CINZA

FONTE: O autor

33
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

A segunda classe de signo é: sinssigno, icônico, remático.

QUADRO 3 – SINSSIGNO, ICÔNICO, REMÁTICO

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno Ícone rema
Secundidade sinssigno Índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: O autor com base em Peirce (2005)

Trata-se de um objeto particular e real, que pelas suas qualidades enuncia


a ideia de outro objeto. Os diagramas, desenhos técnicos dão conta de ser signos
nesta classe.

FIGURA 12 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DE UMA CAMISA

FONTE: <https://br.pinterest.com/pin/527343437596135203/>. Acesso em: 23 set. 2020.

A terceira classe de signo é: sinssigno, indicial e remático.

QUADRO 4 – SINSSIGNO, INDICIAL, REMÁTICO

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno Ícone rema
Secundidade sinssigno índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: O autor com base em Peirce (2005)

34
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

Dá conta de dirigir a atenção a um fenômeno determinado pela sua


própria presença. Um grito de dor é um exemplo.

A quarta classe de signo é: sinssigno, indicial, discente

QUADRO 5 – SINSSIGNO, INDICIAL, DISCENTE

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno Ícone rema
Secundidade sinssigno Índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: O autor com base em Peirce (2005)

Signo ainda afetado diretamente pelo seu objeto, mas consegue dar
informações sobre este objeto, finalidade. Um cata-vento é exemplo para este signo.

FIGURA 13 – FOTOGRAFIA DE UM CATA-VENTO

FONTE: <https://urbanarts.vteximg.com.br/arquivos/ids/4744325/236025-IMA-043-046.
jpg?v=637194245047930000>. Acesso em: 14 abr. 2020.

A quinta classe de signo é: legissigno, icônico, remático.

QUADRO 6 – LEGISSIGNO, ICÔNICO, REMÁTICO

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno Ícone rema
Secundidade sinssigno Índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: O autor com base em Peirce (2005)

35
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

É um ícone interpretado com regra, como lei. Pode ser o mesmo diagrama
da segunda classe, mas sua capacidade de se definir em leis é importante. Ele se
representa pelas regras. Veja um diagrama eletrônico como fica difícil se não
conhecemos as regras que o estabelecem.

FIGURA 14 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DE UM DISPOSITIVO ELÉTRICO

FONTE: <https://eletricidadesemsegredosblog.files.wordpress.com/2018/05/a2.png>.
Acesso em: 14 abr. 2020.

A sexta classe de signo é: legissigno, indicial, remático.

QUADRO 7 – LEGISSIGNO, INDICIAL, REMÁTICO

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno Ícone rema
Secundidade sinssigno índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: Adaptado de Peirce (2005)

É um signo que está delimitado por uma lei geral, que de tal modo atrai a
atenção para este objeto. Um exemplo são as sirenes de ambulância e de bombeiro
– cada uma tem uma frequência que diz, exatamente, de qual é.

A sétima classe de signo é: legissigno, indicial, discente.

QUADRO 8 – LEGISSIGNO, INDICIAL, DISCENTE

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno ícone rema
Secundidade sinssigno índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: O autor com base em Peirce (2005)

36
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

Signo que está delimitado por uma lei geral afetada por um objeto real,
que consegue fornecer informações definidas sobre esse objeto. Uma placa de
trânsito é um exemplo.

FIGURA 15 – REPRESENTAÇÃO EM TOM DE CINZA DE UMA SINALIZAÇÃO DE TRÂNSITO

FONTE: <https://www.novaflexisencao.com.br/wp-content/uploads/2018/08/
1_27092013122011236444265412651f56we1f56ef1236r65.jpg>. Acesso em: 14 abr. 2020.

A oitava classe de signo é: legissigno, simbólico, remático.

QUADRO 9 – LEGISSIGNO, SIMBÓLICO, REMÁTICO

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno ícone rema
Secundidade sinssigno índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: Adaptado de Peirce (2005)

É um signo convencional que não tem nenhum caráter propositivo.


Exemplos são os substantivos comuns. A bandeira branca significando paz.

FIGURA 16 – IMAGEM DE BANDEIRA BRANCA

FONTE: <https://postoavenda.com/wp-content/uploads/2014/05/posto-de-gasolina-a-venda-
bandeira-branca.jpg>. Acesso em: 14 abr. 2020.

37
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

A nona classe de signo é: legissigno, simbólico, discente.

QUADRO 10 – LEGISSIGNO, SIMBÓLICO, DISCENTE

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno ícone rema
Secundidade sinssigno índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: Adaptado de Peirce (2005)

Combina símbolos remáticos (da oitava classe) em proposições. Qualquer


proposição completa é exemplo de signo nesta classe – se na oitava classe os
substantivos comuns foram exemplo, aqui uma proposição com base nele será:
“Nenhum cisne é negro”. E no que compete à ideia de cor branca para paz – um
ambiente todo branco pode sugerir tranquilidade.

A décima classe de signo é: legissigno, simbólico, argumental.

QUADRO 11 – LEGISSIGNO, SIMBÓLICO, ARGUMENTAL

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno Ícone rema
Secundidade sinssigno Índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: Adaptado de Peirce (2005)

A décima classe do signo é a mais racional de todas. Se formos pensar em


um exemplo uma proposição que opera no campo dos silogismos caberia (Exemplo
de silogismo: "todos os homens são mortais; os gregos são homens; logo, os
gregos são mortais"). Se formos para o campo do design, é possível assumir como
exemplo a cor branca para determinados uniformes – não apenas por remeter
e convenção a uma classe profissional (caso de médicos, cozinheiros...), mas
porque nas diretrizes e normas de saúde a cor branca permite identificar sujeira e
problemas de contaminação – assim a cor branca em uniformes profissional está
atrelada a décima classe do signo, sendo seu uso explicado de forma racional – se
o cliente for destas classes profissionais e solicitar outras cores para suas roupas
profissionais – o direcionamento que cabe é trabalhar com tons claros – tendo em
vista que ao sujar funcionarão de forma semelhante ao branco.

38
TÓPICO 2 — CONCEITOS INTRODUTÓRIOS: SEMIOLOGIA E SEMIÓTICA

Como vimos é possível dividir os signos em 10 classes, que nada mais


são que desdobramentos lógicos de combinações possíveis dentro das tríades,
porém, Peirce (2005) nos faz considerar ser um terrível problema afirmar a qual
classe pertence um signo, pois ele pode assumir características diversas, junto a
várias circunstâncias. É importante saber das 10 classes, contudo, antes disto, o
que deve operar: a lógica. E foi o método lógico de classificar os signos que deu
relevância para a grande contribuição de Peirce.

Como afirmamos no início deste tópico: a capacidade de representar algo


é a primeira base para o entendimento de um signo. E, neste momento, deve
ser possível entender que existem duas correntes que estudam esta capacidade
– uma mais restritiva – focada na palavra: a semiologia; na noção dicotômica de
Ferdinand de Saussure, em que signo é a relação entre significante e significado. E
outra, nada restritiva: a semiótica; na noção tricotômica de Charles Sanders Peirce,
em que signo tem sua relação categorizada em três tricotomias: representâmen
(qualissigno, sinssigno e legissigno), objeto (ícone, índice e símbolo) e interpretante
(rema, discente e argumento). Claro que a abordagem e o entendimento destas
duas correntes são densas e solicitam um aprofundamento maior para os mais
interessados.

39
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Durante o século XIX surgiram duas correntes: uma europeia (a semiologia)


e outra norte-americana (a semiótica), e que estas duas correntes têm seus
principais teóricos: Saussure, para a semiologia; e Peirce, para a semiótica.

• A visão saussuriana é do signo linguístico, assumindo principalmente a palavra


(falada) como principal objeto de abordagem.

• Para Saussure, na semiologia, o signo é formado pelo significado e pelo


significante.

• Na semiologia, o signo é dicotômico, formado pelo significante e significado. O


significado é o conceito da coisa e o significante é como essa coisa se manifesta.

• A visão peirciana é do signo em geral, assumindo todo e qualquer coisa que


representa algo em seu lugar, inclusive a palavra.

• Para Peirce, na semiótica, o signo é formado por três categorias: a primeiridade,


a secundidade e a terceiridade.

• Essa categorização é chamada de tricotômica do signo que se apresenta pelo


representâmen, pelo objeto e pelo interpretante.

• A tricotomia se repete para cada um deles, ficando para o representâmen a


primeiridade: o qualissigno; a secundidade: o sinssigno e a terceiridade: o
legissigno.

• A tricotomia se repete para cada um deles, ficando para o objeto a primeiridade:


o ícone; a secundidade: o índice e a terceiridade: o símbolo.

• A tricotomia se repete para cada um deles, ficando para o interpretante a


primeiridade: o rema; a secundidade: o discente e a terceiridade: o argumento.

• O signo é toda e qualquer coisa que representa algo em seu lugar.

40
AUTOATIVIDADE

1 A relação lógica do fenômeno e significado surge inicialmente na medicina.


Ao final do século XVII, Henry Stubbes aponta um ramo da ciência médica
dedicado ao estudo da interpretação dos sinais (sintomas). Tal ramo
científico amplia-se e tem como objeto qualquer sistema sígnico. Por volta
do século XVIII, o “nome” começa a aparecer com os seus respectivos
estudiosos. Com base nessa introdução, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Somente a semiologia que tem nos estudos do norte-americano Charles


Peirce seu principal expoente.
b) ( ) Semiologia com Peirce e Semiótica com Saussure.
c) ( ) Semiologia com Saussure e Semiótica com Peirce.
d) ( ) Somente a semiótica que tem nos estudos de Saussure sua base central.
e) ( ) Nenhuma das alternativas, pois a afirmação introdutória está
equivocada afinal semiótica não tem relação alguma com a medicina.

2 Quando iniciamos um entendimento semiótico, percebemos que a


abordagem científica surge num mesmo período, mas em lugares diferentes.
Semiótica e semiologia se diferem por isso, a primeira com berço nos Estados
Unidos da América e a segunda na França – contexto europeu. Além desta,
outras diferenças marcam esse entendimento. Qual das alternativas não
apresenta uma diferença entre estas duas correntes?

a) ( ) A semiologia entende que o signo é resultado de uma dicotomia;


enquanto que a semiótica, entende que o signo é tricotômico.
b) ( ) O verbo (a palavra) é signo tanto para a semiologia quanto para a
semiótica.
c) ( ) Enquanto a semiótica dá conta de todo e qualquer fenômeno como
signo, a semiologia se limita ao verbo (a palavra).
d) ( ) A abordagem semiótica em Peirce é mais generalista do que a
abordagem saussuriana na semiologia.

3 A semiologia e a semiótica têm como base o entendimento que signo é


alguma coisa que representa algo em seu lugar. A partir da introdução,
avalie as asserções a seguir e a relação proposta entre elas:

I- Uma palavra será signo, considerando que seus falantes estejam em um


mesmo contexto linguístico.

PORQUE

II- Se formos pensar na palavra “mãe” ela é significante para os falantes da


língua portuguesa, tendo significando similiar à palavra “mother” para os
falantes da língua inglesa.

41
A respeito dessas asserções, assinale a opção CORRETA.
a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa
correta da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma
justificativa correta da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

4 A tricotômica da semiótica de Peirce, entende que existem momentos


diferentes de semiose, de processar o significado das coisas. Apresenta
quais são estas categorias e como são chamadas:

5 Descobrir o conceito, determinar as formas como ele será manipulado,


combinar todas as exigências possíveis para que o projeto dê conta de
reprentá-lo demanda do profissional de projeto a capacidade de produzir
objetos que sejam capazem de significar. Um muitos casos se utlizam das
convenções do mercado – tendências de cores, de materiais por exemplo.
Ao usar das convenção, em relação ao objeto, qual categoria signícia da
tricotomia da semiótica de Peirce o projetista está tomando como base?

42
TÓPICO 3 —
UNIDADE 1

A SEMIOLOGIA E A SEMIÓTICA

1 INTRODUÇÃO
Iniciamos o terceiro tópico desta unidade. Nela, você conhecerá os
conceitos de semiologia e semiótica como fundamento para o entendimento
de semiótica, contribuindo para a reflexão acerca da capacidade humana de
interpretar e produzir signos, potencializando a capacidade analítica e crítica de
leitura de objetos sígnicos com base na semiologia (Plano de Expressão e Plano de
Conteúdo) e na semiótica (ícone, índice e símbolo).

O entendimento inicial para este tópico é perceber que o foco linguístico


da semiologia de Saussure, que se limitava à palavra (principalmente falada),
vai ganhar amplitude, com outros teóricos que passaram a chamá-la, também de
semiótica. Oportunizando, mesmo de forma dicotômica, seja possível abordar o
signo de forma genérica.

O recorte deste tópico tem o objetivo de focar, dentro de cada uma


das correntes estudadas até aqui, o entendimento das abordagens semióticas
possíveis, possibilitando que se tenha duas maneiras de abordar o signo.

2 A SEMIOLOGIA E O PLANO DE EXPRESSÃO E PLANO DE


CONTEÚDO
Ao conceber o signo dicotomicamente – com base no significante e no
significado, Ferdinand de Saussure ofereceu condições teóricas para que se
pudesse pensar não apenas na linguagem verbal, mas também na relação entre
“som” e “sentido”.

Neste contexto aparecem dois grandes nomes da semiótica. Louis Trolle


Hjelmslev, um dos grandes teóricos do Círculo Linguístico de Copenhague, não
somente deu continuidade às visões linguísticas de Saussure, como as sistematizou
para as demais linguagens humanas, expandido o objeto saussuriano. Seu
pensamento foi uma das fontes definidoras da Semiótica de Algirdas Julien
Greimas fundador da Escola de Semiótica de Paris nos anos de 1960, cuja obra
teórica foi solidamente construída abarcando teoria, prática e epistemologia. De
fato, para este, a semiótica está na capacidade de exercitar a descrição e análise.
Na visão greimasiana, na esteira do pensamento de Hjelmslev, toda análise de
qualquer fenômeno significante precisa considerar uma estrutura fundamental,
profunda, ao dar conta dela tem-se garantida a significação.

43
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

ATENCAO

Tanto a semiótica quanto a semiologia têm um corpo teórico consistente


e vasto. Nossa disciplina objetiva o entendimento destas áreas, recortando a abordagem
nas posturas, não se aprofundando em cada teórico. Contudo, se você tem interesse em
conhecer cada um deles vale acessar o google scholar: https://scholar.google.com.br e
colocar o nome dos teóricos que aparecem.

O ponto de partida deste subtópico é o modelo semiótico desenvolvido


por A. J. Greimas e colaboradores, em linha com as propostas de Louis Hjelmslev,
o dinamarquês mais saussuriano dos linguistas, que apresentou uma linha de
pensamento em que as noções de significante e significado sofreram ajustes
consideráveis, passando a ser chamadas de “plano de expressão” (significante)
e “plano de conteúdo” (significado), substituindo a ideia de signo entre as duas, e
atribuindo a esta relação a ideia de semiose, como processo de produção de sentido.

FIGURA 17 – PLANO DE EXPRESSÃO E PLANO DE CONTEÚDO

FONTE: O autor

O plano de expressão pode ser definido como instância de exteriorização


do conteúdo, onde ficam manifestadas as qualidades concretas dos elementos e
estímulos que tocam os órgãos sensoriais. Quanto mais complexo o objeto, mais
se deve investigá-lo para dar conta de assumir seu significado. Um bom exemplo
são os desfiles de moda: várias expressões (looks, perfil das modelos, músicas,
iluminação, alocação – espaço, layout da passarela, entre outros elementos)
devem dar conta, em conjunto, do conteúdo (conceito) da coleção apresentada.

44
TÓPICO 3 — A SEMIOLOGIA E A SEMIÓTICA

NTE
INTERESSA

Um designer de moda tem que ter bem claro o “conteúdo” (conceito) da


coleção que está desenvolvendo, para então “expressar” em seus desenhos (linhas, cores,
texturas, cartela de materiais, entre outros) elementos que vão ser sentidos pelo seu
público-alvo promovendo o ato de compra. Amplie isso para o vitrinismo, para um editorial,
para um desfile e vemos a complexidade aumentando!

Outro ponto interessante aqui, que tem como base a lógica de Hjelmslev,
é o entendimento de que o “plano de expressão” pode ter variações, dando conta
das diversidades de estilos, ou seja, um “conteúdo”, pode ser “expresso” de
várias formas. No design, dois projetistas podem expressar o mesmo conteúdo
de formas diferentes, cada um dando conta de expressá-lo, conforme seu estilo
de desenho e de trabalho. Todavia, é claro que alguns elementos de expressão, se
pensados dentro de uma mesma cultura, vão ser similares.

TUROS
ESTUDOS FU

Na Unidade 2 estudaremos os elementos visuais – e, então, perceberemos


que um elemento visual tem potencial para expressar um determinado conteúdo. Cabe
como exemplo aqui a ideia das formas curvas/circulares que se mostram mais orgânicas
que as lineares – então, se dois designers expressam fluidez em seus desenhos, é bem
provável que as formas curvas/circulares aparecerão nas duas expressões.

Os conteúdos estão impregnados de sentidos já articulados, por formas


acrescidas de hábitos e condições sociais, que influenciam diretamente na maneira
como devem ser expressos.

Interessante perceber que o “plano de expressão” indica os elementos


que participam da homologação com o “plano de conteúdo” – e que na
composição do primeiro, vamos ter elementos principais, secundários e outros
que complementam o todo.

Em resumo, nós podemos destacar que um objeto sígnico aqui tratado terá
elementos de enunciação – do “plano de conteúdo”; elementos de expressão –
do “plano de expressão”; e os efeitos de sentido – da semiose, da capacidade de
significar, de ter significado.

45
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

Para Hjelmslev (1975, p. 49) “um signo que funciona, que designa e que
significa, é, acima de tudo, um signo portador de uma significação”. Ele não pode
ser definido como alguma coisa de natureza vazia, ou seja, a condição do signo
é ser signo – é significar. Havendo aqui a necessidade da contextualização, pois
descontextualizado fica desprovido de significado. E, dentro disso, sua máxima
relação sígnica se dá pelas relações que mantêm com outros signos dentro de um
determinado contexto.

Esta ideia fica mais clara quando pegamos um determinado signo, e o


analisamos fora e dentro de um determinado contexto. No pensamento de
Hjelmslev, mais voltado à linguística, vamos tomar a palavra “botão”, vê-se
que isolada nem sempre é possível relacionar a um sentido, havendo aqui um
esvaziamento de sentido (lembre-se de que ausência de sentido não é somente
não ter sentido algum, mas permitir muitos sentidos, o que nos leva a não assumir
sentido algum). A palavra “botão”, na língua portuguesa, tem vários significados,
mas quando aplicada em um determinado contexto, direcionada; desta forma, ela
tem sentido. “Chame o elevador apertando o botão”; “Feche sua calça apertando
o botão”; são sentenças que colocam a palavra “botão” em contexto diferentes,
dando a mesma palavra sentidos diferentes. “[...] isoladamente, signo algum tem
significação. Toda significação de signo nasce de um contexto” (HJELMSLEV,
1975, p. 50). Portanto, entendemos isso como um contexto de situação ou um
contexto explícito.

Vale ressaltar que cores, materiais podem ser considerados elementos


significativos, como expressões de signos, quando desempenham funções de
sentido, caso contrário são elementos vazios de significação. Entretanto, quando
compõem um objeto, dão conta de ser signos, e ao significarem permitem
que o objeto, na sua totalidade tenha o significado do conteúdo pretendido.
Pensando com foco no desenvolvimento de produtos é permitir ver que “plano
de conteúdo” e “plano de expressão” funcionam dicotomicamente. Cada uma
dessas partes parece ter outras internamente, como afirma Hjelmslev (1975), e
mostra o quadro a seguir:

QUADRO 12 – PLANO DE CONTEÚDO E PLANO DE EXPRESSÀO

É a estrutura do conteúdo (como narrativa,


Forma do conteúdo
como língua na fala/escrita).
Plano de
Conteúdo Substância do
É o pensamento, a ideia, a significação.
conteúdo
SIGNO São os elementos da forma – traços, cores,
Forma da expressão texturas, materiais (na linguagem verbal são
Plano de as palavras, os fonemas).
Expressão
Substância da São as composições (na linguagem verbal os
expressão sons articulados pela fala, os textos escritos).

FONTE: O autor

46
TÓPICO 3 — A SEMIOLOGIA E A SEMIÓTICA

Num contexto íntimo à comunicação e a todo período considerado de


contracultura, que marcou a segunda metade do século XX, a semiótica de que aqui
estamos tratando tem outro pensador: Rolland Barthes, que redefiniu a semiologia.

Rolland Barthes, reinterpretando Hjelmslev, esclarece que qualquer


sistema de significação, e aí podemos entender o design, comporta um “plano de
expressão” e um “plano de conteúdo”, e sua significação consiste na relação entre
estes dois planos. Para este autor o vestuário

constituía um excelente objeto poético. Primeiramente, porque


ele mobiliza com muita variedade todas as qualidades da matéria
– substância, forma, cor, tactilidade, movimento, apresentação,
luminosidade; e depois porque, em contato com o corpo e funcionando
ao mesmo tempo como seu substituto e sua cobertura, é ele, certamente,
objeto de um investimento muito importante (BARTHES, 1979, p. 42).

NTE
INTERESSA

Rollando Barthes, em Paris nos anos de 1960, na École Pratique des Hautes
Études en Sciences Sociales, se notabilizou como um dos principais representantes do
estruturalismo, entre algumas obras o livro Sistema da Moda (editora Martins Fontes) é
pertinente para a formação em design de moda e em áreas relacionadas à comunicação.

Neste momento de nossa disciplina, a ideia é mostrar que é possível


trabalhar com uma postura semiótica, a partir da noção dicotômica de Saussure.
Ampliando para as noções de “plano de conteúdo” e “plano de expressão”
tratadas até aqui.

3 A SEMIÓTICA E A TRICOTOMIA DO SIGNO: ÍCONE,


ÍNDICE E SÍMBOLO
Da mesma forma que nos permitimos retornar à semiologia e mostrar de
forma mais aplicável, dentro da semiótica tricotômica de Peirce é possível fazer um
recorte para que ela fique menos complexa.

Vimos que a semiótica peirciana entende o signo como resultado de


relações triádicas, em suma composto pelo “representâmen”, pelo “objeto” e pelo
“interpretante”, em categorias de primeiridade, secundidade e terceiridade. A noção
de que todo este sistema opera quando estamos abordando o signo é importante.

47
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

QUADRO 13 – CATEGORIAS TRICOTÔMICA DE PEIRCE

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno ícone rema
Secundidade sinssigno índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: O autor

O desenvolvimento de projeto em design tem sua natureza diretamente


ligada ao pensamento criativo. Um fenômeno interno mental, que sugere
percepção inconsciente, consciente e conhecimento, envolvendo aspectos
psíquicos, afetivos e o sistema sensório-motor, ou seja, quando nos damos conta
que no desenvolvimento de projeto estamos nos ocupando de um processo
criativo, todo nosso sistema sensorial, psíquico parece estar operando, e nos
vemos assumindo uma postura singular que não separa corpo e mente. E tudo
isso parece acontecer se nos darmos conta!

O ato de projetar, que é ato de criação, é ato de linguagem gerada pelo


corpo, e também é ato de incluir as percepções ambientais, podendo então resultar
em processos que ocorrem internamente e/ou no entorno do contexto do projeto.
Em linha com a semiótica peirciana há neste processo a percepção do sujeito, do
que ele vê/sente do contexto; e do que ele já viu, recordando o que já indicia; e até
daquilo que ele consegue extrair do contexto informações de forma consciente. É
possível perceber as três categorias: no processo de primeiridade, o signo desperta
na consciência do projetista uma qualidade imediata, não há reconhecimento
nem análise dela, apenas é sentida – uma sensação. Então os elementos que a
compõe e suas propriedades (como cores, formas, texturas etc.) se apresentam em
qualidades do fenômeno, havendo neles então a constatação de algo existente,
em secundidade, fazendo o signo se apresentar de forma consciente, provocando
recordações de experiências já vividas. E, então, ocorre o julgamento, a síntese,
a certeza, sendo esta, a terceiridade. Essas categorias mostram que, no processo
criativo, que é o de projetar, são perpassadas as experiências como qualidade, de
relações e de representação – as três categorias de Peirce.

Por vezes a definição de uma cartela de cores de uma coleção não vem
apenas da certeza, de algo que está em terceiridade: assumida como verdade
e síntese nas tendências de um determinado bureau. Ela pode aparecer de uma
experiência de primeiridade, quando o projetista se permitiu vivenciar situações
do público-alvo da marca, e então, movido mais pelo sentimento do que pela
razão, definiu uma cor, uma tonalidade, uma composição. Este exemplo mostra
quanto o projeto, o ato criativo é singular. O projetista está imerso num processo
dinâmico onde, a cada momento, precisa tomar decisões e fazer escolhas.

48
TÓPICO 3 — A SEMIOLOGIA E A SEMIÓTICA

ATENCAO

Ao considerarmos o processo criativo como dinâmico e então caracterizado por


uma constante articulação, é possível que se tenha uma infinidade de ideias, de associações.
Basta que se tenha lógica e que esta consiga ser explicada. Uma ideia leva a outra, nenhum
signo é completo, estático, todo signo se completa em outro e assim por diante.

Todo projeto contém signos ordenados por regras, cuja finalidade é permitir
sua comunicação – seu entendimento. O contexto sentido por um profissional pode
ser por ele incorporado e transformado e resultar em novas formas de representação.
O projeto pode ser entendido como processo de modulação que traduz formas
similares (iguais) – icônicas; que têm relação e remetem aos fenômenos – indiciáticas; e
que se sustentam em regras, em normas – simbólicas.

Uma maneira de ilustrar isso é definirmos o tema “automóveis”. À medida


que nos damos tempo para pensar nele, vemos quão importante é termos o carro
como referência – ou seja, o desenho de um carro se mostra icônico – em suas
qualidades dá conta de representar “automóveis”.

FIGURA 18 – REPRESENTAÇÃO DE UM AUTOMÓVEL

FONTE: <https://amordepapeis.com.br/wp-content/uploads/2019/11/carros-para-colorir-47.jpg>.
Acesso em: 16 abr. 2020.

Para darmos conta de representar carro, e ficarmos no tema “automóveis”,


ícone fazem de forma rápida – olhando a figura acima, dado o contexto cultural
que vivemos, não precisa esforço para vermos a representação de automóvel,
porém algumas representações gráficas podem indiciar “automóveis”, como
exemplo, a marca de pneus que passaram sobre uma superfície:

49
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

FIGURA 19 – REPRESENTAÇÃO DE MARCAS DE PNEU DE UM AUTOMÓVEL

FONTE: <https://pt.dreamstime.com/trilha-de-sujeira-do-protetor-da-roda-carro-silhueta-pneu-
preta-ilustra-o-vetor-isolada-no-fundo-branco-image144799156>. Acesso em: 29 set. 2020.

Ao olharmos para as duas imagens acima, elas dão conta de representar


“automóveis” a partir da noção de experiência do automóvel no mundo, ou
seja, o desenho do carro é ícone de carro, pois é similar – em suas qualidades
representa o automóvel. Enquanto a representação de “marca de pneus numa
superfície” representa “automóveis” a partir da sugestão. Ela sugere automóvel,
mas não o declara. Para termos esta noção, precisamos buscar detalhes a partir
de comparações de experiências já vividas. Sabe-se que é uma marca de pneu,
que dada sua largura e elementos não é de bicicleta nem de motocicleta; e
conseguimos ver referência ao carro, sem ele estar ali representado diretamente.
Assumimos o automóvel na figura, da mesma forma que assumimos fogo ao
vermos fumaça, chuva para chão molhado – ou seja, o desenho da marca de pneu
indicia automóvel, reforçando a presença do índice (secundidade).

Quando vamos para a categoria da terceiridade, na representação


de “automóveis” vamos perceber que as relações se dão com base em regras,
em normas, ou seja, em expressões que foi preciso aprender. E, que de forma
arbitrária, dá conta de representar “automóvel”.

FIGURA 20 – REPRESENTAÇÃO EM TOM DE CINZA DA MARCA DA VOLKSWAGEN

FONTE: <https://logodownload.org/wp-content/uploads/2014/02/volkswagen-vw-logo-0-
2048x2048.png>. Acesso em: 16 abr. 2020.

50
TÓPICO 3 — A SEMIOLOGIA E A SEMIÓTICA

A marca da Volkswagen dá conta de representar “automóveis”, porém


para isso acontecer é preciso conhecer a marca, esta representação não se faz
apenas pelos traços – circulares e triangulares, ou da mesma forma no fato da
composição remeter às letras V e W (talvez isso até contribua para o conceito
da marca) – mas é no conhecimento da marca que se faz capaz de representar
“automóveis”, e faz isso como Símbolo, em terceiridade.

51
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

LEITURA COMPLEMENTAR

SEMIÓTICA APLICADA AO DESIGN DE MODA: UMA LEITURA


DE ARTIGOS CIENTÍFICOS

Joana Brolhani
Thyenne Vilela

Introdução

A teoria Semiótica apresentada como Teoria Geral dos Signos, conduz


o acadêmico de moda a compreender o processo de comunicação e identificar
os fatores que influenciam a significação de uma mensagem. Instrumentaliza
e desenvolve intersemioses entre as diferentes linguagens que constituem os
ambientes humanos, além de exercitar a produção de linguagens, como resultado
dos processos de organização dos signos por habilidades teóricas e práticas.

A fim de reconhecer os usos da semiótica no design de moda, verificando


possíveis aplicações e resultados analíticos, foi identificada a oportunidade
trabalhar com amostras de artigos científicos publicados em eventos de design. A
escolha dos artigos se deu, devido ao caráter exploratório que, em hipótese, além
de apresentar o referencial teórico –, potencializam apresentar também a teoria
aplicada em análises de projetos em design de moda.

É necessário esclarecer que o resultado final da avaliação crítica dos artigos,


não acompanhados dos artigos originais, reduziria a representação significativa
da crítica para junto ao leitor. Por isso, definiu-se direcionar o conteúdo desse
artigo, para os procedimentos que conduziram a leitura do pesquisador de
graduação, que investiga a semiótica aplicada ao design de moda, sendo possível
replicar esse percurso para os demais pesquisadores interessados.

Identificação de artigos científicos com referencial da teoria Semiótica

Com base na metodologia de Lakatos e Marconi (1991) foi possível o


desenvolvimento da pesquisa de seleção e organização dos 11 artigos científicos
na área de Design de Moda que usassem como referência principal a 1 Graduanda
do curso de Design de Moda da Universidade Positivo; Pesquisadora no Programa
de Iniciação Científica (PIC) desta universidade. 2 Mestre em Comunicação e
Linguagens pela Universidade Tuiuti do Paraná; Docente nos cursos de Design da
Universidade Positivo desde 2004; Orientadora do TCC – Trabalho de Conclusão
de Curso – Design de Moda. 2 Semiótica. Foi realizado o fichamento bibliográfico
indicando: 1. Título do artigo; 2. Autores e vínculo acadêmico; 3. Resumo do
artigo; 4. Evento e ano de publicação; 5. Link da referência online. Em seguida,
foi desenvolvida e preenchida uma ficha para identificar em cada um dos artigos

52
TÓPICO 3 — A SEMIOLOGIA E A SEMIÓTICA

selecionados: 1. Quais autores da semiótica o artigo apresentava; 2. Qual foi a


referência utilizada; 3. Uma cópia de uma citação relevante do autor; 4. O modo
como a teoria foi abordada no artigo: a. Teórico com aplicação argumentativa; b.
Teórico com aplicação analítica.

Cabe aqui, apresentar os títulos dos artigos selecionados e respectivas


instituições:

Design de Moda: o corpo, a roupa e o espaço que os habita (UESP); A


inter-relação entre moda, corpolatria e mídia (UEM); Comunicação,
moda e semiótica: pressupostos para o estudo da história do jeans
em campanhas publicitárias (UEM; UFPR); A semiótica e a Moda
(UNICAMP); Por uma tipologia de estilos: Fronteiras da construção
da aparência do corpo (UFPE); Apresentação e discussão do Modelo
exploratório de intervenção de design – Meid (SORBONNE; UFPE);
Pioneiras da Moda de Autor em Portugal (UNL); A linguagem visual
do vestuário da revista Manequim na década de 1960 (UFC; UFPE); O
vestir como dispositivo simbólico da arte (UFPE); A mensagem pela
imagem – análise semiótica das fotografias publicitárias da coleção
verão 2007 da WJ acessórios (UNIASSELVI-SC); Publicidade de
perfume – uma análise plástica do sensível (PUC-SP).

Dos autores mais presentes nos artigos selecionados, é possível


reconhecer uma divisão entre referências à semiótica francesa (Greimas; Barthes;
Baudrillard; Floch; Castilho; Martins, etc.) e referências à semiótica americana
(Peirce; Santaella; Pignatari; Brosso; Valente; etc.). Por meio de questionário
aplicado online a pesquisadores e professores de semiótica em cursos de design
de diferentes localidades, identificou-se que 70% adotam determinada linha de
pesquisa devido à herança acadêmica, e os demais, porque estudaram as diferentes
linhas e optaram por trabalhar com uma determinada. Sendo assim, definiu-se
não adentrar a discussão quanto à linha de pesquisa, e sim em como os conceitos
teóricos estavam sendo abordados nos artigos. De 11 artigos, 5 apresentaram a
teoria aplicada à análise de projetos de moda (abordagem teórico-prática), os
demais artigos concentraram nas abordagens especificamente teóricas.

Reconhecimento de abordagens teórico-práticas

Para explorar quais as condutas e critérios adotados para a aplicação da


teoria no design de moda, foram selecionados 3 artigos que indicavam algum tipo
de análise. A fim de identificar possíveis sistemas analíticos, foi verificado em
cada artigo o uso de: 1. Tabela; 2. Texto analítico discursivo; 3. Uso de imagem do
objeto; 4. Uso de imagem auxiliar ao projeto e / ou editada; 5. Outros. O resultado
apresenta que todos os artigos realizaram análise mediada 3 por: ‘texto analítico
discursivo’ e ‘uso de imagem do objeto’. Isso indica que diante dos artigos
selecionados nessa pesquisa, as análises semióticas adotam o método descritivo
quantitativo de apropriação da teoria na prática.

53
UNIDADE 1 — SEMIÓTICA

Avaliação da teoria como base analítica-prática

Em seguida foi realizada uma leitura exploratória quanto à qualidade


da análise no artigo. Foi desenvolvido e aplicado um formulário-guia, e para
cada item indicar: os autores; as citações pertinentes; e uma breve discussão
argumentativa a partir das informações disponíveis no artigo. O formulário-guia
apresentava as seguintes questões: 1. O objeto e o contexto do objeto analítico foram
anunciados / explicados? 2. Os conceitos teóricos foram explicados (considerando
público leigo) com os respectivos autores indicados? 3. Os conceitos teóricos
foram resgatados durante a análise? 4. Foi apresentado um referencial teórico
complementar à semiótica? Se sim, quais e qual a influência dos mesmos para a
análise semiótica? 5. A análise favoreceu uma discussão com resultados? Se sim,
houve o resgate dos conceitos teóricos nessa discussão?

Vale ressaltar, que o item 4 favoreceu o reconhecimento da necessidade de


um referencial teórico complementar à semiótica, que condicione a representação
de signos, com lógica na leitura das linguagens. O resultado desse processo
avaliativo revela que o conhecimento dos códigos empregados, bem como das
teorias afins, é repertório fundante para – então – ter a semiótica como mediadora
do processo.

Para apresentar a leitura avaliativa realizada, seria necessária também


a apresentação dos artigos originais, evitando recortes críticos sem a devida
referência, o que ocasionaria possíveis ruídos para o leitor, reduzindo a
compreensão do que conduziu um ou outro argumento por parte do pesquisador.

Considerações finais

A pesquisa apresentada foi conduzida a partir de questões entorno de


como a semiótica estava sendo aplicada no design de moda; quais eram os autores,
as abordagens, e os tipos de análises; Como trata de uma iniciação científica, o
que é mais relevante no presente artigo, é o percurso investigativo do graduando,
afim de atender a essas questões. Portanto, os procedimentos adotados, que
poderão guiar futuras análises. É relevante considerar, que em uma área criativa
como o design de moda, o uso da semiótica pode ser potencializado como guia
processual no desenvolvimento de projetos ou como guia analítico de linguagens
da moda. A teoria depende de uma prática que a revele, articulada com outras
teorias que fundamentam a produção da linguagem na área, pois o repertório de
quem se destina a realizar uma análise semiótica, exige referências da natureza
da linguagem investigada, bem como do reconhecimento do contexto, do público
destino e da situação de aplicação; sem esse referencial preliminar a teoria
semiótica não se aplica.

FONTE: BROLHANI, Joanna; VILELA, Thyenne. Semiótica aplicada ao design de moda: uma
leitura de artigos científicos. 11º Colóquio de Moda – 8ª Edição Internacional – 2º Congresso
Brasileiro de Iniciação Científica em Design e Moda, 2015. Disponível em: http://www.
coloquiomoda.com.br/anais/Coloquio%20de%20Moda%20-%202015/POSTER/PO-EIXO1-
DESIGN/PO-1-SEMIOTICA-APLICADA-AO-DESIGN-DE-MODA.pdf. Acesso em: 13 out. 2020.

54
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• A semiologia saussuriana, que só tratava do signo linguístico, ganhou a


possibilidade de tratar de outros tipos de signo a partir da noção de outros
pensadores que atribuíram a noção dicotômica de Plano de Expressão e Plano
de Conteúdo.

• A semiótica peirciana pode sofrer um recorte em sua tricotomia e trabalhada


apenas e uma de suas categorias – caso do objeto: ícone, índice e símbolo.

• É possível analisar um objeto (que não seja apenas linguístico) a partir da noção
dicotômica – Plano de Expressão e Plano de Conteúdo; e/ou a partir da noção
tricotômica – ícone, índice e símbolo.

• Considerando as categorias do objeto: a primeiridade do objeto é o ícone e sua


relação sígnica se faz por similaridade; a secundidade do objeto é o índice e
sua capacidade sígnica se faz por relação indireta; e a terceiridade do objeto é
o símbolo e sua capacidade sígnica se faz, em grande parte, por convenção.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

55
AUTOATIVIDADE

1 Analise a imagem disponível no site Fashion Bubbles, um dos maiores


sites de tendências em lifestyle, para fazer uma análise rápida. Você pode
usar o espaço reservado ao lado da imagem e então observá-la, listando
primeiro os elementos de expressão (liste o máximo de coisas que você vê na
imagem); depois que esta lista estiver bem completa, procure ver o que estes
elementos isolados ou em conjunto enunciam – sugerem, como conteúdo
(perceba que isso tem muito a ver com seu nível de conhecimento e claro
com sua capacidade de ter ideias – tudo vale, desde que tenha lógica, claro).
Após estas duas listas, você consegue fazer uma síntese? Você consegue
montar um pequeno texto colocando em palavras o que a imagem diz? Se
possível, escreva dentro da área de sua formação.

Atenção! A imagem foi modificada para tons de cinza. Em destaque, apenas


vale mencionar que o vestido na imagem seria azul (veja no link a seguir para
ter acesso à imagem colorida). Em nossa leitura, daremos direcionamentos
para esta cor ao mesmo tempo que vamos também ler o tom cinza, que se
forma no vestido na imagem impressa aqui).

FONTE: <https://www.fashionbubbles.com/estilo/a-cor-do-verao-2021-a-i-aqua-aposta-wgsn/>.
Acesso em: 22 set. 2020.

Liste os elementos de expressão


(Plano de Expressão)

O que cada elemento listado enuncia?


(Plano de Conteúdo)

Há algum sentido no que está expresso e enunciado?


(efeito de sentido)

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Normalmente, resvalamos na descrição de objetos conhecidos que vemos:
uma mulher (modelo) com outra ao fundo; um vestido cinza; sapatos (botas)
pretas; piso; elementos que remetem à divisória com bases circulares. Não está
errado! Contudo, podemos nos ocupar do que está expresso na imagem: como
elementos como as linhas onduladas que formam o vestido cinza; o própria
forma cinza que representa vestido; elementos semicirculares (posicionados
no piso dando a ideia que são as bases das divisórias); desses semicírculos
saem linhas mais curvas em vertical, no canto superior direito estas linhas
curvas ficam mais evidentes; linhas retas (do piso cinza), formas pretas da
mancha ao fundo que remete a uma segunda modelo, dos sapatos que se
espelham no piso cinza, que tal completar com estes direcionamentos sua
lista? Liste tudo o que você vê.

Se formos para os elementos de enunciação (plano de conteúdo), a imagem,


em seus elementos expressos pode sugerir algumas coisas: as formas
onduladas dão conta de enunciar um conteúdo: nos remetem a fluido, uma
forma que sugere líquido, podendo até ser pensada como um tecido (trama),
como tecnologia têxtil. A formas circulares que sustentam pequenas linhas
verticais pode nos remeter galhos (ainda mais quando somadas às linhas
curvas do canto superior direito) induzindo, de forma abstrata, a antenas e
tramas de galhos. Da mesma forma as linhas retas do piso que mostram uma
outra trama (só que está mais organizada, mais métrica), por onde o reflexo
dos sapatos sugere um espaço virtual (espelho).

E, então, podemos assumir os efeitos de sentido, em que uma modelo (pois a


mulher parece estar desfilando) lança um look (seu vestido cinza) num espaço
composto por redes e antenas que nos remetem à tecnologia, onde a modelo
parece se virtualizar. A imagem dá o sentido de que no contexto tecnológico o
tom cinza do vestido parece ganhar espaço.

Ao considerarmos ao que foi chamado atenção no enunciado: onde a


imagem colorida daria conta de mostrar um vestido azul – a ideia líquida
ganha conotação de água. Podemos perceber que a imagem dá conta, pelos
seus elementos de expressão e elementos de enunciação sugerem o efeito de
sentido que a WGSN – Worth Global Style Network; vem apostando como
tendência de cor verão 2021 – que é o Azul Elétrico AI Aqua – inspirada na
tecnologia – e por isso fica importante ver a imagem real – e perceber que a cor
azul compõe a imagem.

O legal do exercício é que se lançarmos o olhar novamente à imagem, outros


elementos parecem ficar evidentes, reforçando enunciações ou trazendo
novas enunciações, e promovendo efeitos de sentidos mais consistentes e
novos. Interessante perceber, que cada elemento é portador de significação, e
que somados promovem a imagem como portadora também de significação,
dando a ela um significando maior – que dá conta de um todo. Perceba o
impacto de uma fotografia em um desfile – onde o enquadramento, o foco, a
luz, a velocidade, podem interferir diretamente no discurso final da coleção e
do trabalho de um designer.

57
Com base na análise, assinale V para verdadeiro e F para falsa cada uma das
seguintes sentenças:

( ) Os elementos de expressão são compostos pela estrutura sensível que o


objeto em análise nos oferece.
( ) Entende-se como estrutura sensível todos os elementos do objeto que
tocam os nossos um ou mais dos nossos cinco sentidos.
( ) A estrutura sensível é formada apenas pelo que é visto – apenas pelo
sentido da visão. Desta forma, se estivéssemos assistindo o desfile da
imagem analisada, a música não afetaria o efeito de sentido do objeto em
análise.
( ) A noção de que para todos elementos de expressão exista uma enunciação
é basilar para a noção de efeito de sentido e da ideia de signo.
( ) Não existe relação alguma entre signo e a noção de efeito de sentido.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – V – F – V – F.
b) ( ) V – V – V – V – V.
c) ( ) F – F – V – F – V.
d) ( ) V – F – V – F – V.

2 Analise a mesma imagem do exercício anterior para completar a tabela


ao lado. Você pode se apoiar nos direcionamentos de efeitos de sentido
da resposta anterior (fique à vontade de deixar mais dentro do que você
respondeu), perceba que ele contribui para o Plano de Conteúdo (e como
você conseguia dar a ele uma narrativa). Os elementos que dão conta da
narrativa vão precisar ter sentido (no caso de uma imagem fotográfica:
precisam ficar visíveis – alguns mais evidentes que outros). E aí então, você
pode listar quais elementos estão expressos na imagem dando conta do
Plano de Expressão.

Atenção! Lembre-se de que a imagem foi modificada para tons de cinza. Em


destaque, apenas vale mencionar que o vestido na imagem seria azul. Em nossa
leitura, daremos direcionamentos para esta cor ao mesmo tempo que vamos
também ler o tom cinza que se forma no vestido na imagem impressa aqui.

FONTE: <https://www.fashionbubbles.com/estilo/a-cor-do-verao-2021-a-i-aqua-aposta-w-
gsn/>. Acesso em: 22 set. 2020.

58
Plano de
Conteúdo

SIGNO

Plano de
Expressão

Mais do que uma resposta, o exercício aqui é promover a capacidade de


transformar ideias (o que foi sua narrativa) em expressões. Em muitos casos,
percebemos que nossa capacidade de ideação é impregnada de elementos que
são nossos, e isso é muito importante – pois é isso que faz com que seu trabalho,
no momento de escolher expressões, sejam únicos – que o trabalho tenha o seu
estilo – a sua assinatura. E, então, quando vamos para o campo de expressão,
vemos que a imagem poderia ser outra: com outro enquadramento, com outra
velocidade, com outros elementos no lugar dos que estão ali expressos. Se
você percebeu isso neste exercício, parabéns! A ideia aqui é que você pode ser
capaz de fazer uma crítica a um produto (neste caso uma fotografia) de algum
profissional, pautada em fundamentos lógicos, que tenha sentido. Mais uma
coisa: perceba que os outros só vão entender seu posicionamento se haver
lógica também para eles, então cuidado para não ficar tendo ideias que só
para você tem lógica – pois seu trabalho (sua crítica, se for o caso) tem que
profissional para os outros.

Um exemplo: a cor cinza que ocupa boa parte da imagem tem lógica, ainda
mais se considerada na imagem colorida que seria azul – pois a foto de onde
foi tirada está declarando uma tendência de cor – como vimos pela WGSN, o
azul é muito usado na área da tecnológica e tem tudo a ver com água, certo?
Então, por mais que você não concorde, o peso da cor azul na imagem tem
lógica – e ainda mais ostentada pela modelo – afinal, como tendência, ela
remete ao uso como vestimenta.

59
Com base na análise, assinale V para verdadeiro e F para falsa cada uma das
seguintes sentenças:

( ) O plano de expressão dá conta dos elementos formais, cromáticos,


imagéticos, que formam a estrutura do objeto.
( ) O plano de expressão seria o significante e o plano de conteúdo se
organiza dentro da mesma ideia do significado na semiologia.
( ) O signo tem relação com a capacidade de cada elemento do plano de
expressão, ter enunciações no plano de conteúdo.
( ) O signo só vai ocorrer quando o plano de expressão não tiver nenhuma
relação com plano de conteúdo.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – V – V– V.
b) ( ) V – V – F – F.
c) ( ) V – V – V – F.
d) ( ) F – V – F – F.

3 A semiótica peirciana direciona que o objeto tem três categorias - ícone,


índice e símbolo, analise as sentenças a seguir:

I- A primeiridade do objeto está relacionada ao fato de podermos ver


representações similares nos signos, ou seja, que uma representação
gráfica será signo se for igual ao objeto que ela representa – o desenho de
uma cadeira é um exemplo disso!
II- A secundidade do objeto está nas relações indiretas, nos fenômenos que
indiciam suas representações. Caso do chão molhado para a chuva, não
vemos a chuva, mas pelo chão molhado é provável que choveu.
III- A terceiridade do objeto está nas convenções sígnicas. Em grande parte,
são arbitrárias. Caso da luz vermelha no semáforo significando pare.
IV- Em comparação com a primeiridade, a secundidade dispende mais
energia, pois nela que ficamos indo e voltando na busca de afirmações
sobre a representação. Ela não é direta, e por ao indiciar ela faz com o
que o interpretante enseje particularidades para chegar em algum
posicionamento frente ao signo.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Todas as sentenças estão corretas.
b) ( ) As sentenças I, II e II estão corretas.
c) ( ) Somente a sentença III está correta.
d) ( ) Todas as sentenças estão incorretas.

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4 Continuando com a mesma imagem dos exercícios anteriores, observe a
imagem e aponte três elementos nela, que são: três ícones; três índices; e três
símbolos.

Atenção: lembre-se novamente de que a imagem foi modificada para tons


de cinza. Em destaque, apenas vale mencionar que o vestido na imagem
seria azul. Em nossa leitura, daremos direcionamentos para esta cor ao
mesmo tempo que vamos também ler o tom cinza que se forma no vestido
na imagem impressa aqui).

FONTE: <https://www.fashionbubbles.com/estilo/a-cor-do-verao-2021-a-i-aqua-aposta-
wgsn/>. Acesso em: 22 set. 2020.

Ícones

Índices

Símbolos

5 Um projetista ao ter uma ideia de produto dá forma a essa ideia através de


um esboço, esse seria a expressão do conteúdo que a ideia tem.
Vemos nessa afirmação uma explicação rápida do Plano de Expressão e do
Plano de Conteúdo que, dicotomicamente, dão conta do signo a partir da
corrente saussuriana.
Explique com suas palavras o que seria o Plano de Conteúdo e o Plano de
Expressão:

61
62
REFERÊNCIAS

BARTHES, R. Sistema da moda. São Paulo: Nacional: USP, 1979.

HJELMSLEV. L. Prolegômenos a uma teoria da linguagem. 2. ed., São Paulo:


Perspectiva, 1975.

HOHLFELDT, A.; MARTINO, L. C.; FRANÇA, V. V. (Org.). Teorias da comunicação:


conceitos, escolas e tendências. 14. ed. Petrópolis: Vozes, 2014.

NÖTH, W. Panorama da semiótica de Platão a Peirce. 2. ed. rev. São Paulo:


Annablume, 1998.

PEIRCE, C. S. Semiótica. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2005.

SANTAELLA, L. Semiótica aplicada. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002.

SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. São Paulo: Edusp, 1990.

WALTHER-BENSE, E. A teoria geral dos signos. São Paulo: Perspectiva, 2000.

63
64
UNIDADE 2 —

PERCEPÇÃO VISUAL

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender o que é percepção visual e como se dá a capacidade de


representar visualmente ideias e conceitos;

• entender, de forma introdutória, a fisiologia e psicologia da visão;

• aprender os princípios da Lei da Gestalt – da organização da forma;

• conhecer os princípios e as técnicas básicas da composição visual;

• identificar os elementos básicos da composição visual.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – PERCEPÇÃO VISUAL – FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA


VISÃO

TÓPICO 2 – AS LEIS DA ORGANIZAÇÃO DA FORMA: GESTALT

TÓPICO 3 – PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA


COMPOSIÇÃO

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

65
66
TÓPICO 1 —
UNIDADE 2

PERCEPÇÃO VISUAL – FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA VISÃO

1 INTRODUÇÃO
Para iniciar esta segunda unidade, vale lembrar que o conteúdo de
semiótica até aqui trabalhado oportunizou não apenas um entendimento de que
se trata de uma ciência que se ocupa do signo e de todo o processo de significação
– a semiose; mas que estamos imersos em um cotidiano onde recebemos uma
quantidade considerável de textos visuais e não visuais, e aplicamos a eles certa
leitura e certa compreensão.

A semiótica, indiferente da corrente assumida, ocupa-se do processo de


significação destes textos. Dos não visuais, que nos chegam pelo olfato, pelo
paladar, pela audição, pelo tato, e dos visuais, que colocam a visão como o
principal sentido. E este último (a visão) é o primeiro quando somos indagados
sobre o que sentimos de algum fenômeno.

A capacidade de perceber visualmente vai além da acuidade visual – do


ver bem. Da mesma forma que não basta saber ler, é preciso entender o que se
está lendo, a percepção visual trata da capacidade de leitura e da capacidade
interpretativa do texto percebido visualmente (e então, o que já tratamos dentro da
semiótica, ajuda bastante). Se somos capazes de perceber visualmente e entender
o percebido, adquirimos habilidade para construir fenômenos visuais – que serão
percebidos visualmente, ou seja, o que faz um bom escritor é a capacidade de
leitura e interpretação do que lê.

Profissionais da área de projeto precisam de habilidades de um bom


escritor (para construir textos visuais) e de um repertório considerável para
representar visualmente suas ideias, seus conceitos, seus projetos. Este momento
da disciplina vai ao encontro disso: aproximar o aluno das bases do alfabeto visual
e as possíveis relações gramaticais, para que se possa dar conta de sensibilizar e
instrumentalizar o discente para o uso, intencional, de elementos da linguagem
visual – um dos objetivos desta disciplina. Além de desenvolver, somado à
semiótica, a capacidade de análise e crítica de textos visuais e projetos de design
– em linha com o objetivo geral da disciplina.

67
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

2 PERCEPÇÃO VISUAL – FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA


VISÃO
Por mais que sentimos o mundo com nossos cinco sentidos, este tópico
assume o foco na visão. Tratando de algumas qualidades deste sentido e, de certa
forma, contribuindo para aprimorá-la e gerenciá-la. O conteúdo aqui tratado limitar-
se-á aos meios visuais, dando ênfase aos exemplos relacionados às artes e ao design.

Para que se entenda um objeto destas duas áreas, deve-se dar valor ao
todo. O que se vê? Qual é a dinâmica das formas e das cores? Este olhar total
pode ser assumido em suas qualidades (em primeiridade das categorias de
Peirce). Este olhar inicial ajudará em muito no entendimento das partes, com
destreza vai-se percorrendo a estrutura total do objeto, para então reconhecer
as principais características e, então, poder explorar com domínio os detalhes
interdependentes. Ao analisar um objeto de design, uma obra de arte – perceba-
se fazendo isso – inicialmente nos damos conta de um olhar geral – de um todo
do objeto – para então percorrer suas partes.

Da mesma forma, ao desenvolver um projeto de design ou de arte, o


profissional precisa da segurança e da capacidade de transformar suas ideias, seus
conceitos em elementos de expressão (aqui é possível assumir o Plano de Conteúdo
(ideias – conceitos) com o Plano de Expressão (elementos da composição – as
formas, as cores as texturas). Para tanto, é necessário que se tenha entendimento
das categorias visuais, dos princípios adjacentes e das relações estruturais em jogo
para que se possa, sem intervir na capacidade inovadora, promover a coerência
e o refinamento da composição final, formadas por cada parte. Pense no que faz
um bom escritor, que tem uma bela história em mente, ele até pode inovar em seu
texto, mas precisa ter coerência gramatical e refinamento na escrita para entregar
um texto de qualidade.

Se um objeto – utilizado para ser percebido visualmente – passar uma


mensagem, ele precisa ser objetivo, assim, faz-se necessário que a sua composição
tenha legibilidade para todos e por todos da mesma maneira. Se não tiver isso,
ele será percebido visualmente, mas não será interpretado da maneira que seu
produtor planejou – fracassando em seu maior objetivo: a comunicação. Vale a
pena entender aqui que obter sucesso na comunicação faz com que um automóvel
seja entendido como tal – um automóvel tem que ser visualmente planejado para
que se consiga não apenas denominar-se automóvel, mas declarar suas potências
e até mesmo a marca que o construiu. Ao chegarmos perto de um automóvel, salvo
exceções mais inovadoras, devemos saber onde estão as portas e como abri-las. Ao
nos sentarmos no banco do motorista, o panorama visual que percebemos, deve
nos informar onde está o câmbio e onde acionamos a parte elétrica, que quando
ligado nos disponibilizará, num painel, uma quantidade de informações nos
comunicando sobre as funções dele. Perceba que, por mais que a função principal
do automóvel é ser veículo motorizado de transporte, a função comunicativa,
determinada pela sua composição visual em grande parte, tem papel definidor
no sucesso de uso. Isso vale para um controle de televisão, para um telefone
celular, para uma mochila, para uma calça. Todos estes objetos funcionam
68
TÓPICO 1 — PERCEPÇÃO VISUAL – FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA VISÃO

utilitariamente, mas para isso precisam, através da composição de seus elementos


visuais, expressarem como devem ser manuseados. Perceber os designers como
profissionais que têm o papel de construtores destes textos é dar ainda mais valor
à profissão, que, na maioria das vezes, tem reconhecimento somente em atribuir
beleza aos seus produtos – então, além de projetar utilitariamente um produto,
o designer tem que fazer com que ele comunique seu manuseio, seus atributos e,
ainda, deixá-lo dentro do gosto (do belo) de seu cliente. De fato, projetar com a
aptidão é um trabalho que requer algumas habilidades de seu profissional.

Nesta linha de pensamento, é preciso considerar que um objeto será


percebido de uma maneira, dentro de um determinado contexto. Cada pessoa
tem um repertório imagético dentro de si, que faz parte de sua experiência de vida
e que se acumulou com o passar do tempo – muitos de forma consciente e outros
de forma inconsciente. Algumas distantes (de um passado), outras próximas
(mais atuais), e junto a tudo isso as que causaram mais ou menos determinadas
emoções. Isso tudo é relevante à medida que o objeto, depois de projetado, deixa
de pertencer ao projetista – ele se torna de seu cliente. Quem o projetou não vai
mais estar ao lado dele para explicá-lo – o objeto tem que se explicar sozinho, e
isso se dá, em grande parte, pelo o que deixa expresso visualmente, pelo o que
seus clientes (expectadores) percebem. É neste cenário complexo, que designers
precisam saber que elementos – que formas, que cores, que contrastes, que
texturas devem ser usadas para comunicar determinadas informações para um
determinado perfil de clientela.

Se voltarmos ao que já estudamos, uma afirmação pode ser repetida aqui:


“só tem sentido aquilo que é sentido”. Sim! Só tem sentido aquilo que faz sentido.
Não há o que questionar quando uma excelente costureira, querendo comprar
um belo vestido, nota um na vitrine; entra na loja; pede para ver o vestido e,
por fim, não o compra! Mesmo que o vestido esteja dentro das condições de
preço acessíveis para ela. É certo que o motivo da “não aquisição” não faz e
nem tem sentido para boa parte das pessoas que entram na loja e o compram. O
entendimento de tecido, de acabamento de sua confecção, de sua modelagem,
e outros requisitos que compõem o vestido comunicaram à costureira que o
objeto não estava adequado aos seus padrões de qualidade. Um consumidor que
pouco sabe disso é atraído pela beleza e pelo preço do vestido. Por fim, acaba
comprando-o. Além disso, vai usá-lo com a maior satisfação. Se lhe falarem que
a modelagem poderia ser outra, que o corte do tecido deveria estar de outra
forma, ele não saberá o que dizer, até porque tudo isso não lhe faz sentido. No
seu repertório, esses elementos não lhe dizem nada.

Ampliar o repertório alarga possibilidades de contato com as realidades


dispostas à nossa frente: percebemos mais, vemos mais! É interessante perceber o
quanto vamos ampliando nosso repertório, à medida que investimos um tempo
para observar determinada coisa – por exemplo, a textura de alguns tecidos.
Um tecido de algodão vai apresentar uma determinada característica quando
comparado a uma seda. O couro e suas nuances de toque comparadas com o
corino. Tudo o que vemos tem características próprias, da mesma forma que tudo
o que queremos comunicar deverá ter características próprias também.

69
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

NTE
INTERESSA

Wassily Kandinsky foi professor de uma das principais escolas do design


moderno – a Escola Bauhaus. Sua disciplina tratava da linguagem visual e ele utilizava um
exercício que vamos fazer aqui.

A seguir teremos dois espaços, cada um com um ponto, tomando como limite
cada espaço. O exercício é fazer um traço que inicie no ponto e termine nele, sem tirar o
lápis (ou caneta) do papel. O resultado será uma forma linear fechada – procure fugir de
desenhos existentes. Faça uma forma livre, ok?

No primeiro espaço, a linha deverá representar um relacionamento feliz – um


casamento feliz! No segundo espaço, a linha deverá representar um relacionamento
conflituoso – um casamento cheio de brigas.

Este exercício dá conta do que estamos tratando até aqui. Cada pessoa expressa
os seus conteúdos com base em seu repertório, então, não tem um certo ou errado para
este exercício, o que precisa ter é: lógica. A ideia do exercício é mostrar como somos
levados a manifestar, em linhas, em traços, nas formas situações subjetivas – neste caso,
o sentimento é de “casamento feliz” no primeiro espaço; e de “casamento conflituoso” no
segundo espaço.

A noção de felicidade nos passa uma sensação orgânica, linhas onduladas,


mudanças graduais, leveza. Enquanto a noção de conflito nos sugere sensações de
contrastes, de ruído, linhas retas, pontiagudas, mudanças repentinas, peso. Interessante
perceber aqui, que muito dos conteúdos que vamos expressar estão impregnados do
nosso contexto, da nossa cultura, e, por consequência, os traços (as linhas) devem dar
conta de expressar da forma como as linhas acima.

Pode haver uma possibilidade de aparecerem respostas contrárias, não tem problema.
Todavia, a probabilidade de mais pessoas seguirem esta lógica é maior – ainda mais em nossa
cultura – que tal você fazer isso com seus amigos? Com seus colegas de trabalho?

70
TÓPICO 1 — PERCEPÇÃO VISUAL – FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA VISÃO

Em um único traço, em uma única linha é possível comunicar. Um


ponto interessante aqui é perceber que projetistas, designers, artistas gráficos
devem projetar imagens que, do início, tenham a capacidade de aparecerem nas
superfícies que são rabiscadas – parece básico, mas acreditamos que no exercício
anterior poucos, ou ninguém, optou em pegar um lápis branco para desenhar as
linhas. Intuitivamente, a escolha foi de um grafite, de uma tinta, que contrastasse
com o fundo. A intuição aqui nos faz tratar de um assunto muito importante:
dada nossa cultura e o quanto estamos imersos num mundo visual, muitas das
coisas ocorrem por intuição. E nesta disciplina muito do que é intuitivo deverá
ser pensado intencionalmente.

E
IMPORTANT

Volte ao exercício anterior e perceba com que cor você fez a linha. Se houvesse
a possibilidade de escolher uma cor para dar ainda mais expressão à linha, você mudaria a
cor da sua linha? Certamente, teria que escolher uma cor para a linha do espaço 1 diferente
da cor para a linha do espaço 2. Perceba que você deve ter realizado o exercício de forma
intuitiva – optando por uma cor do lápis ou caneta que se destacasse frente ao fundo
– mas, se além disso você conscientemente quisesse optar por uma cor que também
expressasse – teria uma ação intencional sobre a superfície. Este pequeno exemplo ilustra
esta mudança de atitude que, como projetista, em seus projetos deverá assumir.

Este pensar intencional dentro dos processos de percepção visual fica


evidente quando entendemos que percebemos visualmente tudo o que nossos
olhos conseguem ver. Dos fenômenos do mundo (caso das nuvens no céu, uma
árvore) até as intervenções humanas (caso de uma linha no papel, de um projeto,
de um cartaz, de um edifício). Fenômenos que comunicam mensagens de acordo
com os contextos onde estão inseridos, e que “entre todas essas mensagens que
passam através dos nossos olhos é possível fazer, pelo menos; duas distinções:
[...] pode ser casual ou intencional” (MUNARI, 1997, p. 65). Como casual estão os
fenômenos visuais que ocorrem sem que tenham interesses de comunicar algo –
claro que uma nuvem no céu pode ser interpretada como um evento climático,
mas a princípio ela não se fez intencionalmente para passar tal mensagem. Ao
contrário de uma fumaça no céu criada por alguém, que perdido em uma floresta,
consegue fazer fogo e produzir fumaça para que seja encontrado.

A casualidade de um fenômeno visual dá liberdade de interpretações para


quem a recebe. Ao contrário, o fenômeno intencional deve ser recebido de maneira
que seja entendido o seu significado – e, aqui, vemos que para quem está perdido
em uma floresta, só fazer fumaça pode não dizer muito de sua condição, afinal,
pessoas que a visualizam podem interpretar como uma queimada. Será preciso
que o produtor module a fumaça – talvez com algumas folhas – criando fumaças
maiores e menores – que quando vistas de longe pode indiciar que alguém a está
manipulando e, então, passar a ser coerente interpretar que alguém causa a fumaça.

71
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

3 FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA VISÃO


No processo de comunicação que estamos tratando, é possível
compreender como emissor de uma mensagem visual todo e qualquer fenômeno
visual – casual ou intencional. E para quem o percebe podemos chamar de
receptor. Ao perceber a mensagem visual é interessante considerar que o
receptor terá três filtros: sensorial; cultural e operativo, como mostra a figura:

FIGURA 1 – OS FILTROS DO RECEPTOR AO RECEBER A MENSAGEM VISUAL

Emissor
Receptor

Qualquer fenômeno visual


Mensagens
Visuais
Filtros operacionais
Filtros culturais
Filtros sensoriais

FONTE: Adaptado de Munari (1997, p. 70)

Estes três filtros, por mais que na ilustração se mostrem distintos, não os
são. E nem seguem a ordem ilustrada. O que é necessário entender é que, ao receber
uma mensagem visual, esta deverá passar pelo filtro sensorial – a mensagem
deverá ser sentida – caso da cor, que para um daltônico este filtro limitará o
sentir determinadas cores, ou se conter elementos muito pequenos pode não
ser captada pelo olho humano. Outro filtro é o cultural, que pode apenas deixar
passar mensagens que compõem seu repertório cultural, ou seja, o receptor só
reconhecerá a mensagem por fazer parte de sua cultura – caso de estilos de moda;
onde ao ver uma pessoa com um look que não faz parte de sua cultura, o receptor
pode afirmar que a pessoa vista está fora de moda – malvestida, que tem mal
gosto. E um outro filtro, o operacional, onde a mensagem recebida é confrontada
pelas condicionantes psicofisiológicas (MUNARI, 1997), que constituem o perfil
do receptor – caso de uma cena de um desenho animado onde uma criança
interpreta de uma maneira (mais infantilizada) e a mesma cena ganha conotações
políticas para um adulto.

72
TÓPICO 1 — PERCEPÇÃO VISUAL – FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA VISÃO

É importante entender a existência destes filtros para, como produtor


de mensagens visuais considerar cada um deles. Ao desenvolver um projeto de
um produto – caso de uma jaqueta, por exemplo, é importante assumir que este
objeto, além de um produto que será utilizado como vestuário será suporte visual
de uma marca, de um estilo e claro de uma mensagem que deverá comunicar que
se trata de uma jaqueta. Como suporte visual, entende-se o:

conjunto de elementos que tornam visível a mensagem, todas aquelas


partes que devem ser consideradas e aprofundadas para poderem
ser utilizadas com a máxima coerência em relação à informação. São
elas: Textura, Forma, Estrutura, Módulo, Movimento. Não é simples,
e talvez nem seja possível, estabelecer uma fronteira exata entre as
partes enunciadas, até porque elas se apresentam muitas vezes, todas
juntas (MUNARI, 1997, p. 69).

O reconhecimento dos filtros sensoriais, culturais e operacionais


apresentados destacam o ser humano como figura central, dentro da noção de
receptor de mensagens visuais. Colocando em questão a capacidade de receber o
estímulo visual como ponto crucial para, pelo menos, permitir um fundamento
básico para profissionais que, em seus projetos, precisam dar conta disso – caso
dos designers. Desta forma, uma aproximação sobre a visão como processo
fisiológico por onde se distinguem formas e cores é relevante. A medida que na
percepção visual o “olho” é o principal órgão.

NOTA

Ao tratarmos da fisiologia da visão, é importante compreender a complexidade


de tal abordagem e que aqui se buscará uma abordagem básica, permitindo fundamentos
introdutórios acerca de tal conteúdo.

A noção física de que vemos os objetos a partir dos raios luminosos que
eles refletem é fundamento para compreender que o globo ocular (o olho) é o
órgão que recebe estes raios do exterior e os transformam em informação elétrica,
que é enviada ao cérebro, que se transformará em uma imagem do objeto que se
está vendo.

De forma geral, o processo básico da percepção visual humana se dá


no fato da luz atingir o globo ocular (o olho), ela passa pela córnea, tocando a
íris que permite sua passagem pela pupila (abertura que dilata ou comprime,
regulando a quantidade de luz), a luz então chega ao cristalino, e é focada sobre
a retina – camada fina de tecido nervoso sensível à luz, sua função é transformar
a luz em estímulo nervoso, é nela que a energia luminosa é convertida
eletroquimicamente em padrões nos neurônios e que são codificados pelo

73
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

sistema nervoso cerebral (STERNBERG, 2010). Na retina existe um ponto focal


– a fóvea, que dá conta das definições focais da imagem ali projetada, todo o
resto da retina dá conta do que está ao redor do objeto visto. Se retornarmos aos
filtros, vemos aqui que os sensoriais – se dão mais no campo do olho e os outros
dois já estariam mais na padronização neural e codificação cerebral.

FIGURA 2 – O GLOBO OCULAR

FONTE: <http://especialistaemcatarata.com.br/_novo/wp-content/uploads/2016/12/como-
enxergamos.jpg>. Acesso em: 27 ago. 2020.

A camada fina de tecido que forma a retina apresenta uma diversidade


celular, duas delas, em especial, merecem destaque neste momento: as cônicas e
as bastonetes. As primeiras são especializadas pela agudeza da visão e pelas cores.
As segundas são sensíveis apenas à intensidade, não têm a mesma capacidade
de resolução de detalhes e não sentem as cores, mas dão de possibilitar que
enxerguemos com pouca luz.

Reconhecer objetos é questão primeira na capacidade de percepção visual,


neste processo são mais percebidas as composições mais bem organizadas, mais
simples e estáveis – isso se dá pela lei de Prägnanz – que a teoria da Gestalt analisa.

TUROS
ESTUDOS FU

A Teoria da Gestalt é muito importante para profissionais do design, da


comunicação. Ela trata da percepção e da sensação do movimento, dos processos
psicológicos que ocorrem com o sujeito diante de um estímulo, e estuda como este
estímulo é percebido. Vamos tratar mais à frente da teoria da Gestalt.

74
TÓPICO 1 — PERCEPÇÃO VISUAL – FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA VISÃO

O sistema ocular tem papel importante em todo este processo, pois além de
levar os estímulos luminosos (os objetos) para a retina e convertê-los em impulsos
padrões, para o sistema nervoso, ele é composto por uma estrutura que dá conta
de distinguir figura e fundo, onde a figura (o objeto focado) vai ter uma forma mais
bem definida, em oposição ao fundo. Como afirma Jonathan Crary (1999, p. 72): “A
percepção visual, por exemplo, é inseparável do movimento muscular do olho e do
esforço físico envolvido na busca de foco em um objeto”.

DICAS

A noção de que a luz é a matéria-prima da visão é tão importante que os


mecanismos de captação de luz para a reprodução da imagem têm como base esta
mesma noção. O entendimento da máquina fotográfica é similar ao mecanismo ocular
humano, e entender o papel da luz é muito relevante. Leia o artigo “Fotografia: a escrita da
luz” de Angélica Lüersen, que poderá ajudar neste entendimento. Confira em: http://www.
intercom.org.br/papers/regionais/sul2007/resumos/R0520-1.pdf.

Perceber visualmente é um processo que ocorre em etapas sucessivas a


partir do momento que a luz refletida por um objeto chega aos nossos olhos. Com
relação à intensidade de luz, de acordo com a luminosidade, a visão pode ser
fotópica – modo “normal”, quando os objetos estão iluminados pela luz do dia –
aciona basicamente as células cônicas, tendo sua acuidade acentuada. E a visão
pode ser estocópica – visão noturna. Onde as células bastonetes são ativadas,
permitindo uma percepção sem cores e de fraca acuidade visual. Com relação ao
comprimento de onda luminosa, a visão se dá na percepção das cores do espectro
luminoso (o arco-íris), em que a cor varia de acordo com o comprimento de onda.

Na figura a seguir, nós vamos perceber que das ondas existentes,


algumas conseguem ser captadas pelo olho humano, estas compõem o espectro
eletromagnético visível pelo ser humano.

75
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

FIGURA 3 – ESPECTRO ELETROMAGNÉTICO VISÍVEL AO OLHO HUMANO

vermelho
laranja
amarelo
verde
ciano
azul
violeta

FONTE: <https://s4.static.brasilescola.uol.com.br/img/2019/06/espectro-visivel.jpg>.
Acesso em: 27 ago. 2020.

Com os maiores comprimentos de onda, as ondas de rádio, as micro-ondas


e o infravermelho ultrapassam o limite máximo possível para ser captado pelo olho
humano, que então em forma decrescente tem seu espectro visível composto pelo:
vermelho, laranja, amarelo, verde, ciano, azul e violeta. Abaixo do comprimento do
violeta os comprimentos, não mais visíveis pelo ser humano, são: o ultravioleta, o
raio X e os raios gamas. Vale lembrar que, por mais que não visualizamos todos estes
comprimentos de onda nos atingem e podem causar danos ao nosso corpo – caso dos
raios ultravioletas UV-A e UV-B que causam queimaduras.

Por muito tempo se pensou no olho humano como um órgão que captava e
transmitia informações sem processá-las. Atualmente, é sabido que as informações
trafegam sem interrupções da retina ao sistema nervoso, e um vai interferido no
outro. Quantas vezes, focados em um problema, não percebemos coisas no nosso
campo de visão? De fato, as expectativas do espectador influenciam o processo de
percepção dele. Por mais que seja o olho que capte a luz é o cérebro, a partir das
informações que chegam à retina, que “enxerga”.

Tratamos até aqui da fisiologia da visão – do mecanismo que faz o olho


“ver”, mas é muito importante discutir a capacidade de “enxergar” que é o
cérebro, ou melhor, da capacidade cerebral de assumir os olhos como um dos
órgãos para o processo de percepção visual.

A Grosso modo e, dentro de um significado mais geral, popular,


filosófico e de senso comum, o “ver” remete à percepção e o
conhecimento do ambiente através do sentido da visão. Já o “enxergar”,
remete a um sentido mais profundo que ultrapassa a limitação
fisiológica do sentido da visão. Alguém pode ver em um museu uma
pintura surrealista e não entender o seu conteúdo, porém alguém com
senso ou dotes artísticos, ao observar a mesma obra, enxergará além
de sua visão comum o conteúdo da pintura (COSTA et al., 2015, p. 5).

76
TÓPICO 1 — PERCEPÇÃO VISUAL – FISIOLOGIA E PSICOLOGIA DA VISÃO

Se retornarmos ao exemplo da costureira que não adquiriu o vestido


anteriormente, vemos que ela “enxergou” coisas na peça que outros consumidores
não enxergaram. Se voltarmos aos filtros, ilustrados na Figura 2, podemos constatar
que o processo de receber uma mensagem tem mais sentido no “enxergar”, onde
além de “ver” (filtro sensorial) se somam o repertório cultural e operacional (com
seus respectivos filtros).

DICAS

Esta discussão do “ver” e “enxergar” é muito interessante. Uma obra muito


pertinente é a obra “Ensaio sobre a Cegueira”, romance do escritor português José Saramago,
publicado em 1995, que tem o filme de 2008, sob a direção de Fernando Meirelles.

Entender que existem diferenças conceituais entre o “ver” e o “enxergar”


provoca uma reflexão importante para que se possa entender as nuances da
percepção visual. Principalmente pelo fato de que toda nossa atenção visual
fica condicionada aos nossos interesses, aos fatos que movem nossos olhos
pelas coisas. Quantas vezes deixamos de ver coisas porque, naquele momento,
elas não faziam parte de nossos interesses. Diferente da lente de nossa máquina
fotográfica, nossos olhos, por mais que recebam todas as imagens externas,
dará, por intermédio do cérebro, um recorte, deixando em primeiro plano o que
tem a ver com nossos interesses. Um exemplo interessante para isso – e aí vale
para qualquer outro sentido – é pensar em um problema de projeto: surge uma
demanda para desenvolver roupas para mulheres grávidas, perceba que a partir
deste momento, não importa onde você vá, você parece ver mulheres grávidas.
Sem o problema de projeto, muitas delas, mesmo estando em seu campo de visão,
não seriam percebidas – você não as veria.

Trazendo para o campo das artes, muitos quadros de artistas famosos


brincam com o duplo sentido em suas obras. Elas provocam o nosso olhar e o que
percebemos visualmente.

77
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

FIGURA 4 – PINTURA DE DUPLO SENTIDO DE VLADIMIR KUSH

FONTE: <https://2.bp.blogspot.com/-oM_04u4aq9Y/UH_wUHCQohI/AAAAAAACF0Q/
uwzvCZYt2TQ/s1600/Vladimir+Kush+1965+-+Russian++Surrealist+painter+-+Tutt'Art@.jpg>.
Acesso em: 27 ago. 2020.

Por mais que esteja em tons de cinza, a obra do surrealista russo Vladimir
Kush brinca com o “ver” e “enxergar”, ilustrando as possibilidades que nosso
repertório impõe à maneira como olhamos para as coisas. De fato, “ver” e
“enxergar” são ações diferentes, se no primeiro olhar vemos a representação
de um rosto (enxergamos um rosto), é somente quando nos permitimos “ver”
os detalhes que nos damos conta que não se trata de um rosto, mas de uma
composição de elementos que nos induzem a enxergar outra coisa.

Esta capacidade de perceber o todo em decorrência das partes é base para


uma das principais teorias do design – a Gestalt.

78
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Para percebermos visualmente um objeto, é necessário um olhar geral dele.

• É preciso considerar que um objeto será percebido de uma maneira, dentro de


um determinado contexto. Cada pessoa tem um repertório imagético dentro
de si, que faz parte de sua experiência de vida e que se acumulou – muitas de
forma conscientes e outras inconscientes.

• Existem fenômenos visuais casuais e intencionais.

• Ao recebermos uma mensagem visual, ela entra em contato com três filtros:
sensorial; cultural e operativo.

• Somos capazes de perceber apenas alguns comprimentos de onde de luz, que


vão do vermelho até o violeta.

• Existem diferenças conceituais entre o “ver” e o “enxergar”.

79
AUTOATIVIDADE

1 A abordagem inicial que permitimos dar aos fenômenos qualificará o


diagnóstico da situação que estamos analisando. O olhar inicial, ajuda muito
no entendimento das partes, com destreza vai-se percorrendo a estrutura
total do objeto, para reconhecer as principais características e então poder
explorar com domínio os detalhes interdependentes. A partir da leitura deste
texto, avalie as asserções a seguir e a relação proposta entre elas:

I- Ao analisar um objeto de design, uma obra de arte, uma situação de projeto


é importante assumir essa abordagem indo do todo para as partes e das
partes para o todo.

PORQUE

II- Nesse ir e vir, vamos descobrindo as categorias visuais, os princípios


adjacentes e as relações estruturais em jogo para poder promover a
coerência e o refinamento da leitura visual.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa
correta da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma
justificativa correta da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.

2 Vale a pena entender que para obter sucesso na comunicação, um automóvel


deve ser entendido como tal. Tem que ser visualmente planejado para que
se consiga não apenas dizer-se automóvel, mas declarar suas potências e
até mesmo a marca que o construiu. Ao chegarmos perto de um automóvel,
salvo exceções mais inovadoras, devemos saber onde estão as portas e
como abri-las. Ao nos sentarmos no banco do motorista, o panorama visual
que percebemos, deve nos informar onde está o câmbio e onde acionamos
a parte elétrica, que quando ligado nos disponibilizará, num painel, uma
quantidade de informações nos comunicando sobre as funções dele.
Perceba que, por mais que a função principal do automóvel é ser veículo
motorizado de transporte, a função comunicativa, determinada pela sua
composição visual, em grande parte, tem papel definidor no sucesso de
uso. A partir da leitura desse texto avalie as asserções a seguir e a relação
proposta entre elas:

80
I- Se um objeto, utilizado para ser percebido visualmente e passar uma
mensagem, precisa ter objetividade, faz-se necessário que sua composição
tenha legibilidade para todos e por todos da mesma maneira.

PORQUE

II- Indiferente disso, ele será percebido visualmente, e será interpretado,


seguramente, da maneira que seu produtor planejou – alcançando o
objetivo de comunicar.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa
correta da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma
justificativa correta da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.

3 De forma bem geral, o processo básico da percepção visual humana se


dá no fato da luz atingir o globo ocular (o olho), ela passa pela córnea,
tocando a íris que permite sua passagem pela pupila (abertura que dilata ou
comprime regulando a quantidade de luz), a luz então chega ao cristalino,
e é focada sobre a retina – camada fina de tecido nervoso sensível à luz,
sua função é transformar a luz em estímulo nervoso, é nela que a energia
luminosa é convertida eletroquimicamente em padrões nos neurônios e
que são codificados pelo sistema nervoso cerebral (STERNBERG, 2010). A
camada fina de tecido que forma a retina apresenta uma diversidade celular,
duas delas em especial merecem destaque neste momento: as cônicas e as
bastonetes. As primeiras são especializadas pela agudeza da visão e pelas
cores. E as segundas são sensíveis apenas à intensidade, não tem a mesma
capacidade de resolução de detalhes e não sentem as cores, mas dão de
possibilitar que enxerguemos com pouca luz. A partir da leitura desse texto
avalie as asserções a seguir e a relação proposta entre elas:

FONTE: Adaptado de STERNBERG, R. J. Psicologia Cognitiva. São Paulo: CENGAGE


Learning, 2010.

Assinale a alternativa CORRETA:

81
I- Com relação à intensidade de luz, de acordo com a luminosidade, a visão
pode ser fotópica – modo “normal”, quando os objetos estão iluminados
pela luz do dia – aciona basicamente as células cônicas, tendo sua acuidade
acentuada.

PORQUE

II- Durante a visão noturna – a visão pode ser estocópica. Onde as células
bastonetes são ativadas, permitindo uma percepção sem cores e de fraca
acuidade visual.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
b) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
c) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II complementa
corretamente da I.
d) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não complementa
a I.

4 “[...] entre todas essas mensagens que passam através dos nossos olhos
é possível fazer, pelo menos; duas distinções: [...] pode ser casual ou
intencional” (MUNARI, 1997, p. 65). A partir da leitura desse texto, explique
o que mensagem casual e mensagem intencional, exemplificando cada uma
delas.

FONTE: Adaptado de MUNARI, B. Design e comunicação visual: contribuição para uma


metodologia didática. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

5 No processo de comunicação, é possível compreender como emissor de uma


mensagem visual todo e qualquer fenômeno visual. E, para quem o percebe,
podemos chamar de receptor. Neste processo de transmitir e receber uma
mensagem visual, é interessante considerar três filtros: sensorial; cultural
e operativo (MUNARI, 1997). A partir da leitura desse texto explique cada
um dos filtros.

FONTE: Adaptado de MUNARI, B. Design e comunicação visual: contribuição para uma


metodologia didática. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

82
TÓPICO 2 —
UNIDADE 2

AS LEIS DA ORGANIZAÇÃO DA FORMA: GESTALT

1 INTRODUÇÃO
Iniciamos o segundo tópico desta unidade. Nela aprenderemos os princípios
que regem a Gestalt, entendendo o que faz um objeto alcançar a boa forma, ou seja, ter
a capacidade de se mostrar legível e com alto grau de pregnância.

Na percepção visual, quando inseridos no lado do produtor da


mensagem, precisamos assumir uma postura de comunicador, organizando
e desenvolvendo o objeto (imagem, mensagem) de maneira que seja de fácil
compreensão, entendimento e memorização. Do outro lado, como receptores
(leitores) apreciamos a boa composição, e valorizamos as experiências que, uma
vez memorizadas, podem facilmente ser lembradas.

No cenário diversificado de mensagens visuais, a capacidade de atrair


a atenção e promover a facilidade em ser lembrado se tornam requisitos dos
projetos de profissionais como designers, publicitários, entre outros. A as leis ou
princípios da Gestalt apresentam parâmetros seguros para o bom desenvolvimento
dos projetos nessas áreas.

2 AS LEIS DA GESTALT
Nos processos de leitura ou produção de objetos que devem ser percebidos
visualmente, tanto a experiência quanto o comportamento de “ver” e “enxergar”
são importantes. A Gestalt

é uma escola de psicologia experimental. Considera-se que Christian


von Ehrenfels, filósofo austríaco de fins do século XIX, foi o precursor
da psicologia da Gestalt. Mais tarde, por volta de 1910, teve seu início
mais efetivo por meio de três nomes principais: Max Wertheimer
(1880-1943), Wolfgang Kohler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886-1941),
da Universidade de Frankfurt (GOMES FILHO, 2008, p. 18).

83
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

Atua principalmente na forma e tem grande relevância nos estudos de


percepção, linguagem, conduta e dinâmica de grupos sociais, dando conta de
sugerir respostas ao porquê gostamos mais de uma coisa do que de outra. Em
um sentido mais geral, o termo Gestalt “significa uma interação de parte em
oposição à soma do todo” (GOMES FILHO, 2008, p. 18). Está relacionada com
forma, figura e estrutura que tem, como já mencionado na lei de Prägnanz – lei
da pregnância; uma postura norteadora à medida que seus principais expoentes
forneceram direcionamentos sobre os princípios organizacionais que devem ser
aplicados na percepção do mundo.

NTE
INTERESSA

Quando saímos de um lugar que tinha muita fumaça e ficamos com o cheiro
dela em nossas roupas, falamos que ficamos “impregnados de fumaça”. Esta mesma noção
vale aqui para a lei de Prägnanz, que nos processos de comunicação e percepção de mundo,
nos direciona a maneira que devemos seguir para fazer com que o objeto desenvolvido
fique “impregnado” na pessoa, ou seja, o objeto é tão bem organizado que quando alguém
o vê (entra em contato com ele) fica impregnado dele – consegue lembrar dele. Isso foi tão
intenso no design, que na segunda metade do século XX se criou o conceito da “boa forma”,
que tem tudo a ver com esta lei e com a Gestalt. Se você algum dia já ouviu, ou usou a
premissa: “menos é mais”, ela está em linha com o que estamos estudando aqui!

A Lei da Prägnanz é definida da seguinte forma: “As forças de organização


da forma tendem a se dirigir tanto quanto o permitam as condições dadas, no
sentido da harmonia e do equilíbrio visual. Qualquer padrão de estímulo tende a
ser visto de tal modo que a estrutura resultante é tão simples quanto o permitam
as condições dadas” (GOMES FILHO, 2008, p. 36). A ideia aqui é que quanto mais
simples, mais equilibrado, homogêneo e regular for o objeto, mais pregnante ele
será. A descomplicação visual potencializa o objeto dentro desta lei.

Na figura a seguir, nós vemos alguns exemplos da Lei da Prägnanz, onde


na sequência de cima para baixo o nível de pregnância vai diminuindo. O termo é
o mesmo, mas os primeiros facilitam a leitura, dada a composição visual de suas
tipografias. Imagine você lendo um texto com a última letra? O esforço solicitado
deixaria a leitura cansativa. Por isso, ao produzir um texto é estratégico escolher
fontes mais pregnantes.

84
TÓPICO 2 — AS LEIS DA ORGANIZAÇÃO DA FORMA: GESTALT

FIGURA 5 – EXEMPLO DA PREGNÂNCIA NA TIPOGRAFIA

FONTE: Adaptada de Gomes Filho (2008)

Esta legibilidade, exemplificada na figura anterior também vai aparecer


nas composições, contrastes entre figura e fundo precisam ser considerados
nas composições, vamos pegar o termo mais pregnante e ver como ele perde a
pregnância em decorrência do seu contraste com o fundo.

FIGURA 6 – EXEMPLO DA PREGNÂNCIA FIGURA E FUNDO

FONTE: Adaptada de Gomes Filho (2008)

Além de promover a facilidade de legibilidade, a pregnância trata do


sentido psicológico da organização formal do objeto, à medida que ele tenha a
melhor estrutura, a melhor composição. Para tanto alguns critérios são apontados
por Gomes Filho (2008, p. 37):

1. Quanto melhor ou mais clara for a organização visual da forma


do objeto, em termos de facilidade de compreensão e rapidez de
leitura ou interpretação, maior será seu o seu grau de pregnância.
2. Naturalmente, quanto pior ou mais complicada e confusa for a
organização visual da forma do objeto menor será o seu grau de
pregnância.

85
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

NTE
INTERESSA

Um passeio pela cidade, ou pelo shopping pode possibilitar um belo exercício


deste conteúdo. Você pode organizar uma escala de julgamento para o nível de pregnância
– estabelecendo um grau onde 1 o objeto tem péssima pregnância e 10 se ele tem alto
nível de pregnância. O site “Fashionismo”, em agosto de 2010, publicou a matéria “O poder
de uma vitrine”, que trata de quanto uma vitrine comunica e convida o consumidor a entrar
no estabelecimento.

FONTE: <https://www.fashionismo.com.br/2010/08/o-poder-de-uma-vitrine/>.
Acesso em: 27 ago. 2020.

É apenas para ilustrar este exercício que você pode fazer:



Analisando estas duas imagens, qual pontuação cada uma ganharia? O legal é ter
fotografias das vitrines que você pontuou para depois analisar e identificar que elementos
contribuíram para o julgamento de cada uma.

No caso destas duas vitrines, percebe-se que as duas têm baixo grau de pregnância.
Na comparação entre estas duas, observa-se que a segunda terá um grau de julgamento,
quanto à pregnância, maior – em função de estar composta por elementos similares (papéis
que remetem a cédulas) que contribuem para a harmonização, facilitando o percurso do
olhar (do centro da vitrine para baixo onde se concentram). Em contraposição, a primeira
vitrine apresenta elementos circulares em sua composição, mas além de formas diferentes
(bolas e cilíndricas) se localizam por toda a vitrine, fazendo com que o percurso do olhar
seja bem maior que na segunda vitrine.

Além do percurso do olhar, a diversidade de elementos que compõe a primeira e


relação à segunda compromete seu julgamento do grau de pregnância.

86
TÓPICO 2 — AS LEIS DA ORGANIZAÇÃO DA FORMA: GESTALT

A legibilidade de um objeto, dentro da noção de percepção visual, tem


na Lei da Prägnanz um guia para a efetividade de sua compreensão analítica
acerca da sua totalidade. Tratando-se de um juízo que se faz da organização
visual do objeto, considerando suas partes e os graus psicológicos que aferimos
nas avaliações, nos exemplos e exercícios que propomos não avaliamos as partes
isoladas, as suas relações com o todo de suas composições.

A Gestalt entende que o que acontece no olho humano é diferente com o que
acontece no cérebro, e que a percepção é da junção destes dois momentos, é do todo,
é unificada. Não percebemos formas isoladas, vamos perceber sempre relações, onde
uma parte depende da outra. Na figura a seguir vemos um exemplo disso, por mais
que pareçam diferentes, os dois círculos centrais têm o mesmo tamanho.

FIGURA 7 – ILUSÃO DE ÓTICA

FONTE: Adaptado de Gomes Filho (2008)

A ilusão de ótica acima declara visualmente o postulado gestaltiano onde


todo e qualquer processo consciente, toda a forma percebida está relacionada
às forças que integram o processo fisiológico cerebral. “A hipótese da Gestalt,
para explicar a origem dessas forças integradoras, é atribuir ao sistema
nervoso central um dinamismo autorregulador que, à procura de sua própria
estabilidade, tende a organizar as formas em todos coerentes e unificados”
(GOMES FILHO, 2008, p. 19).

Esta capacidade autorreguladora por mais espontânea que seja, parece


seguir alguns princípios básicos, chamadas forças de organização ou de lei de
organização da forma perceptual.

87
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

O princípio inicial se dá no fato de que as formas visuais precisam estar


segregadas (desiguais) ou unificadas (similares). E para que possam formar
unidades faz-se necessário o contraste entre as partes (descontinuidade dos
estímulos), ou a conformidade (estímulos homogêneos, sem contraste). Um
exemplo é a diferença de estimulação que os pontos pretos da figura anterior
explicitam em contraste com o fundo branco. Fica evidente que à medida que
vamos escurecendo o fundo, vamos diminuindo a percepção das formas circulares
(veja isto acontecendo na Figura 27). São as relações de segregação e unificação
que dão conta da formação de unidades como pontos, linhas, formas, manchas.

3 PRINCÍPIOS DA COMPOSIÇÃO DA GESTALT


A lei de organização da forma perceptual também é conhecida por Lei da
Gestalt, que apresenta uma espécie de alfabeto básico para a leitura e produção
de textos visuais. Ao analisar um objeto os princípios apresentados a seguir
favorecem a articulação analítica e interpretativa do objeto. Os princípios são:
Unidade, Segregação, Unificação, Fechamento, Continuidade, Proximidade,
Semelhança, que levam a uma postura frente a pregnância do objeto. Este último,
regulado pela Lei da Prägnanz.

3.1 UNIDADE
Identificada em um único elemento: a forma, encerra-se em si mesma.
Pode ter um ou mais elementos que configuram um todo único. A unidade pode
ser percebida pelas relações de similaridade destas partes, pode haver unidade
formal, dimensional, cromática. Se houver mais de uma unidade em um objeto,
é interessante eleger as unidades principais, desde que permitam a leitura do
objeto como um todo.

FIGURA 8 – UNIDADE VISUAL – TRÊS LISTRAS DA MARCA ADIDAS

FONTE: <https://www.flaticon.com/svg/static/icons/svg/731/731962.svg>. Acesso em: 27 ago. 2020.

As três barras que compõem a marca da Adidas mostram um bom exemplo


para a unidade. É formada pela mesma faixa retangular cortada em tamanho
diferente e organizada paralelamente.

88
TÓPICO 2 — AS LEIS DA ORGANIZAÇÃO DA FORMA: GESTALT

Uma flor tem unidade visual à medida que composta por unidades
similares, que formam um conjunto de pétalas que são unidades particulares, mas
que juntas dão conta do todo de uma flor. A noção de unidade deve considerar os
elementos similares que organizem partes que promovem uma composição única
de um todo. Por exemplo, no desenvolvimento de moda, a cartela da cor ajuda a
garantir unidade para cada peça e para toda uma coleção.

3.2 SEGREGAÇÃO
A capacidade de separar dando destaque ao que está se separando, pode
ajudar na noção deste princípio. A capacidade de evidenciar, notar, destacar
unidades de uma composição pode ser um recurso realizado através de cores,
formas, dimensões, posicionamentos.

Somos capazes de diferenciar e evidenciar objetos, mesmo que


sobrepostos. E isso vai depender do padrão estético (forma, cor, dimensão,
entre outros) tem em comparação ao outro. No design, trabalhar com elementos
contrastantes podem ajudar neste princípio, havendo ainda a possibilidade de
organizar por hierarquia a segregação, dando maior peso a um conjunto de
elementos do que outros.

FIGURA 9 – SEGREGAÇÃO NA MARCA DO CARREFOUR

FONTE: Adaptado de <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5b/Carrefour_logo.svg>.


Acesso em: 27 ago. 2020.

Na figura anterior, vemos duas versões da marca do Carrefour. As duas


mostram a segregação com seus fundos – o contraste dos tons de cinza escuros
destaca as marcas do fundo branco – tal destaque faz com que os elementos
ganhem destaque. Na marca da esquerda temos ainda a evidência de dois
elementos diferentes pelos tons de cinza (na marca colorida o elemento em cinza
claro é vermelho e outro elemento – cinza mais escuro – é azul – nesta composição
– a segregação sugere formas que apontam para lados opostos. Já a marca da
direita remete ao princípio da unidade, pois os dois elementos têm o mesmo tom
de cinza escuro e por unidade sugerem uma mesma forma – um losango que tem
um “C”, de Carrefour, cortando-o. Aqui, vemos como pode ser inteligente saber
compor formas com base nos princípios da Gestalt.

89
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

3.3 PROXIMIDADE
Ao aproximarmos elementos uns dos outros, oferecemos ao leitor a
possibilidade de vê-los juntos, constituindo unidade de um todo, ou um todo
por si só. Se você olhar esta página, verá que as letras mais próximas sugerem
palavras e que a cada espaço maior entre elas, uma nova palavra aparece – no
conjunto das palavras temos os parágrafos. Entretanto, vamos nos apoiar nas
duas marcas que usamos nos princípios anteriores:

FIGURA 10 – PROXIMIDADE – ELEMENTOS SEPARADOS DAS MARCAS ADIDAS E CARREFOUR

FONTE: O autor

Os elementos que dão unidade a cada uma das marcas, quando distanciados
não sugerem o que precisam comunicar. A aproximação de cada um permite a
visualização de um todo capaz de dizer da Adidas e dizer de Carrefour.

3.4 SEMELHANÇA
Semelhança e proximidade parecem uma agir sobre a outra. E ambas têm
forte relação com a unidade. Elementos semelhantes facilitam o estabelecimento
de agrupamentos.

E condições iguais, os estímulos mais semelhantes entre si, seja por


forma, cor, tamanho, peso, direção e localização, terão maior tendência
a ser agrupados, a constituir parte ou unidades. Em condições iguais,
os estímulos originados por semelhança e em maior proximidade terão
também maior tendência a serem agrupados, a constituírem unidades
(GOMES FILHO, 2008, p. 35).

90
TÓPICO 2 — AS LEIS DA ORGANIZAÇÃO DA FORMA: GESTALT

FIGURA 11 – SEMELHANÇA DOS ELEMENTOS DAS MARCAS ADIDAS E CARREFOUR

FONTE: O autor

Vemos na parte superior da figura que as formas e cores similares atraem


o olho para que se atribua unidade, o que mais circular segrega as formas mais
retas, da mesma forma que o tom cinza mais claro segrega o mais escuro. As
semelhanças das formas e cores permitem que possamos pensá-las como unidades
e quando aproximadas oportunizam as imagens das marcas citadas.

Conhecida também como similaridade, a semelhança é considerada a lei


mais óbvia, à medida que agrupamos quase que intuitivamente objetos similares.
É o que fazemos na segunda vitrine do exercício anterior, com as cédulas.

3.5 UNIFICAÇÃO
Tanto a proximidade quanto a semelhança concorrem fortemente para a
unificação, que consiste na semelhança dos elementos apresentado na composição
visual. A unificação é verificada quando um objeto apresenta harmonia, equilíbrio
e coerência visual.

Numa composição, podemos ter níveis de unificação. Havendo


composições mais unificadas e outra nem tanto. Dependendo do caso, é possível
atribuir valores de qualidade para uma determinada leitura. Analisaremos o
exemplo que João Gomes Filho (2008, p. 31) apresenta para ilustrar a unificação.

91
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

FIGURA 12 – UNIFICAÇÃO EM QUATRO EXEMPLOS

FONTE: Gomes Filho (2008, p. 31)

Os quatro exemplos apresentados na figura anterior apresentam


facilmente o conceito de unificação.

Na primeira figura, tem-se uma unificação perfeita (possui equilíbrio e


harmonia pelas próprias leis da Gestalt de proximidade, semelhança,
fechamento e boa continuidade). Na segunda, a unificação é
prejudicada por uma unidade vazada e por uma unidade “cinza”
(um ruído visual). Na terceira figura a unificação é mais prejudicada
ainda pelo vazio de duas unidades perdidas e por outra que destoa
pela forma circular, além de “seu tom cinza”. Finalmente, na quarta
figura, a unificação simplesmente desaparece: perdeu o equilíbrio e
a harmonia pela completa desordenação e irregularidade formal e
cromática. (GOMES FILHO, 2008, p. 31 – os termos entre aspas foram
alterados, pois a figura do autor é colorida e aqui foi reproduzida em
tons de cinza).

3.6 FECHAMENTO
Obtido pela continuidade e agrupamento de elementos que promovem
um todo mais completo, mais fechado. Não se trata de um fechamento físico, mas
de uma sensação de fechamento. É pelo fechamento, resultando da aproximação
que a Marca do Carrefour sugere a letra “C” cortando um losango, depois que
percebemos tal fechamento passamos a enxergar ora o losango vazado pelo “C”,
ora duas formas que apontam para direções opostas.

FIGURA 13 – FECHAMENTO FORMAL E MARCA DO INMETRO

FONTE: Adaptada de <https://asmetro.org.br/>. Acesso em: 27 ago. 2020.

92
TÓPICO 2 — AS LEIS DA ORGANIZAÇÃO DA FORMA: GESTALT

Nestas duas manifestações visuais, o fechamento pode ser exemplificado.


“As forças de organização da forma dirigem-se sempre para uma ordem espacial
lógica, confirmando o significado formal desejado” (GOMES FILHO, 2008, p. 32).
O triângulo equilátero formado pelos três semicírculos; e as duas letras iniciais
da marca InMetro, formada pela forma espelhada e rebatida – neste caso vemos
em preto o “I” e, vazando ele o “N”. Neste segundo caso, percebe-se o fator
denotativo, já no primeiro o fator abstrato ou conotativo, porém é importante
entender que é a postura artística que instiga a atração visual destas formas, e
promovem formas de alta pregnância quando trabalhadas de forma sútil.

3.7 CONTINUIDADE
A sucessão das partes, sem quebras ou interrupções sugerindo uma
trajetória ou oportunizando fluidez visual, é a continuidade. Ela está na tendência
da organização de elementos de maneira a um acompanhar o outro, permitindo
a continuidade de um movimento numa direção específica.

FIGURA 14 – CONTINUIDADE

Fonte: O autor

O círculo e suas variações definem a melhor continuidade, que ocorre


quando existe uma fluidez visual que sugere um sentido estável. Na representação
ao lado, percebe-se a continuidade fluindo por forma e tamanho. Sempre que se
trabalha com elementos similares, próximos à sugestão de continuidade pode ser
oportuna para orientar o leitor para um lugar específico da composição.

Os princípios da lei de organização da forma perceptual – Lei da Gestalt,


são as bases norteadoras para que se alcance composições que sejam coerentes
aos objetivos da comunicação em jogo. Não existe uma regra correta para alcançar
compor visualmente, “o que existe é um alto grau de compreensão do que vai
acontecer em termos de significado, se fizermos determinadas ordenações das
partes que nos permitam organizar e orquestrar os meios visuais” (DONDIS,
1997, p. 29). Para isso os princípios estudados até agora ajudam, mas outros
devem ser considerados.

93
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Quanto mais simples, mais equilibrado, homogêneo e regular for o objeto, mais
pregnante ele será – e que é esse o princípio da Lei da Prägnanz.

• A teoria da Gestalt entende que o que acontece no olho humano é diferente com
o que acontece no cérebro, e que a percepção é da junção destes dois momentos,
é do todo e é unificada.

• Pela teoria da Gestalt não percebemos formas isoladas, percebemos sempre


relações, onde uma parte depende da outra.

• A teoria da Gestalt, pode ser entendida como a Lei da Gestalt ou como a Lei da
organização da forma perceptual.

• Ao nos apoiarmos à Lei da Gestalt para analisar um objeto, os princípios


que devemos no apoiar são: unidade, segregação, unificação, fechamento,
continuidade, proximidade, semelhança, e a própria Lei da Prägnanz.

94
AUTOATIVIDADE

1 Um objeto que atende à Lei da Prägnanz apresenta clareza e promove sua


leitura de forma fácil. Para que possamos poder validar o nível de pregnância
de um objeto, basta ver se conseguimo-nos lembrar do objeto sem estar à
frente dele. Quanto mais lembramos o objeto, em sua totalidade – com suas
partes, mais pregnante será. Se olharmos as três imagens a seguir, e formos
tratar da pregnância de cada objeto ali representado, é possível afirmar que:

I- A possibilidade de poder lembrar de cada um dos pares de sapato tem


muito a ver com a sua capacidade de armazenar detalhes. Perceba que o
sapato que vai pedir um menor esforço em seus detalhes é o segundo. Dos
três pares, ele é mais pregnante, sugere a monocromia, poucos elementos,
poucas texturas, enquanto os outros dois parece ter mais de uma textura,
elementos decorativos estruturais. Pense da seguinte forma: se daqui
alguns dias você se recortar deste exercício, é bem possível que o segundo
sapato você terá com mais segurança para descrevê-lo.
II- O primeiro sapato você lembrará, mas quando chegar nos elementos:
caso da textura do salto e da base e do laço que será mais difícil lembrar
com segurança; da mesma forma o terceiro, aquelas tiras que seguram
a armação, quantas eram? Perceba que o segundo é mais fácil de ficar
impregnado em você.
III- Feche seus olhos e lembre de uma peça do vestuário que você desenharia
com segurança – claro que pode aparecer aquela peça que de tanto você
usar, você lembre em sua totalidade, mas a probabilidade de aparecer
desenhos de peças básicas, sem estampas, como: T-shirts básicas, vestidos
básicos e bermudas/shorts básicos. Estas são peças pregnantes, sua
neutralidade, clareza, harmonia, unidade, potencializam-nas para compor
looks com outras peças facilmente.

95
Com base no que é possível afirmar acerca das sentenças apresentadas,
assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) A Lei da Prägnanz garante que quanto mais elementos, mais fácil de
lembrar do objeto.
b) ( ) A Lei da Prägnanz está relacionada com a afirmação “menos é mais”.
c) ( ) A Lei da Prägnanz não pode estar relacionada com a capacidade de
comunicação de um objeto.
d) ( ) Ao garantir a Lei da Prägnanz, um objeto fica complicado de ser
percebido.

2 Vamos retornar a uma vitrine de que tratamos anteriormente (https://www.


fashionismo.com.br/2010/08/o-poder-de-uma-vitrine/). Focaremos apenas
no que se mostrou mais pregnante das duas – até porque, quanto mais
utilizamos os princípios da Gestalt estudados até aqui, maior a probabilidade
de chegarmos em uma composição que atenderá à Lei da Prägnanz. Neste
exercício, analise a imagem da vitrine e descreva como estão declarados cada
princípio de composição:

Unidade

Segregação

Proximidade

Semelhança

Unificação

Fechamento

Continuidade

96
Este exercício tem dois objetivos: primeiro, exercitar o olhar para identificar
cada princípio, oportunizando o entendimento de cada um. Segundo: entender
que os princípios se completam, e de como trabalhar um é trabalhar o outro.
Cada um tem seu olhar e ele deve ser pensando dentro da lógica. Dentro disso,
leia com atenção as sentenças a seguir:

I- Unidade – Se voltarmos ao exercício anterior, onde analisamos o grau


de pregnância de duas vitrines, podemos ver que o conjunto de cédulas
(formas que são iguais) garante unidade à vitrine. As a tonalidade cinza é
que faz da imagem, uma unidade de fato.
II- Segregação – é possível ver que as unidades “cédulas” e “manequim” se
segregam por quantidade, dimensão, posicionamento; a forma em barra
branca que declara “AUTOBANK” para garantir o entendimento de que
se trata deste ambiente – estes elementos permitem que a vitrine tenha
uma leitura dentro da temática (conteúdo) pretendida.
III- Proximidade – mas a proximidade é estratégia interessante e também é vista
nesta vitrine. As cédulas que se aproximam do chão – sugerindo quantidade;
as formas mais orgânicas que dão conta de compor o manequim; as formas
lineares geométricas em tons cinzas escuros, que sugerem um caixa eletrônico.
IV- Semelhança – elementos semelhantes facilitam o estabelecimento de
agrupamentos, na vitrine a composição ao segregar bem as partes, ajuda
muito nisso – pois boa parte dos elementos semelhantes já estão agrupados,
mas alguns que aparecem isolados dão destaque ao formato de cada
elemento – isso vale para as cédulas que parecem sair do caixa eletrônico
– que sugerem estar caído – dada a quantidade de elementos semelhantes
na parte de baixo – e como a estampa do vestido ganha destaque com isso
– pois não nenhum outro elemento similar a ela existe fora do vestido.
V- Unificação – os tons de cinza unificam a vitrine, e declaram a mesma
como harmonia, equilíbrio e coerência visual. Percebe-se que os
elementos semelhantes e a proximidade ajudam a compor a vitrine com
partes unificadas – a parte inferior – onde temos uma textura formada
pelas cédulas, a parte superior que tem uma composição geométrica com
elementos que se fecham em si. E a parte do meio da imagem – onde todas
as formas se destacam e o corpo da modelo parece segregar-se em relação
à parede e ao caixa-eletrônico.
VI- Fechamento – vários elementos, por proximidade inclusive, parecem
se fechar – os elementos do caixa-eletrônica fecham a imagem dele. Da
mesma forma que a barra superior declara a palavra “AUTOBANK”
explicitando o espaço que a vitrine representa. Os elementos orgânicos
da textura do vestido se fecham dando a ele destaque.
VII- Continuidade – No caso da continuidade, vemos como os elementos,
que por semelhança, sugerem direções do olhar. Algumas linhas retas
sugerem a noção de perspectiva – veja a figura que enquadra a palavra
“AUTOBANK”, por exemplo. Enquanto as cédulas que caem vão
formando uma linha curva que sugere um alagamento do espaço, de onde
saltam as duas pernas (que por proximidade) explicitam uma “ponta”
– direcionada ao look da modelo, que se segrega de toda a composição –
ganhando o devido destaque.

97
Com base no que é possível afirmar acerca dos princípios apresentados,
assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Todas as sentenças estão corretas.
b) ( ) As sentenças I, II, III e VII estão corretas.
c) ( ) As sentenças II, IV, V, VI e VI estão corretas.
d) ( ) As sentenças I, III e V estão corretas.

3 A Gestalt “é uma escola de Psicologia Experimental. Considera-se que


Christian von Ehrenfels, filósofo austríaco de fins do século XIX, foi o precursor
da psicologia da Gestalt. Mais tarde, por volta de 1910, teve seu início mais
efetivo por meio de três nomes principais: Max Wertheimer (1880-1943),
Wolfgang Köhler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886-1941), da Universidade de
Frankfurt” (GOMES FILHO, 2008, p. 18). A partir da leitura desse texto avalie
as asserções a seguir e a relação proposta entre elas:

I- A Gestalt atua principalmente na forma e tem grande relevância nos


estudos de percepção, linguagem, conduta e dinâmica de grupos sociais,
dando conta de sugerir respostas ao porquê gostamos mais de uma coisa
do que de outra.

PORQUE

II- Em um sentido mais geral, o termo Gestalt tem seu significado relacionado
à interação de parte em oposição ao todo.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
b) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
c) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II complementa
corretamente da I.
d) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não complementa
a I.

4 Reconhecer objetos é questão primeira na capacidade de percepção visual,


neste processo são mais percebidas as composições mais bem organizadas,
mais simples e estáveis – isso se dá pela lei de Prägnanz – que a teoria da
Gestalt analisa. A partir da afirmação, explique o que é a Lei da Prägnanz –
lei da pregnância, exemplificando:

5 Vemos na figura a seguir a mesma palavra escrita com tipografias diferentes.


Aponte qual delas tem maior pregnância, justificando sua resposta. Explique
cada um dos filtros.

98
FONTE: Adaptado de Gomes Filho (2008)

99
100
TÓPICO 3 —
UNIDADE 2

PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA


COMPOSIÇÃO

1 INTRODUÇÃO
Iniciamos o terceiro tópico desta unidade e nela vamos conhecer outros
princípios que parecem completar a Lei da Gestalt, ou, de certa forma estão
intrínsecos a ela. Entendendo que alguns princípios apresentam técnicas opostas
à Gestalt e mesmo assim ter poder na composição visual.

Neste tópico, nós vamos explorar técnicas no âmbito da polaridade,


caso do: equilíbrio e instabilidade; regularidade e irregularidade; simplicidade
e complexidade; unidade e fragmentação; economia e profusão; minimização e
exagero; previsibilidade e espontaneidade; atividade e estase; sutileza e ousadia;
neutralidade e ênfase; transparência e opacidade; estabilidade e variação;
exatidão e distorção; planura e profundidade; singularidade e justaposição;
sequencialidade e acaso; agudeza e difusão; e repetição e episodicidade.

A análise de um objeto pode identificar muitas das técnicas e dos princípios


em sua estrutura, e cabe ao profissional saber usar a variedade dos princípios
e as inúmeras técnicas na composição estrutural do seu objeto. Este tópico os
apresentará, vamos lá?

2 OUTROS PRINCÍPIOS E TÉCNICAS


No desenvolvimento de um objeto, um produto de design por exemplo,
são utilizados um número considerável quantidade de elementos (cores, formas,
texturas) e estratégias (proporção, posição, tamanho), relacionados com base
nos princípios da Lei da Gestalt (unidade, segregação, unificação, fechamento,
continuidade, proximidade, semelhança, pregnância); mas é possível perceber a
existência de outros princípios que regem a composição, caso da harmonia, do
contraste e de outras técnicas e elementos básicos da composição visual.

2.1 HARMONIA
A harmonia está relacionada à boa organização e boa proporção em toda
a composição visual. Quando os fatores de equilíbrio, ordem e regularidade
visual permitem clareza e simplicidade na leitura da composição, tem-se a
harmonia plena.

101
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

FIGURA 15 – HARMONIA

FONTE: O autor

A figura apresenta a harmonia pela ordem na disposição dos elementos


e tem concordâncias formais entre suas unidades. “O organismo humano parece
buscar a harmonia, um estado de tranquilidade e resolução que os zen-budistas
chamam de ‘meditação em repouso absoluto’” (DONDIS, 1997, p. 108), um objeto
harmônico sugere a redução da tensão, a racionalização, resolve as confusões
visuais, dando conta de garantir a Lei da Prägnanz. Quando fica evidente este
contexto harmônico é que o contraste ganha valor.

2.2 CONTRASTE
Se a vontade humana é a harmonia, o contraste é estratégia opositora a isso.
Como já mencionamos, é pelo contraste que é possível ver – imagine um desenho
branco sobre um fundo branco – este baixo contraste dificultará a visualização do
desenho – para darmos visualização, é preciso acentuar a oposição cromática do
fundo ou do desenho – e isso, basicamente, é o contraste.

A importância e o significado do contraste começam no nível básico da


visão pela presença ou ausência da luz. É a força que torna visível as
estratégias da composição visual. É de todas as técnicas a mais importante
para o controle visual de uma mensagem bisou tridimensional. É
também um processo de articulação visual em uma força vital para a
criação de um todo coerente (GOMES FILHO, 2008, p. 62).

O contraste ganha valor (inclusive na comunicação) à medida que ele


potencializa as oposições, como comentamos inicialmente o traço escuro sobre
um fundo branco potencializa a visualização de um desenho. Entendendo isso é
preciso sutileza para trabalhar com ele, ainda mais quando optar pelo contraste
é estratégia é expressar, transmitir uma ideia. “O contraste é o aguçador de todo
significado; é o definidor básico das ideias. Entendemos muito mais a felicidade
quando a contrapomos à tristeza, e o mesmo se pode dizer com relação aos
opostos amor e ódio” (DONDIS, 1997, p. 121).

102
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

NTE
INTERESSA

Retorne ao início desta unidade e veja as linhas que você compôs para
expressar a ideia de “casamento feliz” e de “casamento conflituoso” – o contraste destas
duas situações provavelmente estará manifestado em suas expressões.

De todas as técnicas o contraste é obrigatoriamente o mais existente nas


manifestações visuais, sendo uma referência obrigatória, tanto na composição
visual como um todo ou na caraterização de um elemento específico, pelo fato de
que ele garante a articulação e a expressão visual pretendidas.

Só será possível evidenciar um elemento de uma composição se


promovermos este por contraste. No croqui do estilista Christian Lacroix, nós
vemos como ele utilizou o contraste para dar ênfase aos elementos específicos –
expressando transparências nos ombros em contraste com a opacidade expressa
na representação do vestido na cintura.

FIGURA 16 – OS CONTRATSES NA REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO ESTILISTA CHRISTIAN LACROIX

FONTE: <http://www.parisartours.com/wp-content/uploads/2016/12/
eb55892fd2817193da0de8ac5a00ec53-1.jpg>. Acessado em: 27 ago. 2020.

No croqui de Lacroix é possível perceber o contrate de tom, onde a


claridade ou a obscuridade relativas promovem intensidades contrastantes,
analisando a imagem é evidente que existem divisões dos extremos tonais, que
são suficientes para expressar por contraste as diferenças de volumes, de peso e

103
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

de tamanho de elementos que estão compondo a peça do vestuário representada


pelo estilista. Outros contrastes que aprecem na figura são: contraste de forma
(onde linhas sugerem texturas diferentes – umas mais esvoaçantes que outras,
que na ausência de linhas expressam tecidos lisos). Contraste de escala, onde
pequenos traços que sugerem amarrações (laços) nas mangas dão força (dada ao
seu tamanho menor) ao elemento de amarração na cintura (um laço que parece
cinturar a peça no corpo de quem a veste).

NTE
INTERESSA

Com apenas dois elementos, vamos exercitar o que estamos tratando aqui.
Recorte um quadrado em uma folha de papel branca de tamanho 10x10cm (tendo como
base um A4). E uma moeda.

Usando o quadrado como base, coloque a moeda sobre o papel quadrado.


Inicialmente, vemos que a moeda se contrasta com o fundo branco. Agora, posicione a moeda
dentro do quadrado de maneira criando uma composição harmônica. Veja que interessante:

Harmonia, como tratamos aqui é um estado de repouso absoluto, desta forma,


há uma probabilidade de a moeda estar posicionada em um lugar dentro do quadrado
que provoque um relaxamento das tensões visuais – ou seja, que nosso olhar não fique
vagando a composição em busca de uma situação considerada melhor. Assim é bem
possível que a posição mais sugestiva seja o centro do quadrado.

Interessante perceber que nós nos comportamos como um instrumento de


medida, como nos diz Rudolf Arnheim (2005), vamos levando a moeda de forma que ela
esteja distanciada das quatro bordas igualmente, buscando o centro geométrico da figura.
Desta forma, garantimos a composição harmonia visual em todos os sentidos. Note que se
posicionarmos a moeda sem esta capacidade de medida, a figura fica pedindo isso:

104
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

Com este exercício, colocamos em evidência técnicas de composição que


se apoiam na ideia que a “experiência visual é dinâmica” (ARNHEIM, 2005, p.
4). Perceba quanto a moeda tem vontade de se posicionar no centro, e parece se
puxada para esta posição por forças que não estão declaradas na imagem. Esse
exercício nos mostra que existem mais coisas no campo de visão do que a retina
consegue captar (lembre-se das diferenças entre “ver” e “enxergar”), e como este
fator induz o comportamento de quem compõe visualmente.

A vontade de pausa sugerida pela harmonia, declara que as energias


envolvidas na composição atingiriam o mínimo, pouco há para deixar a mesma
em equilíbrio.

2.3 EQUILÍBRIO
Assim como para a harmonia, o ser humano tem uma tendência de buscar
o equilíbrio, é da natureza dele. Desta forma, o equilíbrio é referência visual
forte quando recebe ou produz informações visuais. A noção horizontal-vertical
compõe a base do ser humano com o meio ambiente e com o espaço que ele vai
compor seus objetos, que passam a ter “eixo” vertical, com referência horizontal,
e juntos determinam as condicionantes estruturais que dão conta do equilíbrio –
conhecido como “eixo de sentido”.

FIGURA 17 – TESTE DE MAITLAND GRAVES

FONTE: Adaptado de Arnheim (2005, p. 14)

105
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

Ilustrando um exemplo dos testes feitos por Maitland Graves para determinar
a sensibilidade de estudantes foi descrita por Arnheim (2005, p. 14) assim:

A figura da esquerda é bem equilibrada. Há bastante vida nesta


combinação de quadrados e retângulos de vários tamanhos,
proporções e direções, mas eles se prendem uns aos outros de tal
modo que cada elemento permanece em seu lugar, tudo é necessário,
nada está procurando mudar. Compare a vertical interna claramente
estabelecida de (a) com sua patética contraparte vacilante em (b). Em
(b), as proporções baseiam-se em diferenças tão pequenas que deixam
os olhos na incerteza de contemplar igualdade ou desigualdade,
simetria ou assimetria, quadrado ou retângulo. Não se pode dizer o
que a figura tenta transmitir.

Neste exemplo, alguns fatores relevantes quanto ao equilíbrio, cujas


propriedades relevantes são:

Peso e direção – Dependendo da posição ou do tamanho de um elemento


ele pode ganhar peso na composição, e com isso atrai a atenção. Para que se consiga
dar a esta composição equilíbrio faz-se necessário inserir outros elementos que
contrabalancem seu peso. As obras de Piet Mondria são composições equilibradas
com base em estruturas onde pesos e direções são potencializados.

FIGURA 18 – REPRESENTAÇÃO EM TONS DE CINZA DA OBRA DE PIET MONDRIAN

FONTE: Adaptada de <http://twixar.me/m5gm>. Acesso em: 27 ago. 2020.

Mesmo em tons de cinza é possível ver que quadrados de tons iguais se


apresentam em tamanhos diferentes e estão posicionados estrategicamente para
que a obra tenha equilíbrio. A capacidade do artista, quase que matemática, é
elogiável, pois é preciso competência visual para alcançar esta composição visual.

106
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

Simetria e assimetria – toda composição apresenta, pelo menos, um eixo


que divide o objeto ao meio, quando as partes são iguais ou se assemelham a
composição é simétrica; quando elas não são iguais a composição será assimétrica.
Dada a relação de igualdade das duas partes, as composições simétricas têm a
tendência de serem percebidas mais facilmente. E dada a uma estrutura que se
repete podem se tornar algo monótono, enfadonho e sem graça. A composição
da Figura 19 é um exemplo disso, e dada a possibilidade de a mesma ter eixos
horizontal, vertical e diagonal que a dividem é chamada de Simetria Axial – neste
tipo, o equilíbrio é absolutamente perfeito.

FIGURA 19 – SIMETRIA NUMA FOTOGRAFIA DE PAISAGEM

FONTE: <https://olhares.com/simetria-axial-natural-foto8109719.html>. Acessa em: 27 ago. 2020.

A fotografia de paisagem se mostra simétrica por pesos e direções de


seus elementos. É possível ver o eixo de simetria vertical (1); o eixo de simetria
horizontal (2) e até os eixos simétricos diagonais (3a; 3b).

Já a assimetria é a ausência de simetria. Uma composição assimétrica,


para alcançar o equilíbrio, demanda de um esforço árduo por parte de seu
produtor. Na composição de Piet Mondrian (Figura 18) o contraste assimétrico
se manifesta em todos os eixos. Os pesos das figuras geométricas e os contrastes
das linhas pretas e dos tons de cinza conferem um resultado plástico, além de
equilibrado, interessante.

Cabe ao profissional responsável em compor visualmente um objeto, seja


ele um desenho, um produto, uma coleção de moda, entender de que forma ele
quer atingir seu público alvo. As composições equilibradas, harmônicas e que
vão em linha à Lei da Prägnanz direcionam o discurso visual para a simplicidade,
para a sensatez. Todavia, nem sempre é isso que atrairá a clientela, entender que
é possível utilizar técnicas opostas a isso pode contribuir para o repertório deste
profissional. Desta forma, vamos apresentar algumas técnicas visuais que pode
servir como estratégias na comunicação (DONDIS, 1997):

107
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

2.4 EQUILÍBRIO E INSTABILIDADE


Já tratamos do equilíbrio que numa composição visual pode ser trabalhado
na definição de um centro de suspensão, que dará norte para os pesos e direções e
para os eixos de simetria. Já a instabilidade é oposta ao equilíbrio.

FIGURA 20 – EQUILÍBRIO (1) E INSTABILIDADE (2)

FONTE: O autor

2.5 REGULARIDADE E IRREGULARIDADE


Enquanto a regularidade potencializa a uniformidade dos elementos da
composição e, institui uma ordem na estrutura organizacional, a Irregularidade
vai enfatizar o inesperado, comprometendo o que seria ordinário na estrutura
organizacional da composição.

FIGURA 21 – REGULARIDADE (1) E IRREGULARIDADE (2)

FONTE: O autor

108
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

2.6 SIMPLICIDADE E COMPLEXIDADE


A ordem e a uniformidade são norteadoras da simplicidade, cujas formas
se apresentam sem complicações e se maiores elaborações. Enquanto a composição
complexa é compreendida por uma quantidade e/ou variedade considerável de
elementos, precisamos de artifícios complicados em sua organização.

FIGURA 22 – SIMPLICIDADE (1) E COMPLEXIDADE (2)

FONTE: O autor

2.7 UNIDADE E FRAGMENTAÇÃO


A unidade já foi trabalhada anteriormente e, neste momento, é
importante salientar que está relacionada com o equilíbrio adequado de vários
elementos em uma composição que os totaliza visualmente. Esta totalização fica
tão harmonizada que passa a ser vista como uma única coisa. A fragmentação,
ao contrário, decompõe os elementos e as unidades possíveis, deixando cada
uma das partes da composição relacionadas entre si, conservando o caráter
individual de cada uma.

109
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

FIGURA 23 – UNIDADE (1) E FRAGMENTAÇÃO (2)

FONTE: Adaptada de <https://i.pinimg.com/originals/58/


e9/9c/58e99cacda07ba7a8714b5581e22f81e.jpg>. Acesso em: 30 out. 2020.

2.8 ECONOMIA E PROFUSÃO


A economia é numa organização sensata, coerente e parcimoniosa na
utilização de elementos visuais. A profusão, pelo contrário, se apresenta cheia
de elementos, com muitos detalhes e ornamentos; pode ser entendida como uma
estratégia de enriquecimento visual, associando seu discurso ao poder e à riqueza,
enquanto a economia está relacionada ao conservadorismo e pureza da forma.

FIGURA 24 – ECONOMIA (1) E PROFUSÃO (2)

FONTE: O autor

110
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

2.9 MINIMIZAÇÃO E EXAGERO


Equivalentes da polaridade econômica e profusão, a minimização se
mostra mais abrandada, dando conta de expressar o máximo com o mínimo de
elementos. O Exagero recorre à expressão profusa e extravagante, dando ênfase à
agressividade, intensificando e amplificando seu discurso.

FIGURA 25 – MINIMIZAÇÃO (1) E EXAGERO (2)

FONTE: O autor

2.10 PREVISIBILIDADE E ESPONTANEIDADE


Uma composição previsível sugere ordem e convenção, tem a possibilidade
de oferecer elementos que deixam previsível como a mesma será composta. Por
outro lado, a espontaneidade parece não ser planejada, de forma impulsiva e livre
surpreende em sua composição.

FIGURA 26 – PREVISIBILIDADE (1) E ESPONTANEIDADE (2)

FONTE: O autor

111
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

2.11 ATIVIDADE E ESTASE


Atividade reflete visualmente o movimento, sugerindo ou representando
isso. Toda a energia e o estímulo da técnica visual Atividade é acalentada, pela
Estase que busca no equilíbrio o efeito de repouso e tranquilidade.

FIGURA 27 – ATIVIDADE (1) E ESTASE (2)

FONTE: O autor

2.12 SUTILEZA E OUSADIA


Embora delicada e requintada, a sutileza apresenta criteriosa concepção
apresentando composições de grande habilidade e inventividade. É uma técnica
que apresenta saídas distintas e apuradas. A ousadia tem na obviedade sua lógica,
objetivando a máxima visibilidade deve ser utilizada com audácia, confiança e
segurança.

FIGURA 28 – SUTILEZA (1) E OUSADIA (2)

FONTE: O autor

112
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

2.13 NEUTRALIDADE E ÊNFASE


A neutralidade aparece em ocasiões em que a composição tem uma
estrutura visual que pouco provoca o observador. Enquanto a ênfase quebra
esta atmosfera, criando elementos provocativos, realçado por fortes contrastes
determinados elementos.

FIGURA 29 – NEUTRALIDADE (1) E ÊNFASE (2)

FONTE: O autor

2.14 TRANSPARÊNCIA E OPACIDADE


Nesta polaridade a transparência vai envolver detalhes que permitem que
os elementos situados na parte de trás sejam revelados. Enquanto a opacidade os
bloqueia totalmente.

FIGURA 30 – TRANSPARÊNCIA (1) E OPACIDADE (2)

FONTE: O autor

113
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

2.15 ESTABILIDADE E VARIAÇÃO


A uniformização e a coerência da composição definem a estabilidade.
A variação exige mudanças e elaborações, caracterizando-se pela diversidade e
sortimento dos elementos da composição.

FIGURA 31 – ESTABILIDADE (1) E VARIAÇÃO (2)

FONTE: O autor

2.16 EXATIDÃO E DISTORÇÃO


A exatidão é a reprodução fiel de como nossos olhos veem. É quando
a composição dá conta de representar o fenômeno como ele é no real. Uma
fotografia é um bom exemplo para a Exatidão. Já a distorção altera o realismo da
exatidão, age sobre a composição desviando a forma regular, a forma verdadeira.

FIGURA 32 – EXATIDÃO (1) E DISTORÇÃO (2)

FONTE: O autor

114
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

2.17 PLANURA E PROFUNDIDADE


Duas técnicas que estão submetidas ao entendimento da perspectiva. No
caso da planura, não existe a perspectiva e nem efeitos de luz e sombra. Quando a
perspectiva aparece, assim como os efeitos de luz e sombra, temos a profundidade.

FIGURA 33 – PLANURA (1) E PROFUNDIDADE (2)

FONTE: O autor

2.18 SINGULARIDADE E JUSTAPOSIÇÃO


A singularidade dá ênfase a um elemento específico, ela focaliza,
deixando este elemento independentemente de qualquer outro elemento da
composição. A justaposição sugere a interação entre os elementos, estabelecendo
relações entre elas tornando-as dependentes uma das outras na composição.

FIGURA 34 – SINGULARIDADE (1) E JUSTAPOSIÇÃO (2)

FONTE: O autor

115
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

2.19 SEQUENCIALIDADE E ACASO


Quando a composição apresenta uma ordem lógica e permite que se
tenha uma resposta compositiva ordinária, temos a sequencialidade, que provoca
uma disposição de elementos similares ou não, segundo um padrão rítmico. Já,
a ausência de planejamento rítmico, a desorganização ordinária define o acaso,
cuja estrutura composicional se mostra acidental.

FIGURA 35 – SEQUENCIALIDADE (1) E ACASO (2)

FONTE: O autor

2.20 AGUDEZA E DIFUSÃO


Agudeza define-se na clareza física e de expressão da composição cujos
elementos se mostra precisos, com linhas/contornos rígidos, com efeito final claro
e de fácil interpretação. Enquanto a suavidade e a menor precisão caracterizam
a composição difusa, que cria uma “atmosfera de sentimento e calor” (DONDIS,
1997, p. 158).

FIGURA 36 – AGUDEZA (1) E DIFUSÃO (2)

FONTE: O autor; Dondis (1997, p. 158)

116
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

2.21 REPETIÇÃO E EPISODICIDADE


Quando a composição apresenta elementos visuais ininterruptos que
a unifica, tem-se a repetição, onde a continuidade dá união à composição. Já a
técnica da episodicidade apresenta elementos desconexos, com conexões frágeis,
ela reforça a individualidade de cada elemento, sem desqualificar a composição
como um todo.

FIGURA 37 – REPETIÇÃO (1) E EPISODICIDADE (2)

FONTE: O autor

Retiradas da obra de Donis A. Dondis: Sintaxe da linguagem visual, estas


técnicas são ferramentas importantes na mão do designer.

Muitas outras técnicas visuais podem ser exploradas, descobertas


e empregadas na composição, sempre no âmbito da polaridade
ação-reação: luminosidade, embaçamento; cor, monocromatismo;
angularidade, rotundidade; verticalidade, horizontalidade;
delineamento, mecanicidade; intersecção, paralelismo. Seus estados
antagônicos de polaridade dão ao compositor visual uma grande
oportunidade de aguçar, graças à utilização do contraste, a obra em
que são aplicados (DONDIS, 1997, p. 160).

Interessante perceber que “a percepção da forma é o resultado de uma


interação entre o objeto físico e o meio de luz agindo como transmissor de informação,
condições e imagens que prevalecem no sistema nervoso do observador que é, em
parte, determinada pela própria experiência visual” (GOMES FILHO, 2008, p. 41).
Quando olhamos para uma vitrine, podemos perceber o “esquema do plano de
expressão”, convertendo a forma fotográfica (que espelha o real da vitrine), em um
conjunto de formas abstratas (linhas, retângulos, círculo) que vão contribuir para o
entendimento mais apurado da vitrine. Isso ajuda a entender que estes elementos
formais se tornam uma espécie de alfabeto visual. Este alfabeto é formado pelos
elementos visuais que são: o ponto, a linha, a forma, a direção, o movimento, a escala,
a dimensão, a textura, o tom e a cor.

117
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

3 ELEMENTOS VISUAIS
Os elementos visuais formam a base do que vemos, como letras de um
alfabeto: ponto, linha, forma, direção, movimento, escala, dimensão, textura, tom
e cor, se mesclam construindo elementos que sozinhos ou em conjunto formar
as composições visuais. Um pequeno número que é matéria-prima de toda e
qualquer informação visual.

Assim como um alfabeto e a gramática fica à disposição do escritor, os


elementos visuais ficam à disposição do artista visual, do designer que, dado o seu
repertório gramatical visual (caso do entendimento dos princípios e das técnicas
visuais), garantirá composições que sejam lidas, compreendidas e convençam a
aquisição de seus valores por parte de seus consumidores.

Para que possamos entender os elementos vamos tratar de cada um deles


isoladamente:

3.1 O PONTO
O elemento mais simples da comunicação visual. Irredutível. Todo e
qualquer ponto tem forte poder de atração.

FIGURA 38 – O PONTO

FONTE: O autor

Isolado o pondo concentra a atenção do espectador. Quando trabalhado


em conjunto e com a mesma proporção o ponto age como eixos de para do olhar
– fazendo com que se percorra as distâncias que supostamente cada um limita.
Perceba na Figura 38 que do lado esquerdo nosso olho repousa no ponto isolado, e
quando dentro de uma figura (como o quadrado) ele chama a atenção – concentra
as forças de toda a composição. Agora se posicionarmos dois pontos ou mais,
veremos que o conjunto dos pontos dirigem o olhar:

118
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

FIGURA 39 – PONTO E A DIREÇÃO DO OLHAR

FONTE: O autor

A aproximação dos pontos permite a sensação de tonalidades – quanto


mais próximos mais fortes os tons, quanto mais distantes, mais suaves. Essa
capacidade contribuiu para o surgimento de um movimento artístico chamado
de “pontilhismo”, que como manifesto dá conta de expressar o poder de atração
dos pontos numa composição visual.

FIGURA 40 – TÉCNICA DO PONTILHISMO

FONTE: <https://3.bp.blogspot.com/-Rw8gA-kJImY/WMC-SVvhZGI/AAAAAAAAAG0/eG02q
h2hZNQpjGA1dRpf-OglGL_NQLHNwCLcB/s320/olho%2Bponto.jpg>. Acesso em: 27 ago. 2020.

A aproximação de elementos para intensificar as tonalidades é um recurso


interessante. Muitos artistas visuais se utilizam disso, na história os artistas do
pontilhismo “exploraram os processos de fusão, contraste e organização, que se
concretizam nos olhos do espectador” (DONDIS, 1997, p. 54). Potencializando
o papel do “olhar” na percepção visual. O ponto, como elemento primeiro de
qualquer composição, induz a qualquer outro elemento.

119
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

NTE
INTERESSA

Muito do que estamos vendo nesta disciplina conversa diretamente com a


história da arte. Que tal um retorno a ela para poder entrar em contato com artistas e obras
que dão conta de exemplificar toda essa teoria? Acesse: https://arteref.com/arte-no-mundo/9-
coisas-que-voce-precisa-saber-sobre-o-pontilhismo/ e veja o exemplo do pontilhismo.

3.2 A LINHA
Como vimos, os pontos quando vão se aproximando, dirigem o olhar e
aumentam a tonalidade do conjunto que compõem. Esta aproximação, quando
impossibilita a identificação dos pontos nos leva à experiência da linha. Tanto que
uma forma de conceituar linha é pela noção do ponto movimentar-se no espaço,
deixando uma marca contínua – uma linha.

FIGURA 41 – A LINHA

FONTE: O autor

A linha nunca é estática, uma vez que ela é o ponto em movimento. É um


elemento da composição inquieto e questionador de todo e qualquer desenho.
Todavia, ela não é vaga, ela é decisiva, delimita. A linha dá forma às ideias, e
permite organizar o sistema visual para que ideias sejam pensadas.

FIGURA 42 – CROQUI ARQUITETÔNICO

FONTE: Adaptada de <https://mir-s3-cdn-cf.behance.net/project_modules/2800_


opt_1/2dd5d894389143.5e7e512c2340c.jpg>. Acesso em: 27 ago. 2020.

120
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

A linha é o elemento essencial do desenho, tanto na escrita quanto na


capacidade de ser desenho. “Pode assumir formas muito diversas para expressar
uma grande variedade de estados de espírito” (DONDIS, 1997, p. 57), lembre-se
do exercício de representar, pela linha o sentimento de “casamento feliz” e de
“casamento conflituoso”! A linha dá conta de retirar tudo o que é supérfluo e
expressar. Delicada ou grosseira, reta ou ondulada, a linha tem poder personalizar
o traço de seu executor, potencializando a identidade no traço, expressão máxima
do estilo de um artista. Da mesma forma que pode ser fria, sem identidade em
desenhos de mapas, projetos técnicos e engrenagens de máquinas.

A linha pode ser entendida como limite. Difícil de ser encontrada na


natureza ela aparece nos limites de uma rachadura na parede, nos limites das
sobras de uma árvore na calçada, no contraste dos fios de luz com o céu azulado.
Ela potencializa, então as formas que nos chegam à visão.

3.3 A FORMA
É descrita, delimitada pela linha. Sua complexidade é articulada pela
linha. Apenas três formas básicas existem: o quadrado, o círculo e o triângulo.
Com características específicas cada um dá conta de representar determinados
significados, em alguns casos de forma arbitrária.

FIGURA 43 – AS FORMAS BÁSICAS: QUADRADO, CÍRCULO E TRIÂNGULO

FONTE: O autor

“Ao quadrado se associam enfado, honestidade, retidão e esmero;


ao triângulo, ação conflito, tensão; ao círculo, infinitude, calidez, proteção”
(DONDIS, 1997, p. 58). Estas formas básicas são planas e a partir das mais variadas
combinações dão conta de formar todas as outras formas.

121
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

FIGURA 44 – EXEMPLOS DA VARIAÇÃO FORMAL DAS COMBINAÇÕES DAS FORMAS BÁSICAS

FONTE: O autor

Se entendemos que a linha surge do movimento do ponto pelo espaço,


podemos entender que a forma surge do movimento linear neste mesmo espaço.
São as direções que a linha percorre que dão as formas que vemos.

3.4 A DIREÇÃO
As três formas básicas surgem de três direções básicas: da direção
horizontal e vertical vamos ter as formas quadráticas; da direção angular vamos
ter as formas triangulares; e da direção em curva, vamos ter as formas circulares.

FIGURA 45 – DIREÇÕES VISUAIS BÁSICAS

FONTE: O autor

Da mesma maneira que as formas básicas, cada direção tem significados


importantes: a direção vertical-horizontal

constitui a referência primária do homem, em termos de


bem-estar e maneabilidade. Seu significado mais básico tem
a ver [...] com a estabilidade em todas as questões visuais. A
necessidade de equilíbrio não é uma necessidade exclusiva do
homem; dele também necessitam todas as coisas construídas
e desenhadas. A direção diagonal tem referência direta com a

122
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

ideia de estabilidade. É a formulação oposta, a força direcional


mais instável, e, consequentemente, mais provocadora das
formulações visuais. Seu significado é ameaçador e quase
literalmente perturbador. As forças direcionais curvas têm
significados associados à abrangência, à repetição e à calidez.
Todas as forças direcionais são de grande importância para a
intenção compositiva voltada para um efeito e um significado
definidos (DONDIS, 1997, p. 60).

FIGURA 46 – TENSÕES FORMAIS CONFORME AS DIREÇÕES

FONTE: O autor

3.5 O MOVIMENTO
Este elemento visual está mais implícito que explícito nas composições
visuais. Contudo é um dos principais recursos visuais do funcionamento das
estruturas visuais. Se formos pensar no movimento explícito, vamos percebê-lo
no cinema, nos audiovisuais, onde de fato, a imagem se expressa em movimento;
ou em mecanismos que tenham no movimento sua expressão (podemos pensar
aqui em vitrines que tenham elementos que fiquem se movimentando). Todavia,
a maneira implícita de se declarar faz do movimento um dos principais recursos
das imagens estáticas. Muitas imagens estáticas podem em sua composição
sugerir movimentos – como resposta à posição de elementos e/ou recursos visuais
que formam a estrutura visual dela. Se voltarmos à Figura 39, vamos ver que a
combinação de dois ou mais pontos, ao sugerirem direção, sugerem movimento.
O olhar do espectador vai e volta entre os elementos visuais (que neste exemplo
são similares – pontos).

123
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

FIGURA 47 – MOVIMENTO EM IMAGENS ESTÁTICAS

FONTE: O autor

É este vagar do olhar, essa exploração visual da estrutura, que promove


movimento à composição. Em nossa cultura (Ocidente) a convenção da leitura
arbitraria esta exploração, induz o olhar a percorrer um caminho na página. Este
vagar também está condicionado às questões fisiológicas – caso de, na busca de
um suposto equilíbrio, exploramos as imagens pelos eixos de sentido (vertical,
horizontal e diagonal); além do próprio olho apresentar movimentos musculares
que o deixam sempre em movimento, percorrendo o espaço de visão – este
tipo de movimento ocular organiza padrões de esquadrinhamento que “são
tão individuais e únicos quanto as impressões digitais” (DONDIS, 1997, p. 81).
Essas capacidades de olhar, sozinhas ou em conjunto, deixam claro que existe
movimento nas imagens, da mesma forma que nos processos de visão.

3.6 A ESCALA
Os elementos que constituem uma composição podem ser diferentes um
dos outros, estas diferenças constituem as escalas – uma cor é mais forte que
outra; uma forma é maior que a outra. “A escala pode ser estabelecida não só
através do tamanho relativo das pistas visuais, mas também através das relações
com o campo ou com o ambiente” (DONDIS, 1997, p. 72). O resultado destas
relações nunca é absoluto, podem sofrer modificações no decorrer da experiência
do olhar – comparado a um elemento tal forma é menor, mas se mostra mais
intensa que outra forma, e por aí vai.

124
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

FIGURA 48 – ESCALA E A VARIAÇÃO NAS RELAÇÕES

FONTE: O autor

Um mesmo círculo pode ser considerado grande em relação à figura que


o contém, e pequeno quando situado dentro de uma figura maior. O tamanho
relativo da composição interfere na afirmação sobre um mesmo elemento,
deixando relativa toda e qualquer afirmação sobre as comparações.

A escala nos permite, então, termos uma dimensão dos elementos a partir
de um valor. Em mapas, por exemplo, ela indica que uma determinada medida
no desenho representa outra medida no mundo real. No caso de um desenho
técnico, onde o desenho a proporcionalidade do desenho para a peça final é feito
em escala, normalmente 1:10 (um para dez). Onde na peça real o que for 100 cm de
altura, terá no desenho 10 cm. A escala vai aparecer na indústria do vestuário nos
tamanhos variáveis das peças – P, M, G; com base em uma escala proporcional à
média das medidas do corpo humano em uma determinada etnia.

FIGURA 49 – ESCALA EM DESENHOS TÉCNICOS

FONTE: Adaptada de <http://www.renataperito.com/?p=2078>. Acesso em: 27 ago. 2020

125
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

Existem outras relações de escala que se fazem por fórmulas de proporção


– caso da seção áurea (fórmula matemática de grande elegância visual). Ela é muito
usada para o desenvolvimento de marcas, mas seu papel básico é proporcionar
uma certa sensação de equilíbrio para o espectador – assim, ao desenvolvermos
um projeto com base na proporção áurea estamos colocando toda a composição
em linha com a Lei da Prägnanz.

DICAS

A proporção áurea é discutida e apresentada por vários autores e profissionais


da área do design, das artes, da comunicação, da arquitetura, e outras. Se você buscar
na internet terá acesso a vários conteúdos interessantes sobre o tema. Disponibilizamos
um site para mostrar isso: https://designculture.com.br/finalmente-aprenda-a-aplicar-
proporcao-aurea. Boa pesquisa!

Entender que ao relacionarmos os elementos de uma composição a partir


de uma escala, nos faz perceber quanto isso pode afetar os significados e o quanto
poderá interferir nos objetivos pretendidos em jogo na composição. Controlar
a escala é dominar o discurso, manipulando os elementos a favor do que se
pretende com projeto.

3.7 A DIMENSÃO
A dimensão de objetos tridimensionais é lógica e real, porém imagens
bidimensionais dão conta de representar a dimensão através da ilusão – o desenho,
a pintura, a fotografia, por mais que representam objetos tridimensionais, não os
são. É possível representar a dimensão por várias maneiras, uma das principais é
a técnica da perspectiva. Os resultados da perspectiva podem ficar mais intensos
com a manipulação de claro-escuro, luz e sombra.

DICAS

A perspectiva tem base matemática e em regras múltiplas e complexas. A


representação utilizando a perspectiva permite o realismo nos desenhos. Muitos sites e
vídeos ajudam a entender esta técnica, que tal uma pesquisa na internet sobre este tema?
Segue um link que pode ajudar nisso: https://comodesenharbemfeito.com.br/desenho-
em-perspectiva/.

126
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

A dimensão permite nos aproximarmos da técnica, já estudada, da


exatidão. Um cubo no espaço, ganha dimensões “exatas” de um cubo se seguir as
regras métricas da perspectiva, por exemplo.

FIGURA 50 – DIMENSÕES DE UM CUBO PELA PERSPECTIVA

FONTE: O autor

A dimensão real é a dominante no desenho de projetos. Por mais que


se trabalhe com escalas, em um determinado momento o tamanho de 1:1 (um
para um) se torna o recurso mais sensato para diminuir os riscos no momento de
confecção das peças.

A capacidade de produzir o objeto na dimensão real de forma


tridimensional é chamada de mockup – que num projeto é um modelo (em escala
proporcional ou real) de um dispositivo capaz de demonstrar seu funcionamento.
No design de moda, a peça piloto pode ser entendida assim. O problema aparece
quando há a necessidade de apresentarmos a dimensão real numa representação
bidimensional – por mais que se possa dar ao desenho uma ilusão tridimensional,
utilizando a perspectiva por exemplo, uma técnica, dentro da área de projeto, são
os desenhos das vistas do objeto. Mostrando o mesmo em partes – caso da Ficha
Técnica da Figura 49.

3.8 A TEXTURA
A ideia visual para o tato é a trabalhada na textura. Um objeto pode
apresentar texturas que não são perceptíveis pelo tato, apenas pela visão, caso
dum uma composição de linhas impresso em papel, em um tecido. Boa parte
da experiência com a textura é visual, quando há o toque ampliamos o níveo
desta experiência. Visualizar um casaco de pele e poder tocá-lo, oferece uma
experiência, primeiramente visual – observamos uma composição visual que
nos remete à determinada textura, e depois, ao tocar, confirmamos o que olhos
sugeriram. Um outro exemplo, é visualizarmos um casaco, cujo tecido imita, em

127
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

desenho, a textura de uma pele – neste caso, a sensação primeira é a mesma da


anterior. Todavia, quando tocamos, a textura sentida é diferente dos que os olhos
sugeriram. Assim, vamos que a capacidade de trabalhar com a textura em uma
composição visual é sugerir estas experiências (que podem ser confirmadas com
o tato, ou não).

FIGURA 51 – REPRESENTAÇÃO VISUAL DE COURO

FONTE: <https://s3-sa-east-1.amazonaws.com/loja2/248f138f8b8d8c37caaaef0e325150c7.jpg>.
Acesso em: 27 ago. 2020.

3.9 O TOM
A base do tom está na utilização de técnicas de representação que se
utilizam da intensidade, da obscuridade ou claridade do que se quer representar.
O tom pode ser entendido como a variação de luz, mas é bom ressaltar que
quando “falamos de tonalidade em artes gráficas, pintura, fotografia e cinema,
fazemos referência a algum tipo de pigmento, tinta ou nitrato de prata, que se usa
para simular o tom natural” (DONDIS, 1997, p. 61). Entre a obscuridade e a luz
existe uma infinidade de tons na natureza, mas nas artes visuais essas tonalidades
são bem mais limitadas. Entre o branco e o preto existem tonalidades de cinza
perceptíveis aos olhos, quanto à variação tonal – e isso é relevante na reprodução
de composições visuais.

FIGURA 52 – VARIAÇÃO DE TONALIDADE DO BRANCO AO PRETO

FONTE: Adaptada de Dondis (1997, p. 62)

128
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

Na segunda composição da imagem percebe-se que um mesmo


tom de cinza, colocado em composição com outras tonalidades modifica-se
dramaticamente. Esta composição tonal pode resultar em sugestões dimensionais,
já tratamos da possibilidade métrica de resultar dimensão tridimensional aos
desenhos bidimensionais, mas isso é possível também através da variação tonal.

FIGURA 53 – DIMENSÃO RESULTANTE DA VARIAÇÃO TONAL

FONTE: O autor

3.10 A COR
Enquanto a tonalidade nos dá noção de profundidade, de dimensão, a
cor sugere emoção. Isso é interessante, pois conseguimos expressar informações
através de desenhos em preto e branco, mas quando inserimos cor, exaltamos
sentidos emocionais – se voltarmos a exercício das linhas que expressavam um
relacionamento feliz e outro conflituoso, podemos lembrar que, na sequencia
dele, foi levantada a possibilidade de desenharmos a linha com um traço
colorido – e que, dependendo do relacionamento, teríamos cores diferentes em
cada uma destas linhas.

Esta capacidade de a cor sugerir sentidos está relacionada aos fenômenos


da natureza – um dia ensolarado (com um céu azul) nos faz ter um comportamento
diferente de um dia chuvoso (com o céu “cinza”, nebuloso – se formos pensar
no azul e no cinza como possibilidade para representar a felicidade – certamente
a cor azul seria a mais provável. De outra maneira, estamos impregnados de
cores com peso simbólico – que arbitrariamente tem seus significados atrelados
a determinados contextos culturais: a cor vermelha significando “pare” nos
semáforos, é um exemplo disso! Assim, cada cor está carregada de sentidos, e eles
devem ser considerados quando analisamos ou desenvolvemos um objeto.

129
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

Muitas são as teorias da cor, não vamos tratar delas aqui! Vamos tratar da
cor como elemento visual, e dentro disso ela pode ser dividida em três dimensões:
A cor em si – matiz (ou croma); a pureza da cor – saturação; e a variação de
tonalidade da cor – o brilho (as gradações de luz e sombra atribuídas a ela).

Quanto à matiz, existem três matizes elementares (primários): vermelho,


azul e amarelo. Cada uma delas representa determinadas qualidades: ao
vermelho se atribui relações emocionais, ativas. Ao azul se atribui passividade
e suavidade. E ao amarelo calor, sendo a cor mais próxima da luz. Quando
associadas, organizam outros significados: “O vermelho, um matiz provocador, é
abrandado ao misturar-se com o azul, e intensificado ao misturar-se com amarelo.
As mesmas mudanças de efeito são obtidas com o amarelo, que se suaviza ao
se misturar com o azul” (DONDIS, 1997, p. 65). Estas misturas oportunizam o
surgimento de outras cores.

Ao combinarmos as cores primárias – vermelho, azul e amarelo, vamos ter as


cores secundárias – violeta (vermelho + azul), verde (azul + amarelo) e laranja (amarelo
+ vermelho). A partir destas combinações é possível montar o Círculo Cromático.

DICAS

Quando falamos de cores primárias e suas combinações – que vão resultar


em cores secundárias, a visão do Círculo Cromático surge. Muitos são os livros, sites e
vídeos que tratam deles. Clique no link para ter acesso a uma abordagem sobre o Círculo
Cromático: http://reformavisual.com/circulo-cromatico/.

Quanto à saturação, que é a pureza relativa da cor, pode-se entender que


ela se compõe das cores primárias e secundárias – elas são tão intensas que são
as preferidas pelas crianças. “Quanto mais intensa ou saturada for a coloração
de um objeto ou acontecimento visual, mais carregado estará de expressão e
emoção” (DONDIS, 1997, p. 66). Quanto ao brilho, estamos atribuindo à cor mais
luz ou menos luz – ou seja, variando a tonalidade dela.

Um televisor em cores é um excelente mecanismo para a demonstração


desse fato visual. Ao acionarmos o controle da cor até que a emissão
fique em branco e preto e tenhamos uma imagem monocromática,
estaremos gradualmente removendo a saturação cromática. O processo
não afeta em absoluto os valores tonais da imagem. Aumentar ou
diminuir a saturação vem demonstrar a constância do tom, provando
que a cor e o tom coexistem na percepção, sem se modificarem entre si
(DONDIS, 1997, p. 66).

130
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

A cor é um elemento visual emocional e representativo, deve ser


considerado em todos os projetos profissionais como elemento pode poderoso no
impacto do objeto no mercado que estará envolvido.

Todos os elementos aqui apresentados são os ingredientes de toda


composição visual. Quando bem dosadas oportunizam discursos palatáveis aos
que se aventuram consumir. Podem ser entendidos como os meios essenciais da
mensagem visual, saber que eles existem e entender como funcionam pode ser
um diferencial importante na carreira de profissionais da área das artes visuais,
da arquitetura, do design.

131
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

LEITURA COMPLEMENTAR

CATÁLOGO DE REFERÊNCIAS PARA A SÍNTESE VISUAL EM


PROJETO DE DESIGN DE MODA

Introdução

Considerando que o vestuário pode ser um meio de construir discursos


simbólicos, por intermédio de uma linguagem não verbal, fica evidente que
o estudo de ferramentas facilitadoras da composição visual no projeto de tais
artefatos é fundamental para a valorização do repertório metodológico de
designers de moda. Por isso, o presente estudo pretende desenvolver um material
gráfico com exemplos documentados do uso de ferramentas de síntese imagética
no design de moda, proporcionando um referencial didático de consulta para
estudantes, designers ou empresas de moda.

Metodologia

O principal método utilizado foi o levantamento teórico sobre a Sintaxe da


Linguagem Visual, abordando a composição de imagens e as ferramentas de síntese
imagética utilizadas na concepção de produtos de moda. Também foi utilizada uma
pesquisa de campo com profissionais atuantes em empresas de moda para constatar o
uso de imagens no processo criativo. A partir de tais análises, foram determinados os
parâmetros de conteúdo do catálogo de referências.

Sintaxe da linguagem visual

A linguagem visual é construída por um vocabulário de elementos


compositivos e suas relações, integrando pontos, linhas, planos, volumes,
formatos, tamanhos, cores, texturas, direção, posição, espaço, etc. Esses elementos
podem ser relacionados dentro de estruturas de organização, como repetição,
gradação ou radiação, compondo uma gramática de informações não verbais,
elaborada sobre os conceitos de polaridade das Técnicas Visuais: equilíbrio /
instabilidade; unidade / fragmentação; previsibilidade / espontaneidade etc.

Ferramentas de síntese imagética

Para Sanches (2012) a síntese imagética auxilia na sistematização do projeto


de design de moda e ao mesmo tempo é uma importante ferramenta metodológica
na interpretação, expressão e disseminação da dimensão estético-simbólica de
produtos, uma vez que, a percepção humana é amplamente dominada pela visão.
Assim, quando uma imagem é observada, o cérebro identifica seus componentes
(linhas, cores, texturas etc.) e processa uma série de relações para produzir um
significado (BAXTER, 1995).

132
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

No âmbito do design de moda, a comunicação por meio de referências


imagéticas, incluindo os desenhos de representação do produto, pode ser
utilizada de acordo com a fase de projeto na qual o designer se encontra, conforme
especificado no Quadro 1.

QUADRO 1 – FASES DE PROJETOS E FERRAMENTAS IMAGÉTICAS CORRESPONDENTES.


FONTE: PRÓPRIA (2013, BASEADO EM HATADANI, 2011)

Painel de Estilo de Vida: Coletânea de imagens que representam


Síntese do
valores sociais e pessoais do público alvo a ser atingido. “[...]
Universo do
procura retratar também outros tipos de produtos usados pelo
Consumidor
Especificação consumidor e que devem se compor ao produto a ser projetado”
do Projeto (BAXTER, p. 190, 1995).
Pesquisa de Painel de Tendências: Coletânea de imagens de tendências
Conteúdo de de moda (microtendências) que auxiliam nas formas, cores e
Moda modelagem. Baseia-se no estudo de macrotendência, no qual é
analisado o comportamento do consumidor.
Moodboard: Contém as impressões subjetivas, materializadas
em uma coletânea de imagens, que o item a ser criado deve
obter. Representa a emoção principal que o produto transmitirá
ao primeiro olhar (BAXTER,1995).
Definição de Painel Semântico: Imagem, ou composição sintética de imagens,
Delimitação Princípios que exprimem a linguagem estético-formal que os produtos
Conceitual Funcionais e de deverão obter. “Para isso, os elementos visuais que o compõe
Estilo devem ser analisados, selecionados e inter-relacionados [...]”
(SANCHES, p. 4, 2007). Auxiliam na escolha de cores, formas,
texturas etc.
Painel de Tema Visual: Coletânea de imagens de produtos que
possuem as mesmas impressões subjetivas que o produto a ser
criado deverá ter.
Esboços e Croquis: “[...] caracteriza-se como um desenho ágil,
Geração de
realizado à mão, apenas com papel e lápis. Por meio dele, o designer
Geração de alternativas
consegue reproduzir todos os seus pensamentos, sem barreiras
Alternativas de solução de
de restrição, assim como num brainstorming” (HATADANI;
problema
MENEZES, p. 72, 2011). Serve tanto para uma comunicação pessoal
quanto para membros de uma equipe de projeto.
Plano de Coleção: Reunião dos croquis selecionados e
representados por “desenhos de estilo”, e não mais esboços,
Escolha das
em uma única prancha. Serve para a verificação da unidade da
alternativas
coleção e para comunicar sua intenção a terceiros, apresentando
suas ideias às pessoas com poder de decisão sobre a fabricação
dos produtos.

Avaliação e Desenhos Técnicos: “[...] linguagem gráfica utilizada na


Elaboração indústria, que tem como principal objetivo orientar a fabricação
de um produto. Nele, a representação de formas, dimensões e
detalhamentos ocorre por meio de linhas, números, símbolos
Detalhamento
e especificações escritas e organizadas de forma precisa”
e Configuração
(HATADANI; MENEZES, p. 76, 2011). Além de auxiliar na
comunicação entre designer e produção, também ajuda o próprio
designer na escolha de aviamentos, tipos de acabamentos e
costuras justamente por ser uma representação gráfica que
requer o máximo de detalhamento do produto.

133
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

Pesquisa de campo

Após a entrevista parcialmente estruturada com 4 designers atuantes


no mercado, concluiu-se que cada um possui um processo criativo específico e
que muitas vezes estes são dependentes do local onde trabalham. Mesmo assim,
todos utilizam e consideram a pesquisa com imagens essencial, mesmo que não
construam painéis ou utilizem sempre uma mesma ferramenta em específico.

Catálogo virtual de referências

Após a pesquisa bibliográfica, percebeu-se que, para a utilização plena de


ferramentas de síntese imagética, é muito importante um conhecimento prévio
sobre a construção da sintaxe da linguagem visual. Neste sentido, Sanches (2012),
descreve o percurso do raciocínio de composição visual da seguinte forma:

FIGURA 1 – PERCURSO DO RACIOCÍNIO DE COMPOSIÇÃO VISUAL

FONTE: Sanches (2012)

Baseado nesse raciocínio, fez-se necessária a adição de informações


sobre a sintaxe visual e suas aplicações na moda, com a intenção de embasar
teoricamente o usuário do catálogo virtual para que o mesmo possa fazer uso das
ferramentas de síntese imagética sem maiores dificuldades.

134
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

O catálogo foi organizado de forma simples em formato de CD com os


seguintes tópicos principais: Introdução, Elementos e Princípios da Comunicação
Visual, Técnicas Visuais, Série Fibonacci e Ferramentas de Síntese Imagética.

FIGURA 2 – EXEMPLO DO CONTEÚDO DO CATÁLOGO

FONTE: A autora (2013)

No exemplo ilustrado pela Figura 2, observa-se o uso do contraste de


gravidade (no caso, leve/pesado) na moda por meio da mistura de materiais: o
couro, material de aspecto pesado e rígido, em contraste ao que parece ser um
tecido leve e maleável, como o chiffon.

135
UNIDADE 2 — PERCEPÇÃO VISUAL

FIGURA 3 – EXEMPLO DO CONTEÚDO DO CATÁLOGO

FONTE: A autora (2013)

Já no exemplo ilustrado pela Figura 3 observa-se na moda o uso da


anomalia em estruturas por meio da abrupta diferença entre os lados direito e
esquerdo do produto. A quebra da regularidade estrutural da estampa (listras)
assim como a quebra da regularidade da modelagem, servem para causar
um certo impacto ao consumidor no momento em que o produto foge de um
modelo óbvio.

Considerações finais

Embora o resultado do projeto seja pautado na investigação de aplicações


práticas da linguagem visual, a pesquisa bibliográfica mostrou-se fundamental
para a elaboração do produto final. Sem ela, seria impossível delimitar diretrizes
para o conteúdo do catálogo, para que este se tornasse realmente útil.

Assim, após a pesquisa bibliográfica, ocorreu a síntese dos principais


conteúdos da Sintaxe da Linguagem Visual que deveriam estar presentes no CD,
auxiliando o entendimento da leitura de imagens. Cada conteúdo foi ilustrado
com exemplos de aplicação dos princípios de composição visual em diferentes
áreas, além da moda.

136
TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS, TÉCNICAS E ELEMENTOS BÁSICOS DA COMPOSIÇÃO

Já a pesquisa de campo, serviu para confirmar a importância da pesquisa


imagética no processo de criação dos designers, mesmo que estes não destaquem
nenhuma ferramenta em específico.

Por fim, o resultado do projeto se mostrou satisfatório, uma vez que os


objetivos foram atendidos e a importância das ferramentas de síntese imagética
foi confirmada.

FONTE: PRADO, M. M.; SANCHES, M. C. de F. Catálogo de referências para a síntese visual em


projeto de design de moda. 2014. Disponível em: http://www.coloquiomoda.com.br/anais/
Coloquio%20de%20Moda%20-%202014/POSTER/POSTER-EIXO1-DESIGN/PO-EIXO-1-Catalogo-
de-referencias-para-a-sintese-visual-em-projeto-de-design-de-moda.pdf. Acesso em: 13 out. 2020.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

137
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Existem mais princípios que a Lei da Gestalt apresenta, e eles são a harmonia; o
contraste e o equilíbrio.

• Nem sempre os princípios podem ser a estratégia a ser utilizada, podendo


haver técnicas visuais que se opõem.

• Muitas outras técnicas visuais podem ser exploradas, descobertas e empregadas


na composição, sempre no âmbito da polaridade, algumas são: equilíbrio e
instabilidade; regularidade e irregularidade; simplicidade e complexidade;
unidade e fragmentação; economia e profusão; minimização e exagero;
previsibilidade e espontaneidade; atividade e estase; sutileza e ousadia;
neutralidade e ênfase; transparência e opacidade; estabilidade e variação;
exatidão e distorção; planura e profundidade; singularidade e justaposição;
sequencialidade e acaso; agudeza e difusão; e repetição e episodicidade.

• A análise de um objeto pode identificar muitas das técnicas e dos princípios em


sua estrutura.

• Um profissional pode usar dos mais variados princípios e de inúmeras técnicas


para compor a estrutura do seu objeto.

• Ponto, linha, forma, direção, movimento, escala, dimensão, textura, tom e cor
compõem o Alfabeto Visual.

• Existem três formas básicas: o quadrado, o triângulo e o círculo.

• Toda e qualquer forma surge da combinação das formas básicas.

• Imagens estáticas podem estar em movimento, basta que se trabalhe


posicionamento e composição de seus elementos.

• Textura e tonalidade podem contribuir para a representação tridimensional em


imagens bidimensionais.

• Conseguimos expressar informações através de desenhos em preto e branco,


mas quando inserimos cor, exaltamos sentidos emocionais.

138
AUTOATIVIDADE

1 Voltamos a vitrine tratada nesta unidade (https://www.fashionismo.com.


br/2010/08/o-poder-de-uma-vitrine/). Ela tem em sua composição muitas
das técnicas estudadas até aqui. A alternativa que pode preencher os
espaços correspondentes é:

Primeira Técnica:

Segunda Técnica:

Terceira Técnica:

a) ( ) Primeira técnica: distorção; segunda técnica: planura; terceira técnica:


acaso.
b) ( ) Primeira técnica: distorção; segunda técnica: repetição; terceira técnica:
acaso.
c) ( ) Primeira técnica: exatidão; segunda técnica: assimetria; terceira técnica:
espontaneidade.
d) ( ) Primeira técnica: exatidão; segunda técnica: simetria; terceira técnica:
previsibilidade.
e) ( ) Primeira técnica: economia; segunda técnica: planura; terceira técnica:
ousadia.

2 Voltamos à mesma vitrine do exercício anterior. Por se tratar de uma imagem


visual ela tem os elementos ponto, linha, forma, direção, movimento,
escala, dimensão, textura, tom como seu alfabeto visual. Leia atentamente
as sentenças a seguir e assinale a alternativa CORRETA:

139
FONTE: <https://www.fashionismo.com.br/2010/08/o-poder-de-uma-vitrine/>.
Acesso em: 27 ago. 2020.

a) ( ) A imagem não permite assumir que o elemento dimensão existe, pois


não há nem perspectiva e nem textura que reforce isso.
b) ( ) O contraste do elemento que representa o cabelo da modelo pode ser
entendido como ponto visual – pois concentra e atrai a atenção da cena.
c) ( ) As linhas verticais não sugerem direcionamento, pois estão paralelas
uma as outras.
d) ( ) Existe variação tonal na imagem é fraca e insuficiente para diferenciar
os elementos que compõem a imagem.
e) ( ) Os objetos que compõem a imagem não variam em escala.

3 “A importância e o significado do contraste começa no nível básico da visão


pela presença ou ausência da luz. É a força que torna visível as estratégias
da composição visual. É de todas as técnicas a mais importante para o
controle visual de uma mensagem bi ou tridimensional. É também um
processo de articulação visual em uma força vital para a criação de um
todo coerente” (GOMES FILHO, 2008, p. 62). A partir da leitura desse texto
avalie as asserções a seguir e a relação proposta entre elas:

I- O contraste ganha valor à medida que ele potencializa as oposições,


como comentamos inicialmente, o traço escuro sobre um fundo branco
potencializa a visualização de um desenho. Entendendo isso é preciso
sutileza para trabalhar com ele, ainda mais quando optar pelo contraste é
estratégia é expressar, transmitir uma ideia.

PORQUE

II- É pelo contraste que aguçamos muitos dos significados, como poderíamos
identificar uma placa de trânsito se ela não contrastasse com o fundo dela?
Como entenderíamos a felicidade sem ter experenciado a tristeza?

140
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não complementa
a I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II complementa
corretamente da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.

4 Quando vamos fazer uma fotografia (tirar uma foto), somos levados, mesmo
que intuitivamente, a organizar o que queremos fotografar. Enquadramos
o que deverá compor nossa foto, e capturamos a cena em nossa câmera
fotográfica. Ao analisarmos a foto feita, nosso olhar percorre a imagem,
fazendo valer dos princípios da percepção visual – um deles é o eixo de
simetria. A partir da afirmação feita, explique o que é o eixo de simetria.

5 Assim como o alfabeto e a gramática ficam à disposição do escritor, os


elementos visuais ficam à disposição do artista visual e do designer,
que, dado o seu repertório gramatical visual (caso do entendimento dos
princípios e das técnicas visuais), garantirá composições que sejam lidas,
compreendidas e convençam a aquisição de seus valores por parte de seus
consumidores. Os elementos visuais formam a base do que vemos, como
letras de um alfabeto: ponto, linha, forma, direção, movimento, escala,
dimensão, textura, tom e cor mesclam-se, construindo elementos que,
sozinhos ou em conjunto, formam as composições visuais. Um pequeno
número que é matéria prima de toda e qualquer informação visual. A partir
da leitura desse texto conceitue o elemento: Linha. Dissertando como ela
surge e qual o poder dela como elemento visual.

141
142
REFERÊNCIAS

ARNHEIM, R. Arte e percepção visual: uma psicologia da visão criadora. São


Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005.

COSTA, F. S. M. et al. Uma luz para os cegos: uma reflexão sobre os


conceitos de “ver” e “enxergar” à luz da literatura. Campina Grande:
UEPB, 2015. Disponível em: https://scholar.googleusercontent.com/
scholar?q=cache:FMdzZBXQsTgJ:scholar.google.com/+ver+e+enxergar&hl=pt-
BR&as_sdt=0,5. Acesso em: 15 ago. 2020.

CRARY, J. Suspensions of perception – attention, spectacle, and modern


culture. Massachusetts: MIT Press, 1999.

DONDIS, D. A. Sintaxe da linguagem visual. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

GOMES FILHO, J. Gestalt do objeto: sistema de leitura visual. São Paulo:


Escrituras Editora, 2008.

MUNARI, B. Design e comunicação visual: contribuição para uma metodologia


didática. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

STERNBERG, R. J. Psicologia cognitiva. São Paulo: CENGAGE Learning, 2010.

143
144
UNIDADE 3 —

SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender a maneira como a percepção visual se relaciona com o estilo


dos produtos;

• entender, de forma prática, a semiótica como ferramenta de análise


crítica;

• conhecer princípios de análise semiótica com base na semiologia;

• escolher quais princípios de análise podem ser usados em sua atuação


profissional.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – A PERCEPÇÃO VISUAL E OS PRINCÍPIOS DE ESTILO

TÓPICO 2 – ANÁLISE DICOTÔMICA

TÓPICO 3 – ANÁLISE TRICOTÔMICA

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

145
146
TÓPICO 1 —
UNIDADE 3

A PERCEPÇÃO VISUAL E OS PRINCÍPIOS DE ESTILO

1 INTRODUÇÃO
As habilidades e as competências desenvolvidas em profissionais de
criação – caso dos designers, arquitetos, artistas, entre outros – é alavanca para
a identificação de estilos individuais, que quando bem trabalhados permitem
criações com forte impacto inovador. Alcançar o estilo em projeto é garantir uma
qualidade provocante, principalmente no ato de chamar a atenção, de atrair a
atenção de outras pessoas. De certo modo, esse seria um dos requisitos mais
procurados pelos empregadores e pelo cliente no mercado atual.

A capacidade de dar estilo às ideias deve ser estimulada para que seja
possível expressar algo atrativo, que, para determinado perfil de pessoas, seja
belo. Essa capacidade de dar estilo agrega valor aos produtos, mesmo que em
muitos casos a mudança seja apenas superficial – caso do produto de moda, que
a cada nova estação não muda suas estruturas construtivas (modelagem, corte,
acabamento), mas declara mudanças em sua composição visual (cartela de cor, de
aviamentos, entre outros).

Desenvolver habilidades e competências que promovam o estilo é muito


importante. Para isso, entender a semiótica e a percepção visual se faz coerente,
e, ainda mais, conhecer os princípios de estilo. Neste tópico, voltaremos ao
que já foi estudado nas unidades anteriores, mas com um foco mais prático,
dando ênfase aos princípios de estilo, propondo uma abordagem voltada
ao desenvolvimento de projeto que se direcionam aos objetivos específicos:
sensibilizar e instrumentalizar o discente para o uso, intencional, de elementos
da linguagem visual; e potencializar a capacidade analítica e crítica do discente
com base em fundamentos que suportem seus posicionamentos profissionais.

147
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

2 PRINCÍPIOS E HABILIDADES DE ESTILO


A noção de que quando expressamos uma ideia, ou entramos em contato
com alguma expressão, nossos cinco sentidos são estimulados é ponto inicial para
que possamos falar do estilo como princípio regulador do fazer em projeto. De
fato, cada vez mais somos estimulados e podemos estimular todos os sentidos –
caso de uma loja, que além do visual, de fragrância própria, tem música ambiente,
permite que os produtos sejam tocados e em alguns casos nos dão experiências
degustativas de seu conceito. Em uma experiência dessa, quando bem realizada,
o cliente é impactado positivamente. Todavia, deve-se considerar que grande
parte das experiências se fazem no campo do sentido visual. A percepção visual
é o estímulo maior nas experiências de consumo, e muito da atratividade de um
produto depende do estilo visual dele.

Como já estudamos, a visão humana se dá pelo olho. A luz emitida por


um objeto entra nesse órgão sensorial e atinge as células na retina, gerando um
impulso elétrico. A tudo que se vê, é fruto da interpretação que o cérebro dá conta
de processos que ocorrem no sistema nervoso, que é capaz de dividir os diversos
componentes dos impulsos (imagem) que lhe chegam – caso de pontos, linhas,
cores, direções, entre outros. Todos esses componentes transmitidos ao cérebro
produzem significados e podem ou não ser memorizados pelo indivíduo.

A engenhosidade cerebral é interessante. Basicamente, ela processa de


algumas maneiras, trataremos de três, como faz Mike Baxter (2011), em sua obra
Projeto de produto: guia prático para o design de novos produtos: os dois estágios do
processamento visual; a primeira percepção global; e a hipótese visual.

3 OS DOIS ESTÁGIOS DO PROCESSAMENTO VISUAL


Quando uma imagem nos chega à visão damos contas de abordá-la de
duas formas, em dois estágios. No primeiro estágio, a visão varre a imagem, como
um grande “scanner” ela busca padrões e formas. Se faz de forma involuntária.

NOTA

Perceba que essa involuntariedade tem relação direta com a primeiridade na


semiótica peirciana? Vasculhe uma imagem desta forma, olhe para toda a composição de
forma bem geral, não dirija o olhar nem a atenção – deixe os movimentos do olho vagarem
involuntariamente – nesse “scanneamento” tudo que for identificado (padrões, formas) e
dão conta de representar alguma coisa, pode ser entendido como a primeiridade de Peirce.

148
TÓPICO 1 — A PERCEPÇÃO VISUAL E OS PRINCÍPIOS DE ESTILO

O segundo estágio inicia quando passamos a dar foco intencional aos


detalhes da imagem. Quando algumas partes da composição nos chama a atenção.

FIGURA 1 – PROCESSAMENTO VISUAL

FONTE: Adaptado de Baxter (2011, p. 49)

Esta figura ilustra estes dois estágios. Uma primeira varrida do olhar
destaca se existe algo diferente na composição no canto superior direito dela. Para
perceber isso o esforço foi mínimo e não foi preciso investir intencionalmente
atenção – eis aqui o primeiro estágio. Todavia, se vagarmos com intencionalidade
a composição, nos esforçando, é possível identificar uma forma retangular com
seis letras X em negrito de altura e oito letras X em negrito de largura.

NOTA

Perceba que a intencionalidade – o esforço que empreendemos em analisar


uma imagem ou composição – já nos impõe uma tarefa de legitimar o que é diferente, o que
se destaca. Quando isso ocorre, pode ser atribuída a ideia de secundidade do signo peirceano.
Ao tentarmos particularidades, abandonamos a primeiridade de um vasculhar involuntário.

149
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

4 A PRIMEIRA PERCEPÇÃO GLOBAL


Todo o processo que ocorre no primeiro estágio pode ser entendido
como primeira percepção global, ela se dá nos momentos que antecedem a
atenção voluntária global (segundo estágio); e ela é global pois, como tratamos,
ela “scannea” toda a imagem, ela se dá no olhar do todo e não para detalhes,
por mais que esse olhar do todo já mostre padrões e formas que se destacam,
orientando ao segundo estágio – onde acontecerá o olhar focalizado. De certa
forma, a qualidade dessa “scanneada”, a paciência é primeiro olhar o todo, sem
assumir nenhum foco, dará suporte qualitativo quando o momento de focar
surgir. Como vimos na figura anterior, a “scanneada” na imagem permitiu
visualizar uma área de interesse (o retângulo de X em negrito); e de imediato a
atenção parece parar aí! E não nos permitimos voltar a “scannear” novamente
a composição como um todo. Perceba se você notou um outro X em negrito?
Ele está no canto inferior esquerdo. Sim! Ele é menor (único), mas se destaca na
composição. Perceba que após o visualizarmos, nossa atenção começa a assumir o
foco nesta outra parte da composição – dando mais qualidade à análise da imagem
como um todo. Se pararmos nos primeiros elementos que se destacam, podemos
perder a identificação de outros elementos, não mais nem menos importantes,
mas potentes em garantir um olhar inovador, criativo, diferente e com estilo.

Outro exemplo clássico nas teorias e percepção visual, inclusive na
Gestalt, é o caso das imagens ambíguas, dado primeiro estágio do olhar podemos
visualizar uma determinada forma, um determinado discurso visual; e corremos
o risco de não visualizamos outra forma, outro discurso – que faria a imagem ser,
de fato, ambígua. Veja a imagem a seguir:

FIGURA 2 – IMAGEM AMBÍGUA

FONTE: <http://twixar.me/Vjgm>. Acesso em: 19 out. 2020.

150
TÓPICO 1 — A PERCEPÇÃO VISUAL E OS PRINCÍPIOS DE ESTILO

Este é um caso de imagem ambígua, mostrando a cabeça e os ombros


de uma jovem, com a face voltada para o fundo da figura. Mostra
também a face de uma idosa, em perfil. É impossível perceber
simultaneamente as duas imagens, devido à primeira percepção
global. Se a mente se fixar em uma das duas imagens, uma percepção
global será produzida. Você, então, pode examinar os detalhes: na
jovem, a linha pronunciada do queixo, a elegância da gargantilha, o
lenço volumoso sobre a cabeça e o luxuoso casaco. Na senhora idosa,
o nariz aquilino, a protuberância do queixo, os lábios finos e os olhos
profundos. Geralmente, a imagem que você perceber primeiro vai
determinar a estratégia para a exploração posterior dos detalhes.
Para enxergar outra imagem, você precisará piscar, desviar os olhos
ou tirar a figura temporariamente do campo de visão. É como se
fosse necessário apagar a primeira imagem. Depois de percebida essa
segunda imagem, ela determinará também a exploração posterior
dos seus detalhes, de modo que não é possível perceber uma das
imagens e explorar os detalhes da outra (BAXTER, 2011, p. 50-51).

Interessante perceber quanto uma imagem, um objeto, que nos chega


pela percepção visual, tem poder em atrair nossa atenção. Faz de maneira geral
incialmente e depois nos prende em seus detalhes. Eis aqui um princípio do design
para Mike Baxter (2011, p. 50): “chamar a atenção e depois prender a atenção”.

No projeto de uma vitrine em um shopping, por exemplo, ela precisa atrair


a atenção dos transeuntes. Inicialmente, eles não saberão do que se trata, mas os
olhos vão “scannear”, varrer (primeiro estágio) e organizar elementos e formas que
se destacam (segundo estágio), levando-os a darem foco a esses elementos e essas
formas. Nesse momento, a vitrine prendeu a atenção deles – e atualmente isso já
pode ser considerado um sucesso no projeto, tendo em vista a quantidade vitrines,
de informações que o transeunte está recebendo naquele momento. Veja, que se o
primeiro estágio não funcionar, nada adiantará o segundo.

5 A HIPÓTESE VISUAL
Todo esse processo de perceber visualmente uma imagem, entendendo
os dois estágios e a ambiguidade das imagens, precisa ser percebido como
insuficiente, afinal de contas, muitas imagens não declaram visualmente, não
explicitam em sua composição o que podem querer discursar. Essa incompletude
imagética, da mesma forma que a completude, nos faz definir hipóteses visuais
mentais que projetamos sobre a imagem visualizada, ou seja, somos levados a ver
com o cérebro – já tratamos disso na Unidade 2. Padrões visuais nos fazem ver
formas que não existem na imagem, mas na nossa mente, por mais que as formas
estejam incompletas na imagem, em nossa cabeça elas se completam, dando conta
de declarar coisas que não estão explícitas na imagem. Vamos trazer uma imagem
que já utilizamos anteriormente para ilustrar a hipótese visual:

151
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

FIGURA 3 – HIPÓTESE VISUAL

FONTE: <https://www.yescert.com.br/voce-conhece-o-inmetro/>. Acesso em: 17 ago. 2020).

Ao olharmos para as duas composições visuais desta figura, nossa


mente organizará hipóteses visuais sobre as formas, que dada a proximidade
e fechamento nos induzem a vermos imagens que não estão materializadas na
imagem. A esquerda vemos um triângulo enquanto na direta vemos uma imagem
ambígua que dá conta de formar as duas letras da marca INMETRO.

Essas descobertas sobre o nosso processo visual contrariam algumas


noções intuitivas. Intuitivamente, acreditamos que os nossos olhos
são janelas para o mundo. Mas não é bem assim. Nós enxergamos
aquilo que pensamos ver. Nós olhamos para uma imagem e, sem
perceber, extraímos suas principais características. A partir dessas
características, a nossa mente trabalha na sua identificação com algum
padrão conhecido. Segue-se uma visão mais focalizada, guiada por
essa visão inicial, para se examinar detalhes (BAXTER, 2011, p. 52).

Se entendermos que muito do que pensamos está atrelado ao nosso


repertório cultural, podemos entender que vemos o mundo com certa
arbitrariedade – ou seja, visualizamos no mundo muitas coisas que o nosso
contexto cultural, social, econômico e ideológico nos dita como coerentes (e até
mesmo corretos).

NOTA

Essa arbitrariedade entendida como basilar das hipóteses visuais poder ajudar a
entender a terceiridade do signo peirceano. Se ao vasculhar a imagem de forma involuntária,
sem nenhum esforço relacionamos com a primeiridade; e quando já assumimos uma
postura voluntária de identificar padrões e formas dando atenção voluntária a eles
assumimos como secundidade; será terceiridade quando, de certo modo, passamos a ver,
a partir de padrões arbitrariados pela cultura ideológica (por exemplo) imagens que não
estão declaradas, da mesma quando conseguimos nominar o que estamos vendo – caso
da imagem ambígua mulher jovem ou mulher idosa – precisamos arbitrariamente saber o
que define uma mulher, juventude e velhice.

152
TÓPICO 1 — A PERCEPÇÃO VISUAL E OS PRINCÍPIOS DE ESTILO

A percepção global é responsável, em grande parte, pela percepção


do estilo, da mesma forma que sua noção contribui, como habilidade, para
o desenvolvimento de um objeto estiloso. Quando um objeto é percebido
globalmente, quando ocorre o “scanneamento” ocorre a atração – atrair é sem
dúvida uma das principais estratégias de todo e qualquer material que está
em oferta. Após a tração, imediatamente ocorre a fase de pré-atenção, como
afirma Baxter (2011), onde se realizam alguns julgamentos ainda sem maiores
deliberações e exames detalhados.

Tente lembrar de um objeto, e perceba que a primeira imagem que vem


é a visão global dele. Conseguimos, inclusive, ter a visão do seu estilo. Aí está
a confirmação da importância da percepção global, e quanto o estilo de um
produto depende desta primeira abordagem. Até mesmo no processo criativo,
quando estamos certos do conceito a ser trabalhado, e iniciamos a fase de geração
de alternativas, os primeiros esboços dão conta, em sua maioria, da forma global
do produto. Nossa habilidade de representação nos leva a desenhar formas e
composições que tenham o poder representativo do global, e ao se confirmando
essa forma geral, os detalhes começam a ganhar atenção.

Como bom escritor, precisamos dar conta de respeitar algumas regras
básicas da escrita visual. Falamos muito disso na unidade anterior, mas é preciso
trazer aqui um recorte do que foi lá tratado. Como dito, todo o aparato sensorial
humano, atribui enorme valor à visão. Sim! Precisamos estimular os outros sentidos
e nos dar o deleite de sentir e até de oferecer experiências sensoriais que envolvam
estes outros – caso de marcas, que além do desenho da marca e sua aplicabilidade
na fachada da loja e nos uniformes, tem um cheiro, uma música e permite que seus
produtos sejam tocados – todas essas experiências ajudam a dar força ao conceito
da marca e garantir a memorização do estilo da marca. Todavia, neste pequeno
exemplo, a percepção visual parece ser a porta de entrada dessa experiência.

A Teoria da Gestalt sugere que a visão tem uma predisposição de
reconhecimento por meio de padrões. Ao lançarmos o primeiro olhar a uma
cena, a um objeto, nosso sistema perceptivo, em especial, o cérebro, ao “scannear”
identifica alguns desses padrões e os ajusta, internamente, em uma imagem
mental que seja capaz de conferir significados. Esse processo não é nato, ele
vem se construindo a partir dos estímulos visuais que recebemos durante nosso
crescimento – fique à vontade para pensar em quantos estímulos recebermos, e,
quanto mais estímulos, mais potente o processo!

Já estudamos os princípios que regem a Gestalt e a percepção visual,


todavia, focaremos em alguns deles, como os padrões tratados aqui. O padrão
mais observado nessa primeira abordagem do olhar é a simetria. O ser humano
é hábil em criar eixos de simetria em tudo o que vê, parece uma “vontade de
equilíbrio”, somos levados a comparar as partes de uma cena, de um objeto,
para ver se o mesmo se mostra equilibrado – assim, comparamos a parte direita
com a esquerda – criando imaginariamente uma linha que o divide, quase que
metricamente. Comparamos também a parte de cima com a parte de baixo, e
assim por diante.

153
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

FIGURA 4 – EIXOS DE SIMETRIA

FONTE: O autor

Somada a essa “vontade de equilíbrio”, que nos permite analisar


simetricamente as coisas, outros dois padrões se somam: proximidade e
continuidade. No primeiro, agrupamos formas próximas, dando a elas uma visão
de conjunto. Enquanto no segundo, somos levados a dar continuidade à trajetória
de uma linha, de um conjunto de coisas, que dirigem nosso olhar, prolongando
sua sequencialidade.

FIGURA 5 – PROXIMIDADE E CONTINUIDADE

FONTE: Adaptado de <https://caelum-online-public.s3.amazonaws.com/1631-gestalt/


Transcri%C3%A7%C3%A3o/Imagens/1_2_1_cachorro.jpg>. Acesso em: 7 out. 2020.

Com base nesses três padrões, uma característica que fica acentuada na
percepção humana é a habilidade de separar o que se julga ser mais importante
– ou seja, dar ênfase, destaque ao que consideramos ser mais importante no
momento em que olhamos a imagem. Essa característica é responsável por
conseguirmos distinguir, em uma cena, a “figura” e o “fundo”. Quando olhamos
uma fotografia nossa em uma viagem, perceba que somos levados a nos colocar
como “figura” e toda a cena enquadrada do lugar que estávamos como “fundo”.
Isso fica tão evidente, que chamamos a foto de: “minha foto” – por mais que seja
uma composição plana – em um papel, em uma tela de celular, evidenciamos o

154
TÓPICO 1 — A PERCEPÇÃO VISUAL E OS PRINCÍPIOS DE ESTILO

que nos atrai. Imagine que essa foto tenha ao fundo um edifício de um grande
arquiteto. Se sua foto estiver em suas redes sociais e, por acaso, ser acessada por
um estudante de arquitetura que não conhece você, mas conhece o edifício, para
ele a “figura” será o edifício, e o você fará parte do “fundo”, inclusive essa pessoa
poderá usar essa foto para ilustrar seu trabalho, chamando a foto pelo nome
do edifício ou do arquiteto. Isso explicaria quando dirigimos a cena, antes de
fotografá-la, pois, uma vez colocado o que queremos como “figura” (e isso pode
ocorrer centralizando esses elementos no centro geométrico do enquadramento
ou ofuscando os outros elementos), delegamos ao restante dos elementos o
“fundo” da composição. Permitir esse jogo entre “figura” e “fundo” pode ser
uma estratégia interessante para atrair a atenção de um número maior de pessoas.

Um exemplo para isso pode ser visto na imagem ambígua (Figura 2),
utilizada anteriormente, nossa visão fica pulando entre “figura” e “fundo”,
dando figuração à jovem em um momento e à idosa em outro. Esta capacidade
da imagem de ser “figura” ou” fundo” está diretamente relacionada aos padrões
simetria, proximidade e continuidade, somando a estes as noções de tamanho
relativo – proporção, contorno e orientação. “Quanto mais a imagem for simétrica,
relativamente pequena, contornada e orientada no sentido horizontal ou vertical,
será mais facilmente identificada com figura” (BAXTER, 2011, p. 57).

FIGURA 6 – FIGURA OU FUNDO

FONTE: O autor

Perceba que ao ganhar proximidade, simetria e contorno a imagem da


direita permite que possamos ora ver duas faces de perfil, ora ver uma taça. Essa
ambiguidade ilustra o que estamos tratando aqui de “figura” ou “fundo”.

Fica evidente a importância da Gestalt no estilo dos produtos. A


capacidade de valorizarmos o todo, a visão global, efetivando a integração
de todos os componentes evidencia a funcionalidade das relações das partes
em decorrência do todo, porém, além de considerar a percepção visual, as
composições formais dos objetos, como eles são formatados – sua materialidade,
é preciso considerar que muito desta percepção – como já comentamos da
unidade anterior – está impregnada da maneira como pensamos – lembre-se
das diferenças dentre o “ver” e o “enxergar”.

155
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

Fatores socioculturais, econômicos, históricos, influenciam diretamente em


como percebemos e valoramos as coisas. Há pouco vimos que uma foto sua em
uma viagem pode ser vista de outra maneira por outra pessoa. É isso! Nosso olhar é
dirigido por como “pensamos” o mundo – e a maneira que pensamos é resultado de
toda uma vida de aprendizado que empreendemos durante nossa vida.

Se olharmos três fotografias de épocas diferentes (uma de hoje, uma de


três anos e outra de seis anos atrás), e por mais que escolhíamos o que vestir,
veremos pelas roupas das fotos como somos influenciados pelas tendências de
moda e comportamento. A cada ano, mudanças sutis reorganizam o nosso estilo.
Entender esse mecanismo, e programar habilmente nossos projetos para que
sejam capazes de, em suas composições, apresentarem o que é desejoso pelos
clientes é estratégia importante para promover um impacto positivo no comércio.

Todavia, além do fenômeno das tendências de moda, o efeito cultural sobre


a percepção visual é mais longo e influencia valores e crenças pessoais. Se por um
lado as tendências de moda contribuem para que tenhamos gostos parecidos, os
influenciados pela cultura nos permitem ter gostos individuais, então, é possível
uma pessoa ser atraída por um objeto e outra não. “Certas influências culturais
no estilo de produtos podem ter um ciclo de longa duração chegando a ser
centenárias” (BAXTER, 2011, p. 74), mas é interessante perceber que por mais que
tenhamos essas influências: das tendências de moda e da cultura; o estilo visual
de um produto, em grande parte, será demandado pelo seu cliente, podendo ter
três níveis de determinação:

1. NÍVEL BÁSICO – pelo momento que o produto é acessado pelo nosso sistema
visual. O momento que chamamos anteriormente de “scanneamento”, em que
ao determinar nossa percepção visual, direcionará elementos onde o foco do
olhar se concentrará.
2. NÍVEL INTERMEDIÁRIO – a partir do momento em que o foco do olhar
acontece, atributos específicos do processo visual são declarados. Passamos a
dar atenção aos elementos específicos, que pode ser uma marca, um acabamento
ou um detalhe estrutural.
3. NÍVEL MAIS ELEVADO – ao focarmos aos detalhes, depois de uma investida
visual no todo, os fatores sociais, culturais e comerciais determinam o estilo
do objeto que estamos percebendo. Nesse momento, muito do que nos chegou
cultural, social e economicamente ajudará a perceber valores no objeto,
permitindo entender seu valor e iniciar o momento da aquisição.

O estilo de um produto deve ser considerado um momento do projeto que


ocorre em conjunto com outras áreas e em todas as fases de desenvolvimento.
Não pode e nem deve ser considerado apenas na fase final – pois em grande
parte, o estilo é condicionado e condicionador dos elementos estruturantes, dos
materiais, da composição do objeto desde seu início. Como salienta Baxter (2011,
p. 77): “As decisões sobre o estilo precisam ser tomadas em todas as fases, desde
o planejamento do produto até a engenharia de produção”.

156
TÓPICO 1 — A PERCEPÇÃO VISUAL E OS PRINCÍPIOS DE ESTILO

É importante perceber que a percepção visual e a capacidade de analisar


e criticar projetos de design, a partir da noção de percepção visual, com base
na semiótica (objetivo desta disciplina), potencializa a habilidade de pensar os
projetos de forma mais atrativas, inclusive através do estilo do produto. De fato,
a atração é requisito básico de todo objeto que objetiva alcançar seu mercado, e,
para isso, é preciso considerar que:

• um objeto pode chamar atenção de várias formas, inclusive por ser visualmente
agradável. Perceba quantas vezes você desvia o olhar do que está fazendo
para ver uma pessoa bem vestida; um jardim bem decorado. Certamente isso
acontece quando em meio a vários produtos, um lhe chama atenção.
• ao chamar a atenção um objeto passa a ser desejável. Perceba que a maioria dos
produtos que passamos a desejar ganham destaque em nossa atenção.
• se pensarmos nestes dois momentos – o produto que chama a atenção e, ao
mesmo tempo, é desejável, tem forte poder de atração – ou seja, é atraente.
Portanto, quando somos capazes, como projetistas, de desenvolver/projetar
produtos que chamem a atenção pelo seu estilo, e que esse estilo está em linha
com os comportamentos de voga no mercado, estamos entregando ao mercado
produtos atraentes – com forte poder de consumo.

Basicamente, o que nos atrai está relacionado com quatro coisas (BAXTER,
2011): o que já é conhecido; o que parece funcionar bem; o que parece ajudar a
dizer quem sou; e o que é bonito. Perceba que, quando na composição de um
produto a ser percebido visualmente, escolhemos uma ou mais dessas coisas,
e estamos assumindo a habilidade de compor objetos com base nos princípios
da percepção visual (Unidade 2), compreendendo que o objeto que estamos
desenvolvendo tenha a capacidade de significar produtos que o cliente já conheça;
ou representar seu funcionamento; ou dar conta de simbolizar status, definindo a
pessoa que o usará; ou ser significante dentro dos valores de beleza considerados
pelo mercado consumidor, ou seja, precisamos ter a competência, também, em
semiótica (Unidade 1).

157
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Existem dois estágios para o processamento visual; a primeira percepção


global; e a hipótese visual.

• Que a capacidade da imagem de ser “figura” ou “fundo” está diretamente


relacionada aos padrões simetria, proximidade e continuidade, somando a
estes as noções de tamanho relativo – proporção, contorno e orientação.

• Que fatores socioculturais, econômicos, históricos, influenciam diretamente


em como percebemos e valoramos as coisas.

• O estilo visual de um produto, em grande parte, será demandado pelo seu


cliente, podendo ter três níveis de determinação: nível básico (“scanneamento”
visual); nível intermediário (foco nos atributos específicos do processo visual);
e nível mais elevado (percepção dos valores do objeto com base na cultura,
sociedade e economia permite assumir o seu entendimento).

• O estilo de um produto deve ser considerado um momento do projeto que


ocorre em conjunto com outras áreas e em todas as fases de desenvolvimento.

158
AUTOATIVIDADE

1 Quando olhamos uma vitrine, durante um passeio no shopping,


rapidamente conseguimos ter alguns posicionamentos frente a ela.
Sabemos, por exemplo, se somos ou não o público-alvo; os produtos
que a loja vende e até mesmo conseguimos ter noção de quanto custaria
uma compra naquela loja. Vamos tomar a vitrine já utilizada em nossa
disciplina, da rede De Fursac.

FONTE: <https://i2.wp.com/farm6.static.flickr.com/5301/5660386039_bde9ceb848.
jpg?zoom=2>. Acesso em: 12 out. 2020.

Sobre o processo visual aplicado nessa situação, pode-se afirmar que:

I- Ocorrem dois estágios no processo visual, a percepção global e a hipótese


visual.
II- As condições culturais, sociais e econômicas que formam o repertório do
expectador não influenciam nada na percepção visual.
III- A percepção visual, no primeiro estágio, a visão varre a imagem, como um
grande “scanner” ela busca padrões e formas. Faz-se de forma involuntária.
IV- A hipótese visual, no segundo estágio, tem o seu início quando passamos
a dar foco intencional aos detalhes da imagem.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Somente a afirmativa I está correta.
b) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.
c) ( ) Somente a afirmativa III está correta.
d) ( ) As afirmativas I, III e IV estão corretas.

159
2 A imagem que ilustra essa questão “é um caso de imagem ambígua,
mostrando a cabeça e os ombros de uma jovem, com a face voltada para o
fundo da figura. Mostra também a face de uma idosa, em perfil. É impossível
perceber simultaneamente as duas imagens, devido à primeira percepção
global. Se a mente se fixar em uma das duas imagens, uma percepção global
será produzida. Você, então, pode examinar os detalhes: na jovem, a linha
pronunciada do queixo, a elegância da gargantilha, o lenço volumoso
sobre a cabeça e o luxuoso casaco. Na senhora idosa, o nariz aquilino, a
protuberância do queixo, os lábios finos e os olhos profundos. Geralmente,
a imagem que você perceber primeiro vai determinar a estratégia para a
exploração posterior dos detalhes. Para enxergar outra imagem, você
precisará piscar, desviar os olhos ou tirar a figura temporariamente do campo
de visão. É como se fosse necessário apagar a primeira imagem. Depois
de percebida essa segunda imagem, ela determinará também a exploração
posterior dos seus detalhes, de modo que não é possível perceber uma das
imagens e explorar os detalhes da outra” (BAXTER, 2011, p. 50-51).

A imagem é chamada “My Wife and My Mother-in-Law” (“Minha Esposa e Minha


Sogra”, em tradução livre) é uma ilusão de ótica muito conhecida, criada pelo
cartunista britânico William Ely Hill, em 1915.

FONTE: <http://twixar.me/Vjgm>. Acesso em: 19 out. 2020.

A partir da leitura desse texto avalie as asserções a seguir e a relação proposta


entre elas:

I- A primeira impressão de uma imagem é resultado da percepção dela como


um todo.

PORQUE

II- As teorias de percepção visual, inclusive na Gestalt, entendem que no


primeiro estágio do olhar podemos visualizar uma determinada forma, um
determinado discurso visual; correndo o risco de não visualizamos outra
forma, outro discurso – que faria a imagem ser, de fato, ambígua.

160
A respeito dessas asserções, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa
correta da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma
justificativa correta da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

3 O estilo visual de um produto pode ter três níveis de determinação. Sobre


estes níveis, analise as sentenças a seguir:

I- O nível básico é responsável pelo momento que o produto é acessado


pelo nosso sistema visual. O momento que chamamos anteriormente
de “scanneamento”, em que ao determinar nossa percepção visual,
direcionará elementos onde o foco do olhar se concentrará.
II- No nível intermediário se dá o foco do olhar, onde atributos específicos
do processo visual são declarados. Passamos a dar atenção aos elementos
específicos – que pode ser uma marca, um acabamento, um detalhe estrutural.
III- No nível mais elevado, focando nos detalhes, percebemos que os fatores
sociais, culturais e comerciais determinam o estilo do objeto que estamos
percebendo. Nesse momento, muito do que nos chegou culturalmente,
socialmente e economicamente ajudará a perceber valores no objeto,
permitindo entender seu valor e iniciar o momento da aquisição.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Somente a afirmativa I está correta.
b) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.
c) ( ) Somente a afirmativa III está correta.
d) ( ) As afirmativas I, III e IV estão corretas.

4 As “descobertas sobre o nosso processo visual contrariam algumas noções


intuitivas. Intuitivamente, acreditamos que os nossos olhos são janelas para
o mundo. Mas não é bem assim. Nós enxergamos aquilo que pensamos ver.
Nós olhamos para uma imagem e, sem perceber, extraímos suas principais
características. A partir dessas características, a nossa mente trabalha na
sua identificação com algum padrão conhecido. Segue-se uma visão
mais focalizada, guiada por essa visão inicial, para se examinar detalhes”
(BAXTER, 2011, p. 52).
Qual é o papel do contexto cultural, social e econômico na percepção visual
de uma pessoa?

5 A percepção visual e a capacidade de analisar e criticar projetos de design,


a partir da noção de percepção visual com base na semiótica, potencializa
a habilidade de pensar os projetos de forma mais atrativa, inclusive através
do estilo do produto. De fato, a atração é requisito básico de todo objeto
que pretende alcançar o seu mercado. Cite dois requisitos de atração de um
objeto, explicando-os.

161
162
TÓPICO 2 —
UNIDADE 3

ANÁLISE DICOTÔMICA

1 INTRODUÇÃO
Iniciamos o segundo tópico desta unidade. Entramos no momento da
disciplina mais prático. Analisaremos imagens com base na semiologia, mais
especificamente na abordagem dicotômica dos objetos em seus planos de
expressão e conteúdo, e poder, de certa forma, criticar e desenvolver objetos
que sejam capazes de ser percebidos visualmente em linha com os discursos que
pretendem passar.

É muito importante perceber o valor de se conhecer e saber usar um


referencial que dê suporte nas leituras que nos propomos fazer em nossos
campos de trabalho. No design, a capacidade de ler imagens é fundamental para
que se possa potencializar o desenvolvimento de objetos pertinentes, que devam
funcionar esteticamente (tocar os sentidos do consumidor), utilitariamente e
simbolicamente – dando conta de representar os valores das marcas que as
promovem em seus mercados.

O entendimento que um objeto funciona de forma estética, de forma


utilitária e de forma simbólica, é importante aqui, pois muito do que é expresso
em um objeto está relacionado ao discurso que ele quer passar (os tais valores
mencionados no parágrafo anterior), com a maneira como deve ser manuseado
(de que forma ele diz onde liga, onde pega, onde aperta, onde abre), e ainda se é
belo (se tem o estilo atraente que tratamos no tópico anterior).

2 ANÁLISE DICOTÔMICA: A LEITURA COM BASE NA


SEMIOLOGIA OU SEMIÓTICA SAUSSUREANA
Para não escorregarmos num erro comum, ainda mais como estudantes,
daremos como encerrada essa diferença de nomenclaturas. A primeira unidade
desta disciplina apresentou as duas principais correntes em seus idealizadores:
semiologia com Saussure, e semiótica com Peirce. A noção de que estas duas cabem
numa mesma nomenclatura ocorreu historicamente na Europa, à medida que
outros filósofos, ocupando-se com pressupostos saussurianos, deram conta da
generalidade do signo, tal qual os norte-americanos. Aprumados numa mesma
linha de pensamento, os europeus assumiram o nome Semiótica, com base no
linguista Algirdas Julius Greimas (1919-1992), no momento que pretendia dar
conta do fenômeno de produção de sentido para todo e qualquer objeto que
representasse algo em seu lugar. Afastando-o da base semiológica de Saussure.

163
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

[...] para os iniciados, esta polêmica entre os termos Semiologia e


Semiótica passou a ser um episódio histórico a partir de 1969, quando
Roman Jakobson – e a Associação Internacional de Semiótica aceitou
– a adoção do termo comum Semiótica para designar todo o campo
de estudo abarcado tanto pela semiologia quanto pela Semiótica
(OLIVEIRA, 2004, p. 17).

Na visão greimasiana, a semiótica é uma ciência geral dos sistemas sígnicos


que possibilita o estudo do conjunto dos processos de produção de sentidos.
Ela pode ser compreendida como um conjunto de maneiras que permitem o
conhecimento de qualquer grandeza que se manifesta aos nossos sentidos. Para
Greimas, de acordo com Oliveira (2004), a semiótica estuda o discurso com base
na ideia de que uma estrutura narrativa se manifesta em qualquer tipo de texto,
não necessariamente verbal.

A análise que se sustentada na semiótica greimasiana, cuja base está


nos posicionamentos estruturalistas de Saussure está apoiada na capacidade de
percebemos globalmente e criarmos hipóteses, como tratado no início desta unidade.

3 PLANOS DE EXPRESSÃO E CONTEÚDO


O ponto de partida do modelo semiótico desenvolvido por A. J.
Greimas e colaboradores, com foi tratado na primeira unidade, está na noção
de que significante e significado precisaram de ajustes consideráveis, passando
a ser chamadas de “plano de expressão” (significante) e “plano de conteúdo”
(significado), permitindo que dicotomicamente o signo pode ser toda e qualquer
coisa que represente algo em seu lugar, além da palavra.

3.1 PLANO DE EXPRESSÃO


Ao entrarmos em uma imagem, para analisá-la, precisamos nos dar conta
de “vasculhar” o todo, de entender o momento da percepção global (BAXTER,
2011), nos permitindo perceber o plano de expressão, tudo o que compõe a
imagem e é perceptível ao olhar. Neste momento, somos capazes de compreender
a macroestrutura da imagem visual (OLIVEIRA, 2004), que pode ser chamada de
estrutura básica. As primeiras indagações surgem na busca de clareza sobre essa
estrutura, ela é geométrica? Linear? Inclinada? De que maneira essa estrutura se
declara visualmente ao sustentar a composição visual que estamos analisando?
As certezas sobre isso influenciarão diretamente nas decodificações do significado
que aos poucos vão surgindo.

164
TÓPICO 2 — ANÁLISE DICOTÔMICA

Com a estrutura básica definida, com a visão total da estrutura realizada,


inicia-se a fase de identificação dos elementos constitutivos – pontos, linhas,
cores, volumes, dimensões, entre outras (OLIVEIRA, 2004). Um novo jogo de
indagações deve ser realizado, quais os princípios que regem a organização
destes elementos constitutivos (aqueles tratados em nossa Unidade 2)? Que
outros elementos compõem a imagem, mas que não dão conta de assumirem o
posicionamento de constitutivos? É o caso do suporte, da moldura e do espaço
onde está situada a imagem em análise. Não existem repostas erradas, erro seria
não fazer as indagações.

Compreendida a estrutura básica e identificados os elementos


constitutivos é possível estabelecer relações. Assim “identificados os elementos
constitutivos, buscam-se as articulações entre esses elementos, momentânea
e mentalmente desfeitas, quando da investigação do rol de elementos que
constituem a imagem” (OLIVEIRA, 2004, p. 24). Neste momento, têm-se os
procedimentos relacionais, que podem ocorrer entre elementos, entre estes e
blocos de elementos, entre blocos entre si. Um mesmo elemento pode ter um
tipo de relação com outro, e uma outra forma relacional com outro.

Para clarear um pouco esta composição intricada que é a imagem,


poderemos fazer analogias, que são bastante simplistas, mas têm
funcionado. Uma das comparações propõe pensar na imagem como
um texto verbal, onde os elementos constitutivos seriam as palavras,
e os procedimentos relacionais corresponderiam a sintaxe, ou seja, ao
modo de organizar as palavras entre si. Mas é preciso cuidado, pois
existem distinções para além do aspecto visual de ambos os textos.
Uma dela é que nem a escrita nem a leitura da imagem são lineares;
a outra é que cada elemento não “concorda” com apenas um outro
elemento [...] (OLIVEIRA, 2004, p. 25).

A análise tratada neste momento sugere um desmonte da imagem. Um


processo complexo que na busca de efeitos de sentido sugere significações. Todo
esse processo ocorre no ir e vir, no desconstruir e construir os elementos da
imagem, oportunizando uma cadeia de significações com base em regras que se
mostram em linha com os princípios formais trabalhados na Unidade 2. Uma vez
vasculhada a estrutura da imagem e identificada seus elementos constitutivos,
cabe o questionamento: como estão organizados os elementos na imagem?

Qualquer que seja a intenção do projetista da imagem, a expressão do


conteúdo estará na imagem, explicitada em seu texto visual. Cabe ao leitor,
entrar em contato com este texto estético, ler e o interpretar – passando pelo
momento de percepção global e alcançado a hipótese visual (BAXTER, 2011).
Concretizando a autonomia da imagem, ou seja, que por mais que o autor
expresse um determinado conteúdo, este só será interpretado e entendido
se o objeto (a imagem) permitir isso – ela é autônoma e não pode contar com
seu criado ao lado para explicar! “A imagem passa a falar por si mesma,
independentemente do que seu autor queria dizer” (OLIVEIRA, 2004, p. 26).

165
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

O leitor passa a ter domínio sobre o objeto (imagem) que está lendo.
Ele deve transitar incansavelmente pela imagem, indo e vindo pelos elementos
e pelos blocos de elementos e para o todo da imagem, encontrando detalhes,
nesse ir e vir, que não se declaram nos primeiros olhares. É esse vagar
intencional pela imagem que faz com ela, em sua autonomia, tenha condições
de expressar seu conteúdo; e ainda faz com que o leitor seja capaz de interpretar
outros conteúdos, bastando para isso, que a imagem, em seus elementos e seus
procedimentos relacionais, permita!

Todo esse envolvimento de “varredura” e de “foco”, de desconstrução


e construção, de ir e vir pela imagem, permite que o leitor alcance os possíveis
significados, alcançando então, o plano de conteúdo.

3.2 PLANO DE CONTEÚDO


Os elementos constitutivos não adquirem sentido isolados, precisam das
relações, seja com outros elementos, com blocos, ou até mesmo com os espaços,
com a situação onde estão e como estão posicionados. Entender a importância
destas relações é vital para que se alcance o plano de conteúdo, capacitando o
leitor na interpretação do objeto analisado.

4 ANÁLISE DICOTÔMICA: PLANO DE EXPRESSÃO E PLANO


DE CONTEÚDO
A análise semiótica de um objeto percebido visualmente é complexa e
requer um referencial mínimo para sua realização. A expectativa aqui é que tudo
o que já foi tratado em nossa disciplina seja capaz de suportar como parâmetro
deste momento, que se faz de maneira mais prática. Além disso, a postura do
observador frente ao objeto a ser analisado é vital ao processo, é preciso abordar
o objeto diferentemente do habitual.

A noção de que se está no momento do “scanneamento”, faz com que o
processo de percepção do todo seja intencional, visando acessar o sistema (objeto
em análise) visual como um todo – o que Baxter (2011) afirma que a percepção global
leva à hipótese visual; entender que algumas partes do sistema atrairão o olhar,
e só por isso já se organizam como elementos constitutivo, ora potencializando
o foco e atenção em um único elemento, ora para blocos de elementos; assumir
o compromisso de voltar ao todo do objeto em observação, realizando relações a
partir do que está declarado e com base, claro, em seu repertório social, cultural,
histórico e econômico. E, por fim, ter a noção de que o que se faz expresso no
objeto sugere conteúdos que estão em nossa bagagem cultural; mas que outras
relações podem nos instigar a novas descobertas, a uma oxigenação ou aumento
de nosso repertório.

166
TÓPICO 2 — ANÁLISE DICOTÔMICA

O processo de significação precisa considerar a totalidade do objeto,


e toda análise deve ser orientada por um processo de significação que estará
sobreposto ao encadeamento de signos que se materializam, ou ganham sentidos,
entre o plano de expressão e o plano de conteúdo (GREIMAS; CORTÉS, 2011).

Vamos a um exemplo de leitura, realizada por Sandra Ramalho e Oliveira


na obra “Imagem também se lê”, da Editora Rosari (2004). Será de uma obra de
arte, o que de certa forma ajudará no entendimento da abordagem e na maneira
como se descreve cada momento.

FIGURA 7 – ANÁLISE DICOTÔMICA DE ENTERRO NA REDE – CANDIDO PORTINARI (1944)

FONTE: <https://i0.wp.com/virusdaarte.net/wp-content/uploads/2014/10/enterro-na-rede-port..jpg>.
Acessado em: 9 out. 2020.

A obra “Enterro na Rede”, integra a “Série Retirantes” do artista brasileiro


Candido Portinari (1903-1962), com influências expressionistas trata da situação
social do povo brasileiro. Essa pequena apresentação é apenas uma forma de
respeitar a obra e situá-la histórica e contextualmente. No que se pede em análises
semióticas, é que o autor e toda sua vontade sejam esquecidas, a obra tem que
falar por si só! Portinari não está aqui nos explicando sua obra, e sua obra que
deve falar por ela. Então, vamos seguir a maestria de Sandra Ramalho Oliveira no
passo a passo de sua análise semiótica.

O que se vê? Primeiro, o todo da obra, rapidamente damos conta de


observar o todo. E aí alguns elementos atraem a atenção, são os elementos
constitutivos. Quase que juntos, começamos a fazer relações, primeiro pelo
olhar – perceba que ele vai vagando de um elemento constitutivo a outro, de
um elemento constitutivo a um bloco de elementos, e vice-versa. Como esses
processos ocorrem simultaneamente e de forma muito rápida, é necessário, pelo
menos para fim didático, utilizarmos ferramentas de análise, em uma delas são
os esquemas visuais que vão apresentar as figuras que compõem a estrutura da
imagem. “Nesse esquema são destacados um a um os planos de profundidade
propostos, diferenciação que é feita através do uso e linhas e cores específicas
para contornar e destacar a estrutura de cada um deles” (OLIVEIRA, 2004, p. 35).

167
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

DICAS

Acesse o link que está como fonte da figura, ou pesquise na internet pelo
nome da obra para poder ver a imagem colorida.

No “scanneamento” da imagem, a planta dos pés da mulher ajoelhada


evidencia-se, pois além da forma, está em primeiro plano na obra. E com isso
observamos o todo desta composição formada pelos dois pés. As linhas formadas
pelas pernas da mulher ajoelhada direcionam o olhar para os pés e fazem o “convite”
para o olhar retornar para a obra – ir para o centro dela. Como salienta Oliveira
(2004, p. 35): “A posição dos pés indica a forma que está destacada em toda a
imagem: o ângulo”. Como elemento constitutivo, o bloco de elementos constitutivos
(se considerarmos os dois pés) direcionam a rotina de toda a imagem que se faz de
forma angular, e explicitam formas triangulares por toda a composição.

Os contornos das partes internas e externas dos pés não são paralelos
e por estarem eles postos, qual mãos postas em oração, compõem a
diagonalidade da obra e formam dois ângulos que se sobrepõem e
remetem o olhar ao centro da tela onde se situa, o culto atrás desta
mulher, a personagem principal da cena, o morto. Também no centro
da tela, o ângulo formado pelos pés da mulher central, é rebatido
por um grande ângulo – na verdade, um triângulo – que se origina
do lençol ou rede, situado no terceiro plano de profundidade
(OLIVEIRA, 2004, p. 35).

Tendo os pés da mulher no primeiro plano de profundidade, a rede ou


lençol no terceiro plano, o corpo da mulher no segundo plano de profundidade,
a composição mantém a rotina angular, a saia dela é formada por uma variedade
de traços angulares da mesma forma sua blusa. Os braços abertos dão conta de
um grande triângulo que rebate no segundo plano de profundidade a forma
que a rede ou lençol formam no terceiro plano. Até nos dedos da mulher as
linhas e formas angulares, em proporções menores repetem o esquema – como
que por redundância evidencia a rotina angular da cena. Os cabelos formados
por traços, mesmo mais sinuosos, remetem à forma triangular. Da mesma
forma que alguns elementos da textura do tecido que cobrem os braços da
mulher, evidenciam linhas e formas angulares. Composta por vários elementos
constitutivos a mulher se faz um bloco, e como bloco se relaciona com toda a
obra: “O ângulo formado pelos braços desta mulher remete o olhar para seu
vértice, no tronco do corpo dela mesma, o qual oculta o centro da rede, lugar
onde está o morto” (OLIVEIRA, 2004, p. 35-36).

Os procedimentos de figurativização (GREIMAS; CORTÉS, 2011) são


revelados durante o processo de geração de sentido, colocando o autor da obra
como um criador de estratégias no processo interpretativo, por meio do plano de

168
TÓPICO 2 — ANÁLISE DICOTÔMICA

expressão e plano de conteúdo. O “scanneamento” da imagem como um todo, nos


fez perceber alguns elementos constitutivos, caso da planta dos pés no primeiro
plano de profundidade; caso do corpo da mulher no segundo plano; e a composição
formada pela rede ou lençol e os carregadores no terceiro plano de profundidade.
E, ainda, em termos relacionais foi percebido elementos constitutivos que nos fazem
ir e vir em cada um desses planos – caso das pernas da mulher que nos fazem
sair dos pés e ir para o corpo dela, ou voltar do corpo para os pés. Caso da forma
triangular dos braços da mulher que se rebate com a forma triangular da rede ou
lençol, indicando uma ponte entre o plano segundo e terceiro.

Estacionados em um dos planos, nosso foco, nossa atenção direciona


o vagar do olhar para a identificação dos elementos constitutivos e blocos de
elementos permitindo os procedimentos relacionais. Em nossa análise, seguindo
a abordagem de Sandra Ramalho e Oliveira (2004), entramos pelos pés (primeiro
plano de profundidade); tratamos do corpo da mulher (segundo plano de
profundidade); e agora vamos para o terceiro plano de profundidade. Este plano
é composto pela rede ou lençol e seus carregadores – duas figuras masculinas.

O pano da rede apresenta, acima da cabeça da mulher, um suposto


quadrado em tom mais claro, que tendo uma parte encoberta, deixa
aparente, no seu contorno, um ângulo que é rebatido nas diversas
formas angulares do fundo, na parte superior da tela. A rede forma
um triângulo isósceles cujo maior lado é o superior, horizontal e quase
paralelo ao pau no qual está amarrada, bem como à linha que delimita
o chão. Um ponta de pano, à esquerda, sai do vértice em direção ao
centro inferior da rede; as linhas das dobras do ângulo da direita
tomam a mesma direção, indicando o local onde está depositado o
defunto (OLIVEIRA, 2004, p. 36).

Os elementos constitutivos que dão conta de rede ou lençol se


mostram importantes, pois ao rebaterem com os braços da mulher fazem acesso
entre os dois planos. Todavia, além deste bloco de elementos constitutivos, o
terceiro plano de profundidade é formado por duas figuras masculinas – dois
carregadores. As formas angulares os compõem e nos dão a ideia de marcha,
de movimento. Movimento esse como passos pelo ângulo formado por cada
perna ao dar passadas; mas também pelos triângulos formados pelas pernas que
apontam no sentido inverso ao da rede ou lençol, promovendo um movimento
plástico – vetorial, a que o olhar se submente. Fica evidente na composição que os
três triângulos (das pernas e da rede ou lençol), se encaixam.

Outras formas angulares aparecem na composição – no braço do


carregador que está à frente no carregar (à direita da tela); e em proporções
menores formas angulares dão conta de sua mão; e de sua face – com destaque
ao seu nariz. O outro carregador é composto de forma angular também – pés,
volumes da sua vestimenta, mãos e cabeça. Interessante registrar que as formas
angulares que sugerem pontas, direcionam o olhar como vetores para uma
direção oposta ao trajeto que suas pernas e própria composição parece ir. É o
olhar sendo direcionando para ir e voltar na imagem.

169
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

A obra não é composta apenas por linhas e formas angulares, ela


apresenta linhas sinuosas (como as que já forma descritas: cabelo da mulher).
Elas estão evidenciadas no braço direito do homem da esquerda; em algumas
dobras das vestes da mulher e até nas linhas que compõem os dedos dos pés –
veja aqui, que a linha orgânica mais evidente é do braço do homem da esquerda
(terceiro plano de profundidade), que nos leva para a sinuosidade dos cabelos
e de algumas linhas da veste da mulher (segundo plano de profundidade),
chegando aos dedos dos pés (primeiro plano de profundidade) – um novo
caminho para vagar entre esses planos.

Como falamos durante nossa disciplina, alguns elementos da imagem


vão ganhando destaque à medida que nos permitimos vagar pela imagem, ou à
medida que a imagem nos direciona o olhar – por isso, destacamos os elementos
que nos fazem entrar e sair de cada plano. Este ir e vir nos fazem perceber
elementos que antes não víamos – estavam lá! Todavia passam desapercebidos
nos primeiros olhares. E não só elementos surgem, pode saltar blocos de
elementos e até mesmo outros planos – que é o que ocorre nessa imagem: um
quarto plano de profundidade surge. Nele nos deparamos com uma figura
feminina, composta por linhas sinuosas – curvas (interessante perceber que seus
elementos se destacam quando nos damos conta que a obra não é somente angular
e vem num lugar da obra que faz o olhar percorrer o todo da tela – lembre-se de
que em linhas sinuosas – saímos dos braços do homem da esquerda, fomos para
o centro nos cabelos e vestes da mulher; chegamos aos pés, mas a parte da direita
da tela, com as formas sinuosas das vestes desta figura faz com que cheguemos
ali – ou seja, nosso olhar foi da esquerda à direita da imagem – percorrendo toda
ela mais uma vez!).

As linhas curvas que compõem essa figura do quarto plano de


profundidade, estão no contorno do braço visível, na cabeça e nas suas pernas
ajoelhadas. Existem linhas retas e angulares nessa figura, mas elas estão
posicionadas na parte interna, dando conta das linhas interiores dos braços, do
pescoço e queixo. Em suas mãos aparecem triângulos, explicitando rigidez e
tensão de seus músculos.

Essas linhas sinuosas percorrem horizontalmente compondo o solo, na


metade da parte inferior da imagem, nos trazendo o quinto plano de profundidade.
Que forma quadrangular total da tela – o fundo do quadro. O ritmo sinuoso do
chão é quebrado na parte inferior por blocos angulares – elementos ríspidos e
dificuldades de pedregulhos por onde passa o cortejo fúnebre. Já a parte superior
dessa linha horizonte sinuosa a composição visual é formada por linhas e formas
angulares, em algumas dessas formas as pinceladas deixaram elementos pontuais
“gerando uma textura grosseira” (OLIVEIRA, 2004, p. 37).

Sugerimos como dica, acessar o link que aparece como fonte da Figura
7 para visualizava em cores, mas as gradações de cinza da impressão aqui
disponibilizada sugerem um olhar total. Na obra como um todo destaca-se

170
TÓPICO 2 — ANÁLISE DICOTÔMICA

os tons de cinza e os contornos fortes em preto, os tons mais escuros de cinza


sugere as trevas, o sentido mais negativo, a melancolia, também evidentes nas
tensões das formas lineares e angulares que ambienta quase que a totalidade da
obra. “Este preto, especialmente nos músculos expostos e nas obras das roupas,
funciona também para dar profundidade, pois é sombra, e para compor texturas”
(OLIVEIRA, 2004, p. 37). Interessante perceber que os contornos pretos ou mais
escuros não estão no quarto e quinto plano de profundidade, como que os
sugerindo como planos de fundo, e destacando os três primeiros planos onde o
conteúdo parece estar evidenciado.

Até na obra colorida, os tons de cinza tomam conta da composição,


como que estratégico no plano de comunicação da obra e de seu artista. Ao não
estar presente para explicar, perceba que ele atribuiu ao seu objeto, elementos,
formas, cores e os compôs de maneira que declarassem, ou sugerissem o que
e como deveriam ser lidos e entendidos. “O cinzento predominante dá a ideia
de cinza, o que resta depois de um incêndio, ou de cadáver, o que restou da
vida”, nos descreve Sandra Ramalho Oliveira (2004, p. 37), da mesma forma que
dias cinzentos são mais melancólicos, e o clima triste e melancolia de um cortejo
fúnebre pode ser assim cromatizado.

Pontos, linhas e planos formam a estrutura angular e dão conta dos


elementos constitutivos das obras, direcionam plasticamente gestualidades,
que ganham ainda mais expressão nas pinceladas, onde contornos grosseiros
evidenciam a tensão das linhas retas imprimindo figuras que mais parecem ser
talhadas em madeira (OLIVEIRA, 2004). E quando surgem as linhas curvas, que
também ganham expressividade em suas pinceladas ela “parecem” deformar as
figuras – deformação que remete, normalmente, ao sofrimento.

A obra toda apresenta uma simetria, ela não é absoluta, mas é possível
situar a mulher ajoelhada no centro simétrico da imagem total, o que sugere
quebrar a simetria é a segunda mulher – lá do quarto plano de profundidade.
Todavia, a sugestão simétrica tem seus rebatimentos por pesos – evidente na
parte inferior com a parte superior – onde o pau que carrega o defunto se faz
linha da simetria horizontal.

As formas lineares e angulares sugerem à obra o que sugerem como


elementos isolados – linhas direcionam o olhar e ângulos, como figura incompleta
que é expressa imperfeição, algo que precisa ser acabado, que precisa ser completo
pela ausência de outra parte. O ângulo vetoriza, mostra e direciona um suposto
caminho que não está traçado, mas é para onde se deve ir. “Adotando-se esse modo
de olhar, observa-se a inter-relação entre expressão, no nível de manifestação, e
significação, no nível do conteúdo” (OLIVEIRA, 2004, p. 38 – grifo da autora), e
que assim complementa:

171
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

Os pés da mulher central, vincados por linhas diversas, assim como


a superdimensão dos demais membros e músculos evidentes aludem
à atividade braçal, no cultivo da terra. Pés descalços reforçam esta
ideia e presentificam uma noção de nobreza. A forma dos pés,
grandes, retangulares, com toda a base em contato com o solo, parece
colar o ser humano àquele chão, àquela realidade. É uma versão da
expressão verbal: “com os pés no chão”, que pode ser entendido
como o estado de quem deixou os sonhos de lado.

Atentos a linha de simetria vertical, que parte do meio dos dois pés,
divide a cabeça e o triângulo formado pelos braços e o triângulo formado pela
rede ou lençol subindo até a borda superior da tela, percebemos que essa linha
estabelece o eixo da composição principal da composição plástica. Inclusive
registra metricamente, nos dando a exatidão, de constatar que o triângulo
formado pelos braços da mulher e o inferior do triângulo – a rede e o lençol,
coincidem se sobrepõem. “Esta coincidência, reiterada pelo fato de estar a
rede prenhe do morto, podem indicar que esta mulher é a mãe do defunto.
Ou teria sido ele quem fertilizou seu ventre?” (OLIVEIRA, 2004, p. 38 – grifo da
autora). As possibilidades de efeito de sentido que uma composição pode causar
é grande e permite variações, tantas quantas o repertório e a curiosidade do
analista (leitor) permitirem.

Traçada essa linha imaginária, da simetria vertical, outros elementos


constitutivos podem aparecer no plano de expressão e se tornarem relevantes
ao plano de conteúdo. Fica declarada a mão esquerda do homem que está à
direita no pau onde está presa a rede ou lençol, posicionada sobre a cabeça da
mulher que vela e sofre pelo morto. A forma dessa mão se faz ambígua nos
remetendo à mão posta que benze e ao mesmo tempo faz figurar-se em uma
caveira (OLIVEIRA, 2004), símbolo de morte.

Outra ambiguidade aparece na ausência ou impossibilidade de vermos
a face da mulher que abre os braços. Não sabemos se ela está revoltada ou pede
por clemência, o que é possível afirmar é que ela não está passiva com o cortejo.
E deve estar sedenta por justiça – sede entregue pela forma da rede ou lençol
que sugere uma boca aberta, provocando o efeito de sentido de querer receber
algo para saciar a fome, a sede.

Em meio às ambiguidades e possibilidades interpretativas, o autor


deve entender que haverá um processo de interpretação (realizado pelo leitor/
analista da obra); e que ao considerar esse processo deve (ou não) intervir –
tomando posição na manipulação que se caracteriza em levar o leitor/analista a
executar o seu programa narrativo (GREIMAS; CORTÉS, 2011).

172
TÓPICO 2 — ANÁLISE DICOTÔMICA

A quantidade de linhas e ângulos é atravessada por uma linha grossa – a


vara, o pau que segura, suporta o corpo, e segurar, suportada pelos homens que
a atravessa por todo o quadro horizontalmente. “A vara, como figurativização de
laça, atravessa o quadro; ela é paralela à linha da terra, da realidade, da morte;
ambas as linhas, horizontais, dão estabilidade à composição, contrastando com
a diagonalidade dos ângulos” (OLIVEIRA, 2004, p. 39 – grifo da autora).

A imposição linear e angular que a rede ou lençol adquire e expressa no


desenho, sugere um corpo pesado e esguio, “um defunto minguado, amontoado
no fundo da rede” (OLIVEIRA, 2004, p. 39 – grifo da autora). Como vetor angular
ela ponta para baixo, como sendo cova, ou para onde será levado seu conteúdo.

A quantidade de ângulos e seus direcionamentos vetoriais entrecruzam
sentidos e sentimentos, sugerindo o ir e vir de um olhar que precisa se dar conta
das injustiças terrenas (sofrimento) e divinas (a morte). “Tanto os ângulos com
abertura para o céu quando aqueles com abertura a terra podem dar a ideia
de cunha, ferindo pelo vértice, agressão, violação, ou, pelo lado oposto, pela
abertura do ângulo, a ideia de abertura do mesmo, de vulnerabilidade, de
rendição, fragilidade, aceitação do estupro inevitável” (OLIVEIRA, 2004, p. 39
– grifo da autora).

De forma geral, a tela ilustra uma cena onde dois homens carregam sobre
seus ombros uma vara que tem uma rede amarrada nela e em seu conteúdo algo
pesado. Mostra duas mulheres, uma em primeiro plano que parece lamentar e
clamar; e outra que reza, que lamenta em silêncio. O plano de expressão é marcado
pela linearidade e formas angulares, tendo quebras com elementos sinuosos. Por
mais que tenha cores e marcado pela tonalidade cinza. Ao plano de conteúdo o
que está expresso já permite direcionar o olhar para um determinado discurso,
que quando nos vem o título da obra: Enterro na Rede; permite que os elementos,
cores e composição ganhem ainda mais efeito de sentido em seus procedimentos
relacionais. Percebe-se aqui, o valor do título de uma obra, porém muitas podem
estar sem o título, aí, caro leitor, é com você nominar a obra, e sua postura frente
a mesma garantirá êxito nessa tarefa.

Neste encontro/troca entre expressão e conteúdo pode ser observada a


dimensão epistemológica da obra pois, além de desvendar as relações,
precisa também articular as áreas de conhecimento que o estudo de
cada obra específica leva-o a se defrontar. Vale dizer, embora esse
texto pictórico traga todo um conjunto de significados em si, passível
de leitura em qualquer contexto sociocultural, a apreciação cresce em
densidade se se dispuser a conhecer um pouco mais sobre o tema, o
que, neste caso, é favorecido pelo texto verbal que, sendo o título da
obra, com o texto pictórico interage (OLIVEIRA, 2004, p. 39-40).

173
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

NOTA

Ao considerar a “dimensão epistemológica”, o conteúdo deste tópico acredita


que a definição de epistemologia esteja entendida. Para facilitar apresentamos duas
definições que podem ajudar: se trata de um substantivo feminino ligado à filosofia. A
primeira definição o relaciona com a “reflexão geral em torno da natureza, etapas e limites
do conhecimento humano, especificamente nas relações que se estabelecem entre o
sujeito indagativo e o objeto inerte, as duas polaridades tradicionais do processo cognitivo;
teoria do conhecimento. E a segunda entende o termo como sendo a “frequência do
estudo dos postulados, conclusões e métodos dos diferentes ramos do saber científico, ou
das teorias e práticas em geral, avaliadas em sua validade cognitiva, ou descritas em suas
trajetórias evolutivas, seus paradigmas estruturais ou suas relações com a sociedade e a
história; teoria da ciência”.

FONTE: <http://twixar.me/Dpgm>. Acesso em: 9 out. 2020.

174
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Atualmente é possível adotar do termo comum semiótica para designar todo o


campo de estudo abarcado tanto pela semiologia quanto pela semiótica.

• Ao analisarmos o plano de expressão somos capazes de compreender a


macroestrutura da imagem visual, que pode ser chamada de estrutura básica.

• Com a estrutura básica definida, com a visão total da estrutura realizada,


inicia-se a fase de identificação dos elementos constitutivos – pontos, linhas,
cores, volumes, dimensões, entre outras.

• Compreendida a estrutura básica e identificados os elementos constitutivos é


possível estabelecer relações, fazer o chamado procedimentos relacionais.

• Os elementos constitutivos não adquirem sentido isolados, precisam dos


procedimentos relacionais, a importância destas relações é vital para que se alcance
o plano de conteúdo, capacitando o leitor na interpretação do objeto analisado.

175
AUTOATIVIDADE

1 “[...] para os iniciados, esta polêmica entre os termos Semiologia e Semiótica


passou a ser um episódio histórico a partir de 1969, quando Roman Jakobson
– e a Associação Internacional de Semiótica aceitou – a adoção do termo
comum Semiótica para designar todo o campo de estudo abarcado tanto
pela semiologia quanto pela Semiótica” (OLIVEIRA, 2004, p. 17).

A partir da leitura desse texto, avalie as asserções a seguir e a relação proposta


entre elas:

I- Durante o século XIX Semiologia e Semiótica eram corrente diferentes,


além de contexto geopolíticos diferentes, e também se diferenciavam pelos
teóricos e seus fundamentos, porém a noção linguista foi expandida

PORQUE

II- Além do verbo – palavra falada; todo e qualquer outro fenômeno capaz
de representar algo em seu lugar podia ser objeto de análise da semiótica,
indiferente das duas. O que resultou no abandono da semiótica dicotômica,
prevalecendo apenas análises tricotômicas.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa
correta da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma
justificativa correta da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

2 “Para clarear esta composição intricada que é a imagem, poderemos fazer


analogias, que são bastante simplistas, mas têm funcionado. Uma das
comparações propõe pensar na imagem como um texto verbal, em que os
elementos constitutivos seriam as palavras, e os procedimentos relacionais
corresponderiam a sintaxe, ou seja, ao modo de organizar as palavras entre
si. Mas é preciso cuidado, pois existem distinções para além do aspecto
visual de ambos os textos. Uma dela é que nem a escrita nem a leitura da
imagem são lineares; a outra é que cada elemento não “concorda” com
apenas um outro elemento [...]” (OLIVEIRA, 2004, p. 25).

176
A partir da leitura desse texto, avalie as asserções a seguir e a relação proposta
entre elas:

I- Ao entrarmos em uma imagem, para analisá-la, precisamos nos dar conta


de “vasculhar” o todo, nos permitindo perceber o plano de expressão, tudo
o que compõe a imagem e é perceptível ao olhar, como consequência desse
momento vamos identificando os elementos constitutivos; e com o tempo
vai se fazendo os procedimentos relacionais, que resultarão no plano de
conteúdo.

PORQUE

II- Chegar no plano de conteúdo é um trabalho de ir e vir. Muitos elementos


constitutivos são só percebidos depois de inúmeros olhares – “vasculhadas”
no todo da imagem; a cada elemento constitutivos, ou bloco de elementos
constitutivos percebidos, novos procedimentos relacionais podem ser
realizados, desvelando conteúdos outros.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa
correta da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma
justificativa correta da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

3 A análise semiótica de um objeto percebido visualmente é complexa e requer


um referencial mínimo para sua realização. A postura do observador frente
ao objeto a ser analisado é vital ao processo, é preciso abordar o objeto
diferentemente do habitual.

A partir da introdução dessa questão, avalie as asserções a seguir e a relação


proposta entre elas:

I- A capacidade de dar tempo à percepção visual é importante para que se


tenha qualidade na interpretação de seus elementos constitutivos e de seus
processos relacionais.

PORQUE

II- Esse tempo, quando bem utilizado permitirá processos de ir e vir


constantes no objeto em análise qualificando os processos relacionais e
promovendo qualidade na intepretação do plano de conteúdo de toda a
composição visual.

177
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II não é uma
justificativa correta da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II é uma
justificativa correta da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

4 A análise com base na semiótica dicotômica entende que todo e qualquer


objeto que representa algo em seu lugar é signo, ou seja, tem significado
porque é significante. Quais são os planos que se referem significado e
significante? Explique cada um deles.

5 “A imagem passa a falar por si mesma, independentemente do que seu


autor teria querido dizer” (OLIVEIRA, 2004, p. 26). Explique a autonomia
da imagem.

178
TÓPICO 3 —
UNIDADE 3

ANÁLISE TRICOTÔMICA

1 INTRODUÇÃO
Iniciamos o terceiro tópico desta unidade. Dando continuidade ao
momento da disciplina mais prático, trataremos de uma outra maneira de
analisar imagens com base na semiótica norte-americana, mais especificamente
na abordagem tricotômica de Charles S. Peirce, e poder de certa forma criticar
e desenvolver objetos que sejam capazes de serem percebidos visualmente em
linha com os discursos que pretendem passar.

Reforçamos a importância de ter um referencial que dê suporte às leituras


que nos propomos fazer em nossos campos de trabalho, e com esse tópico
a disciplina direciona a segunda referência. Se no Tópico 2 desta unidade, foi
considerado a semiologia/semiótica saussuriana como referencial, neste tópico
vamos nos apoiar em Peirce. Lembramos que no design a capacidade de ler
imagens é fundamental para que se possa potencializar o desenvolvimento de
objetos pertinentes, que devam funcionar esteticamente (tocar os sentidos do
consumidor), utilitariamente e simbolicamente – dando conta de representar os
valores das marcas que as promovem em seus mercados.

O entendimento destas funções é muito importante para o profissional


de projeto, uma vez que dentro da análise tricotômica vamos percorrer as
possibilidades de um objeto significar dentro das três categorias sígnicas,
podendo se mostrar icônico (primeiridade), indiciático (secundidade) e simbólico
(terceiridade) e que o processo de coleta de dados pode também estar apoiado
nessa categorização.

2 ANÁLISE TRICOTÔMICA: A LEITURA COM BASE NA


SEMIÓTICA DE PEIRCE
Os projetistas configuram seus objetos de maneira que eles devam mostrar
seus atributos. No campo das artes os atributos estéticos ganham destaque,
enquanto no design, por mais que o estilo (a estética) tenha certa persuasão,
os atributos utilitários ganham destaques. Assim como dito anteriormente:
“O produto diz de si próprio: suas qualidades e características, o seu modo de
produção, o que serve, para quem se dirige” (NIEMEYER, 2003, p. 15). Desta
forma cabe ao projetista coletar os dados e as informações do mercado para dar a
elas expressão em seus produtos.

179
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

Vamos iniciar esse tópico assumindo a semiótica como uma ferramenta de


análise de situações, posicionamento que pode ajudar em muito na maneira que
coletamos informações e as transformamos em atributos de projeto. Existe uma
obra conhecida cinematograficamente que pode nos ajudar nesse momento, e se
chama: “O nome da rosa”, obra escrita por Umberto Eco.

ATENCAO

Assim como Saussure teve seus seguidores, a semiótica norte-americana


influenciou outros pensadores que deram suas interpretações. Um deles, em especial foi
Umberto Eco (1932-2016), linguista italiano que em suas obras aproximaram a semiótica do
grande público. A obra “O nome da rosa”, foi lançada como livro em 1980 e virou filme em
1986 dirigido por Jean-Jacques.

Vamos nos apropriar de um trecho do livro, das primeiras páginas do


livro, e em sua leitura vamos entender como a categorias de primeiridade,
secundidade e terceiridade funcionam na maneira como enxergamos o mundo.
Vale lembrar que como primeiridade estamos falando das qualidades do mundo,
dos fenômenos que nos chegam aos sentidos e só em sentir já nos dizem, já
nos representam algo, já se fazem signo; enquanto que na secundidade, esses
fenômenos que nos chegam aos sentidos nos fazem ensejar particularidades,
fazer comparações com o que já temos em nossa experiência, com as coisas do
mundo; enquanto que na terceiridade tudo que nos tocou os sentidos, que nos
fez pensar, ganha valor cultural, ganha relações arbitrárias para que possamos
assumir e legitimar o signo nesse terceiro nível.

O trecho que segue foi retirado da obra de Umberto Eco: O nome da rosa
(Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986), mais especificamente das páginas 36 a 39. Um
direcionamento para a sua leitura, já que estamos também promovendo a leitura
(análise) semiótica do texto, afinal compete a você interpretá-lo, correto? Faça uma
leitura, sublinhando trechos que você acredita ser referente a alguma categoria.

DICAS

Que tal escolher três cores de lápis/caneta para sublinhar, definindo cada cor
para cada categoria?

180
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

Para ajudar na leitura, o texto é uma narrativa, dois frades viajam até a um
monastério, um dele é o mestre (Guilherme) e o outro é o aprendiz (Adso). Adso
é o narrador. Guilherme está subindo para a Abadia como investigador e o texto
se dá no momento em que eles estão subindo o monte para chegar na Abadia.
Vamos à leitura:

Primeiro dia.

Primeira: onde se chega aos pés da abadia e Guilherme dá provas de


grande argúcia.

Era uma bela manhã de fins de novembro. À noite nevara um pouco, e


o chão estava coberto de um pelame fresco que não tinha mais que três dedos.
No escuro, logo depois dos laudes, tínhamos assistido à missa num vilarejo do
vale. Depois seguimos viagem rumo às montanhas, no despontar do sol.

Tão logo subimos pela trilha íngreme que se desatava ao redor do


monte, vi a abadia. Não me espantaram nela as muralhas que a cingiam
por todos os lados, iguais a outras que vi em todo o mundo cristão, mas a
mole daquele que, depois fiquei sabendo ser o Edifício. Era uma construção
octogonal que a distância parecia um tetrágono (figura perfeitíssima
que exprime a solidez e a intocabilidade da Cidade de Deus), cujos lados
meridionais se erguiam sobre o planalto da abadia, enquanto os setentrionais
pareciam crescer das próprias faldas do monte, sobre o qual se enervavam a
pique. Digo que de certos pontos, de baixo, parecia que a rocha se prolongava
até o céu, sem solução de tintas e de matéria, e virava, a uma certa altura,
fortaleza e torreão (obra de gigantes que tinham grande familiaridade tanto
com a terra como com o céu). Três fileiras de janelas davam o ritmo trinário
de sua sobrelevação, de modo que aquilo que era fisicamente quadrado na
terra, era espiritualmente triangular no céu. Ao nos aproximarmos mais, via-
se que a forma quadrangular gerava, em cada um de seus ângulos, um torreão
heptagonal, do qual cinco lados se projetavam para fora – quatro, portanto,
dos oito lados do octógono maior, gerando quatro heptágonos menores, que
no exterior manifestavam-se corno pentágonos. E não há quem não veja a
admirável harmonia de tantos números santos, cada um revelador de um
sutilíssimo sentido espiritual. Oito, o número da perfeição de todo tetrágono,
quatro, o número dos evangelhos, cinco, o número das zonas do mundo, sete,
o número dos dons do Espírito Santo. Pela mole, e pela forma, o Edifício me
pareceu como mais tarde veria no sul da península italiana Castel Ursino ou
Gastei dal Monte, mas pela posição inacessível era mais tremendo que esses,
e capaz de gerar temor no viajante que dele se aproximasse devagar. E é sorte
que, sendo uma límpida manhã de inverno, a construção não me surgiu como
é vista nos dias de tempestade. Não direi de modo algum que ela sugerisse
sentimentos de alegria. Trouxe-me espanto, e uma inquietação sutil. Deus
sabe que não eram fantasmas de minh'alma imatura, e que corretamente eu

181
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

interpretava indubitáveis presságios inscritos na pedra, desde o dia em que


os gigantes nela tocaram, e antes que a ilusória vontade dos monges ousasse
consagrá-la à custódia da palavra divina.

Enquanto os nossos mulos arrastavam-se pelo último cotovelo da


montanha, lá onde o caminho principal se ramificava em trevo, dando origem
a dois atalhos laterais, meu mestre deteve-se por algum tempo, olhando para
os lados ao redor da estrada, para a estrada, e acima da estrada, onde uma série
de pinheiros sempre verdes formava por um breve trecho um teto natural,
encanecido de neve. “Abadia rica", disse, "Ao Abade agrada aparecer bem nas
ocasiões públicas."

Habituado que estava a ouvi-lo fazer as mais singulares afirmações,


não o interroguei.

Mesmo porque, após mais um trecho de estrada, ouvimos rumores,


e numa curva apareceu um agitado punhado de monges e de fâmulos. Um
deles, como nos visse, veio ao nosso encontro com muita urbanidade: "Bem-
vindo, senhor", disse, "e não vos admireis se adivinho quem sois, porque
fomos advertidos de vossa visita. Eu sou Remigio de Varagine, o despenseiro
do mosteiro. E se vós sois, como creio eu, frei Guilherme de Baskerville, o
Abade precisaria ser avisado." "Tu", ordenou voltando-se para alguém do
séquito, "sobe para avisar que nosso visitante está para adentrar os muros!"

"Agradeço-vos, senhor despenseiro", respondeu cordialmente


meu mestre, "e tanto mais aprecio a vossa cortesia quanto para saudar-me
interrompestes a perseguição. Entretanto, não receeis, o cavalo passou por aqui
e dirigiu-se para o atalho da direita. Não poderá ter ido muito longe, porque
chegado ao depósito de estrume precisará deter-se. É inteligente demais para
lançar-se escarpa abaixo."

"Quando o vistes?", perguntou o despenseiro.

"Na realidade não o vimos, não é, Adso?", disse Guilherme voltando-


se para mim com ar divertido. "Se estais à procura de Brunello, o animal não
pode estar senão onde eu disse."

O despenseiro hesitou. Olhou Guilherme, em seguida o atalho, e por


fim perguntou:

"Brunello? Como sabeis?"

"Vamos", disse Guilherme, "é evidente que andais à procura de Brunello,


o cavalo favorito do Abade, o melhor galopador de vossa escuderia, de pelo
preto, cinco pés de altura, de cauda suntuosa, de casco pequeno e redondo, mas
de galope bastante regular; cabeça diminuta, orelhas finas e olhos grandes. Foi
para a direita, estou vos dizendo, e apressai-vos, em todo caso."

182
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

O despenseiro teve, um momento de hesitação, depois acenou aos


seus e tomou o atalho à direita, enquanto nossos mulos recomeçavam a subir.
Quando estava para interrogar Guilherme, porque tinha sido mordido pela
curiosidade, ele fez-me um sinal para esperar: e de fato alguns instantes
depois ouvimos gritos de júbilo, e na curva do caminho reapareceram monges
e fâmulos conduzindo o cavalo pelo cabresto. Passaram por nós continuando
a nos olhar um tanto aturdidos e nos precederam em direção à abadia. Creio
também que Guilherme diminuíra o passo de sua cavalgadura para permitir-
lhes contar o que acontecera. Com efeito, tivera oportunidade de perceber
que meu mestre, em tudo e por tudo homem de altíssima virtude, tolerava o
vício da vaidade quando se tratava de dar provas de sua argúcia e, tendo já
apreciado seus dotes de sutil diplomata, compreendi que queria chegar à meta
precedido de uma sólida fama de homem sábio. "E agora dizei-me", não pude
me controlar por fim, "como conseguistes saber tudo isso?" "Meu bom Adso",
disse meu mestre.

“Durante toda a viagem tenho te ensinado a reconhecer os traços com


que nos fala o mundo como um grande livro. Alan das Unas dizia que”:

omnis rnundi creatura


quasi Jiber et picture
nobís est in speculum

E pensava na abundante reserva de símbolos com que Deus, através de


suas criaturas, nos fala da vida eterna. O universo é ainda mais loquaz do que
pensava Alan e não só fala das coisas derradeiras (caso em que o faz sempre
obscuramente), mas também daquelas próximas, e nisto é claríssimo. Quase
me envergonho de repetir aquilo que devias saber. No trevo, sobre a neve
ainda fresca, estavam desenhadas com muita clareza as marcas dos cascos de
um cavalo, que apontavam para o atalho à nossa esquerda. A uma distância
perfeita e igual um do outro, os sinais indicavam que o casco era pequeno
e redondo, e o galope bastante regular – disso então deduzi a natureza do
cavalo, e o fato de que ele não corria desordenadamente como faz um animal
desembestado. Lá onde os pinheiros formavam como que um teto natural,
alguns ramos tinham sido recém-partidos bem na altura de cinco pés. Uma
das touceiras de amoras, onde o animal deve ter virado para tomar o caminho
a sua direita, enquanto sacudia altivamente a bela cauda, trazia presas ainda
entre os espinhos longas crinas negras. Não vais me dizer afinal que não sabes
que aquela senda conduz ao depósito do estrume, porque subindo pela curva
inferior vimos a baba dos detritos escorrer pelas escarpas aos pés do torreão
meridional, enfeando a neve; e do modo como o trevo estava disposto, o
caminho não podia senão levar aquela direção." "Sim", disse, "mas a cabeça
pequena, as orelhas pontudas, os olhos grandes...".

"Não sei se os tem, mas com certeza os monges acreditam piamente nisso.
Dizia Isidoro de Sevilha que a beleza de um cavalo exige “ut sít exiguum caput et
siccum prope pelle ossibus adhaerente, aures breves et argutae, oculi magni, nares

183
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

patulae, erecta cervix, coma densa et cauda, ungularum soliditate fixa rotunditas”.
Se o cavalo de que inferi a passagem não fosse realmente o melhor da escuderia,
não se explicaria por que não foram apenas os cavalariços a persegui-lo,
mas até o despenseiro deu-se ao incômodo. E um monge que considera um
cavalo excelente, além de suas formas naturais, só pode vê-lo assim como as
autoridades o descreveram, especialmente se “aqui endereçou-me um sorriso
de malícia”, "é um douto beneditino...", "Está bem", disse, "mas por que
Brunello?" "Que o Espírito Santo te dê mais esperteza que a que tens, meu
filho!" exclamou o mestre. "Que outro nome lhe darias se até mesmo o grande
Buridan, que está para tornar-se reitor em Paris, precisando falar de um belo
cavalo, não encontrou nome mais natural?".

Assim era meu mestre. Sabia ler não apenas no grande livro da natureza,
mas também no modo como os monges liam os livros da escritura, e pensavam
através deles. Dote que, como veremos, lhe seria bastante útil nos dias que
se seguiriam. Sua explicação, além disso, pareceu-me àquela altura tão óbvia
que a humilhação por não a ter achado sozinho foi superada pelo orgulho de
participar dela e quase congratulei a mim mesmo por minha agudeza. Tal é a
força do verdadeiro que, como o bem, difunde-se por si. E seja louvado o santo
nome de nosso senhor Jesus Cristo por essa bela revelação que tive.

FONTE: ECO, Umberto. O nome da Rosa. Rio de Janeiro: Record, 1986, p. 36-39.

O interessante na leitura desse texto é que somos levados a entrar no


processo de análise semiótica de Guilherme através da narrativa entusiasta
de Adso. Há nele, momentos onde ficam declaradas as categorias semióticas
de Peirce, mostrando como podemos, de certo modo, agir para analisar uma
determinada ocasião, uma cena, um evento. Fica evidente o momento do
“scanneamento”, onde nele já existem referências sígnicas; fica declarado e com
exemplos a secundidade, onde Guilherme traz suas referências que indiciam
suas considerações, e, de forma didática, Guilherme explica para Adso como a
terceiridade acontece, à medida que entendo e acessando o contexto cultural,
consegue dar nome ao cavalo!

DICAS

Este texto é utilizado como exemplo em algumas aulas do Professor do Pós-


Design Dr.Richard Perassi Luiz de Sousa, que atualmente leciona na Universidade Federal
de Santa Catarina. Ele escreveu um artigo mostrando como aborda esse texto, e uma
aqui temos uma dica para a leitura do artigo, cuja referência é: GHIZZI, Eluiza Bortolotto;
MACHADO, Amanda Pires; SOUSA, Richard Perassi Luiz de. Ícones, índices e símbolos em
um trecho de O nome da rosa. Semeiosis: semiótica e transdisciplinaridade em revista.
[suporte eletrônico] Disponível em: http://www.semeiosis.com.br/o-nome-da-rosa/.
Acessado em 09 nov. 2020.

184
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

3 ANÁLISE TRICOTÔMICA: AS CATEGORIAS DO OBJETO –


ÍCONE, ÍNDICE E SÍMBOLO
Tal qual o personagem do texto anterior, Guilherme, o observador que
assume analisar semiticamente algum fenômeno, precisa “parar” e observar.
“Scannear” o todo do fenômeno, fazendo com que aos pontos elementos, ou
blocos de elementos ganhem destaque provocando relação de indagações acerca
de suas singularidades; para então, norteado pelo seu repertório legitimar o que
estará vendo.

Se formos perceber esses três momentos, (1) de observar, (2) de ensejar
particularidades/singularidades do que está sendo observado e (3) assumir
conclusões (em alguns casos com base nos valores culturais), é base para a construção
de conhecimento. Então, quando nos posicionamentos intencionalmente
frente a algum fenômeno e conseguimos assumir que o conhecemos esses três
momentos acontecem. Interessante notar que quando olhamos para um objeto
que já conhecemos (que já faz parte de nossa cultura) esses momentos ocorrem
simultânea e rapidamente, a ponto de nem percebemos que passamos por eles.
Agora, quando entramos em contato com algum fenômeno nunca visto, perceba
que somos levados a ter que observar – “scannear”. E então, vamos comparando
suas singularidades com o que já conhecemos – ensejando particularidades que,
na sequência, poderão nos ajudar a darmos um nome, um conhecimento sobre o
que estamos vendo.

DICAS

Na prática profissional, a monotonia de projetos/clientes similares, nos faz


assumir verdades – “conhecimento” – rapidamente. A dica é assumir uma postura que todo
cliente, por mais que seja do mesmo mercado que outros que você já vem atendendo; ou
até um cliente que já atende, mas que agora chama para uma nova interveçào profissional,
seja entendido como novo. Para, que antes de assumirmos “verdades” sobre ele, pois “já” o
conhecemos; possamos dar valor e atençào à “observaçào” e a possibilidade de pensarmos
sobre fenômenos singluares que passam a operar nesse momento em sua rotina.

Os fenômenos estão relacionados com seus contextos, por mais que


estejamos à frente de um fenômeno já experenciando e conhecido, sempre é bom
lembrar que, por ser a segunda vez que o experenciamos isso já faz diferença,
pois não é a primeira, e ainda há a coerência de lembrar que o tempo passou, e
nesse passar do tempo nós mudamos, aprendemos coisas novas, reorganizamos
nossa maneira de pensar e, consequentemente de operar no mundo. “Sígnico, o

185
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

mundo está em constante transformação, adquirindo ressignificações, segundo


as diferentes culturas e épocas, porque as fronteiras espaço-temporais são
diferenciadas em cada lugar e em cada momento dado de sua historização”
(RIBEIRO; SANTOS, 2018, p. 79). Como vamos analisar o objeto que foi analisado
anteriormente, isso faz sentido!

Nossa análise agora está sustentada na tricotomia peirciana, e nos três


momentos que estamos tratando aqui, valendo lembrar que por se tratar de um
exercício, sempre haverá maneiras outras de pensar, o que será feito aqui é uma
descrição, com foco no entendimento de como é possível analisar um fenômeno
(um objeto visual – uma obra de arte), e não em chegar a conclusões maiores
acerca do discurso da obra de arte. Dessa forma, se durante a análise você chegar
a conclusões sobre o discurso, o considere válido, desde que – como já salientamos
durante toda a disciplina, tenha lógica e coerência.

Nossa análise tomará como base a leitura realizada por Augusto


Gonçalves Ribeiro e Luciana Rocha dos Santos, publicada como um capítulo no
livro “Discussões e aplicações da semiótica de extração peirciana”, organizada
por Marcília Simões e Claudio Manoel de Carvalho, para a editora carioca
Dialogarts, em 2018. Seguindo os passos que esses autores se utilizaram para
aborda a obra: “Enterro na Rede” de Candido Portinari, na série chamada de
“Retirante” de 1944.

FIGURA 8 – ANÁLISE TRICOTÔMICA DE ENTERRO NA REDE – CANDIDO PORTINARI (1944)

FONTE: <https://i0.wp.com/virusdaarte.net/wp-content/uploads/2014/10/enterro-na-rede-port..jpg>.
Acesso em: 9 out. 2020.

Como primeiro momento verificar-se-ão os qualissignos ou as qualidades


da aparência; depois os sinsignos ou os elementos que são signos por meio da
ocorrência; e por fim os legissignos, dar relações sígnicas que se fazem por meio
de leis, convenções, ou seja, seguindo as categorias peircianas da primeiridade,
secundidade e terceiridade. Para a análise é preciso considerar que na primeiridade,

186
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

devemos buscar as relações que ocorrem livremente, sem esforço de pensamento


algum, com mais originalidade e irresponsabilidade – é que se sente, sem explicações
maiores – ganham registro apenas por tocarem os sentidos e darem algum sentido
– sem necessidade de explicações e justificativas, sem que tenhamos que processar
algum raciocínio – a propósito, no momento que nós pegamos a pensar sobre os
sentidos que estamos tendo, já somos levados para a secundidade, onde ocorrem
as relações sígnicas da materialidade, da realidade, das comparações, do ensejar
particularidades, da incerteza e da dúvida; no momento em que essa situação
duvidosa, quando parecemos seguros de afirmar (pautados principalmente nas
convenções culturais) somos levados para a terceiridade “que corresponde à camada
da continuidade, mediação, lei, norma, hábito, regularidade e aprendizagem”
(RIBEIRO; SANTOS, 2018, p. 81).

A compreensão de que nos processos de análise semiótica, com base


nas teorias de Charles Sanders Peirce (2005), existem 10 classes de relações
categóricas por onde passam as possibilidades interpretativas é fundamental
aqui. Nestas possibilidades (apresentadas na Unidade 1), teremos maneiras
de abordar o objeto da nossa maneira, mas, para isso, precisamos apenas nos
lembrar das categorias como mostra o quadro a seguir:

QUADRO 1 – CATEGORIAS TRICOTÔMICA DE PEIRCE

Categorias do signo Representâmen Objeto Interpretante


Primeiridade qualissigno ícone rema
Secundidade sinssigno índice discente
Terceiridade legissigno símbolo argumento

FONTE: O autor

Ao analisarmos a obra de Portinar, assumiremos o caminhar processual


das categorias, partindo da primeiridade, passando pela secundidade e chegando
à terceiridade. Em um determinado momento, nos posicionaremos para apontar
quais objetos na obra são icônicos, indiciáticos e simbólicos, dentro da relação
do objeto como signo, por se assemelharem à coisa que representam (ícone); por
indicarem as coisas que representam (índice) e por normatizarem a coisa que
representam (símbolo). O que de certa forma serão identificados os elementos
da obra que nas qualidades já representam (primeiridade: qualissigno); que nas
relações de comparações das suas singularidades representam (secundidade:
sinssigno); e que nas relações de representarem por normas, por lei (terceiridade:
legissigno). E o que nos leva a considerar o interpretante no processo: na noção de
a obra e seus elementos propiciam interpretar (primeiridade: rema); veiculam e
sugerem dúvidas e ponderações no interpretar (secundidade: discente); e os que
interpretam pelo raciocínio, pela lógica (terceiridade: argumento).

187
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

Iniciando nossa abordagem analítica da obra, continuamos com os níveis


apresentados no Tópico 1 desta nossa unidade. Onde em nível básico, acessamos
o objeto como um “scanneamento”, em que ao determinar nossa percepção visual,
direcionará elementos onde o foco do olhar se concentrará. Indo para o nível
intermediário onde o foco do olhar acontece, atributos específicos do processo
visual, são declarados. Passamos a dar atenção aos elementos específicos – que
pode ser uma marca, um acabamento, um detalhe estrutural. Chegando ao nível
mais elevado ao nos focarmos aos detalhes, depois de uma investida visual no
todo, os fatores sociais, culturais e comerciais determinam o estilo do objeto que
estamos percebendo.

O “scanneamento”, a contemplação primeira de uma obra o que deve ser
considerado são suas formas, as qualidades de como a obra chega aos nossos
sentidos – caso das linhas, traços, das cores e dos tons que já podem, de forma
livre nos sugerir representações. Depois vamos descrever melhor os elementos
através de nossas reações à existência concreta, das ocorrências singulares do
que está expresso na obra e pode ser relacionado com o real, é quando a obra
nos sugere coisas representadas que não estão ali, mas se fazem presentes por
indicação; e finalmente o que passa a representar algo por que compreendemos e
normatizamos, através de nossa vivência e repertório cultural.

Como estamos trabalhando com uma obra de arte, que se encontra


impressa em um livro, e que pelo link se faz disponível na internet e acessada
em uma tela (de computador, de tablet, de celular), é preciso considerar que ela
se mostra diferente da original por apresentar características distintas da obra
verdadeira (que se faz única e está em uma galeria de arte). Então muito das
qualidades como dimensões, textura, cromatização, tonalidades são diferentes e
serão assumidas com as que acessamos na página impressa.

Ao olharmos a obra, nos deparamos com essas qualidades e nos damos
conta, em qualissigno, que a paisagem é diminuta, faz-se secundária na obra, nos
oferecendo um aspecto de tensão humana, esse sentido é efêmero, não é possível
descrever nem dar uma definição verbal, apenas, de forma original e livre nosso
olhar, ao acaso sente – sentimos pela figuração e pelos tons, um clima tenso e
triste do sertão e seu clima árido – de fato, as qualidades expressas no quadro nos
sugerem mais tristeza e sofrimento, do que alegria e felicidade. Da mesma forma
que iconiza o solo e o clima árido.

E, então, tão subitamente como o lugar de onde a cena se passa e o


sentimento de tensão que nos foi dado em primeiridade, começamos a interagir
com a obra, a ensejar particularidades – e aí já estamos na secundidade. Vemo-nos
discutindo com a gente mesmo, numa busca de comparar e dialogar como nossas
experiências para identificar o que na imagem indicia sentidos que, para a gente
faz e tem sentido, “a partir de uma dialética de ação e reação, configuramos o

188
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

caráter de existência concreta da paisagem no aqui e agora de sua representação.


Esta singularidade pode ser observada e apreendida” (RIBEIRO; SANTOS, 2018,
p. 86). Na obra “Enterro na rede”, a paisagem parece desaparecer completamente,
enfatizando e dramatizando a tensão e a tristeza das figuras humanas que perecem
experenciar a morte pela dificuldade geográfica, econômica e social.

Percebemos estar na terceiridade quando o quadro nos traz essa noção


de dificuldade social, econômica do sertão, claro que a cena indicia dificuldade,
mas ela só dá conta de simbolizar a dificuldade quando o enredo social em que o
artista e o quadro pintado nos vêm e, por meio do contexto cultural, colocamos a
discussão da sobrevivência no clima árido (onde toda a vida natural se esvai) em
que o sertanejo está situado.

Retornamos aos conceitos da Unidade 2, e então os elementos visuais dão


conta de formar a base estrutural do que vemos: ponto, linha, forma, direção,
movimento, escala, dimensão, textura, tom e cor se mesclam construindo elementos
que sozinhos ou em conjunto formam as composições visuais (DONDIS, 1997).
Os elementos visuais da obra têm papel definidor nas demandas de enfocar os
detalhes de seu discurso.

DICAS

Acesse o link que está como fonte da figura acima, ou pesquise na internet
pelo nome da obra para poder ver a imagem colorida.

Na figura impressa, os tons cinzas e escuros dão conta do clima cromático


da obra, mas na obra colorida (que pode ser acessada no link logo abaixo da
figura) os tons amarelo-alaranjados predominam na obra nos situando já
em primeiridade de um dia de calor, seco e árido. A dramaticidade da obra é
deflagrada por essas tonalidades, que com as linhas angulares, pontas e pesos
visuais nas linhas orgânicas mostra a sutileza do artista ao exaltar ainda mais o
sofrimento e a tensão de toda a composição. “Nem a luz divina, nem a escura
treva se atualizam nesta tela, pois sua finalidade é justamente priorizar o caráter
sentimental, emocional e humano de um ser social com seu grito de dor devido
às privações que sofre em seu mundo terreno” (RIBEIRO; SANTOS, 2018, p.
92). A cromatização da tela iconiza o árido de um dia quente – isso se faz em
primeiridade – note que não há esforço algum para sentir isso – as qualidades
da cor e da composição nos sugerem isso! Quando acessamos cada elemento e
passamos a buscar sentido – ensejando particularidades de cada cor, de cada

189
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

forma expressa na obra, estamos em secundidade, e aí as cores e os elementos


gráficos indiciam ruptura, quebra, movimento, calor; e quando acessamos as
regras assumimos o discurso da obra – de tensão, sofrimento, tristeza, dor, aridez
e morte. Note que os significados das cores apresentados por Dondis (1997, p. 65)
arbitrariam isso:

[...] o amarelo é a cor que se considera mais próxima da luz e do


calor; o vermelho é a mais ativa e emocional; o azul é passivo e suave.
O amarelo e o vermelho tendem a expandir-se; o azul, a contrair-se.
Quando são associadas através de misturas, novos significados são
obtidos. O vermelho, um matiz provocador, é abrandado ao misturar-
se com o azul, e intensificado ao misturar-se com o amarelo, que se
suaviza ao se misturar com o azul.

Da mesma forma que os elementos visuais induzem nosso olhar, somos


capazes de identificar no primeiro olhar “pontos”; “linhas” e “planos” e percorrer
a obra por meio deles. É válido lembrar que sem ponto, sem linha não existe o
manifesto gráfico. Por meio desses elementos e de seus significados visuais é que
somos capazes de interpretar os objetos aos quais nos propomos analisar.

DICAS

Que tal voltar à Unidade 2, ou em suas anotações e lembrar os conceitos


de ponto, linha, plano – dos elementos visuais, que trabalhamos? Eles podem ajudar no
entendimento da análise que estamos realizando.

A olharmos a obra, vemos formas triangulares, piramidais. Elas compõem


boa parte da textura da obra. Em primeiridade vemos formas abstratas, linhas
que se aproximam e dão conta de elementos piramidais, pontas... antes de
buscar significados maiores, ainda em primeiridade vale considerar que formas
piramidais têm aspecto concreto e real em nosso mundo, como as pirâmides
do Egito, ou as pirâmides das classes sociais. Claro que quando legitimamos
as formas piramidais para a cultura egípcia – estamos, indiscutivelmente, na
terceiridade (afinal esta relação se fez pela cultura). Entretanto, ao estar nesse
nível, ao poder ver ali relação com as pirâmides egípcias, podemos voltar à
categoria primeira e relacionar iconicamente a pirâmide como túmulo – lugar
onde os faraós sepultavam seus mortos, com a finalidade de mantê-los vivos. E
secundidade, a forma piramidal nos indicia trabalho, povo trabalhador (escravos
que as construíram) e ainda como pontas – direcionam o sentido espiritual. E em
terceiridade a forma piramidal simboliza essa espiritualidade, nos permitindo
crer que o artista vê a salvação espiritual como força motora da relação social
apresentada em sua tela.

190
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

Este mesmo ir e vir nas categorias sígnicas, aparece na noção da forma


piramidal como pirâmide social. Em sua forma temos uma maior quantidade ao
distanciar do vértice angular, onde estaria menor quantidade isso é icônico, na
noção primeira de espaço entre as linhas; mas ela indicia gráfico quantitativo,
e simboliza em sua posição de base maior em baixo, a ideia de diferentes
classes sociais, onde as mais baixas têm maior quantidade. Uma interferência
intencional do artista, ao remeter ao cenário social e econômico brasileiro “visto
que somente um por cento da população detém o poder econômico. Portanto, a
classe dominante concentra-se na parte superior” (RIBEIRO; SANTOS, 2018, p.
94). Quando analisamos a obra, percebemos que as principais formas piramidais
se apresentam de forma invertida, nos provocando novas singularidades,
ressignificações produzindo em nossa mente, outros efeitos de sentido que
podemos legitimar em terceiridade. E, ainda, a noção de que, percebida em
primeiridade virada, iconiza o vetor de direção para baixo, o que nos indicia que
o que está carregado ficará na terra? Ou será enterrado? Suposições que podem
nos levar à conclusão de que,

ao observar a pirâmide voltada para a terra onde a matéria corpórea


fica para o todo sempre, que há um momento no qual todos os
seres humanos se igualam, ou seja, a morte. Neste momento não há
diferenças entre negros e brancos, pobres e ricos, religiosos ou ateus,
todos, sem exceção, vão perecer e se destinar ao mesmo lugar, aos
braços da mãe Terra (RIBEIRO; SANTOS, 2018, p. 95).

Ao olhar a obra pela primeira vez, saltam aos olhos as figuras humanas,
em traços esqueléticos e com membros desproporcionais, ocupam quase toda
a composição visual. Iconicamente vemos dois homens em pé, duas mulheres
ajoelhadas; nos damos conta de vermos mãos, braços e pés (de grandes
proporções) iconicamente – suas formas são similares aos objetos reais. Não há
esforço para ver isso: são pés, braços e mãos. São homens e mulheres. Contudo,
quando, em secundidade, ao nos darmos conta das proporções passa a ensejar
particularidades – porque os pés fixos ao chão são maiores? Por que os braços
ganham tal destaque? Por que os homens sugerem carregar algo, cruzando a cena
da esquerda para a direita, enquanto as mulheres ajoelhadas lamentam, um em
dor e a frente dos homens no enquadramento, e a outra em oração atrás destes
homens? Essas e outras dúvidas nos declaram que estamos na secundidade
e que a busca de certezas só finalizará como em terceiridade legitimarmos
posicionamentos, caso de que: a proporção dos braços simboliza força, esforço
físico; os pés descalços simbolizam pobreza; os braços abertos simbolizam dor
e questionamento; e o ajoelhar pode ser considerado símbolo de resignação
religiosa. Desta forma o discurso da obra, “escrito” visualmente pelo artista,
parece nos apresentar o enredo:

o caráter social da deflagração da miséria do nordestino que vive


em um sertão sem possibilidade de prosperar e em uma resignação
religiosa que o faz aceitar como destino divinatório tal tragédia
humana. Tragédia que o artista consegue transpor para a tela através
de sua observação da realidade, a peculiaridade da significação sócio-
político-cultural de seu tempo, isto é, da contextualidade do entre
guerra (1944) e transcender aos dias atuais posto que a seca, miséria,
fome, sede permanecem inalteradas (RIBEIRO; SANTOS, 2018, p. 94).

191
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

Em nossa análise aos poucos estamos identificando algumas partes em


relação ao todo. Perceba que essa análise ocorre no ir e vir na imagem. Em cada ida e
vinda percebemos novas maneiras de interpretar e nos envolver categoricamente
com a obra, em primeiridade sempre vamos fazer análises diretas – sem muito
esforço; enquanto que na secundidade, vamos promover um gasto maior de
energia, onde levantamos questionamentos a partir de particularidades ou de
possibilidades que vamos entendendo a empreender na obra; e então assumimos
(de forma arbitrária na maioria das vezes) conclusões sobre tais fenômenos ou
processos relacionais.

Neste momento vamos dar ênfase ao objeto – em suas categorias: ícone,


índice e símbolo. Trazendo uma distinção de Peirce (2005) para o objeto: o objeto
dinâmico e o objeto imediato.

NOTA

Não abordamos essa distinção de objeto peirciana em nossa fundamentação


de semiótica (Unidade 1) por uma questão estratégica didática. Trazendo essa distinção
nesse momento ela fica mais fácil de ser entendida.

Santaella (2002, p. 15) discorre sobre essa distinção, da seguinte forma:

Quando pronunciamos uma frase, nossas palavras falam de alguma


coisa, se referem a algo, se aplicam a uma determinada situação
ou estado de coisas. Elas têm um contexto. Esse algo a que elas se
reportam é o seu objeto dinâmico. A frase é o signo e aquilo sobre o
que ela fala é o objeto dinâmico.
O modo como o signo representa, indica, se assemelha, sugere, evoca
aquilo a que ele se refere é o objeto imediato. Ele se chama imediato
porque só temos acesso ao objeto dinâmico através do objeto imediato,
pois, na sua função mediadora, é sempre o signo que nos coloca em
contato com tudo aquilo que costumamos chamar realidade.

Na obra que estamos analisando, o objeto dinâmico “é a prerrogativa de


denúncia sociocultural do autor, enquanto, o modo particular de como é feito
esta denúncia através dos recortes específicos intencionados a partir do artista,
representa o objeto imediato” (RIBEIRO; SANTOS, 2018, p. 97-98). De forma
simples, o braço forte expresso no desenho, é objeto imediato para o objeto
dinâmico de “força”; “esforço físico”; “trabalhador”.

192
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

A obra “Enterro na rede” trata da força dramática do sertanejo – do homem


e da mulher sofridos. Da dificuldade da sobrevivência árida social brasileira. “A
paisagem não está presente como indício referencial da dor tamanha ao perder
um ente querido que, em sua primeiridade remática, não pode ser descrita,
porém, sentida, através das impressões da aparência imediata e indeterminada”
(RIBEIRO; SANTOS, 2018, p. 111), de fato é a situação que somos levados a sentir
pelas qualidades da obra, onde sem maiores esforços identificamos como ícones
a cena de um real possível – um cortejo fúnebre em um ambiente de extrema
dificuldade e dor.

Esta dor, torna-se em um momento segundo, um signo decente, por


veicular uma referencialidade indicativa de todo o sofrimento humano
diante da seca ou da guerra. A seca é uma batalha contra as adversidades
das forças da natureza, portanto, divina. A guerra é uma luta de homens
contra homens movidos por interesses político-econômicos, portanto,
terrena, humana (RIBEIRO; SANTOS, 2018, p. 111).

O quadro, em suas expressões visuais, e em seus elementos icônicos


(figurativos) indicia dor e sofrimento. Conseguimos “enxergar” a face em pranto
ou desespero da mulher que ajoelhada observa o corpo envolto à rede ou lençol
passando por ela. O artista a desenhou de costas para o expectador, mas deixou
índices para que fosse possível imaginar como está a face dela. “O sofrer da mãe
por não aceitar o destino tão cruel de seu filho é de uma enormidade tamanha que
ela se ajoelha ao chão em súplicas para não levarem, ou melhor, não arrancarem
de seu seio materno, aquele imóvel ser, sem respiração e sem fluidez” (RIBEIRO;
SANTOS, 2018, p. 112). Da mesma forma que ao vermos fumaça podemos afirmar
a existência de fogo; quando vemos o chão da rua molhado, podemos afirmar que
choveu – os elementos visuais da obra, permitem que afirmemos como a face da
mulher está. Não é certo, é sempre duvidoso – e é isso que define a secundidade.

A terceiridade sempre será momento de afirmações. De dar o aceite


às dúvidas, porém o fenômeno já pode nos apresentar símbolos – objetos
impregnados de sentidos arbitrários e presos em convenções culturais. Como
projetistas, autores, podemos inserir formas simbólicas para ter certa garantia
que nossos expectadores vão entender o que estamos desenvolvendo – mas, para
isso, precisamos saber como nossos expectadores pensam e em quais contextos
estão inseridos. Na obra em questão, morte, sofrimento e religiosidade parece
explícitos na composição.

Podemos também, inferir da cena, o formato de cruz que as mãos da


mãe perfazem ao ser levantadas. Movimento este que nos induz a
mais um ato de amor a Deus, tão implicitamente revelado, sugerindo
a salvação humana e evidenciando a religiosidade do nordestino que
resignado segue o seu destino sem blasfemar (RIBEIRO; SANTOS,
2018, p. 112).

193
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

Perceba que a indução pela cruz do “ato de amor a Deus”, está carregado
da arbitrariedade judaico-cristã, e tem peso estratégico na composição visual que
o artista organizou.

Os elementos na tela apontam para o enorme drama humano, ou seja,


a morte. Os traços negros, fortes, delineiam as figuras carregadas de
dramaticidade plástica suprema, realçada pela tonalidade amarela que
expande os sentimentos, de dor, desespero, incerteza, incompreensão
como na música de Gonzaga: “Eu preguntei a Deus do céu, ai / Por que
tamanha judiação?” (RIBEIRO; SANTOS, 2018, p. 112).

Mesmo no campo das artes, Portinari – o artista da obra que estamos


tratando, parece se valer do comportamento de um projetista. Ele parece ter
familiaridade, compreensão e domínio do tema que está pintando, da mesma
forma que designers precisam assumir essas posturas para entregar produtos que
“funcionem” no mercado em que pretendem atuar. Como salienta Niemeyer (2003,
p. 53): “Aspectos quanto a tradições, costumes, valores, religião, características
políticas e econômicas devem ser mapeados na fase inicial do projeto para evitar
perda de tempo em futuros ajustes ou, o que é pior, fracasso da solução adotada”.

Para finalizarmos esse tópico, apresentaremos algumas referências
que podem indicar quais elementos presentes nos produtos podem propor
interpretações que podemos planejar em linha com os valores da empresa, do
mercado, ou até mesmo do cliente.

4 REFERÊNCIAS ICÔNICAS
Aqui a noção de semelhança é importante. Ela pode ser imagética,
estrutural, organizacional e aparece da seguinte maneira:

Tradição da forma: alguns elementos formais parecem se assemelhar


com fenômenos reais – caso das formas arredondadas e curvas que remetem à
produtos infantis.

Semelhança cromática: algumas cores que funcionam no mundo real são


usadas para fins semelhantes nos produtos – caso dos frutos madures cujas cores
quentes (vermelho, laranja), ganha uso em embalagens de produtos alimentícios.

Semelhança material: alguns materiais têm nas suas sensações reais


direcionamentos para dar sentidos a objetos – caso de materiais metálicos voltados
para produtos mais técnicos.

Metáfora: por analogia conseguimos interpretar um produto em referência


a outro. A ideia de asa de avião para a asa de um pássaro.

194
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

Estilo: relação das partes de um produto por meio da semelhança. O uso


de uma cor na composição de várias peças, respeitando a cartela de cores e dando
unidade à coleção de moda.

Semelhança de ambiente: um objeto tem o uso entendido por que conseguimos


visualizá-lo no ambiente quando o interpretamos – uma cadeira de sala de aula tem
ambiente diferente de uma cadeira de mesa jantar (NIEMEYER, 2003).

5 REFERÊNCIAS INDICIÁTICAS
Considera-se aqui “uma determinação de causalidade” (NIEMEYER,
2003, p. 55). Traços de ferramentas ou de máquina: um detalhe de acabamento dá
a ideia de feito à mão.

Cor: pelo tingimento conseguimos ter noção do processo, se foi industrial


ou artesanal.

Forma indicativa: um detalhe, um elemento aponta como funciona, dirige


o olhar.

Marcas de uso: algumas ranhuras mostram que o produto foi usado por
alguém. Sabemos que um produto já foi usando por alguma mancha nele.

Outros traços: o desgaste feito no acabamento de um mobiliário e madeira


para indiciar envelhecimento, por exemplo.

Sinais luminosos e sonoros: componente de um produto que sinalizam


onde acionar, onde apertar.

Som de uso e barulho de um produto: o produto pode fazer barulho ou


acender um sinal luminoso para indiciar que está ligado.

Cheiro: um odor ou aroma pode ser interpretado como qualidade de um


produto. O cheiro de um carro novo, por exemplo.

Toque ao material: ao tocarmos em um material podemos pensar sobre


seu peso, sua resistência.

Algarismos: algarismos desenhados sobre uma interface afere cuidados


com determinado produto.

195
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

6 REFERÊNCIAS SIMBÓLICAS
São “estabelecidos culturalmente e, então, difundidos, podendo, então,
passar a serem aplicados” (NIEMEYER, 2003, p. 57).

Símbolos gráficos: nome, marca, logotipo de uma empresa que aprendemos


a relacionar com seus produtos. Exemplo: Nike; Apple.

Cor simbólica: uma cor em uma marca pode estar relacionada a uma
regra, norma. Caso do uso da cor azul para tecnologia.

Forma simbólica: similar a cor simbólica. Uma marca em formato de cruz


tem peso religioso.

Posições e posturas simbólicas: existem produtos que tem posicionamento


cultural, pelo uso por exemplo. Roupas brancas para a área da saúde.

Material simbólico: um determinado tecido pode simbolizar um status –


caso da seda.

A abordagem que trabalhamos em nossa disciplina pretende que seja


considerada como fundamento introdutório. E que existe muito ainda para
se aprofundar, tanto em semiótica, quanto em percepção visual. Muito desse
aprofundamento não precisa acontecer teoricamente, em cursos e universidades;
pode ocorrer na prática, no comportamento de utilizar, a sua maneira, o que foi
trabalhado aqui. Aos poucos, durante os usos, alguns pontos da teoria ganham
entendimento, da mesma forma, que alguns pontos ferramentais e técnicos de
análise vão se aperfeiçoando.

Nem sempre é fácil assumir a semiótica como ferramenta de projeto, mas


quando nos permitimos colocar a semiótica e a percepção visual em nossa prática
profissional, nossos projetos adquirem mais segurança e ficamos mais confiáveis
em melhorar no fazer e nosso pensar. Em meio à diversidade de ferramentas e
técnicas que se disponibilizam para desenvolvimento de projeto, a capacidade
de gerenciar informações, de ter ideias, e dar a elas formas à produtos que
almejam sucesso no mercado, entender que a maneira que operamos no mundo
e pensamos sobre eles nos faz profissionais diferentes com poder de impacto no
mercado de trabalho.

196
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

LEITURA COMPLEMENTAR

SEMIÓTICA: UMA CIÊNCIA DE... DETETIVES

Izidoro Blikstein

Numa engenhosa alusão a O signo dos Quatro – uma das cinquenta e


tantas aventuras de Sherlock Holmes, escritas por Sir Arthur Conan Doyle – duas
“estrelas” da Semiótica, Umberto Eco e Thomas Sebeok, editaram em 1983, nos
Estados Unidos, The signo f Three, pela Indiana Univesity Press. No Brasil, O signo
de Três é lançado em 1991 (tradução de Silvana Garcia) pela Perspectiva, editora
cuja “vocação” para a Semiótica é marcada por toda uma linha de publicações
inaugurada em 1968 com o desbravador Obra Aberta, do mesmo Umberto Eco. O
Signo de Três também é um livro inovador, pois é mais um lance audacioso de Eco,
ao levar a Semiótica para além do elitista e fechado referencial acadêmico e mostrar
como a “detetivesca” ciência dos signos, índices e símbolos nos oferece as grandes
chaves para desvendar os enigmas do comportamento humano. Com efeito, O
Signo de Três é uma coletânea de dez pequenos ensaios de autoria muito diversa
(semioticistas, filósofos, historiadores, críticos literários, sociólogos (dedicados a
dois famosos detetives da ficção policial, Sherlock Holmes e Auguste Dupin (o sagaz
investigador de Os Crimes da Rua Morgue, de Edgar Allan Poe), e... ninguém menos
que um dos “pais” da Semiótica, o americano Charles Sanders Peirce. O que estará
fazendo o semioticista Peirce na companhia de Sherlock e Dupin? Intrigado com
essa estranha reunião, o leitor tem plenamente o direito de indagar da pertinência
das relações entre histórias de crimes, detetives e... Semiótica.

A resposta a tal indagação pode ser obtida na leitura de O signo de Três.


O leitor perceberá facilmente que, muito além das pertinentes e estreitas relações
entre investigadores policiais e semioticistas, o que se verificam na verdade, é
que, de um lado, o método da descoberta, ou melhor, a heurística sherlockiana
constitui uma autêntica operação semiótica, e, por outro lado, a tarefa da Semiótica
é “”coisa” de detetive! Com efeito, em que consiste o trabalho de detetive? Basta
examinar a etimologia da palavra: detetive (que nos veio do inglês detective) é da
raiz latina TEC, “cobrir”, a mesma de onde se formaram detector e detectar. O
termo detectar significa então, muito simplesmente, “descobrir”, e o detetive é
aquele que detecta ou descobre. Mas, afinal, qual é o método de descoberta de
Sherlock Holmes, o protótipo do detetive “metalinguístico”, sempre disposto
a explicar o itinerário de seu raciocínio nas investigações? Embora, em todas
as histórias, o herói de Conan Doyle nos brindes com uma exposição de seus
procedimentos investigatórios, é justamente no cap. I de O signo dos Quatro que o
leitor se deliciará não só com uma verdadeira “aula” sobre como decifrar os mais
intricados enigmas, mas também, e sobretudo, sobre a razão de ser da profissão
sherlockiana. E o cap. I se abre com uma cena um tanto desconcertante para os
admiradores do detetive:

197
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

Sherlock Holmes tomou o frasco que estava sobre a borda da lareira


e, abrindo um elegante estojo de marroquim, tirou a sua seringa
hipodérmica. Com os dedos longos, brancos e nervosos, ajustou a
agulha delgada e arregaçou o punho esquerdo da camisa. Durante um
momento pousou o olhar no pulso e no antebraço vigoroso, pontilhado
de inúmeras picadas. Finalmente, espetou a ponta aguda, comprimiu o
êmbolo, e reclinou-se na sua poltrona forrada de veludo com um longo
suspiro de satisfação” (O Signo dos Quatro, São Paulo, Melhoramentos,
trad. de Hamilcar de Garcia, 1991, cap. I, p. 7 – grifos meus).

Diante de Watson, seu famoso companheiro, Holmes acabara de tomar


cocaína, operação que se repetia pelo menos três vezes por dia nos últimos meses,
causando grande prazer no próprio Holmes, mas perplexidade e irritação em
Watson. E a esse revoltado Watson, o detetive justifica o hábito:

Meu cérebro, disse ele, rebela-se contra a estagnação. Dê-me


problemas, dê-me trabalho, dê-me o mais obtuso criptógramo, ou
a mais intricada análise, e eu estarei no meu elemento. Dispensarei,
então, os estimulantes artificiais. Detesto a rotina monótona da existência.
Preciso ter a mente em efervescência” (cap. I, p. 9 – grifos meus).

Como se vê, a pesquisa e a elucubração detetivesca constituem uma


condição sine qua non para a sobrevivência. Mas não se trata de mera pesquisa
policial, pois Sherlock tem plena consciência de seu método, na medida em que
não só investiga, como também procura sempre elucidar e teorizar sobre os
procedimentos de investigação. É o que se depreende do diálogo com Watson:

É por isso que escolhi a minha profissão especial, ou melhor, criei-a,


porque sou o único no mundo a exercê-la.
- O único detetive particular? Perguntei, erguendo uma sobrancelha.
- O único detetive particular consultivo... Sou o mais alto tribunal de
apelação em matéria de pesquisa criminal...” (cap. I, p. 9).

Ao impaciente Watson, curioso por conhecer os segredos da ciência


sherlockiana, Holmes explica que ela se baseia muito simplesmente em observação
e dedução (abdução para Peirce, como se verá adiante), exemplificando-as com
o próprio Watson: “... a observação mostra-me que você esteve esta manhã na
agência postal da Wigmore Street, mas a dedução faz-me saber que, ali chegando,
expediu um telegrama” (cap. I, p. 12).

Diante do espanto de Watson, que não entende a “adivinhação”, pois não


mencionara a ninguém a sua ida ao correio, Sherlock expõe a sua heurística:

A observação diz-me que você tem um pequenino torrão avermelhado


preso à sola do sapato. Exatamente em frente da agência postal da
Wigmore Street, levantaram a calçada, deixando um pouco de terra
no caminho, de sorte que é difícil não pisar nela ao entrar. A terra é
de um vermelho típico que, até onde sei, não se encontra em nenhum
outro lugar das redondezas. Tudo isto é observação. O resto é dedução”
(cap. I, p. 12 – grifos meus).

198
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

E Sherlock esclarece ao cada vez mais espantado Watson como deduziu


que este havia passado um telegrama:

- Ora, evidentemente, eu sabia que você não tinha escrito uma carta,
uma vez que passei toda a manhã sentado à sua frente. Vejo, além
disso, que há uma folha de selos na sua escrivaninha aberta e um
grosso maço de postais. Para que iria, então, à agência postal, se não
para mandar um telegrama? Elimine todos os outros fatores, e o que
restar deve ser a verdade” (p. 12 – grifos meus).

O método da descoberta consiste pois em observação e dedução. Mas


dá para perceber a prudência científica de Holmes, pois suas deduções não são
nem adivinhações e nem afirmações categóricas mas constituem, antes de tudo,
formulações hipotéticas que podem levar à verdade dos fatos. Tal prudência pode
ser depreendida de algumas expressões cautelosas utilizadas pelo detetive como:
“até onde sei”; “o resto é dedução”; “Para que iria, então, à agência...” (uso de um
modo verbal hipotético); “... e o que restar deve ser verdade”.

Nota-se, portanto, que a riqueza e a fecundidade do método está na


possibilidade de formular hipóteses baseadas em observações e deduções: o fato de
Watson não ter contado a ninguém que fora ao correio não impede que o detetive
formule uma hipótese provável. No entanto, a demonstração cabal da eficácia dessa
conduta metodológica fica evidente quando Holmes é desafiado a identificar “o
caráter e os hábitos” do proprietário de um relógio que Watson maliciosamente
lhe exibe. Depois da costumeira e atenta observação, o detetive deduz com a suam
metódica cautela: “- Se não me disser o contrário, julgo que o relógio pertenceu ao seu
irmão mais velho, que o herdou de seu pai” (cap. I, p. 13)”.

Watson, que achara quase normal a descoberta do proprietário, deduzida


a partir das iniciais H. W. e da data gravadas no relógio, fica absolutamente
indignado pela descrição dos hábitos do irmão feita por Holmes:

- Ele era um homem de hábitos desordenados... Iniciou a vida com


boas perspectivas, mas deitou fora as duas oportunidades, viveu
algum tempo na pobreza, com intervalos ocasionais de prosperidade,
e por fim, entregando-se à bebida, faleceu. Isso é tudo o que posso
inferir” (cap. I, p. 14).

Incapaz de aceitar e, sobretudo, de entender como foi possível chegar


a tais inferências pela simples observação de um velho relógio, Watson prefere
acreditar que Holmes, como um bom charlatão, cometeu a indignidade de
“fingir” estar fazendo deduções, quando, na verdade, tudo o que o detetive
dissera baseava-se em indagações bisbilhoteiras sobre a vida daquele infeliz
irmão. Ao procurar aplacar a ira do companheiro, Sherlock acaba de fornecer os
elementos fundamentais de seu método de descoberta, marcando bem a diferença
entre o senso comum “realista” de Watson – para quem o conhecimento se obtém
por um contato direto com as pessoas, os objetos e, enfim, os fenômenos – e o
seu “deducionismo” lógico que consiste em formulações hipotéticas a partir da

199
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

observação de pormenores ou indícios muitas vezes secundários e aparentemente


insignificantes. Com efeito, Sherlock, começa por esclarecer que nem sequer sabia
da existência do irmão de Watson e que tratava do caso como um “problema
abstrato”, esquecendo-se de que “era uma coisa íntima e dolorosa” (p. 14). E para
a solução desse problema abstrato, Watson deveria compreender que a descrição
feita pelo detetive não foi propriamente o relato real da vida do irmão, mas apenas
um “saldo de probabilidades” (p. 15), deduzindo na observação de pequenos
indícios encontrados no relógio. Assim, o desleixo do irmão foi inferido a partir
dos arranhões na parte inferior da caixa do relógio, “consequência do hábito de
guardar objetos duros, tais como chaves ou moedas, no mesmo bolso” (p. 15);
quatro números gravados com alfinete na tampa interna, procedimento habitual
nas casas de penhor na Inglaterra – indicam que o irmão de Watson, em prováveis
apuros financeiros, deve ter penhorado o relógio repetidas vezes; finalmente
sulcos em torno do buraco da chave na tampa interna sugerem dificuldades em
introduzir a chave por causa dos escorregões da mão vacilante de um ébrio.

Nesses exemplos de descobertas sherlockianas encontra-se magistralmente


resumido o método semiótico que consiste basicamente em formular a explicação
hipotética de um conjunto, de uma situação ou deu um quadro geral a partir da
observação e da “leitura” de pormenores aparentemente marginais ou irrelevantes.
Embora possa haver equívocos, a hipótese pode dar certo, pois a leitura e a
interpretação dos pormenores e indícios apoiam-se em regras gerais acerca da
experiência humana. A força do método sherlockiano/semiótico reside no fato
de que o investigador não precisa em nem mesmo deve estar presente à situação,
mas tem de sobretudo saber interpretar os dados de que dispõe. Trata-se mais de
percepção (perceber é “capturar através de”) do que de uma visão direta dos fatos.
De fato, Sherlock percebeu a ida de Watson ao correio ou o desleixo do irmão
através dos pormenores (torrão de terra avermelhada no sapato, arranhões na
caixa do relógio) observados e interpretados à luz de regras ou de uma “lógica”
a respeito da experiência humana. Para o conhecimento, não se trata, pois, de ver
os fatos, mas de percebê-los e saber interpretá-los. O que interessa a Sherlock – e à
Semiótica, é claro! – não é propriamente o visível mas o inteligível.

A Semiótica é exatamente isto: decifrar o “grande” (embora sem vê-lo)


através do “pequeno”. O semioticista deve formular as hipóteses ou conjecturas
que possibilitem o deciframento das situações, dos comportamentos, dos
pensamentos e do discurso, com base na observação de pormenores (que podem
ser índices, símbolos ou ícones) interpretados a partir de um quadro lógico sobre
a experiência humana. O “pai” da Semiótica, Charles Sanders Peirce, chamou tal
procedimento metodológico de abdução, fartamente ilustrada nos ensaios de O
Signo em Três com o clássico exemplo dos feijões:

Regra: Todos os feijões deste saco são brancos.


Resultado: Estes feijões são brancos.
Caso: Estes feijões provêm deste saco.

200
TÓPICO 3 — ANÁLISE TRICOTÔMICA

Peirce distingue a abdução da dedução e da indução, pois enquanto estas


apontam para algo que deve ser ou que é de fato operatório, a abdução (tal como
no “saldo de probabilidades” sherlockiano) “sugere meramente algo que pode
ser” (O Signo de Três, p. 202). Esse pode ser mostra a fecundidade da investigação
semiótica. Como um detetive, o semioticista formula hipóteses criativas que
vão engendrando outras hipóteses e conduzindo aos “play of musement” de
Peirce (jogo de meditação ou de ruminação), conforme Thomas Sebeok em
“Um, Dois, Três, Uberdade Desta Vez”, ensaio introdutório de O Signo de Três.
O termo uberdade indica com precisão a tarefa que Peirce atribuiu à Semiótica:
construir prognósticos sobre a experiência humana e, particularmente, sobre a
nossa conduta futura, a partir da interpretação dos índices, símbolos e ícones que
envolvem o indivíduo. O método semiótico da “prognosticação” é poeticamente
ilustrado por Sebeok, ao evocar o famoso “a criança é o pai do homem”, de
Wordsworth (citado por Machado de Assis em Memórias Póstumas de Brás Cubas).
Mas os jogos de ruminação ou as abduções “úberes” e criativas já tinham sido
praticadas por Auguste Dupin, o sagaz detetive criado por Edgar Allan Poe (Os
Crimes da Rua Morgue), como bem observa Nancy Harrowitz, em “O Arcabouço do
Modelo Detetive”, nono ensaio de O Signo de Três. Para Harrowitz, Poe é o criador
da “raciocinação” detetivesca, um verdadeiro devaneio ou ruminação acerca de
indícios aparentemente insignificantes. Para os “detetives” Sherlock, Dupine e
Peirce, a observação do pormenor é de fundamental importância. A ideia de que
o “pequeno” conduz ao “grande” está impecavelmente sintetizada na frase “Deus
se esconde nos detalhes”, de Flaibert e Warburg, citada em epígrafe no texto
“Chaves do Mistério: Morelli, Freud e Sherlock Holmes”, de Carlo Guinzburg,
quarto ensaio de O Signo de Três. Nesse brilhante trabalho, Guinzburg aponta o
paralelismo entre Sherlock, Freud e o historiador e crítico de pintura Giovanni
Morelli, “baseado na apreensão de detalhes marginais e irrelevantes enquanto
chaves reveladoras” (p. 96). Para Morelli, o pormenor insignificante é revelador
na medida em que, como dificilmente pode ser falsificado ou camuflado, deve
conduzir à revelação do conjunto a que pertence. Outro não é o procedimento
de Freud, ao deter-se nos pequenos lapsos de memória ou de linguagem para
explicar, por exemplo, o esquecimento dos nomes próprios em A Psicopatologia
da Vida Cotidiana. Como oportunamente assinalam Thomas e Jean Umiker
Sebeok em “Você Conhece o Meu Método”, segundo ensaio do livro, não é mera
coincidência o fato de que o Dr. Joseph Bell, o médico que inspirou Conan Doyle
na criação de Sherlock, tenha insistido, em seus diagnósticos e prognósticos,
no valor incalculável do “infinitamente pequeno” (p. 44 de O Signo de Três). A
partir da percepção arguta do “pequeno”, a investigação semiótica é uma tarefa
criativa e poética, o antídoto a que recorria Sherlock para combater a estagnação
e a “rotina monótona da existência”. Com efeito, é a ruminação, é o devaneio,
é a “raciocinação” que nos levam a uma geração de sentidos prenhes de outros
sentidos que nos permitirão sempre prognosticar.

201
UNIDADE 3 — SEMIÓTICA E PERCEPÇÃO VISUAL

É a semiose infinita, de Umberto Eco, que pode nos transportar do realismo


“sem graça” do cotidiano para a esfera poética dos prognósticos engendrados
pelos “play of musement”. Daí o erro de Zadig, de Voltaire, que, por não saber
ater-se à sua inteligente abdução sobre as características de um cavalo e caiu no
mundo “real”; conforme a luminosa observação de Umberto Eco, em “Chifres,
Cascos, Canelas” (último ensaio de O Signo de Três), quando foi instado pelos
oficiais do rei a justificar a sua hipótese sobre o desaparecimento do cavalo, Zadig
responde que nada podia dizer, pois não tinha visto o animal (apesar de tê-lo
descrito à perfeição), o que leva os guardas a puni-lo por considerar Zadig ladrão
e mentiroso. Os guardas não sabiam a diferença entre um prognóstico semiótico
e uma situação concreta do mundo real; Zadig, por sua vez, foi punido, porque,
como observa ironicamente Umberto Eco, traiu a Semiótica, trocando o inteligível
pelo visível.

Vale observar então que o título O Signo de Três não é só uma alusão aos três
semioticistas (Sherlock, Dupin e Peirce) mas também uma homenagem ao método
detetivesco de Peirce, todo ele baseado em relações triádicas, como os três termos
das abduções, a conexão entre ícone, símbolo e índice, ou a relação signo/objeto/
interpretante. Já O Signo dos Quatro, de Conan Doyle, se deve a quatro nomes
(Jonathan Small, Maomé Singh, Abdullah Khan e Dost Akbar) escritos num velho
papel e que podem servir de pista para decifrar o mistério de desaparecimento do
Capitão Morstan, pai da Srta. Morstan que desesperadamente tinha recorrido a
Sherlock, como o único capaz de descobrir o paradeiro do capitão.

Para ampliar o escopo da investigação semiótica seria útil ao leitor


conhecer a teoria semiológica do belga Éric Buyssens (Semiologia e Comunicação
Linguística, pela Editora Cultrix), também baseada na observação e interpretação
de indícios.

Para concluir, eu diria que o leitor sairá recompensado da leitura de O


Signo de Três, pois Umberto Eco, Thomas Sebcok e seus companheiros acabam nos
mostrando, de modo sedutor, o que é e para que serve a Semiótica: é a ciência do
deciframento do mundo e serve para garantir a nossa liberdade de percepção e
de pensamento, na medida em que pode manter acesa a consciência dos signos,
índices, ícones e símbolos que nos envolvem e com que podemos ser manipulados.

FONTE: BLIKSTEIN, Izidoro. Semiótica: uma ciência de... detetives. Revista USP, p. 161-166.
Disponível em: https://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/25944/27675. Acesso em: 9 out.
2020.

202
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Cabe ao projetista coletar os dados e as informações do mercado para dar a elas


expressão em seus produtos.

• Como primeiridade estamos falando das qualidades do mundo, dos fenômenos


que nos chegam aos sentidos e só em sentir já nos dizem, já nos representam
algo, já se fazem signo.

• Na secundidade, esses fenômenos que nos chegam aos sentidos nos fazem
ensejar particularidades, fazer comparações com o que já temos em nossa
experiência, com as coisas do mundo.

• Na terceiridade tudo que nos tocou os sentidos, que nos fez pensar, ganha valor
cultural, ganha relações arbitrárias para que possamos assumir e legitimar o
signo nesse terceiro nível.

• Três momentos: observar, ensejar particularidades/singularidades do que


está sendo observador, e assumir conclusões é base para a construção de
conhecimento.

CHAMADA

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pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

203
AUTOATIVIDADE

1 “O produto diz de si próprio: suas qualidades e características, o seu modo


de produção, o que serve, para quem se dirige” (NIEMEYER, 2003, p. 15). A
partir da leitura desse texto, avalie as asserções a seguir e a relação proposta
entre elas:

I- Cabe ao projetista coletar os dados e as informações do mercado para dar


a elas expressão em seus produtos.

PORQUE

II- Os projetistas configuram seus objetos de maneira que eles devam mostrar
seus atributos. No campo das artes os atributos estéticos ganham destaque,
enquanto no design, por mais que o estilo (a estética) tenha certa persuasão,
os atributos utilitários ganham destaques.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa
correta da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma
justificativa correta da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

2 “Sígnico, o mundo está em constante transformação, adquirindo


ressignificações, segundo as diferentes culturas e épocas, porque as
fronteiras espaço-temporais são diferenciadas em cada lugar e em cada
momento dado de sua historização” (RIBEIRO; SANTOS, 2018, p. 79).

A partir da leitura desse texto, avalie as asserções a seguir e a relação proposta


entre elas:

I- Os fenômenos estão relacionados com seus contextos, por mais que


estejamos a frente de um fenômeno já experenciando e conhecido, sempre
é bom lembrar que, por ser a segunda vez que o experenciamos isso, já faz
diferença, pois não é a primeira.

PORQUE

II- Somos levados a ter sempre a mesma interpretação de um fenômeno que


não mudou. Por exemplo, um livro – ele como objeto não muda, então
não importa quantas vezes podemos lê-lo, sempre vamos ter a mesma
interpretação.

204
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa
correta da I.
b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma
justificativa correta da I.
c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) ( ) As asserções I e II são proposições falsas.

3 Ao analisarmos a obra de Portinari, vamos assumir o caminhar processual


das categorias, partindo da primeiridade, passando pela secundidade e
chegando à terceiridade. E um determinado momento vamos nos posicionar
para apontar o que objetos na obra são icônicos, indiciáticos e simbólicos,
dentro da relação do objeto como signo, por I que representam (ícone);
II que representam (índice) e III que representam (símbolo).

Assinale a alternativa CORRETA que completa as lacunas corretamente no


texto apresentado:
a) ( ) I- Por normatizarem a coisa. II- Se assemelharem a coisa. III- Por indicarem
a coisa.
b) ( ) I- Por normatizarem a coisa. II- Por indicarem a coisa. III- Se assemelharem
a coisa.
c) ( ) I- Se assemelharem a coisa. II- Por indicarem a coisa. III- Por normatizarem
a coisa.
d) ( ) I- Por indicarem a coisa. II- Se assemelharem a coisa. III- Por normatizarem
a coisa.

4 As categorias da semiótica ajudam a entendermos como acontece o processo


de percepção de um objeto. Apresente a sequencialidade explicando cada
uma delas.

5 Em uma análise semiótica, com base na tricotomia do objeto, temos o


ícone, índice e símbolo. As relações icônicas se fazem por semelhança, as
simbólicas por convenções culturais, mas as indiciáticas são resultados
da incerteza, as possibilidades lógicas de representação. Apresente um
exemplo de referência indiciática num objeto de design.

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REFERÊNCIAS

BAXTER, M. Projeto de produto: guia prático para o design de novos produtos.


São Paulo: Blücher, 2011.

DONDIS, D. A. Sintaxe da linguagem visual. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

ECO, Umberto. O nome da rosa. Rio de Janeiro: Record, 1986.

GREIMAS, A. J.; COURTÉS, J. Dicionário de semiótica. 2. ed. São Paulo: Contexto,


2011.

NIEMEYER, L. Elementos de semiótica aplicados ao design. Rio de Janeiro: 2AB,


2003.

OLIVEIRA, S. R. e. Imagem também se lê. São Paulo: Rosari, 2004.

PEIRCE, C. S. Semiótica. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2005.

RIBEIRO, A. G.; SANTOS, L. R. dos. Retirantes, menino morto e enterro na rede


de portinar: um recorte histórico social e semiótico do nordeste brasileiro. In:
SIMÕES, D.; C.; C. M. de C. (Orgs.). Discussões e aplicações da semiótica de
extração peirciana. Rio de Janeiro: Dialogarts, 2018. p. 77-115.

SANTAELLA, L. A teoria geral dos signos: como as linguagens significam as


coisas. São Paulo: Pioneira, 2002.

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