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Aula 10

Mangues: relevos formados de


lama que sustentam vidas

Jorge Soares Marques


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Meta

Demonstrar que as características físicas e biológicas dos mangues re-


sultam de intensa interação entre processos continentais e costeiros.

Objetivos

Esperamos que, ao final desta aula, você seja capaz de:

1. explicar a importância dos mangues;


2. identificar as principais características de um manguezal;
3. descrever como são mobilizados os sedimentos no ambiente
de mangue;
4. argumentar por que os mangues são ambientes com
grandes fragilidades;
5. identificar as causas que interferem na existência e evolução dos frá-
geis ambientes constituídos por manguezais.

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Geomorfologia Costeira

Introdução: que importância tem um mangue?

Assim como a restinga, a identificação do mangue está fortemente


associada ao seu tipo de vegetação, que é muito peculiar. Porém seu am-
biente físico também possui características marcantes, dentre as quais se
destacam seu relevo e seu material constituinte.
Antes de apresentar as características de um mangue e os processos
que atuam em sua dinâmica, é importante abordar aspectos que lhe têm
atribuído valor ao longo do tempo, fazendo exemplificações relativas ao
litoral brasileiro.
Um primeiro aspecto que sempre chama a atenção em um mangue
é a presença de sua lama escura e mal cheirosa, que aparece quando
ocorre uma baixa-mar. Outros se referem às dificuldades de locomoção
em seu interior e à existência de condições propícias para o desenvolvi-
mento de insetos nocivos, como os mosquitos, que podem ser vetores
de diversas doenças.
Esses ambientes costeiros, no século XIX e em grande parte do sé-
culo XX, foram muito estigmatizados como locais sem maior serventia.
Assim, muitos deles se tornaram depósitos de lixo e entulhos, enquanto
outros foram aterrados ou drenados por obras de saneamento. Acredi-
tava-se que, com essas práticas, esses lugares lodosos e fétidos seriam
eliminados e teriam algum aproveitamento urbano.
Entretanto, os mangues, ao longo do tempo, ganharam também al-
guns valores diferentes. A presença de enxofre concentrado nas lamas
atribuiu-lhes propriedades medicinais, e elas passaram a ser usadas no
tratamento de doenças de pele. No passado, em algumas regiões, prin-
cipalmente situadas no interior de baías sob o domínio de marés, sur-
giram hospedarias para pessoas que buscavam conseguir a cura com o
uso das lamas ali encontradas.
Até a década de 1960, antes do agravamento da poluição nas baías da
Guanabara e de Sepetiba (estado do Rio de Janeiro), existiam ali locais
como o saco do Jequiá, na Ilha do Governador, e a praia de Sepetiba, que
eram frequentados por doentes em busca de tratamentos.

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Banho de lama imperial

Talvez o exemplo mais interessante desse valor agregado às lamas


dos mangues tenha sido o caso de D. João VI. Após sua chegada ao
Rio de Janeiro, no início do século XIX, o Rei, por conselhos mé-
dicos, passou a ir à praia, no bairro do Caju, para tratar de doenças
em sua pele, com a aplicação de lama sobre o corpo. No local, para
melhor atender às necessidades do rei, foi construída uma “casa de
banhos”. Essa casa, que hoje é tombada pelo patrimônio histórico,
após ser restaurada, passou a sediar o museu da Companhia de
Limpeza Urbana (Comlurb) da cidade do Rio de Janeiro.

Halley Pacheco de Oliveira

Figura 10.1: Casa de Banho de D. João VI, hoje transformada em


museu da Companhia de Limpeza Urbana (Comlurb) da cidade do
Rio de Janeiro.
Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Casa_de_Banho_D._Jo%C3%
A3o_VI_no_Caju.jpg

É interessante lembrar que essa área, com o posterior crescimen-


to da cidade, passou a ser local de despejo de lixo. Durante mais
de um século, o lixo da cidade do Rio de Janeiro foi jogado ali,
gerando uma pequena montanha cuja origem antrópica é sabida
por poucos. Entende-se, com isso, por que a Comlurb ficou res-
ponsável pelos terrenos do local.

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Geomorfologia Costeira

Outros valores atribuídos aos mangues se devem à extração de lenha


e à coleta de caranguejos.
A lenha tinha como destino sua queima para o consumo domiciliar
e para atividades produtivas, como as relativas aos engenhos e olarias.
Com a contínua e ampla devastação da mata atlântica, passou a haver
dificuldades na obtenção de madeira para diversos usos. Assim, durante
longos períodos, a vegetação de muitos manguezais, mais próximos às
áreas ocupadas pelas populações litorâneas, foi degradada, por se tornar
alternativa para suprir a falta de lenha.
Por sua vez, o caranguejo sempre foi visto como alimento e como
pequena forma de obtenção de renda para a subsistência das populações
mais pobres das áreas litorâneas. Sob o ponto de vista alimentar, é uma
rica fonte de proteínas.

Pancrat

Figura 10.2: O caranguejo-uça (Ucidescordatus) é um crustáceo co-


mestível de grande ocorrência no litoral brasileiro.
Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Ucides_cordatus_Martinique.JPG

Hoje, sua coleta ainda é importante para a subsistência em muitos


lugares do litoral, porém, visando à venda para demandas de maiores
volumes, a atividade se concentra nos grandes manguezais, onde os
níveis de poluição ainda não existem ou não se apresentam de forma
restritiva. A valorização de pratos típicos em grandes restaurantes, em
centros urbanos, tem demandado uma intensa captura de caranguejos e
até mesmo estimulado sua criação em cativeiro.

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Em Gargaú, distrito de São Francisco do Itabapoana (RJ), existem


pequenas criações do animal, em fundos de quintais, nas casas de pes-
cadores na beira dos mangues. Essas iniciativas foram incentivadas pelo
crescimento da demanda, que, inclusive, veio do Nordeste, região para
qual se têm notícias de exportação de caranguejos vivos por avião.
Hoje, é notório que o crescimento sem controle da coleta de caran-
guejos e a poluição dos mangues são fatores que restringem a manuten-
ção sustentável dessa atividade, muito importante para a sobrevivência
de populações pobres do litoral.
Considerados, por muito tempo, áreas problemáticas e sem valor,
pertencentes ao governo da União, os mangues acabaram se tornando
locais de aterros públicos, para usos diversos, e de invasões por popu-
lações marginalizadas, sem recursos para ter suas moradias em melho-
res terrenos. Em várias capitais, casas rudimentares, construídas sob a
forma de palafitas, formaram enormes favelas desprovidas de mínimas
condições de infraestrutura e saneamento básico. Observe as Figuras
10.3 e 10.4.

Figura 10.3: Ocupação de áreas de mangue: casas sobre palafitas. Itapagipe,


Baía de Todos os Santos (BA).
Fonte: Google Earth

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Geomorfologia Costeira

Figura 10.4: Parte sul da vila de Barra de Itabapoana, em São Francisco


do Itabapoana (RJ). Todas as casas nesse local foram construídas sobre o
mangue existente na foz do rio Itabapoana (lado direito da imagem). Os pinos
vermelhos indicam áreas ainda ocupadas pelo manguezal.
Fonte: Google Earth

Mas, afinal, além do que foi apresentado, qual o papel de um mangue


na natureza?
O mangue é um ambiente de transição entre o mar e a terra, que pode
ser considerado um dos principais berçários da vida no planeta. É um
importante ecossistema, no qual há grande produtividade de matéria
orgânica. Nesse ambiente, diversos processos físicos e químicos ocor-
rem e interagem com processos biológicos responsáveis pela existência
e desenvolvimento de inúmeras espécies de vida terrestre e aquática.
O início da segunda metade do século XX foi marcado pelo reconhe-
cimento da existência e da dimensão assumida pela poluição ambiental
no planeta. Disso resultaram diversas ações no sentido de preservar a
natureza, procurando soluções para resolver os problemas criados pelas
atividades humanas.
A partir dessa época, as preocupações com a situação e a amplia-
ção dos problemas ambientais, locais e planetários passaram a merecer
maior atenção no âmbito das legislações e das políticas ambientais.

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Assim, houve mais incentivos para a busca por um maior nível de


conhecimento sobre os sistemas ambientais e, consequentemente, por
melhorias nas condições de vida e pela criação de meios de preservar
ecossistemas importantes.
Nesse contexto, os manguezais tiveram seus valores evidenciados e
foram considerados ambientes importantes a serem conservados.

Você sabe como as lamas


sustentam vidas?

Se quiser conhecer melhor um importante valor do mangue para


a vida do homem, o livro Geografia da fome, de Josué de Castro, é
um bom começo. Trata-se de uma obra clássica e indicada como
obrigatória no conhecimento da Geografia brasileira. Nela tam-
bém está presente o caranguejo catado nas lamas dos mangues, que
se transforma em alimento capaz de sustentar populações pobres.

Atividade 1

Atende ao objetivo 1

Quando pessoas passam próximo a um manguezal, muitas pensam que


é algo sujo e sem importância, já que é um ambiente com odor ruim e
cheio de lama escura. Devido a esse pensamento, muitos manguezais
são utilizados como lixões ou aterrados para a construção de habitações.
Agora que você já descobriu a importância desses ambientes, crie uma
propaganda que mostre à população o papel dos manguezais tanto para
a manutenção do meio ambiente quanto para a economia.

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Geomorfologia Costeira

Resposta comentada
Nem tudo o que reluz é ouro e nem tudo o que é feio é ruim.
Por trás da horrível aparência causada pela presença da lama e de um
desagradável cheiro, esconde-se algo muito benéfico para a natureza e,
consequentemente, para o homem.
No mangue existe um processo de reciclagem muito importante. É onde
se concentra matéria orgânica, morta ou inerte, que, por decomposição,
libera grande quantidade de elementos químicos necessários para sus-
tentar novas vidas.
Os mangues são considerados berçários, pois oferecem condições pro-
pícias para o desenvolvimento de muitas espécies marinhas, que irão
povoar as áreas costeiras. Esse povoamento é importante para manter as
atividades pesqueiras e, com elas, a oferta de alimentos para a população.

Mangues, apicuns e marismas Apicum


Apecuou apicu, derivado
A origem dos mangues, apicuns e marismas está diretamente ligada do tupi apekum. Coroa de
à existência das marés. Eles se fazem presentes nas faixas entre a prea- areia entre o mar e a terra
firme, banhada por águas
mar e a baixa-mar. salgadas (somente durante
a ocorrência de níveis de
Mangues e apicuns ocorrem nas áreas de clima tropical úmido, entre preamar mais altos); brejo
de água salgada à beira do
o Equador e os trópicos, onde, mesmo no inverno, as temperaturas es- mar; alagadiço dos brejos;
caminho arenoso entre
tão sempre acima dos 20ºC. Veja a Figura 10.5. banhados e alagadiços.

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Chandra Giri
Figura 10.5: Locais de ocorrência de mangues no litoral dos continentes.
Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki//File:World_map_mangrove_distribution.jpg

No Brasil, os mangues e apicuns estão presentes do litoral do Amapá


até o de Santa Catarina.
Os marismas típicos são característicos de litorais localizados em
médias e altas latitudes. Seu ambiente físico é bastante semelhante ao
dos manguezais, apresentando, também, diferenças internas, relacio-
nadas às variações no nível de salinidade e no tempo e frequência da
inundação de suas áreas. No litoral brasileiro, estão presentes em Santa
Catarina e no Rio Grande do Sul. Sua vegetação é de pequeno porte,
com o predomínio de espécies herbáceas.

Wojsyl

Figura 10.6: Marisma com sua vegetação de pequeno


porte.
Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Cepkeliu_
marsh.jpg

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Geomorfologia Costeira

Características gerais de mangues

Como será visto e caracterizado mais adiante, os apicuns não ocor-


rem junto a todos os mangues, mas, quando existem, embora tenham
aspectos peculiares, estão intimamente associados e integrados ao am-
biente dos manguezais. Por isso, ao se procurar conhecer os mangues, já
se estarão incorporando alguns conhecimentos que também se aplicam
aos apicuns.
Além de suas características relacionadas às marés e ao clima, o man-
gue constitui-se em um ambiente de deposição que, para se desenvolver,
deve estar em uma área abrigada da ação das ondas, ter água salgada
ou salobra e disponibilidade de sedimentos finos e de matéria orgânica.
A mistura entre a água doce e a água do mar também é uma carac-
terística dos ambientes denominados estuários, que podem existir em
diferentes escalas de tamanho. Condições estuarinas são encontradas
em baías, lagunas, canais ou na foz de rios.

Estuários são ambientes de deposição de sedimentos que con-


têm um corpo de água litorâneo de pouca profundidade, no qual
ocorrem, por circulação, misturas de águas fluviais e marinhas.
Eles são submetidos, principalmente na sua parte mais interna, à
maior influência de marés do que de ondas.
Dilce de Fátima Rossetti (2008) assinala a existência de várias de-
finições para estuários, ressaltando que as mais utilizadas desta-
cam a importância da interação de processos fluviais e marinhos.
Assim como outros autores, ela mostra também que os estuários
se formam quando da subida do nível do mar, por afogamento de
baixos vales ou cursos fluviais.
Nessa concepção, as atuais baías, que antes eram planícies flu-
viais, foram inundadas, e a foz dos rios passou a ter uma
forma mais em V, com sua porção junto ao mar mais larga, afuni-
lando-se para o interior.

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Os mangues podem ocupar extensas áreas, formando grandes uni-


dades ambientais. Manguezais de enormes dimensões estão relaciona-
Planícies de maré dos às chamadas planícies de maré. Elas ocorrem em litorais baixos,
Relevo de topografia onde existem grandes amplitudes de marés e uma vasta disponibilidade
relativamente plana, com
declividade bastante suave de sedimentos. Rios que levam grandes volumes de água e sedimentos
em direção ao mar. Essas para o mar, como o Amazonas (Figura 10.7), também são responsáveis
áreas são pantanosas,
cobertas pela água do pela formação desse tipo de planície e pela presença de largas faixas de
mar durante as marés
enchentes e descobertas
manguezais ao longo do litoral das regiões tropicais úmidas.
durante as marés vazantes.
São recortadas por canais
de maré e tendem a ser
recobertas pela expansão
da vegetação.

Figura 10.7: Litoral do estado do Amapá - ilha de Maracá (a maior) e ilha de


Jipioca (a menor). Ao longo desse litoral, raso e com grandes amplitudes de
maré, transitam e são depositados sedimentos trazidos pelo rio Amazonas.
Na imagem, a cor bege indica a presença de áreas mais rasas com lamas e
sedimentos em suspensão. Com a descida das marés, extensos baixios ficam
emersos na faixa litorânea.
Fonte: Google Earth

Os sedimentos dos manguezais têm composição e propriedades bem


específicas. Areias finas, siltes e, principalmente, argilas e matérias orgâ-
nicas compõem-nos, sendo comumente denominados lamas orgânicas.
Em áreas de clima tropical com temperaturas elevadas, a grande
quantidade de matéria orgânica nos sedimentos está sujeita a ter sua
decomposição acelerada. Instalam-se condições inerentes aos ambien-
tes fortemente redutores, ou seja, devido a reações químicas e biológicas
que são aceleradas pelo calor, são liberados os elementos componentes
das substâncias orgânicas. Essas substâncias são originadas do todo ou
de parte dos corpos de animais e vegetais mortos e de restos orgânicos
liberados dos vegetais ou produzidos pelos animais.

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Geomorfologia Costeira

Esses elementos químicos podem se manter isolados ou formar no-


vas substâncias agregadas nas lamas. Podem, ainda, permanecer no lo-
cal onde foram depositados ou sair, incorporando-se nas águas ou no
ar. Muitos desses elementos são nutrientes que, disponibilizados nas
águas, permitem uma grande reprodução e desenvolvimento de micro-
-organismos, os quais são a base da cadeia alimentar dos manguezais.
Durante um verão muito quente, ao se passar ao lado de um mangue
em momento de maré baixa, com suas lamas expostas ao sol durante
algum tempo, certamente será sentido um forte e desagradável cheiro
de ovo podre. Tanto no ovo quanto no mangue, esse cheiro é resultado
de uma reação química que une hidrogênio a enxofre, formando o gás
sulfídrico (H2S).

Figura 10.8: O cheiro desagradável que o mangue exala durante a maré


baixa, quando está muito calor, resulta da liberação de gases provocada
pela decomposição da matéria orgânica contida na sua lama.

Outra reação importante é a que incorpora sal nos sedimentos. Isso


acontece porque a lama, com suas argilas e matérias orgânicas, ao ser
exposta após a descida da maré, tende a continuar saturada de água sal-
gada, salvo quando chove ou ocorre evaporação em sua superfície. Essa
evaporação atua quando há uma forte insolação, que pode ser ampliada
se a temperatura local já estiver alta e se houver vento retirando o ar que
já absorveu umidade. A repetição desse processo, envolvendo marés e

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evaporação, promove a acumulação do sal. No caso da chuva, a água que


chegou à superfície, se estiver exposta, diluirá esse sal, que, em parte,
sairá com ela ao escoar para o mar.

Atividade 2

Atende ao objetivo 2

1. Descreva a imagem a seguir, relacionando o que é encontrado nos lo-


cais marcados pelos pinos coloridos a aspectos e características ligadas
ao ambiente de mangues.

Figura 10.9

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Geomorfologia Costeira

2. Estabeleça as relações entre as colunas a seguir, levando em conta que:


• referem-se às características dos mangues e dos ambientes onde
são encontrados;
• apenas um item da primeira coluna se relaciona com dois da segunda.

a) mangue (  ) baixo vale afogado


b) ambiente de estuário (  ) médias e altas latitudes
c) planície de maré (  ) concentração de sal
d) evaporação (  ) vegetação de maior porte (tamanho)
e) marisma (  ) área quase plana sem vegetação
(  ) temperaturas acima de 20ºC

Resposta comentada
1. A área refere-se à baía de Sepetiba, que é um ambiente estuarino. Essa
baía existe em função da subida do nível do mar, que afogou um baixo
vale fluvial e propiciou a formação da restinga de Marambaia.
A imagem mostra a parte mais interior da baía. Nela, a influência da
maré será maior, portanto é uma área de dissipação de energia. Con-
sequentemente, é uma área de deposição, com águas salobras, devido à
presença, também, de rios que ali deságuam.
O pino verde indica a presença da ocupação urbana local de Sepetiba,
bairro da cidade do Rio de Janeiro. À sua frente, há uma praia abrigada
– típica de baía (pino 1) – formada por duas partes: uma arenosa e outra
lamosa (pino 3), ficando esta exposta durante as marés baixas.
Seguindo a linha da costa para nordeste, os pinos 4 indicam rios que
deságuam na baía, responsáveis por trazerem águas doces e sedimentos,
com matéria orgânica, que se depositarão no litoral.
Os pinos 2 e 5 indicam a presença de um mangue com uma parte lamo-
sa (pino 2), exposta durante a maré baixa, e outra com vegetação típica
(pino 5).

2. Ordem correta: b-e-d-a-c. O mangue é um ambiente típico de áreas


tropicais, portanto, existe em lugares com temperaturas elevadas (mais
de 20ºC). Nele se desenvolvem vegetações que podem atingir níveis

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arbóreos. Com a subida do nível do mar, baixos vales fluviais foram afo-
gados, formando baías onde águas doces se misturam a águas salgadas,
criando ambientes estuarinos.
As planícies de marés são áreas que estão sendo entulhadas pela de-
posição de sedimentos, tendo superfícies quase planas constituídas por
locais lamosos e/ou arenosos, quase sem vegetação. Quando em marés
baixas, as lamas orgânicas dos mangues, saturadas de água com sal, são
submetidas a um forte calor, pela exposição ao sol. Tal fato ocasiona a
evaporação, provocando a precipitação do sal que vai se acumulando
no solo.
Marismas são também áreas pantanosas, presentes em locais de médias
e altas latitudes, apresentando vegetação de baixa altura.

Todos os aspectos físicos até agora apresentados são importantes


para entender como vive e se desenvolve a vegetação nos manguezais
que, por sua vez, participa de forma efetiva na dinâmica ambiental, con-
forme será visto mais adiante.
Nei de Mello Rivello (1999), entre outros autores, apresenta os man-
gues a partir da adoção de uma classificação que os divide em três com-
partimentos fisionômicos: lavado, arvoredo e salgado, sendo que este
último corresponde ao chamado apicum.
Segundo essa classificação, o lavado é a área dos terrenos mais bai-
xos do mangue, desprovidos de vegetação, com sedimentos superficiais
menos compactados. É a parte que mais fica coberta pelas águas do mar,
mesmo em marés com menor amplitude. Enquanto as outras partes do
mangue tendem a só crescer verticalmente, o lavado, com o aumento da
sedimentação, tende a se expandir em direção ao mar.
Já o arvoredo, que vem em sequência à área do lavado, é onde se
desenvolvem as espécies vegetais mais representativas dos manguezais.
Sua área de ocorrência se limita entre os valores médios, mais altos, de
preamares de sizígia e os valores médios, mais baixos, de preamares de
quadratura. Há, localmente, maior produção de sedimentos de origem
orgânica e crescimento vertical do terreno, mesmo com maior compac-
tação desses sedimentos.

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Geomorfologia Costeira

Figura 10.10: Manguezal no litoral de Pernambuco. Nesta imagem, você


pode observar o lavado (parte submersa) e o arvoredo, com árvores (Ri-
zophoras) e suas raízes aéreas.
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Manguezal_penambuco_2.jpg

A flora dos mangues, em todo o mundo, não é composta por grande


quantidade de espécies. A salinidade dos solos e a constante saturação de
seus poros pela água, que impede a penetração do ar (oxigênio), criam
condições restritivas para o desenvolvimento de vegetais variados.
No Brasil, algumas espécies se destacam pela dimensão das áreas
que ocupam e pelas suas constantes presenças nos manguezais de todo
o litoral:
• Mangue vermelho ou sapateiro (Rhizophoramangle): ocorre na parte
mais baixa do mangue, em contato mais constante com a água do mar.
De seu tronco descem inúmeras raízes que o ajudam a se fixar. Por esse
aspecto, é a espécie que, por sua presença, permite mais facilmente
identificar a ocorrência de um ambiente de mangue (Figura 10.11).

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Ulf Mehlig
Figura 10.11: Exemplares de
mangue vermelho (Rhizophora-
mangle) de grande porte.
Fonte : https://commons.wikimedia.
org/wiki/File:Rhizophora_trees.jpg

• Mangue preto ou siriúba (Avicenniaschaueriana): é uma espécie que


tolera altos níveis de salinidade. Como adaptação a essas condições,
desenvolveu raízes respiratórias (pneumatófaros), que chegam a se
posicionar acima do nível das maiores marés. Nelas existem poros
que viabilizam trocas gasosas com o ambiente e, em seu interior, há
espaços para armazenar ar (Figura10.12).

Peripitus
Douglas Meyer

Figura 10.12: A. Detalhes da siriúba (Avicenniaschaueriana), mostrando suas


folhas e frutos. B. A Avicennia marina, da mesma família da siriuba, é encon-
trada na Austrália.
Fonte: A) http://www.ufrgs.br/fitoecologia/florars/open_sp.php?img=2329 e B) https://
commons.wikimedia.org/wiki/File:Avicennia_marina_var_resinifera_-_globe_derby.jpg

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Geomorfologia Costeira

• Mangue branco ou mangue manso (Lagunculariaracemosa): é consi-


derada vegetação pioneira, sendo encontrada no interior do mangue
e em áreas de transição para ambientes de restingas. Como as demais
plantas que habitam os mangues, também possui dispositivos que
auxiliam no controle do excesso de sal. A espécie possui glândulas
secretoras em suas folhas, que permitem eliminar o sal absorvido
(Figura 10.13).

Ulf Mehlig
Figura 10.13: Detalhes do mangue branco ou manso (Laguncularia racemo-
sa). B. Laguncularia racemosa.
Fonte: A) http://pt.wikipedia.org/wiki/Mangue-branco#mediaviewer/File:Laguncularia_
racemosa.jpg e B) http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/8/8e/Mangrove_in_
la_manzanilla.jpg

Manguezais: educar para proteger

Aprender mais sobre o meio ambiente é o primeiro passo para


ajudar a protegê-lo. Conheça melhor os importantes aspectos
ecológicos e sociais relativos aos manguezais, a partir da publi-
cação da Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Rio de Ja-
neiro denominada “Manguezais: educar para proteger”, que está
disponível em: http://www.mma.gov.br/estruturas/sqa_pnla/_ar-
quivos/manguezais.pdf.

Além da vegetação, os mangues possuem uma diversificada fauna,


que se beneficia de sua estrutura, capaz de criar nichos e dar abrigo a
muitas espécies em seus estágios iniciais de crescimento.

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Características gerais dos apicuns

O apicum, ou salgado, é a área mais interior e mais alta do mangue. É


a que fica por menos tempo recoberta pela água salgada, pois é a última
a ser atingida pelo preamar. Além disso, suas áreas mais interiores só são
alcançadas pela água do mar quando acontecem marés de valores mais
elevados. Seus terrenos mais superficiais são compostos por areias finas,
que se apresentam de forma mais compactada. Por ficarem mais tempo
expostas ao ar, tendem a concentrar mais sal. Quando chove, podem
ocorrer lavagens verticais que conduzem o sal e a matéria orgânica para
o interior do solo.
A vegetação nos apicuns é esparsa e de menor porte, composta, prin-
cipalmente, de herbáceas. Isso se deve às condições de alta salinidade
local. Sua parte mais interior é a que mais tende a se transformar em
terreno continental.

Nem todos os manguezais têm apicuns em suas posições mais


interiores.

O município de Apicum-Açu, no estado do Maranhão, possui exten-


sos manguezais, nos quais são encontrados apicuns, fato que deu ori-
gem ao seu nome (Figura 10.14).

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Geomorfologia Costeira

Figura 10.14: O litoral do município de Apicum-Açu (MA) é coberto por man-


guezais. As áreas claras no interior dos mangues (verdes) são canais e apicuns.
Fonte: Google Earth

Características da dinâmica ambiental e


aspectos morfológicos dos mangues

A formação dos mangues ocorre pela deposição de sedimentos em


áreas de clima tropical úmido e pela atuação e interação das ações flu-
viais e das marés.
Os rios trazem água doce e sedimentos para o mar. Desses sedimen-
tos, os mais grossos – como as areias – depositam-se no entorno ime-
diato da embocadura dos rios. Os mais finos e leves, como argilas, siltes
e matéria orgânica, são levados pelo fluxo fluvial para mais adiante e se
misturam com as águas costeiras, podendo se espalhar nelas.
O volume de água dos rios depende do regime fluvial. Existem
épocas de cheia em que a vazão é maior e, consequentemente, há uma
maior quantidade de sedimentos sendo transportada e depositada no
ambiente litorâneo.
Um confronto permanente de forças se dá entre o fluxo fluvial e a
maré, que também traz matéria orgânica para o ambiente estuarino.
Com a maré baixa, o fluxo fluvial avança, levando mais sedimentos finos

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para o mar. Com a subida da maré, o fluxo se retrai e os sedimentos


finos são empurrados de volta para o litoral.
Ao serem analisados esses confrontos, é necessário levar em con-
ta as dimensões envolvidas nesse movimento de águas. De um lado, o
porte dos rios com suas vazões variando ao longo do ano (de valores
menores e mais frequentes aos momentos de grandes cheias). Do outro,
a variação diária do nível das marés e a variação, ao longo do tempo,
desses valores.
Célia Regina de Gouveia Souza e outros autores (2005) chamam a
atenção para as diferenças de comportamento das marés em função do
valor de suas amplitudes, maiores ou menores, ao longo dos litorais, e
não apenas das suas locais variações diárias. Lembram que, no Brasil,
ocorrem micromarés (menores) nas costas sul e sudeste, mesomarés
(médias) na leste e em parte da nordeste, e macromarés (maiores) na
norte e em parte da nordeste.
Ainda para os autores, é importante considerar que, embora a gera-
ção de correntes seja mais significativa nas macromarés, em todas elas
Pelitos ocorre deposição, em lâminas, de areia e pelitos, a cada descida e subida
Denominação de da maré.
caráter geral dada aos
sedimentos constituídos Esses comportamentos criam os padrões hidrodinâmicos que, em
de argilas e siltes.
cada local, misturam águas e distribuem sedimentos.
Mesmo não sendo predominantes nos ambientes estuarinos, as ações
das ondas também estão presentes neles, interagindo, mantendo sedi-
mentos em suspensão e criando correntes ao longo da linha do litoral.
A deposição do material em suspensão ocorre por processos de flo-
culação, que consistem na agregação das partículas finas, criando, as-
sim, um material mais pesado, que se precipita.
Com esses processos, a sedimentação aumenta nesses ambientes,
principalmente quando estão em reentrâncias costeiras. A deposição vai
diminuindo a profundidade e agregando sedimentos na linha do litoral,
que tende a avançar em direção ao mar. A superfície dos mangues tende
a crescer verticalmente e as áreas de seus lavados também crescem hori-
zontalmente em direção ao mar (Figuras 10.15 e 10.16).

346
Geomorfologia Costeira

Figura 10.15: Samarinda, costa leste da Indonésia, estreito de Macáçar. Inte-


ração entre processos fluviais e marés. O rio traz sedimentos para um ambien-
te em que há efetiva ação de marés. O resultado do processo é o crescimento
do continente em direção ao mar (progradação) e, sobre os sedimentos depo-
sitados, há o crescimento dos mangues. Dos pinos vermelhos para a direita
está, aproximadamente, delimitada a área em que ocorre crescimento dos
mangues em direção ao mar.
Fonte: Google Earth

Figura 10.16: Litoral sul de Bangladesh. Interação entre processo fluvial e


maré. Crescimento da área de mangue a partir da chegada dos sedimentos
fluviais. Os pinos vermelhos delimitam, aproximadamente, a área do cresci-
mento do litoral em direção ao mar.
Fonte: Google Earth

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Atividade 3

Atende ao objetivo 3

Responda às perguntas abaixo:


1. Quais são as condições que limitam o crescimento de muitas espécies
de vegetais no mangue?

2. Por que os apicuns concentram sal?

3. Por que os rios não trazem sempre o mesmo volume de águas


e sedimentos?

4. Qual a diferença entre uma micromaré e uma macromaré? E como


elas influenciam na mobilização dos sedimentos dos mangues?

5. O que acontece com a chegada de mais sedimentos no estuário e para


onde eles vão?

Resposta comentada
1. O crescimento de variadas espécies vegetais no mangue se dá pelas
características dos seus solos: o fato de estarem ora recobertos de água
e ora expostos ao ar, de serem compostos por lamas orgânicas que ab-
sorvem sal e de serem altamente saturados de água impede seus poros
de conter ar.

348
Geomorfologia Costeira

2. Os apicuns concentram sal pois são áreas alcançadas somente pelas


maiores marés, ficando mais expostas ao calor e aos efeitos da evapora-
ção, o que permite o constante acúmulo de sal no solo.
3. Tanto o volume de água quanto o de sedimentos, que contém maté-
rias orgânicas, dependerão da vazão dos rios, que varia em períodos de
vazantes e de cheias.
4. A diferença entre micro e macromarés está na amplitude da maré.
Com maiores amplitudes, as macromarés ocupam litorais mais largos e
mobilizam maior volume de sedimentos do que as micromarés.
5. Os sedimentos, principalmente os mais finos, tendem a se espalhar
nas águas por toda a área estuarina. Isso aumenta sua deposição, fa-
zendo crescer a superfície dos mangues, vertical e horizontalmen-
te, e acelerando o entulhamento do estuário, o que vai diminuindo a
sua profundidade.

Como já foi visto em aulas anteriores, o mar é o nível de base da


drenagem continental. Quando a maré desce, são criados, no lito-
ral, fluxos de água em direção ao mar, tanto em sua superfície quanto
na subsuperfície.
Nessa situação, os fluxos superficiais são similares ao fluxo de um
rio correndo, fazendo erosão remontante, ou seja, levando, com a água,
os sedimentos mais finos. Tal ação faz com que esses fluxos formem e
aprofundem os seus canais. Com esse aprofundamento, os canais po-
dem agregar águas dos fluxos subsuperficiais, que estão se deslocando
na mesma direção, e aumentar seu poder erosivo.
Quando a maré sobe, vem remobilizando e arrastando sedimentos
em direção ao litoral, podendo tampar muitos dos canais que foram
formados quando a maré esvaziou. Se o canal não for bloqueado, na
próxima maré baixa, ele será reutilizado, sendo assim mantido, e poderá
crescer e se juntar a outros canais.
Gradativamente, o mangue vai sendo recortado pela drenagem que,
além de poder se ampliar, vai estabelecendo um formato, um padrão.
O tipo de sedimento local, a inclinação do terreno, o volume de água
a drenar e o desnível produzido pela variação do nível de maré são

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condicionantes que definirão o padrão da rede de drenagem e, conco-


mitantemente, a forma do relevo que o terreno possuirá.
Uma vez estabelecidos esses canais, o relevo do mangue vai sendo
definido e a maré, subindo, avançará pelos canais mais rapidamente em
direção ao continente.

Durante a subida da maré, a presença de canais emersos ou sub-


mersos facilita o avanço das águas do mar, sob a forma de cunhas
salinas, para o interior do continente.

Esses canais também apresentam comportamentos similares aos ca-


nais fluviais. Ao migrarem lateralmente, fazendo sinuosidades, eles pro-
duzirão erosão em uma das margens e deposição na outra. Na prática,
estão revolvendo os materiais depositados anteriormente, facilitando a
saída dos sedimentos finos e a permanência dos maiores, mais grossos,
durante a descida das marés.
Com esse processo, os sedimentos são selecionados, criando uma
gradação vertical, com os mais grossos embaixo e os mais finos em
cima, e uma gradação horizontal, com os sedimentos mais grossos na
parte mais interior do mangue e os mais finos mais próximos dos níveis
de marés baixas.

350
Geomorfologia Costeira

Figura 10.17: Costa oeste da península da Flórida (Estados Unidos). Padrão


de drenagem de uma área de mangue. Observa-se também a sinuosidade dos
canais que, por erosão lateral, retrabalham os sedimentos já depositados. Na
imagem fica evidente uma área sem e outra com vegetação de mangue. Do
mar em direção ao interior, os sedimentos tendem a ficar mais compactados
e grosseiros.
Fonte: Google Earth

Cuidado! Areia movediça nos mangues

Eventualmente, em alguns mangues que se desenvolvem nos bai-


xos cursos fluviais, podem ocorrer depressões que acumulam
sedimentos muito finos, extremamente saturados de água e sem
nenhuma vegetação. Esses lugares são perigosos e devem ser evi-
tados, pois possuem as mesmas características de areia movediça.
Qualquer animal ou pessoa que, inadvertidamente, tentar entrar
neles, em poucos segundos afundará, como uma pedra que cai na
água, correndo risco de morte, pois não adianta saber nadar.

A vegetação também funciona ativamente no processo de sedimen-


tação nos mangues, produzindo material que será incorporado aos se-
dimentos. É o caso de folhas, galhos e troncos que caem e se juntam aos

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siltes e às argilas. Além disso, os troncos e raízes também funcionam


como obstáculos para a circulação de águas, diminuindo sua velocida-
de, o que provoca a deposição dos sedimentos transportados.
É interessante mencionar que restos de animais e, principalmente,
o conjunto de folhas, flores, frutas, galhos e troncos que caem da ve-
getação formam uma camada de matéria orgânica, em decomposição,
sobre o solo. Essa camada, que é muito desenvolvida em matas tropicais,
recebe a denominação de serapilheira. Nos mangues ela se agrega rapi-
damente às lamas do topo dos solos.
Peixes, crustáceos, moluscos, aves, insetos e até mamíferos que vivem
no ambiente de mangue geram biodetritos. Além disso, muitos animais
marinhos começam sua vida ali e, abrigados, iniciam seu crescimento,
migrando, posteriormente, para outras áreas do mar, onde deixam, tam-
bém, restos orgânicos agregados aos sedimentos.

Os mangues e as variações do nível do mar

Como você já aprendeu, as variações do nível do mar promovem


mudança no comportamento dos processos marinhos e na posição da
linha dos litorais.
A origem dos mangues é anterior ao Quaternário. Desse perío-
do até os dias de hoje, eles ocuparam diferentes posições promovidas
pelas variações do nível do mar, incluindo as mais recentes, ocorridas
no Holoceno.
Depósitos sedimentares antigos, incluindo os de mangue, permitem
obter dados e informações que ajudam a fazer reconstituições paleoge-
ográficas e, assim, mostrar a evolução de ambientes. Trabalhos como
esse são importantes para avaliar e entender os ambientes atuais, com as
heranças que trazem do passado, e para projetar cenários futuros.

352
Geomorfologia Costeira

Conhecendo mais a evolução


na Baía de Guanabara

No livro Baía de Guanabara e ecossistemas periféricos: homem


e natureza (1997), de Elmo da Silva Amador, o autor apresenta
descrições paleogeográficas da Baía de Guanabara. Essa é uma
referência importante para entender como o local se transformou
em um ambiente estuarino que contém mangues, onde, nos últi-
mos 500 anos, um novo fator – o antrópico – promoveu também
profundas alterações.

O futuro dos mangues

O reconhecimento da importância dos mangues abriu caminhos


para estimular políticas que visem à sua conservação. Entretanto, muitos
deles já necessitam de trabalhos de recuperação, principalmente aqueles
próximos de grandes centros urbanos. Isso acontece não apenas no Bra-
sil, mas em quase todos os países localizados nas faixas intertropicais.
Essas iniciativas buscam corrigir problemas ligados às ações huma-
nas, como aterros e dragagens, que, há muito tempo, têm promovido a
degradação de manguezais. Outro fator de degradação reside na polui-
ção produzida pela chegada e deposição, nesses ambientes, de materiais
e substâncias provenientes de esgotos e lixos domésticos e industriais.
Além desses problemas, o novo desafio colocado diz respeito às mu-
danças ambientais, que trazem como consequência a elevação do nível
do mar. Para os mangues atuais, os efeitos dessas mudanças são situações
de afogamento, que comprometerão a existência da vegetação nas faixas
que forem atingidas. Em alguns locais, novos mangues podem aparecer
e, em outros, podem ser deslocados mais para o interior do continente.
Para atuar nas duas situações, é necessário conhecer mais as
características do local, assim como avaliar as alterações que os
processos sofrerão.

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Amplie seu conhecimento


sobre os mangues

No endereço a seguir, você encontrará informações sobre diver-


sos aspectos relativos aos mangues, divulgados pelo Ministério
do Meio Ambiente, além de alguns projetos de proteção aos man-
guezais, apoiados por ele:
http://www.mma.gov.br/biodiversidade/biodiversidade-aquati-
ca/zona-costeira-e-marinha/manguezais.
Para conhecer mais sobre sistemas aquáticos, incluindo os man-
gues, consulte:
http://www.ecologia.ib.usp.br/portal/index.php?option=com_co
ntent&view=article&id=70&Itemid=409.
E, para assistir a um vídeo sobre os mangues do litoral do Paraná,
acesse:
http://meioambiente.culturamix.com/ecologia/manguezais.

Atividade final

Atende aos objetivos 3 e 4

1. Por que os fluxos superficiais de água no mangue, que correm para o


mar, podem aumentar de velocidade?

2. Por que a cunha salina pode ser importante na mobilização


de sedimentos?

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Geomorfologia Costeira

3. Atualmente, fala-se muito em criar barreiras nas desembocaduras dos


rios para reter materiais flutuantes (como madeiras, sacos de lixo e gar-
rafas plásticas) e, assim, reduzir a poluição das baías. Se não existirem
barreiras, o que a maré, nesse ambiente estuarino, poderá fazer?

4. Por que a subida ou descida do nível do mar pode matar a vegetação


de mangue?

Resposta comentada
1. Conforme a maré vai baixando, aumenta-se a diferença entre o nível
das águas que estão no continente e o nível do mar. Quanto maior for
esse desnível, mais forte será o efeito da gravidade, acelerando o fluxo
das águas.
2. A cunha salina existe em função da diferença de densidade entre duas
massas d’água. Quando a maré sobe, a água salgada, mais densa, avança
mais rapidamente pelo fundo, levando os sedimentos para o interior
dos mangues, principalmente pelos canais existentes.
3. Qualquer material flutuante em um ambiente dominado pelo proces-
so de maré poderá ser levado para fora do ambiente estuarino quando a
maré baixar, e ser levado e depositado em praias e mangues quando ela
encher. A vegetação do mangue, com seus troncos e raízes, facilitará a
retenção desses materiais.
4. Com a subida ou a descida do nível do mar, mangues existentes pode-
rão, respectivamente, ficar permanentemente submersos ou emersos, o
que determinará a morte de sua vegetação.

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Resumo

Até parte do século XX, os mangues eram considerados lugares sem


valor. Só a partir da necessidade de melhor conhecer esses ambientes e
resolver os crescentes problemas de poluição ocorridos neles, sua im-
portância passou a ser reconhecida.
Nesta aula, foi visto que os mangues são locais de transição entre o mar
e o continente e que sua existência depende, diretamente, da interação
entre as marés e os rios, sob condições de clima tropical úmido.
Foi destacada a existência de mangues nas áreas tropicais, das lamas
orgânicas que os formam, das condições salinas que subdividem seu
ambiente, dos lavados e dos arvoredos, e de suas vegetações característi-
cas. Foram também descritos os apicuns, que ocorrem em terrenos mais
arenosos e se posicionam junto aos mangues de lamas, e os marismas,
que ocorrem em áreas de climas mais temperados e com vegetação de
menor altura, estando, no Brasil, presentes nos litorais de Santa Catari-
na e do Rio Grande do Sul.
Os mangues foram associados às planícies de maré e aos estuários, sen-
do identificada sua presença em baías, lagunas, canais e rios. Essa asso-
ciação existe pois eles são considerados ambientes de deposição, onde
predominam ações de processos de maré e onde as águas são salobras.
Ainda sobre os mangues, foram apresentadas: características físicas rela-
cionadas à natureza dos materiais que constituem suas lamas orgânicas;
características biológicas relacionadas aos animais e vegetais que habi-
tam ou frequentam esses ambientes, ampliando o volume de matéria
orgânica dos sedimentos; aspectos da dinâmica relacionados à chegada
dos fluxos de água e sedimentos dos rios e à movimentação de subida e
descida das marés. Tais aspectos envolvem a movimentação de água e
sedimentos em ambientes estuarinos, o desenvolvimento da drenagem
continental e as ações de remobilização de sedimentos.
Foi visto ainda que, ao longo do tempo, as variações do nível do mar
afetaram o posicionamento e a existência de mangues. Alguns podem
deixar de existir, outros aparecem e outros avançam ou recuam na linha
do litoral.
Concluiu-se que, nas últimas décadas, mesmo reconhecendo-se a impor-
tância dos ambientes de mangues, eles passaram a sofrer mais interven-
ções antrópicas, como aterros e dragagens, assim como passaram a re-
ceber e acumular, em maior volume, materiais e substâncias poluidoras.

356
Geomorfologia Costeira

Informações sobre a próxima aula

O assunto da próxima aula será a ação eólica e as dunas litorâneas.

Referências

AMADOR, E. da S. Baía de Guanabara e ecossistemas periféricos: ho-


mem e natureza. Rio de Janeiro: edição do autor, 1997. 539 p.
CASTRO, J. de. Geografia da fome. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1961.
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CHRISTOPHERSON, R. Geossistemas: uma introdução à Geografia Fí-
sica. Porto Alegre: Bookman, 2012. 728 p.
FERRI, M. G. Vegetação brasileira. São Paulo: Livraria Itatiaia, 1980.157 p.
HADLICH, C. M.; UCHA, J. M. Apicuns: aspectos gerais, evolução re-
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gia, Curitiba, v. 10, n. 2, 2009. p. 13-20.
MENDES, J. C. Elementos de estratigrafia. São Paulo: T. A. Queiroz/
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RIVELLO, N. de M. Repovoamento do manguezal: rio Piraquê – Pedra
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ROSSETTI, D. de F. Ambientes costeiros. In: FLORENZANO, T. G.
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SOUZA, C. R. de G.; SUGUIO, K.; OLIVEIRA, A. M. dos S.; OLIVEI-
RA, P. E. de. Quaternário do Brasil. Ribeirão Preto: Holos, 2005. 378 p.
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WEBER, W. (Org.). Ambiente das águas no estado do Rio de Janeiro. Rio
de Janeiro: Planágua-Semads/ GTZ, 2001. 228 p.

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