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Durante muitos anos o combate à pobreza foi considerado um assunto acessório, onde
o crescimento económico concentrava as prioridades das agendas à escala mundial
sendo a preocupação fundamental para o desenvolvimento dos países. Até finais do
século XX a pobreza estava associada à falta de recursos económicos e às privações que
derivam desta, sendo que a solução para o problema passava pelo crescimento
económico e por ações que pontualmente iam sendo desenvolvidas. As ações de
combate à pobreza estavam então assentes num modelo segmentado, assistencialista
e reativo de respostas avulsas, baseadas na minimização de danos. Com falta de rigor,
não necessitava, portanto, de intervenções sistematizadas por parte da sociedade, o que
não permitia eliminar as causas estruturais da pobreza.
Novas formas de pobreza vieram agora afirmar-se e agravar uma situação que em
alguns anos apresentou ligeiras melhoras. Estas coexistem com as desigualdades que
aumentaram entre os países, as classes sociais e as pessoas. Hoje sabemos que a pobreza
(e a exclusão social) não são fenómenos apenas característicos dos países mais pobres e
que têm um caráter multidimensional.
Em 2013 o Banco Mundial estabeleceu uma nova meta para acabar com a
pobreza: que não exista mais de 3% da população mundial a viver com apenas
1,90 dólares por dia até 2030, tendo posteriormente acrescentado em adenda que
não somente o rendimento per capita diário e o acesso a serviços básicos são
determinantes da pobreza, mas também aspetos como a fome, a discriminação e a
exclusão social.
Apesar de tudo o que foi feito até então, com uma sucessão de políticas sociais pela
Europa e pelo Mundo, a verdade é que a pobreza persiste, as causas estruturais da
pobreza não foram resolvidas; as pessoas continuam pobres e vulneráveis. Na verdade,
o que está em causa são múltiplas dimensões. Não é um caminho a dois, ou a três. Por
essa razão não se consegue falar em pobreza sem falar nas desigualdades.
Segundo a OXFAM (2018), no final da última década, mais 700 milhões de pessoas
poderiam ter saído de uma situação de pobreza extrema se tivessem existido políticas
concertadas de redução das desigualdades, e não apenas de redução da pobreza.
Segundo dados publicados pelo Eurostat, cerca de um em cada cinco cidadãos (21,9%)
da União Europeia, correspondendo a 96,5 milhões de pessoas, encontrava-se em risco
de pobreza ou de exclusão social, registando um aumento de 21,1% em relação a
2019. Portugal situa-se nos 20%, revelando a existência de cerca de dois milhões de
pessoas em risco de pobreza e exclusão social.
Porém todos estes dados foram recolhidos e tratados antes do início da pandemia.
Sabemos que a pandemia de COVID-19 piorou todas as situações e as pessoas mais
vulneráveis foram as mais atingidas, com o aumento do desemprego e o agravamento
das condições de vida. Conhecemos o seu impacto abrangente e a realidade do
aumento generalizado dos preços dos bens, da habitação e o aumento dos combustíveis
que afeta toda a sociedade, acentuando as fragilidades sociais.
A Estratégia
Que linhas são as orientadoras para um instrumento esperado ser inovador, inclusivo e
de resposta eficaz face à mudança rápida no contexto da crise social e económica gerada
pela COVID-19?
Mas será esta uma estratégia duradoura e coerente com o contexto europeu e outras
estratégias de âmbito nacional, com contributo um contributo para a proteção das
pessoas mais vulneráveis, nas atuais transições verde e digital a decorrer?
Será também importante refletir porque, sendo o sexto eixo estratégico “Fazer do
combate à pobreza um desígnio nacional”, o ODS 1 – Erradicar a Pobreza, em Portugal
não é considerado um dos prioritários? Os ODS prioritários para Portugal são os ODS
4 (Educação de qualidade), 5 (Igualdade de género), 9 (Indústria, Inovação e
Infraestruturas), 10 (Reduzir as Desigualdades), 13 (Ação Climática) e 14 (Proteger a
Vida Marinha). (Ministério dos Negócios Estrangeiros, 2017)
Importa por último, a realçar a importância da criação de regras sociais, defendido pela
Presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen “Um conjunto de regras que
assegure a solidariedade entre gerações. Um conjunto de regras que recompense os
empresários que zelam pelos seus trabalhadores. Que se centre no emprego e abra
oportunidades. Que coloque as competências, a inovação e a proteção social em pé de
igualdade”. (Discurso ao Parlamento Europeu, 20 de janeiro de 2021)
Não havendo estas questões resolvidas, continua a ser seguido um conjunto de (boas)
intenções, à semelhança das anteriores estratégias. E o combate à pobreza é
fundamentalmente uma questão de direitos humanos, interligando-se com todos os
vários setores, sejam políticos, económicos, sociais, ambientais ou culturais.
Continuaremos a viver numa sociedade onde a desigualdade condena e abandona os
mais pobres, onde a indiferença e discriminação se afirmam, onde não existe o respeito
pelos direitos humanos e o exercício pleno dos direitos e deveres de cidadão. E a
pobreza afeta a autoestima, afeta a dignidade do ser humano, afeta toda a sociedade. A
grande questão é que não se trata de nós e os outros. Não há um muro que nos separa.
Estamos todos interligados, conectados. Esta interdependência social e humana faz-nos
perceber o caráter sistémico da pobreza e de todos os fenómenos associados nas
nossas vidas, nas nossas famílias, na nossa sociedade.
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