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FACULDADE DE HISTÓRIA
MESTRADO EM HISTÓRIA
GOIÂNIA - GO
2019
Vinícius Felipe Leal Machado
GOIÂNIA - GO
2019
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus amigos Rodrigo Mendes Oliveira, Rodrigo Augusto Leão
Camilo, Marco Aurélio Corrêa e Enver Roger Pereira pela parceria que extrapola em
muito o universo acadêmico, apesar de ter surgido nele. Desde 2006, estudamos juntos,
sonhamos juntos e crescemos juntos, partilhando das experiências profissionais e pessoais
que nos tornaram os homens que somos hoje. Vejo vocês como os irmãos que a vida me
deu. O incentivo de vocês durante esta empreitada me fortaleceu, e espero poder retribuir
sempre que precisarem.
Por fim, o mais importante agradecimento: a Deus, que permitiu que tudo isso
acontecesse exatamente como foi. Entre os sabores e dissabores da vida, fica a certeza de
que Deus é bom o tempo todo.
Vocês que fazem parte dessa massa
Que passa nos projetos do futuro
É duro tanto ter que caminhar
E dar muito mais do que receber
This research investigates the process of creation and installation of the first state public
high school in the district of Campinas, located in Goiânia-GO. This work was conducted
from a perspective strengthened within the field of the History of School Institutions,
which presupposes that schools inevitably dialogue with the society that surrounds it in a
permanent way, constructing, in itself, and around itself, a culture of its own. This one,
in part, reflects the surrounding social reality and, in part, transforms it, emanating for the
community its influence through its constituent elements. Therefore, we sought to
understand the cultural situation in which schooling and school education developed in
the Campinas region, since it was a small village, until the creation of Ginásio Estadual
de Campinas, in 1947. Installed in 1950, the gymnasium was later renamed Colégio
Estadual de Campinas, and finally renamed, in 1961, with the name that made it famous
among Goiânia’s students and families from the 1960s onwards: Colégio Estadual
Professor Pedro Gomes. In this sense, we trace, through the history of Campinas, which
had been marked by great material precariousness in most of the time, the conditioning
factors that made the creation of this college an important modernizing landmark for the
ancient city that ceded its lands for the edification of the new state's capital. Therefore,
we present a view based on the interpretation that the understanding of the history of the
foundation of this college necessarily passes through the history of its place, being the
facts linked to the construction of Goiânia, central elements in this narrative.
Keywords: Colégio Estadual Professor Pedro Gomes. Campinas. Campininha das Flores.
School Education. Modernization.
LISTA DE IMAGENS
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 17
CAPÍTULO I - MUITO ANTES DO COLÉGIO PEDRO GOMES: AS ORIGENS DA
CAMPININHA E O DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO ESCOLAR NA
REGIÃO ......................................................................................................................... 47
1.1 - Modernidade, modernização e progresso em Goiás: considerações iniciais...... 47
1.2 - A ação propulsora da Igreja Católica como marco da instrução formal no Estado
de Goiás e do advento da educação escolar em Campinas ......................................... 60
1.3 - O povoamento da Campininha e a epopeia dos pioneiros da educação escolar na
região .......................................................................................................................... 65
CAPÍTULO II - O LUGAR DO COLÉGIO PEDRO GOMES: A CAMPININHA DAS
FLORES E A CONSTRUÇÃO DE GOIÂNIA ............................................................. 87
2.1 – A transição entre velha e a nova Campininha: 1930 faz soprar nas campinas os
ventos da mudança que os trilhos não trouxeram ....................................................... 87
2.2 – A escolhida: apesar dos pesares, um novo começo para a velha Campininha .. 91
2.3 – A expectativa vendida pelos jornais e os auspícios de uma modernidade
anunciada .................................................................................................................... 98
2.4 - Campinas no contexto dos anos iniciais de Goiânia: dos dias difíceis de cidade
falida a centro da vida social e do lazer goianiense .................................................. 106
2.5 - A construção de uma modernidade possível: a Campininha no epicentro do
discurso de progresso ................................................................................................ 118
CAPÍTULO III - O TEMPO DO COLÉGIO PEDRO GOMES: FUNDAÇÃO E
TRANSFORMAÇÃO EM MEIO AO NOVO CONTEXTO DA POLÍTICA GOIANA
(1945-1961) .................................................................................................................. 131
3.1 – A redemocratização, entre disputas e promessas: o contexto político que
possibilitou o nascimento de um ginásio estadual em Campinas ............................. 131
3.2 - A narrativa da fundação e seus personagens: o teatro político apresenta o novo
palco campineiro da educação .................................................................................. 137
3.3 – Projetos educacionais e escolas como elementos de poder e instrumentos
eleitoreiros: a quem interessava o secundário público em Campinas? ..................... 145
3.4 – A elevação do Ginásio: enfim, um colégio para Campinas! ........................... 159
3.5 – O novo nome é a cereja do bolo: quem é a pessoa que emprestou seu nome ao
colégio de Campinas? ............................................................................................... 168
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 180
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 184
ANEXOS .................................................................................................................. 192
INTRODUÇÃO
Acredito, portanto, que seja necessário, antes de qualquer outra coisa, explicar o
que levou ao desenvolvimento deste trabalho, revelando ao leitor, a relação existente entre
o pesquisador e o objeto da pesquisa. Para uma melhor organização da estrutura narrativa,
este texto introdutório abordará os tópicos descritos a seguir. Primeiramente,
desvelaremos os fatores pessoais e profissionais que concorreram para que chegássemos
à concepção da ideia inicial desta pesquisa. Em seguida, percorreremos, também, os
caminhos tomados em seu decorrer, explicitando a construção do problema que suscitou
todo este esforço, a justificativa para tal empreendimento, os objetivos idealizados e as
hipóteses que sustentamos. Apresentamos, ainda, a caracterização das “fontes”1, ou seja,
1
A concepção de fonte histórica adotada neste trabalho não corresponde à noção historicista de que o
documento escrito resguarda a exata dimensão do passado, tampouco à equivocada ideia de que a fonte,
como pode sugerir o nome, “jorra” informações que estão à espera de um intérprete. Nosso entendimento
acerca da ideia de “fonte”, como se convencionou chamar, é influenciada por Lucien Febvre, quando, em
Combates pela História, afirmou: “A história se faz com documentos escritos, quando existem. Mas ela
pode e deve ser feita com toda a engenhosidade do historiador... Com palavras e sinais. Paisagens e telhas.
Formas de campos e ervas daninhas. Eclipses lunares e cordas de atrelagem. Análises de pedras pelos
geólogos e de espadas de metal pelos químicos. Numa palavra, com tudo aquilo que, pertencendo ao
homem, depende do homem, serve o homem, exprime o homem, significa a presença, a atividade, os gostos
e as maneiras de ser do homem”. (1989, p. 249). A fim de reforçar a construção deste argumento e justificar
o uso de tais conceitos ao longo do texto, amparo-me ainda na definição encontrada no Dicionário de
Conceitos Históricos (2009), que coloca o conceito de “fonte histórica” como correlato de “documento”,
“registro” e “vestígio”, explicando que estes termos são todos apropriados “para definir tudo aquilo
produzido pela humanidade no tempo e no espaço”. Nesse sentido, quaisquer elementos componentes da
herança material e imaterial deixada pelos antepassados servem de base para a construção do conhecimento
histórico. A explanação aprofunda-se no sentido de afirmar que “o termo mais clássico para conceituar a
fonte histórica é documento”. Alerta-se, no entanto, que esta palavra deve ser empregada de forma crítica
pelo historiador, pois devido às concepções da escola metódica, ou positivista, esteve associada a uma gama
de ideias preconcebidas, significando não somente o registro escrito, mas principalmente o registro oficial.
Na historiografia contemporânea, “vestígio é a palavra atualmente preferida pelos historiadores que
defendem que a fonte histórica é mais do que o documento oficial: que os mitos, a fala, o cinema, a
literatura, tudo isso, como produtos humanos, torna-se fonte para o conhecimento da história”. (SILVA;
SILVA, 2009, p. 158).
17
os documentos e demais referenciais apreciados no conjunto constitutivo de nossa
proposta. Ademais, situamos a pesquisa no plano teórico-metodológico, enquadrando-a,
não de forma limitante, mas elucidativa, dentro dos domínios que proporcionaram os
insumos requeridos no processo de “pensar” nosso objeto. Este texto se finaliza com a
apresentação de nosso plano de redação, constituído de necessárias apresentações das
circunscrições temáticas estabelecidas para cada parte do trabalho.
Tenho uma relação especial de carinho com o Colégio Estadual Professor Pedro
Gomes. Trabalhei na instituição, como professor, desde que me graduei em licenciatura
em História, pela Universidade Estadual de Goiás, ao final do ano de 2009. Este ciclo
seguiu de forma contínua até março de 2017, quando ocorreu o meu afastamento, em
caráter de “licença para aprimoramento profissional”, concedida pela Secretaria de
Estado de Educação, Cultura e Esporte, a fim de que eu pudesse realizar o curso de pós-
graduação ao qual este trabalho encerra. Neste ínterim, a escola passou por uma de suas
muitas reconfigurações político-pedagógicas, sendo convertida, em 2013, em um centro
de ensino em período integral2, exigindo, deste modo, que seu corpo docente trabalhasse
em regime de dedicação exclusiva. Este fato tornou a permanência no ambiente escolar
cada vez mais intensa e intensiva - em quantidade e em qualidade - tanto nas relações
estabelecidas no interior da equipe, quanto em relação ao trabalho desenvolvido junto ao
2
No início do ano letivo de 2013, a SEDUCE, à época denominada “Secretaria de Estado da Educação”,
implantou o “Programa Novo Futuro” sob a justificativa de atender à crescente demanda social pela
ampliação do tempo escolar com qualidade a fim de “atender estudantes do ensino médio na perspectiva da
formação de um cidadão livre, solidário e qualificado”, em acordo com o art. 2 da Lei de Diretrizes e Bases
9.394/96. Assim, segundo a SEDUCE, os CEPI’s (Centros de Ensino em Período Integral), inicialmente
criados e regulamentados sob a Lei Estadual 17.920/2012, são pautados em um modelo pedagógico
diferenciado, o qual se baseia em “experiências de sucesso aplicadas em outros estados pelo país”. As
escolas pertencentes ao “Programa Novo Futuro” iniciam suas atividades, de segunda a sexta, às 7h30,
servem três refeições diárias, encerrando suas atividades às 17h, perfazendo um total de 45 aulas semanais
mescladas em um currículo até então inédito em Goiás, constituído por um Núcleo Básico Comum e um
núcleo de disciplinas exclusivas ao modelo, denominado “Núcleo Diversificado”. A SEDUCE informa que
o programa respondia às diretrizes do “Pacto pela Educação do Estado de Goiás”, “atendendo às unidades
de ensino com melhoria da infraestrutura, valorização do profissional e ensino de excelência”. As palavras
do órgão, afirmam ainda que “tais modificações geram profundas transformações que para se perenizarem
na rede necessitam de um processo de acompanhamento específico e especializado. O Programa Novo
Futuro tinha por função estruturar os CEPI’s e garantir a implantação e acompanhamento do programa”.
Atualmente, a Lei Estadual Nº 19.687, de 22 de junho de 2017, substitui as leis anteriores que
regulamentavam as escolas implantadas em 2013 e 2014 e denominação “Programa Novo Futuro” já não é
mais utilizada oficialmente pela SEDUCE.
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corpo discente. Desde o início desta fase, muitos colegas optaram por sair e voltar a
trabalhar em escolas “de tempo regular”, que passaram a ser chamadas, por alguns, de
“escolas/ colégios de meio-período”.
A minha opção pela permanência no Pedro Gomes, sob este modelo pedagógico,
estreitou ainda mais minha relação com a escola, seus símbolos e elementos históricos
constituintes, pois, sem dúvidas, passei a desfrutar de mais tempo para observá-los e
refletir sobre eles. Isto ocorreu, em função do aumento substancial do tempo de
permanência naquele ambiente, regido desde a mudança para CEPI, pela dinâmica de
trabalho popularmente conhecida por “horas-relógio”. Esta situação difere da realidade
de composição da carga-horária à qual muitos professores estavam acostumados até
então, conhecida como “horas-aula”. Na realidade dos CEPI’s, ficara estabelecido que os
professores deveriam estar na escola diariamente, de segunda a sexta-feira, das 7:30 às
17:00. Nesse regime de trabalho, de dedicação exclusiva a uma única escola, o quadro de
atividades de cada professor deve ser preenchido com - além do quantitativo de aulas e
seus respectivos planejamentos - atividades que não necessariamente concernem ao
exercício da docência, pelo menos de forma direta. Deste modo, o envolvimento com
atividades extraclasse, como a elaboração e organização de eventos em geral, a adequação
e decoração de espaços, como as “salas-ambiente”, dedicadas a uma única disciplina, o
aconselhamento pedagógico de alunos, conhecido como “tutoria pedagógica” e outras
atividades cotidianas, passaram a integrar a nova rotina dos professores que, assim como
eu, permaneceram integrando o grupo de trabalho da instituição.
Assim, destaco como ponto importante para a narrativa de origem deste trabalho,
o fato de que, sempre que possível, eu ter desempenhado tarefas de ajudante na
organização dos espaços que seriam atingidos pela reforma pela qual o colégio passava,
desde 2010. Muitas foram as ocasiões em que, havendo necessidade de uma sala ser
desocupada para obras, e constatando-se ali a existência de “papéis antigos”, como diziam
os funcionários, eu costumava ser chamado para participar do manuseio e remoção deles.
Naqueles momentos, “descobrimos” um grande volume de arquivos empoeirados,
aparentemente intocados há anos, com décadas de registros das atividades desenvolvidas
no colégio desde sua criação.
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inicialmente, eu ainda não sabia como poderia interpretar tais vestígios do passado.
Apenas guardava em meu íntimo um profundo respeito e vontade de conhecer e preservar
aqueles elementos da história do chão em que pisava.
Aliás, ao longo do tempo que passei naquela escola, percebi que visitas de antigos
membros dos corpos discente e docente, além de funcionários administrativos de outros
tempos e membros da comunidade vizinha, não eram fato incomum. Logo, intuí que
estava em um ambiente que fora palco muitas de vivências e que trazia à tona muitas
memórias, recuperadas nas narrativas daquelas pessoas. Para mim, isso instigava
fortemente o desejo de desenvolver as potencialidades investigativas que eu enxergava
naquele cenário. Algumas conversas informais que tive com ex-alunos e funcionários,
mesmo antes da ideia deste trabalho existir também possuem importância nesta trajetória.
3
Em “Educação e Sociologia”, Durkheim (1978) apresentou uma visão funcionalista dos processos de
educação ao envolvê-los tão somente na “formação preparatória” dos indivíduos para a vida em sociedade.
Esta visão sobre a educação - desdobrada do conceito de socialização - posteriormente estudado e redefinido
por inúmeros teóricos, foi debatida e, de forma muito profícua, abordada criticamente pelo fato de não
considerar o poder de reprodução das estruturas sociais, como forma de dominação, a partir da dissimulação
das reais funções e objetivos dos sistemas educativos formais, como observado por Pierre Bourdieu e Jean
Claude Passeron no influente livro “A reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino” (1975).
21
Deste modo, objetivava aplicar as interpretações destas leituras acerca do mundo
escolar em algo concreto: uma pesquisa, talvez. Mas como a faria? Por onde começar?
Queria decifrar aquela escola tão antiga, que permanecia, e persistia, ao longo do tempo,
em meio àquela comunidade. Sem meias palavras, o Colégio Pedro Gomes passou a me
fascinar. Inquietavam-me questões sobre a trajetória histórica da escola em que, assim
como eu fazia naquele momento, desde os anos 1950, pessoas com as mais diversas
características punham seus pés. Pessoas que estiveram ali desempenhando diferentes
funções sociais inerentes àquele espaço - o ambiente escolar - como professores,
estudantes e demais envolvidos, sem deixar de exercerem suas dimensões políticas,
econômicas e culturais, em suas múltiplas possibilidades de ação.
Os domínios da História, como dito por Ciro Flamarion Cardoso, na célebre obra
homônima organizada em conjunto com Ronaldo Vainfas, se abriram ao horizonte de
novos campos surgidos a partir de diálogos interdisciplinares entre a História e outras
ciências. Assim, novos olhares, perspectivas e recortes se lançaram sobre os mais diversos
Sobre as teorias mais modernas acerca deste problema, destaco, ainda, o entendimento de Peter Berger e
Thomas Luckmann (1973), que definiram o processo de socialização humana em dois momentos distintos
e complementares: “a socialização primária” e a “secundária”. Este segundo momento ocorre dentro dos
espaços públicos, dentre os quais a escola tem a primazia de ser, por convenção, seu local principal. Nesse
processo, se iniciam e ampliam os universos relacionais, que envolvem os professores, os colegas e a
comunidade educativa de convívio cotidiano. (BERGER & LUCKMANN, 1973).
22
gêneros daquilo que, de alguma forma, testemunhava a existência pretérita das
sociedades, grupamentos e indivíduos no transcurso do tempo. Este trabalho está situado
em um desses novos domínios surgidos a partir da complementaridade estabelecida pelas
ciências, sobretudo as que se dedicam a compreender o ser humano em seus aspectos
sociais: a História Cultural.
23
Portanto, a escolha de conceitos próprios do campo da História Cultural para a
execução deste trabalho se mostra adequada, tendo em vista que nenhuma outra
perspectiva historiográfica apresenta possibilidades interpretação dos documentos, que
constituísse meios tão favoráveis à compreensão das dimensões simbólicas e subjetivas
da existência humana, postas em ação nas relações sociais e na atuação sobre o mundo
material. As instituições escolares são partes importantes na composição das teias
culturais estabelecidas em uma comunidade. Aspectos políticos e econômicos estão
implicados em sua existência e funcionamento, deste modo, a História de um lugar é
construída a partir das relações entre pessoas e instituições, entre elas, as que são voltadas
para o ensino, a educação formal das pessoas (sobretudo os jovens). Assim, investigar a
história de uma escola ou colégio, pode ser um mergulho nas características culturais4
que se estabelecem e se transformam dentro e fora da instituição.
4 A propósito do conceito de cultura defendido por Pesavento, que se aplica à proposta deste trabalho, a
autora afirma que cultura é: o “conjunto de significados partilhados e construídos pelos homens para
explicar o mundo. Expressão da realidade que se faz de forma simbólica, ou seja, admite-se que os sentidos
conferidos às palavras, às ações e aos atores sociais se apresentam de forma cifrada, portando já um
significado e uma apreciação valorativa” (PESAVENTO, 2003: p. 15).
5 Encontramos, nas palavras de Le Goff, o rigor metodológico que nos inspirou na execução deste trabalho,
especialmente quando o autor afirma: “O documento não é inócuo. É, antes de mais nada, o resultado de
uma montagem, consciente ou inconsciente, das sociedades que o produziram, mas também das épocas
sucessivas durantes as quais continuou a viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a ser
manipulado, ainda que pelo silêncio. O documento é uma coisa que fica, que dura, e o testemunho, o
ensinamento (para evocar a etimologia) que ele traz devem ser em primeiro lugar analisados,
desmitificando-lhe o seu significado aparente. O documento é monumento. Resulta do esforço das
sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária ou involuntariamente – determinada imagem de si
próprias. No limite, não existe um documento verdade. Todo documento é mentira. Cabe ao historiador não
fazer o papel de ingênuo.” (LE GOFF, 2003: p. 538)
24
Deste modo, ao analisar os documentos escritos, do ponto de vista metodológico,
observamos os apontamentos feitos por Pesavento a respeito da corrente da cultura escrita
(PESAVENTO, 2003, p. 69-71). Segundo a autora, a perspectiva da “cultura escrita”
considera os vestígios escritos e as interpretações deles advindas, de suma importância
para a construção da narrativa que se faz sobre o passado. Portanto, na pesquisa, buscamos
enfatizar os estudos na produção, função e usos sociais dos textos, bem como seus
sentidos implícitos e explícitos. Assim, ao analisar os documentos, antes de qualquer
aprofundamento específico, as questões básicas que orientaram nossa leitura preliminar
foram: “Quem fala?”; “De onde fala?”; “O que se fala?”; “Como se fala?”; “Para quem
se fala?”; “Qual o a função desse texto?”
6
A respeito desta ideia, nos amparamos nos escritos do professor e pesquisador francês Bruno Delmas,
quando este afirmou: “Conservar seus arquivos é um ato indispensável. Eles são o produto necessário do
funcionamento de toda sociedade organizada. Quanto mais uma sociedade se desenvolve, mais as
atividades humanas são numerosas, diversificadas e interdependentes. Quanto mais documentos são usados
para que os homens registrem seus atos assegurem a sua continuidade e estabeleçam relacionamentos
duráveis entre si, mais eles produzem e conservam arquivos. [...] O acúmulo de relações cada vez mais
densas e amplas aumenta de forma exponencial as necessidades e usos de documentos precisos para agir,
negociar e viver. Os arquivos aumentam proporcionalmente a isso.” (DELMAS, 2010. p. 19-20).
7
Neste sentido, o historiador, e teórico da arquivística estadunidense, Theodore Roosevelt Schellenberg,
elaborou um entendimento com o qual compactuamos: “Um documento pode ser útil por vários motivos.
25
Entre as fontes documentais escritas, destacamos neste trabalho, também, os
textos de leis e projetos de lei, de alguma forma, vinculados à narrativa que buscamos
compor. A utilização deste tipo de fonte se fez necessária à guisa de ilustração e extração
de informações que possibilitassem a contextualização política do desenvolvimento de
Campinas, de Goiânia e de Goiás, bem como a trajetória do ensino público nestas
localidades e, por fim, da própria trajetória do Colégio Pedro Gomes. O uso de
documentos desta tipologia, em nossa pesquisa, também nos permitiu acrescentar uma
apreciação crítica sobre o caráter oficial de tais documentos a despeito da disparidade
notória, muitas vezes observada, entre eles e a realidade, dada a inconsistência na
aplicação de algumas das leis elencadas neste trabalho.
O valor que um documento contém, devido ao testemunho que oferece da organização e funcionamento da
administração, pode ocasionalmente ser o mesmo que o valor derivado de sua informação sobre pessoas,
coisas ou fenômenos.” (SCHELLENBERG, 2006. p. 182).
26
somente problemas já conhecidos, como também explorar novas áreas” (MINAYO, 2008:
p.67).
Desta forma, a pesquisa bibliográfica não é mera repetição do que já foi tornado
público. Na verdade, seu uso permite o exame do tema sob diferentes enfoques e
perspectivas, o estabelecimento de diálogos de diferentes ideias para a composição de
uma nova abordagem, muitas vezes, diferente do original, permitindo chegar a conclusões
inovadoras. Foi exatamente isto que nos propusemos a fazer, sempre que necessário, para
a construção da narrativa e das análises que compõem este trabalho.
27
seleção de palavras, especialmente adjetivos e advérbios. Assim, um mesmo fato relatado
em ata por redatores distintos, tende a ter estruturas diferentes, enfatizando elementos
diferentes de acordo com a subjetividade empregada na seleção vocabular de quem redige
o texto. A construção sequencial da narrativa, por exemplo, expressa escolhas a respeito
daquilo que mereceu uma descrição mais detalhada ou apenas uma breve citação. A
seleção vocabular também deve ser considerada como elemento marcador de época, estilo
e discurso. A escolha de adjetivos e pronomes de tratamento dão indícios da forma como
o registro pode ganhar uma forma correspondente a uma visão de quem o escreve ou
coordenou sua realização. As atas de instalação do colégio, bem como as atas de reuniões
que se seguiram, tinham o objetivo de transmitir para o papel a visão que seria tomada
como “oficial” da escola, talvez a única e definitiva, sobre o acontecimento registrado.
8
Acerca do trabalho de investigação empreendido pelo “historiador de instituições escolares”, o historiador
da educação português Justino Pereira de Magalhães teoriza: “A história das instituições educativas
constitui um processo epistêmico que medeia entre a(s) memória(s) e o arquivo, não se limitando a
memória, às dimensões orais, mas incluindo as crônicas e outros textos afins e não se confinando o arquivo
à documentação e informações escritas. Totalidade em organização e construção, uma organização
educativa não é estática, nem a percepção de conjunto se obtém a partir de uma única fonte ou de uma só
vez. Se a primeira aproximação à história de uma instituição educativa se obtém a partir de um olhar
externo, é, todavia à medida em que o historiador mergulha na sua interioridade a partir de informações
que lhe permitam uma análise sistemática sob um mesmo conjunto de fenômenos, que a história estabelece
hipóteses-problemas e esboça um sentido para as suas investigações. Uma compreensão, uma hermenêutica
que se processa de forma gradual e para a qual os primeiros contatos com o arquivo são fundamentais. O
arquivo, tal como se encontra organizado, quando o investigador inicia o seu trabalho, constitui uma
28
escola possui peculiaridades metodológicas que concernem à necessidade constante de
promover a intersecção dos elementos narrativos e discursivos inerentes às realidades
interior e exterior, identificando-as e alternando entre ampliação e aproximação do olhar
analítico.
29
educacional-escolar em Campinas, ao longo de sua existência, e na nova capital goiana,
no momento que antecede a criação da escola, na década de 1940?”; “Quais relações
políticas e socias permearam a criação e o funcionamento da instituição em seus primeiros
anos?”; “De que forma elementos condicionantes externos, como as políticas públicas,
questões sociais, econômicas e culturais impactaram sobre a dinâmica escolar?” Estes
foram alguns problemas secundários que tentamos responder ou refletir a respeito ao
longo do trabalho, por entender que possíveis conclusões acerca da questão central
necessariamente perpassavam por estas problemáticas.
9
Genesco Ferreira Bretas foi professor da Faculdade de Educação da UFG e pioneiro na implantação dos
cursos de educação na Universidade Federal de Goiás (UFG) e Universidade Católica de Goiás (UCG). Sua
obra sobre a história da instrução pública em Goiás é uma das, senão a principal referência sobre o assunto.
Este trabalho representa uma síntese detalhada da evolução do quadro educacional goiano desde o século
XVIII até o período da década de 1960. Em seu estudo, ele se aprofunda na interpretação dos papéis
desempenhados por pessoas, instituições e pelas políticas públicas adotadas para o setor, nos diversos
momentos abarcados pela obra.
10
Professora titular do Departamento de Educação da Universidade Católica de Goiás.
11
Quando estudadas, na fase inicial da pesquisa, na qual enfatizamos leituras teóricas, as palavras de Décio
Gatti Júnior reforçaram essa nossa inquietação: “De modo geral, pode-se afirmar que as escolas e o sistema
educacional, por mais heterogêneos que sejam, aparecem como localidades que não podem ser
negligenciadas como amostra significativa do que realmente acontece em termos educacionais em qualquer
país, e, especialmente no Brasil, onde as análises governamentais têm a tendência de obscurecer a
problemática real de seu sistema escolar. Nesse sentido, seja na formulação de interpretações ou análises
que deem conta do presente ou do passado, as escolas apresentam-se como locais que portam um arsenal
de fontes e de informações fundamentais para a formulação de interpretações sobre elas próprias e,
sobretudo, sobre a história da educação brasileira. (GATTI JUNIOR, 2002: p. 4)”
30
compreensão do objeto e do problema que tínhamos em mãos, bem como, ajudaram a
instrumentalizar nossas análises. Considero importante ressaltar que muitos dos autores
consultados são ligados, por suas contribuições, ao HISTEDBR (Grupo de Estudos e
Pesquisas "História, Sociedade e Educação no Brasil" da Faculdade de Educação da
Unicamp).
Portanto, comecemos do geral para o particular. Saviani (2005: p. 28) explica que,
apesar de uma aparente diversidade de significados, relativos às suas origens etimológicas
e valores semânticos adquiridos em nosso idioma12, o conceito de instituição diz respeito
a “algo que não estava dado e que é criado, posto, organizado, constituído pelo homem”,
como nos habituamos a dizer: algo instituído. O autor deixa claro que, obviamente, nem
toda estrutura criada pelo homem é uma instituição13.
12
Saviani (2005: p. 28) explica que o vocábulo “instituição” deriva do latim “institutio, onis”, possuindo
quatro significados aceitos: 1) disposição, plano, arranjo; 2) instrução, ensino, educação; 3) criação,
formação; 4) método, sistema, aglutinação temática (escola, doutrina, seita). Estas acepções, por sua vez,
geraram ideias relacionadas a ações a elas correspondentes, afirmando o amplo escopo semântico da
palavra. sendo respectivamente: 1) organizar, ordenar, arrumar; 2) educar, ensinar, instruir; 3) criar,
conceber, formar (tanto no âmbito material, quanto no imaterial); 4) aglutinar, juntar de acordo com
afinidades, sob determinado critério de classificação.
13
Sobre esta situação de aplicação do conceito de instituição, Saviani afirma: “A instituição se apresenta
como uma estrutura material que é constituída para atender a determinada necessidade humana, mas não
qualquer necessidade. Trata-se de necessidade de caráter permanente. Por isso, as instituições são criadas
para permanecer. Se observarmos mais atentamente o processo de produção de instituições, notaremos que
nenhuma delas é posta em função de alguma necessidade transitória, como uma coisa passageira que,
satisfeita a necessidade que a justificou, é desfeita. [...] como todos os produtos humanos, por serem
históricos, não deixam, em última instância de ser, também elas, transitórias. Mas sua transitoriedade se
define pelo tempo histórico e não, propriamente, pelo tempo cronológico e, muito menos, pelo tempo
psicológico.” (SAVIANI, 2005: p.28).
31
convivência adequada aos parâmetros de civilização e cidadania celebrados cultural e
legalmente, e também as condiciona para o desempenho de funções sociais relacionadas
ao mundo do trabalho. Assim, as instituições educativas são - assim como as que se
prestam a qualquer outra finalidade - estruturas essencialmente sociais, tanto na origem,
já que nascem das necessidades postas pelas relações entre as pessoas, quanto no
funcionamento, uma vez que se constituem de agentes que estabelecem relações entre si
e com a sociedade na qual se insere. Sua natureza permanente lhes impõe duas outras
características: o funcionamento dinâmico e a mutabilidade organizacional em função das
alterações das demandas sociais. Deste modo “elas não se constituem como algo pronto
e acabado”. São unidade de ação, constituídas por um sistema de práticas, seus agentes e
os meios e instrumentos por eles operados, tendo em vista a finalidade perseguida pela
instituição. (SAVIANI, 2005: p. 28)
14
Os sociólogos franceses afirmam que as escolas e demais instituições de ensino formal compõem um
sistema interligado que se ocupa da reprodução das dinâmicas sociais nas quais estão inseridas: “Todo
sistema de ensino institucionalizado deve as características específicas de sua estrutura e de seu
funcionamento ao fato de lhe é preciso produzir e reproduzir, pelos meios próprios da instituição, as
condições institucionais cuja existência e persistência (auto-reprodução da instituição) são necessários,
tanto ao exercício de sua função própria de inculcação quanto à realização de sua função de reprodução de
um arbitrário cultural do qual ele não é o produtor (reprodução cultural) e cuja reprodução contribui à
reprodução das relações entre os grupos ou as classes.” (BOURDIEU; PASSERON, 1975: p. 64)
32
“seja organizando e promovendo modalidades específicas de educação formal, seja
mantendo escolas próprias em caráter permanente. Nesse âmbito, as instituições que se
destacam nitidamente entre as demais, são, sem dúvida, a Igreja e o Estado.” (SAVIANI,
2005: p. 29)
15
Sobre isto, Saviani explica: “A palavra “escola”, como se sabe, deriva do grego e significa,
etimologicamente, “o lugar do ócio”. A educação dos membros da classe que dispõe do ócio, de lazer, de
tempo livre passa a se organizar na forma escolar, contrapondo-se à educação da maioria, que continua a
coincidir com o processo de trabalho. Vê-se, pois, que já na origem da instituição educativa ela recebeu o
nome de escola. Desde a Antiguidade, a escola foi se depurando, se complexificando, se alargando até
atingir, na Contemporaneidade, a condição de forma principal e dominante de educação, convertendo-se
em parâmetro e referência para se aferir todas as demais formas de educação. (SAVIANI, 2005: p. 31)
33
havia um elemento que se destacava no papel de agente promotor da educação, alterando
os modelos pedagógicos nos quais os processos educativos se dariam16.
Dominique Julia traz sua visão acerca do tema, em uma abordagem sócio
histórica, que apresenta um ponto de vista mais ampliado acerca do escopo do conceito.
Ele afirma que a cultura escolar não pode ser abordada sem análise precisa das relações
conflituosas ou pacíficas que ela mantém, a cada período de sua história, com o conjunto
16
O autor volta à antiguidade para fazer esta associação entre as estruturais socioeconômicas e a produção
de modelos correspondentes de educação escolar: “após a radical ruptura do modo de produção comunal,
nós vamos ter o surgimento da escola, que na Grécia se desenvolverá como paidéia, enquanto educação de
homens livres, em oposição à duléia, que implicava na educação dos escravos, fora da escola, no próprio
processo de trabalho. Com a ruptura do modo de produção antigo (escravista), a ordem feudal vai gerar um
tipo de escola que em nada lembra a paidéia grega. Diferentemente da educação ateniense e espartana,
assim como da romana, em que o Estado desempenhava papel importante da organização da educação, na
Idade Média, as escolas trarão fortemente a marca da Igreja Católica. O modo de produção capitalista
provocará decisivas mudanças na própria educação confessional e colocará em posição central o
protagonismo do Estado, forjando a ideia de escola pública, universal, gratuita, leiga e obrigatória, cujas
tentativas de realização passarão pelas mais diversas vicissitudes.” (SAVIANI, 2005: p. 32).
34
das culturas que lhe são contemporâneas: cultura religiosa, cultura política ou cultura
popular. Assim, o autor define a cultura escolar como
35
traduzindo-a para a perspectiva institucional, e construindo um conjunto de saberes que,
uma vez organizado, didatizado, compõe a base de conhecimentos sobre a qual trabalham
professores e alunos. Nas palavras do autor, a cultura escolar é o “conjunto de conteúdos
cognitivos e simbólicos que, selecionados, organizados e normalizados, sob os efeitos dos
imperativos didáticos, constituem habitualmente o objeto de uma transmissão deliberada
no contexto das escolas”. (FORQUIN, 1992: p. 47)
A propósito de toda esta discussão, aliás, convém relatar uma de nossas muitas
reflexões paradigmáticas resultantes do andamento da pesquisa. Quando este trabalho
ainda estava em sua fase embrionária, a categoria-campo da Cultura Escolar, cada vez
mais profícua na produção de pesquisas recentes em Sociologia da Educação e História
da Educação, parecia-nos ser a mais adequada para a análise que pretendíamos: conhecer
e analisar o ambiente de uma escola em determinado período, observando seus fatores
condicionantes. Ao longo do desenvolvimento do trabalho, entretanto, foi percebido que
o campo da História das Instituições Escolares permitia uma leitura da realidade escolar
sob um escopo ampliado, que poderia nos conduzir aos nossos objetivos de promover
intersecções entre a criação da escola e o desenvolvimento da cidade de Goiânia e,
especificamente, de Campinas. Enquanto nos estudos que se ocupam da Cultura Escolar,
as análises tendem a focar em elementos materiais e imateriais que atuam na construção
de uma atmosfera pedagógico-cultural própria da escola, geralmente situando-os no
espectro das práticas, representações, imaginário ou da cultura material (mobiliário,
material didático, disposição espacial), o campo das Instituições Escolares abre-nos o
leque, também, para outras abordagens investigativas não necessariamente concernentes
a questões pedagógicas, as quais, desde o início, pretendíamos extrapolar.
Outro elemento que, sem dúvidas, reforçou nossa convicção na pertinência deste
tema e objeto para a pesquisa foi a possibilidade de apresentar uma contribuição real ao
36
enriquecimento da historiografia da educação em Goiás. Do mesmo modo, também
pretendemos contribuir com a historiografia sobre Campinas e sobre Goiânia. Este
trabalho pode ser do interesse de estudiosos dos campos da História Social, da História
Urbana, da História Política de Goiás e, claro, da História da Educação e das Instituições
Escolares. Por se tratar de uma instituição responsável pela formação de muitas pessoas
ao longo de sua existência, acreditamos, também, no potencial desta obra em atingir
leitores que não atuam na área da pesquisa histórica. Ansiamos legar este trabalho
também aos antigos e atuais alunos da instituição, bem como seus professores e
funcionários de todas as épocas, assim como demais membros da rede estadual, figuras
políticas, memorialistas, escritores, jornalistas e quaisquer outros possíveis interessados.
Este trabalho goza, ainda, de expressivo ineditismo, uma vez que, no processo de
levantamento de fontes, notamos a quase total inexistência de bibliografia que possuísse
especificamente o CEPPG como objeto. O único vestígio de algo nesse sentido, ou seja,
uma obra que supostamente seria voltada, na íntegra, para o colégio, teve seu nome e
autor apenas citados pelo escritor Bariani Ortêncio em seu livro “História Documentada
e Atualizada de Campinas (1810 – 2010)”: trata-se do nominalmente mencionado “Ensaio
Monográfico do Ginásio Estadual de Campinas. Sebastião Veloso Peleja – Goiânia
(Campinas) – Goiás, 1956” (ORTÊNCIO, 2011, p. 337). Ao final de seu livro, o autor
lista a obra como um de seus referenciais bibliográficos, sem, no entanto, dar maiores
detalhes sobre seu conteúdo, nem muito menos, se aprofundar em quaisquer questões
relacionadas ao colégio. Não obstante a isso, encontramos um bom número de obras que
tratam do passado de outras instituições escolares da capital e do interior de Goiás,
merecendo nossa especial atenção, as obras que abordam a história de instituições de
importância histórica amplamente reconhecida no que se refere à história da educação
escolar no Estado, como o Liceu de Goiás e o Colégio Santa Clara17.
17
A Irmã Áurea Cordeiro de Menezes registrou as seguintes conclusões a respeito do pioneirismo desta
instituição: “Mais de uma década antes da transferência do governo, da velha capital para Goiânia, o Santa
Clara, que fora fundado em 1922, já atendia à população escolar, não só da vasta área reservada à construção
da futura capital, mas também à das regiões vizinhas. Pioneiro em Goiás, até onde nossa pesquisa pôde
alcançar, concluímos que ele foi o segundo colégio do Estado, sendo o primeiro, o das irmãs dominicanas
da cidade Goiás, a adotar o estudo em regime de internato, para meninas.” (MENEZES, 1981, p. 45)
37
constatou o professor Bretas, a primeira instituição de ensino secundário oficial a ser
instalada na nova capital, sendo que, no ano seguinte fora a vez da Escola Normal
(BRETAS, 1991, p. 579). Enfatizando a relevância que o Liceu tivera, o professor resume
a precariedade do ensino público no início do século passado em Goiás, afirmando que,
em todo o Estado, até 1929, o Liceu era a única instituição de ensino secundário. Nesse
ano o Ginásio Anchieta, de Bonfim, foi instalado e, em 1930, o Ginásio Municipal de
Ipameri achava-se ainda em fase de organização. (BRETAS, 1991, p. 576).
Diante disso, reforçamos nossa crença de que este trabalho consiste em uma
contribuição à sociedade, sustentada pela nossa constatação de que o Colégio Pedro
Gomes possuiu, desde sua criação, ao longo da segunda metade do século XX e das
décadas iniciais do século XXI, um proeminente papel no cenário educacional goiano,
sendo o ambiente escolar responsável pela formação, em nível equivalente ao secundário,
de um grande número de jovens de diferentes origens e estratos sociais. Assim, o colégio
desenvolveu uma forte relação com a comunidade circundante, determinada, em parte,
pela demanda social de uma escola com o seu perfil para a região na qual ela fora instalada
e, por outro lado, pelo relativo reconhecimento público da qualidade dos trabalhos
pedagógicos ali desenvolvidos. Assim, levantamos a hipótese de que a influência da
instituição pudesse extrapolar, em alguma medida, o alcance pedagógico intra-
institucional e, alguns momentos, alcançava, através de seus agentes, as esferas cultural,
política e econômica da cidade. Este cenário deve ser analisado como uma “via de mão
dupla”, na qual as dinâmicas políticas e sociais externas também poderiam ter forte
impacto sobre o cotidiano escolar.
38
no que diz respeito à educação escolar e à cultura material do lugar. Para isso, buscamos
apresentar os conceitos de modernidade, modernização e progresso sob o ponto de vista
de autores que promoveram análises de aspectos da sociedade goiana à luz de tais
conceitos, sobretudo no período que nos interessa. Partimos nossa investigação do
princípio de que, para que pudéssemos refletir a respeito da importância da criação do
Colégio Pedro Gomes para Campinas em 1947, era necessário conhecer todo o histórico
da educação escolar na região. Nossa tese é de que não houvera, anteriormente, instituição
escolar com inserção social equivalente à do primeiro ginásio e colégio público de
Campinas.
18
Gatti Junior nos ajuda a explicitar a relevância do trabalho desenvolvido nesta parte da pesquisa:
“Historiar uma instituição educativa, tomada na sua pluridimensionalidade, não significa laudatoriamente
descrevê-la, mas explicá-la e integrá-la em uma realidade mais ampla, que é o seu próprio sistema
educativo. Nesse mesmo sentido, implicá-la no processo de evolução de sua comunidade ou região é
evidentemente sistematizar e re(escrever) seu ciclo de vida em um quadro mais amplo, no qual são inseridas
as mudanças que ocorrem em âmbito local, sem perder de vista a singularidade e as perspectivas maiores.”
(GATTI JÚNIOR, 2002, p. 74)
39
governo estadual com as diretrizes federais da “Marcha para o Oeste”, preconizada por
Vargas.
Outro elemento comum à maioria das obras que seguem esta linha é a ênfase na
interpretação do papel desempenhado pela figura do interventor Pedro Ludovico no
contexto político pós “Revolução de 1930”: seu discurso, suas escolhas, suas ações e
ideias. Nesse ponto, Goiânia e a Cidade de Goiás assumem posição de centralidade na
construção das narrativas, uma vez que as ideias públicas e ações políticas de Ludovico
priorizavam, dentro deste contexto temático, tais locais como a origem e o destino de
todos os seus esforços.
Assim, pode-se afirmar, que estes estudos mais recentes vêm gozando, em suas
execuções, das propostas de diálogos inter e transdisciplinares e, por conseguinte,
gerando os resultados mais diversos possíveis, ampliando bastante as possibilidades de
interpretação acerca do momento histórico em questão. Muitos trabalhos situados no
campo da História Urbana, por exemplo, vêm sendo construídos em uma profícua zona
de intersecção entre a História e a Arquitetura/ Urbanismo. Estas pesquisas vêm se
encarregando de imprimir novas interpretações à construção física da cidade, se atentando
40
não somente às suas minucias arquitetônicas e estruturais, mas à compreensão do
fenômeno de ocupação e transformação do espaço como elemento simultaneamente
condicionado e condicionante das relações políticas, econômicas e sociais de seu tempo.
A 140 quilômetros dali, por uma estrada estreita, de terra e cheia de buracos,
ficava uma cidade menor e mais atrasada do que Goiás: Campinas. Poucos a
conheciam. As famílias com maior poder aquisitivo sabiam que ela podia ser
comparada, em termos de clima, a uma prima distante de Campos do Jordão,
em São Paulo: um lugar para tratar de doenças respiratórias, 700 metros acima
do nível do mar, fria e seca. Bom para abrigar tuberculosos. Uma das pioneiras
daquela que seria a nova capital. Célia Coutinho Seixo de Britto19, se curara lá,
hóspede do Novo Hotel, que depois daria lugar ao Palace Hotel. (GODINHO,
2013: p. 38)
19
Escritora, natural da Cidade de Goiás, nascida em 07 de fevereiro de 1914. Era filha de João José
Coutinho, deputado estadual, entre 1935 e 1937, e um dos fundadores da UDN em Goiás, e de Alice
Augusta de Sant’Anna Coutinho. Foi membro-fundadora da Academia Feminina de Letras e Artes de
Goiás, empossada em 09 de novembro de 1970. Foi vice-presidente da entidade por vinte e três anos, e
presidente entre 1993 e 1994, ano de seu falecimento. Célia Coutinho Seixo de Britto publicou, no ano de
1974, a obra “A mulher, a História e Goiás”, na qual apresenta a biografia de trinta e duas personalidades
femininas goianas que, no entendimento da autora, representaram, de alguma forma, a ação proeminente
das mulheres na edificação da cultura nacional ao longo da história. Foi esposa de Hélio Seixo de Britto,
médico, que, ao longo de sua vida pública exerceu as funções de Secretário de Estado da Educação e Saúde,
no governo de Jerônimo Coimbra Bueno, (1947-1951); Deputado Estadual, pela UDN, na segunda
Legislatura pós constituição de 1946 (1951-1955); Prefeito Municipal de Goiânia, também pela UDN
(1961-1966), entre outros cargos.
41
que viria a se tornar o grandioso Santuário de Trindade. A partir da vinda dos padres
redentoristas, já no final do século XIX, Campinas passou a ser lembrada e referenciada
com mais frequência em relatos de viajantes, editoriais e matérias (como nas publicações
da revista Informação Goyana) e outros escritos. Nestes casos, passaram a receber
destaque, as benfeitorias implementadas pelos religiosos, como o Convento e seus
anexos, bem como as atividades desempenhadas pelo Colégio Santa Clara. Por muito
tempo, a imagem de Campinas, para o público “de fora”, orbitou em torno da Igreja e
destas instituições católicas. A proeminência destas construções e o valor sociocultural
da Igreja para a comunidade local ficam evidentes, já que, em 1932:
Um dos únicos locais com luz elétrica em toda a região, o convento dos padres
redentoristas, parecia um oásis naquela região atrasada. Eles, que produziam
até um vinho artesanal, fizeram uma pequena barragem no Córrego Cascavel
e montaram uma pequena usina mais à frente. A água movia uma turbina que
alimentava um gerador, o que só dava para uma luzinha errática que atendia,
por poucas horas do dia, o convento, a igreja matriz, o Colégio Santa Clara e
uma ou outra casa. As festas importantes sempre tinham ligação com os santos
católicos, as mais importantes, com direito a foguetes – os fogueteiros vinham
especialmente para estas ocasiões – e fogueiras. (GODINHO, 2013: p. 38)
Por outro lado, muitos são os escritos em linguagem poético-literária sobre a vida
em Campinas a espera de estudos interpretativos de caráter científico-acadêmico. Nesse
sentido, abunda material literário, dentre os quais estão escritos de cronistas,
memorialistas, jornalistas, poetas e escritores, em geral, que podem ser elencados como
objetos de estudos e analisados à luz dos diversos matizes metodológicos provenientes da
História Cultural. A propósito, destacar a diferença tipológica existente entre os diversos
tipos de produção é importante, pois neste trabalho incorremos na análise de autores-
personagens, como Bariani Ortêncio, que é um memorialista que muito já escreveu sobre
a história de Campinas e de Goiânia. Seus escritos não observam rigor metodológico
científico, mas podem constituir rico material de análise. Outro autor que aparece, nesta
pesquisa, como objeto de análise acerca de seus escritos sobre Campinas, é o jornalista
Oscar Leal, um viajante que registrou suas impressões ao passar pelo Estado no final do
século XIX. Mais recentemente, o jornalista Iúri Rincon Godinho desenvolveu um rico
42
trabalho literário-jornalístico que aborda a transferência da capital e os aspectos humanos
marginais à historiografia oficial, envolvendo a “construção de Goiânia”. Sua obra
também foi tomada como objeto de análise neste trabalho.
Campinas deve ser, de fato, considerada como parte integrante de Goiânia a partir
do momento em que esta surge: para todos os efeitos, um de seus bairros. Porém,
determinar com exatidão quando o “modo de vida campineiro” se funde por completo ao
goianiense – e em que medida um se alimenta do outro - é arriscado, para não dizer,
impossível. Não há precisão que alcance as particularidades de processos antropológicos
tão intrincados e dinâmicos. Entre rupturas e permanências, o que temos é um processo
de permanente (re)significação identitária, muitas vezes baseado em “tradições
inventadas”, marcado pela confluência de elementos de origens distintas, em razão do
progressivo crescimento populacional da cidade. Segundo o historiador britânico Eric
Hobsbawn, as tradições tendem a se reforçar na medida em que as marcas identitárias de
uma comunidade se veem eminentemente ameaçadas pelo risco da diluição em meio ao
avanço dos agentes exógenos.
43
inovações do mundo moderno e a tentativa de estruturar de maneira (aparentemente)
imutável e invariável aspectos da vida social.
O autor alerta que, nesse sentido, “tradição” deve ser analisada de forma distinta
do “costume”, este, vigente nas sociedades ditas “tradicionais”, mas que, em certa
medida, nos ajuda a pensar a maneira como abordamos estes elementos, enquanto
conceitos associados à definição de identidade cultural, neste trabalho. A finalidade
característica às tradições, sobretudo as inventadas, é a invariabilidade. O passado a que
se referem, impõe seus modelos, que devem ser respeitados conforme estabelecido em
práticas fixas, geralmente formalizadas, resguardadas pela repetição. Já o “costume”, nas
sociedades tradicionais, tem a dupla função: “de motor e volante”. Com isto, o autor quis
dizer que, os costumes movem a comunidade para frente e, ao mesmo tempo, guia a
direção que será tomada em meio às novidades do porvir.
44
Campinas fosse criado, em 1947 e transformado no Colégio Estadual de Campinas em
1959/ 1960. Os embates político-ideológicos influenciaram até mesmo na adoção do
nome definitivo da instituição, ocorrido, em lei, em 1959, mas assumido na prática, 1961.
Aqui, sustentamos a hipótese de que a criação da escola está inserida nos processos de
modernização alardeados no discurso político a partir da década de 1930, mas que, graças
à emergência das disputas eleitorais do período democrático, finalmente avançavam de
maneira mais contundente sobre certos aspectos aguardados em Campinas, como o asfalto
e a ampliação do acesso ao prestigioso ensino secundário para os jovens do bairro. Este
aspecto, relativo à demanda social pelo ensino secundário no bairro, coloca o Ginásio,
posteriormente ampliado e elevado ao patamar de Colégio, em uma posição marcante na
história de Campinas, na qual ficou evidenciada sua importância prática (enquanto
instituição de ensino formadora de grande comunidade estudantil) e simbólica (enquanto
representante da cultura local perante o restante da cidade). Esta hipótese é sustentada
pelo fato de ter sido explorado, de forma significativa, na esfera discursiva política e
midiática, o sentimento de carência daquela população em relação às necessidades sociais
não atendidas pelo grupo rival dos criadores do colégio, no período anterior. Por isso, as
comparações com o colégio secundário trazido para Goiânia em 1937, pelo grupo de
Pedro Ludovico, o Liceu, se tornaram recorrentes, tanto no cenário do debate político,
quanto no imaginário popular. Nas décadas de 1950 e 1960, o Colégio Pedro Gomes
chegou a ficar conhecido como o “Liceu de Campinas”.
45
Weffort, na obra “O populismo na política brasileira” (1980), abrange os anos
compreendidos entre “Revolução de 1930” e o golpe civil-militar de 1964. Portanto,
interessa-nos, profundamente, o estudo dos projetos educacionais em voga naquela época,
assim como as políticas públicas voltadas para a educação, bem como sua relação com a
dinâmica imposta pelas disputas partidárias e eleitorais do período a fim de desvelar
como, exatamente, este contexto influenciou na criação e no funcionamento da
instituição.
46
CAPÍTULO I
O Colégio Estadual Professor Pedro Gomes foi fundado, através de uma lei
assinada pelo governador Jerônimo Coimbra Bueno, em 1947. Com o nome “Ginásio
Estadual de Campinas”, a instituição começou a oferecer atendimento à população no ano
de 1950, marcando o início de suas atividades letivas, que se desenvolvem até os dias
atuais, de forma ininterrupta, desde então. De lá para cá, foram muitas as transformações
sociais, políticas e econômicas que incidiram sobre a instituição, seu público, e suas
condições de funcionamento. Em mais de meio século de existência, o colégio persistiu,
tendo sua marca impressa na vida de profissionais, estudantes e famílias, atendendo à
população goiana em meio a sucessivas mudanças no sistema educacional brasileiro.
Quando o colégio foi criado, Goiânia tinha somente 14 anos e contava com um número
de habitantes estimado em um quantitativo situado entre 48.166 (1940) e 53.389 (1950)20.
Campinas, a cidade que recebera Goiânia em suas terras, era, naquele momento,
um bairro peculiar entre todos os outros da nova cidade que se expandia. Além de ser
uma região já urbanamente estabelecida desde a segunda década do século XIX – em
moldes nada planejados, em oposição à concepção original de Goiânia - possuía uma
comunidade expressiva, tanto em relação à significativa quantidade de pessoas21, quanto
20
No sítio eletrônico do IBGE não existem dados exatos sobre o ano de 1947, pois a contagem demográfica
oficial era realizada com periodicidade de dez anos em dez anos, desde que começou a ser promovida pelo
governo federal por meio de um instituto criado para este e outros fins estatísticos oficiais. A criação do
IBGE data de meados da década de 1930. Em 1934, foi criado o Instituto Nacional de Estatística - INE, que
iniciou suas atividades em 29 de maio de 1936. No ano seguinte, foi instituído o Conselho Brasileiro de
Geografia, logo em seguida incorporado ao INE, que passou, então, a se chamar, Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística. O primeiro censo organizado pelo instituto foi justamente o do ano de 1940. Antes
disso, a população do país havia sido recenseada em outras quatro oportunidades. A primeira delas foi ainda
no período imperial, em 1872, no chamado “Recenseamento da População do Império do Brasil”. Os censos
seguintes foram realizados em 1890, 1900 e 1920.
21
Assim que Goiânia foi oficializada como município, e Campinas foi submetida à condição de distrito e,
logo em seguida, bairro, no ano de 1935, a antiga cidade, figurava como o mais populoso bairro da capital.
“Em 1933, o sítio escolhido para a edificação da nova capital contava com 14.300 habitantes (absorvidos
os municípios de Hidrolândia e Campinas)” (CAMPOS, 1985, p. 53). Hidrolândia (anteriormente distrito
de Santo Antônio da Grimpas) havia sido elevada à categoria de município, desmembrado de Pouso Alto
(Piracanjuba), pelo Decreto Estadual n° 454, de 24 de novembro de 1930.
47
em relação à existência de uma identidade22 própria, marcada por elementos culturais
associados à história local, sedimentados em tradições de uma comunidade que teve sua
formação inicial datada do início do século XIX. Esta identidade peculiar pôde ser notada
logo no início dos estudos acerca do bairro, através da forma singular - certamente
carinhosa - como Campinas costuma ser chamada em textos não-oficiais que nos serviram
de fonte. Campinas era conhecida, entre seus antigos e novos moradores, como
Campininha, como mostram as inúmeras referências à região, que encontramos ao longo
de nossa pesquisa, trazendo este nome. A esse respeito, o escritor Bariani Ortêncio afirma:
O escritor, em seu estilo literário característico, expõe sua versão das prováveis
origens do “apelido”, salientando que, ao reunir documentos oficiais para sua obra
“História Documentada e Atualizada de Campinas (1810 – 2010)” não foi encontrada
nenhuma menção a essa nomenclatura. Tal fato é compreensível, por se tratar de
documentos oficiais (textos de leis, resoluções, decretos, registros eclesiásticos) e nos
permite concluir que, realmente, a forma diminutiva corresponde a uma maneira informal
de denominar o lugar, que acabou se perpetuando entre as pessoas. Entretanto, em outros
22
Ao se falar em identidade, precisamos nos debruçar sobre certos referenciais a fim de compreender como
este conceito se aplica à proposta desta pesquisa. Segundo Zygmunt Bauman (2005, p. 22-23), antes do
século XX, os debates acerca do conceito de identidade eram “unicamente um objeto de meditação
filosófica”, porém a crescente necessidade de uma compreensão antropológica que desse conta da
multiplicidade dos fenômenos ligados às crises e incertezas dos paradigmas culturais tradicionais, trouxe à
tona um grandioso esforço das ciências humanas para aprofundar este debate no âmbito dos estudos
socioculturais. Existem, nesse sentido, duas vertentes principais de teóricos que discorrem a respeito dos
sentidos atribuídos à identidade. Em uma ótica que se ocupa do indivíduo, em primeira instância, autores
como Anthony Giddens (1991), a estudiosa da psicologia social contemporânea, Maria da Graça Correa
Jacques (1998) e Pierre Bourdieu (2003) definem identidade, grosso modo, como um “conceito de si”, um
“sentimento pessoal” , ou ainda uma “representação de si” em relação à sua condição social assumida no
mundo. Esta perspectiva assinala um viés de análise que enfatiza a relação existente entre a esfera pessoal
e a identidade social, em um movimento “de dentro para fora”, que destaca a importância de atributos
específicos do indivíduo que o levem ao sentimento de pertencimento a grupos ou categorias. Outros
teóricos concebem a identidade a partir da existência de sistemas culturais que seriam baseados na
confluência de diversos componentes. Nesta linha, podemos descrever identidade como “sentimento de
pertencimento de realidades” e, mais importante para nós, neste trabalho, como “conjunto de significados
compartilhados”, como explanaram Nestor Canclini (1995), Hall (2001), Douglas Kellner (2001) e o
próprio Bauman (2005). Assim sendo, a perspectiva defendida por Start Hall nos interessa especialmente,
quando este afirma que “As identidades culturais são pontos de identificação, os pontos instáveis de
identificação, ou sutura, feitos no interior dos discursos da cultura e da História” (HALL, 1996: p. 70).
48
tipos de registros escritos que encontramos, de cunho menos formal, como textos
jornalísticos e crônicas de viajantes, encontramos o nome “Campininha”, ou
“Campininhas”, desde o século XIX, como fica explícito na descrição muito menos idílica
do local, feita por um visitante de passagem pela localidade. Vindo do Rio de Janeiro em
viagem pelo interior do Brasil, o jornalista carioca Oscar Leal23, ao passar pela região em
1890, registrou a seguinte impressão a respeito do local
Dito isto, reforçamos o fato de que este texto objetiva apresentar, ao leitor, o lugar
onde o colégio foi instalado da forma mais ampla e aprofundada possível. A partir da
investigação de elementos históricos que caracterizem os processos de formação
sociocultural de sua população ao longo tempo, buscamos interpretar como a região
recebeu a atenção do poder público em mais de um século de existência, até a instalação
da sua primeira instituição de ensino secundário mantida exclusivamente pelo Estado, o
Colégio Estadual Professor Pedro Gomes.
23
Oscar Leal foi um jornalista, prosador, romancista e teatrólogo carioca, nascido em 1862. Também
cirurgião-dentista, residiu por muito tempo na cidade do Recife, colaborando com o “Jornal do Domingo”
e “O Judarão”, ambos periódicos com circulação na capital pernambucana à época. Enviara para
publicação, em fins de 1893, a Antônio Sales, redator de “A Madrugada de Lisboa”, entre 1894 e 1896,
seus escritos aqui referidos: “Viagens às Terras Goianas”.
49
ascensão do projeto de transferência da capital encampado pelo grupo político de Pedro
Ludovico.
50
cotidiano, alterando-o de forma visível. Neste contexto, o processo de modernização seria
a experimentação da aceleração temporal disponível a todos que, especialmente no
ambiente urbano, tivessem contato com as inovações técnicas em sua vida prática. A
modernização seria, inicialmente, a vitória humana sobre as amarras impostas pela lenta
progressão do tempo da natureza e seus ciclos.
Assim, a ideia de progresso está associada a esta concepção linear (e, muitas
vezes, acelerada) do tempo, que (sempre) avança, deixando para trás o que fora
inexoravelmente superado. É, portanto, a força motriz do movimento de oposição que
afasta o antigo e o novo, ao passo que o antigo se torna sinônimo de arcaico, enquanto o
novo, de moderno. Tal ideia já estava presente, ainda de que modo conciliador, século
XVIII, como mostram as palavras do filósofo e religioso, abade Jean Terrasson, em texto
de 1754, trazido ao nosso conhecimento por Jacques Le Goff:
24
Segundo Koselleck, o sentido da modernidade ensejado pelo desejo pela modernização e o entusiasmo
com o progresso só puderam se firmar socialmente quando a cultura europeia assumiu uma postura de
expectativa por um futuro realmente “novo” e “infinito”. Nas palavras dele: “Para considerar o próprio
tempo como radicalmente novo, em oposição à história passada, e por isso antiga, precisava-se de uma
51
apocalipse e da morte (únicas certezas da vida) dá lugar a uma visão que contrapõe esta
perspectiva de finitude inexorável. As inovações técnicas abriram, no imaginário de seus
entusiastas, as possibilidades de um futuro “infinito” pelo qual valia a pena esperar,
mesmo sendo incerto (desconhecido). Assim a ideia de progresso angariou, não só na
Europa, mas em escala global, o fascínio despertado diante de uma força imparável, o
veículo que tem o poder de levar ao futuro ou trazê-lo até o presente. O filósofo polonês
Bronislaw Baczko assim descreve a proeminência da ideia de progresso em nossa cultura
(ocidental), uma vez complemente imersa e seduzida pela concepção de modernidade:
atitude diferente, não apenas em relação ao passado, mas, muito mais ainda, em relação ao futuro. Enquanto
se acreditasse que nos encontrávamos na última era, o realmente novo do tempo não poderia ser senão o
Último Dia, que poria fim a todo tempo anterior. (KOSELLECK, 2012: p. 278)
52
grupo apoiador do “movimento revolucionário de 30”, que tomou o poder e instaurou um
regime que visava aparentar – antes de qualquer outra coisa - ser totalmente distinto do
conjunto anterior. O autor goiano sintetiza assim a visão dos agentes da modernização em
Goiás: “A modernidade para os arautos de 30 consistia no progresso do estado, por meio
do desenvolvimento da economia, da política, da sociedade e da cultura regionais”.
(CHAUL, 2015: p. 176)
Chaul destaca que, por ser um estado agrário, com pouca inserção nas dinâmicas
capitalistas industriais, os promotores da modernização no Estado eram provenientes do
próprio meio das atividades rurais, uma vez que as classes médias urbanas ainda não eram
um corpo social consolidado em Goiás. As camadas urbanas eram, portanto, até a década
de 1930, uma parcela social incapaz de veicular seus interesses no plano político. Este
fato vai mudar de forma substancial, porém gradativa, a partir da consolidação de
Goiânia. Ocorre, sobre este propósito, o fato de que
mesmo com os pés plantados em solo rural, os novos grupos no poder não eram
iguais às oligarquias dominantes na Primeira República, pois tinham uma
mentalidade urbana. Pelas suas propostas de modernização do estado, estavam
dentro dos preceitos defendidos pelos grupos no poder em âmbito nacional.
(CHAUL, 2015: p. 209)
53
Isto significava, também em Goiás, a ascensão de uma ideia de progresso
encampada pela ação estatal, altamente vinculada ao desenvolvimento urbano e ao
incentivo à indústria. Mas como isto seria possível, em uma sociedade que vivenciava
uma realidade diametralmente oposta a estas condições? A explicação está relacionada
ao fato da derrocada da oligarquia dominante, em Goiás no período pré-1930, ter ocorrido
pelas mãos de uma parcela da sociedade que, uma vez munida de poder econômico,
obtido através do dinamismo fulguroso de sua região de origem, se achava também
pertencente a uma espécie de vanguarda da modernidade político-intelectual, a qual,
naquele momento, já era atuante no âmbito da política nacional:
54
aparentemente lhe saltava aos olhos, o urbanista Attilio Correia Lima registrou, em
relatório dirigido a Pedro Ludovico, seu ponto de vista:
Assim, com uma progressiva alteração nos perfis populacionais, acarretada pelo
significativo crescimento do afluxo de pessoas para a região da nova capital nos anos e
décadas seguintes, novas demandas foram surgindo entre a comunidade campineira,
como uma consequência natural deste processo de acelerada urbanização. O livro
“Goiânia Documentada”, editado, segundo o autor, em 1958, mas publicado em 1960,
traz as seguintes informações a respeito da progressão demográfica no período de nosso
interesse:
55
É também o mais populoso do Estado e o único que apresenta população
urbana superior à rural. O índice de incremento relativo da cidade, no decênio
1940-1950, foi o mais expressivo das capitais dos Estados brasileiros, com
exatamente 167%, seguida de Florianópolis (104%), Belo Horizonte (93%),
Fortaleza (69%), e São Paulo (63%). Deve ressaltar-se que o crescimento
populacional do município prossegue no mesmo ritmo, bastando dizer que a
população de Goiânia está estimada, atualmente, em 110 mil habitantes,
segundo observações dos serviços de estatísticas regionais. (SABINO
JUNIOR, 1960: p. 30)
Uma destas novas demandas foi a exigência, por parte das camadas médias da
população, que por intermédio de seus representantes políticos, se desse atenção à
necessidade de escolarização de seus jovens em níveis que ultrapassassem a instrução
elementar, a qual já era presente na região desde a segunda metade do século XIX.
Menções a estes anseios da comunidade de Campinas são expressas nos relatos e recortes
jornalísticos arrolados pela Irmã Área Cordeiro Menezes, na obra “O Colégio Santa Clara
e sua influência educacional em Goiás” (uma das quais citaremos em trecho conveniente,
logo adiante, neste texto) e também na Ata de Instalação do Ginásio Estadual de
Campinas (a qual também detalhamos mais a frente neste trabalho).
56
Ficou claro, também para a população de Campinas, que este não supriria - nem
no início, nem em nenhum outro momento, mesmo com expansões e superlotação - toda
a demanda crescente de estudantes que ali buscavam vagas para dar prosseguimento aos
seus estudos, de forma gratuita.
25
Segundo o professor Bretas, o Liceu chegou a ter 5.400 alunos matriculados, no ano de 1965, fato que
ele caracterizou como uma “superlotação intolerável” e à qual ele atribui a condição de causadora de uma
situação de “indisciplina e ineficiência” no colégio. (BRETAS, 1991: p. 581)
57
letras à população local, que pudesse custear o ingresso de moças e, com restrições,
rapazes, em suas classes.
26
A Revista Informação Goyana foi lançada no Rio de Janeiro em agosto de 1917. Teve sua circulação
veiculada na capital federal, no Estado de Goiás, em vários outros estados do país e até em países
estrangeiros, até 1935. Segundo o exposto na tese de doutoramento da professora Maria de Araújo
Nepomuceno (1998), a revista foi, na prática, um instrumento de divulgação do então exótico e
desconhecido Estado de Goiás para potenciais observadores externos. A publicação possuiu ambições de
caráter enciclopédico, em consonância com os valores cientificistas de sua época, preconizados, sobretudo,
entre os militares positivistas envolvidos em sua criação. A revista pode, também, ser considerada um
instrumento educativo – ou ainda político-pedagógico, que se ocupou da interpretação e elaboração de um
programa econômico que levasse, na visão de seus idealizadores, o “progresso e o desenvolvimento” para
Goiás. No seu editorial de lançamento, seus responsáveis afirmaram seu comprometimento com a
divulgação dos “atributos naturais e das possibilidades econômicas do Brasil Central”, região que, naquele
momento, ainda parcamente integrada ao sistema produtivo capitalista. Apesar desta premissa de,
teoricamente, representar toda esta vasta região do Brasil, o veículo acabou destacando, em suas páginas,
o Estado de Goiás. Ao longo de sua existência, seus colaboradores dedicaram especial atenção às questões
econômicas e sociais deste Estado. O núcleo original do grupo, que se articulou em torno da produção de
textos para a publicação, era constituído pelos dois mentores intelectuais do projeto: o militar de Bonfim
(atual Silvânia) Henrique José da Silva, conhecido como Henrique Silva e o também bonfinense Antônio
Americano do Brasil, médico, militar e político — e por outros intelectuais goianos formados na Escola
Militar da Praia Vermelha no fim do século XIX.
58
Colégio Pedro Gomes, no Instituto Paulo VI, no SENAI e ainda em uma escola
na prefeitura, Tentando dar o melhor de si, para o progresso da educação em
Goiás, ora atuando diretamente junto às crianças e aos adolescentes, ora junto
aos adultos e professores, o Santa Clara tem dado sua colaboração em vários
setores da educação em Goiás. (MENEZES, 1981: p 194)
59
viria a se consubstanciar no Colégio Estadual Professor Pedro Gomes, cuja lei de criação
fora publicada, justamente em 1947. Na Ata de Instalação do Ginásio Estadual do Bairro
de Campinas (documento consta em Anexo 2), na qual foram relatados os acontecimentos
da solenidade de criação da escola, a menção a esta promessa foi proferida pelo então
secretário da Educação Hélio Seixo de Britto, conforme registrado:
Figura 1 - Trecho da Ata de Instalação do Ginásio Estadual de Campinas: “[...] Usou da palavra o Exmo.
Snr. Dr. Hélio Seixo de Brito, Secretário da Educação. Disse do esforço do Governo para instalar o
Ginásio. Afirmou que o Ginásio foi uma antiga promessa do então candidato ao Governo do Estado,
Engenheiro Coimbra Bueno, e é hoje realização palpável do atual Governador dos goianos.” (FONTE:
Ata de Instalação do Ginásio Estadual do Bairro de Campinas, 15 de abril de 1950)
1.2 A ação propulsora da Igreja Católica como marco da instrução formal no Estado
de Goiás e do advento da educação escolar em Campinas
60
precária ou mesmo inexistente, como foi no povoado e depois, município e bairro em
questão, até a década de 1950.
Já no calor do momento que marca o início das ações que mudariam para sempre
a vida em Campinas, no Relatório encaminhado pelo interventor Pedro Ludovico Teixeira
ao Governo Provisório da República27, no ano de 1933, o interventor registrou uma
conclusão que resume a postura assumida, por muito tempo, pelo Estado, em relação à
instrução escolar. Ao assumir que a educação não era uma área prioritária, em face das
restritas possibilidades de investimentos públicos impostas pela situação de carência dos
cofres estaduais, Ludovico admite a delegação da atribuição de formação de novos
educadores no Estado às instituições particulares. Deste modo, se referindo à criação e
instalação de novas escolas normais no estado afirmou:
Entre creá-las às expensas dos cofres públicos, o que lhes acarretaria talvez
ônus superiores à sua apoucada capacidade, e estimular a ação da iniciativa
particular, sempre que esta pretendesse fundar estabelecimentos de ensino
normal, optamos pela segunda orientação por ser, infelizmente, a que se
coaduna, no momento, com a penosa situação financeira do Estado”
(TEIXEIRA, 1933: p.12)
27
Neste relatório, o tema “educação” tem bastante destaque. Pedro Ludovico trata do assunto logo no
primeiro capítulo do documento, dedicando-se à apresentação de dados e, a partir deles, tecendo
comentários e análises a respeito do quadro educacional goiano. Nesta parte do relatório, o interventor
aproveita o ensejo para fazer ponderações acerca de seus planos políticos para a área, expondo sua visão
sobre ela. Ludovico destaca, por exemplo, o fato de que, por iniciativa sua, “Goiaz passou a ser, no seio da
federação, a unidade que consigna ao ensino maior dotação orçamentária em proporção à despesa”
(TEIXEIRA, 1933: p.23) Dá a entender, deste modo, que a educação pública teria uma posição estratégica
em sua administração, pelo menos em discurso. O interventor afirmou que reconhecia um “movimento
mundial” orientado para “difundir, dignificar e prestigiar a escola”, dizendo-se comprometido em “propagar
tal movimento no ambiente social do Estado”, “voltando suas vistas” para a educação “desde a hora
inaugural” de seu exercício como governante. (TEIXEIRA, 1933: p.23)
61
No mesmo relatório, Pedro Ludovico traz informações importantíssimas sobre a
quantidade de instituições de ensino em Goiás, de todos os níveis, em 1932, revelando as
respectivas fontes de recursos: duas instituições de ensino superior (uma estadual e uma
particular); 11 escolas de formação normalista, sendo uma estadual e 10 particulares; 6
instituições de ensino secundário, das quais 5 eram estaduais e uma, particular; uma
instituição de ensino eclesiástico; uma escola de nível técnico profissionalizante, mantida
pelo governo federal; uma escola estadual descrita como nível “pré-primário”; por fim,
um total de 559 escolas primárias, sendo 276 estaduais, 132 municipais e 151 particulares.
(TEIXEIRA, 1933: p. 25). Assim, segundo os dados oficiais prestados pelo interventor
ao governo federal, às vésperas da fundação de Goiânia, o Estado contava com 581
unidades de ensino espalhadas pelo seu vasto território. Ainda no mesmo documento,
Pedro Ludovico conclui a respeito deste quadro, associando-o a outro, no qual revelara
que as verbas destinadas à instrução corresponderam, no ano de 1932, a 24,32% do total
do valor das despesas fixadas pelo Estado (TEIXEIRA, 1933: p. 23):
62
Neste cenário de relativa ausência do poder público estatal e muita precariedade
material, merece especial menção, dentro do período estudado, o trabalho de incentivo às
atividades educacionais que fora empreendido pelo bispo D. Emanuel Gomes de Oliveira,
arcebispo de Goiás entre 1922 e 1955. Nesta seara, a historiadora Vanessa Carnielo
Ramos Gomes destaca as seguintes realizações do religioso:
Carnielo ainda informa que, além das escolas primárias, o arcebispo se envolveu
diretamente com a instalação e funcionamento de inúmeras outras instituições de ensino
de diferentes níveis, precisamente:
63
atuação e expansão da rede de instituições de ensino ligadas à Igreja Católica na primeira
metade do século XX, como aponta a historiadora:
Antes de Dom Emanuel, seu antecessor na função entre 1891 e 1907, D. Eduardo
Duarte e Silva também desempenhou papel de relevância para a compreensão da narrativa
que envolve o desenvolvimento da educação escolar no Estado e, particularmente, na
região de Campinas, tendo em vista que seus esforços para trazer missionários europeus
para a região renderia frutos, até então impensáveis, para a localidade, sendo o mais
marcante deles a fundação do Colégio Santa Clara, em 1921.
64
História pela Universidade Federal de Goiás, em 1977, e posteriormente publicada como
livro, através do esforço editorial da própria autora.
65
pequeno comércio. Ali, viajantes buscavam pouso e abrigo, restaurando as energias para
retomar o restante da viagem. Campinas foi um caso típico de povoação que teve este tipo
de início. Na clássica historiografia sobre o lugar, entre muitas narrativas, encontramos
três hipóteses principais para seu surgimento.
Campinas, a 470 metros de altitude, foi fundado em 1816, por José Gomes da
Silva Gerais. Criada pela lei nº 6, de 2 de agosto de 1853, foi desmembrada de
Bonfim e elevada a Vila pela lei de nº 287, de 15 de junho de 1907 (sendo
instalada a 7 de setembro do mesmo ano) e, a cidade, pela lei nº 476, de 8 de
julho de 1914. (SIQUEIRA, 1942: p. 48)
28
Francisco Ferreira dos Santos Azevedo foi professor de Geografia e de Aritmética, lecionou na Escola
Normal de Goiás a partir de 1907. Foi também diretor do Liceu de Goiás entre 1921 e 1929. No ano de
1930 assumiu a direção da Escola Normal. (BRETAS, 1991: p. 494) O “Annuario Histórico Geographico
e Descriptivo do Estado de Goyaz” é considerado uma importante obra para os primórdios da ciência
geográfica no Estado de Goiás. Como autor da referida obra, é lembrado como um relevante intelectual
goiano que “tanto sucesso fez no começo do século XX pela agudeza de seus escritos e o acerto de suas
pesquisas, inclusive geográficas, o que era incomum àquele tempo. Foi um interessado pesquisador das
possibilidades da Geografia goiana há mais de cem anos” (CURADO, 2013).
66
Um artigo assinado por Henrique Silva, datado de 1887, e publicado, anos mais
tarde, na Revista “A Informação Goyana”, na edição de julho de 1926 (p. 81), reforça
esta versão descrevendo com maiores detalhes a região do município de Bonfim, atual
Silvânia, o qual, na época, subordinava administrativamente o povoado de Campinas:
Aos 13 de abril de 1839 Faleceu da vida presente com todos os Santos Joaquim
Gomes da Silva Gerais homem branco casado e foi sepultado no adro desta
Capella de Nossa Senhora da Conceição de Campinas no dia 14 do mês e ano
solenemente sendo este o fundador da mesma capella e para constar fiz este
termo. O Cura Bazílio Antônio de Santa Bárbara”. (SANTOS, 1976: p. 71)
67
2010)29. Em 1836, por força da Resolução Provincial nº 8, assinada, em 13 de agosto,
pelo então presidente de Goyaz, José Rodrigues Jardim, Campinas foi reconhecida como
distrito subordinado ao município de Bonfim (ORTÊNCIO, 2011: p. 21). Em 10 de julho
de 1844, a Resolução nº 2 criou a Paróquia de Campinas, desmembrando a Capela da
Senhora da Conceição de Campinas da Paróquia do Senhor do Bonfim, elevando-a em
importância pela primeira vez (ORTÊNCIO, 2011: p. 26-27). Em 1853, o arraial foi
elevado à categoria de Freguesia, subordinada – juntamente com Bela Vista e Santa Cruz
- à Vila de Bonfim (atual Silvânia), à época, o mais importante centro urbano da
microrregião à qual pertencia, por concentrar considerável peso político e cultural no sul
do Estado. Em 1896, através da Lei nº 100, de 5 de junho daquele ano, Campinas passou
a integrar o recém emancipado município de Bela Vista. Somente quase um século depois
de sua “fundação” é que Campinas fora, finalmente, emancipada, sendo desmembrada de
Bela Vista e elevada à categoria de Vila, por força da Lei nº 287 de 15 de junho de 1907.
(ORTÊNCIO, 2011: p. 48-49). Oficialmente, a então Vila de Campinas adquiriu status
de cidade em 1914, através da Lei nº 476 de 8 de julho, 104 anos depois do povoado ser
estabelecido na região. (ORTÊNCIO, 2011: p. 62-63).
29
Apesar de Ortêncio ser um autor memorialista, esta obra, especificamente, traz uma coletânea de textos
de leis transcritos a partir dos originais aos quais o cronista teve acesso.
68
se nestes registros, o fato de mencionar claramente se tratar de uma escola pública, além
do fato de o processo avaliativo ser conduzido sob a tutela e inspeção de membros da
Igreja local. No ano de 1888, a Lei nº 843 de 21 de setembro, assinada pelo Brigadeiro
Felicíssimo do Espírito Santo, vice-presidente da Província de Goyaz, determinava a
criação de duas escolas de primeiras letras que seriam providas logo que a “situação
financeira da província permitisse”. Uma seria em Campinas (segundo o documento,
previa-se que esta fosse exclusivamente masculina) e a outra seria para o sexo feminino,
na “Freguesia de São Sebastião do Alemão”. (ORTÊNCIO, 2011: p. 45)
A primeira escola mista (que recebia jovens de ambos os sexos, mas em turmas
separadas), em Campinas, tem sua existência comprovada por uma efeméride registrada
pelo Decreto nº 2196, de 14 de outubro de 1908. Publicado no dia 28 do mesmo mês, o
texto informava a exoneração, a pedido, da professora Sebastiana Tavares Morais do
cargo de “professora interior” da “Eschola Elementar Mixta da Vila de Campinas”.
(ORTÊNCIO, 2011: p. 53).
30
No seu artigo 1º, a Lei nº 186 diz que “o ensino em Goiás será de cinco categorias: a) primário; b) Normal;
c) secundário; d) profissional ou técnico; e) superior. O ensino primário será dado nas escolas
subvencionadas pelo Estado, nas escolas criadas e mantidas pelas municipalidades e em escolas
particulares. O ensino Normal será dado na Escola Normal. O ensino secundário será dado no Liceu e em
estabelecimentos congêneres criados nos municípios. O ensino profissional ou técnico será dado nos
estabelecimentos que para esse fim forem criados. O ensino superior será dado em academias fundadas pelo
Estado ou em faculdades livres criadas por iniciativa particular.” (BRETAS, 1991: p. 453)
Destacamos, a partir deste trecho da lei, o limitado alcance prático das suas disposições. Mesmo sob outras
legislações subsequentes, a influência da estrutura adorada sempre se fez ver. O Liceu foi a única instituição
de ensino secundário do Estado até 1929, quando surgiu, em Bonfim, o segundo, o “Ginásio
Arquidiocesano Anchieta”. Os municípios nunca chegaram a abrir instituições congêneres; a Escola
Normal Oficial só foi existir, efetivamente, em 1904. A maioria das instituições Normais que se
69
da Primeira República, sendo superada, em importância, somente pela Lei nº 631, de 2
de agosto de 1918. A grande polêmica envolvendo a Lei nº 186 está situada no fato de
que o dispositivo retirava do Estado a obrigação de manter, de forma integral, o custeio
relativo à existência escolas primárias espalhadas pelo estado, delegando grande parte da
responsabilidade às municipalidades:
equipararam a esta - a única pública - eram femininas e privadas, mas subvencionadas pelo Estado desde
1906, além de serem ligadas a ordens religiosas como o Colégio Santana, em Goiás, e o Santa Clara, em
Campinas; o ensino técnico ou profissionalizante só passou a existir em 1910, com a criação da Escola de
Aprendizes Artífices, que funcionou em Goiás até 1942, quando foi transferida para Goiânia; o Ensino
Superior se resumiu à fundação da Academia de Direito de Goyaz, (1903-1909), à Faculdade Livre de
Direito (1916), a Escola de Farmácia e Odontologia (1922).
70
condição de interina: D. Ana Rosa de Oliveira. No final daquele ano, outra ordem
decretava a nomeação de um professor para a mesma escola, também em caráter interino:
o Decreto nº 2583, de 21 de dezembro de 1909 admitia para o quadro da escola de 1º
Entrância, o cidadão Abner da Cunha Soares.
71
força do exposto no Artigo 2º da Lei nº 825, de 20 de julho de 1927. (ORTÊNCIO, 2011:
p. 77)
Como dito, Barro Preto, ou Trindade, possui um importante papel para a história
de Campinas e, indiretamente, para a história do ensino e instrução na região e, em certa
instância, no Estado de Goiás, quando consideramos que a vinda dos religiosos alemães
da Congregação Redentorista fora determinante para fundação de importantes escolas que
contribuíram para mudanças na realidade educacional do Estado na primeira metade do
século XX.
31
O Santuário da Santíssima Trindade era o principal informativo de Campinas. De publicação mais regular
e de tom mais formal, o jornal circulava em toda região a partir das igrejas, passando de mão em mão.
Havia outro jornal em Campinas até 1930, o “Bodoque”. Bariani Ortêncio assim explica: Bodoque era o
segundo jornal em Campinas. Havia do Santuário da SS. Trindade e por último o Bodoque. Uma grande
diferença existia entre os dois: o Santuário era um jornal dos mais respeitados pelos pontos de vista que
defendia, e o segundo era datilografado, atuando na faixa da brincadeira.” (ORTÊNCIO, 2011: p. 86)
72
Ocorre que, segundo os registros encontrados por Santos, a romaria se
desenvolveu sem nenhum controle da Igreja, o que, na visão de D. Eduardo Duarte da
Silva, teria gerado “desvios e abusos preocupantes”. Em 1893, o bispo viajou para a
Europa e um dos seus objetivos era obter anuência para trazer sacerdotes a quem pudesse
confiar a missão de organizar, administrar e “cristianizar” a Romaria do Divino Pai Eterno
de Barro Preto. O pároco de Campinas na época, Monsenhor Inácio de Souza já havia
sofrido hostilidades por parte de membros da festa popular ao tentar participar mais
ativamente de sua organização, portanto, considerava que somente uma Congregação
poderia disciplinar a romaria, de proporções já consideráveis.
Nestes dias visitou-nos um bispo do Brasil que tem uma enorme diocese, onde
há quatro tribos de selvagens; poucos, porém, são os padres, e não são dos
melhores. Pediu ajuda, com lágrimas nos olhos, ao Pe. Geral. O Pe. Geral viu
nesse pedido, um sinal de Deus, crendo que ele vale em primeiro lugar para a
província bávara. Certo de que aí não faltam almas heroicas, que não receiam
pobreza e não desprezam pobres índios e cristãos abandonados, o Pe. Geral
aceitou o pedido do bispo. (COPRESP-A, 1º Volume – 1817-1896. Carta nº
13. Pe. Carlos Dilgkron, ao Pe. Antônio Schöpf. Roma, 11 de junho de 1894,
p. 18 Apud GOMES FILHO, 2018: p.277).
73
porte. O grupo que veio para Goiás era assim composto: Pe. Gebardo (Geraldo)
Wiggerman, de 51 anos, como Superior e Visitador (vice provincial), Pe. João da Matta
Späth, de 63 anos, como admonitor do visitador, o Pe. Miguel Siebler, de 29 anos, o Fr.
Lourenço Hubbauer, de 22 anos, e os irmãos Norberto Wagenlehener (37 anos), Gebardo
Konzet, Ulrico Karmermeir (27 anos) e Floriano Grilhisl (23 anos). A palavra “irmãos”
designa uma categoria de religiosos que não recebiam instrução superior, ao contrário dos
sacerdotes e estudantes em vias de serem ordenados, que possuíam formação em filosofia
e teologia. Os irmãos se consagravam apenas ao trabalho doméstico, ou funcional, como
sapateiros, pedreiros, cozinheiros e etc., com objetivo de suprir as necessidades práticas
da congregação. (GOMES FILHO, 2018: p. 278). Registra-se que, entre 1894 e 1920, a
Província Bávara enviou para o trabalho missionário no Brasil 72 confrades, entre padres
e irmãos.
74
Chama atenção neste excerto, também, a alusão à tensão existente entre os
representantes oficiais da Igreja e o grupo leigo organizador da romaria. Isto ocorria,
segundo os registros apresentados pelo mesmo autor, graças a disputas relativas à
administração do cofre e do patrimônio do “Santuário” do Divino. Esta situação teria
perdurado, não obstante ao afastamento do grupo mais arredio de suas funções
administrativas, até o fim do bispado de D. Eduardo que, em 1907, assumiria a recém-
criada diocese de Uberaba, deixando a diocese de Goiás a cargo do bispo D. Prudêncio
Gomes da Silva (1907-1921).
Para ilustrar que a relevância dos religiosos alemães na região não se restringiu à
mediação da questão de Barro Preto, nem a situações estritamente religiosas e
eclesiásticas, Miguel Archângelo traz em sua obra sobre o Santuário de Trindade, mais
um interessante relato do Pe. João Ribeiro de Carvalho, no qual são enumeradas as
contribuições modernizadoras e melhorias implementadas pelos redentoristas:
a casa dos padres, que era parada obrigatória a todos aqueles que demandavam
à capital ou ao sul do Estado; construíram a nova Matriz, uma das mais
majestosas do Estado em 1900 e o 2º cemitério da cidade; instalaram a primeira
usina elétrica em Campininhas, em 1921; editaram o primeiro jornal, também
em 1921; [...] introduziram a primeira motocicleta em Campinas (1922) e
possivelmente em Goiás; instalaram o primeiro o primeiro telefone do Estado,
entre Campinas e Trindade (1924) a 100 réis a telefonada; introduziram a
segunda bicicleta em Campininhas; instalaram o primeiro relógio de torre de
Igreja. (SANTOS, 1976: p. 50).
75
acompanhadas Maria Willibalda Mayer, responsável pelos trabalhos domésticos. As
alemãs deixaram a Europa em agosto de 1921 rumo ao Brasil. Após dezessete dias de
viagem marítima, algumas semanas em Aparecida do Norte e seis dias de viagem
terrestre, chegaram a Campinas sob aclamações da população local, na manhã do dia 16
de outubro. (MENEZES, 1977: p. 6)
76
pois recebeu, por muito tempo, alunas de todas as regiões de Goiás à procura de seu
internato, sendo responsável pela formação de muitas professoras, educadoras e outras
profissionais que atingiram os mais diversos postos na sociedade. A título de exemplo, só
no ano de 1936 o colégio recebeu matrículas de alunas oriundas de 40 cidades diferentes
espalhadas pelo Estado. (MENEZES, 1981: p. 143).
Em sua pesquisa, Menezes deixou claro que a formação feminina era uma
necessidade real para a sociedade local, sobretudo no contexto cultural tradicional -
marcado pelo patriarcalismo e pelo sexismo - do período compreendido entre os anos
1920 e 1960, porém os altos custos de manutenção das jovens em regime de internato,
fazia com que somente as famílias mais abastadas pudessem proporcionar o ensino
escolar às moças. A autora assim descreve tal panorama, em que, num cenário já restrito
de opções, outras questões interferiam no acesso e permanência de jovens em idade
escolar no colégio, especialmente no regime de internato:
77
(ginasial e secundário) era, assim como em quase todo o Estado, uma realidade distante
para a população campineira.
Irmã Áurea ainda relata uma outra informação importantíssima para o escopo de
nossa pesquisa: o primeiro curso ginasial que atendia também ao público masculino, em
Campinas, foi uma extensão do Colégio Santa Clara. Segundo a autora, o Arcebispo D.
Emanuel Gomes de Oliveira, o “Arcebispo da Instrução”, em 1949, fez um pedido para
que a direção do colégio fizesse uma extensão de seu curso ginasial visando o
atendimento de alunos do sexo masculino, em Campinas. A autora ilustra o ocorrido
citando um recorte de jornal, sobre o qual, segundo ela, não fora possível indicar autoria
do texto, nem informações sobre o jornal, justamente por se tratar de uma parte avulsa
recortada que ela registra ter encontrado em suas pesquisas nos arquivos da Secretaria do
Colégio Santa Clara. O recorte, em um texto de tom bastante apologético, exalta a
implantação do curso, dizendo o seguinte:
32
Há, nas diferentes fontes pesquisadas, divergência a respeito da grafia correta do nome do professor
Eusébio. Em uma mesma obra, em diferentes partes do texto, foi encontrada as duas grafias (com “s” e com
“z”). Isso acontece tanto na obra de Menezes (1981), quanto na de Bretas (1991). Já Campos (1985) adota
a grafia com “z”.
78
Antônio Americano do Brasil33. Assim como o Santa Clara, a escola de Antônio Eusébio,
também se situava no Largo da Igreja Matriz. (José Sêneca Lobo in: O POPULAR, 02 de
junho de 1994).
O professor Eusébio e sua escola são citados, também, pela Irmã Áurea Cordeiro
de Menezes, atestando que, mesmo antes da instalação do Santa Clara, ambos os
elementos já eram presentes, de forma relevante, na sociedade campineira. Ao falar da
precariedade estrutural encontrada em Campinas na década de 1920, ela relata: “Não
havia em dentistas, nem médicos, nem hospitais na cidade. Em casos mais simples, o
farmacêutico prático, professor Antônio Euzébio, tratava os doentes.” (MENEZES, 1981:
p. 91). Ao descrever a cerimônia de inauguração do Colégio, ocorrida no dia 9 de janeiro
33
Como já foi dito em nota anterior, Antônio Americano do Brasil foi uma figura proeminente na política
e no cenário intelectual goiano da Primeira República, contribuindo para a consolidação da Revista
Informação Goyana. Interessa-nos mostrar que ele, a exemplo de seu pai, também se relacionou diretamente
com a área da educação escolar, contribuindo para sua expansão no Estado, ao ser responsável pela
fundação e manutenção de duas escolas na cidade de Santa Luzia (atual Luziânia). Bretas descreve
brevemente sua trajetória: “Após se formar em medicina no Rio de Janeiro, voltou para Goiás,
estabelecendo sua primeira clínica em Formosa. Durante o governo de João Alves de Castro (1917-1921),
mudou-se para a capital, a Cidade Goiás, onde exerceu a função de secretário estadual, comandando a pasta
do Interior e Justiça. Ao fim do mandato de Castro, elegeu-se deputado federal, retornando para o Rio de
Janeiro a fim de exercer seu mandato. No término deste período, regressou a Goiás, onde infelizmente,
descobriu-se enfermo. Afastou-se da política e foi morar em Santa Luzia, onde fundou uma Escola Normal,
em 1928, juntamente com seu antigo colega Joaquim Machado de Araújo. Ali, dedicou-se à escrita (entre
seus trabalhos, destacam-se escritos de História de Goiás), ao exercício da medicina e à sua escola, na qual
também lecionava. Seu pai, o professor Antônio Euzébio, que já havia deixado Campinas e retornado a
Bonfim ainda na primeira metade dos anos 1920, foi então ao seu encontro. Ali, trabalharam juntos nesta
Escola Normal até que fundaram um colégio na cidade: o Ateneu. A trajetória de Americano foi
interrompida, tragicamente, em 1932, quando ele foi assassinado por um homem que, supostamente,
alimentava ciúmes de sua esposa em relação ao médico.” (BRETAS, 1991: p. 566-567).
34
Até o início do século XX, o termo “mestre”, ou “mestre-escola”, em geral, designava os professores de
primeiras letras. Estes, “comumente, aprendiam o ofício de ensinar através da prática estabelecida na rotina
de acompanhar outro mestre mais experiente” (ou um professor diplomado) em uma determinada casa-
escola ou instituição em que seu preceptor lecionava. (SHUELER, 2005, p. 334).
79
de 1922, às 10 horas, com 14 alunas reunidas em uma sala de aula para seu primeiro dia
letivo, a pesquisadora afirmou:
Em Bonfim, Eusébio fundou o “Colégio Xavier de Almeida”, que mais tarde teve
o nome alterado para “Colégio Bonfinense”. Este foi o colégio particular de mais longa
existência no Estado durante a primeira metade do século XX, funcionando até o fim da
Primeira República, mesmo sem a presença de Eusébio. Segundo Bretas, seu colégio
“mantinha internato e externato, recebendo alunos das cidades vizinhas, e até mesmo do
Triângulo Mineiro, dada a confiança que os pais de família de toda a região depositavam
no educador e diretor”. (BRETAS, 1991: p. 566). Depois disso, atuou junto ao filho,
fundador e diretor da Escola Normal de Santa Luzia. Na mesma cidade, fundou o Colégio
Ateneu para rapazes, que acabou encerrando as atividades depois da tragédia que
acometeu seu filho.
Quando se fala que a escola de Nico Eusébio foi a primeira escola da cidade de
Campinas, é importante estabelecer a diferença conceitual do que hoje é classificado desta
forma, com uma instituição assim denominada naquele período. O professor Bretas faz
este alerta expondo a definição atual de escola:
80
Quando falamos hoje em escola, entendemo-la como uma instituição de
ensino, estabelecida em prédio próprio, com várias salas de aula, salas de
administração e serviços, numerosos alunos e vários professores e funcionários
obedecendo a uma direção interna. (BRETAS, 1991: p. 71)
Em seguida, ele elucida o que era uma escola, em Goiás, nos períodos colonial e
imperial. Não obstante às mudanças na legislação (reformas estaduais de 1893, 1898,
1911 e 1913 e 1916) ocorridas após a proclamação da república, em sucessivas tentativas
de regulamentar a situação do ensino escolar básico no Estado - conforme a descrição
apresentada por Bretas - não mudou a realidade na maioria das escolas espalhadas pelo
interior de Goiás. Deste modo, o pesquisador nos explica o que devemos ter em mente ao
encontramos menções, em documentos e fontes, às escolas no Estado até os anos 1930.
Deste modo, segundo o autor, uma escola comum em Goiás:
81
municípios, responsabilizando-os por uma demanda à qual se mostraram completamente
incapazes de administrar. Esta situação de profunda falta de recursos e também de
incompetência na gestão, acabou levando o sistema a uma situação caótica rapidamente.
As Lei nº 397 de 21 de junho de 1911, a Lei nº 436 de 19 de julho de 1913 e, por fim a
Lei nº 527 de 07 de julho de 1916 se sucederam, uma exercendo poder de revogação sobre
a outra, mas sem nada resolver, pois esbarravam na falta de recursos por parte do Estado,
para intervir diretamente no socorro das escolas públicas primárias.
Assim, a Lei nº 631 de 1918, embora não muito diferente das anteriores em suas
resoluções principais, se diferenciou por seus detalhes mais marcantes, que
determinavam, entre outras coisas, que o Estado se responsabilizaria (direta ou
indiretamente) pelo controle e funcionamento de todas as escolas, obrigando as escolas
municipais a seguirem as mesmas diretrizes das escolas estaduais, mas resguardando os
municípios da não-obrigatoriedade da manutenção de escolas primárias, facultando-a
àqueles que conseguirem manter tais unidades com recursos próprios. Mas certamente a
principal inovação do dispositivo foi a adoção do modelo de Grupo Escolar. Bretas
explica a concepção do modelo que proliferar-se-ia por Goiás ao longo das próximas
décadas:
82
escolar foi Catalão, cidade vizinha de Araguari e Uberlândia, de onde “recebia influência
progressista”. O grupo escolar de Araguari, que existia desde 1910 era
83
deveriam ser remetidas, para aprovação do diretor da instituição, todas as avaliações
aplicadas, bem como seus resultados.
Neste caso, mais uma vez, o professor Antônio Eusébio, pioneiro da educação
escolar em Campinas, é mencionado de forma relevante. Bretas relata que
84
Por outro lado, não havia, fora o este Curso Normal, nenhuma instituição que
proporcionasse a continuidade dos estudos para além do nível elementar, deixando toda
uma parcela majoritária da população em idade escolar desassistida. Naquele momento,
a região sul do Estado, da qual Campinas ocupava posição geográfica de centralidade, era
a região mais populosa do Estado. Era clara, portanto, a situação de insuficiência de
instituições de ensino para atender à população, não só de Campinas, mas das áreas
adjacentes. Além da escassa quantidade de unidades, sofria-se também com a
precariedade das poucas instalações existentes e com a baixa qualidade dos serviços
prestados. Irmã Áurea assim definiu este cenário em síntese:
Desta forma, o número de escolas espalhadas pelo Estado antes da década de 1930
era realmente pequeno. Os poucos grupos escolares que começaram a se estabelecer se
situavam nas cidades maiores. Se o panorama não era favorável à escolarização em nível
elementar, o nível secundário parecia uma utopia distante da maior parte de população,
já que, neste mesmo período, era irrisória a quantidade de instituições secundárias, mesmo
considerando todas nesse universo, entre públicas e privadas, de ensino normal, técnico
e as regulares. O Liceu de Goiás era, até 1929, a única instituição secundária pública
regular do Estado. Além do Liceu, havia, até a década de 1930, apenas um
estabelecimento equiparado: o Ginásio Anchieta, instituição católica instalada em Bonfim
naquele ano.
85
secundário para os jovens e as jovens que não dispunham de condições financeiras, fosse
para estudar no Santa Clara ou para custear seus estudos em outra cidade.
86
CAPÍTULO II
2.1 – A transição entre velha e a nova Campininha: 1930 faz soprar nas campinas
os ventos da mudança que os trilhos não trouxeram
Em toda a sua história, o maior marco no campo cultural-escolar pelo qual a região
já havia passado até então, fora a criação do Colégio Santa Clara, em 1921, como já
exposto. Este colégio era uma instituição privada, que não dava conta de suprir todas as
demandas educacionais da comunidade local – em parte também graças às suas
características iniciais, pensado apenas para prover educação ao público feminino.
Mesmo com a ampliação de suas atribuições35 e o rápido reconhecimento do alto nível de
seus serviços, a atuação do Santa Clara não era uma suficiente para atender às
35
Segundo afirma a Irmã Áurea Cordeiro de Menezes (1981: p. 105), o Santa Clara, ao longo de sua história,
aceitou matrículas de alunos do sexo masculino em períodos intermitentes. Por muito tempo, as únicas
vagas ofertadas a alunos eram no curso primário. Somente a partir de 1974 a instituição passou a aceitar a
matrícula de meninos em todos os cursos. Não obstante, o Santa Clara nunca formou um normalista do sexo
masculino.
87
necessidades da maior parte da população local. Esta situação, de insuficiência escolar,
se agravou quando as atenções se voltaram para Campinas a partir do momento em que a
transferência da capital fora anunciada. A década de 1930 gerou grandes incertezas do
que aconteceria com Campinas, mas sem dúvidas, também gerou grandes expectativas.
A partir de 1942, com a celebração do batismo cultural da cidade selando sua instalação
definitiva e irreversível, o crescimento populacional e as novas dinâmicas econômicas e
sociais intensificaram ainda mais este quadro de expectativas e demandas da população
campineira.
88
No início do século XX, a estrada de ferro era considerada condição sine qua non
para o desenvolvimento e o progresso. Sobre isto, Palacin escreveu, com base em
relatórios do governo estadual que, ao longo dos anos 1920, o automóvel e o caminhão
foram deixando de ser raridades no Brasil e em Goiás, mas ainda estavam longe de
substituir o trem, tanto no imaginário, quanto na prática, como principal meio de
integração humana e econômica. Prevalecia a ideia de que “a estrada de ferro
possibilitaria a consolidação dos dois grandes impérios continentais do século XX: o
americano e o russo. Este era o transporte rápido e barato, condição indispensável para o
desenvolvimento da economia goiana” (PALACIN, 1976: p. 31). Acontece que Campinas
não fazia parte da rota de penetração da estrada de ferro em Goiás.
Para seus críticos, entre eles estava principalmente o grupo dos antimudancistas,
mas não somente estes36, Campinas era relativamente mal situada em relação à estrada de
ferro – mas para a sorte do argumento mudancista pró-Campinas, não tanto quanto a
própria capital. Para os partidários da mudança para o local, Campinas estava sim, bem
situada em relação à linha férrea. Na década de 1930 Campinas ainda padecia de poucas
vias de acesso rodoviário em condições adequadas para os modernos automóveis, mas
ainda sim as tinha - o que era ponto positivo - principalmente se considerarmos a situação
geral compartilhada em quase todo o Estado, com 6.000 km de “sofríveis estradas de
rodagem”, dentro de um total de 747.000 km de estradas, todas localizadas no sul,
sudoeste e centro do Estado. Este era outro argumento que não poderia ser usado contra
Campinas, tendo em vista que o problema também afligia a velha capital e de forma ainda
mais custosa, dada as características do relevo local.
Outro dado ilustrativo desta situação posta em destaque na época, apresentado por
Palacin, é que, em 1932, Goiás possuía apenas 300 km de linhas férreas, quando o Estado
ainda possuía uma imensa área total, de aproximadamente 650.00 km² (PALACIN, 1976:
p. 31). Havia, no início da década de 1930, a esperança do encurtamento da distância
entre Campinas a estrada de ferro, posto que em 1931 foram iniciadas as obras de
extensão da estrada ligando Leopoldo de Bulhões a Anápolis, mas a escassez de recursos
nos cofres estaduais fez com que o trecho, de apenas 53 km demorasse muito mais que o
36
Entre as cidades que disputaram a preferência da comissão encarregada da escolha do local de edificação
da nova capital, a cidade de Bonfim, liderou os protestos contra a escolha de Campinas, pois seu prefeito à
época, estava seguro de que sua cidade possuía atributos muito mais adequados ao suporte do projeto
modernizador de Pedro Ludovico do que os demonstrados por Campinas, entre eles, a presença da linha de
ferro.
89
esperado para ganhar forma. Em 1934, o Governo Federal destinou uma verba de 2.458
contos para o prosseguimento dos trabalhos, que só seriam concluídos anos depois.
(PALACIN, 1976: p. 32).
Houve, em Goiás, duas linhas férreas que penetraram o Estado na primeira metade
do século XX, ligando-nos à região litorânea do sudeste do país. A primeira e, sem
dúvidas, mais importante, era a “Mogiana”. Vinda de São Paulo, proporcionava a
circulação de mercadorias e pessoas por onde passava desde o século XX, quando se
estendia ao atual Triângulo Mineiro. Em Goiás, a primeira cidade goiana a se beneficiar
disso foi Catalão, em 1912. A outra, a “Estrada de Ferro Oeste de Minas”, vinda do Rio
de Janeiro, só foi se estender ao Estado, passando também por Catalão, na década de
1940. Campinas colheu frutos indiretos da “marcha do progresso” trazida pelas linhas do
trem. O professor Alexandre Ribeiro Gonçalves afirma, em relação aos significados
práticos e simbólicos da expansão da linha férrea em direção ao interior de Goiás, que
“um dos efeitos mais sensíveis dessa expansão foi uma intensa urbanização dos
municípios que se localizavam ao longo da estrada de ferro e outros, próximos à ferrovia,
que se beneficiaram com o seu advento” (GONÇALVES, 2002: p. 24). Campinas
pertencia ao segundo grupo. Gonçalves, inclusive destaca de forma muito pertinente:
O fato associado a isto, que nos interessa em nossa análise, é a constatação de que,
embora “os vagões da modernidade que adentrava o Estado” (BORGES, 1990: p. 36),
através do leito da ferrovia, não chegassem à Campininha, os partidários da mudança do
local da capital do Estado para a região da modesta cidadezinha, nunca enxergaram isso
como um problema. Nos pareceres técnicos emitidos pelos responsáveis pela avaliação
das áreas que concorriam pela escolha, as menções à relativa proximidade entre Campinas
e a malha ferroviária foi exaltada como significativa qualidade, tanto pelos membros da
comissão encarregada da escolha do lugar, quanto dos engenheiros posteriormente
envolvidos. A propósito destas e outras supostas características favoráveis à instalação da
almejada modernidade necessária ao Estado, presentes em Campinas, o engenheiro
Armando de Godoi assim escreveu em seu relatório destinado ao interventor Pedro
Ludovico, “homologando sem restrições” a escolha da região pela Comissão encarregada:
90
Uma das circunstâncias que mais deveriam ter influído no espírito dos ilustres
membros da Comissão que optou por Campinas foi a de se encontrar a pequena
distância da linha férrea que penetra no Estado, distância que pode ser vencida
em pouco mais de uma hora, desde que se ligue aquela cidade à estação mais
vizinha, que é Bonfim, por uma rodovia apresentando regulares condições
técnicas. Julgo não haver necessidade de se recorrer à ligação ferroviária, pois
penso que os modernos omnibus e caminhões automotores satisfarão a todas
as necessidades de comunicação, sem que seja necessário apelar-se para aquela
solução, hoje sobremodo onerosa. Mais para o futuro poder-se-á recorrer à
estrada de ferro. Outra condição realizada por Campinas, que muito deveria ter
concorrido para a escolha feita, é a de estar o local em questão no centro da
zona mais próspera e habitada do Estado de Goiaz. O local é como que o centro
de gravidade da mencionada zona, de onde provém os recursos e elementos de
vida do Estado. Tal circunstância é de fato de grande peso e devia ter atuado
fortemente para a decisão final. É nesta parte de Goiaz que se desenvolveram
em maior escala suas forças produtivas e que se concentrou principalmente a
maior parte de sua população, ainda diminuta, comparada com a grande
superfície e as consideráveis possibilidades do mencionado Estado. A
gravitação dos interesses máximos operando-se em torno de Campinas e
achando-se nos arredores de tal região os centros de população que têm
apresentado maior vitalidade, era natural que para a referida localidade se
voltasse a preferência da comissão. (GODOI Apud. MONTEIRO, 1938: p. 60)
2.2 – A escolhida: apesar dos pesares, um novo começo para a velha Campininha
91
envolvida neste contexto, ocupando, em um curto espaço de tempo, o papel de epicentro
da “novidade que se irradiava para todo o Estado”.
Naquele dia, em uma espécie de jogo para ver quem impressionava mais o
interventor, o prefeito, Coronel Licardino de Oliveira Ney37, relata em suas memórias,
descritas no livro “Um lutador” (1975), que ouvira de Ludovico palavras que considerou
encorajadoras para uma, até então, completamente improvável candidatura do recém-
criado município de Campinas: “O seu direito é igual ao dos outros prefeitos. Além do
mais, quando estudante passava por lá a cavalo e sempre achei o lugar maravilhoso para
edificar uma cidade moderna.” (NEY, 1975: p. 61).
37
Nascido em 23 de maio de 1885, o mineiro de São Gotardo, Licardino de Oliveira Ney relata que se
estabeleceu em Campinas na primeira década do século XX. Seus antepassados, provenientes de Minas
Gerais, teriam vindo para Goiás em 1900. Casado, em primeiro matrimônio, com Maria Carolina de Morais,
teve como sogro o Coronel Joaquim Lúcio Tavares. Licardino também foi agraciado com o título (social)
de Coronel e exerceu papel político relevante na sociedade do povoado, tendo sido comerciante, fazendeiro
e político. Como figura política, esteve no centro dos momentos mais importantes vividos por Campinas
no início do século XX, ocupando a cadeira de Intendente Municipal de Campinas entre 1921 e 1923,
depois a de Prefeito de Campinas. Foi o segundo e último prefeito (título atribuído após a Revolução de
30) que o município teve, sendo nomeado em 2 de fevereiro de 1931, pelo Decreto nº 671, em substituição
a José do Egypto Tavares. Permaneceu no cargo até a extinção da comarca, em 2 de agosto de 1935. Já em
Goiânia, exerceu a função de vereador, ocupando o posto de presidente da Câmara Municipal.
Posteriormente foi eleito vice-prefeito de Goiânia pela chapa do PSD, encabeçada justamente por Jaime
Câmara, um dos fundadores do jornal O Popular, que dirigiu a cidade entre 1959 e 1961. (CAMPOS, 1985:
p. 19)
92
que não deixaram que a ideia de ter sua cidade escolhida, esmorecesse em sua cabeça.
Em um encontro das duas autoridades durante o evento de prefeitos na antiga capital,
Barbosa teria dito: “Doutor Pedro não quer a cidade, quer o local e o seu está em
condições.” (NEY, 1975: p. 61). A fagulha da esperança estava acesa. A modernidade,
enfim, chegaria a Campinas?
Justamente, o próprio Dom Emanuel fora destacado para presidir a Comissão para
estudos da escolha do local para instalação da nova capital, nomeada pelo Decreto nº 2737
de 20 de dezembro de 1932 (CORREIO OFICIAL). Os outros integrantes do grupo de
trabalho eram: João Argenta (engenheiro), Colemar Natal e Silva (Secretário de Estado),
Antônio Pirineus de Souza (comandante do batalhão militar de Ipameri), Gumercindo
Alves Ferreira e Antônio Augusto Santana (ambos, comerciantes da Cidade de Goiás). A
comissão foi oficialmente empossada, dando início a seus trabalhos, no dia 2 de janeiro
de 1933, a primeira segunda-feira daquele ano. A Comissão formou um grupo,
denominado “Subcomissão Técnica”, com três profissionais designados para realizar
visitas às localidades de Bonfim, Campinas e às outras candidatas, Pires do Rio e Ubatan
(Orizona). Liderados pelo engenheiro João Argenta, o também engenheiro Jerônimo
Curado Fleury e o médico Laudelino Gomes de Almeida, primo de Pedro Ludovico,
foram encarregados de analisar as condições “topográficas, hidrológicas e climatéricas”
das regiões estudadas. O relatório apresentado por este grupo de estudos à Comissão
presidida por D. Emanuel, em 4 de março de 1933, assim concluía:
93
As conclusões deste documento foram acatadas em definitivo pela Comissão
principal, após o parecer emitido pelo encarregado de realizar o estudo final da região
indicada, o urbanista Armando de Godoi que, em tom otimista - o qual viria a caracterizar
seus relatórios, que pareciam sempre ratificar as preferências de Pedro Ludovico -
endossava a escolha de Campinas para receber as obras de construção da nova capital.
Suprimindo aqui muitos detalhes, assim Godoi descreveu algumas das características que
julgou possuir Campinas, em seu extenso relatório sobre a região:
Venho por meio deste dar-vos conta dos resultados a que cheguei
inspecionando os arredores da cidade de Campinas e examinando os dados e
informações que recebi do prefeito e moradores do respectivo município e
colhi na leitura do relatório da culta comissão nomeada para escolher o local
em que deverá ser construída a futura capital de Goiaz. (...) Campinas está de
fato situada em uma magnífica região, indiscutivelmente, preparada pela
natureza para servir de sede a uma moderna cidade (...) Graças à suave
declividade que se nota nas formosas ondulações nos arredores de Campinas,
o problema dos esgotos será resolvido sem consideráveis dispêndios. É
outrossim necessário que se faça referência à fertilidade dos terrenos do que
ora me ocupo. Pude constatá-la visitando algumas lavouras existentes no local.
Vi alguns milharais já nas vésperas de se fazer a colheita. Os pés de milho se
elevam a grande altura e as espigas eram enormes. Examinei também alguns
feijoais, mandiocais, arrozais etc. Em suma, as plantações e o gado que pude
ver indicam que os terrenos são magníficos para a cultura de cereais, algodão,
fumo, frutas e a pecuária. Em Campinas há uma propriedade pertencente a
missionários alemães que nela cultivam várias frutas, inclusive a uva,
colhendo-se esta última em quantidade suficiente para permitir uma regular
fabricação de vinho. (GODOI Apud. MONTEIRO, 1938: p. 48-66)
38
Jornalista formado pela Universidade Federal de Goiás em 1985, membro do Instituto Histórico e
Geográfico de Goiás, além das Academias Goiana e Goianiense de Letras.
94
carta, divulgada entre as correspondências pessoais do interventor 39, o prefeito de
Goiandira – cidade próxima a Catalão, localizada a pouco mais de 280 quilômetros de
Campinas - Absay Teixeira, aliado de Ludovico, faz uma intrigante afirmação de
congratulação ao homem mais poderoso do Estado naquele momento:
Por via indiretas (sic) tenho sabido de sua patriótica atitude sobre a mudança
da capital para Campininhas. Aceite os meus francos aplausos, por essa medida
de grande utilidade para o estado e para os interesses dos goianos, pois, sinto-
me deveras satisfeito por ver que o seu nome impoluto ficará imortalizado no
estado e no coração dos goianos. (GODINHO, 2013: p. 64)
Figura 2 - Carta de Abssay Teixeira a Pedro Ludovico: Carta, assinada por Absay Teixeira, em 13 de
fevereiro de 1932 seria um forte indício de que comentários sobre a preferência de Pedro Ludovico por
39
Material publicado digitalmente (em CD) pelo professor Nasr Chaul, quando ocupava a função de
presidente da Agência Goiana de Cultura Pedro Ludovico Teixeira (AGEPEL), cargo que equivalia ao de
Secretário de Estado da Cultura, durante a primeira gestão Marconi Perillo (1999-2006).
95
Campinas teriam “vazado” de seu círculo de confiança antes mesmo da formação da Comissão para
estudos da escolha do local de edificação da nova capital. (FONTE: imagem extraída de GODINHO, 2013:
p. 64)
O outro indício que poderia revelar uma possível decisão antecipada de Ludovico,
não exatamente em relação a Campinas, fora exposto por Attilio Corrêa Lima. O
urbanista registrou em um álbum – entregue ao Governo do Estado em 1935 – uma foto
de uma visita de campo, na qual aparece como componente de um grupo que estudava o
local onde seria fixada a futura cidade (não se pode saber qual seria este local exatamente,
pois a informação não existe em sua anotação). O arquiteto registrou que o ocorrido se
deu em 1932, e não em 1933, quando seria contratado oficialmente.
Figura 3- Foto do álbum de Attílio Correa Lima: Foto do álbum de Attilio Correa Lima registra que o
arquiteto esteve em Goiás, em missão de “fixação do local da cidade” antes de firmar o contrato oficial
de prestação de serviços às obras de planejamento de Goiânia, em 1933. (FONTE: imagem extraída de
GODINHO, 2013: p. 64)
96
enxergavam, naquele movimento, oportunidades comerciais inéditas batendo à sua porta,
passou a fornecer quase tudo para o processo de construção.
97
sinalizou, juridicamente, o fim de Campinas como município. Este documento criou
oficialmente o município de Goiânia a partir da supressão da autonomia administrativa e
fusão, em uma única comarca, da totalidade dos territórios de Campinas e Hidrolândia,
bem como determinava a anexação a Goiânia de partes dos municípios de Anápolis, Bela
Vista e Trindade. A partir de então, momentaneamente, Campinas adquiriu a condição de
distrito subordinado à recém-criada comarca da futura capital.
A sanção desta lei representou, do ponto de vista jurídico, o ponto final definitivo
na História da cidade de Campinas, agora oficialmente, um bairro de Goiânia.
Desde o começo, o processo levou à localidade uma nova dinâmica, que atuava
tanto sobre o cotidiano prático das pessoas, como sobre seu imaginário. Expectativas e
obras se misturavam entre a desconfiança a e esperança dos campineiros. Até então,
situação assim jamais fora vista no pacato povoado. Os auspícios de modernidade
realmente chegariam a Campinas nos anos seguintes. Mas o que isto significava? Quais
anseios trouxeram? Para tentar entender, é necessário lembrar como o desenvolvimento
de Campinas foi lento, nesse sentido, ao longo de sua história, conforme já narramos.
98
Pequenos acontecimentos, como a chegada de viajantes e novas tecnologias – já usuais
em outras regiões – constituíam efemérides, e às vezes, se transformavam em
acontecimentos dignos de nota em documentos e registros de memórias.
A partir da tomada do poder político, em Goiás, pelo grupo do qual fazia parte
Pedro Ludovico Teixeira - que se consolidara como sua maior liderança - a nova
oligarquia que se formava tentava se afastar dos antigos paradigmas políticos
estabelecidos no Estado durante a Primeira República. Nesse sentido, o grupo se
apropriou, no plano regional, do discurso de renovação encampado por Getúlio Vargas e
demais promotores da “Revolução de 1930”. O ideal de “novo” - por eles representado -
era, pelo menos em discurso, a antítese do que havia antes. E assim deveria ser, para a
consolidação de seu projeto de poder.
O uso de tal ideário se firmaria como justificativa para praticamente todas as ações
governamentais a partir de 30. O maior símbolo de tal postura foi a força discursiva com
a qual se deu a emergência (e urgência) do mudancismo da capital e a construção de
Goiânia. No período pós-1930, os discursos dos políticos alinhados ao grupo ludoviquista
falavam de um Estado de Goiás que se tornara decadente e atrasado – nas mãos dos outros
- e o Goiás que surgiria com a Revolução, numa inequívoca promessa de progresso e
crescimento econômico, como observou Chaul:
99
representação da modernidade, sobre a qual buscaram traçar o período da
política goiana desse período. (CHAUL, 1997: p. 236 Apud. PINHEIRO,
2003: p. 35)
40
O jornal O Popular, que circula até os dias atuais, foi fundado em 3 de abril de 1938 pelos irmãos Câmara,
Joaquim Câmara Filho, Vicente Rebouças Câmara e Jaime Câmara.
A propósito da propagação local deste importante veículo de comunicação impressa, sobretudo até a década
de 1950, José Mendonça Teles registra que o primeiro jornal impresso em Goiânia, chamou-se, justamente,
“Goiânia”. Foi fundado no dia 20 de novembro de 1935, sob a direção de Oscar Pierucetti. Em 3 de outubro
de 1936 começou a circular o Jornal de Goiânia, fundado por Venerando de Freitas Borges, mas que deixou
de circular no mesmo ano. Em 2 de julho de 1939, Gerson de Castro Costa fundou a Folha de Goiás, que
circulou até 1984. (TELES, 2004: p. 100)
100
Figura 4 - Capa da primeira edição do Jornal "O Popular": O jornal situacionista “O Popular” entrou
em circulação em 3 de abril de 1938, contando com apenas quatro páginas e tiragem de três mil
exemplares. Percebe-se que todas as matérias de capa e suas respectivas chamadas fazem alusão a alguma
ação política do grupo que ocupava o poder. (FONTE: Arquivo Jornal O Popular/ Organização Jaime
Câmara).
101
Figura 5 - Capa da edição nº 146 de “O Popular”: celebrava o sexto aniversário de Goiânia com
mensagem de tom auspicioso em relação ao futuro da cidade no âmbito do projeto de integração nacional
que estava em curso, a “Marcha para o Oeste”. (FONTE: Arquivo Jornal O Popular/ Organização Jaime
Câmara)
102
A ideia da mudança não era apenas de Pedro Ludovico. Era um desejo de
Vargas, era uma necessidade do capitalismo. Era uma dinamização da
economia goiana, incorporando-se mais e mais à economia nacional. Era,
enfim, a meta política das oligarquias do Sul e do Sudoeste. (CHAUL, 2001:
p. 77)
103
Figura 6 - Capa do jornal O Popular, edição nº 382: A edição, datada de 5 de julho de 1942, mais uma
vez enfatizava as realizações do grupo ludoviquista em prol do “progresso” de Goiás, bandeira que acabou
se tornando a ideologia de sustentação do poder deste grupo no jogo político local, como mostra Chaul
(2001: p. 83). (FONTE: Arquivo Jornal O Popular/ Organização Jaime Câmara)
O que se divulgava na imprensa dos anos 30, tirando a datação e descrição dos
fatos, era imprestável. Sob a força de um governo revolucionário, um hiato
democrático e a ditadura do Estado Novo, só se lia o lado bom e o elogio
gratuito aos governantes e tudo parecia perfeito. Jornais da época, como O
Popular e Folha de Goiás, deixaram de prestar um serviço histórico de
informação para apoiar incondicionalmente o governo – o pragmatismo da
sobrevivência. Os periódicos de oposição adotavam o caminho oposto e
trocavam a discussão pela crítica acima de tudo. (GODINHO, 2013: p. 21)
105
Modernidade aqui está entendida dentro da visão dos grupos políticos que se
assenhoram do poder em 1930: como progresso, o culto no novo e a rejeição
do passado, como forma de introduzir Goiás no cenário nacional. Goiânia
representava, por assim dizer, a etapa do moderno em Goiás, enquanto a
modernização seria fruto da década de 1950. (CHAUL, 2015: p. 241-242)
2.4 - Campinas no contexto dos anos iniciais de Goiânia: dos dias difíceis de cidade
falida a centro da vida social e do lazer goianiense
Em março de 1921, Licardino de Oliveira Ney fora, pela primeira vez, eleito
intendente municipal, em conturbado ambiente político local, marcado pelas práticas
coronelistas comuns ao período. O Correio Official do dia 15 de fevereiro de 1921
noticiou que o Conselho Provisório de Campinas se negou a proceder com a apuração dos
votos e a ratificar o resultado das eleições sob a alegação de que a mesma ocorria sob a
pressão de jagunços. O presidente João Alves de Castro, então, determinou que os eleitos
na eleição tanto para o Conselho Municipal quanto para a Intendência, se reunissem,
apurassem a eleição e reconhecessem mutuamente seus poderes. (CAMPOS, 1985: p. 41)
106
à função diretiva da cidade oito anos depois de sua primeira passagem pela administração
local, primeiro como Intendente, agora como Prefeito.
Licardino relata que houve, naquele ano, grande esforço para que um montante de
20 contos e 500 mil réis fosse arrecadado, evitando-se, assim a extinção daquela unidade
administrativa:
Campinas era, sem dúvidas, uma comunidade que havia se acostumado a ser
administrada com poucos recursos, afinal, era a única realidade que muitos ali conheciam.
A arrecadação pública era pequena em Campinas, fazendo da localidade, uma
municipalidade economicamente irrelevante no plano estadual e, em tese, sem quaisquer
condições de investir em melhorias substanciais para a coletividade. Esta realidade era
compartilhada com muitos outros municípios goianos na época, tendo em vista que, a
própria situação financeira do Estado, como um todo, não era de riqueza em
disponibilidade de recursos. Muito pelo contrário. Fazer qualquer investimento em áreas
que não fossem consideradas prioritárias, como a educação, era algo absolutamente
impensável em Goiás, nas primeiras décadas do século XX. Os gastos com as obras
públicas associadas à construção de Goiânia intensificaram esse quadro.
107
contos, 662 mil réis; em 1920, 14 contos, 162 mil réis e 819 réis; em 1921, 15 contos, 123
mil réis e 13 réis; em 1922, registrou-se um forte declínio para 9 contos, 697 mil réis e
272 réis; em 1925, 11 contos, 433 mil réis e 400 réis. (NEY, 1975: p. 58). Analisando o
período que vai de 1919 a 1930, o próprio Licardino concluiu que a crescimento da
arrecadação municipal, em 11 anos, se limitava a 3 contos de réis, o que resulta em uma
média de arrecadação anual baixíssima, com crescimento médio quase nulo.
Isso, entretanto, não foi empecilho para que, aos poucos, pequenos investimentos
fossem transformados em poucas, mas significativas realizações na localidade durante a
década de 1920 e no início dos anos 1930. Destaca-se a construção de um grupo escolar
público municipal, o grupo escolar Pedro Ludovico, construído entre 1931 e 1935, mas
inaugurado no ano de 1936, quando Licardino já não era mais prefeito. Este grupo escolar,
foi depois rebatizado de Grupo Escolar Henrique Silva, após 1945. (ORTÊNCIO, 2011:
p. 102). Foi no prédio desta escola que o Ginásio Estadual de Campinas fora instalado
solenemente em 1950.
108
de 27 de julho de 1918 concedia à municipalidade de Campinas um auxílio de 3000$000
para a construção desta linha telegráfica, que só fora, portanto, inaugurada, quase nove
anos depois. (Anexo 2)
Em 1947, ano da lei de criação do Ginásio Estadual de Campinas, ainda havia uma
pequena distância física - aproximadamente cinco quilômetros - que separava os núcleos
urbanos da parte central da nova capital e da antiga cidade que a recebeu. Este
“isolamento”, do ponto de vista territorial, de Campinas em relação a Goiânia foi, por
assim dizer, momentâneo, tendo em vista o acelerado ritmo com o qual novas construções
eram erguidas ao longo das avenidas 24 de outubro e da Avenida Anhanguera, ainda em
obras. A Avenida Anhanguera, que incorporava a estrada que ligava Leopoldo de Bulhões
até ao antigo núcleo de Campinas (MANSO, 2001), logo de início, ganhou rápida
importância para os habitantes, tanto de Goiânia quanto de Campinas, tanto por ser a
principal via de ligação à cidade vizinha, no sentido Leste-Oeste, quanto pela maior
concentração comercial. Attílio Corrêa Lima já vislumbrava ali uma região com maior
densidade de construções.
Figura 7 - Registro do transporte coletivo que realizava a viagem entre Goiânia e Campinas: Carro de
transporte coletivo de passageiros que fazia a rota Goiânia-Campinas através da Avenida Anhanguera
sinalizava um avanço da urbanidade moderna sobre antiga cidade. A distância entre os dois núcleos podia
ser vencida de várias formas. O transporte motorizado era uma delas, mas a tração animal ainda era
largamente utilizada. (FONTE: Acervo autorizado Hélio de Souza, 1957)
109
representação mais visível da chegada de cada vez mais pessoas. Sobre o rápido
crescimento populacional da região, o escritor Hélio Rocha afirma:
110
focado nas obras da construção de Goiânia, mais tarde se tornariam questões emergenciais
a serem acudidas pelo poder público e, eventualmente, exploradas politicamente.
É interessante ressaltar tais relatos, pois são reveladores de aspectos que denotam
uma mudança que atingiu a região, alterando profundamente a relação de seus moradores
com o lugar que fora sendo modificado em uma velocidade jamais vista na região. Até o
início do século XX, tudo corria em ritmo lento. São muitos os relatos desta vagareza e
do caráter pacato de Campinas. Em “Notícias sobre Goiás”, o Padre Francisco Wand
afirmava que, em 1894 “Campinas possuía apenas umas 30 casas pobres e mal
construídas e a igreja, completamente descuidada, estava a ponto de ruir” (SANTOS,
1976: p. 48). Situada à beira da estrada, Campinas era vista por muitos, apenas como um
ponto de pouso para quem passava a caminho da Cidade de Goiás. Fora isso, até a chegada
dos missionários redentoristas, pode-se afirmar que Campinas praticamente não gozou de
importância alguma na realidade regional. Nas poucas ruas do local, os moradores de
zonas rurais circunvizinhas adquiriam parte dos suprimentos que necessitavam e,
principalmente, se reuniam para eventos religiosos. Não obstante à celebrada fertilidade
de suas terras e sua favorável localização, nenhum outro aspecto chamava muito à atenção
dos que a ela dedicaram relatos no final do século XIX.
Tudo isso contrasta muito com a Campinas que surgiria após 1935. Pode-se
afirmar que, em 1947-1950, Campinas já era uma região substancialmente distinta do que
se via no início dos anos 1930, tanto demograficamente, quanto econômica, social e
estruturalmente. A verdade é que, com as obras de Goiânia em curso, Campinas ganhou
uma importância que jamais teria sido imaginada por seus moradores mais antigos.
112
constantes queixas e reclamações trazidas à polícia, por inúmeras famílias deste bairro e
[para] consequente moralização dos costumes”. O delegado argumentava que “somente
com essa providência se conseguirá sanar, de uma vez por todas, as irregularidades,
escândalos e a falta de moralidade, que, constantemente, ‘mulheres de vida alegre’
provocam no seio de famílias respeitáveis, residentes neste bairro”. O documento
redigido pelo delegado foi acompanhado pelo texto jornalístico, sem assinatura, que
corroborava a sugestão do delegado, dizendo tratar-se de uma “medida de interesse
social” que certamente, teria “ótima repercussão”, pois “as casas de mulheres em
Campinas, encontram-se bastante espalhadas, havendo lugares em que existem em
mistura com as casas de família. O texto é finalizado com a afirmação de que a solução
de “isolamento das partes escusas do bairro” surtirá bons resultados na parte social, pois
tais medidas já [teriam sido] testadas em outras capitais, com bons resultados. (FOLHA
DE GOIAZ, 13 de janeiro de 1950)
Figura 8 - Edição do Jornal Folha de Goiaz de 13 de janeiro de 1950: No começo de 1950, o jornal Folha de
Goiaz tratou de um dos aspectos tidos como desagradáveis da “nova Campinas”. Um conflito que denota
a existência de uma mudança do perfil do bairro, em vários aspectos, aos quais uma parcela da população
resistia.
114
Figura 9 – Registro fotográfico da Praça Joaquim Lúcio, Campinas, década de 1940: Movimentação de
pessoas na Praça Cel. Joaquim Lúcio, um dos principais centros de convivência social do bairro. Na foto
é possível ver o coreto, também citado como espaço reservado ao entretenimento da população de Goiânia/
Campinas. (Fonte: imagem extraída de CAMPOS, Itaney Francisco. Notícias históricas do bairro de
Campinas. 1985: p. 57)
É interessante, neste ponto de nossa pesquisa, notar que o Goiânia surgiu para
rivalizar com um time de Campinas, o Atlético Clube Goianiense. Fundado em 2 de abril
115
de 1937, o “Dragão da Campininha” é o time de futebol profissional mais antigo da capital
ainda em atividade41, e desenvolveu, ao longo do século XX, forte simbologia identitária
associada à sua região de origem. Assim, nos anos iniciais da capital, a rivalidade entre o
Goiânia e o Atlético constituía uma alegoria perfeita da relação de interdependência
existente entre Campinas e Goiânia. A respeito desta importante efeméride cultural,
Horieste Gomes, atesta:
41
A primeira agremiação esportiva dedicada exclusivamente ao futebol que surgiu em Goiânia foi o “União
Americana Esporte Clube”. Antes da existência do Atlético Goianiense e do Goiânia Esporte Clube, este
foi o time que mais se aproximou de um “clube de futebol profissional” no complexo Goiânia-Campinas,
realizando as primeiras partidas intermunicipais que se tem notícia na nova capital. Fundado em 28 de abril
de 1936 por jovens oriundos da Cidade de Goiás, que se mudaram para Goiânia logo em seus primeiros
anos, o clube rapidamente perdeu o brilho inicial de “novidade”. Isso está relacionado ao estabelecimento
da hegemonia, tanto nos gramados como também em popularidade, compartilhada entre o Goiânia e o
Atlético nos anos seguintes à fundação de ambos. O nome “União Americana Esporte Clube” remete às
origens vilaboenses de seus fundadores, pois homenageia os dois times rivais da antiga capital do Estado:
a Associação Atlética União Goiana e o América Esporte Clube.
116
com coisas diversas, que iam desde o tratamento dentário gratuito, passando por terno,
até chuteira e outras coisas mais” (TELES, 1995: p. 40).
Com o tempo, até rivalidades políticas passaram a ser exacerbadas nas contendas
futebolísticas entre campineiros e goianienses, como afirma o professor Eliézer Cardoso:
Ressalta-se que, apesar dos muitos relatos de lazer e de existência de agitada vida
cultural em Campinas, nem tudo eram flores na Campininha das Flores. Longe disso. A
modernidade ainda demoraria para se firmar como uma realidade ao alcance da maioria.
Às vésperas dos anos 1940, o complexo Goiânia-Campinas sofria com situações
estruturais que evidenciavam total precariedade, que divergiam das expectativas
difundidas pela imprensa governista e pelo discurso político da época.
Em 1936, por exemplo, não havia fornecimento público de energia elétrica para
as casas, ficando este restrito à iluminação dos espaços e logradouros públicos. Goiânia,
somada a Campinas e distritos, possuía 1368 casas. Havia duas pequenas unidades de
saúde em funcionamento, oito farmácias, aproximadamente cem lojas de comércio, duas
117
agências bancárias. Em relação a serviços essenciais, toda a região contava, até o início
daquele ano, com quinze escolas, com doze médicos e igual número de advogados
diplomados. “Se reinava o breu do lado de fora, imperava o silêncio da porta para dentro:
apenas dezesseis famílias possuíam rádio” (GODINHO, 2013: p. 202). A este respeito,
lembra-nos de maneira bastante pertinente Luiz Palacín, um fato um tanto irônico. Ele
conta que Monteiro Lobato visitara Goiânia na ocasião de seu “Batismo Cultural”, em
julho de 1942, e teria ficado incomodado com a cidade com a qual se deparou. Desta
passagem, o famoso escritor registrou, em tom de sarcasmo:
Os versos do escritor paulista denotam uma clara alusão à profunda decepção que
acometia a alguns visitantes oriundos dos solidamente urbanizados centros das regiões
litorâneas do país. Tal situação, de descontentamento com aspectos da realidade goiana,
não era novidade, como mostram os escritos de cronistas viajantes que por aqui passaram
em outros tempos. O que há de novo na fala Lobato é, sem dúvida, o fato de que a
decepção agora se baseava, de forma concreta, em uma gigantesca discrepância entre a
realidade experimentada e a ilusão criada a partir da maciça propaganda feita pelo
governo de Pedro Ludovico e pelos intelectuais goianos através dos veículos da imprensa
que circulavam pelo país a respeito da moderna capital que seria edificada no Estado.
42
Cyllêneo Marques Araujo Valle, que publicou muitos de seus poemas nos primeiros jornais que
circularam na nova capital, como “O Goiânia”, nasceu em 1884, no município de Pouso Alto, atual
Piracanjuba, no estado de Goiás. Filho de uma família tradicional em sua região, usava o pseudônimo Leo
Lynce em suas publicações literárias e poesias. É considerado o primeiro poeta modernista goiano, sendo
seu livro “Ontem”, publicado em 1928, o marco introdutório do Modernismo no Estado (TELES, 2004: p.
118
Os versos acima, escritos nos anos 1940 remetem, romanticamente, à ideia de uma
indissolúvel relação simbiótica constituída entre a “modernidade” preconizada pela ideia
do “novo”, associado à nova capital – que experimentava, naquele momento, um rápido
crescimento, simbolizado no poema pela sua condição de “cidade adolescente” - e a
“tradição”, vinculada, no texto, à “presença dos tradicionais costumes católicos e das
antigas instituições de Campinas no cotidiano”. Os elementos da tradição associados a
Campinas, são alusões do poeta, ao povoado que cresceu em torno do que, por muito
tempo, foi o principal prédio da antiga cidade, a Igreja Matriz. O outro elemento citado,
de forma mais direta, é o icônico convento fundado pelos religiosos alemães que
chegaram na antiga cidade ainda no século XIX, trazendo consigo, muitos elementos que
marcariam sutis transformações na vida no povoado.
Na Goiânia dos anos 1940 e 1950, tradição e modernidade conviviam lado a lado
todos os dias, constituindo um modo de vida híbrido, caracterizado pela mescla do antigo
e do novo. O processo de crescimento da “nova” Goiânia, ao lado da “velha” Campinas,
insere a apreciação que fazemos acerca do lugar-espaço de nosso objeto de estudo
35). Também exerceu as profissões de jornalista e magistrado entre os anos de 1900 a 1954, ano de seu
falecimento. No poema, extraído do texto do livro “Campininha das Flores e sua história”, segundo explica
ROCHA (2010), o termo “Botafogo”, se referia ao antigo bairro, que atualmente, corresponde a parte do
Setor Leste Universitário. Até a década de 1950, a região representava os limites de Goiânia na direção
oeste. Para o Hélio Rocha, estes versos ilustram romanticamente a relação de complementaridade
estabelecida entre Goiânia e Campinas, destacando que o Sol de cada dia nascia na nova cidade e se punha
na velha.
43
Guimarães (2016) enumera como marcos significativos, no contexto da criação de novos centros urbanos,
pensados sob o pretexto de modernização dos centros de poder, o surgimento das capitais dos Estados do
Piauí (Teresina, em 1852), de Sergipe (Aracajú, em 1855) e de Minas Gerais (Belo Horizonte, em 1897),
ainda no século XIX. Goiânia foi, portanto, a primeira cidade planejada, no século XX, com intuito de
assumir a posição de centro de poder, em substituição a um antigo centro urbano. É importante ressaltar o
fato de que Goiânia, assim como estas cidades, pensadas para serem as capitais de seus Estados, já “nasce”
sob o signo do poder simbólico do qual seus idealizadores as investiram desde o projeto. Assim, a criação
de uma cidade-capital possui todos os elementos associados ao surgimento de uma nova cidade, mesmo
quando desprovida de tal função específica, mas todos eles ganham dimensões acentuadas, ampliadas e
instrumentalizadas simbolicamente, pela importância atribuída ao lugar.
Interessa-nos salientar também que, do ponto de vista conceitual, uma “cidade nova” é definida, enquanto
elemento intencionalmente concebido, por Trevisan (2009), pela possibilidade de detecção dos seguintes
aspectos: desejo (vontade de agentes, públicos ou não, para concretizar ações específicas voltadas para o
planejamento e edificação), necessidade (atendimento de uma ou mais funções alegadas), lugar (escolha
prévia de sítio), execução profissional (existência de agente na elaboração física), projeto urbanístico e
tempo (construção significativa numa parcela temporal, envolvendo um momento de fundação
razoavelmente preciso).
Conclui-se, portanto, que no surgimento de uma nova cidade, concebida como centro de poder “estes
aspectos foram potencializados pela forte ligação ao conceito da cidade-capital, onde o centro do poder se
119
nestes momentos de gênese: se, por um lado, uma nova ocupação provoca a
impressão de espaço ahistórico (conforme descrito por Lévi-Strauss ao visitar
a cidade), observa-se como contraponto o espaço urbano na condição de
materialização dinâmica das conexões sociais dos indivíduos que ali
permeiam; desta maneira, torna-se compreensível que a paisagem é fruto do
homem, assim como o homem também é fruto de sua paisagem, visto a forma
que o espaço interfere nas impressões humanas, desde sua localização no
mundo quanto associações emocionais e organização das atividades.
(GUIMARÃES, 2016: p.520)
Esta definição é cara à análise que fazemos neste trabalho, pois a criação de
Goiânia, como novo espaço de vida, ocorreu em concomitância à continuidade da
existência de um espaço urbano anterior, Campinas, que não só presenciou, como
participou ativamente deste processo de criação, afetando-o e sendo, por ele afetado.
estabelecia como um monumento simbólico, superior às outras pela perfeição de seu plano. (LAUGIER,
1979 apud MANSO, 2001).
44
Apresentamos, também, dados demográficos referentes à evolução da população de Goiânia/ Campinas
no Capítulo I deste trabalho.
120
Figura 10 - Registro fotográfico do andamento das obras de construção do centro administrativo de
Goiânia: Nota-se inusitada a fusão entre o rolo “compressor”, usado para pavimentação, e uma forma de
tração animal, os tradicionais carros de boi. Artifício empregado nas obras de construção das principais
vias da jovem da capital, como esta, que fornecia acesso aos prédios administrativos do Estado. (FONTE:
Acervo MIS-GO. Alois Feichtenberger, 1937).
Figura 11- Registro da primeira feira livre organizada em Goiânia: A primeira feira de Goiânia, em foto
registrada na década de 1930, recebia produtos rurais das regiões circundantes ao perímetro central de
Goiânia, (região onde se concentravam as obras) e colaborava com o abastecimento de víveres para
população operária que se estabelecia na cidade. (FONTE: imagem extraída de MONTEIRO, 1938: p. 99.
Sem registro de autor).
121
coerente com o ideal de modernidade originalmente pensado, para a nova capital do
Estado, a partir dos anos 1930, “caracterizou-se por padrões de planejamento e expansão
condicionados tanto por propostas de adesão à modernidade, quanto pelas condições de
sua execução” (GONÇALVES, 2003: p. 19)
Desta forma, a fundação de Goiânia foi, sem dúvidas, o maior marco político,
econômico e cultural na recente história de Goiás. Acabou, no entanto, revelando, de
forma curiosa, as contradições de nossa sociedade no desenrolar do século XX. A
presença de novos elementos urbanos na vida prática das pessoas, vez ou outra, se
chocava com costumes não alinhados os com ares de modernidade, demonstrando que a
dita modernização do discurso não é assimilada pelas pessoas em seu cotidiano, caso
esteja desconectada das realidades culturais existentes. Tornou-se marca da
“modernização” em Goiás, a convivência entre o novo e o antigo: como exemplo, a
moderna urbanização de ruas e avenidas coexistindo com veículos de tração animal e
122
outros elementos próprios da ruralidade45. Este cenário pitoresco, aos olhos da alguns
observadores, internos e, sobretudo externos, como o próprio Lévi Strauss46, fazia com
que a sensação de modernização saltasse do discurso político e da produção intelectual,
para o imaginário popular, inspirando poetas, cronistas, jornalistas e plantando na
sociedade goianiense e campineira uma semente de expectativa.
45
Sobre este assunto, ver: “OLIVEIRA, Eliezer Cardoso de. Imagens e mudança cultural em Goiânia. 1999.
254f. Dissertação de Mestrado - Universidade Federal de Goiás, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia,
1999., Goiânia.”. Nos três primeiros capítulos deste trabalho, o autor aborda este processo de maneira
extremamente aprofundada.
46
O antropólogo Claude Lévi-Strauss visitou Goiânia em 1937. Suas impressões a respeito desta
experiência foram relatadas na obra Tristes Trópicos (2000).
123
pensamento modernizante do início do século XX se apegou substancialmente ao
tecnicismo-cientificismo.
O médico Pedro Ludovico procurou ter sua imagem fortemente associada a estes
elementos positivos, ao longo do período em que esteve à frente do poder executivo
estadual. Como colocou Chaul (2015: p. 214), ele exerceu “o saber médico a serviço do
poder”. Habilmente utilizado, em uma época em que ser médico, em Goiás, imbuia o
portador daquele título de uma aura especial, que poderia, facilmente, ser manejada
politicamente. Além de detentor de um nível de sabedoria acima da média, tendo em vista
a raridade de pessoas com formação superior no interior do Brasil, o médico era visto
como alguém capaz de salvar vidas e, portanto, de uma relevância social sem par. Desta
forma, um médico poderia, facilmente, construir uma imagem pública de alguém
generoso e altruísta, ao mesmo tempo preocupado e capacitado para conduzir a população
sob sua direção ao progresso. Nas palavras de Chaul, a confiança inspirada por um médico
carismático que se lançava à vida política, em Goiás, pode ser assim explicada:
124
peso de suas escolhas. Riscos sim, pois o progresso, só poderia chegar com a implosão
das estruturas carcomidas pelas antigas relações estabelecidas em nome de interesses de
pessoas e grupos que não condiziam com as necessidades da maioria da sociedade. A
modernização implicaria muitos custos materiais e imateriais, em nome dos quais,
certamente, alguns elementos tradicionais deveriam ser sacrificados.
Por meio de seus agentes promotores, a quem Chaul (2015, p. 176) chama de
“arautos de 30”, a modernização prometida, deveria abrir as portas do Estado a dias
melhores. Esses dias melhores foram anunciados, inicialmente, propondo uma
problemática tratada dentro dos domínios de Pedro Ludovico, o progresso pelas vias da
higiene pública. Criticava-se a urbanidade decrépita da velha capital, associada à
insalubridade e elogiava-se todo o esforço de sair desta condição. Esta temática foi,
portanto, incorporada no discurso mudancista com muito entusiasmo e perpetuada,
durante toda sua gestão, em diferentes momentos, nas suas falas públicas e relatórios
administrativos. A este respeito, Machado salienta que o discurso higienista foi “o
instrumento privilegiado pelos médicos na tática utilizada para dar à medicina estatuto
125
político próprio, o que significa seu aparecimento como um poder capaz de tomar parte
efetiva nas medidas de organização, controle e regularização da vida social”
(MACHADO, 1978: p. 258).
126
fundamental à ideia da nova cidade também obedeceria a esta visão utilitarista. Sem
deixar de lado a intenção de provocar a sensação impactante da chegada do progresso,
evitava-se a suntuosidade luxuriosa, com a adoção de conceitos estéticos relativamente
econômicos em adereços que se mostrassem mais dispendiosos.
O estilo Art Deco foi adotado para as principais construções, sob a aprovação de
Pedro Ludovico e seguiu, mesmo nas décadas seguintes, influenciando, como referência
ou inspiração direta os novos prédios públicos e até construções privadas, remetendo à
necessidade de união entre modernidade e eficiência a um custo satisfatório, se
comparado a estilos arquitetônicos mais ricos em ornamentos. Os prédios escolares das
décadas de 1930, 1940 e 1950 certamente tiveram estas ideias incorporadas às suas
concepções, embora apresentando estilo muito simplificado em relação ao acabamento
das fachadas, se comparado a outros prédios de repartições oficiais situados no centro
administrativo da nova capital. O prédio do Liceu, construído na década de 1930 é um
exemplo disso:
Figura 12 – Registro de 1937 das obras de construção do prédio do Liceu transferido para Goiânia: a
obra havia sido iniciada em setembro de 1936. (FONTE: O Popular, Projeto Álbum)
127
Figura 13 - Prédio próprio do Colégio Estadual Professor Pedro Gomes em foto de 1966: Em nossa
pesquisa, este é o registro fotográfico mais antigo da fachada do prédio, encontrado no acervo do colégio.
Em 1959, o colégio foi transferido para esta nova construção, iniciando o ano letivo neste prédio
construído na Avenida Sergipe com a rua Benjamin Constant. Ainda em 1959, um novo pavilhão de dois
andares foi inaugurado. Em 1960, a instituição passou a oferecer os ciclos I e II, sob o novo nome de
Colégio Estadual de Campinas, abandonando o nome Ginásio Estadual de Campinas. Somente em 1976 o
prédio receberia os procedimentos iniciais de sua primeira reforma. (FONTE: Arquivo do Colégio
Estadual Professor Pedro Gomes)
Entretanto, é notável o poder que o novo tem de tornar-se belo, na medida em que
consegue gerar expectativa, e um consequente certo fascínio, aos olhos de quem espera
pelo novo como algo minimamente diferente dos referenciais conhecidos. Tal fascínio,
originado da expectativa reveste o moderno de uma aura que só a novidade pode estar
imbuída: a possibilidade de superação daquilo que fica marcado como (ultra)passado a
128
partir do momento em um novo paradigma toma-lhe o lugar. Ao se deparar com o
prometido “novo” consubstanciado em matéria, ou seja, com o elemento modernizante
alardeado em discurso, pode-se ter a sensação de que o progresso - como uma marcha
para frente - está realmente acontecendo diante de si. O novo, apresentado enquanto
elemento da modernidade que será integrada ao cotidiano, traz em torno de si a sensação
da possiblidade real de inserção dos sujeitos em uma realidade que promete ser senão
melhor, pelo menos diferente da anterior.
129
representação social do mundo a partir de si em um contexto ressignificado.
Extremamente pertinente a esta exposição é a visão apresentada por Chartier quando
afirma que:
130
CAPÍTULO III
Com o fim da ditadura do Estado Novo, a política estadual também passaria por
mudanças. A abertura partidária possibilitada pela Quarta República Brasileira,
conhecida como “República Populista”, teve reflexos profundos no equilíbrio do poder
no Estado de Goiás. A saída de Pedro Ludovico do poder executivo estadual, em 1945,
abriu espaço para um novo contexto político no qual os partidos teriam que disputar a
preferência do eleitorado, entre eles o PSD, de Pedro Ludovico e seu principal
oposicionista a nível local, a UDN, de seu antigo aliado, Jerônimo Coimbra Bueno. Além
destas, outras agremiações menores em apelo eleitoral na política goiana, como o PTB e
o PSP, acabaram orbitando em torno destes dois grupos nos pleitos daquele período, que
viria a se findar em 1964, com o golpe militar que afastou o último governador eleito pelo
voto popular, Mauro Borges Teixeira, do PSD.
Primeiro governador eleito pelo voto popular nesta fase, Jerônimo Coimbra
Bueno, surgiu como figura pública associada ao meio político goiano quando foi
nomeado para a Superintendência Geral de Obras de Goiânia, em 1934. Junto com seu
irmão, Abelardo Coimbra Bueno, criou a empresa “Coimbra Bueno e Cia.”, sediada no
Rio de Janeiro, que ficou responsável pelos trabalhos de planejamento e execução das
principais obras de construção da nova capital do Estado de Goiás.
131
anunciarem terrenos de sua propriedade para venda na nova capital - quanto na vida
política (Anexos 4 e 5). Ao sagrar-se vitorioso, o engenheiro governou o Estado de 1947
a 1950. Depois disso, elegeu-se senador por Goiás em outubro de 1954, concorrendo pela
coligação UDN-PSP.
O apoio comunista, acatado por José Ludovico, gerou revoltas. Uma delas
centralizou-se na Liga Eleitoral Católica (LEC), associação que não aceitou o
posicionamento do candidato Juca Ludovico em apoiar o partido.
O arcebispo de Goiás D. Emanoel Gomes de Oliveira e o Bispo auxiliar D.
Abel Ribeiro, condenaram a atitude de Juca Ludovico, os quais passaram a
pedir apoio à população para o candidato udenista. (MOREIRA, 2000: p. 110)
132
Com a eleição de um governador da UDN, Pedro Ludovico e seus aliados
passaram à condição de oposicionistas, uma posição inédita para eles até aquele
momento. Neste novo contexto de inversão dos polos do poder, esses grupos – as novas
situação e oposição - passaram a disputar, no discurso, a legitimidade sobre o domínio do
legado associado aos virtuais pontos positivos ligados aos processos de modernização
pelo qual o Estado havia passado nos últimos anos. Nesse sentido, ambos detinham a
possibilidade de explorar politicamente suas respectivas contribuições para a construção
de Goiânia. O engenheiro Coimbra Bueno buscou se amparar fortemente nisso. Além de
associar-se ao lado positivo da mudança, buscou alimentar possíveis ressentimentos entre
a população e seus adversários. Tornou-se comum o hábito de apontar, junto ao
eleitorado, as falhas de seu antecessor para com as demandas populares. É precisamente
neste contexto que nasce e se consolida a ideia de um colégio público estadual em
Campinas.
Do ponto de vista eleitoral, apoiar a instrução escolar das massas era, no discurso
populista, visto como um inequívoco empreendimento modernizador, necessário ao
“progresso da nação”, ao qual agentes políticos de diferentes visões procuravam estar
associados. Se, nas décadas de 1940 e 1950, a democracia ainda nascia, a urbanização e
a abertura econômica que possibilitava o incremento da industrialização faziam emergir
a figura do político que tinha, entre suas pautas, a suposta promoção do progresso social
através da educação pública, preparando as novas gerações para assumirem postos de
trabalho adequados à sociedade urbana e integrada ao capitalismo global, que eram
133
anunciados como “a modernidade”. Jerônimo Coimbra Bueno e seu secretário da
educação, Hélio Seixo de Brito, souberam explorar muito bem esta oportunidade em seu
favor. Se havia alguma demanda por um colégio público na região, eles prometeram
supri-la. O hábil manejo eleitoreiro das “vontades populares” era ponto recorrente nas
dinâmicas políticas do populismo instalado naquele período.
134
expressão do período de crise da oligarquia e do liberalismo, sempre muito
afins na história brasileira, e do processo de democratização do Estado, que
por sua vez, teve que apoiar-se sempre em algum tipo de autoritarismo, seja o
autoritarismo institucional da ditadura Vargas (1937-45), seja o autoritarismo
paternalista ou carismático dos líderes de massas da democracia do após-
guerra (1945-64). Foi também uma das manifestações das debilidades políticas
dos grupos dominantes urbanos quando tentaram substituir-se à oligarquia nas
funções de domínio político de um país tradicionalmente agrário, numa etapa
em que pareciam existir as possibilidades de um desenvolvimento capitalista
nacional. E foi sobretudo a expressão mais completa da emergência das classes
populares no bojo do desenvolvimento urbano e industrial verificado nestes
decênios e da necessidade, sentida por alguns dos novos grupos dominantes,
de incorporação das massas ao jogo político. (WEFFORT, 1980: p. 61-62)
135
do país. A esse respeito, uma importante fonte interpretativa de tais processos é a pesquisa
desenvolvida pelo professor Luíz Sérgio Duarte da Silva. Seu trabalho corrobora a
imagem construída em torno de Coimbra Bueno como importante partícipe do processo
modernizador pelo qual passou Goiás ao ser inserido no contexto da edificação da nova
capital federal. Ter a nova capital do país no interior de seu território foi mais um
elemento explorado como um símbolo de progresso para os goianos.
Ao governar o Estado, Jerônimo Coimbra Bueno empenhou-se em fazer a
propaganda mudancista da capital nacional para as terras de nosso Estado. Foi
responsável pela organização de “comitivas” para sensibilizar a “Comissão de
Localização”, visitando com elas municípios do interior goiano, entre eles, Formosa,
Luziânia e Planaltina e apoiou a criação das caravanas de deputados goianos que
percorreram cidades pelo país para promover a pauta da mudança da capital federal
(SILVA, 1998: p.41).
O professor Luiz Sérgio aponta que, apesar da forte oposição que enfrentou nas
questões domésticas durante todo o seu mandato, Coimbra Bueno articulou junto ao
legislativo estadual projetos de infraestrutura necessários para a construção da nova
capital, entre eles: pistas de pouso, construção e melhoria de estradas, obras de rede
elétrica e de telecomunicações, além de prometer condições favoráveis para a aquisição
de lotes na nova cidade por parte de servidores públicos do Estado de Goiás. (SILVA,
1998: p. 46).
Ao deixar o governo estadual, exerceu suas competências técnicas, participando
das Comissões de Localização (1953-1956) e de Planejamento da Construção e de
Mudança da Nova Capital (1956-1957). No campo político, como senador pela UDN
(eleito em 1954), atuou de forma bastante próxima ao presidente Juscelino Kubitschek,
representando seus interesses mudancistas no Congresso. Liderou a bancada udenista nas
questões que envolviam a transferência e acabou sendo consagrado como “o homem que
construiu politicamente Brasília”.
Figura um tanto quanto singular em meio às disputas partidárias de seu tempo,
Coimbra Bueno, às vezes manteve-se alheio à participação direta nos jogos de poder
impostos pelo legislativo estadual, no qual sofreu, ao longo de todo seu mandato, forte
oposição dos deputados do PSD, cuja bancada dificultava ao máximo a aprovação de sua
plataforma, sempre visando seu desgaste e consolidando condições para o retorno do
partido ludoviquista ao executivo estadual no próximo pleito.
136
Jerônimo Coimbra Bueno chegou a ser considerado “traidor, inepto de
compreensão política, com ação perniciosa e desagregadora das organizações partidárias”
por parte de alguns importantes correligionários, como o deputado udenista José Fleury,
autor destas palavras dirigidas ao então governador (MOREIRA, 2000: p. 114). Ainda
assim, Bueno não conseguiu desvencilhar-se das tramas politiqueiras articuladas pelas
oligarquias e das práticas tradicionais de clientelismo envolvendo aliados de ocasião nas
diversas regiões do Estado. Estes motivos podem ser associados à queda udenista nas
eleições sucessórias, sendo que no pleito subsequente (1950), Altamiro de Moura
Pacheco, candidato da UDN, seria derrotado na disputa para governador por Pedro
Ludovico, enquanto Coimbra Bueno concorreria pelo PSP ao Senado, amargando derrota
junto com o candidato da UDN, Alfredo Nasser.
A lei sancionada previa, em seu Artigo 1º, que a instalação da nova instituição
deveria ocorrer no ano letivo de 1948, o que não aconteceu. A despeito da data de
concepção do texto original, a lei de criação do Ginásio de Campinas só foi publicada no
Diário Oficial do Estado de Goyaz, no dia 23 de junho de 1949, na edição nº 5929 - Ano
112 (Anexo 1). Todavia, sua efetiva instalação e funcionamento no bairro tardaria ainda
mais para acontecer, sendo celebrada em cerimônia solene ocorrida no dia 15 de abril de
1950 (Anexo 2).
137
objetivo de enaltecer a criação do colégio como algo esperado, desejado e necessário.
Nesse sentido, o redator utiliza o recurso de registrar a gratidão dirigida aos agentes
políticos responsáveis por tal ação, por meio de recortes selecionados entre os discursos
proferidos durante a festividade. Outro artifício, que confere peso ao tom elogioso destes
discursos emitidos em nome da comunidade beneficiada, é a atribuição de características
positivas aos atores citados e à população do bairro de Campinas, em geral, através do
uso de adjetivos de conotação positiva, relacionados a qualidades morais e intelectuais
valorizadas na época. Este registro, portanto, proporciona insumos para a análise do jogo
político no qual a criação do colégio ocorreu, sendo a cerimônia - quando analisada sob
a perspectiva de uma narrativa criada - uma encenação (política), um espetáculo de
enaltecimento de personagens políticos no qual a “mise-en-scène” descrita é tão
importante quanto o colégio nascituro em si. Nesta perspectiva, acreditamos que “não há
sistema político que abra mão do aparato cênico, que se conforma tal qual um teatro; uma
grande representação.” (SCHWARCZ, 2000)
Figura 14 - Fachada do Grupo Escolar Henrique Silva, onde funcionou o Ginásio Estadual de Campinas:
o Grupo Escolar Henrique Silva era o antigo Grupo Escolar Pedro Ludovico, o primeiro de Campinas. Na
inscrição do frontispício é possível ler “Ginásio Estadual de Campinas” logo abaixo do nome do grupo
47
O Grupo Escolar Henrique Silva foi inaugurado em 1936 sob o nome de Grupo Escolar Pedro Ludovico.
Inicialmente, era um grupo escolar municipal, concebido ainda em 1935 pelo então prefeito de Campinas
Licardino de Oliveira Ney. Durante o governo de Jerônimo Coimbra Bueno teve seu nome alterado. Este
prédio, que aparece na imagem, era situado na Avenida Minas Gerais, em Campinas. Neste mesmo
endereço, atualmente (2019, ano de publicação deste trabalho) está localizado o Colégio Estadual
Presidente Castelo Branco.
138
escolar. (FONTE: Arquivo do CEPI Professor Pedro Gomes. A imagem é uma reprodução fotocopiada,
sem referência de autoria e data).
139
“ação benevolente” de atenção à educação da população do bairro, creditando louros à
figura do governador e seu grupo político.
48
O registro da Ata, ao enfatizar a formação do governador como engenheiro, incluindo o epíteto junto ao
nome - fato comum na época, como verificado em muitos outros documentos - conferia a Jerônimo Coimbra
Bueno distinção intelectual e remetia à sua estratégia político-eleitoral de se associar, sempre que possível,
às supostas capacidades modernizantes comumente relacionadas à profissão de engenheiro e a sua atuação,
sobretudo enquanto esteve à frente das obras de Goiânia.
140
Como dito, a fala do professor Geraldo da Paixão foi elevada à condição de
“estudo filosófico” a fim de destacar a qualidade do grupo de professores por ele
representado e, consequentemente, valorizar as ideias por ele apresentadas. Para o público
espectador, os professores que compunham aquele corpo não poderiam ser, senão,
portadores de amplo e profundo saber, genericamente classificado como “filosófico”. A
escolha deste adjetivo alude à capacidade crítico-reflexiva que deu origem a todas as
ciências que se enfileiravam, diante dos espectadores, por meio do corpo docente que
estava sendo apresentado à comunidade. A palavra confere profundidade ao discurso do
professor, afastando-o do senso comum. Naquele momento, sua fala se fez especialmente
pertinente pois, segundo o documento, o professor astutamente apontou a educação como
uma esfera “problemática”. Intui-se que, ao apontar a existência de problemas, o efeito
esperado fosse o de destacar ainda mais a importância da criação da escola através da
comparação de realidades distintas daquela que a população local passaria a gozar. Ao se
referir à população de Campinas, como beneficiária direta pela instalação do ginásio, o
uso dos adjetivos “distinta e laboriosa” implicam, primeiramente, em uma valorização
daquele grupo social, de forma a lhe garantir proeminência em relação ao restante da
população da capital. A escolha da palavra “laboriosa”, certamente evoca o trabalho como
virtude, apontando para a valorização da população de Campinas em função de sua
suposta aptidão e disposição para o trabalho. A população descrita por este perfil,
especificamente os jovens sob seus cuidados, usufruiria daquela nova instituição de
ensino.
Outro grupo que teve espaço para se pronunciar, dentro dos “atos cênicos” que
compuseram a cerimônia de implantação do Ginásio de Campinas, foi o dos estudantes
do Ginásio. Para isso, Ivo Sasse, descrito como um “inteligente aluno”, foi empossado
como o primeiro presidente do Grêmio Estudantil juntamente com o corpo diretivo da
agremiação discente. Na ocasião, Sasse teve a oportunidade de proferir “breves” palavras.
A criação e apresentação do Grêmio Estudantil na mesma cerimônia em que se
inaugurava a escola pode ser vista como um significativo sintoma dos novos valores
políticos associados ao contexto de redemocratização pós-1945.
141
destacados, além de um discurso - que não teve seu conteúdo descrito – proferido pelo
recém-empossado orador do Grêmio Estudantil.
142
progresso associado ao momento vivido durante a cerimônia. Ao se fazer presente no
evento, a cidade de Catalão foi reverenciada como um “progressista município do sul-
goiano”.
O último ato do evento foi a subida ao “palanque” das duas maiores autoridades
políticas presentes: o Secretário da Educação e o governador do Estado. O Secretário
Hélio Seixo de Brito falou a respeito do processo de criação e implantação do Ginásio,
enfatizando seu esforço e do governador nesse sentido. Descreveu, também, outras
realizações que creditou ao governo do qual fazia parte, entre elas a Universidade do
Brasil Central, tratando-a como uma “conquista objetiva do governo para o povo”. O
secretário aproveitou o momento para lembrar que a criação do Ginásio fora uma
promessa de campanha, que Jerônimo Coimbra Bueno cumpria naquele momento. Esse
foi o ensejo para a realização de mais duas importantes promessas para a comunidade
campineira, especialmente para a comunidade escolar do Ginásio: a instalação, no
próximo ano (1951), do segundo ciclo no Ginásio de Campinas e a disponibilização de
recursos para a edificação de um prédio próprio para a instituição. Disse ter incluído, para
este fim, um milhão de cruzeiros na proposta orçamentária do corrente ano (1950),
condicionada à aprovação do legislativo. Tanto a primeira, quanto a segunda promessas
demorariam mais que o anunciado para se concretizar. A transferência para o prédio
próprio seria efetivada apenas em 1959. Já a instalação do segundo ciclo só seria
consumada em 1960, uma década após esta promessa. Apesar disso, é importante destacar
que o Ginásio já nascia, portanto, com a promessa de ser transformado em colégio. O
Ginásio Estadual de Campinas nascia, em 1950, predestinado a ser o Colégio Estadual de
143
Campinas. Ao finalizar sua fala, Brito prometeu, ainda em tom auspicioso, “que o
governo tudo faria para dotar Campinas de outros melhoramentos no setor educacional”,
sem especificá-los, contudo.
144
prometer a instalação do segundo ciclo (equivalente ao atual Ensino Médio, nível
consideravelmente valorizado pelas parcelas médias da população naquela época) e ao
mencionar a Universidade, de forma recorrente ao longo da cerimônia, naquele contexto,
os artífices do governo reforçavam seu papel na formação de uma geração futura mais
escolarizada. Este discurso era significativo aos olhos de muitos habitantes do tradicional
bairro, uma vez que ter este cenário como perspectiva para sua mocidade era,
definitivamente, algo inédito em Campinas.
145
Nossa hipótese é de que seria justamente este histórico de ausência, associado a
uma nova realidade marcada pelo crescimento populacional e pela alteração do perfil
econômico da região que tornava a demanda pelo colégio legítima.
Outra questão associada a esta reflexão que nos instiga, ao pensar naquela
realidade é: “a educação pública secundária, que sempre fora insipiente na região de
Campinas (e naquela altura ainda era em praticamente em todo o Estado), não poderia
esperar um pouco mais em favor da atenção a outras demandas necessárias à consolidação
da infraestrutura de Goiânia?” Para a oposição a Pedro Ludovico, a resposta era “não”.
Se o clamor popular existia, havia também a clara oportunidade de convertê-lo em votos.
A corrida eleitoral de 1947 tornou a demanda pelo colégio não apenas legítima, mas
urgente. A população de Campinas, composta de uma classe média associada às
atividades comerciais e à prestação de serviços queria ser valorizada. Um dos caminhos
apontados pelas dinâmicas políticas daquele momento seria a promessa de oportunizar
aos da comunidade as mesmas condições, ou pelo menos similares, de ascender a níveis
de escolarização mais elevados, como os alunos do Liceu.
146
século, implicando na persistência de uma mentalidade de elitização e em uma visão
instrumentalizada do ensino secundário. Se para as famílias trabalhadoras o trabalho era
mais importante, para as classes médias e para as elites era um meio de se diferenciar das
camadas pobres. Até a década de 1950, o nível secundário era, em Goiás, encarado como
etapa de preparação das elites para a formação superior, obtida quase sempre no Rio de
Janeiro, ou em outros centros, enquanto que para as camadas médias da sociedade, era
visto como elemento condicionante para a ocupação das funções operacionais na
iniciativa privada e dos cargos da baixa burocracia estatal.
Um dos dados apresentados, que nos permite observar uma trajetória do acesso
aos níveis mais básicos de escolarização, informa que, no Brasil “tínhamos, em 1900,
9.750.000 habitantes de mais de 15 anos, dos quais 3.380.000 eram alfabetizados e
6.370.000 analfabetos. Em 1950, 14.900.000 eram alfabetizados e 15.350.000,
analfabetos” (TEIXEIRA, 1957: p. 28-29). Conclui-se que, no transcorrer de cinco
décadas houve a permanência de um sistema seletivo, que excluía grande parte da
população já que, embora tenha diminuído o percentual de analfabetos em face à
totalidade da população, aumentou além do dobro o número absoluto de iletrados. Em
1950, o ano que marcou o início do efetivo funcionamento do Ginásio Estadual de
Campinas - uma localidade que já desfrutava de acesso à educação básica – estabeleceu-
se um novo patamar para a formação escolar na região.
147
Este significativo princípio de mudança indicado pela redução dos índices de
analfabetismo no Estado de Goiás se deveu, em parte às ainda tímidas reformas
promovidas no orçamento destinado à educação pública estadual, incrementado
discretamente, ano após ano, após o governo de João Alves de Castro. Na terceira década
do século XX ocorreu o surgimento de novas escolas e “grupos escolares” espalhados
pelo território goiano, em grande medida, graças à ação educacional empreendida pela
Igreja Católica que, com certo ímpeto preenchia demandas e vazios não ocupados pelas
instituições oficiais. Desta forma, constituiu especial papel neste contexto, a ação de
congregações de missionários católicos de origem europeia que foram responsáveis pela
fundação de escolas e o bispado de D. Emanuel Gomes de Oliveira, como afirmamos no
capítulo inicial. Portanto, todo este contexto teve forte implicação na vida cultural e na
instrução formal proporcionada à população de Campinas na primeira metade do século
XX.
49
Em nível nacional, os exames de admissão foram introduzidos para o ingresso no Colégio Pedro II através
do Decreto nº 4.468 de 1º de fevereiro de 1870 e regulamentados pelo Decreto nº 981 de 8 de novembro de
148
eram praticados, segundo, pela grade curricular complexa e, para os padrões culturais da
maioria da população, demasiada erudita, sobretudo após a Reforma Capanema, de 1942,
que dividia o ensino secundário nas modalidades, clássica e científica.
Na visão de Anísio Teixeira (1957), o ensino secundário foi, até meados do século
XX, mais procurado e desejado que o ensino primário50, pois inspirava uma certa
admiração proveniente do status social a ele associado, já que qualificava seus egressos
para um tipo de específico de prestígio intelectual, ou nas palavras do autor “classificava”
o aluno, e o lançava entre os “privilegiados e semi-privilegiados da nação”. Deste modo,
Teixeira, mais uma vez, nos auxilia em nosso esforço de reflexão acerca do sentido
simbólico e do peso político da inauguração de um colégio público na década de 1950, a
primeira década de funcionamento do Ginásio Estadual de Campinas.
Destarte, o ensino médio, assim como o superior, no contexto dos anos 1940 e
1950, seletivo, mas começava a se popularizar com a abertura de novas unidades nos
principais centros urbanos. A população de Goiânia, incluída a de Campinas, necessitava
de perspectivas que divergiam dos anseios mais modestos ainda reservados às populações
espalhadas pelo interior do Estado. A população campineira buscava se integrar às
1890. Posteriormente, durante o Governo Provisório de Getúlio Vagas, por meio do Decreto nº 19.890 de
18 de abril de 1931, como parte da reestruturação, em nível nacional, do sistema educacional, conhecida
como “Reforma Francisco Campos” estes exames tornaram-se obrigatórios nas escolas públicas de todo o
Brasil. Esta determinação vigorou até o ano de 1971, quando houve uma nova “reforma”. Como
constatamos, muitos estudiosos da educação brasileira concordam que os exames de seleção foram peça
fundamental em um período histórico caracterizado pela restrição no acesso ao ginásio. A “Reforma
Francisco Campos” estava inserida em um contexto de profundas mudanças pelas quais o país passaria a
partir de 1930, principalmente em função do incentivo ao desenvolvimento industrial e urbano por parte
das políticas do governo de Getúlio Vargas. Uma das implicações de tais políticas foi a intensificação da
demanda por mão de obra minimamente qualificada, o que intensificou a procura por serviços educacionais.
Os exames de admissão ao ginásio funcionaram, portanto, como uma barreira de acesso ao ensino
secundário, visto naquele momento como preparatório para a formação superior.
50
Anísio Teixeira apresentou os seguintes dados a respeito da composição e do acesso à rede de instituições
escolares de nível médio no Brasil, na década de 1950, que incluía o ginásio (primeiro ciclo), e o secundário
(segundo ciclo), associado a diferentes modalidades (secundário regular, Normal, comercial, industrial e
agrícola): em 1957 existiam “2.363 escolas de nível médio no Brasil, sendo que 1.887 mantêm o curso
secundário, 628, o comercial, 873, o normal, 86, os cursos industriais e 17, o curso agrícola.
A matrícula geral é de 780.639, sendo 579.781 no secundário, 114.000 no comercial, 67.000 no normal,
19.000 no industrial e 1.200 no agrícola. Na primeira série encontram-se 180.000 no secundário, 24.000 no
comercial, 24.000 no normal e 6.200 no industrial, ao todo 234.000, número equivalente aos dos que
terminam o curso primário.” (TEIXEIRA, 1957: p. 33)
De acordo com a visão do autor, isto revelava o grau de exacerbação a que chegava a busca por prestígio
social em detrimento de processos educacionais voltados para a prática profissional, já que os cursos
profissionalizantes industriais figuravam com menos de 3% da matrícula geral, o agrícola com 1,1% e o
comercial com pouco mais de 14%. Conclui-se, portanto, que apesar da expansão da rede, ocorrida até
aquele momento, o que a maioria das famílias ainda procurava era o curso secundário acadêmico,
preparatório para o ensino superior.
149
dinâmicas de trabalho e consumo da nova capital, almejando condições para obtenção
dos postos de trabalho mais ligados à intelectualidade que surgiam naquele momento,
dentro do contexto eminentemente urbano e supostamente moderno da capital.
51
Felipe Tiago Gomes foi um advogado paraibano que se destacou como ativista pela expansão do acesso
ao ensino secundário na década de 1950. Foi o principal idealizador da Campanha Nacional de
Educandários Gratuitos – CNEG (1948), difundida durante a primeira metade dos anos de 1950. Este
movimento foi gestado em meio ao movimento estudantil do Recife, do qual Felipe Tiago Gomes
participava. Em 1943, surgia o movimento embrionário que seria a essência da CNEG, denominado de
Campanha do Ginasiano Pobre (CGP). Ao longo da década de 1950, Gomes se empenhou pela difusão da
campanha em vários Estados da Federação, o que tornou a Campanha conhecida em todo o território
brasileiro e a fez gerar frutos concretos, com a efetiva fundação de escolas (em Goiás foram sete
“estabelecimentos cenegistas” fundados até 1953, com subvenção do Estado). Quando esteve em Goiânia
pela primeira vez, ele relata ter enfrentado “o boato de que a CNEG se tratava de um movimento
comunista”, algo comum no cenário de polarização do período. No entanto, Venerando de Freitas Borges,
o professor convidado para presidir a Seção Estadual da CNEG, apoiou o movimento. Segundo Gomes, o
ex-prefeito teria dito: “Se cuidar da educação do povo é comunismo, eu também sou comunista!” Assim,
Venerando tomou posse e presidiu a CNEG em Goiás à época de sua instalação. O primeiro estabelecimento
criado sob o escopo da campanha em Goiás foi o Ginásio Professor Ferreira. (GOMES, 1965, p. 98). (Ver
Anexos 6 e 7)
150
aparelho de Estado como uma questão meramente técnica, burocrática e formal. Seu
escopo enquanto ordenamento de coisas, pessoas, recursos, processos e direcionamento
de ações é o que costuma se chamar de “ponta do iceberg”. Interessa, portanto, a esta
pesquisa, tratar todos estes aspectos de forma interconectada, buscando entendê-los nos
contextos políticos e econômicos dos quais se originam, a fim de compreender seus
objetivos e consequências sociais no momento delimitado. A motivação para este
entendimento provém das ideias expressas pelo pesquisador em educação, professor e
pedagogo Nicanor Palhares Sá:
151
Worterbuch, compartilhada por Sá (1982): Ideologia é um “Sistema de ideias sociais
(políticas, filosóficas, religiosas, artísticas e etc.) que são determinadas pela respectiva
base material da sociedade que e refletem esta base”. Certamente, trata-se de um conceito
de viés marxista-leninista, que reduz e não explicita as diferenças entre a base material
(infraestrutura) e a superestrutura social, que, geralmente, coexistem em conflito.
Em uma formação social qualquer, várias ideologias estão presentes aos vários
segmentos da população. Aos intelectuais compete delas em função da classe
fundamental. Mas só autoritariamente se atinge a coerência completa. (1982,
p.18)
O autor nos explica que, entende-se por intelectuais, aqueles que desenvolvem,
organizam e divulgam uma concepção de mundo. Sendo assim, os papéis assumidos pelo
intelectual podem ser de criador, organizador e/ ou educador, incluindo profissionais da
iniciativa privada (burocratas da mídia de massa) e agentes públicos (do Estado), como
cientistas, professores universitários, juristas, e professores do nível básico. Neste ponto,
152
chegamos a uma conclusão caríssima ao nosso trabalho: a educação é, portanto, veículo
de propagação da ideologia. Assim, nas palavras do próprio Gramsci:
Sob este ponto de vista, a escola pode ser considerada o meio de difusão ideológica
mais eficiente, pois, de todos os aparelhos, é o que, certamente, dispõe de mais tempo,
sistematicamente organizado, ao longo da vida do indivíduo, para atuar sobre sua
formação. O célebre Henri Lefebvre também discorre sobre o assunto, assumindo um
olhar semelhante, porém de aplicação mais geral:
153
e a universidade propagam o conhecimento e formam as gerações jovens
segundo “padrões” (patterns), que convêm tanto ao patronato, quanto à
paternidade e ao patrimônio. Há disfunção quando o saber crítico inerente a
todo o conhecimento dá origem a revoltados. Às funções maciças da escola e
do liceu, sobrepõe-se a função “elítica” da universidade, que filtra os
candidatos, desencoraja ou afasta “os que se desviam”, permite o
establishment. Assim, os três graus de ensino (primário, secundário e superior)
não entram apenas como efeitos ou produtos da divisão social do trabalho,
doutrina já exposta, por vezes em nome da crítica liberal e moderada. Eles
fazem parte dela como causas e razões, como funções e estruturas e
subordinam-se aos diversos mercados capitalistas. (LEFEBVRE, 1973, p. 59)
A partir de toda a reflexão que nos foi proporcionada a partir destas leituras,
entendemos que o sistema educacional-escolar carrega em si, uma contradição quanto à
sua finalidade: é necessário elevar o nível de conhecimento da população a fim de
prepará-la para atender à permanente demanda por mão de obra qualificada que se
incrementa a cada avanço do sistema produtivo. Ao mesmo tempo, é necessário impedir
ou dificultar mudanças profundas de consciência que possam perturbar o status quo. As
escolas públicas secundárias, como o Ginásio Estadual de Campinas/ Colégio Professor
Pedro Gomes, estavam, nos anos 1940, 1950 e 1960, no centro desta questão.
154
múltiplas visões. Nesse sentido, concluímos, a partir de seu pensamento, que as
instituições de ensino, especialmente, de nível superior e especificamente as
universidades, podem abrigar um corpo de intelectuais-cientistas capazes de promover a
integração entre diferentes visões de mundo, as quais poderiam ser acomodadas de modo
a se complementarem, gerando um produto mais verdadeiro, um conhecimento que,
hipoteticamente, ultrapassa as barreiras de classe. Esta tese se ancora na crença de que as
instituições e seus intelectuais hábeis para tal tarefa seriam munidos de neutralidade no
que diz respeito à produção do conhecimento.
Weber, por outro lado, não crê nesta neutralidade, e chega a admitir a interferência
do pesquisador, munido de seus valores, na escolha do objeto e na formulação do
problema de pesquisa nas ciências sociais. Entretanto, curiosamente, acredita que, se as
regras do método científico forem respeitadas, a investigação, o trabalho empírico e suas
resultantes são desprovidos de valoração pessoal, tendo valor universal. O autor clássico,
portanto, desconsidera qualquer determinismo ideológico sobre o conhecimento
científico final, aquele que chega às pessoas.
Jacques Rancière (1971: p.25), por sua vez, afirma que a ideologia dominante é
um poder organizado em um conjunto de instituições que concentram a legitimidade em
torno de saberes, informações etc. A ciência é uma só, mas os saberes são de classe. O
controle sobre sistemas de saberes constitui o instrumento de dominação de classe (a
partir da ciência), pois é onde ocorre a articulação do processo de apropriação do
conhecimento - a saber: aquisição, transmissão, controle e utilização – e a ideologia do
grupo. Assim, o conceito de ideologia, para Rancière, emanada, a priori, partir destes
sistemas de controle, não corresponde somente a um conjunto de discursos ou um sistema
de representações abstratas, mas também a ações dirigidas e legitimadas por este controle.
A este respeito, concordamos com Palhares Sá (1982), quando este arremata a questão
afirmando que a
155
Interessa-nos, com essa exposição, mostrar que, para vários estudiosos do tema
em assuntos correlatos à educação, política e poder, a ideologia dominante é transmitida
através das ciências, e o ensino da ciência é a forma pela qual o grupo ou classe dominante
se apropria do saber científico. Este ponto é basilar para a sustentação de uma das ideias
que defendemos neste trabalho, de que o controle do sistema educacional-escolar,
expresso nas políticas educacionais dos agentes políticos (intelectuais, partidos,
governantes e gestores) possuía, no período populista, um marcante caráter ideológico.
Isso ocorria desde os anos 1930, quando Vargas percebeu a eficiência do uso
instrumentalizado da educação a favor de seu regime. Podemos afirmar que esta fórmula
ainda se expressava fortemente em Goiás à época da fundação do Ginásio Estadual de
Campinas.
Com a saída de Ludovico do poder, em 1945, sua maior arma até então, o discurso
de agente da modernização, acabou sendo usado pelos oposicionistas, em favor próprio e
contra o escolhido do grupo ludoviquista para disputar as eleições de 1947, José Ludovico
de Almeida. Desta vez, foi sua política que fora apontada pelos adversários como
envelhecida e carente de renovação. Com Goiânia já consolidada, os adversários tiverem
que apontar as falhas existentes no projeto modernizador desenvolvido ao longo dos
últimos anos, se voltando, oportunamente, para as regiões geográficas e áreas
administrativas que não teriam ainda vislumbrado, em seu cotidiano, os avanços
proporcionados pelo progresso. Dentro da própria capital, certamente não foi difícil
encontrar aceitação, entre o eleitorado, para tal discurso, tendo em vista que o crescimento
populacional se acelerava em ritmo mais veloz que as estruturas originalmente pensadas
por Pedro, levando a um descompasso da administração pública com as novas demandas
sociais. A educação pública foi uma das áreas exploradas nesse sentido. Assim, Campinas
era um “prato cheio” para o discurso oposicionista, uma vez que, entre as demandas das
156
novas camadas médias e populares da capital estava o provimento de formação escolar
em níveis que possibilitassem o acesso dos jovens às funções que, em tese, lhes
garantiriam um posicionamento social confortável.
Este cenário configura a eclosão, em nível local, das novas disputas políticas que
ocorriam no âmbito federal, tendo a União Democrática Nacional (UDN), como um dos
polos ideológicos mais fortes em relação ao rompimento com o momento anterior. Este
panorama, deflagrado no Estado após o afastamento do presidente Getúlio Vargas, e
consumado nos momentos que antecedem às eleições ocorridas em 19 de janeiro de 1947,
levou à emergência de um novo discurso desenvolvimentista regional na qual a criação
do Ginásio Estadual de Campinas estava inserida. Nesse ponto, os ataques que ensejavam
as disputas políticas direcionavam-se para as promessas de atendimento de demandas até
então ignoradas pelos agentes públicos, e a criação de uma escola com perfil avançado,
caracterizado, na época, pelo ginasial e secundário, para a região de Campinas, era uma
delas. Era uma oportunidade para o fortalecimento o novo viés do discurso populista em
nível local. Ao mesmo tempo, sendo o colégio, uma instituição de ensino secundário, algo
raro (e necessário) naquele momento, a reinvindicação de sua criação e de manutenção
era um instrumento de valor político.
52
Seu sobrenome “Brito” é encontrado com as duas grafias (“Brito” e “Britto”), nas diversas fontes que
pesquisamos. Não conseguimos encontrar, de fonte segura, o motivo pelo qual isto ocorre. Neste trabalho,
optamos por usar a grafia “Brito”, pelo fato de ser a encontrada nos documentos oficiais mais antigos aos
quais tivemos acesso. Somente utilizamos a grafia com duas letras “t” quando necessário, como por
exemplo em transcrições de originais, nos quais o nome consta desta forma.
157
A instalação do Colégio Estadual de Campinas, hoje Colégio Estadual Pedro
Gomes, foi outra festa das mais gratificantes, pois era a nossa resposta aos
apaixonados adversários políticos que não desejavam o meu sucesso na
Secretaria importante da Educação. Para eles – demagogicamente – Campinas
não comportava um estabelecimento de ensino daquele porte. A resposta está
aí no tamanho do Colégio Pedro Gomes e no benefício enorme que vem
fazendo. É a prova de que estávamos certos e, por isso, o meu silêncio às
críticas desonestas e insinceras é o que mereciam. (KELPS, 1999, p. 72).
Mas tão logo cheguei, com o plano de fazer uma especialidade médica no Rio
de Janeiro, surpreendentemente, fui convidado pelo governador udenista,
engenheiro Jerônimo Coimbra Bueno, que acabara de tomar posse no alto
cargo, depois de acirrada luta eleitoral, para ocupar a Secretaria de Educação
e Saúde. Ele estava em dificuldade para preenchê-la: várias correntes das
forças políticas que o elegeram, sem transigirem, ambicionavam o lugar (o
único!) para os seus candidatos próprios.
Assim, só uma atitude conciliatória e firme do governador acabaria com o
problema. Apresentou meu nome como homem de sua inteira confiança, e,
também, responsável pela sua eleição, para a importante Secretaria, o que foi
aplaudido por todos. Daí a origem do convite e minha dificuldade em não
aceitar. (KELPS, 1999, p. 66)
Este testemunho, dá indícios de que tal secretaria fosse vista como uma pasta
especial do ponto de vista político, talvez por proporcionar visibilidade ao seu ocupante,
talvez pelo poder que dela emanasse, sobretudo no que diz respeito à administração de
verbas, como o próprio Dr. Hélio menciona, se referindo aos recursos federais destinados
à construção do que viria a ser o Hospital Psiquiátrico Adauto Botelho, quando as pastas
ainda eram unidas administrativamente:
158
Desmembrada a Secretaria de Educação e Saúde, o governador convidou-me
para ficar, apesar de médico, na da Educação, que era mais volumosa e não
podia perder o ritmo do desenvolvimento em que estava com o nosso trabalho,
dizia ele. Juntas, a Saúde foi sempre prejudicada, embora as duas fossem
igualmente importantes e fundamentais para o Estado. Separadas, cada qual
seguiria seu rumo desembaraçadamente, com cada secretário cuidando
especificamente da sua, sem o atropelo da simultaneidade dos dois assuntos
complexos e essenciais, com proveito para ambas as secretarias. (KELPS,
1999, p. 68)
Assim, ele sintetizou sua opinião a respeito da importância de seu trabalho como
secretário da Educação do Estado, dispensando atenção à menção da criação do Colégio
Estadual de Campinas como uma grande realização:
Na Educação, com técnicos de ensino de alto mérito e outros excelentes
auxiliares da mesma área, transformamos, ampliamos e renovamos a instrução
pública no Estado, com apoio total do governador e do Ministério da Educação.
(KELPS, 1999: p. 68)
Em 1948, quando era Secretário de Educação e Saúde, no governo Coimbra
Bueno, dando uma reestruturação no ensino estadual, que estava desordenado,
criamos três colégios: Colégio Estadual de Goiânia, Colégio Estadual de Goiás
e Colégio Estadual de Campinas, no já populoso bairro da capital. (KELPS,
1999: p. 71)
Em Goiás, assim como em outras partes do país, um dos maiores obstáculos para
a para a instalação de novas unidades escolares era, desde o século XIX, a escassez de
recursos para a construção, expansão ou reforma de instalações próprias por parte do
poder público. Em meados do século XX a situação em Goiás ainda era de precariedade
nesse aspecto. Até a década de 1960, muitas escolas e colégios funcionavam em espaços
inadequados ou improvisados, cedidos ou alugados por proprietários particulares ou pelas
159
prefeituras. Uma das alternativas mais exploradas pelo Estado, até então, era a subvenção
de atividades educativas em instituições particulares em situação de convênio. O Estado
concedia benefícios fiscais, recursos, ou algum outro tipo de vantagem em troca da oferta
de vagas públicas a estudantes. Outro recurso, muito utilizado desde os tempos da Cidade
de Goiás como capital, era a instalação de escolas, grupos escolares (a partir da década
de 1920), ginásios, cursos normais e outros, em condições físicas que estavam longe do
ideal, fosse adaptando casas que não foram originalmente construídas para tal finalidade
ou promovendo seu funcionamento em anexos feitos em prédios de instituições já
existentes.
Bretas descreve como essa prática foi usada à exaustão pelos governantes de Goiás
como “solução” para as novas demandas, como no caso do Liceu de Goiás original, que
surgiu tendo como sede uma casa doada ao Estado na forma de herança pelo Dr. Corumbá,
conhecido como “benfeitor da Geometria em Goiás”. (BRETAS, 1991: p. 227-228)
Ao longo de sua história, o próprio Liceu abrigou outros cursos que se tornariam
instituições independentes, como a Escola Normal Oficial, além da Academia de Direito
(BRETAS, 1991: p. 470-471). A própria Escola Normal do Estado, depois de obter sua
autonomia em relação ao Liceu e, em 1929, ser instalada em prédio próprio sob o
pomposo nome de Palácio da Instrução, teve o Grupo Escolar Estadual de Goiás e o
Jardim de Infância aglutinados no mesmo prédio. A logística empregada para o
funcionamento de mais de uma instituição educativa em compartilhamento de um mesmo
espaço físico é exemplificada pela descrição fornecida por Bretas de como se dava o
funcionamento dos três níveis no Palácio:
160
em auditório - até sua primeira expansão, com a construção de um novo pavilhão na
década de 1950. (BRETAS, 1991: p. 579) Contudo, a limitação de recursos e a alocação
deles em outras prioridades fez com que outras unidades educacionais não recebessem a
mesma atenção dispensada inicialmente ao Liceu, a vitrine da moderna educação pública
estadual sob a gestão de Pedro Ludovico. A construção de outras unidades, mesmo para
as outras instituições trazidas da antiga capital, como a Escola de Aprendizes Artífices e
a Escola Normal Oficial, tiveram que esperar mais um pouco. A Escola de Aprendizes e
Artífices foi instalado em 1942 em um prédio próprio construído pelo Governo Federal.
Já a Escola Normal, primeiramente foi alojada em um sobrado residencial pertencente ao
professor Pardal dos Reis Gonçalves. Em 1945, foi realocada no prédio da Faculdade de
Direito. Esta situação durou apenas um ano. Em 1946 voltou a funcionar em outros
sobrados residenciais alugados, sempre em alegado “caráter provisório”. Seguiu-se a isto
uma arrastada jornada pela construção do prédio que viria a abrigar em definitivo a Escola
Normal, que seria convertida no Instituto de Educação do Estado de Goiás (IEG) no final
dos anos 1950. (BRETAS, 1991: p. 586)
161
p. 584). Entre os documentos pesquisados neste trabalho, os textos de leis revogadas,
revelam que foram consideráveis as movimentações a respeito de negociações entre
proprietários particulares e o governo do Estado. Em 1952, por exemplo, houve a primeira
menção registrada em lei de uma tentativa de aquisição do terreno. (Anexo 8) Em 1957,
dois textos trataram do mesmo assunto (Anexos 9 e 10). A lei nº 1502 de 17 de julho
dispunha os termos nos quais se daria a permuta de terrenos entre o poder público e o Sr.
Eduardo Bilenjiam, citado como proprietário dos terrenos estabelecidos na quadra
localizada no “Loteamento Vila Abajá”, bairro residencial anexo a Campinas, entre as
ruas Santa Luzia, Rua 1, Benjamin Constant e Avenida Perimetral, compondo um total
de 5583 m². Em troca desta área, o Estado ofertava um conjunto de lotes em Campinas,
com metragem total de 2977, 26 m², acrescido do pagamento de indenização no valor de
260.574,00 Cruzeiros (100 Cruzeiros por metro quadrado excedente dos terrenos do Sr.
Bilenjiam em relação à área pública ofertada).
53
O advogado José Feliciano Ferreira era um político jataiense proveniente de família ligada ao
agronegócio. Desde que ocupara seu primeiro cargo eletivo, como vereador na Câmara Municipal de Jataí,
mostrou-se possuidor de útil espírito de liderança. Este fato, aliado aos laços políticas que mantinha com
as oligarquias do sudoeste do Estado favoreceram uma rápida ascensão em sua carreira política dentro do
partido de Pedro Ludovico. Em 1950 elegeu-se deputado estadual pelo PSD. Foi secretário de Educação de
Goiás durante o mandato de seu antecessor, José Ludovico de Almeida (1955-1959), também do PDS.
Ocupou o cargo entre 1955 e 1958. Nas eleições de outubro de 1958, foi eleito governador, ao derrotar
César da Cunha Bastos, da UDN, assumindo em fevereiro de 1959. Não fugindo à regra política da época,
na qual era tão trivial encampar um discurso desenvolvimentista, naquele momento fortemente
contaminado pela construção de Brasília dentro de nosso Estado, Feliciano conduziu “um governo baseado
em três pilares que remetem à ideia de modernização: estradas, energia, escolas”. Neste trinômio, chama-
nos a atenção a ênfase concedida aos investimentos na área da educação, principalmente sob o ponto de
vista estrutural, com a expansão da rede. Ferreira também priorizou o suporte ao governo federal nas
medidas necessárias à construção de Brasília, tendo importante papel na desapropriação da área do novo
Distrito Federal e na instalação da rede de transmissão elétrica para a nova sede administrativa do país.
162
2568, de 10 de setembro de 1959, gerando assim, a situação que possibilitou a
transferência do ginásio para seu prédio definitivo, que ainda viria a ser construído e
inaugurado pouco tempo depois.
Permaneceu no cargo até fevereiro de 1961, quando foi substituído por Mauro Borges Teixeira, filho de
Pedro Ludovico.
163
governo, ele afirma que o prédio quase foi construído fora dos limites do bairro de
Campinas:
Esta fala deve ser analisada à luz das intrincadas relações de disputas entre
situação e oposição, especialmente entre PSD, UDN e seus respectivos grupos coligados.
A alegação de que o governo do Estado cogitou a possibilidade de não construir o Colégio
Estadual de Campinas no bairro pode ser compreendida em função da tática eleitoral de
despertar e alimentar ressentimentos da população em relação a oposicionistas. Podemos
conjecturar que, caso seja verdade, este fato ajuda a explicar a demora da instalação do
colégio, tendo em vista a sequência de governos do PSD, que, conforme queriam
denunciar seus oposicionistas, aparentemente nutria certa antipatia pela região do antigo
município ou, especificamente, pela ideia da existência de um colégio daquele porte em
Campinas, como alegou Hélio Seixo de Brito.
Chama atenção, também, a descrição que o candidato fez do público alvo que
seria beneficiado pela instalação do colégio em Campinas. Ao citar como beneficiários
“uma legião de moços desafortunados, filhos de famílias pobres”, o vereador deixa claro
um dos elementos discursivos do populismo do período: o apelo às necessidades das
massas. Percebe-se aí um certo paternalismo, que expressa uma suposta preocupação com
as condições de “justiça e equidade” em que esta população iria adquirir insumos culturais
para “lutar pela vida”.
164
decisivos para a construção da imagem que se perpetuaria ao longo das décadas seguintes
acerca do primeiro colégio de Campinas, ocorreram, entre as quais destacamos: condução
da instituição durante a edificação do novo prédio, a transferência para da estrutura
existente para o novo prédio, realização de obras de expansões prediais posteriores, como
o auditório, e um segundo pavilhão, além do aparelhamento de laboratórios, conforme
relatado nos arquivos da escola. Por tudo isso, esta diretora é associada à elevação do
ginásio ao status de colégio, o colégio que Campinas tanto esperava. Outro aspecto que
influenciou na construção simbólica da imagem que o colégio veio a consolidar entre a
coletividade goianiense nos anos seguintes, foi trazida no mesmo ato em que ocorreu a
elevação, como que coroando aquele momento: a adoção de um novo nome, “Professor
Pedro Gomes”.
Figura 15 - Fac-símile do texto original da Lei nº 2568, de 10 de setembro de 1959: Texto assinado pelo
governador José Feliciano Ferreira, pelo Secretário de Educação e Cultura José Pereira Pinto e pelo
Secretário da Fazenda, Fellipe Santa Cruz Serradourada. A lei determinava a criação do 2º Ciclo
Secundário, elevando à categoria de colégios os ginásios estaduais das cidades de Morrinhos, Rio Verde,
Jataí e do bairro de Campinas, em Goiânia (Art. 1º). O texto também oficializava o batismo dos novos
colégios com denominações completamente diferentes das que possuíam enquanto ginásios. Em seu artigo
165
2º, a lei institui o ano letivo de 1960 como prazo para que as providências necessárias ao funcionamento
destes cursos secundários fossem tomadas pela Secretaria de Educação e Cultura. Chama atenção,
também, a criação de dezenas de cargos de professores que deveriam assumir os postos demandados pelas
novas instituições. (FONTE: Casa Civil do Governo do Estado de Goiás. Disponível em
http://www.gabinetecivil.goias.gov.br/leis_ordinarias/1959/lei_2568.pdf )
Dona Lígia Rebelo teve sua gestão marcada por eventos políticos e sociais de
relevância local e nacional, que acabaram, naturalmente, influenciando as dinâmicas
internas do colégio. Sem dúvidas, o mais marcante deles, foi o golpe militar de 1º de a
abril de 1964. Este fato reverberou em tensões internas entre estudantes, o Grêmio e a
direção da escola, em situações que, muitas vezes, extrapolavam os muros do colégio,
muito em parte devido ao alcance da atuação de entidades estudantis como a UGES e
partidos políticos, como o PCB, que vinha estabelecendo conexões com a associação
representativa dos estudantes do Colégio Pedro Gomes, o Grêmio. Relatos que
representam o discurso das autoridades gestoras e do corpo docente frente a situações
relacionadas ao conturbado período foram registrados no documento “Atas do Conselho
dos Professores do Colégio Estadual Prof. Pedro Gomes”. Pretendemos tratar deste
assunto, em específico, em um projeto futuro, possivelmente em uma pesquisa de
doutoramento na qual buscaremos dar prosseguimento aos estudos acerca da relação desta
instituição com a sociedade em momentos posteriores aos abordados neste trabalho.
Foi também durante sua gestão de Lígia Rebelo, que outro marco simbólico
associado ao Colégio Pedro Gomes e à comunidade campineira ganhou novo status e
dimensões: a fanfara foi elevada à categoria de banda marcial. Desde sua criação, em 15
de abril de 1950, a inicialmente denominada Fanfarra do Ginásio de Campinas se
destacou pela sua marcante participação nos grandes eventos cívicos e datas
comemorativas celebradas em Goiânia. Com seus elementos musicais, coreográficos e
alegóricos, como carros temáticos, a banda rapidamente se consolidou como um emblema
166
da instituição presente no imaginário das pessoas que presenciavam os desfiles. Em 7 de
setembro de 1960 a fanfarra foi transformada em Banda Marcial e rebatizada como
“Banda Marcial Lígia Rebelo”, em homenagem à diretora em exercício.
167
3.5 – O novo nome é a cereja do bolo: quem é a pessoa que emprestou seu nome ao
colégio de Campinas?
168
Portanto, se solidarizar com o professor Pedro Gomes, mesmo após seu
falecimento, mostrando-se politicamente favorável ao colégio que passaria a ostentar seu
nome, poderia ser entendido como um ato de sensibilidade e patriotismo, já que o nome
do professor passaria por uma construção simbólica que o associaria à educação e à
cultura literária regionalista. O escritor goiano Bernardo Éllis contribuiu para sua
valorização nesse sentido ao afirmar que fora influenciado pela prosa do professor e
opinar em artigo:
O autor de “Na cidade e na roça” tem lugar marcado na literatura goiana, onde
definiu uma linha de arte literária profundamente ligada à terra e focalizando
os aspectos engraçados ou grotescos dos viventes do sertão, linha que vinha se
opor à inaugurada por Hugo de Carvalho Ramos, mais cerebrina, que aproveita
com maior profundidade os recursos literários ou artísticos tanto da fala como
dos temas. (COLÉGIO PEDRO GOMES, Recorte de Jornal sem data e sem
referência)
Assim, o colégio também deveria ter sua imagem associada aos mesmos “elevados
propósitos” culturais atribuídos ao professor que lhe emprestava o nome, justificando
coerentemente a escolha do nome, efetivada com o novo batismo. A mudança de nome
funcionou como um marcador simbólico da assunção a um novo status jurídico enquanto
instituição educativa e, consequentemente, a um patamar de importância mais elevado
diante da sociedade campineira e goianiense.
Na década de 1950, embora Pedro Gomes não tivesse ligações políticas, que
tenham se tornado públicas, com os grupos que disputavam o poder naquele momento54,
o educador, através de seu nome e relativo reconhecimento público, foi envolvido em
uma disputa de caráter político-ideológico travada entre agentes que representavam os
partidos divergentes. No dia 11 de janeiro de 1953 a edição nº 26 do diário Jornal de
54
Embora tenha se afastado de quaisquer atividades políticas durante sua velhice, o ex-professor esteve
bem perto do poder em outros tempos. Em 1918, já com 36 anos se casou com Dona Lydia Xavier de
Almeida, irmã do ex-presidente do Estado José Xavier de Almeida, governante entre 1901 e 1905. Durante
a Primeira República, Pedro Gomes de Oliveira teve uma vida ativa na esfera político-administrativa na
antiga capital do Estado, ocupando algumas funções no poder executivo estadual. Em 1912, ele foi nomeado
“chefe da 1ª Secção da Secretaria de Instrucção, Indústrias e Obras Públicas”. (Anexo nº 13). Em 1917, foi
nomeado delegado de polícia. (Anexo nº 14).
169
Notícias (Imagem nº 16), trouxe, destacada em sua capa uma matéria, concluída na página
7 daquela edição (Anexos 17 e 18), com o seguinte título: “Vetada lei que beneficiava o
educador goiano Pedro Gomes”. O subtítulo afirmava: “Clamorosa injustiça do
governador do Estado – Uma lei de favores pessoais onde não cabe um nome ilustre,
encanecido ao serviço da cultura – Cargos com idêntica denominação, idênticas
atribuições e vencimentos diferentes.”
55
Alfredo Nasser foi um advogado, político e professor natural de Caiapônia – GO. Atuou como jornalista
na Folha de São Paulo na década de 1920.
170
Durante a primeira década do regime democrático, os periódicos que eram
órgãos oficiais de partidos políticos foram sendo extintos e, ao final da década
de 1950, surgiram três periódicos “independentes” que ameaçaram mais
severamente as posições de O Popular e Folha de Goiaz: Diário da Tarde,
fundado por pessedistas, Diário do Oeste, comprado por udenistas, e Cinco de
Março, fundado por pessepistas. Ou seja, o grupo político que dirigia O Social
passou a dirigir o Jornal da Tarde, o grupo político que dirigia o Jornal do Povo
passou a dirigir o Diário do Oeste e o grupo político que dirigia o Jornal de
Notícias passou a dirigir o Cinco de Março. Entretanto, os novos jornais, assim
como O Popular e Folha de Goiaz, não evidenciavam em suas edições suas
relações político-partidárias. (NASCIMENTO, 2018, p: 82-83 in Revista
Espaço Acadêmico nº 202, março de 2018)
Estas páginas do Jornal de Notícias noticiaram, portanto, que dois anos antes de
seu falecimento, Pedro Gomes de Oliveira teve a oportunidade de ver reajustado o
defasado valor de seus vencimentos como aposentado. A matéria jornalística, porém,
afirma em tom de denúncia, que ele fora vítima de descaso por parte do governador do
Estado, que vetou os artigos da lei aprovada pela Assembleia Estadual, cujo texto
beneficiaria o educador. O governador, naquele momento, era o próprio Pedro Ludovico
Teixeira, que exercia desde 31 de janeiro de 1951 seu mandato obtido através de eleições
democráticas vencidas contra o udenista Altamiro de Moura Pacheco. A matéria fazia
referência à aprovação do texto da Lei nº 723, sancionada pelo governador mediante a
exclusão de apenas um artigo, de um total de cinco. A lei em questão tratava da criação
de cargos na Secretaria de Educação, “com vencimentos superiores ao do nível atual de
proventos da maioria dos servidores públicos de Goiás”. O artigo vetado propunha,
especificamente, a “elevação dos proventos atribuídos ao velho educador”. De acordo
com o veículo, o governador justificou seu veto alegando que tal favorecimento
individual acarretaria desequilíbrio nos valores dos proventos em relação aos outros
servidores na mesma condição que Pedro Gomes, caracterizando um favorecimento
injusto, caso o reajuste individual proposto se somasse a um futuro reajuste geral que o
governador afirmava ter como plano futuro.
171
Figura 16 - Capa da edição número 26 do Jornal de Notícias, publicada no dia 11 de janeiro de 1953: o
Jornal de Notícias foi um veículo associado à oposição ao grupo ludoviquista no Estado de Goiás.
Veiculava pautas ligadas ao programa udenista tanto na esfera federal quanto regional e dedicava sua
linha editorial à crítica aos adversários, apesar de não explicitar suas conexões partidárias. Apresentava,
também, conteúdos que faziam alusão à exaltação de valores cristãos, familiares e anticomunistas. Na
capa desta edição podemos notar um elemento significativo: o grande destaque dado às manchetes que
traziam, em tom de denúncia, notícias de caráter negativo em relação ao governo do Estado. Da mesma
forma, mereceu destaque a transcrição de uma mensagem do ex-governador Jerônimo Coimbra Bueno
(UDN) que havia sido veiculada pela Rádio Brasil Central no dia 06 de janeiro daquele ano. Além disso,
a única foto jornalística da capa é um registro da visita a Goiânia do deputado federal goiano pelo PSP,
João D’Abreu56, que assim como Coimbra Bueno vinha atuando no Congresso Federal em prol da
56
João D’Abreu foi um político, odontólogo, advogado e professor goiano. Nasceu em 4 de junho de 1888,
na Vila de Santa Maria de Taguatinga (GO), atual município de Taguatinga (TO). Na juventude, teve a
oportunidade de estudar na capital do Estado, cursando o ensino secundário no Liceu de Goiás. Graduou-
se em odontologia em 1911, pela Faculdade de Odontologia do Rio de Janeiro. Em 1925 bacharelou-se em
direito pela Faculdade de Direito de Goiás. Sua trajetória na política foi efetivamente iniciada como
vereador na cidade de Arraias, entre 1923 e 1926. Entre 1926 e 1930 assumiu como intendente (equivalente
a prefeito) da mesma cidade. Em 1934 foi eleito deputado estadual, chegando a ocupar a presidência da
Assembleia Legislativa, entre setembro de 1936 e novembro de 1937. Em 1937 ocupou, também, a função
de Diretor Geral da Fazenda. Em 1945, elegeu-se deputado federal pelo PSD para participar da Assembleia
Constituinte Nacional. Com a promulgação da nova Constituição, em 1946, a Constituinte foi convertida
em Congresso ordinário e João D’Abreu exerceu seu mandato de deputado até 1950. As eleições de 1950
marcaram seu estratégico afastamento de Pedro Ludovico, quando foi reeleito para novo mandato como
172
campanha de transferência da capital federal para o Planalto Central. Com relação à organização estética
da capa, nota-se que a diagramação da página valoriza tais elementos políticos em sua composição,
enfatizando-os tanto ou mais que a própria logomarca do jornal, presente de forma discreta no canto
direito.
“Pedro Gomes, que tirou da boca da família os magros dois contos com que
editou ‘Na cidade e na roça’, esse mesmo Pedro que às vésperas de morrer,
entre irônico e melancólico, dizia que a publicação do terceiro volume de seus
contos dependia de dinheiro.” (JORNAL DE NOTÍCIAS nº 313, p. 1; p.8:
1958).
Se seu falecimento recente havia contribuído para o resgate de sua obra como
escritor, colocando sua memória em voga, como educador ainda faltava igual
comprometimento em reconhecer sua trajetória. Durante sua vida, o professor Pedro
deputado federal pelo seu novo partido, o PSP, em coligação com o PTN. Nas eleições de 1954, seu partido
se aliou à UDN, quando foi eleito para um novo mandato no Congresso Nacional (1954-1958), pela
coligação PSP-UDN. Encerrou o mandato como líder do PSP na Câmara. Em reaproximação com o PSD,
seu partido compôs chapa vitoriosa nas eleições para o governo do Estado em 1958, elegendo José Feliciano
Ferreira (PSD) como governador e João D’Abreu como vice (pelas regras eleitorais vigentes desde 1946,
os candidatos a vice disputavam eleições independentes dos candidatos a titular). Assim, de 1959 a 1963
foi vice-governador de Goiás. Seu último cargo eletivo foi o de prefeito da cidade Arraias, pela ARENA,
no período de 1968 a 1972.
173
Gomes não teve nenhuma relação direta com a escola de Campinas à qual veio emprestar
seu nome. Tal fato, entretanto, não foi empecilho para que o ex-professor, naquele
momento falecido há poucos anos, e que fizera carreira no Liceu, fosse “homenageado
para a posteridade” emprestando seu nome para uma instituição de ensino que começava
a ser cada vez mais importante para a região de Campinas. De maneira geral, desde a
instituição da República, possuir histórico de relação direta com a instituição de ensino à
qual se nomeia nunca foi pré-requisito para ter o nome escolhido para batizar instituições
de ensino públicas no Brasil. Em Goiás, a situação não era diferente. Políticos e pessoas
públicas, com algum destaque a nível regional, já eram os preferidos para emprestar seus
nomes aos grupos escolares criados pelo Estado, desde a segunda década do século XX.
Como exemplo disso, o professor Genesco Bretas (1991: p. 512) cita que, até
1930, havia 16 grupos escolares espalhados pelo Estado funcionando por conta do
governo estadual e mais dois grupos municipais, um em Morrinhos e outro na Cidade de
Goiás (estes eram mantidos pelas suas respectivas intendências, sendo que, na Cidade de
Goiás havia, também, um grupo mantido pelo Estado).
174
Rocha Lima, que exercera a função de presidente do Estado de 1905 a 1909 e entre 1923
e 1925. Rocha Lima ainda foi também senador federal entre 1926 e 1930.
No caso de Mestra Nhola, quando a educadora teve seu nome escolhido para um
grupo escolar, este modelo de instituição escolar representava o que havia de mais
moderno e significativo, no que diz respeito às políticas públicas voltadas para o Ensino
175
Primário no Brasil. Uma novidade anunciada como um “grande melhoramento” trazido
para a realidade educacional de Goiás.
Por mais que seja um ato essencialmente político, percebemos que não se nomeia
uma escola pública com um nome que não possua respaldo de algum grupo que o sustente.
O emprego de um nome oficial para um espaço público - sobretudo aqueles que, como
escolas, envolvem expectativas sociais voltadas para o desenvolvimento humano - com
potencial de enraizamento memorialístico relacionado a afetividades vinculadas à
vivência de uma relação pessoa-lugar, tem que se justificar de modo minimamente
coerente com sua função e/ ou expectativas sociais. Se um lugar possui esse potencial,
principalmente quando nos atentamos ao ambiente escolar, que é pedagogicamente
pensado para finalidades educativas que podem desencadear tais processos, o nome
também pode ser encarado como “elemento educativo”, inserido na cultura escolar
através da sua naturalização no cotidiano, obtida por meio de sua inserção no currículo
oculto ou através da simples repetição de seu uso.
Isso se estende a quaisquer estruturas públicas, nas quais seus nomes podem ser
instrumentos de perpetuação do poder, apresentando, portanto, alto potencial educativo
por meio da inculcação e permanecia simbólica junto à população. Certamente, nomear
um viaduto pode ser tão importante para seus agentes promotores quanto atribuir nome a
uma escola, porém de maneiras muito diferentes, pois a sociedade desenvolverá relações
diferentes com ambos. Um não possui maior importância que o outro de maneira absoluta
e imutável. Sua importância é construída e alterada dinamicamente em função das
demandas e necessidades mais valorizadas pelo(s) grupo(s) atingido(s) por sua existência
em cada momento.
176
O nome “Colégio Estadual de Campinas”, que chegou a ser utilizado brevemente
nos documentos e em uniformes nos anos de 1959 e 1960 parecia suficientemente altivo,
principalmente pelo fato de remeter diretamente à desejável singularidade da instituição
naquela época, caracterizada pelo sentimento de “bairrismo”. Este nome soava como “o
colégio estadual do bairro de Campinas”, ou seja, o único da região. Era o colégio de
Campinas e, consequentemente, do povo de Campinas, em simbólica oposição ao Colégio
Estadual de Goiânia. Este, por sua vez, diz respeito ao “rival” Liceu. Trata-se de outra
renomeação ocorrida nos anos iniciais da nova capital, mas que, ao contrário do caso do
nome de Pedro Gomes, não logrou sucesso na substituição do nome anterior. O
oficialmente chamado Colégio Estadual de Goiânia era grande referencial para a
educação secundária do Estado, mas praticamente ninguém o chamava por este nome. O
Liceu, que, pelo menos oficialmente (como pode ser visto em documentos da instituição
e da Secretaria de Educação) havia adotado o nome “Colégio Estadual de Goiânia” desde
a década de 1940, continuava sendo amplamente conhecido como Liceu de Goiânia entre
a população. A popularidade e força simbólica do nome Liceu, que remetia às suas
origens se mostrou mais forte que qualquer tentativa de alteração proposta na esfera
política. Ao ser transferido para Goiânia, o primeiro nome adotado fora Liceu de Goiânia,
em ode à nova capital. Depois esse nome passou a fazer ainda mais sentido quando a
sucursal do Liceu na cidade de Goiás adquiriu independência, retomando seu nome
original de Liceu de Goiás (Lyceu de Goyaz).
177
do Estado, parecia ser uma atitude coerente aos olhos das pessoas mais atentas ao cenário
cultural goiano.
Muito embora seja o topônimo, em sua estrutura, como já se acentuou, uma forma de
língua, ou um significante animado por uma substância de conteúdo, da mesma
maneira que todo e qualquer outro elemento do código em questão, a funcionalidade
de seu emprego adquire uma dimensão maior, marcando-o duplamente: o que era
arbitrário, em termos de língua, transforma-se, no ato do batismo de um lugar, em
essencialmente motivado, não sendo exagero afirmar ser essa uma das principais
características do topônimo. (DICK, 1990: p. 38).
Deste modo, entendemos que a atribuição de nomes a lugares é um processo com
motivações específicas ao contexto social e temporal em que ocorre, sendo, portanto, uma
representação da realidade histórica e cultural de uma sociedade. Ainda sobre o elemento
motivacional intrínseco ao ato de nomear um lugar, a pesquisadora nos explica que a
motivação para a escolha de um nome para local de uso coletivo reside na
intencionalidade do grupo ou agente denominador, a qual é acionada por circunstâncias
que tem o poder de gerar um “processo seletivo”, no qual possibilidades de nomes são
cogitadas e excluídas:
178
[a] intencionalidade que anima o denominador, acionado em seu agir por
circunstâncias várias, de ordem subjetiva ou objetiva, que o levam a eleger,
num verdadeiro processo seletivo, um determinado nome para este ou aquele
acidente geográfico. (DICK, 1990: p. 39).
179
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Constatamos, ainda, que antes da criação do Colégio Santa Clara, a maior parte
da população da região de Campinas esteve à margem de qualquer possibilidade de
aquisição de instrução escolar para além dos níveis mais básicos nas chamadas “aulas de
primeiras letras”. Este conhecimento também estava restrito a quem podia pagar pelas
aulas dos “mestres-escola”, como o professor Nico Eusébio. Esta foi a realidade da cultura
escolar desenvolvida na Campinas do século XIX: muitos relatos de uma população que
vivia à margem dos conhecimentos formais consagrados nos currículos de instituições
como o Liceu de Goiás. Neste cenário, poucos eram os cidadãos campineiros que
conseguiam “se formar” em instituições localizadas em outras regiões do país. Estes
agraciados geralmente, quando retornavam para a pequena e pacata cidade,
desempenhavam destacadas funções políticas, com elevado prestígio social, como todo o
clã que orbitou politicamente em torno da família Tavares, do patriarca Joaquim Lúcio.
180
Apenas na década de 1930, a realidade começa a mudar na região. A ideia de
modernidade, antes associada à proximidade de uma cidade aos trilhos do trem, agora
passa a ser enxergada ao longe no horizonte campineiro. O triunfo da “Revolução de
1930” conduz ao poder um grupo favorável à transferência da capital do Estado para uma
cidade mais moderna. O discurso sanitarista do médico Pedro Ludovico é, então, usado
para dar nova utilidade política às ideias de modernização e progresso.
Quando Campinas foi escolhida para sediar as obras da cidade que substituiria
Goiás como sede administrativa do Estado, justificou-se que sua natureza atendia aos
requisitos exigidos pelos autores do projeto. Nos relatórios produzidos acerca desta
escolha técnica, nunca foram mencionadas qualidades humanas, relativas às
características socioculturais da população local, como se isso não importasse. E
realmente, para Pedro Ludovico e seu grupo, não importava. Como Pedro Ludovico
chegou a afirmar, “a ele, só importava o lugar”. Apesar disso, a chegada das autoridades
e das obras à tranquila cidade mudou profunda e irreversivelmente a vida daquela
comunidade. Junto com as máquinas, vieram muitas expectativas. A palavra “moderno”
e suas derivações se tornaram cada vez mais presentes na propaganda oficial. A cidade
que estava sendo construída seria a “capital mais jovem e moderna do país”, afirmam os
jornais de apoiadores do mudancismo.
Nos anos 1930, um misto de esperança e incômodo pairou pela cidade, que
crescera espontaneamente em torno de uma igrejinha há mais de 110 anos, sem grandes
mudanças ao longo deste período. A esperança focava na possibilidade de obtenção dos
efeitos positivos anunciados como consequências da modernidade: energia elétrica nas
casas, novos meios de comunicação e transporte, infraestrutura de estradas, oportunidades
econômicas e, principalmente, a toda a atenção que poder público estadual - agora tão
perto - poderia, enfim, dispensar a melhorias nas condições de serviços públicos voltados
para a saúde e para a “elevação cultural” dos jovens da cidade.
181
um problema cuja população local se mostrava desejosa de que uma intervenção do poder
público pudesse apartar sua existência das residências familiares. A redenção de
Campinas pela alardeada modernização demorava a chegar. Enquanto isso, Goiânia
crescia e recebia o Liceu, transferido da antiga capital em 1937. A procura por vagas no
Liceu em Goiânia era muito grande, e a demanda superava, em muito, sua capacidade, já
no início da década de 1950.
182
atividades econômicas capitalistas no Estado. Goiânia experimentou, então, uma contínua
onda de crescimento populacional naquele momento. As camadas médias urbanas
passaram a valorizar o ensino secundário como seu “passaporte” para a ascensão social e
como uma possibilidade de preparação adequada ao concorrido ingresso no ensino
superior, cada vez mais presente na nova capital a partir da criação da Universidade
Católica e da Universidade do Brasil Central.
183
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em: 07/03/2019, às 08:38.
DOCUMENTOS
BITTENCOURT, Luiz. Discurso a respeito do “Transcurso do 57º aniversário de
fundação do Colégio Estadual Pedro Gomes, em Goiânia, Estado de Goiás”, proferido
na “Sessão: 283.2.52.O” realizada na Câmara dos Deputados do Congresso Nacional no
dia 14/12/2004 às 15:20. Brasília, 2004. (Disponível em
https://www.camara.leg.br/internet/sitaqweb/TextoHTML.asp?etapa=3&nuSessao=283.
2.52.O&nuQuarto=41&nuOrador=1&nuInsercao=31&dtHorarioQuarto=15:20&sgFase
Sessao=PE%20%20%20%20%20%20%20%20&Data=14/12/2004&txApelido=LUIZ%
20BITTENCOURT&txFaseSessao=Pequeno%20Expediente%20%20%20%20%20%20
%20%20%20%20%20%20&dtHoraQuarto=15:20&txEtapa=Com%20reda%C3%A7%
C3%A3o%20final)
COLÉGIO ESTADUAL PROFESSOR PEDRO GOMES. Almanaque “O Pedrão – 48
Anos”. Secretaria do Colégio Estadual Professor Pedro Gomes. Goiânia, 1995.
COLÉGIO ESTADUAL PROFESSOR PEDRO GOMES. Atas do Conselho dos
Professores do Colégio Estadual Professor Pedro Gomes. Arquivo do Colégio. 1964-
1968.
COLÉGIO ESTADUAL PROFESSOR PEDRO GOMES. Atas de Instalação do
Ginásio, das Reuniões da Congregação dos Funcionário Administrativos e das Sessões
190
Solenes de Entrega de Certificados dos Concluintes do Ginásio Estadual de Campinas.
Arquivo do Colégio Estadual Professor Pedro Gomes, 1950-1967.
COLÉGIO ESTADUAL PROFESSOR PEDRO GOMES. Histórico da Banda Marcial
Lígia Rebelo. Secretaria do Colégio Estadual Professor Pedro Gomes, 1989.
COLÉGIO ESTADUAL PROFESSOR PEDRO GOMES. Manuscrito “CEPPG”.
Secretaria do Colégio Estadual Professor Pedro Gomes. Goiânia, s/d.
CORRÊA LIMA, Atílio. Relatório do urbanista Corrêa Lima ao Exmo. Snr. Dr. Pedro
Ludovico Teixeira; M. D. Interventor no Estado de Goiás. Campinas (GO), 1935.
DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DE GOIAZ, nº 5.929. Goiânia, 23 de junho de 1949.
JORNAL DE NOTÍCIAS, 11 de janeiro de 1953.
JORNAL DE NOTÍCIAS, 11 de março de 1953.
JORNAL DE NOTÍCIAS, 26 de abril de 1956.
JORNAL DE NOTÍCIAS, 06 de agosto de 1958.
JORNAL DE NOTÍCIAS, 12 de agosto de 1958.
FOLHA DE GOIAZ, 13 de janeiro de 1950.
GODOI, Armando Augusto de. Relatório apresentado ao Sr. Dr. Interventor Federal, em
Goiaz, pelo engenheiro urbanista Dr. Armando de Godoi, relativo à construção da nova
capital do Estado de Goiaz nas proximidades da cidade de Campinas. Rio de Janeiro,
1933.
O POPULAR, 03 de abril de 1938.
O POPULAR, 24 de outubro de 1939.
O POPULAR, 5 de julho de 1942.
O POPULAR. Projeto Álbum (Fascículos).
O POPULAR, 02 de junho de 1994.
REVISTA OESTE. Goiânia na Opinião Nacional. Ano II, nº 6 (Reedição) Goiânia:
UCG, 1982.
TEIXEIRA, Pedro Ludovico. Relatório apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Getúlio Vargas,
D.D. Chefe do Governo Provisório, e ao povo goiano, pelo Dr. Pedro Ludovico
Teixeira, Interventor Federal neste Estado (1930-1933). Goiânia, Imprensa Oficial,
1933.
191
ANEXOS
192
Anexo 2 – Ata da instalação do Ginásio Estadual de Campinas. (Fonte: Arquivo do CEPI
Professor Pedro Gomes)
193
194
195
196
Anexo 3 – Lei nº 618, de 27 de julho de 1918, concedia condições financeiras para que a
linha de comunicação telegráfica chegasse a Campinas.
(Fonte: Casa Civil do Estado de Goiás. Disponível em
http://www.casacivil.go.gov.br/legisla%C3%A7%C3%B5es-e-atos-oficiais/leis-
ordin%C3%A1rias.html. Acesso em 22 de maio de 2019)
197
Anexo 4 – Lista de diretores do Ginásio Estadual de Campinas/ Ginásio Estadual de
Campinas/ Colégio Estadual Professor Pedro Gomes e seus respectivos períodos à frente
da direção. (Fonte: Secretaria do CEPI Professor Pedro Gomes)
FONTE: “Almanaque Comemorativo ‘O Pedrão’: Colégio Estadual Professor Pedro Gomes – 48 anos
(1947-1995)”. Arquivo da Escola. Goiânia: 1995. Obs.: Como a tabela original encontrada no documento
“Almanaque” alcançava apenas as gestões ocorridas até o ano de 1995 - ano em que fora elaborado - a
atualização da lista de diretores (as) com dados a partir daquele ano foi feita pela Secretária Geral do
colégio, D. Tânia Cerocino, atingindo, assim, o momento atual, no qual este trabalho foi finalizado.
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Anexo 5 - Recorte da primeira página do jornal Correio Oficial, apresentando vista aérea
de Goiânia com texto que faz menção aos Coimbra Bueno, bem como decreto concedendo
o título de “Construtores da Cidade de Goiânia” aos irmãos proprietários da firma
Coimbra Bueno e Cia. (CORREIO OFICIAL Nº 3654 – 24 de abril de 1938 – Fonte:
CPDOC-FGV. Disponível em: http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/arquivo-
pessoal/GV/audiovisual/fac-simile-da-primeira-pagina-do-jornal-correio-oficial-
apresentando-vista-aerea-de-goiania-bem-como-decreto-concedendo-o-titulo-de-
construtores-d Acesso em 22 de maio de 2019)
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Anexo 6 – Publicidade na capa do Jornal O Estado de São Paulo anunciando a futura
venda de terrenos pela empresa dos irmãos Coimbra Bueno. (Fonte: O ESTADO DE SÃO
PAULO, 11 de março de 1937)
200
Anexo 7 – Lei Estadual nº 614, de 5 de agosto de 1952, assinada pelo governador em
exercício Jonas Duarte (PSD), vice de Pedro Ludovico. A lei autorizava a doação de um
terreno para a construção do Ginásio Professor Ferreira, fundado sob o escopo da
Campanha Nacional dos Educandários Gratuítos (CNEG). (Fonte: Casa Civil do Estado
de Goiás. Disponível em http://www.casacivil.go.gov.br/legisla%C3%A7%C3%B5es-e-
atos-oficiais/leis-ordin%C3%A1rias.html. Acesso em 22 de maio de 2019)
201
Anexo 8 – Lei Estadual nº 1564, de 13 de setembro de 1957. O documento assegurava
legalmente a subvenção estatal das instituições de ensino criadas a partir da atuação da
Campanha Nacional dos Educandários Gratuitos - CNEG). (Fonte: Casa Civil do Estado
de Goiás. Disponível em http://www.casacivil.go.gov.br/legisla%C3%A7%C3%B5es-e-
atos-oficiais/leis-ordin%C3%A1rias.html. Acesso em 22 de maio de 2019)
202
Anexo 9 – Lei nº 705 de 14 de novembro de 1952, assinada pelo governador Pedro
Ludovico Teixeira autorizava a permuta de terrenos entre a Igreja Católica o e Estado. Os
terrenos obtidos em Campinas seriam destinados à construção da sede do Ginásio
Estadual de Campinas. Esta negociação não foi consumada e a lei foi revogada por um
dispositivo de 1956. (Fonte: Casa Civil do Estado de Goiás. Disponível em
http://www.casacivil.go.gov.br/legisla%C3%A7%C3%B5es-e-atos-oficiais/leis-
ordin%C3%A1rias.html. Acesso em 22 de maio de 2019)
203
Anexo 10 – Lei nº 1502, de 17 de julho de 1957, estabecia em detalhes os termos para a
aquisição de um outro terreno destinado à construção do Ginásio Estadual de Campinas.
Também foi vetada. (Fonte: Casa Civil do Estado de Goiás. Disponível em
http://www.casacivil.go.gov.br/legisla%C3%A7%C3%B5es-e-atos-oficiais/leis-
ordin%C3%A1rias.html. Acesso em 22 de maio de 2019)
204
Anexo 11 – Lei nº 1626, de 16 de outubro de 1957. Neste dispositivo, eram finalmente
promulgados os critérios para a aquisição do terreno e início das obras para a instalação
da sede própria do Ginásio Estadual de Campinas. (Fonte: Casa Civil do Estado de Goiás.
Disponível em http://www.casacivil.go.gov.br/legisla%C3%A7%C3%B5es-e-atos-
oficiais/leis-ordin%C3%A1rias.html. Acesso em 22 de maio de 2019)
205
Anexo 12 – A Lei nº 2417, de 17 de dezembro de 1958, assinada pelo presidente da
Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, dispunha sobre a elevação do Ginásio
Estadual de Campinas à condição de Colégio, autorizando a abertura, no primeiro ano de
funcionamento como tal, apenas da primeira série do ensino secundário científico. Àquela
época, vivia-se o período final do governo de José Ludovico de Almeida, cujo secretário
da Educação, José Feliciano Ferreira, viria a suceder. (Fonte: Casa Civil do Estado de
Goiás. Disponível em http://www.casacivil.go.gov.br/legisla%C3%A7%C3%B5es-e-
atos-oficiais/leis-ordin%C3%A1rias.html. Acesso em 22 de maio de 2019)
206
Anexo 13 – Lei nº 2791, de 11 de novembro de 1959 estabelecia o valor a ser consignado
para as obras de asfaltamento das ruas do bairro de Campinas e determinava que a
execução das obras deveria ter seu início promovido no ano seguinte. (Fonte: Casa Civil
do Estado de Goiás. Disponível em
http://www.casacivil.go.gov.br/legisla%C3%A7%C3%B5es-e-atos-oficiais/leis-
ordin%C3%A1rias.html. Acesso em 22 de maio de 2019)
207
Anexo 14 – Nomeação de Pedro Adalberto Gomes de Oliveira como chefe da 1ª Secção
da Secretaria de Instrucção, Indústrias e Obras Públicas. (Fonte: CORREIO OFFICIAL
Nº 76 – 26 de setembro de 1912, pág. 4)
208
Anexo 15 – Nomeação de Pedro Gomes ao posto de delegado de polícia. (Fonte:
CORREIO OFFICIAL Nº 144 – 22 de novembro de 1917, pág. 3)
209
Anexo 16 – Nomeação de Pedro Gomes como Secretário do Lyceu de Goyaz (Fonte:
CORREIO OFFICIAL Nº 140 – 24 de outubro de 1917, pág. 3)
210
Anexo 17 – Deferencia do pedido de exoneração de Pedro Gomes da função de delegado
de polícia da Cidade de Goiás. (Fonte: CORREIO OFFICIAL Nº 185 – 31 de agosto de
1918, pág. 4)
211
Anexo 18 – Recorte do Jornal de Notícias Edição nº 26, publicado no dia 11 de janeiro
de 1953 (Chamada de capa).
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Anexo 20 – Retrato do professor Pedro Adalberto Gomes de Oliveira, de autoria do artista
campineiro Thiers, exposta no hall de entrada do CEPI Professor Pedro Gomes. O artista,
que é morador de Campinas desde 1964, segundo relatou, se ofereceu voluntariamente
para pintar a tela, que foi cedida gratuitamente à instituição em 2017.
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Anexo 21 – Discurso do candidato a vice-prefeito de Goiânia, Olegário Moreira Borges
(PTB), concorrente nas eleições de 1958 pela chapa UDN-PSP-PTB. (Jornal de Notícias,
edição nº 318, de 12 de agosto de 1958).
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Anexo 22 – Detalhe ampliado do discurso do candidato a vice-prefeito de Goiânia,
Olegário Moreira Borges (PTB), concorrente nas eleições de 1958 pela chapa UDN-PSP-
PTB. (Jornal de Notícias, edição nº 318, de 12 de agosto de 1958).
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