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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

FACULDADE DE FILOSOFIA DOM AURELIANO


MATOS LICENCIATURA PLENA EM PEDAGOGIA

JOSÉ YGOR RIBEIRO DOS SANTOS

IDENTIDADE DOCENTE: TRAJETÓRIA DE VIDA DE UM PEDAGOGO EM


FORMAÇÃO E DE PEDAGOGAS DA EDUCAÇÃO BÁSICA

LIMOEIRO DO NORTE – CEARÁ


2021
JOSÉ YGOR RIBEIRO DOS SANTOS
IDENTIDADE DOCENTE: TRAJETÓRIA DE VIDA DE UM PEDAGOGO EM
FORMAÇÃO E DE PEDAGOGAS DA EDUCAÇÃO BÁSICA

Trabalho apresentado ao curso de Pedagogia


da Universidade Estadual do Ceará – UECE
na Faculdade de Filosofia Dom Aureliano
Matos – FAFIDAM como requisito parcial
para obtenção do título de licenciatura em
Pedagogia.

Orientadora: Profª. Drª. Paula Pereira


Scherre

LIMOEIRO DO NORTE – CEARÁ


2021

Dedico este trabalho primeiramente a Deus por


ter me sustentado até aqui, e às pessoas que
acreditaram em mim desde o início, chegar até
aqui não foi nada fácil, passei por algumas
situações que me fizeram repensar se valia a pena
ou não estar aqui. Mas, com muita dedicação e
força de vontade consegui, minha trajetória de
vida de formação traduz minha identidade e me
mostra que, mesmo enfrentando dificuldades,
quem decide o meu futuro sou eu mesmo.
Obrigado a todos pelo apoio, eu venci.
AGRADECIMENTOS

Inicialmente agradeço a Deus por ter me proporcionado a experiência de cursar uma


universidade, foram feitas muitas orações e pedidos com os joelhos todas as noites no chão,
obrigado Deus por tudo. A trajetória por mim guiada até aqui foi de bastante superação e
dedicação. A vida me mostrou que as dificuldades vão existir, mas que se deve estar preparado
para enfrentá-la, persistir e nunca desistir lhe traz resultados bastante positivos basta acreditar,
e eu acreditei e aqui estou concluindo a etapa mais desafiadora de minha vida.
Agradeço a minha mãe Regina Neris Ribeiro que mesmo querendo que eu seguisse
outro caminho, sempre esteve do meu lado comemorando cada passo e vitória em minha vida.
São em pequenas atitudes do dia a dia que você percebe quem está do seu lado.
Agradeço a minha tia Linelda Ribeiro de Lima, minha prima Elvia Carla de Lima
Freire, seu esposo Marcos Paulo Marrocos e meu primo Elvis Carlos de Lima Freire por
acreditarem no meu potencial e por sempre me ajudarem nos momentos difíceis o meu muito
obrigado.
Agradeço à minha orientadora Paula Pereira Scherre por acreditar no meu trabalho e
está sempre disponível para me auxiliar. Obrigado pela paciência que teve comigo, sem ela
esse trabalho não seria possível, meus profundos agradecimentos, professora.
Aos meus amigos e colegas de sala, vocês são pessoas incríveis que Deus colocou em
minha vida. Obrigado por todo apoio e por todo companheirismo. Esse percurso se tornou
mais leve e especial com a presença de vocês. Estamos juntos sempre! Muito obrigado.
Agradeço a minhas avós Celestina Ribeiro de Noronha, já falecida, e minha avó Maria
Marlene dos Santos. Vocês me mostraram o sentido da vida em pequenas atitudes. Obrigado
por todos os ensinamentos, eles foram muito importantes para que eu chegasse até aqui. Amo
vocês até o fim.
Por fim, agradeço a minha instituição por todo o apoio e pela oportunidade de poder
cursar essa faculdade na minha cidade. Obrigado por confiarem em nós e por sempre estarem
lá quando precisamos. Obrigado a todo o núcleo docente, gestor e todos os funcionários dessa
universidade. Orgulho-me em ter feito parte dela.
RESUMO

Este trabalho traz como tema central identidade docente, que visa compreender os diversos
elementos presentes na história de vida de um professor que são significativos em sua
constituição como ser docente. O problema de pesquisa aqui apresentado é: Quais aspectos
fazem parte da constituição da identidade docente como professor e profissional? E como
objetivo geral: Analisar a construção da identidade docente a partir de meu relato de história
de vida de formação e de entrevistas narrativas com duas pedagogas de uma escola pública de
Ensino Fundamental – Anos Iniciais da Educação Básica de Limoeiro do Norte/CE. Essas
inquietações surgiram a partir de uma experiência que vivi, no Programa Residência
Pedagógica, em uma escola pública na qual trabalhei com professoras que me mostraram que,
mesmo sendo bastante diferentes, fazem a educação acontecer. Para tanto, fez parte, desta
investigação, a minha história de vida de formação e as trajetórias de vida de formação de duas
professoras atuantes na Educação Básica, construídas, estas últimas, a partir da realização de
entrevistas narrativas. Meu trabalho revela, por meio das narrativas desenvolvidas, como eu e
as professoras nos constituímos como seres docentes, passando pela infância chegando até a
fase adulta. Todas as situações enfrentadas durante a vida vão construindo e constituindo
um(a) professor(a), mostram os elementos relevantes na formação de cada um(a). A pesquisa
realizada foi de cunho qualitativo, com os seguintes elementos metodológicos: pesquisa
bibliográfica, relato de história de vida de formação, entrevistas narrativas e análise de
conteúdo das entrevistas, identificando e analisando as categorias principais que compõem a
identidade docente das professoras. A partir da análise de conteúdo das entrevistas narrativas,
foram identificados os seguintes resultados dentro das categorias constituintes das narrativas,
a saber: família, escola na infância e na adolescência, formação, experiências profissionais,
política e luta, relações extrasala de aula e o educador Paulo Freire. Esses resultados se
caracterizam como grandes temas presentes dentro da história de vida das professoras
participantes da pesquisa e que influenciaram no seu caminhar. As aprendizagens adquiridas
são baseadas na educação, ter a compreensão que ela transita por várias áreas, entender que a
relação família e escola é essencial, olhar para a minha formação e para a formação das
professoras de forma a criar e repensar ações educativas na prática docente.

Palavras-chave: Identidade docente; História de vida de formação; Entrevista Narrativa;


Matrizes Pedagógicas; Professoras da Educação Básica.
ABSTRACT

This work presents as its central theme the docent identity, which aims to comprehend the
several elements present in a teacher's life history that are meaningful to their constitution as
docents. The issue presented in this study is: What aspects are a part of the constitution of the
teacher 's identity as docent and professional? Whereas the general purpose is to analyze the
construction of the teacher's identity based on my report regarding my educational training
storyline and from narrative interviews with two pedagogues from a public Elementary School
- Early Years of Basic Education based in Limoeiro do Norte, Ce. These concerns emerged
after an experience I have had while in the Pedagogical Residency Program at a public school
in which I had worked with teachers that showed me that, even though they were different
from each other, they make education a reality. Therefore, my academic background as well
as the academic trajectories of two teachers working in primary education, the latter
conducted through interviews, were part of this investigation. My work reveals, through
developed narratives, how the teachers and I constituted ourselves as docents, going through
childhood to adulthood. Each situation a docent faces in life takes part in their constitution as
a teacher, it shows the relevant elements in the formation of each one. This study was realized
through qualitative research with the following methodological elements: bibliographic
research, narrative report regarding professional teacher training background, interviews and
the analysis of its content, identifying and analyzing the main categories that compose the
docents' identity as teachers. In the analysis of the interviews content, the following results
were identified within the constituent categories of the narratives: family, school during
childhood and teenage years, teacher training, professional experiences, politics and battles,
relations outside the classroom and the educador Paulo Freire. These results are characterized
as huge themes present in the life of the teachers involved in this research and influenced on
their journey as well. The acquired learning is based on education and comprehension that it
transitions through several areas, understanding that the relationship between family and
school is essential and that I am pursuing to look not only at my training background but also
to the teacher’s in order to create and rethink educational actions for the docent practice.

Keywords: Docent identity; Teacher training background; Narrative interview; Pedagogical


matrices; Teachers of Basic Education.
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO……………………………………………………………...... 11 2

MINHA BREVE HISTÓRIA DE VIDA DE FORMAÇÃO……………....... 18 2.1

Infância……………………………………………………………………….... 18 2.2

Adolescência………………………………………………………………….... 21 2.3 Fase

adulta…………………………………………………………………...... 23 2.3.1 Curso de

Pedagogia…………………………………………………………...... 25 2.3.2 Programa de

Residência Pedagógica………………………………………….... 28 3 INSPIRAÇÕES

TEÓRICAS………………………………………………..... 35 3.1 Identidade

docente…………………………………………………………..... 35 3.2 Narrativas:

construção da identidade do ser……………………………....... 38 3.2.1 (Auto)biografia:

o estudo sobre si…………………………………………….... 40 3.2.1.1 História de vida

de formação………………………………………………...... 41 3.2.2 Matrizes

Pedagógicas………………………………………………………....... 42 4
METODOLOGIA DE PESQUISA………………………………………....... 44 4.1

Abordagem qualitativa……………………………………………………...... 44 4.2

Escola e sujeitos....................………………………………………………...... 45 4.3

Metodologia da História de vida de formação…………………………......... 45 4.4

Entrevista Narrativa………………………………………………………….. 48 4.5

Análise de Conteúdo…………………………………………………………... 52 4.5.1

Categorização…………………………..……………………………………..... 55

5 RESULTADOS E DISCUSSÕES…………………………………………..... 56 5.1

Sobre a realização das entrevistas………………………………………….... 56 5.2

Caracterização das entrevistadas..................................................................... 56 5.3

Análise do conteúdo das entrevistas narrativas realizadas............................ 57 6

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................ 85

REFERÊNCIAS……………………………………………………………..... 90

APÊNDICE 1 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E


ESCLARECIDO................................................................................................94
11

1 INTRODUÇÃO

Buscar respostas para determinados assuntos é algo que me instiga desde muito jovem,
ouvir histórias, relatos e até mesmo “causos” sempre foram atividades que me chamaram
muito a atenção. Quando adentrei no curso de Pedagogia, comecei a me questionar sobre o
meu lugar ali naquele meio, surgiram muitas dúvidas e aos poucos fui começando a encontrar
as respostas e, principalmente, o motivo que me trouxe até a universidade.
Sempre gostei muito de conversar com as pessoas e saber sobre sua vida e sobre os
seus projetos, creio que esse fator tenha me ajudado bastante a ser a pessoa que sou hoje, pois
sempre fui muito tímido, e a partir do momento que comecei a dialogar com as pessoas,
minha personalidade começou a mudar, transformando assim minhas convicções internas e
externas,
me fazendo amadurecer.
Voltando ao fato de como cheguei no curso de Pedagogia, gosto muito de crianças,
ajudei minha mãe a cuidar dos meus irmãos mais novos, então o contato com criança sempre
foi presente em minha vida. Eu brincava com eles e ajudei na educação deles também, então
isso me despertou a conhecer o curso. Ser professor era algo que nunca me passou pela minha
cabeça, mesmo gostando muito de ensinar meus irmãos, eu nunca me vi como um profissional
da educação. Com pouco tempo que adentrei a universidade, consegui um emprego numa
escola, como Monitor de Apoio na Educação Inclusiva, foi ali que me vi professor pela
primeira vez. Foi nesse momento que virou a “chavinha” na minha cabeça que essa era a
profissão certa para mim.
Depois desse pequeno relato sobre minha vida, irei detalhar sobre o desenvolvimento
do meu trabalho, que tem como temática “Identidade docente: trajetória de vida de um
pedagogo em formação e de pedagogas da Educação Básica”. Mas, por que falar de identidade
docente? No mundo contemporâneo, ser diferente não é uma tarefa muito fácil, principalmente
quando nos deparamos com os padrões estabelecidos pela sociedade. A busca pela sua
essência é algo que necessita de muito esforço de si próprio, tentando de certa forma, se
conectar com o seu eu interior, podendo assim conseguir se descobrir tanto pessoalmente
quanto profissionalmente. O tema “identidade docente” transita em vários vieses, buscar sua
identidade não é uma tarefa fácil, faz-se necessário se aprofundar em seu autoconhecimento,
podendo assim procurar os mais profundos ensinamentos construídos durante toda a sua vida,
conseguindo assim encontrar o seu verdadeiro caminho e aquilo em que se acredita ser o certo
a seguir.
12

O olhar para si mesmo é uma tarefa que exige do indivíduo uma concentração e uma
percepção sobre sua própria experiência. Jorge Larrosa (2002) fala sobre a experiência:

A experiência, a possibilidade de algo nos aconteça ou nos toque, requer um


gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm:
requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais
devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir
mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o
juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a
atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos
acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro,
calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço. (LARROSA, 2002, p. 24).

Essa citação diz muito sobre a vida, em toda a trajetória percorrida pelo indivíduo
situações acontecem para que possamos refletir sobre nossas atitudes, ajudando assim a seguir
em frente, em cada passo dado surge um novo aprendizado. A experiência também aparece
durante essa caminhada proporcionando mudanças que de certa forma nos ajudam a crescer e
evoluir como ser humano. A história de vida de formação tem muito a ver com isso, o
processo percorrido também se faz necessário parar e pensar sobre tudo aquilo que foi vivido.
Minha pesquisa também proporciona esse olhar para a experiência, se ver no passado e
reconhecer que tudo aquilo vivenciado foi importante para a formação das professoras da
minha pesquisa, é algo muito satisfatório na minha visão, pois minhas próprias experiências
são algo que de vez em quando retorno nos meus pensamentos e nos registros que tenho,
então, elas me ajudaram durante todo o meu percurso e compõe momentos importantes durante
toda a minha história de vida de formação.
Através disso, é importante ressaltar que voltar ao passado é uma forma de buscar sua
própria essência, incorporando assim toda sua personalidade, trilhando assim um caminho para
sua vida.
A busca pela sua essência é importante, pois a incorpora em ações durante toda a sua
vida, um pequeno exemplo: se durante toda a sua vida você sempre gostava ou se interessava
por contação de histórias, você, adulto, pode se religar com o que você viveu e é possível que,
em suas aulas, você se utilize de sua experiência em contar histórias, pois é algo seu, é algo
que já veio contigo, antes de você se tornar um profissional da educação.
Então entrar em contato com as experiências vividas ajuda no sentido de se encontrar
com sua identidade docente. Para Pimenta (1999, p. 19), “Mobilizar os saberes da experiência
é, pois, o primeiro passo no nosso curso de didática que se propõe a mediar o processo de
construção de identidade dos futuros professores”. É necessário buscar, na sua experiência,
informações que lhe ajudem a desvelar sua própria identidade.
13

A escolha por esse tema surgiu a partir de uma experiência que vivi numa escola,
quando participei do projeto Residência Pedagógica (RP), subprojeto da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)1. Consegui essa bolsa quando estava
cursando o 6° semestre do curso de Pedagogia, em 2019. Durou um ano. Durante esse projeto,
convivi com várias professoras e comecei a perceber que todas elas eram bem diferentes, tanto
pessoalmente quanto profissionalmente. Cada uma com um jeito diferente de ministrar suas
aulas, utilizando métodos diferentes, dinâmicas diferentes. Foi aí que me despertou o interesse
em querer estudar sobre identidade docente. Acho bastante interessante conhecer e investigar
esse processo de construção como professor e, por isso, venho por meio deste trabalho
pesquisar e analisar como acontece esse processo, tanto em mim quanto em outras
professoras. Sendo assim, passei por minha história de vida de formação e entrevistei as
pedagogas da escola onde trabalhei durante o projeto já citado acima.
Quando olhamos para a sociedade brasileira, percebemos a importância de se estudar
sobre este tema, quantos professores que trabalham na Educação Básica estão fazendo uma
mera reprodução de tudo aquilo que as secretarias repassam, onde está a sua identidade
docente? Onde está a mudança? Essas perguntas são sempre debatidas nas universidades e
dentro das escolas. A mudança está relacionada à autonomia do professor dentro de sala de
aula, deve partir do próprio profissional da educação, muitos estão acomodados e, por isso,
não se arriscam em querer buscar algo novo, mas, no mundo contemporâneo em que vivemos
esse tipo de atitude não ajuda em nada, tudo aquilo que foi aprendido no passado é de suma
importância sim, mas não devemos ficar presos nele. O mundo muda, e está sempre em
constante transformação e precisamos perceber isso.
Os ensinamentos que são passados pela família são fortes, pois é um conhecimento
trazido durante muito tempo, por isso que a dificuldade de enfrentar algo novo ainda é bastante
difícil, principalmente para aqueles profissionais que estão há vinte anos dentro da educação. É
um processo complicado, mas é algo que precisa acontecer.

1
De acordo com a CAPES (2018, p. 1): Edital CAPES n° 06/2018 do Programa Residência Pedagógica art. 2.1° “O
Programa de Residência Pedagógica visa: I. Aperfeiçoar a formação dos discentes dos cursos de licenciatura, por meio
do desenvolvimento de projetos que fortaleçam o campo da prática e que conduzam o licenciando a exercitar de forma
ativa a relação entre teoria e prática profissional docente, utilizando coleta de dados e diagnóstico sobre o ensino e a
aprendizagem escolar, entre outras didáticas e metodologias; II. Induzir a reformulação do estágio supervisionado nos
cursos de licenciatura, tendo por base a experiência da residência pedagógica; III. Fortalecer, ampliar e consolidar a
relação entre a IES e a escola, promovendo sinergia entre a entidade que forma e aqueles que receberão os egressos das
licenciaturas, além de estimular o protagonismo das redes de ensino na formação de professores; e IV. Promover a
adequação dos currículos e das propostas pedagógicas dos cursos de formação inicial de professores da educação
básica às orientações da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) ”. (CAPES, 2018, p. 1).
14

Mas por que é importante estudar sobre identidade docente? Pesquisando a fundo
encontrei uma citação bastante interessante de Zygmunt Bauman (2005), vejamos:

[...] a “identidade” só nos é revelada como algo a ser inventado, e não


descoberto; como alvo de um esforço, “um objetivo”; como uma coisa que
ainda se precisa construir a partir do zero ou escolher alternativas e então lutar
por ela e protegê-la lutando ainda mais - mesmo que, para que essa luta seja
vitoriosa, a verdade sobre a condição precária e eternamente inconclusa da
identidade deva ser, e tenda a ser, suprimida e laboriosamente oculta.
(BAUMAN, 2005, p. 21-22).

A partir desta explicação de Bauman, podemos identificar que a identidade é algo que
está em contínuo desenvolvimento, algo a ser descoberto e construído e deve partir do próprio
indivíduo. Quando analisamos isso dentro da educação, conseguimos perceber que educar e
ensinar está em plena transformação, a busca pelo conhecimento deve ser algo constante, o ser
professor é um profissional que não deve ficar fechado dentro de uma caixa e sim, estar em
constante movimento. Pimenta (1999) esclarece:

Constrói-se, também, pelo significado que cada professor, enquanto ator e


autor, confere à atividade docente no seu cotidiano a partir de seus valores, de
seu modo de situar-se no mundo, de sua história de vida, de suas
representações, de seus saberes, de suas angústias e anseios, do sentido que
tem em sua vida o ser professor. (PIMENTA, 1999, p. 19).

Ser professor é trazer uma bagagem de conhecimento que começa na infância e vem se
acumulando ao longo do tempo. São conhecimentos construídos em uma vida toda e cada
professor possui suas peculiaridades, por isso é importante se falar de identidade docente,
porque todos os profissionais que hoje em dia exercem sua profissão possuem sua própria
história, seus próprios aspectos que o constituem como docente, podemos ver as várias facetas
de um profissional e, assim, a sociedade pode perceber que o professor é um profissional, que
merece respeito e valorização.
Mediante ao que já relatado anteriormente, chegamos num ponto bastante importante
deste trabalho, o problema de pesquisa, a inquietação de saber sobre determinado assunto e o
que o meu objeto de estudo relata sobre o tema, a pergunta é a seguinte: Quais aspectos fazem
parte da constituição da identidade docente como professor e profissional?
Já foi citada a importância de entrarmos em contato e reconhecermos nossa identidade,
relacionando-a com sua dimensão profissional inquieto-me em saber qual a percepção das
pedagogas da escola em que trabalhei, quais considerações elas trazem acerca deste assunto,
quais fatores influenciam nessa identidade estabelecida por elas, então tenho essa curiosidade
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em descobrir como esse tema é discutido por elas. Também me analiso dentro deste tema, a
partir da construção da minha própria identidade.
Sendo assim, tenho como objetivo geral: Analisar a construção da identidade docente
a partir de meu relato de história de vida de formação e de entrevistas narrativas com
pedagogas de uma escola pública de Ensino Fundamental – anos iniciais. A partir do
problema de pesquisa e objetivos geral apresentados, estabelecemos como objetivos
específicos: (1) Estudar referenciais teóricos dos seguintes temas: identidade docente,
matrizes pedagógicas, história de vida de formação. (2) Refletir sobre identidade docente, a
partir de meu relato de história de vida de formação e de entrevistas narrativas com pedagogas
de uma escola pública de Ensino Fundamental – anos iniciais. (3) Sistematizar as
aprendizagens aprofundadas e vividas ao longo desta pesquisa incorporando-as à minha
formação e identidade docente.
Acho de suma importância identificar essas questões, eu como professor em formação
tenho essa vontade de conhecer esse processo de construção de uma identidade, acredito que
as semelhanças e diferenças de cada professora é o que torna a educação múltipla e diversa.
Observando diversas aulas dessas pedagogas, fiquei fascinado com tanta diferença e, ao
mesmo tempo, com o interesse em descobrir como foram suas trajetórias até se tornarem as
professoras que são hoje.
O olhar sobre a história de vida de formação me encanta muito, conhecer a história das
participantes da minha pesquisa me faz olhar para minha própria formação também, como foi
minha trajetória e a importância dessa formação na minha vida. Então quando paro e penso na
minha pesquisa o que me vem na cabeça é a palavra “construção”, como a pessoa se construiu
durante sua caminhada, que momentos e situações foram determinantes em sua vida, o que
contribui para ela ser a pessoa que é hoje, são algumas das inquietações que me instigam a
entrar em contato com as experiências importantes nesse caminhar, que a pessoa deseja relatar,
como elas e eu nos constituímos como professores, que elementos fazem parte de nossa
identidade docente, desvelando nossas matrizes pedagógicas.
Em meus estudos e na minha percepção, para que eu consiga um resultado concreto e
válido, realizei pesquisa bibliográfica e a minha breve história de vida de formação e fiz a
pesquisa de campo, para a qual utilizei, como técnica de coleta de dados, a Entrevista
Narrativa (EN), via Google Meet2, com autorização das professoras. Esta ferramenta de
comunicação foi utilizada como meio de manter o distanciamento social exigido devido à
pandemia por conta da Covid-19. Nesse momento foi importante evitar o contato entre as
pessoas.
2
“Com o Google Meet, é fácil iniciar uma videochamada segura. Basta usar qualquer navegador da Web
moderno ou fazer o download do app.” (GOOGLE, 2021, online).
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Essa pesquisa é de abordagem qualitativa, na qual foi feita uma EN com pedagogas
atuantes na Educação Básica do município de Limoeiro do Norte/CE. Foi elaborado um Termo
de Consentimento livre e Esclarecido (TCLE – ver apêndice 1) no qual detalho sobre minha
pesquisa e explico passo a passo como ocorreria. Depois de assinado pelas professoras
participantes, iniciei as ENs. Utilizei o diário de campo como instrumento de estudo, no qual
guardei todas as informações necessárias para minha pesquisa e que me ajudaram bastante no
desenvolvimento do texto monográfico.
Esta monografia está composta pelas seguintes seções, após a introdução:
primeiramente início relatando minha breve história de vida de formação, na qual trago as
fases da minha vida, meu processo de educação: infância, adolescência e fase adulta, o
ingresso na universidade e as vivências e experiências no curso de Pedagogia, entrar no
Programa da Residência Pedagógica (RP) que foi uma experiência bastante rica em minha
vida e na minha formação. Adiante, início a seção teórica, na qual abordo: a Identidade
docente trago Bauman (2005), Dubar (2006), Pimenta (1999) e Nóvoa (2009), os enfoques
sobre as Narrativas com Motta (2013), a (Auto)biografia trago Mota, Silva e Rios (2019) e
Machado, Nunes e Santana (2019), a História de vida de formação com Josso (2007) e sobre
as Matrizes pedagógicas com Ecleide Furlanetto (2003). Relacionado ao conceito de matrizes
pedagógicas:

As matrizes pedagógicas podem ser simbolicamente consideradas em espaços,


nos quais a prática dos professores é gestada. Conteúdos do mundo interno
encontram-se com os do mundo externo e são por eles fecundados, originando
o novo. A matriz, além de configurar-se como local de fecundação e gestação,
também se apresenta como possibilidade de retorno em busca da regeneração
e da transformação. (FURLANETTO, 2003, p. 27).

As matrizes pedagógicas, tem uma relação muito grande com a identidade docente,
trazer esses apontamentos sobre espaços que auxiliam nas práticas dos professores é algo que
incorpora e agrega conhecimentos e valores que ajudam na construção daquele profissional,
são elementos que compõem a identidade de um professor. Quando faço essa comparação,
vejo a importância de o professor sempre estar se atualizando e buscando experiências novas
em sua carreira. Tudo isso influencia diretamente na sua identidade como docente, e acho de
suma importância o professor estar sempre tendo esse cuidado de olhar para si e ver sua
própria trajetória na educação, na vida.
Esses temas estão bastante vinculados com o meu tema principal. Logo após,
desenvolvi a metodologia de pesquisa propriamente dita, na qual utilizo da abordagem
qualitativa, fazendo o detalhamento metodológico da história de vida de formação, da EN e da
Análise de Conteúdo, que utilizei para analisar as ENs realizadas com as professoras
participantes e utilizei a
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categorização como auxílio para a descobertas dos temas norteadores da EN. Finalizo com
resultados e discussões, considerações finais, referências utilizadas ao longo do trabalho e
apêndices.
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2 MINHA BREVE HISTÓRIA DE VIDA DE FORMAÇÃO

Falar sobre identidade docente nos remete à trajetória de vida, pois identidade se
constitui ao longo do tempo, do nosso vir a ser docente. Diante disso, nessa seção irei tratar
sobre minha própria história de vida de formação, relatando o que aconteceu durante o meu
percurso educativo, que tenham me marcado, remetendo a situações que me construíram como
pessoa e que, com certeza, me influenciam na dimensão profissional.
Exige uma busca de mim mesmo sobre o conhecimento, me faz viajar no passado
relembrando situações de vida que, de certa forma, foram formadoras, uma linha do tempo que
faz refletir e compreender como foi esse processo de educação, podendo analisar as
transformações que aconteceram no decorrer dos anos, motivações, aprendizagens.
Um ponto muito importante para mim, é buscar e identificar quais ações educativas
ajudaram a me formar como ser humano, que ações influenciaram para ser o que sou hoje, isto
traz à consciência do que me levou a percorrer os caminhos trilhados. As lembranças e as
memórias serão auxílios muito importantes para o desenvolvimento deste trabalho. As
vivências adquiridas durante este processo também são influências necessárias e que ajudaram
a trilhar minha trajetória.
Marie Christine Josso (2007, p. 415) fala sobre o processo de identidade e das histórias
de vida, “Trabalhar as questões da identidade, expressões de nossa existencialidade, através da
análise e da interpretação das histórias de vida escritas, permite colocar em evidência a
pluralidade, a fragilidade e a mobilidade de nossas identidades ao longo da vida”. A autora nos
relata sobre a transformação, na qual nós como indivíduos estamos mudando simultaneamente,
e que, nesse processo, vamos identificando diversas características nossas, sejam defeitos ou
qualidades. Destaca ainda que devemos ter a consciência de que isso tudo faz parte da nossa
construção como ser humano.

2.1 Infância

Minha infância foi uma fase de muito divertimento e ensinamento. Fui criado
praticamente sozinho pela minha mãe e pela minha avó. Quando eu tinha 4 anos de idade
minha mãe se separou do meu pai, depois disso não tive quase nenhum contato com ele.
Então, desde o começo, elas foram minha referência para vida. Elas demonstravam muita
força e esperança para mim, sempre dizendo que “ia dar tudo certo” e que eu não ia ficar
sozinho. Isso foi e é muito importante para minha vida.
19

Carrego essa força comigo sempre. Gabriel Chalita, em seu livro “Aos mestres com
carinho”, traz uma citação que representa bem isso que retratei:

São elas que chefiam as famílias e que protagonizam as mudanças necessárias


para que a cidade não deixe ninguém para trás. Confiam na educação como o
caminho mais eficaz para que os filhos tenham uma vida digna. Enfrentam as
adversidades com valentia. Não querem ser Amélias. São as mulheres de
verdade que assumem o comando da própria vida e avisam ao medo que “sexo
frágil” é um termo que não existe em seus dicionários. (CHALITA, 2016, p.
60).

Toda essa garra e determinação me tornaram a pessoa que sou hoje. Nunca ter medo do
que a vida me proporcionar. “Dar a cara a tapa” em situações que quero defender e que
condizem com o meu pensamento. Uma das principais lições que elas me ensinaram foi “Vá
atrás dos seus objetivos, nunca desista do que você quer, lute pelos seus sonhos”. Isso é algo
que nunca vou esquecer.
Minha criação não foi nada fácil. Minha mãe e minha avó lutaram muito para que eu
tivesse uma vida digna e isso é algo que vou recompensar. Minha avó já é falecida, mas minha
mãe continua viva e, enquanto eu existir, irei fazer o que for necessário para vê-la bem.
Então, o primeiro contato que tive com a educação aconteceu ali, o contato com a
minha família e todos os ensinamentos que adquiri, como: respeito, amor, confiança, lealdade,
perseverança, solidariedade. Mas, o principal ensinamento que me deram, e o que eu tenho
maior apreço, é a humildade. Sempre me ensinaram a ser humilde e nunca querer ser melhor
que os outros e isso é muito significativo para mim.

E como se educa para esses valores? Com palavras, quando necessário; e com
exemplos sempre! Pais precisam dar bons exemplos aos filhos, não pagando
o mal com o mal e não praticando o mal. Pais fofoqueiros, vingativos, cruéis
vão ensinando esses antivalores aos filhos. Pais serenos, respeitosos, também.
É nessa fraternidade que acreditamos, que alicerce um mundo em que, de fato,
sejamos irmãos uns dos outros. Isso é um sonho? Não sei. Só sei que a leitura
da Palavra de Deus nos ensina a pensar e agir assim. É esse o intento que deve
nos unir. Que o bem vença. (CHALITA, 2016, p. 204).

Irei relatar agora sobre minha fase na escola, pelo menos do que mais ou menos eu me
lembro. A visão que eu tinha da escola: era algo muito fantasioso. Lembro-me bem de uma
vez que falei para minha mãe “Mãe, a escola é outro universo!”. Pensando um pouco sobre
essa frase, lembro que realmente eu me sentia em outro universo, era algo muito diferente
para mim. Nessa ocasião, eu devia ter uns 7 para 8 anos e eu era muito tímido, muito tímido
mesmo, de não conseguir brincar e me relacionar com as pessoas. Isso era algo muito difícil
para mim. Como eu já estava no processo de alfabetização, minha mãe comprou uma coleção
de histórias,
20
aqueles famosos contos de fadas. A partir do momento que eu tive contato com aqueles livros,
houve uma grande transformação para mim, quando minha mãe fazia a leitura daqueles contos,
eu me sentia muito bem, eu me via muito na história do Peter Pan, eu queria ser ele, ter toda
aquela força, ser valente, alegre, astucioso. Esse foi um momento que me recordo muito bem.
Parece loucura, mas eu me lembro da primeira vez que minha mãe contou essa história e foi
essa sensação que senti. O poder que a palavra exerce é algo espetacular e Paulo Freire vem
retratar isso no livro “Pedagogia do Oprimido”, nessa citação:

A palavra é entendida, aqui, como palavra e ação; não é o termo que assinala
arbitrariamente um pensamento que, por sua vez, discorre separado da
existência. É significação produzida pela práxis, palavra cuja discursividade
flui da historicidade – palavra viva e dinâmica, não categoria inerte, exânime.
Palavra que diz e transforma o mundo. (FREIRE, 2018, p. 28).

Essa representação sobre a palavra é algo bem interessante, a partir do momento que
você tem o contato com uma palavra, fica a seu critério confiar e seguir aquela palavra dita ou
escrita por alguém, ou simplesmente ignorar e dizer que aquilo não serve para você e nem para
sua vida. Por isso essa relação de poder, porque a palavra pode influenciar em suas decisões e
quando aliado ao discurso pode facilmente lhe convencer, então quando minha mãe leu aquela
história para mim eu me identifiquei com aquele personagem, foi um convencimento
vinculado com o discurso, ou seja, a própria leitura que a minha mãe fez para mim também
influenciou meu desejo em ser aquele personagem.
Vejamos os seguintes apontamentos nessa citação:

As observações de Vigotski apontaram que um conjunto se forma não por


meio do jogo mútuo das associações, mas por meio de operações intelectuais
em que todas as funções mentais elementares se comunicam numa
combinação exclusiva. Esta operação é orientada pela utilização das palavras
como forma de ativar a atenção, abstrair características e realizar a síntese e
representação através de um signo. (DIAS; KAFROUNI; BALTAZAR;
STOCKI, 2014, p. 497).

Os apontamentos de Vygotsky, nos mostram que a partir do contato com a palavra o


ser humano ativa os seus sentidos sobre o espaço que o rodeia, fazendo com que seu
desenvolvimento mental se conecte havendo assim uma comunicação, transformando os
elementos presentes naquele local significativos, auxiliando e ampliando seus conhecimentos.
Um assunto que também me interessava muito na escola era a poesia. Eu sempre
entrava num mundo imaginário quando a professora recitava os poemas, sempre gostei e
achava muito interessante as rimas, a forma como é combinado uma palavra com a outra
fazendo sempre
21

sentido para aquilo que estava sendo dito me encantava. Para mim, era algo tão complexo em
se fazer, era genial.
Eu tinha mais ou menos uns 10 para 11 anos, quando tive o primeiro contato com a
poesia, nunca vou me esquecer de uma aula que tive. Era para a gente analisar e indicar as
informações mais importantes dos poemas que a professora trouxe. Lembro que quando me
deparei com as diversas informações que um poema tão pequeno pode trazer, eu achei aquilo
tão incrível. Essa é uma das lembranças que mais me recordo da escola.
No livro “A poesia na escola”, a autora Ana Elvira Gebara (2012, p. 8) fala que “Para
gostar de ler poesia, é preciso habituar-se ao contato com esse tipo de texto. Mais que elogiar a
poesia, é preciso possibilitar a vivência com poemas, lendo-os em voz alta, várias vezes, para
captar seu ritmo e sua música – que também produzem efeitos de sentido”. Poesia é vida.
Basicamente foram esses ensinamentos que mais me marcaram na infância e que eu
levo por toda a minha vida. Foram momentos que me marcaram muito e que foram
significativos para meu processo educativo, guardo todas essas lembranças com muito carinho
e apreço.

2.2 Adolescência

Nesse segundo tópico, irei relatar como foi meu processo educativo na adolescência,
ou seja, no Ensino Médio.
Minha experiência no ensino médio foi algo incrível e, ao mesmo tempo, com muita
pressão. Eu estudei numa escola integral e profissionalizante conhecida como EP, então
tínhamos duas formações, o ensino regular normal e um curso profissional, no meu caso era
Técnico de Informática. As vivências são algo que trago comigo até hoje. A escola era muito
boa e bem estruturada. As amizades que criei lá dentro levo para o resto da minha vida. Porém,
sempre tem um fator negativo. Por proporcionar um ensino técnico, a pressão e as demandas
eram enormes em cima dos alunos, mexia muito com meu psicológico.
No começo, eu não compreendia o porquê de toda essa pressão, na qual o principal
objetivo era formar para o mercado de trabalho, e por não ter conhecimento sobre isso fui
alienado por todo aquele discurso de “Nossa parabéns você estuda numa EP”, e eu me
orgulhava disso, pois para estudar numa escola dessas era feita uma seleção e só entravam as
pessoas que tinham as melhores notas. No artigo “A crise do capital e a relação com a
educação brasileira”, de Rafael, Ribeiro e Segundo (2016), relata muito bem isso nessa
citação:
22

Uma característica presente na educação profissional nos dias atuais é a


polivalência, termo empregado para qualificar o trabalhador como aquele que
está apto a desempenhar várias funções em nome do aumento na produção e,
consequentemente o consumo, continuando assim o ciclo do capital. Algumas
vezes, o termo polivalência é utilizado como sinônimo de politecnia, como se
esta palavra tivesse o mesmo significado de polivalência, em favor do
capitalismo. Uma formação que faz do estudante um ser capaz de
desempenhar várias funções em um ambiente em prol do desenvolvimento
econômico e não em prol do desenvolvimento humano como é o sentido
originário do termo politecnia, o contrário disso só é possível em uma
sociedade adversa a nossa, ou seja, no socialismo. (RAFAEL; RIBEIRO;
SEGUNDO, 2016, p. 381-382).
Nesta citação, podemos identificar claramente qual é o objetivo da educação
profissional, de buscar sempre o lado técnico desvinculado do lado humano. Isto para mim foi
muito frustrante, pois somente no terceiro ano que compreendi essa questão quando fui para o
estágio. Foi lá que percebi o que eles queriam dos estudantes. Havia uma contradição dentro
da escola, pois o incentivo ao ensino superior era muito abordado e incentivado pela gestão
escolar, então esse lado de querer nos preparar somente para o trabalho era algo muito
escondido e que foi escancarado somente no terceiro ano. Então me sinto alienado por não ter
percebido isso logo no começo, mais por outro lado me sinto feliz pelo incentivo que eles
deram para o ingresso na universidade, isso foi um fator positivo.
A educação profissional é uma simples reprodução da sociedade em que vivemos, o
capitalismo é a maior representação de poder estabelecido dentro da nossa sociedade. O
trabalho é o que rege o capitalismo, estimulando o consumo de massas, fazendo com que a
população viva para o consumo, alienando-os de forma que não consigam enxergar o que está
acontecendo ao seu redor. É necessário que haja conscientização, da mesma forma que eu fui
alienado perante um sistema na qual fui inserido e, ao mesmo tempo, eu tive noção e pude
refletir sobre o que realmente eles queriam de mim. Foi, neste momento, que tudo mudou, se
eu mudei qualquer um pode mudar, basta que haja um pouco de conhecimento sobre a
sociedade e a partir disso se possa refletir e se conscientizar sobre sua realidade, fazendo com
que haja sua própria transformação como ser humano e atuante dentro desse sistema.
No artigo “A crise do capital e a relação com a educação brasileira” identificamos
claramente isso:

Outro destaque é também a presença do capital humano ainda nos dias atuais,
porque a sociedade também culpa o indivíduo pela sua não inserção exitosa
no mercado de trabalho, instigando-o a competitividade, é preciso provar o
tempo todo não apenas que somos bons, mas que somos melhores que os
outros. (RAFAEL; RIBEIRO; SEGUNDO, 2016, p. 377).

23

O capital humano representa uma população na qual é influenciada e por muitas vezes
forçada a adentrar dentro do mercado de trabalho. Toda essa demanda é dada pela própria
sociedade capitalista, que mostra todos os dias que o mais importante num ser humano é o seu
trabalho. A partir daí que surge a competitividade, quando se adentra no mercado de trabalho o
indivíduo é instruído a sempre querer mais e mais, tentando assim superar seu próprio colega
de trabalho, aumentando ainda mais o capitalismo.
Por isso, destaco a importância de se estudar Paulo Freire. Quando eu tive essa
compreensão sobre a função que a escola profissional exerce, eu comecei a refletir e me
conscientizar sobre isso. Eu estava exercendo o que Paulo Freire nos convida a fazer, ou seja,
a própria transformação do ser, tornando-se assim uma pessoa mais confiante e ativa dentro da
sociedade.
No livro “Pedagogia do Oprimido” Paulo Freire mostra o processo de libertação e
transformação do ser:
A pedagogia do oprimido, como pedagogia humanista e libertadora, terá dois
momentos distintos. O primeiro, em que os oprimidos vão desvelando o
mundo da opressão e vão comprometendo-se, na práxis, com a sua
transformação; o segundo, em que, transformada a realidade opressora, esta
pedagogia deixa de ser do oprimido e passa a ser a pedagogia dos homens em
processo de permanente libertação. (FREIRE, 2018, p. 57).

Não é à toa que dizem que Paulo Freire foi um visionário, alguns temas que ele aborda
em seus livros são situações que estão acontecendo nos dias atuais, a classe dominante explora
a qualquer custo a classe trabalhadora, se tornado um opressor nessa sociedade e os oprimidos
que lutam para poder ter seu pão de cada dia. A desigualdade só tende a crescer mais e mais,
essa é uma situação permanente em nossa sociedade.
Então, esse foi o meu processo de educação na minha adolescência, um turbilhão de
informações e conhecimentos que me fizeram refletir sobre o meu papel dentro da sociedade,
abrindo meus olhos para decidir realmente quais os caminhos que eu queria seguir.

2.3 Fase Adulta

Chegamos agora na melhor fase da minha vida, até agora. Entrar na universidade foi
algo extraordinário para mim, não foi fácil chegar até aqui. O incentivo para fazer uma
faculdade foi pouco, a maioria das pessoas da minha família queria que eu fosse trabalhar, pois
o dinheiro, naquele momento, era mais importante. Fiquei com isso na cabeça durante muito
tempo. Nada veio fácil para mim, eu sempre tive que “ralar e correr atrás” do que eu queria.
24

Mas, partindo do princípio que relatei no tópico anterior, a reflexão foi algo muito importante
para tomar essa decisão, imaginei minha vida futuramente e pensei que o trabalho não me
daria a oportunidade de crescer como um ser humano, pois não me traria uma reflexão e um
conhecimento de mundo na qual eu buscava tanto.
Então, ter o conhecimento era e é algo muito importante para mim e me apeguei a isso,
prestei o vestibular, quando fui aprovado a sensação primeiramente era de ansiedade perante o
que me esperava e sempre pensando em transformar minha realidade, ajudando minha mãe de
alguma forma e me transformando como pessoa, que é um dos aspectos mais importante para
mim.

A consciência é essa misteriosa e contraditória capacidade de que tem o


homem de distanciar-se das coisas para fazê-las presentes, imediatamente
presentes. É a presença que tem o poder de presentificar: não é representação,
mas condição de apresentação. É um comportar-se do homem frente ao meio
que o envolve, transformando-o em mundo humano. Absorvido pelo meio
natural, responde a estímulos; e o êxito de suas respostas mede-se por uma
maior ou menor adaptação: naturaliza-se. Despegado de seu meio vital, por
virtude da consciência, enfrenta as coisas objetivando-as, e enfrenta-se com
elas, que deixam de ser simples estímulos, para se tornarem desafios. O meio
envolvente não o fecha, limita-o – o que supõe a consciência do além-limite.
Por isto, porque se projeta intencionalmente além do limite que tenta encerrá
la, pode a consciência desprender-se dele, liberar-se e objetivar,
transubstanciando o meio físico no mundo humano. (FREIRE, 2018, p. 18).
Essa citação expressa muito bem esse momento que entrei na universidade, o ato de
transformação é algo que mexe muito com o indivíduo, principalmente com o psicológico, no
fato de ficar se perguntando como eu não percebi isso antes? Então, essa aceitação de que eu,
como indivíduo devo me colocar como um participante desta sociedade na qual posso
reivindicar ações, me coloca num lugar de desprendimento de tudo aquilo que eu acreditava,
mudando minhas concepções e ações. Não é fácil, mas é necessário.
A primeira disciplina que tive aula na universidade foi “Introdução à Educação”, uma
das melhores disciplinas que já cursei. O primeiro livro trabalhado foi “O que é educação?” de
Carlos Rodrigues Brandão (1993). Esse livro é simplesmente maravilhoso! Quando eu
comecei a lê-lo e a compreender a grande influência da educação em nossas vidas, me senti
num processo de libertação, onde minha cabeça começou a se abrir, construindo assim mais
conhecimento.

A educação pode existir livre e, entre todos, pode ser uma das maneiras que
as pessoas criam para tornar comum, como saber, como ideia, como crença,
aquilo que é comunitário como bem, como trabalho ou como vida. Ela pode
existir imposta por um sistema centralizado de poder, que usa o saber e o
controle sobre o saber como armas que reforçam a desigualdade entre os
homens, na divisão dos bens, do trabalho, dos direitos e dos símbolos.
(BRANDÃO, 1993, p. 10).
25

Brandão (1993) nos mostra que a educação transita sobre todos os lugares, está
presente durante todo o percorrer de nossa vida. Percebi que a educação também é poder, um
poder que se manifesta nas culturas, povos, crenças e que influencia diretamente no ato de
transformação do ser e que pode ser repassado por várias pessoas e não somente por um
professor de uma escola formal. A educação vai além dos muros da escola, ela é diversificada,
espontânea e me faz relembrar todos os ensinamentos que aprendi fora da escola, me trouxe
uma reflexão muito importante para minha vida que detalharei a seguir.
Aprendi na universidade que tenho voz e posso expressar tudo que penso. Essa
liberdade me ajudou muito a superar minha timidez, principalmente no ato de falar em
público. Percebo que melhorei muito nesse sentido, hoje consigo me expressar bem e expor o
que penso e quero falar.
Com o passar dos semestres, eu só cresci seja como ser humano, seja como
profissional. Uma lição que a universidade me ensinou foi acreditar em mim mesmo e ter
confiança de seguir em frente. Errar é humano, devemos nos reinventar todos os dias, fazendo
com que tenhamos consciência sobre nossa importância dentro da sociedade e nunca baixar a
cabeça diante de situações difíceis.
Eu, como futuro Pedagogo, preciso ser uma pessoa forte. A realidade que me espera lá
fora não é algo fácil de se lidar. Preciso ter um bom controle emocional e saber lidar com as
situações do dia a dia. A Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos (FAFIDAM), campus
da Universidade Estadual do Ceará (UECE), ajudou-me a me tornar uma pessoa confiante,
reflexiva, incentivadora, consciente e, principalmente, um transformador de realidades, o que
eu puder fazer para transformar a realidade dos meus futuros alunos eu irei fazer.
Chalita (2016, p. 124) nos relata “Ser professor é irradiar vida mesmo em vidas
abaladas por circunstâncias alheias à nossa vontade. Alguns estão lá há muito tempo. Há
outros que chegam e precisam entender as especificidades do lugar”. Agradeço à FAFIDAM
por todo o conhecimento construído. Quando eu me formar vou ter orgulho de dizer que fui
estudante desta Instituição de Educação Superior. Toda experiência que tive nessa
universidade será lembrada para sempre em minhas memórias e em meus depoimentos.

2.3.1 Curso de Pedagogia

Falar sobre a Pedagogia é algo que me deixa bastante emocionado e alegre ao mesmo
tempo, uma emoção aliada a esperança de dias melhores e de um futuro próspero e digno para
26

a sociedade. Lembro que, antes de prestar o vestibular, eu me sentia muito confuso em relação
ao meu futuro, desacreditado, muitas vezes, por mim e por muitos que estavam ao meu redor.
Eu me via numa situação na qual eu precisava decidir entre trabalhar ou estudar.
Em um belo dia, uma amiga minha me mandou uma mensagem avisando sobre o
vestibular que iria acontecer na FAFIDAM. Fiquei muito entusiasmado em ver na minha
frente uma oportunidade muito rica e que poderia mudar minha situação atual. Preenchi todos
os dados necessários e, no final, tinha a escolha do curso. Nunca havia imaginado ser
professor, mas enfim, olhei todos os cursos e dentre os que estavam disponíveis vi a
Pedagogia. Não sabia nada sobre essa área, fiz uma breve pesquisa e vi que estava relacionado
com a Educação Infantil. Como gosto muito de crianças, coloquei essa opção. Hoje em dia
vejo que a Pedagogia vai além desse pensamento na qual eu tinha lá atrás, ela é ampla e
diversa, abrange um espaço enorme dentro da educação, tenho muito orgulho da minha
escolha.
Fiz a primeira fase, não achei difícil. Voltei para casa meio esperançoso. Quando saiu o
resultado, pulei de alegria, era uma vitória que eu estava buscando há muito tempo. Foi aí que
percebi que tinha uma segunda fase (eu não sabia disso), uma redação sobre o lugar onde eu
vivo, um tema bastante interessante. Pude escrever sobre tudo que acontecia no meu lugar e
tudo que eu gostava nele. Quando terminei eu tinha certeza de que havia passado.
No dia que saiu o resultado, foi aquela sensação de alívio e de dever cumprido. Eu me
vi como um vencedor. Muitas pessoas me criticaram dizendo que eu não conseguiria alcançar
meus objetivos, mas eu tinha muita fé, orei muito toda noite com o joelho no chão pedindo a
Deus para me honrar e a glória veio. Pude mostrar a todos que eu conseguia, provando para
mim mesmo que posso alcançar tudo aquilo que eu quiser. Basta que tenha muita dedicação e
foco naquilo que almejo.
Chegou o tão sonhado dia o começo de um sonho. O primeiro dia de aula foi muito
estranho, era um universo muito diferente de tudo aquilo que eu já havia vivenciado. Aos
poucos, fui encontrando os colegas de sala. Lembro que, nesse dia primeiro dia, não havia sala
para a gente, muito menos aula, então, foi mais como um encontro mesmo com a turma, não
estavam todos. Conversamos muito sobre assuntos variados e sobre a vida pessoal de cada um.
Foi algo muito legal conhecer aquelas pessoas, saber um pouco sobre a história delas. Eu me
senti muito acolhido naquele momento.
À medida que os semestres foram passando, eu tinha mais certeza de que havia feito a
escolha certa. A Pedagogia me mostrou a construção da educação e suas evoluções, a
importância do pedagogo na sociedade como Brandão (1993, p. 43) retrata “O pedagogo era o
educador por cujas mãos a criança grega atravessava os anos a caminho da escola, por
caminhos
27

da vida”. Essa frase ficou gravada na minha cabeça por muitos motivos. Um deles é sobre o
cuidado, a dedicação que o pedagogo exerce perante aqueles que necessitam de sua ajuda. O
ensinar de fato, segurar sua mão e não soltar. Isso é muito lindo e me dá esperança de um
futuro melhor para nossas crianças.
Essa profissão devia ser mais valorizada em nosso país e isso está longe de acontecer.
Ela jamais deve ser esquecida, precisamos de mais e mais pedagogos ao nosso redor, o mundo
seria muito melhor.
A educação transforma o ser humano. Ela apresenta possibilidades de escolha. Basta
que as oportunidades apareçam.

A educação do homem existe por toda parte e, muito mais do que a escola, é
o resultado da ação de todo o meio sociocultural sobre os seus participantes.
É o exercício de viver e conviver o que educa. E a escola de qualquer tipo é
apenas o lugar e um momento provisórios onde isto pode acontecer. Portanto,
é a comunidade quem responde pelo trabalho de fazer com que tudo o que
pode ser vivido-e-aprendido da cultura seja ensinado com a vida – e também
com a aula – ao educando. (BRANDÃO, 1993, p. 47).

Percebe-se, então, que a educação não acontece somente na escola, acontece a todo
momento e a toda hora. A comunidade é um lugar na qual se possibilita muitas aprendizagens,
no diálogo com as pessoas e na convivência diária. Tudo isso é uma forma de aprendizado. É
muito importante que todos entendam que não se educa somente na escola, também, fora dela.
Brandão (1993, p. 25) mostra “Quando o educador pensa a educação, ele acredita que,
entre homens, ela é o que dá a forma e o polimento. Mas ao fazer isso na prática, tanto pode
ser a mão do artista que guia e ajuda o barro a que se transforme, quanto a forma que iguala e
deforma”. A educação me possibilitou estar aqui hoje, me possibilitou conhecer a Pedagogia.
A Pedagogia me ensinou como educar uma criança, buscar possibilidades daquela criança
aprender. Tenho orgulho imenso por ter escolhido esse curso. Abriu muitas portas para o meu
futuro, me fez olhar para educação e ver esperança nela.
A Pedagogia me ajuda todos os dias a nunca desistir do outro, a sempre buscar
maneiras de me sentir focado e dedicado naquilo que tanto quero. Então, agradeço a todos os
professores deste curso maravilhoso por todas as oportunidades e aprendizagens que me
foram oferecidas. É algo que guardo com muito carinho no meu coração e na minha história.
28

2.3.2 Programa Residência Pedagógica

O programa RP é um subprojeto da CAPES 3na qual tem por objetivo o


aperfeiçoamento da formação de discentes, no caso os universitários, proporcionando a
ligação do aluno com a teoria e a prática, introduzindo-o dentro do ambiente escolar.
Participei do programa RP no ano de 2019, estava cursando o 6° semestre do Curso de
Pedagogia. O projeto durou 1 ano e, durante esse período, foram realizadas três etapas do
projeto: ambientação, imersão e regência4.
A ambientação foi a primeira etapa que está relacionada com o conhecer, se
familiarizar com aquele ambiente em que você iria trabalhar. Então, esse período para mim foi
uma experiência maravilhosa, pois a partir do momento que conheci a escola e passei a tomá-
la como objeto de estudo, comecei a entender a importância desse programa para a minha
formação, na qual exigiu muita dedicação e entendimento.
A imersão é a segunda etapa que se caracterizou como um processo de participação, ou
seja, depois do período de ambientação, que conheci a escola eu me via parte dela, então eu
me sentia dentro deste processo. Tudo o que eu realizei fez parte da imersão, ou seja, observar
como o professor regia uma sala de aula, auxiliar o professor em sala de aula tirando dúvidas
dos alunos, tudo isso fazia parte da imersão.
A regência foi a terceira etapa deste processo, depois de conhecer e me familiarizar
com a escola, eu fui um bolsista e participei de tudo que a escola propôs, como: elaboração
dos planejamentos com os professores, estudo sobre metodologias, elaboração de materiais
didáticos de aprendizagem, participação nos eventos da escola etc. Eu observei os professores
dentro da sala de aula e depois dessa observação vieram as regências.
Neste momento, eu comecei a ministrar minhas aulas para aquelas turmas destinadas
pela minha preceptora, trabalhei com turmas de 5° ano do Ensino Fundamental em torno de
100 alunos, eram turmas de: A, B e C. As turmas foram escolhidas pela preceptora 5, pois eu
tinha que trabalhar nas turmas em que ela ensinava na escola. Eram turmas bastante cheias
com muitos alunos de diferentes comunidades e diferentes contextos, em média 35 estudantes.

3
De acordo com a CAPES (2018, p. 1): Edital CAPES n° 06/2018 do Programa Residência Pedagógica art. 1.1° Do
objeto: “1.1 O objeto do presente edital é selecionar, no âmbito do Programa Residência Pedagógica, Instituições de
Ensino Superior (IES) para implementação de projetos inovadores que estimulem articulação entre teoria e prática nos
cursos de licenciatura, conduzidos em parceria com as redes públicas de educação básica”.
4
“2.2.1.1 A residência pedagógica terá o total de 440 horas de atividades distribuídas da seguinte forma: 60 horas
destinadas a ambientação na escola; 320 horas de imersão, sendo 100 de regência, que incluirá o planejamento e
execução de pelo menos uma intervenção pedagógica; e 60 horas destinadas à elaboração de relatório final, avaliação e
socialização de atividades.” (CAPES, 2018, p. 1).
5
“2.2.2 Na escola-campo, o residente será acompanhado por um professor da educação básica, denominado preceptor.”
(CAPES, 2018, p. 2).
29

Durante todo o período do RP, me relacionei com duas professoras. No caso, eram
duas pedagogas. Eu observei-as durante todo esse processo e percebi que são profissionais
muito diferentes. Uma delas era bastante calma, transmitia muita paz e tranquilidade durante
suas aulas. Já a outra é bem mais agitada, compartilhando seus questionamentos e tendo uma
dinâmica muito boa dentro da sala de aula.
Como preparação para a regência, estudei muito o livro “Didática” de Libâneo (1990),
que traz muitas informações relevantes sobre as práticas de ensino, para depois poder colocar
em prática aquilo que o programa me ofereceu, ou seja, o exercício da docência. Em linhas
gerais, essas foram as etapas deste programa.
Esses processos dentro da RP foram estipulados ao todo em torno de 440 horas, não
podia ser menos que isso, mas digo, com toda certeza, que durou bem mais que isso. Foi um
trabalho bastante intenso e de muito estudo. Aplicar a teoria na prática é algo que necessita de
bastante atenção e muita dedicação, não é algo simples. Esse ponto, para mim, foi bastante
importante, estava muito focado em conseguir realizar tudo aquilo que foi planejado durante
todo esse percurso, tendo o foco sempre no aluno, proporcionando a aprendizagem
significativa, tudo tinha que fazer sentido para o aluno, essa era nossa maior preocupação.
Mediante o que foi dito sobre os processos de desenvolvimento da RP, irei relatar a
minha experiência nesse projeto maravilhoso, que me deu muitas oportunidades de me ver
como profissional e perceber que era aquilo que eu queria para o resto da minha vida. Essa é a
minha profissão.
A Residência Pedagógica contribuiu de forma muito positiva na minha formação
docente, me trouxe a experiência que tanto eu precisava, me mostrou que é possível colocar
em prática aquilo que foi planejado, mesmo diante de diversas dificuldades encontradas
durante todo esse processo. Então, me sinto lisonjeado e honrado em ter participado da
residência. Ajudou-me a me tornar um profissional reflexivo, mesmo diante das dificuldades
que estavam ali presentes. A RP me deu uma bagagem enorme de muito aprendizado,
principalmente voltado às práticas pedagógicas incluindo: planejamento e regência. Tudo isso
foi de suma importância para a minha formação, agradeço tudo que essa bolsa me
proporcionou.
O planejamento escolar é um dos componentes da didática, vinculado com o processo
de ensino, que deve ser exigido e respeitado por toda instituição escolar. Esta é uma tarefa de
grande importância tanto para professores quanto para alunos, pois é a partir do planejamento
que será desenvolvido toda a organização e coordenação das atividades que serão realizadas
durante todo o ano letivo.
30

O planejamento é um processo de racionalização, organização e coordenação


da ação docente, articulando a atividade escolar e a problemática do contexto
social. A escola, os professores e os alunos são integrantes da dinâmica das
relações sociais: tudo o que acontece no meio escolar está atravessado por
influência econômicas, políticas e culturais que caracterizam a sociedade de
classes. Isso significa que os elementos do planejamento escolar - objetivos,
conteúdos, métodos - estão recheados de implicações sociais, têm um
significado genuinamente político. Por essa razão, o planejamento é uma
atividade de reflexão acerca das nossas opções e ações: se não pensarmos
detidamente sobre o rumo que devemos dar ao nosso trabalho, ficaremos
entregues aos rumos estabelecidos pelos interesses dominantes na sociedade
(LIBÂNEO, 1990, p. 222).

Libâneo (1990) nos mostra de forma bastante clara a importância do planejamento


dentro do âmbito escolar. Tudo começa a partir do planejamento, os objetivos estabelecidos, os
rumos que a escola precisa tomar. O planejamento é um fator essencial para que o professor
consiga desenvolver tudo aquilo que foi planejado para ser aplicado dentro de sala de aula.
Mesmo o planejamento sendo algo necessário ele não deve ser estabelecido de forma
mecânica, vejamos:

Planejar, então, não se restringe a uma ação mecânica que obriga o professor
a preencher formulários vazios e entregá-los à coordenação da instituição de
ensino. Não é um instrumento para controle administrativo. Antes disso, é o
instrumento de que lança mão o professor no direcionamento das ações
pedagógicas. Por isso mesmo, as suas intenções, revestidas em termo de
objetivos de ensino/aprendizagem, revelam o modelo de sociedade, de
educação e de ser humano que construímos ao longo de nossa trajetória
(D’ÁVILA; MADEIRA, 2018, p.70).

O planejamento vai além da ação administrativa, ele deve ser reflexivo e


conscientizador. Estabelecer sim às demandas da sociedade, mais que seja de forma flexível e
que o professor tenha autonomia para desenvolvê-lo da forma que ele desejar, sem nenhum
tipo de pressão em cumpri-lo ao todo, essa seria a forma ideal do professor se utilizar do
planejamento.
A regência se caracteriza como a prática em sala de aula, ou seja, o momento que se
ministra a aula, então envolve: planejamento, organização, objetivos, desenvolvimentos,
avaliação. Todos esses pontos fazem parte da regência escolar. O pertencimento é algo muito
importante dentro da regência, o aluno precisa se pertencer naquele lugar, fazendo com que
possa se ver como um professor. Vejamos:

Trata-se portanto, de adquirir um saber sobre como ocupar um lugar e como


saber falar a partir dele, ou mesmo de criar um lugar onde ele às vezes nem
existe. Seria a partir do estabelecimento de um lugar como esse que o
estagiário-professor poderia lidar com a imprevisibilidade da sala de aula, com
31

o comportamento dos alunos e suas demandas, com as questões de ensino


imediatas que surgem durante a aula; enfim exercer a função de professor em
sua plenitude (ARRUDA; BACCON, 2007, p. 118).

O estágio é o momento de o aluno universitário colocar tudo que ele estudou, suas
metodologias, planejamento, e o exercício da didática, então ele precisa entender o seu papel
naquele lugar, mesmo sendo estagiário ele vai ter que ministrar aula para aqueles alunos na
qual ele está acompanhando, então naquele momento ele é um professor e deve impor-se
como um, isso precisa ser encarado por ele mesmo.

O estágio curricular é, portanto, indispensável na construção da identidade


profissional, uma vez que a profissão de professor não pode ser considerada
uma ciência aplicada, sendo que o envolvimento humano não pode ser
sistematizado, devendo haver um contato mais intenso para gerar
conhecimento (ROSA; WEIGERT; SOUZA, 2012, p. 678).

O Curso de Pedagogia poderia intervir de uma forma mais prática, trazer os alunos
para o chão da escola desde o início do curso, fazendo com que eles tenham uma visão mais
ampla da Pedagogia, podendo identificar se realmente é isso que eles querem para o seu
futuro. Essa seria uma forma muito interessante de trabalhar, de aliar a teoria à prática.
A escola-campo6ajudou muito durante todo o percurso do projeto. O auxílio foi
relacionado aos materiais didáticos. Todos nós sabemos o quanto é escasso e precário o ensino
público hoje em dia, mas, mesmo com tantas dificuldades, eles nos ofereciam materiais para se
trabalhar como: cartolina, cola, pincéis, folhas, lápis entre outros. Quando não se tinha para
oferecer, a gente reutilizava e assim ia dando tudo certo.
Então a escola foi uma grande aliada principalmente na ajuda em sala de aula, davam
algumas dicas de como intervir em situações, como: quando os alunos estavam muito agitados
depois do recreio, em como ensinar determinado conteúdo, então essas questões foram
importantes para mim, para que tudo fosse cumprido dentro da Residência Pedagógica.
A preocupação com a educação dos alunos foi algo que me impactou no começo do
projeto. A gestão escolar, juntamente com os professores eram muito dedicados em buscar
sempre uma metodologia que proporcionasse uma melhor aprendizagem daquele conteúdo
para os alunos. Então me motivou mais, em sempre querer estudar e proporcionar uma certa
mudança no comportamento dos alunos, pois em diversas vezes eles não queriam participar
das

6
De acordo com a CAPES (2018): Edital CAPES n° 06/2018 do Programa Residência Pedagógica art. 2.2° Das
definições: 2.2.2 “Na escola-campo, o residente será acompanhado por um professor da educação básica, denominado
preceptor”. (CAPES, 2018, p. 2).
32

aulas e sempre tínhamos que buscar algo que fosse importante para ele naquele momento
dentro de sala de aula. Foi justamente essa força e apoio que a escola deu, foi de suma
importância.

Portanto, o papel da educação é soberano, tanto para a elaboração de


estratégias apropriadas e adequadas para mudar as condições objetivas de
reprodução, como para a automudança consciente dos indivíduos chamados a
concretizar a criação de uma ordem social metabólica radicalmente diferente.
(MÉSZÁROS, 2008, p. 65, grifo do autor).

A educação vai ser sempre um ato de transformação para o indivíduo, quando o aluno
se apropria dela e tem a consciência da importância que ela exerce dentro da sociedade a
aprendizagem começa a acontecer, mas é algo que deve partir do aluno. Nós, como
professores, podemos desenvolver a função de estimular e sempre dar apoio ao aluno,
principalmente para aqueles alunos que não tem muita noção de responsabilidade,
comprometimento e iniciativa. Podemos reelaborar a compreensão que a família e a
sociedade, muitas vezes, não oferecem essa ajuda ao cidadão, eles ficam à mercê de muita
coisa, é uma tarefa difícil, mas é necessário.
Os professores podem potencializar ambientes e situações de ensino e de aprendizagem
que permitam que o aluno compreenda que sua participação é essencial dentro do seu processo
de aprendizagem, que ele pode se sentir capaz e atuante, mas para que isso aconteça ele
precisa de ajuda. O professor pode ser esse mediador e o aluno pode se abrir para a nossa
ajuda e querer aprender. Em minha compreensão, a educação está aí para auxiliar no ato de
transformação da vida de qualquer pessoa, para tanto é importante que se entenda que a
educação é algo que deve ser valorizado e não desperdiçado.
Relacionado aos estudos durante a RP, o projeto utilizava a Teoria da Aprendizagem
Significativa de David Ausubel, que nos mostra a importância que o aluno tem dentro da sua
própria aprendizagem, não adianta os professores trabalharem determinados conteúdos sem
que haja uma participação significativa do aluno, não haveria resultados satisfatórios agindo
dessa forma.
Então, a participação dos alunos nesse processo foi algo muito importante, eles
caminharam junto com a gente, eles eram o nosso foco, a partir do momento que eles
compreenderam isso, nosso trabalho começou a ter um aproveitamento muito considerável.

Aprendizagem significativa é aquela em que ideias expressas simbolicamente


interagem de maneira substantiva e não-arbitrária com aquilo que o aprendiz
já sabe. Substantiva quer dizer não-literal, não ao pé-da-letra, e não-arbitrária
significa que a interação não é com qualquer idéia prévia, mas sim com algum
conhecimento especificamente relevante já existente na estrutura cognitiva do
sujeito que aprende. (MOREIRA, 2012, p. 2).
33

Por meio desses apontamentos feitos por Moreira sobre a definição de aprendizagem
significativa de Ausubel, compreendo que a partir do momento que recebemos novas
informações, elas irão se acoplar às concepções preexistentes em nosso cognitivo, tornando
assim de certa forma significativas, ou seja, algo que faça sentido em nossos pensamentos. O
professor quando ministra sua aula precisa despertar interesse no aluno, fazendo com que
dessa forma a aprendizagem aconteça.
Durante todo esse percurso, tive algumas dificuldades. Primeiramente foi na
organização da sala, mesmo observando as professoras em sala de aula, fiquei com uma certa
insegurança. Ao meu ver, isso é normal, pois estava me inserindo pela primeira vez como um
professor regendo uma sala, e a questão emocional também influencia. Fui conseguindo pouco
a pouco fazer a gestão da sala de aula, melhorando assim as minhas aulas. Outra dificuldade
encontrada foi em relação aos materiais didáticos, às vezes a escola não tinha um determinado
material que seria utilizado, então nós tínhamos que ir atrás dos materiais didáticos, comprar
em lojas. Essas foram as dificuldades que encontrei durante todo esse período.
O olhar para a docência foi algo que me chamou muita atenção nesse projeto, ter a
oportunidade e experiência de ir à campo foi algo incrível, e estar dentro de uma sala de aula é
tudo aquilo que eu buscava desde que entrei na universidade. Então, só tenho a agradecer ao
programa RP e a todos que me proporcionaram essa experiência maravilhosa que ficará
guardada comigo para o resto da minha vida.
Quando tive a oportunidade de ministrar em sala de aula me vi como professor, no período de
ambientação observei bastante as professoras em sala de aula. Esse momento foi muito
importante para mim, todas aquelas práticas de ensino me despertaram muito interesse em
querer trabalhar aquilo quando eu estivesse regendo. Os seminários, as contações de histórias,
as atividades em grupo, tudo isso que presenciei foi me construindo como professor.
Identidade docente é uma construção, é olhando e aprendendo que também se contribui
para a formação de um profissional da educação. Os ensinamentos que aprendi foram diversos
durante esse período, antes eu era um bolsista que apenas estudava as teorias na universidade e
durante todo o processo da RP me descobri uma nova pessoa, uma pessoa mais confiante,
sabendo lidar com situações adversas como: tratar os alunos de forma igualitária, saber escutar
no momento certo, me posicionar diante de um conflito, aprender com os erros, valorizar
minha profissão em sala de aula. Tudo isso me fez crescer como pessoa e como profissional.
Entrei um universitário sem experiência em reger uma sala de aula, sai como um
universitário que aprendeu muito naquele espaço e que agora tem conhecimento de como
34

utilizar as práticas de ensino e como o professor se reinventa a cada situação de dificuldade,


acrescentou muito na minha formação e na minha bagagem como um futuro pedagogo. O
interesse pelo tema identidade docente surgiu desse convívio diário com as professoras da
escola, as experiências que adquiri no tempo que passei com elas. São elementos que guardo
em minha memória e na minha formação, o auxílio em determinadas situações foi algo que
me ajudou muito, por exemplo: dicas de como trabalhar determinados conteúdos com os
alunos, me ajudaram na oratória, até na escrita da lousa elas me ajudaram. São pequenos
detalhes que diferenciam cada professor, e isso me instigou nessa pesquisa, escutar suas
trajetórias é algo que me inquieta e que desejo muito realizar, conhecer e continuar a aprender
com elas.
O convívio com o grupo escolar me mostrou que o trabalho do professor é algo que
ultrapassa a sala de aula, a troca de experiências dentro da sala dos professores é algo muito
interessante, surgem muitas ideias, na qual são compartilhadas e debatidas ali mesmo, cada um
mostrando seu ponto de vista, isso é muito instigante. Então carrego comigo essa ação coletiva
em busca de alternativas que auxiliem mais o ensino e aprendizagem, aprendi nesse espaço
que mesmo com pouco tempo e com poucos recursos a educação acontece. O trabalho é em
grupo e não individualmente, acho isso esplêndido dentro da escola.
A próxima seção é sobre o referencial teórico, na qual eu trago ideias e apontamentos
de autores que me auxiliaram no desenvolvimento do meu trabalho, me ajudando a dialogar
com meus questionamentos sobre os temas apresentados.
35

3 INSPIRAÇÕES TEÓRICAS

Nesta seção, irei abordar sobre alguns temas que são de suma importância para o meu
trabalho, que me ajudaram na construção e no desenvolvimento do meu tema central. Sobre o
tema “Identidade” trago Bauman (2005), Dubar (2006), Pimenta (1999) e Nóvoa (2009) que
auxiliam na compreensão sobre esse tema tão rico que necessita de bastante dedicação para se
ter um posicionamento coeso. Acrescentando a minha pesquisa trago as “Narrativas”
utilizando o autor Motta (2013) que apresenta esse conceito mostrando que, dentro da
formação, as narrativas agregam à construção de reflexões, relações e conhecimentos sobre e
na prática educativa. Sobre o conceito de (auto)biografia, como referência utilizei Mota, Silva
e Rios (2019) e Machado, Nunes e Santana (2019), que nos mostram que a (auto)biografia nos
ajuda a repensar a prática docente, proporcionando ações transformativas dentro da educação.
Trago a “História de vida de formação” com Josso (2007) que nos mostra o quão importante é
nossa trajetória de vida, fazendo com que isso reflita em nossa formação, proporcionando
sempre atos de reflexão, de mudança e de renovação de si. Trago também as “Matrizes
Pedagógicas”, com Furlanetto (2003), que oferece uma visão bastante enriquecedora sobre os
espaços que o professor ocupa e sobre as possibilidades de transformação do ser humano.

3.1 Identidade docente

Tendo como base para esse estudo, utilizarei os pensamentos de Zygmunt Bauman, foi
um filósofo, sociólogo, professor e escritor polonês que se deteve em estudar sobre a
identidade e suas interferências dentro da sociedade. Então, lendo seu livro “Identidade:
entrevista a Benedetto Vecchi” (BAUMAN, 2005), vejo a grande influência que ele teve
dentro da sociologia.
Deve-se entender que a identidade é algo que pode ser mudado ao longo do tempo,
pois é uma construção e exige, de certa forma, uma conscientização de tudo aquilo já vivido e,
com o passar do tempo, você pode perceber que aquilo que lhe chamava muita atenção, agora,
não chama mais e não tem mais a mesma importância que antigamente. Vejamos como
Bauman (2005) explica isso:

Tornamo-nos conscientes de que o “pertencimento” e a “identidade” não tem


a solidez de uma rocha, não são garantidos para toda a vida, são bastante
negociáveis e revogáveis, e de que as decisões que o próprio indivíduo toma,
os caminhos que percorre, a maneira como age - e a determinação de se manter
firme a tudo isso - são fatores cruciais tanto para o “pertencimento” quanto
36

para a “identidade”. Em outras palavras, a idéia de “ter uma identidade” não


vai ocorrer às pessoas enquanto o “pertencimento” continuar sendo o seu
destino, uma condição sem alternativa. Só começarão a ter essa idéia na forma
de uma tarefa a ser realizada, e realizada vezes e vezes sem conta, e não de
uma só tacada. (BAUMAN, 2005, p. 17-18, grifo do autor).

A identidade é algo que parte de suas próprias escolhas, se elas são certas ou erradas
quem vai perceber isso é você, pois naquele momento você acreditava nas escolhas que
estavam sendo tomadas. Quando o autor fala sobre o pertencimento, compreende-se que é
algo que todo indivíduo tem em si mesmo, seja em determinadas escolhas que se toma ou
mesmo em seus próprios pensamentos e sentimentos. Então, fazer com que haja esse
desprendimento de coisas que estão guardadas com você e que, por diversos fatores, você não
abre mão de chegar a uma conclusão de que isso foi importante, mas que no momento não
serve mais dentre as suas escolhas, é algo natural e que deve acontecer sem que haja
ressentimento, mas, para isso, existe todo um processo e uma conscientização que deve partir
de si próprio.
A identidade é algo social, por isso nos deparamos com inúmeras situações nas quais
nos fazem refletir sobre o nosso modo de pensar e sobre as nossas escolhas. Isso exige uma
certa preocupação e atenção, pois não é porque determinada pessoa pensa algo que eu sou
obrigado a pensar igual eles. Vivemos em um mundo onde a diversidade de ideias é algo
comum e que devemos entender qual o nosso papel dentro da sociedade. Então, a apropriação
de algo dito por outra pessoa é uma forma de ser influenciado diante de algumas situações,
fugindo assim um pouco de sua identidade, buscando informações de outros indivíduos.
Bauman cita:

As “identidades” flutuam no ar, algumas de nossa própria escolha, mas outras


infladas e lançadas pelas pessoas em nossa volta, e é preciso estar em alerta
constante para defender as primeiras em relação às últimas. Há uma ampla
probabilidade de desentendimento, e o resultado da negociação permanece
eternamente pendente. (BAUMAN, 2005, p. 19).

A busca por esse entendimento entre o que eu acredito e o que outras pessoas
acreditam é algo que acontece constantemente, pois o contato com as pessoas é diário, ter essa
noção e esse cuidado parte do próprio indivíduo e do fato de olhar para si mesmo e se
entender, ajudando, assim, no seu próprio reconhecimento como pessoa e como profissional.
O pessoal é algo que também se destaca muito na identidade, pois na maioria das vezes
está interligada com a subjetividade, pois justamente é aquilo que o indivíduo guarda consigo,
algo de sua própria natureza que está interligado com o seu eu.

De facto, a identidade não é apenas social, ela é também pessoal. Ora o


indivíduo não se transforma facilmente num objecto sociológico. Em França,
37
a sociologia clássica constituiu-se contra a psicologia e contra a sua
focalização sobre o indivíduo. Por esse facto, na continuidade de Durkheim, o
ser social dos indivíduos (a sua identidade social, sinônimo de pertença a uma
categoria socialmente pertinente) é considerado como aquilo que eles herdam
sem o quererem e o que modela as suas condutas sem que eles tenham
consciência disso. (DUBAR, 2006, p. 13)

Então, o fator pessoal é aquele que se caracteriza por aquilo que lhe foi ensinado
durante a sua vida, aquilo que você traz consigo, sua história, sua essência é o mais puro
sentimento que vem guardado e que você deve perdê-lo, pois é sua raiz. Algo que foi trazido
durante gerações, foi o que lhe construiu como pessoa e que se reflete em suas ações como
profissional e que não deve ser considerado errado, pois foi muito importante durante a sua
trajetória.

A identidade não é um dado imutável. Nem externo, que possa ser adquirido.
Mas é um processo de construção do sujeito historicamente situado. A
profissão de professor, como as demais, emerge em dado contexto e momento
históricos, como resposta a necessidades que estão postas pelas sociedades,
adquirindo estatuto de legalidade. Assim, algumas profissões deixaram de
existir e outras surgiram nos tempos atuais (PIMENTA, 1999, p. 18).

Se tornar professor perpassa por muitas etapas e processos na qual se vai construindo
conhecimentos e vivências durante sua vida, como em todas as profissões como a citação
acima afirma, é algo que vai se construindo ao longo do tempo. Durante a nossa história
passamos por situações na qual vão construindo nossa identidade e na hora de escolher nossa
profissão olhamos para nossa história e vemos aquilo que nos caracteriza como indivíduo,
auxiliando assim as nossas escolhas futuras, não é algo escolhido do dia para noite e sim algo
construído ao longo de nossa trajetória de vida.
A escola se caracteriza como o local onde o professor irá compartilhar seu
conhecimento, conhecimento esse trazido durante toda a sua trajetória de vida e
principalmente na sua formação como profissional de ensino.

A educação escolar, por sua vez, está assentada fundamentalmente no trabalho


dos professores e dos alunos, cuja finalidade é contribuir com o processo de
humanização de ambos pelo trabalho coletivo e interdisciplinar destes com o
conhecimento, numa perspectiva de inserção social crítica e transformadora.
(PIMENTA, 1999, p. 23).

Compartilhar conhecimentos é uma das principais funções que a escola exerce, é a


partir deste contato que o aluno irá aprender e se desenvolver, aqui se estabelece a identidade
docente do professor, os ensinamentos que o professor ensina aos seus alunos foi algo
construído durante o percorrer de sua vida. A identidade aqui se apresenta de várias formas:
nos temas
38

escolhidos, na metodologia utilizada, no planejamento estabelecido e principalmente na


didática utilizada por ele, então a identidade é algo entranhado no ser humano, na qual vai
sendo atualizado ao longo das vivências e experiências adquiridas.
O contato com a escola faz com que o professor vá se moldando ao longo do tempo,
ele precisa identificar qual o seu propósito dentro daquele espaço, fazendo com que ele possa
auxiliar da melhor forma possível.

Através dos movimentos pedagógicos ou das comunidades de prática, reforça


se um sentimento de pertença e de identidade profissional que é essencial para
que os professores se apropriem dos processos de mudança e os transformem
em práticas concretas de intervenção. É esta reflexão colectiva que dá sentido
ao seu desenvolvimento profissional. (NÓVOA, 2009, p. 21).

Dentro da escola o professor começa a se reconhecer como profissional, então as


mudanças aqui irão acontecer para que ele se adeque a essa situação, tendo compreensão da
sua importância dentro da sociedade, agregando ainda mais sua identidade docente,
proporcionando novos questionamentos, o fazendo refletir sobre o seu espaço de trabalho se
estabelecendo assim uma identidade profissional.

Uma identidade profissional se constrói, pois, a partir da significação social


da profissão; da revisão constante dos significados sociais da profissão; da
revisão das tradições. Mas também da reafirmação de práticas consagradas
culturalmente e que permanecem significativas. Práticas que resistem a
inovações porque prenhes de saberes válidos às necessidades da realidade.
(PIMENTA, 1999, p. 19).

O contato com a profissão vai transformando o ser, ele vai adquirindo mais
responsabilidade, consciência e compreensão sobre tudo que está a sua volta, identificando
assim sua verdadeira função, sendo seu próprio agente de mudança em sua vida. Possibilitando
aprendizagens significativas, aumentando assim o seu repertório e sua trajetória de vida de
formação.

3.2 Narrativas: construção da identidade do ser

Durante toda nossa trajetória de história de vida de formação, acumulamos


conhecimentos, vivências, experiências que nos constroem enquanto seres humanos, diante
disso o que fica são as histórias e lembranças. Algumas delas são compartilhadas entre todos
que convivem ao nosso redor.
39

As narrativas se apresentam como uma maneira de dialogar sobre nossa história de


vida, e mostrar nossa identidade a partir de tudo aquilo que vivemos, ressignificando
momentos e aprendizagens, refletindo, escrevendo sobre si mesmo. Motta (2013) ressalta:

Vivemos mediante narrações. Todos os povos, culturas, nações e civilizações


se constituíram narrando. Construímos nossa biografia e nossa identidade
pessoal narrando. Nossas vidas são acontecimentos narrativos. O acontecer
humano é uma sucessão temporal e causal. Vivemos as nossas relações
conosco mesmo e com os outros narrando. Nossa vida é uma teia de narrativas
na qual estamos enredados. (MOTTA, 2013, p. 17).

As narrações estão totalmente ligadas com nossa identidade. A construção da nossa


identidade se relaciona muito com nosso diálogo. A comunicação é muito importante em nossa
vida, precisamos refletir sobre nossos questionamentos e nossas ideias. Nós mudamos o
mundo, desse jeito, nos expressando. Então, o narrar é algo que está conosco desde o
princípio e se torna uma grande aliada em vários momentos de nossas vidas, inclusive nos
processos formativos, pois para conseguirmos alcançar nossos objetivos, precisamos nos
posicionar diante da sociedade.
A construção da nossa identidade se baseia nas relações que temos durante a vida,
relações que são tecidas a partir do diálogo e das próprias histórias de vida das pessoas, então
o contato que temos pode acontecer de várias formas, como: pelos mesmos gostos, por
conversas, por amigos em comum. São diversas formas que fazem com que a relação com os
outros aconteça.

Nossas vidas são nossas narrativas. Melhor dizendo, nossas narrativas tecem
nossas vidas. Organizamos as nossas biografias destacando alguns
acontecimentos que cremos estarem mais carregados de significações, e que
pontuam a nossa história pessoal. Pontos de virada que nos vinculam ao
passado, dão continuidade ao presente e nos remetem ao futuro, criando as
representações de nós mesmos e nossas identidades individuais. Narrar é uma
forma de dar sentido à vida. Na verdade, as narrativas são mais que
representações: são estruturas que preenchem de sentido a experiência e
instituem significação à vida humana. Narrando, construímos nosso passado,
nosso presente e nosso futuro. As narrativas criam o ontem, fazem o hoje
acontecer e justificam a espera do amanhã. (MOTTA, 2013, p. 18).

Quando busco falar sobre a minha história de vida de formação e as histórias de vida
de formação das professoras da minha pesquisa procuro as narrativas. Narrações essas que
dão sentido a tudo que foi construído durante uma vida e, por meio delas, é possível
identificar como esse processo aconteceu. Narrar sobre sua própria história significa perceber
quais aspectos foram importantes durante a sua caminhada, aspectos esses que construíram
sua
40

identidade pessoal e sua identidade docente. As narrações dentro da história de vida de


formação dão sentido e nos mostra como o ser humano é de verdade, como aconteceu o seu
processo de formação e como isso interferiu em sua vida.

3.2.1 (Auto)biografia: O estudo sobre si

O estudo (auto)biográfico se caracteriza como um processo de autoanálise, buscando


retratar experiências vivenciadas durante toda sua trajetória. Quando me propus a trazer o
estudo (auto)biográfico no meu trabalho, busquei, por meio da minha breve história de vida de
formação, mostrar as diversas situações e acontecimentos que foram significativos durante
meu percurso com o recorte para a minha formação como Pedagogo, então é de suma
importância que eu me veja dentro do meu trabalho.

A pesquisa (auto)biográfica tem se apresentado, nos últimos anos, como uma


abordagem colaborativa para o movimento formativo de docentes. Tal
abordagem vem possibilitando maneiras outras de se (re)pensar a docência
diante do contexto contemporâneo no que diz respeito às relações
estabelecidas pelos sujeitos que compõem os espaços escolares. Assim, fica
evidente que as narrativas (auto)biográficas trazem em si uma potência
formativa, no que respeita aos processos de (re)construção de sentidos e
significados do fazer docente. Durante muito tempo, este fazer esteve marcado
meramente pela reprodução de conteúdos, desconsiderando as diferenças
existentes nas escolas e nos contextos culturais socioeconômicos de cada
comunidade. (MOTA; SILVA; RIOS, 2019, p. 360).

O aprofundamento do estudo (auto)biográfico pode trazer diversos elementos com


relevância para a profissão docente, como: o processo de reflexão sobre a prática docente,
ações contextualizadas envolvendo a cultura e, até mesmo, a percepção sobre suas próprias
experiências, podendo refletir e aprender com elas além de desvelar suas próprias matrizes
pedagógicas.
Trazer suas contribuições também é uma forma muito significativa de expor tudo
aquilo que foi adquirido e construído durante sua vida, as experiências vivenciadas ajudam
muito na ação docente e, de certa forma, mostram suas habilidades e seu potencial. Ver-se
diante da sua história e buscar os elementos que a constituíram é algo de muita relevância
dentro do seu processo de construção e evolução, esse olhar visando aprendizagem e
conhecimento é uma tarefa essencial de uma análise própria e sua.
Neste trabalho, quando apresento a (auto)biografia, quero mostrar como a trajetória é
importante na vida do profissional, nesse caso de um Pedagogo em formação, mostrar as
41

experiências, as vivências, as situações, são “coisas” existentes, e que interferem na própria


formação, fazendo com que possa ter reflexão e conscientização sobre tudo aquilo vivenciado.
Para Machado, Nunes e Santana (2019, p. 85) “as autobiografias nunca têm fim, porque a
história de vida de uma pessoa se amplia até o infinito e pode ser contada de várias maneiras,
sofrendo novas interpretações”. Identificamos aqui nessa reflexão, que a autobiografia é algo
que está em constante transformação, pois durante a nossa vida, vamos vivenciando
experiências que ficam guardadas para sempre, proporcionando conhecimentos que poderão
ser utilizados a qualquer momento.

3.2.1.1 História de vida de formação

Como um recorte dentro dos estudos (auto)biográficos, me aprofundei nos elementos


voltados para a formação como docente, que compõem a identidade docente minha e das
professoras participantes. Compreendo que a história de vida de formação se encaixa
perfeitamente no que já venho afirmando sobre identidade docente, quando se fala em história
se lembra do passado, e olhar para o passado é lembrar sobre sua vida, sobre os
acontecimentos, lembranças, memórias podendo assim reconhecer quem você é, como se
fosse uma reconexão com o seu eu.

A história de vida é, assim, uma mediação do conhecimento de si em sua


existencialidade, que oferece à reflexão de seu autor oportunidades de tomada
de consciência sobre diferentes registros de expressão e de representações de
si, assim como sobre as dinâmicas que orientam sua formação. (JOSSO, 2007,
p. 419).

Quando o indivíduo se vê diante do mundo muitos pensamentos surgem, ele começa a


reconhecer seu verdadeiro lugar. Esse lugar que é ocupado pelo indivíduo passou por muitas
transformações e vivências que o constituíram, como se fosse um quebra cabeça, que a
qualquer momento pode se “quebrar” e depois se construir de novo. O ser humano está em
constante transformação, o destino pode ser escolhido, as decisões a serem tomadas dependem
também de si mesmo.
Quando o professor decide exercer essa profissão, foi uma escolha feita, na qual
existem diversos fatores para que isso aconteça. Ele pode ter olhado para o passado e ter
lembrado de alguns professores que foram inspiração, por exemplo.
Sendo assim, proponho trabalhar com a história de vida de formação, porque acredito,
a partir dos autores estudados, na importância que esse tema tem dentro do processo de
42

construção da identidade docente. Minha história revela um pouco de quem eu sou, do que
aconteceu no passado que me influenciou a ser o que sou hoje. Acredito que são
acontecimentos em nossa vida que nos fazem crescer e evoluir tanto como profissional quanto
como pessoa. Neste estudo, tratarei de minha história de vida de formação e das histórias de
vida de formação das professoras.

3.2.2 Matrizes Pedagógicas

O professor é um profissional que está sempre em constante mudança, ou seja, se


construindo a cada experiência que aparece em sua vida, aprendendo com pessoas, com
lugares e com situações das mais diversas possíveis.
A relação do professor com a educação vai além do lado profissional, existe um afeto,
carinho e principalmente amor pela sua profissão.
A pesquisadora Ecleide Furlanetto (FURLANETTO, 2003, p. 27) afirma que: "Fomos
percebendo que as matrizes apresentam-se como arquivos existenciais que contêm imagens,
conteúdos coletivos e pessoais que são acessados quando o professor se exerce nos espaços
pedagógicos”, o espaço onde a educação acontece tem uma conexão muito forte com o
professor, a prática e o convívio escolar faz com que o professor se reconheça como um
profissional, observando assim todo o processo construído para que a aprendizagem se
concretize. Então trazer as matrizes pedagógicas como uma questão importante tanto para
escola quanto para a formação docente é algo que deve ser de interesse de todos que atuam
nela, é um assunto muito relevante e que pode trazer questionamentos importantes nos
processos de ensino e aprendizagem.

O inconsciente pessoal abriga os registros de nossas recordações pessoais;


enquanto o inconsciente coletivo guarda imagens arcaicas, construídas
baseadas nas vivências de nossos antepassados, mas, não só! Tanto as
vivências pessoais como as histórias de nossos antepassados repousam sobre
imagens coletivas inatas que estruturam o inconsciente coletivo [...]
(FURLANETTO, 2003, p. 28).

Essa citação mostra como nossas recordações guardadas no nosso inconsciente


influenciam em nossas ações, com o passar do tempo nossa trajetória pessoal e profissional
passa por diversas mudanças e evoluções. Os caminhos que escolhemos nos mostram
exatamente o que somos e o que gostamos, nos mostra nossa identidade e o mais importante é
olhar para trás e ter orgulho de tudo aquilo que foi realizado com todo o esforço e dedicação.
43

A escola sempre foi um lugar de transformação na minha vida, sempre quis mostrar
meu potencial, nas tarefas e nas apresentações. Sempre fui uma pessoa muito dedicada e
sempre tive muito apoio, principalmente dos meus professores. Eles sempre me passaram
muita confiança e eu me sentia encorajado e nunca tive medo de apresentar meus
questionamentos. Creio que esse fato tenha me ajudado muito na universidade.
O esforço é algo que sempre me motiva a querer fazer o melhor. Nunca me achei uma
pessoa inteligente, mas sim esforçado. Eu corro atrás dos meus objetivos e não desisto daquilo
que desejo conquistar. Agradeço aos meus professores pelo voto de confiança. Sou uma pessoa
que me cobro muito, em algumas circunstâncias, mas foram essas cobranças que me tornaram
mais forte. Hoje eu agradeço a Deus por ter chegado até aqui e peço sempre muita sabedoria
para trilhar novos caminhos, mas sou humilde e lembro da minha história. Foi na minha
primeira escola que descobri que a palavra “desistir” não existe no meu vocabulário e que
“persistir” sim é algo que me move dia a dia.
44

4 METODOLOGIA DE PESQUISA

A metodologia desta pesquisa é dividida em alguns conceitos que são muito


importantes dentro do meu trabalho, na qual irei detalhar sobre. Trago a abordagem
qualitativa que tem o foco nas interpretações das realidades sociais tendo coerência com tudo
que exposto sobre minha pesquisa. Cito sobre a história de vida de formação, que nos mostra
a importância da trajetória de vida do sujeito, influenciando assim na formação profissional do
próprio, que tem relevância principalmente sobre a identidade docente. Trago a entrevista
narrativa que me ajudou a conhecer a história de vida das professoras e a análise de conteúdo
me auxiliou a desenvolver o passo a passo da organização das entrevistas e a categorização
me ajudou na identificação dos grandes temas dentro da história de vida de formação das
professoras participantes da pesquisa.

4.1 Abordagem qualitativa

Este trabalho foi fundamentado na abordagem qualitativa, com a utilização de diversos


autores que de certa forma trazem conceituações bastante ricas e esclarecedoras sobre o
assunto. Martin W. Bauer e George Gaskell (2008, p. 23) trazem alguns apontamentos acerca
da abordagem qualitativa “Em contraste, a pesquisa qualitativa evita números, lida com
interpretações das realidades sociais, e é considerada pesquisa soft. O protótipo mais
conhecido é, provavelmente, a entrevista em profundidade”. Entende-se aqui que a abordagem
qualitativa lida com o fator social, buscando a interpretação sobre diversas situações que
acontecem na sociedade. Como o meu trabalho é voltado para minha percepção e para a
percepção das professoras se encaixa perfeitamente nesse tipo de abordagem, na qual posso
identificar minhas opiniões e as opiniões das professoras e a partir disso analisar os
apontamentos e questionamentos sobre a identidade docente.
Outros autores que também estudam essa abordagem são Robert C. Bodgan e Sari
Knopp Biklen (1994) que trazem alguns apontamentos que se encaixam muito bem com o que
estou buscando nessa pesquisa, vejamos essa citação:

Utilizamos a expressão investigação qualitativa como um termo genérico que


agrupa diversas estratégias de investigação que partilham determinadas
características. Os dados recolhidos são designados por qualitativos, o que
significa ricos em pormenores descritivos relativamente a pessoas, locais e
conversas, e de complexo tratamento estatístico. (BODGAN; BIKLEN, 1994,
p. 16).
45

A abordagem qualitativa busca a interpretação do sujeito sobre aquele determinado


conteúdo, e a partir das implicações feitas pelo sujeito é que o pesquisador começa a ter certos
resultados na sua pesquisa, por exemplo: questionamentos sobre o tema, críticas, relatos e
opiniões. Por isso se caracteriza como um ato de investigação, o pesquisador irá buscar
respostas sobre aquilo que lhe inquieta e precisa entrar a fundo no tema, tornando assim esse
processo um dos mais importantes dentro da abordagem qualitativa, pois é a partir dele que a
pesquisa toma um rumo, por isso deve-se ter o cuidado tanto na escolha dos sujeitos, quanto
nos questionamentos feitos ao próprio. A história de vida de formação também faz parte da
abordagem qualitativa, pois nos mostra relatos e interpretações sobre diversos momentos que
aquele sujeito viveu em sua vida.
4.2 Escolas e sujeitos

Minha pesquisa será realizada com duas pedagogas que atuam na Educação Básica
numa escola pública do município de Limoeiro do Norte/CE. Primeiramente, escolhi essas
professoras porque foi na escola onde elas trabalham que tive a experiência e a oportunidade
de estagiar como residente no programa RP. Foi nessa escola que aprendi a fazer um plano de
aula, a organizar materiais para trabalhar nas aulas. Foi lá onde tive o prazer de ministrar
minhas aulas nas turmas de 5° ano, então já tenho uma certa intimidade tanto com o corpo
docente quanto com o núcleo gestor.
Essas pedagogas acompanharam todo o meu processo como estagiário no programa
RP. Tenho muita gratidão e honra em ter trabalhado com elas, e estou muito contente pela
participação delas no meu trabalho, a contribuição delas no meu processo de formação foi algo
que guardo com muito apreço tanto nas minhas memórias quanto no meu coração.
A escola na qual as participantes da pesquisa atuam é uma escola do Ensino
Fundamental II, que engloba do 5° ao 9° ano. Uma escola bastante grande que acolhe alunos
de várias comunidades das zonas rurais, então a população é bastante diversificada.

4.3 Metodologia da História de vida de formação

No meu trabalho, trago também a história de vida de formação. Percebo como sendo de
extrema relevância o olhar sobre sua própria trajetória, como eu me constitui como ser
humano, como estou me constituindo como docente. Poder refletir sobre tudo aquilo que vivi
durante
46

minha vida que, de alguma maneira, influenciou no que eu sou hoje, as situações vividas, o
diálogo com as pessoas, as batalhas enfrentadas, tudo isso me constituiu. Esses momentos e as
pessoas são muito importantes e devem ser sempre lembrados, pois fazem parte da minha
história.

O trabalho de pesquisa a partir de narração das histórias de vida ou, melhor


dizendo, de histórias centradas na formação, efetuado na perspectiva de
evidenciar e questionar as heranças, a continuidade e a ruptura, os projetos de
vida, os múltiplos recursos ligados às aquisições de experiência, etc., esse
trabalho de reflexão a partir da narrativa da formação de si (pensando,
sensibilizando-se, imaginando, emocionando-se, apreciando, amando)
permite estabelecer a medida das mutações sociais e culturais nas vidas
singulares e relacioná-las com a evolução dos contextos de vida profissional e
social. As subjetividades exprimidas são confrontadas à sua frequente
inadequação a uma compreensão libertadora de criatividade em nossos
contextos de mutação. O trabalho sobre essa subjetividade singular e plural
torna-se uma das prioridades da formação em geral e do trabalho de narração
das histórias de vida em particular (JOSSO, 2007, p. 414-415).

A história de vida de cada indivíduo é algo que está estreitamente ligado à sua
identidade, é algo que não pode ser desvinculado. A autora Josso (2007) nos mostra a relação
do fator social e profissional, fazendo com que se tenha noção que a história de vida é algo que
perpassa por diversas áreas, que existem diversos fatores ligados. Quando um indivíduo inicia
uma carreira profissional, ele já traz consigo uma bagagem que tem: conhecimentos, vivências,
experiências, amor e diversos sentimentos. Durante uma trajetória de vida, o ser humano passa
por diversas situações e provações que o deixam forte e também que o deixam fraco. Isso é
normal, ele está em construção. Então, o que quero mostrar, trazendo a história de vida de
formação, são justamente as experiências, os conhecimentos, os sentimentos que me
constituíram como sujeito, olhando para o passado e podendo identificar minha trajetória,
então acho de suma importância trazer esses apontamentos na minha pesquisa.
A história de vida é algo que influencia diretamente em seu futuro, pois o faz tomar
algumas decisões que lhe foram instruídas lá atrás, ajudando, assim, na sua própria formação
profissional. Elizeu Clementino de Souza (2004) ressalta sobre esse processo de vivência
escolar:
A compreensão das implicações pessoais e das marcas construídas na
trajetória individual, através de relatos escritos sobre a aprendizagem
pessoal e coletiva na profissão com base na vivência escolar, revela
se como um fértil exercício de formação e de pesquisa, na medida em
que possibilita ao sujeito em formação compreender-se como autor e
ator do seu percurso formativo. (SOUZA, 2004, p. 26-27).
47

Compreender sua história de formação é algo que justifica aquilo que você conquistou
ao longo de sua vida. É uma forma de reconhecer e ter consciência da importância de tudo
aquilo que lhe foi conquistado durante a sua formação e perceber os fatores que implicaram
para que você conseguisse chegar ali. Por isso, que no começo do meu trabalho trago minha
história de vida de formação, pois é de suma importância entender de onde vim, e
compreender como me constitui como pessoa, tudo que eu vivi influenciou de certa forma na
minha vida, e reconhecer isso é um ato de reconectar-me comigo mesmo, com as minhas
aprendizagens, estabelecendo diálogo com as teorias estudadas e com as experiências vividas,
podendo ressignificá-las, aprender com elas e acho de suma importância trazer essas vivências
para minha pesquisa.
A história de vida de formação nos apresenta uma visão bastante ampla sobre o
processo de aprendizagem. Durante a nossa trajetória, vamos aprendendo com o passar do
tempo, aprendizado esse que nos formou como pessoa e que nos ajuda a tomar decisões que
irão influenciar durante o percorrer de nossas vidas. Nossa história também compõe nossa
identidade, que foi se construindo ao longo do tempo e que possibilita uma evolução,
proporcionado pelas transformações que vivenciamos durante a nossa caminhada.

É por isso que todo projeto de formação cruza, à sua maneira e nas palavras
de seu autor, com a temática da existencialidade associada à questão
subseqüente da identidade (identidade para si, identidade para os outros). Um
dispositivo de formação que, por pouco que seja, integre a reflexão sobre esse
projeto, a partir, por exemplo, de uma análise de histórias de vida dos
aprendentes, pode, desse modo, ver aflorar e penetrar nas preocupações
existenciais dos aprendentes adultos. Assim, a questão do sentido da
formação, vista através do projeto de formação, apresenta-se como uma voz
de acesso às questões de sentido que hoje permeiam os atores sociais, seja no
exercício de sua profissão - eles se assumem como porta-vozes dos problemas
dos grupos sociais com os quais operam-, seja nas vivências questionadas e
questionadoras de sua própria vida (JOSSO, 2007, p. 414).

A história de vida de formação também é ciência, ela pode ser estudada e analisada,
tendo a compreensão que ela faz parte da construção e formação de um ser humano, ser
humano esse que traz uma trajetória de conhecimentos e aprendizados adquiridos e que são
relevantes. Podem ser usados como instrumento de pesquisa, pois, quando se fala em
identidade, se fala em construção, uma construção de um ser que vive sua vida e tem história
para contar e refletir sobre o que viveu durante sua própria caminhada e, também, aprender
com isso.
Narrar sua história de vida é um ato de libertação e de pertencimento, demonstrando suas
subjetividades, seus aprendizados permitindo o acesso das pessoas dentro do seu contexto de
vida. Minha pesquisa se encaixa perfeitamente nesse contexto aqui colocado, pois ao ter
48

acesso à história de vida de formação das professoras participantes do meu trabalho, quero
compreender como aconteceu essa construção como pessoa e como profissional, que fatores
influenciaram para que elas se tornassem o que são hoje, e isso é de extrema importância para
entender o processo de identidade docente que busco em meu trabalho. Além disso, conhecer o
percurso dessas professoras também me auxilia nas reflexões e aprendizados de meu próprio
percurso.
Sobre a experiência, Larrosa (2002) diz que:

Trata-se, porém, de uma passividade anterior à oposição entre ativo e passivo,


de uma passividade feita de paixão, de padecimento, de paciência, de atenção,
como uma receptividade primeira, como uma disponibilidade fundamental,
como uma abertura essencial (LARROSA, 2002, p. 24).

A experiência é algo que mexe com o passado, podendo assim ser encontrados
elementos que influenciam diretamente em sua identidade. A partir do momento que se
encontra essa identidade, mesmo ela podendo estar em constante aprimoramento, em
constante vir-a-ser, podemos adentrar na área profissional, identificando assim elementos que
interferem no seu agir como profissional, constituindo-se assim sua identidade docente. A
docência é uma fase na qual se acumula muitas experiências, durante sua trajetória pessoal e
profissional, ou seja, o que você viveu reflete nas suas ações profissionais.

4.4 Entrevista Narrativa

Outro instrumento de pesquisa qualitativa que irei utilizar é a EN, que também é um
processo voltado ao ato de narrar histórias, mas pela pessoa que é entrevistada. Martin W.
Bauer e George Gaskell (2008) explicam que:
Ela é considerada uma forma de entrevista não estruturada, de profundidade,
com características específicas. Conceitualmente, a ideia da entrevista
narrativa é motivada por uma crítica do esquema pergunta-resposta da maioria
das entrevistas. No modo pergunta-resposta, o entrevistador está impondo
estruturas em um sentido de tríplice: a) selecionando o tema e os tópicos; b)
ordenamento as perguntas; c) verbalizando as perguntas com sua própria
linguagem (BAUER; GASKELL, 2008, p. 95)

Aqui podemos identificar um pouco como a EN é feita. O elemento que a diferencia


dos outros tipos de entrevista é simplesmente o fato do entrevistado ter mais liberdade quando
for falar sobre o tema, sem ter uma estrutura fixa tendo que obedecer a aquilo que o
entrevistador quer, como acontece em um roteiro de entrevista estruturado ou
semiestruturado. O
49

entrevistador deixa o entrevistado narrar sua história livremente, sem interrupções. Cabe
ressaltar que o entrevistado irá falar a partir da indicação de tema/assunto ou pergunta inicial
que lhe for apresentado pelo entrevistador. O objetivo aqui é claro, deixar o entrevistado à
vontade durante a entrevista, fazendo com que ele se sinta confortável para narrar sua história,
deixando a conversa fluir livremente.

Para conseguir uma versão menos imposta e por isso mais “válida” da
perspectiva do informante, a influência do entrevistador deve ser mínima e um
ambiente deve ser preparado para se conseguir esta minimização da influência
do entrevistador. A EN vai mais além que qualquer outro método ao evitar uma
pré-estruturação da entrevista baseado em pergunta-resposta. Ela emprega um
tipo específico de comunicação cotidiana, o contar e escutar história, para
conseguir esse objetivo. (BAUER; GASKELL, 2008, p. 95)

Mas para que a EN possa ser realizada há um esquema de narração, que é:

O esquema de narração substitui o esquema pergunta-resposta que define a


maioria das situações de entrevista. O pressuposto subjacente é que a
perspectiva do entrevistado se revela melhor nas histórias onde o informante
está usando sua própria linguagem espontânea na narração dos
acontecimentos. (BAUER; GASKELL, 2008, p. 95-96)

Então, como eu já havia comentado anteriormente, a EN proporciona ao entrevistado


essa liberdade, na qual se pode usar sua própria linguagem sem nenhum receio e sem nenhuma
preocupação. Mesmo contendo uma certa liberdade, a EN também possui regras e
procedimentos a serem seguidos. Vejamos como acontece todo esse processo a partir do que
propõem os autores Bauer e Gaskell (2008), sistematizado no quadro 1 a seguir:

Quadro 1 – Etapas, regras e procedimentos da EN


1. Iniciação O contexto da investigação é explicado em termos amplos ao informante.
Deve-se pedir a ele a permissão para se gravar a entrevista. Gravar é
importante para se poder fazer uma análise adequada posteriormente. O
procedimento da EN é então brevemente explicado ao informante: a
narração sem interrupções, a fase de questionamento e assim por diante.
Na fase de preparação da EN, um tópico para narração já foi identificado.
Deve-se ter em mente que o tópico inicial representa os interesses do
entrevistador. Para ajudar na introdução do tópico inicial, podem ser
empregados recursos visuais. Uma linha do tempo, representando
esquematicamente o começo e o fim do acontecimento em questão, é um
exemplo possível. O narrador, neste caso, irá enfrentar o problema de
segmentar o tempo entre o começo e o fim da história.
A introdução do tópico central da EN deve deslanchar o processo de
narração. A experiência mostra que, a fim de eliciar uma história que
possa

50
ir adiante, várias regras podem ser empregadas como orientações para
formular o tópico inicial:
● O tópico inicial necessita fazer parte da experiência do informante.
Isso irá garantir seu interesse, e uma narração rica em detalhes. ● O
tópico inicial deve ser de significância pessoal e social, ou
comunitária.
● O interesse e o investimento do informante no tópico não devem ser
mencionados. Isso é para evitar que se tomem posições ou se
assumam papéis já desde o início.
● O tópico deve ser suficientemente amplo para permitir ao
informante desenvolver uma história longa que, a partir de
situações iniciais, passando por acontecimentos passados, leve à
situação atual.
● Evitar formulações indexadas. Não referir datas, nomes ou lugares.
Esses devem ser trazidos somente pelo informante, como parte de
sua estrutura relevante.

2. Narração central Quando a narração começa, não deve ser interrompida até que haja
uma clara indicação (“coda”), significando que o entrevistado se
detém e dá sinais de que a história terminou. Durante a narração, o
entrevistador se abstém de qualquer comentário, a não ser sinais não
verbais de escuta atenta e encorajamento explícito para continuar a
narração. O entrevistador pode, contudo, tomar notas ocasionais
para perguntas posteriores, se isto não interferir com a narração.
Restrinja-se à escuta ativa, ao apoio não verbal ou paralinguístico,
e mostrando interesse (“hmm”, “sim”, “sei”). Enquanto escuta,
pergunte-se mentalmente, ou escreva no papel, as perguntas para a
próxima fase da entrevista.
Quando o informante indica coda no final da história, investigue
por algo mais: “É tudo que gostaria de contar?” Ou “Haveria ainda
alguma coisa que você gostaria de dizer?”.
3. Fase de Quando a narração chega a um fim “natural”, e o entrevistador
perguntas inicia a fase de questionamento. Este é o momento em que a escuta
do entrevistador produz seus frutos. As questões exmanentes do
entrevistador são traduzidas em questões imanentes, com o emprego
da linguagem do informante, para completar as lacunas da história.
A fase de questionamento não deve começar até que o
entrevistador comprove com clareza o fim da narrativa central. Na
fase de questionamento, três etapas básicas se aplicam:
● Não faça perguntas do tipo “por quê”; faça apenas perguntas
que se refiram aos acontecimentos, como: “O que aconteceu
antes/depois/então?” Não pergunte diretamente sobre
opiniões, atitudes ou causas, pois isto convida a
justificações e racionalizações. Toda narrativa irá incluir
determinadas justificações e racionalizações; contudo, é
importante não investigá-las, mas ver como elas aparecem
espontaneamente.
● Pergunte apenas questões imanentes, empregando somente as
palavras do informante. As perguntas se referem tanto aos
acontecimentos mencionados na história, quanto a tópicos
do projeto de pesquisa. Traduza questões emanentes em
questões imanentes.

51
● Para evitar um clima de investigação detalhada, não aponte
contradições na narrativa. Esta é também uma precaução
contra investigar a racionalização, além da que ocorre
espontaneamente.
A fase de questionamento tem como finalidade eliciar material
novo e adicional além do esquema autogerador da história. o
entrevistador pergunta por maior “textura concreta” e “fechamento
da Gestalt”, mantendo-se dentro de regras.
As fases 1, 2 e 3 são gravadas para transcrição literal, com o
consentimento dos informantes.

4. Fala conclusiva No final da entrevista, quando o gravador estiver desligado, muitas


vezes acontecem discussões interessantes na forma de comentários
informais. Falar em uma situação descontraída, depois do “show”,
muitas vezes traz muita luz sobre as informações mais formais
dadas durante a narração. Esta informação contextual se mostra, em
muitos casos, muito importante para a interpretação dos dados, e
pode ser crucial para a interpretação contextual das narrativas do
informante.
Durante esta fase, o entrevistador pode empregar questões do tipo
“por quê” Isto pode ser uma porta de entrada para a análise
posterior, quando as teorias e explicações que os contadores de
histórias têm sobre si mesmos (“eigentheories”) se tornam o foco
de análise. Além do mais, na última fase, o entrevistador pode
também estar em uma posição de avaliar o nível de (des)confiança
percebido no informante, o que se constitui em uma informação
importante para a interpretação da narração no seu contexto.
A fim de não perder esta importante informação, é aconselhável ter
um diário de campo, ou um formulário especial para sintetizar os
conteúdos dos comentários informais em um protocolo de memória,
imediatamente depois da entrevista. Se alguém organiza uma série
de EN, é útil planejar o tempo entre as entrevistas para escrever os
comentários informais e outras impressões.
Fonte: Elaborado pelo autor a partir de informações de Bauer e Gaskell (2008, p. 98-100).

Como instrumentos para me auxiliar na pesquisa, utilizei o diário de campo que me


acompanha desde o começo do meu trabalho, onde guardo todas as informações necessárias
para o desenvolvimento do meu estudo. Khaoule e Carvalho (2013) relatam:

Devemos considerar que a escrita é o instrumento chave para qualquer


pesquisa. Desenvolver as competências e habilidades de/para escrita, portanto,
é quase uma condição essencial para o pesquisador. Nesse sentido, o diário de
campo se mostra como um instrumento fundamental, pelas inúmeras
possibilidades que oferece (KHAOULE; CARVALHO, 2013, p. 275).

A utilização do diário de campo precisa ser cotidianamente, pois sua função é de ajudar
o pesquisador a não se perder, e seguir sua caminhada de escrita de forma coesa tendo uma
52

ligação da teoria com as informações do objeto de estudo. Além disso, é um instrumento de


registro de tudo, das dúvidas, questões, insights, leituras, observações, entre outros processos.
Será feita a gravação das entrevistas narrativas realizadas, com a devida autorização das
participantes. Como recursos de coleta de dados, utilizei o Google Meet que é uma ferramenta
de comunicação síncrona para realizar a entrevista narrativa, por meio de chamadas de áudio e
vídeo, pois estávamos em pandemia por conta da Covid-19 e, para segurança de todos, foi
melhor nos resguardar e manter o distanciamento. Também utilizei o TCLE, que foi enviado
com antecedência para as professoras por e-mail e, depois de assinado pelas participantes,
iniciei minha pesquisa e obtenção dos dados e proceder, assim, à análise do conteúdo das
entrevistas.
Minha pergunta inicial para as professoras está totalmente ligada aos meus objetivos e
ao foco do meu trabalho que é a identidade docente. Sendo assim, a pergunta sugerida é a
seguinte: relate-me sobre sua história de vida de formação... Como você se tornou
professora? Pode trazer suas memórias desde a infância...
Mediante essa pergunta compreendo que posso chegar aos meus objetivos, como
esclarece Larrosa (2002, p. 25) “A experiência é em primeiro lugar um encontro ou uma
relação com algo que se experimenta, que se prova”. A experiência trazida por essas
professoras se caracteriza como uma construção, formando assim sua identidade docente. Em
relação a entrevista irei seguir as etapas estabelecidas no quadro 1 detalhado acima.

4.5 Análise de Conteúdo

Para analisar as entrevistas realizadas, será utilizada a Análise de Conteúdo, assim


definida por Laurence Bardin (1977):
[...] Um conjunto de instrumentos metodológicos cada vez mais subtis em
constante aperfeiçoamento, que se aplicam a discursos (conteúdos e
continentes) extremamente diversificados. O factor comum destas técnicas
múltiplas e multiplicadas - desde o cálculo de frequências que fornece dados
cifrados, até a extracção de estruturas traduzíveis em modelos - é uma
hermenêutica controlada, baseada na dedução: a inferência. Enquanto esforço
de interpretação, a análise de conteúdo oscila entre os dois pólos do rigor, da
objectividade e da fecundidade da subjectividade. (BARDIN, 1977, p. 9).

A Análise de Conteúdo apresenta algumas fases de organização, se caracterizam em


três pólos cronológicos: a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados,
a
53

inferência e a interpretação. Vejamos como Bardin (1977) define essas etapas, a partir do
Quadro 2:

Quadro 2 – Etapas da Análise de Conteúdo


A Pré-análise É a fase de organização propriamente dita. Corresponde a um
período de intuições, mas, tem por objectivo tornar operacionais
e sistematizar as ideias iniciais, de maneira a conduzir a um
esquema preciso de desenvolvimento das operações sucessivas,
num plano de análise. Recorrendo ou não ao ordenador, trata-se
de estabelecer um programa que, podendo ser flexível (quer
dizer, que permita a introdução de novos procedimentos no
decurso da análise), deve, no entanto, ser preciso.
Geralmente, esta primeira fase possui três missões: a escolha dos
documentos a serem submetidos à análise, a formulação das
hipóteses e dos objectivos e a elaboração de indicadores que
fundamentam a interpretação final.
A pré-análise tem por objectivo a organização, embora ela
própria seja composta por actividades não estruturadas, abertas,
por oposição à exploração sistemática dos documentos.
a) A leitura flutuante - A primeira actividade consiste em
estabelecer contacto com os documentos a analisar e em
conhecer o texto deixando-se invadir por impressões e
orientações. Esta fase é chamada de leitura flutuante, por
analogia com a atitude do psicanalista. Pouco a pouco, a
leitura vai-se tornando mais precisa, em função de
hipóteses emergentes, da projecção de teorias adaptadas
sobre o material e da possível aplicação de técnicas
utilizadas sobre materiais análogos.
b) A escolha dos documentos - O universo de documentos
de análise pode ser determinado a priori: por exemplo: o
objectivo é seguir a evolução dos valores da instituição
escolar francesa durante um determinado ano. Opta-se
então pela análise dos discursos de distribuição dos
prémios: material homogêneo, regular,
conservado, acessível e rico em informações
relativamente ao
objectivo.
c) A formulação das hipóteses e dos objectivos - Uma
hipótese é uma afirmação provisória que nos propomos
verificar (confirmar ou infirmar), recorrendo aos
procedimentos de análise. Trata-se de uma suposição cuja
origem é a intuição e que permanece em suspenso
enquanto não for submetida à prova de dados seguros.
O objectivo é a finalidade geral a que nos propomos (ou
que é fornecida por uma instância exterior), o quadro
teórico e/ou pragmático, no qual os resultados obtidos
serão utilizados.
d) A referenciação dos índices e a elaboração de indicadores.

54
- Se se considerarem os textos como uma manifestação
contendo índices que a análise vai fazer falar, o trabalho
preparatório será o da escolha destes - em função das
hipóteses, caso elas estejam determinadas - e sua
organização sistemática em indicadores.
e) A preparação do material. - Antes da análise
propriamente dita, o material reunido deve ser preparado.
Trata-se de uma preparação material e, eventualmente,
de uma preparação formal.
A preparação formal, ou edição, dos textos, pode ir desde
o alinhamento dos enunciados intactos, proposição por
proposição, até à transformação linguística dos
sintagmas, para standartização e classificação por
equivalência.

A Exploração do Se as diferentes operações da pré-análise foram


Material convenientemente concluídas, a fase de análise propriamente
dita não é mais do que a administração sistemática das decisões
tomadas. Quer se trate de procedimentos aplicados manualmente
ou de operações efectuadas pelo ordenador, o decorrer do
programa completa-se mecanicamente. Esta fase, longa e
fastidiosa, consiste essencialmente de operações de codificação,
desconto ou enumeração, em função de regras previamente
formuladas.

Tratamento dos Os resultados brutos são tratados de maneira a serem


resultados obtidos significativos (falantes) e válidos. Operações estatísticas simples
e interpretação (percentagens), ou mais complexas (análise factorial), permitem
estabelecer quadros de resultados, diagramas, figuras e modelos,
os quais condensam e põem em relevo as informações
fornecidas pela análise.
Para um maior rigor, estes resultados são submetidos a provas
estatísticas, assim como a testes de validação.
O analista, tendo à sua disposição resultados significativos e
fiéis, pode então propor inferências e adiantar interpretações a
propósito dos objectivos previstos, ou que digam respeito a
outras descobertas inesperadas.
Por outro lado, os resultados obtidos, a confrontação sistemática
com o material e o tipo de inferências alcançadas, podem servir
de base a uma outra análise disposta em torno de novas
dimensões teóricas, ou praticada graças a técnicas diferentes.

Fonte: Elaborado pelo autor a partir de informações de Laurence Bardin (1977, p. 95-101).

Como minha pesquisa é de abordagem qualitativa, o objetivo da Análise de Conteúdo, no meu


trabalho, é proporcionar um direcionamento me auxiliando na: compreensão das narrativas
realizadas, categorizando os temas identificados dentro da história de vida das professoras.
Permitiu-me encontrar seus pontos de convergência e de divergência, identificando
55

os principais elementos que compõem suas trajetórias de vida e os elementos constituintes da


identidade docente das entrevistadas. Esta técnica de análise visa contribuir na interpretação da
fala das participantes, buscando detalhar e analisar o conteúdo nas narrativas, podendo assim
também fazer conexões com a fundamentação teórica deste estudo, tecendo as discussões na
próxima seção deste trabalho.

4.5.1 Categorização
Utilizar a categorização auxilia na organização e na análise das entrevistas,
identificando dentro das entrevistas categorias importantes que existem na história de vida de
formação das entrevistadas. Bardin (1977) esclarece:

A categorização é uma operação de classificação de elementos constitutivos


de um conjunto, por diferenciação e, seguidamente, por reagrupamento
segundo o gênero (analogia), com os critérios previamente definidos. As
categorias são rubricas ou classes, as quais reúnem um grupo de elementos
(unidades de registro, no caso da análise de conteúdo) sob um título genérico,
agrupamento esse efectuado em razão dos caracteres comuns destes
elementos. O critério de categorização pode ser semântico (categorias
temáticas: por exemplo, todos os temas que significam a ansiedade, ficam
agrupados na categoria ansiedade, enquanto que os que significam a
descontracção, ficam agrupados sob o título conceptual descontracção),
sintático (os verbos, os adjectivos), léxico (classificação das palavras segundo
o seu sentido, com emparelhamento dos sinónimos e dos sentidos próximos)
e expressivo (por exemplo, categorias que classificam as diversas
perturbações da linguagem). (BARDIN, 1977, p. 117-118).

Podemos identificar a necessidade de utilizar a categorização para analisar as


entrevistas, utilizar categorias dentro dos temas mais importantes percebidos dentro da história
de vida de formação das pedagogas entrevistadas me ajudaram a identificar e a compreender
os elementos constitutivos de suas jornadas e de suas identidades docentes.
Após realizada a entrevista narrativa foram identificadas algumas categorias nas
narrativas das professoras, elas são: família, escola na infância e na adolescência, igreja
católica, formação, experiências profissionais, política e luta, relações extrassala de aula e
educador Paulo Freire.
Cada categoria foi definida a partir da história de vida de formação das professoras, na
qual foram debatidas e explicadas na seção de Resultados e discussões.
56

5 RESULTADOS E DISCUSSÕES

As entrevistas narrativas foram realizadas, seguindo o passo a passo descrito


anteriormente no tópico de metodologia. Essa seção irá tratar dos resultados obtidos abarcando
a caracterização das entrevistadas, a análise de conteúdo das entrevistas realizadas, tendo
referência teórica a proposta de Análise de Conteúdo de Bardin (1977). Para tanto, realizamos
a leitura flutuante, a categorização das entrevistas e as inferências com o diálogo teórico.

5.1 Sobre a realização das entrevistas

A primeira entrevista foi realizada com a Professora 1 na data 05 de agosto de 2021 às


18:30 horas, 1 hora e 37 minutos de duração. A Professora estava bastante empolgada e
demonstrava bastante entusiasmo em participar da entrevista.
Essa entrevista foi bastante empolgante, pude perceber que os temas fluíram de uma
forma bastante leve e que a Professora busca sempre um mundo melhor, tentando transformar
sua realidade e ajudando no desenvolvimento dos seus alunos. Acho lindo quando ela fala das
lutas nas ruas em busca de melhores condições de trabalho para os professores, se todos
tivessem essa força de vontade iríamos conseguir muitos avanços e melhorias para a educação.
A segunda entrevista foi realizada com a Professora 2 na data 18 de agosto de 2021 às
14:00 horas, 45 minutos de duração. A Professora estava muito feliz pelo convite e se mostrou
bastante determinada em contar a sua história de vida de formação.

5.2 Caracterização das entrevistadas

As participantes da minha pesquisa foram escolhidas pelo fato de terem trabalhado


comigo num projeto muito importante em minha vida, a RP. Vivenciei essa experiência
juntamente com elas e estudar a história de vida de formação delas foi algo que me instigou e
fiquei bastante curioso em descobrir quais aspectos influenciam-nas a se tornarem professoras.
Foram duas professoras da Educação Básica de Limoeiro do Norte/CE.
A Professora 1 é do sexo feminino, tem 44 anos de idade, é formada em Pedagogia,
trabalha há 23 anos na educação da cidade de Limoeiro do Norte/CE numa escola pública na
qual trabalha há 5 anos e, atualmente é aluna do mestrado em educação, atualmente leciona
nos 5° anos.
57

A Professora 2 é do sexo feminino, tem 52 anos de idade, é formada em Pedagogia,


trabalha há 21 anos na educação da cidade de Limoeiro do Norte/CE numa escola pública na
qual trabalha há 12 anos, atualmente leciona nos 5°anos.

5.3 Análise do conteúdo das entrevistas narrativas realizadas

Após a transcrição das entrevistas narrativas realizadas e a leitura flutuante das


transcrições, foi feita a análise de conteúdo. Sendo assim, foram identificadas as seguintes
categorias constituintes da história de vida de formação das professoras participantes: família,
escola na infância e na adolescência, igreja católica, formação, experiências profissionais,
política e luta, relações extrassala de aula e educador Paulo Freire.

Categoria Família:

A categoria aparece de forma bastante presente na vida das professoras, se caracteriza


como um: apoio, cuidado, afeto, carinho, incentivo familiares, de pais e mães. Mostra a força
que a família tem dentro da história de vida de formação dessas professoras, sendo uma base
de apoio desde o início, procurando sempre incentivar para o estudo, fazendo com que elas
nunca desistam dos seus sonhos. Diante desse assunto Acosta e Vitale (2003) afirma:
Partimos, então, da idéia que a família se delimita simbolicamente, baseada
num discurso sobre si própria, que opera como um discurso oficial. Embora
culturalmente instituído, ele comporta uma singularidade: cada família
constrói sua própria história, ou seu próprio mito, entendido como uma
formulação discursiva em que se expressam o significado e a explicação da
realidade vivida, com base nos elementos objetiva e subjetivamente acessíveis
aos indivíduos na cultura em que vivem. (ACOSTA; VITALE, 2003, p. 26-
27).

Perante essa citação o vínculo estabelecido dentro de uma família proporciona


interações que durarão de certa forma durante toda uma vida, se baseia numa construção de
relações e de confiança. Por isso, a influência da família é importante em todos os sentidos, na
vida pessoal, profissional, amorosa, o apoio recebido pela família é algo repassado de geração
para geração, é um ciclo extremamente necessário durante a trajetória de vida.
A Professora 1 citou a importância da sua família no início de sua caminhada, que, em
suas palavras: “Minha base familiar me ajudou muito desde o início, sempre tive incentivo em
estudar e em querer ser alguém na vida” (Professora 1). Nessa fala, podemos identificar o
58

quanto a base familiar ajuda no processo de formação do ser humano. O apoio familiar se
mostrou como algo indispensável dentro de um contexto de história de vida de formação desta
professora.
A Professora 2 também citou sobre a importância da família, aqui representada pela figura da
mãe: “Minha mãe sempre me incentivou muito a estudar, por ser a segunda mais velha em
relação às minhas irmãs eu sempre ensinava as tarefas para as mais novas” (Professora 2).
Ela também relatou a relação do trabalho doméstico, na qual ela citou uma situação
que aconteceu nesse período: “Nessa fase, começou a surgir pessoas atrás de mim para ir
trabalhar em casas como doméstica, mas minha mãe não permitiu, disse que era para mim
estudar, sempre na minha casa estudar era prioridade” (Professora 2). Percebemos que o foco
na educação era algo bastante sério dentro da sua casa, a mãe dela não permitia que ela saísse
para trabalhar e sim que ela estudasse.
Para esta Professora, também o fato de, desde pequena, ensinar suas irmãs foi um
incentivo maior para que ela quisesse estudar, então sua mãe sempre quis que todas as suas
filhas estudassem, buscando assim um futuro bom. Acosta e Vitale refletem (2003) que:

Pensar a família como uma realidade que se constrói pelo discurso sobre si
própria, internalizado pelos sujeitos, é uma forma de buscar uma definição que
não se antecipe à sua própria realidade, mas que nos permita pensar como ela
se constrói, constrói sua noção de si, supondo evidentemente que isto se faz
em cultura, dentro portanto, dos parâmetros coletivos do tempo e do espaço
em que vivemos, que ordenam as relações de parentesco (entre irmãos, entre
pais e filhos, entre marido e mulher). Sabemos que não há realidade humana
exterior à cultura, uma vez que os seres humanos se constituem em cultura,
portanto, simbolicamente. (ACOSTA; VITALE, 2003, p. 27).

A relação familiar é construída por meio de valores, valores esses passados ao longo do
tempo, pelos quais são compartilhados: experiências, histórias, sentimentos entre outros. Tudo
isso é tecido culturalmente, cultura essa vinda dos nossos ancestrais, então a construção de um
ser humano parte da cultura, daquilo que foi lhe ensinado durante toda a sua trajetória de vida
e é algo que deve ser valorizado e repassado, pois é uma forma de deixar viva todos os
ensinamentos adquiridos.

Categoria Escola na infância e na adolescência:

A escola é uma categoria muito importante na trajetória dessas professoras, o vínculo


estabelecido por elas dentro deste espaço e com os profissionais da educação presentes é algo
muito profundo, por meio do qual elas falam com muita propriedade. As experiências, que elas
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adquiriram trabalhando e estudando dentro da escola, são situações que elas trazem dentro de
sua trajetória que envolve: dedicação, amor, persistência, resistência, entre outros aspectos.
Lück (2009) nos mostra:

O objetivo maior da comunidade educacional revela-se, portanto, o de


estabelecer uma comunidade de ensino efetivo, onde preserve, coletivamente,
não somente o ideal de ensinar de acordo com o saber produzido socialmente,
mas o de aprender, em acordo com os princípios de contínua renovação de
conhecimento, criando-se um ambiente de contínuo desenvolvimento para
alunos, professores, funcionários e é claro, os gestores. O conhecimento da
realidade ganha novas perspectivas: a organização do projeto político
pedagógico da escola e o seu currículo; o papel da escola e o desempenho de
seus profissionais, que devem renovar-se e melhorar sua qualidade
continuamente, tendo o aluno como centro de toda a sua atuação. (LÜCK,
2009, p. 16).

A citação nos mostra que a escola precisa ser um lugar onde os alunos possam se
desenvolver sem pressão, a educação deve ser compartilhada de forma que busque a reflexão
do aluno, precisa promover o acolhimento, fazendo com que o desenvolvimento do aluno
aconteça e que ele veja sentido naquilo que está sendo ensinado. A escola deve garantir o
aprendizado do aluno, mas que esse aprendizado seja de forma consciente e inspiradora, que
ele possa se reconhecer diante daquilo lhe apresentado, podendo a partir disso evoluir e
começar a colher os seus próprios frutos.
A Professora 1 inicialmente citou que sua identidade docente foi construída desde sua
infância. Como ela entrou na escola cedo com 3 anos de idade, a escola sempre fez parte de
sua vida, desde sua infância até a fase adulta, estabelecendo aquele local como sendo um local
de aprendizagens e experiências. Ao relatar sua relação com a escola, a Professora 1 disse: “É
muito forte meu convívio com a escola, desde os meus 3 anos até os 44 anos, eu nunca me
ausentei um ano de dentro de uma escola”.
A Professora 2 esclareceu sua relação com a escola: “Por ser de família carente, as
freiras tiveram dó de mim e da minha irmã mais velha, aí ganhamos uma bolsa para estudar
com as freiras, então até o 5° ano eu e minha irmã, mas estudamos com bolsa nessa escola”
(Professora 2). A Professora 2 detalha alguns aspectos das vivências dentro da escola: “Nós
éramos as pobres da escola, nosso material era bem diferente dos outros colegas, mas isso
nunca influenciou em nada na minha vida, sabia que estava ali para estudar” (Professora 2).
Aqui identificamos a dedicação e força de vontade da Professora 2 que mesmo com
dificuldades, ela e sua irmã conseguiram uma bolsa de estudos, então, dentro desse contexto
escolar, já identificamos diferenças decorrentes do poder aquisitivo, sendo de família carente
60

as oportunidades, muitas vezes, não vem, o governo devia intervir e proporcionar uma
qualidade melhor na educação da nossa população.
Mesmo com todas essas dificuldades observamos que com muito empenho se chega
longe. Lück (2009) afirma que:

A educação é um processo organizado, sistemático e intencional, ao mesmo


tempo em que é complexo, dinâmico e evolutivo, em vista do que demanda
não apenas um grande quadro funcional, como também a participação da
comunidade, dos pais e de organizações diversas, para efetivá-lo com a
qualidade necessária que a sociedade tecnológica da informação e do
conhecimento demanda. (LÜCK, 2009, p. 19).

A educação deve ter o total apoio dos pais, da escola e da comunidade inserida, deve-se
ter a compreensão da necessidade de ter um ensino e de fazer com que ele faça parte do
ambiente em que se está inserido, transbordando assim o conhecimento, fazendo com que a
sociedade seja mais reflexiva e consciente a cada dia.
A escola durante minha história de vida de formação foi um lugar de muita
importância, onde eu conseguia usar minha criatividade e imaginação, tudo isso
proporcionado pela educação, educação essa que me trouxe até aqui, foi ela que me deu a
oportunidade de desfrutar de várias experiências, como a faculdade, na qual foi um dos
espaços mais importantes na minha formação.
Então, entender a importância da educação para essas professoras me mostra como a
sua presença interfere de forma positiva e principalmente na formação e na vida delas, sem a
educação elas não se tornariam as professoras que elas são hoje.

Categoria Igreja Católica:

A Igreja católica, na história dessas professoras, se estabeleceu como uma forma de:
apoio, solidariedade, ensinamento e formação. As duas professoras tiveram experiências
bastante motivadoras com a Igreja católica, que as instigaram para o estudo e lhes estenderam
a mão na hora que foi preciso. Rocha (2018) ressalta:

A Igreja revela, na missão evangelizadora, a sua concepção de educação,


quando assume o desafio de proporcionar ao ser humano a aventura de ser
sujeito de sua ação tendo em vista a sua dignidade de filho de Deus. A
educação é um meio de conscientização e tem seu fundamento na busca
constante da pessoa por sua própria identidade e seu empenho em vista do
processo de humanização e personalização, encontrado os meios necessários
para uma atuação transformadora na sociedade. (ROCHA, 2018, p. 23)
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Rocha (2018) nos mostra que a percepção de educação que a Igreja traz é algo que nos
mostra que os todos os ensinamentos que são propostos por ela são voltados para algo
educativo, na qual busca a conscientização do ser humano, que envolve a construção de sua
identidade e proporciona ações humanizadoras. A Igreja não só declama as passagens da
bíblia, ela também compartilha ensinamentos necessários para a vida.
Já citado na categoria acima, a Professora 2 ganhou uma bolsa de estudos graças às
freiras, então a Igreja, nesse sentido, foi muito importante na vida dela, possibilitando a
oportunidade de estudar, proporcionando assim mais conhecimentos e experiências adquiridas.
A Professora 2 relatou: “A igreja me ajudou muito, me deu uma oportunidade que sou grata
até hoje”.
A Professora 1 já tem uma relação mais profunda com a Igreja e também com as
freiras. A Professora 1 aos 11 anos de idade fez a sua primeira comunhão, e com 14 para 15
anos de idade foi morar numa comunidade próxima de onde tinha ensinamentos sobre o
catecismo. Por ser muito comunicativa e por conhecer as catequistas, ela começou a ajudá-las,
tornando-se uma colaboradora, tendo funções estabelecidas pelas catequistas. Nesse
momento, ela já exercia uma função de professora, pois auxiliava e ensinava aqueles que
estavam vindo para fazer o catecismo. Aqui, ela já se sentia bem em ajudar e ensinar as outras
pessoas. A Professora 1 comentou: “A igreja foi um lugar onde eu aprendi muito e eu gostava
muito de ajudar as catequistas, me mostrou professora sem eu saber ainda”.
A função exercida pela Igreja em instruir e ser solidário com as pessoas parece
interferir positivamente na vida daqueles que recebem essa oportunidade, então na vida dessas
duas professoras, a Igreja católica foi um marco no início de suas trajetórias de vida, foi algo
marcante e positivo na vida delas.

Portanto, a missão da educação na Igreja corresponde a uma maior intensidade


e maior grandeza visto que humaniza e oportuniza a plenitude do ser, pois a
educação para o ser humano é o aprendizado da vivência fraterna e solidária e
da vivência como filho de Deus, imagem e semelhança do Criador. Educar é
emancipar e dar condições para uma maior conscientização das realidades da
vida, da vivência, da cidadania e do compromisso com a ética e com o projeto
de vida digna, que Jesus Cristo veio trazer para todos. (ROCHA, 2018, p. 23).

Os ensinamentos que a Igreja proporciona são condutas a serem obedecidas buscando


assim a evolução do ser humano, me lembro que, durante minha primeira comunhão, a
catequista utilizava muito os valores como: amor, solidariedade e compaixão. Ela se utilizava
muito da ideia de cuidar do próximo, então aprendi muito a ter empatia e ser humilde. A Igreja
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nos mostra o quanto nós seres precisamos evoluir, seguindo os passos de Jesus, aquele que
deixou muitos ensinamentos para nossa vida.

Categoria Formação:

Durante nossa trajetória de vida, nós vamos evoluindo com o passar do tempo, a partir
dessa evolução passamos por etapas que tem muita importância em nossa vida que é a
educação, educação essa que proporciona uma formação, na qual vamos construindo mais e
mais conhecimentos. Diante disso, a formação dessas professoras é algo muito lindo,
passaram por muitas etapas que foram decisivas em suas vidas. Destaco aqui que a formação
inicial e continuada, na vida delas, foi algo crucial e de muito envolvimento e dedicação das
próprias. Sobre a formação na vida dos professores, Tardif (2012) comenta:

Os profissionais devem, assim, autoformar-se e reciclar-se através de


diferentes meios, após seus estudos universitários iniciais. Desse ponto de
vista, a formação profissional ocupa, em princípio, uma boa parte da carreira
e os conhecimentos profissionais partilham com os conhecimentos científicos
e técnicos a propriedade de serem revisáveis, criticáveis e passíveis de
aperfeiçoamento. (TARDIF, 2012, p. 249).

A formação é um processo no qual o ser humano está em busca de um futuro, onde ele
tem uma certa liberdade para escolher qual área que mais se encaixa com o seu perfil. As
professoras da minha pesquisa passaram por diversos processos formativos para chegar na
profissão que estão hoje. A profissão apareceu já em situações cotidianas vividas, nas quais
elas perceberam que fizeram a escolha certa na vida.
A Professora 1, na adolescência, foi para o ensino médio, fez o curso científico, que
preparava os alunos para fazer os vestibulares. Nesse mesmo período, em outro turno, ela fazia
um curso de contabilidade em outra instituição. Foi, nesse momento, que um de seus
professores, nesse curso de contabilidade, chegou para ela e perguntou: “O que você faz
mesmo no ensino médio?", a Professora 1 disse: “faço o científico”. Ele indagou: “Sério? Não
tem nem perigo, eu tinha certeza que você fazia o curso normal”. A Professora 1 perguntou:
“Por que?”, e ele respondeu: “Você tem muito jeito de professora”. Isso já começou a “mexer
um pouco com a cabeça” da Professora 1: “Será que eu tenho jeito para a professora? ” Ela
disse.
No relato da Professora 2, sobre o fundamental II, ela comentou: “Estudei numa escola
do estado e já tinha vontade de fazer o curso pedagógico, eu amava pegar as cartilhas e ficar
estudando as famílias silábicas”.
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Percebemos que o foco na educação era algo bastante sério dentro da sua casa, a mãe
dela sempre a incentivou para o estudo.
Chegando no final do Ensino Médio, a Professora 1 prestou vestibular pela primeira
vez, mas não conseguiu passar nessa primeira oportunidade. Então, pensou: “Ai que
decepção!”. Por ser uma aluna destaque na sua escola, ela se sentiu frustrada nesse momento.
Depois desse momento pensando muito bem, resolveu investir no curso normal, e
sobre isso a Professora 1 comentou: “Eu me apaixonei”. Durante toda a sua formação, a
Professora 1 estava buscando seu lugar e foi a partir da opinião de um professor que fez com
que ela se visse como uma professora. Especificamente sobre o curso normal, a Professora 1
disse:

No terceiro ano do curso normal, eu já comecei a substituir professores da rede


estadual. Naquele tempo, era menos criterioso do que hoje em dia. Comecei
dando aula no ensino médio, as professoras me ligavam para que eu fosse
substituir elas e eu ia. Comecei a tomar gosto pela profissão. (Professora 1).

Antes mesmo da Professora 1 terminar o curso normal, ela já lecionava em escolas. A


Professora 2 também fez o curso normal: “Fiz o curso pedagógico, mais conhecido como
normal voltado para área da educação”. Sobre o curso normal, a Professora 2 comentou:

Naquela época, o curso normal era direcionado para ser professor mesmo, mas
a Pedagogia, pra mim, ainda era algo muito distante. Naquele tempo, quem
tinha o curso pedagógico já estava preparado para atuar como professor,
depois de um tempo foi que surgiu uma lei que revogou isso. (Professora 2).

Seu pensamento em relação à Pedagogia, nesse primeiro momento, ainda era algo
muito vazio, ela ainda não tinha muita noção da área. Então, vamos entender como acontecia
esse Curso normal ou Curso pedagógico. Sobre o Ensino normal, temos o Decreto-lei n°
8.530 de 02 de janeiro de 1946 – Lei Orgânica do Ensino Normal:

Art. 2º O ensino normal será ministrado em dois ciclos. O primeiro dará o


curso de regentes de ensino primário, em quatro anos, e o segundo, o curso de
formação de professores primários, em três anos.
[...]
Art. 6º O ensino normal manterá da seguinte forma ligação com as outras
modalidades de ensino: 1. O curso de regentes de ensino estará articulado com
o curso primário. 2. O curso de formação geral de professores primários, com
o curso ginasial. 3. Aos alunos que concluírem o segundo ciclo de ensino
normal será assegurado o direito de ingresso em cursos da faculdade de
filosofia, ressalvadas, em cada caso, as exigências peculiares à matrícula. (
BRASIL, 1946, online).
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O Ensino normal cursado pelas professoras era habilitado para o magistério, por meio
do qual elas podiam lecionar na Educação Básica. Mas, com o passar do tempo, uma nova lei
foi elaborada. Nesse período, fazendo o ensino normal, já se poderia sim lecionar nas escolas.
Depois de um tempo a lei foi revogada, pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB/96) nº 9394/96 que passou a regulamentar que:

Art. 62º A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em


nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades
e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o
exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do
ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal. Art.
87 §4o. Até o fim da Década da Educação somente serão admitidos
professores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em
serviço (BRASIL, 1996, online).

Com a LDB/96, o magistério passou a ser exercido somente a partir de uma graduação
em nível superior e em licenciatura, ou seja, aquelas pessoas que tinham somente o curso
normal teriam que fazer sua graduação para poder continuar lecionando. Sobre essa temática,
após esse período, entre o ano de 2001 para 2002, a Professora 1 percebeu que era hora de
enfrentar o vestibular novamente. Na sua cidade, tinha um cursinho preparatório, que era
pago, a professora sempre foi de família de trabalhadores sem condições financeiras muito
favoráveis, então ela não teve como fazer esse curso.
Foi quando surgiu uma oportunidade, um cursinho gratuito no Núcleo de Informação
Tecnológica (NIT), com o apoio de sua mãe foi, de madrugada, ver se conseguia uma vaga
para ela e conseguiu, a Professora 1 comentou: “A primeira prova de fogo era conseguir uma
vaga nesse cursinho, pois vinha gente de todo o Vale do Jaguaribe para tentar as vagas".
Após 6 meses de cursinho, prestou o vestibular na FAFIDAM e estava aprovada em
segundo lugar no curso que ela queria, que foi a Pedagogia. As primeiras palavras que foram
ditas para ela foram: “Você é tão inteligente e vai fazer Pedagogia?”. A Professora 1
respondeu: “É por isso mesmo que vou fazer, nem eu sei se eu tenho competência para
exercer tal função que um pedagogo tem, vou estudar e fazer por com que eu consiga”. Outros
ainda disseram: “Você não vai ganhar nada”, então a Professora 1 disse que, nesse momento,
já percebeu a grande desvalorização da profissão do Professor na sociedade.
Nesse período, também havia passado em outro curso na mesma instituição onde ela
fez aquele cursinho preparatório, chamado Saneamento Ambiental. Duas áreas totalmente
diferentes, mas resolveu cursar Pedagogia.
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A Professora 2 também citou sobre seu processo de vestibular e início no curso de


Pedagogia, suas irmãs já haviam feito a faculdade, uma fez História e a outra Geografia.

Foi um período bem interessante, como minhas irmãs já tinham prestado o


vestibular, uma já estava saindo do curso e a outra já tinha terminado. Foi um
pouco assustador, porque eu estava acostumada com o ensino médio na qual
só eram três salas e durante os três anos continuava a mesma turma, então tive
um susto no início. (Professora 2).

A Pedagogia apareceu, para as duas professoras, de forma diferente, elas batalharam


muito para conseguir fazer seu curso e continuar com sua formação, a educação transformou a
vida delas. Em consonância com a percepção das entrevistadas, o autor Ghiradelli reforça a
função da Pedagogia:

A pedagogia, por sua vez, é vista não propriamente como teoria da educação,
ou pelo menos não como teoria da educação vigente, mas como literatura de
contestação da educação em vigor e, portanto, afeita ao pensamento utópico.
Contrariamente, teorias da educação real e vigente deveriam seguir as ciências
da educação. (GHIRALDELLI, 2006, p. 8).

A Pedagogia busca educar para transformar o ser humano, proporcionando, assim, sua
evolução. É observado na fala da Professora 1 a grande desvalorização que é imposta à
profissão de professor em nossa sociedade, falta reconhecimento e valorização, lutamos e
reivindicamos melhores condições de trabalho e qualidade na educação. Mas, na maioria das
vezes, não somos ouvidos, é triste ver tanta luta em vão. Seguimos firmes sempre buscando o
melhor sempre para a educação do Brasil.
A Professora 1 começou seu curso de Pedagogia, muito dedicada e inspirada, e
continuou trabalhando. Então, mesmo estudando ela continuou com sua função de professora.
Ela ressaltou a importância do trabalho que exerceu na Escola 1 particular. Nesta escola, antes
de começar a trabalhar como professora, os professores tinham que participar de formações
continuadas, nas quais se trabalhavam muitos autores da área da Pedagogia. Ela citou que estas
formações foram uma preparação para entrar no curso de Pedagogia, o que lhe ajudou
bastante. Sobre isso, a Professora 1 comentou: “Aquelas formações me ajudaram muito para
que eu pudesse entender mais sobre a Pedagogia”.
A Professora 1 ressaltou muito a importância dos professores da Pedagogia, que lhe
ajudaram e marcaram muito sua vida nesse período em que fez o curso. Citou nomes e temas
que foram muito importantes como: introdução à educação, currículo oculto, políticas
públicas, Paulo Freire, as psicologias.
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A Professora 2 também relatou sobre a Pedagogia: “Eu gostei muito dos primeiros
semestres, eu me enganchava mais nas partes burocráticas, ficava meio perdida, mas da parte
pedagógica eu gostava bastante”. Tardif (2012) afirma que:

Por outro lado, é evidentemente que a “pedagogia” não é uma categoria


inocente, uma noção neutra, uma prática estritamente utilitária: pelo contrário,
ela é portadora de questões sociais importantes e ilustra, ao mesmo tempo, as
tensões e os problemas de nossa época que se encontram vinculados à
escolarização de massa e à profissionalização do magistério. Nesse sentido,
não se trata de uma noção que pode ser definida científica ou logicamente.
Trata-se, ao contrário, de uma noção social e culturalmente construída, noção
essa na qual entram ideologias, crenças, valores e interesses. (TARDIF, 2012,
p. 116)

A partir da citação acima, compreendemos que a Pedagogia não está isenta de questões
sociais, ao contrário disso, ela possui um posicionamento forte principalmente em relação à
educação e como ela se comporta dentro da sociedade. Esta área de conhecimento busca
questionar e debater sobre o papel que a educação exerce e como ela pode interferir dentro da
sociedade de forma significativa e com umas indagações diante de ações que causam um certo
desconforto como: desvalorização docente, qualidade da educação, falta de recursos nas
escolas, entre outras. Então, ela também é um ponto de apoio para a busca de reflexão e de
conscientização dentro da sociedade e, principalmente, dentro da escola. Como exemplo, a
Professora 2 relatou uma experiência que teve no curso de Pedagogia:

Um professor meu da Pedagogia apresentou um projeto que estava querendo


desenvolver, um projeto de Educação de Jovens e Adultos – EJA, na qual seria
utilizado o método Paulo Freire, o nome do projeto era “Vivendo e
aprendendo”. Fiz uma formação pra começar a desenvolver esse projeto. Seria
desenvolvido durante 6 meses em comunidades na qual tivesse um maior
número de pessoas analfabetas. Por eu já ter trabalhado como agente de saúde
dentro da minha comunidade, eu já sabia quem eram as pessoas que
precisavam desse projeto. Então, eu indiquei minha comunidade e disse mais
ou menos quantas pessoas precisavam. Só poderia pegar 25 alunos por turma.
Esse projeto era totalmente voltado ao método do Paulo Freire, na qual tinha
que ser voltado à realidade do aluno. Eu e meu colega de equipe saímos de
casa em casa perguntando quem gostaria de participar. Nesse tempo, aprender
a ler e escrever ainda não tinha muita importância para as pessoas. Na lista,
tinha 50 pessoas, mas tivemos que ver quais os casos mais críticos, pois só
tinha 25 vagas. Selecionamos e começamos a trabalhar, eram 3 dias na semana
de 18:00 às 21:00 horas. Todos recebiam material e nós também. O tempo era
muito curto, mas os alunos eram muito dedicados. A gente planejava cada
aula, procurava trabalhar muitos com os esquemas que Paulo Freire utilizava.
Então, assim por fim das contas, dos 25 alunos apenas 1 desistiu e a maioria,
que ficou, aprendeu a ler e a escrever. Foi uma experiência muito interessante,
eles realmente estavam ali para aprender. (Professora 2).
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Essa experiência foi de suma importância na história de vida de formação da


Professora 2. Ela relatou que foi muito especial porque foi realizada na sua comunidade e, por
ela já conhecer as pessoas que participaram desse projeto, sua contribuição foi ainda mais
importante. Ela disse que foi uma etapa muito marcante em sua formação. Sobre a
culminância do projeto, a Professora 2 ainda comentou: “Quando o projeto acabou, os alunos,
que participaram, foram para FAFIDAM apresentar os seus trabalhos. Foi algo primoroso”.
Sobre o método de Paulo Freire:

Paulo Freire pensou em um método de educação construído em cima da idéia


de um diálogo entre educador e educando, onde há sempre partes de cada um
no outro, não poderia começar com o educador trazendo pronto, do seu
mundo, do seu saber, o seu método e o material da fala dele.
Um dos pressupostos do método é a idéia de que ninguém educa ninguém e
ninguém se educa sozinho. A educação, que deve ser um ato coletivo, solidário
- um ato de amor, dá pra pensar sem susto -, não pode ser imposta. Porque
educar é uma tarefa de trocas entre pessoas e, se não pode ser nunca feito por
um sujeito isolado (até a auto-educação é um diálogo à distância), não pode
ser também o resultado do despejo de quem supõe que possui todo o saber,
sobre aquele que, do outro lado, foi obrigado a pensar que não possui nenhum.
“Não há educadores puros”, pensou Paulo Freire. “Nem educandos”.
(BRANDÃO, 1985, p. 21-22)

Paulo Freire acreditava em uma educação compartilhada com todos, uma educação em
que começasse pelo aluno e não pelo educador, onde a partir das vivências e experiências dos
alunos o educador pudesse conhecer sua realidade e a partir disso iniciar o processo de
alfabetização, fazendo com que eles aprendessem, a partir daquilo que vivenciavam todos os
dias.
Em 2021, a Professora 1 está de licença por conta do Plano de Carreira e Remuneração
dos Profissionais do Magistério da Educação Básica Pública de Limoeiro do Norte/ce, mais
conhecido como PCCR7, que dá direito ao professor a saída para estudo de mestrado e
doutorado. Sobre isso, a Professora 1 comentou: “Hoje eu estou estudando, estou fazendo o
que eu nunca fiz, porque sempre que eu estava estudando eu estava trabalhando. Sou muito
grata a Deus pela saúde e oportunidade de estar hoje falando aqui”.

A palavra formação comporta uma grande variedade de significados. Não é


fácil definir, quando falamos de formação, de que estamos falando

7
“Art. 41. Os cursos de pós-graduação strictu sensu (Mestrado e doutorado), somente serão considerados se realizados
em instituições de ensino superior, nacionais ou estrangeiras, mediante cumprimento de todos os créditos disciplinares,
inclusive com a defesa da dissertação e/ou tese necessárias à outorgado dos títulos de Mestre ou Doutor,
respectivamente, relacionados à área de atuação do professor, ficando obrigatório o cumprimento de igual período de
afastamento a serviço do sistema municipal de educação ou ressarcimento integral e corrigido dos recursos recebidos
quando afastado”. (PREFEITURA MUNICIPAL DE LIMOEIRO DO NORTE/CE, 2009).
68

exatamente. A formação não se limita nem a um diploma, nem a um programa,


nem a uma lei. Reconhecida como necessária para o exercício de uma
profissão, ela também faz parte da evolução da nossa vida pessoal.
(MACEDO; PIMENTEL; REIS; AZEVEDO, 2012, p. 19).

A formação profissional vai além do diploma, como a citação afirma, é um processo


que acontece em nossa vida, a partir do trabalho e das decisões que tomamos na vida, baseia se
em interesses e estímulos vivenciados durante nossa história de vida de formação.
Sobre a educação, as professoras citaram: Professora 1: “É um processo, são atividades
emancipadoras, mas sozinha eu não consigo nada, preciso da ajuda de todos”. Professora 2:
“Falar de educação é muito importante, eu tenho muita alegria e me realizei muito nessa
profissão”.
Aa professoras expressaram uma relação de muita entrega e dedicação com a educação,
em cada fala se percebe a importância que a educação tem em suas vidas. Nesse sentido, Paulo
Freire (1996) esclarece:

É preciso insistir: este saber necessário ao professor - que ensinar não é


transferir conhecimento - não apenas precisa de ser aprendido por ele e pelos
educandos nas suas razões ontológica, política, ética, epistemológica,
pedagógica, mas também precisa ser constantemente testemunhado e vivido.
(FREIRE, 1996, p. 21).

Além disso, Paulo Freire (1996) nos ensina que educar não é transferir conhecimento, a
educação precisa ser libertadora, precisa se estabelecer como uma transformação do ser, nós
professores buscamos a evolução do aluno, então nossos conhecimentos são compartilhados
para que os alunos reflitam e aprendam a partir de nossas experiências. A função do educador
vai além do ensinar por ensinar, precisamos identificar a realidade daquele aluno, é necessário
buscar elementos que estejam inseridos dentro de sua realidade, para que assim ele possa
pensar e tirar suas próprias conclusões daquele conhecimento compartilhado.
As duas Professoras também fizeram especializações. A Professora 1 fez
especializações nas áreas de: Gestão escolar e Produção de material didático, “São duas áreas
que me chamam bastante atenção e que gosto muito, sobre Gestão é sempre bom aprender
mais sobre e o material didático é muito importante dentro da escola, sempre é preciso buscar
algo diferente para se trabalhar com os alunos”. A Professora 2 também fez especializações:

Surgiu uma especialização pelo Instituto Federal do Ceará – IFCE,


especialização em Ciências da Educação Básica, conclui em 2 anos. No
decorrer desse curso, trabalhei a gravidez na adolescência, pois tanto na minha
comunidade quanto na minha sala de aula havia muitos jovens que já se
relacionavam. (Professora 2).
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A continuidade da vida profissional mostra o quanto a educação tem importância na


vida delas, principalmente, no fato de estar se especializando e buscando ainda mais
conhecimentos, essa é uma atitude muito positiva na profissão de professor. Nesse sentido,
Macedo, Pimentel, Reis e Azedo (2012) afirmam que:

Visto como um processo em constante movimentação no decorrer de uma vida


adulta, a formação escapa à rigorosidade dos termos de verdade, de prova ou
objetividade, que caracterizam, na maioria das vezes, o debate científico, com
respeito à problemática epistemológica. (MACEDO; PIMENTEL; REIS;
AZEVEDO, 2012, p. 21).

A formação quando ela é feita com amor e com muita dedicação ela é muito mais
proveitosa, no sentido do fazer bem feito, hoje em dia a profissão, muitas vezes, sufoca o
profissional, o que devemos fazer é ver a importância daquilo em nossa vida e o quanto vai
contribuir em nossa trajetória profissional.
Durante a minha trajetória de vida, a formação me acompanha desde sempre, na qual
por meio de processos educativos formais eu consegui alcançar os meus objetivos, a formação
fez com que eu me tornasse a pessoa que sou hoje, me mostrou um caminho, me fez ter uma
identidade e continua me construindo dia a dia.

Categoria Experiências profissionais:

As experiências profissionais dessas professoras nos mostram muita força e dedicação,


elas se dedicaram muito dentro dessa profissão de professora, passaram por muitas situações
que lhe trouxeram muitas experiências, se mostraram bastante dedicadas fazendo duas funções
ao mesmo tempo, pois estudavam e trabalhavam.
O amor pela profissão é algo muito nítido na história de vida delas, estudaram muito
para poder exercer essa profissão e se tornaram excelentes profissionais na área da educação.
O que me chamou mais atenção em suas experiências foi a determinação e a competência, são
mulheres muito destemidas e seguras daquilo que se realiza. Tardif (2012) nos mostra que:

As experiências escolares anteriores e as relações determinantes com


professores contribuem também para modelar a identidade pessoal dos
professores e seu conhecimento prático. Acrescentam-se também a isso
experiências marcantes com outros adultos, no âmbito de atividades
70

extraescolares ou outras (atividades coletivas: esportes, teatro, etc.).


(TARDIF, 2012, p. 73).

A experiência é algo que se constrói ao longo do tempo, passamos por muitas situações
em nossa vida que de certa forma influenciam quando vamos decidir algo, isso também vale
para nossa formação e a área profissional também.
Após terminar o curso normal, a Professora 1 ingressou numa escola particular recém
chegada na cidade que ela comentou ser muito exigente, já que exigia estudo dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN)8exigia muitos conhecimentos pedagógicos.
Nessa escola, ela citou que aprendeu mais do que ensinou, pegou turmas de Ensino
Fundamental de 3° e 5° ano.
Depois desse período, ela conseguiu seu primeiro contrato como temporária na
prefeitura de Limoeiro do Norte/CE, para substituir uma professora que estava de licença
maternidade, passou somente 4 meses na função. Sobre isso, a Professora 1 comentou: “Sofri
tanto para entregar a turma. Foi um momento que ficou muito marcado para mim. Esses alunos
já são casados e têm suas famílias, mas, mesmo assim, lembram de mim e me cumprimentam”.
O sentimento que sentia quando estava em sala de aula, nas palavras da Professora 1 eram:
“Quando eu entro naquele espaço tento fazer o meu melhor, eu tenho vontade de estar ali”.
Paulo Freire (1996) ressalta:

A responsabilidade do professor, de que às vezes não nos damos conta, é


sempre grande. A natureza mesma de sua prática eminentemente formadora,
sublinha a maneira como a realiza. Sua presença na sala é de tal maneira
exemplar que nenhum professor ou professora escapa ao juízo que dele ou dela
fazem os alunos. E o pior talvez dos juízos é o que se expressa na “falta” de
juízo. O pior juízo é o que considera o professor uma ausência na sala.
(FREIRE, 1996, p. 27).

O vínculo estabelecido pelo professor dentro da sala de aula é algo transformador e


inspirador. Exercer essa função é algo que exige muita responsabilidade e dedicação. Quando
o professor entra em sala de aula, ele precisa proporcionar um ambiente de confiança para o
aluno, precisa mostrar para os alunos a importância que a educação e a escola têm na vida dele
e precisa trabalhar com muito amor também. Quando a Professora 1, relata sua experiência
com os alunos que passaram por ela e que ainda a consideram e lembram dela, é justamente
por

8
Os Parâmetros Curriculares Nacionais constituem um referencial de qualidade para a educação no Ensino
Fundamental em todo o País. Sua função é orientar e garantir a coerência dos investimentos no sistema educacional,
socializando discussões, pesquisas e recomendações, subsidiando a participação de técnicos e professores brasileiros,
principalmente daqueles que se encontram mais isolados, com menor contato com a produção pedagógica atual.
71
conta de seu trabalho, de sua entrega em sala de aula, ela sempre estava presente na vida
desses alunos, por isso essa valorização.
Para trabalhar com educação, primeiramente, você precisa gostar de educação e saber a
importância que ela tem dentro da sociedade, a educação transforma o ser humano, mas este(a)
também precisa querer essa transformação.
Tardif (2012) nos apresenta que:

Os saberes profissionais também são temporais, no sentido de que os primeiros


anos de prática profissional são decisivos na aquisição do sentimento de
competência e no estabelecimento das rotinas de trabalho, ou seja, na
estruturação da prática profissional. Ainda hoje, a maioria dos professores
aprendem a trabalhar na prática, às apalpadelas, por tentativa e erro. (TARDIF,
2012, p. 261).

Todo conhecimento, adquirido nas experiências profissionais são muito importantes,


principalmente neste caso para a Professora 1, pois ela estava começando seu curso de
Pedagogia e estava trabalhando, então estudar as teorias e vê-las na prática é tudo aquilo que
um universitário gostaria de vivenciar.
Professora 1, cursando Pedagogia ainda e trabalhando no período da manhã na escola 1
particular, ela recebeu uma proposta de emprego para ser coordenadora escolar na escola 2,
uma escola de grande porte na cidade. Mas como estava trabalhando na escola 1, ela entrou em
contato com a diretora dessa escola 1, conversaram e alinharam alguns pontos. Depois dessa
conversa, ela pediu um estágio de 6 meses na escola 2 para que depois desse período, ela
pudesse exercer o cargo.
Nesse momento, a Professora 1 comentou: “Senti muito medo, pois eu era muito nova
para essa função”. Ela tinha em torno de 22 anos, foi uma fase na qual ela estudou muito,
principalmente sobre política, gestão e coordenação. Ficava observando como as
coordenadoras agiam. Ela disse que sua monografia do curso de Pedagogia, foi feita nas
madrugadas e nos finais de semana. Sobre isso a Professora 1 disse: “[...] tem que ter muita
força de vontade”.
Lück (2009) afirma:

[...] a gestão democrática escolar é exercida tanto como condição criadora das
qualificações necessárias para o desenvolvimento de competências e
habilidades específicas do aluno, como também para a criação de um ambiente
participativo de vivência democrática, pela qual os alunos desenvolvem o
espírito e experiência de cidadania, caracterizada pela consciência de direitos
em associação a deveres. (LÜCK, 2009, p. 71).
72

Não é à toa que a Professora 2 sentiu medo em exercer essa função, a área de gestão
escolar exige muito conhecimento sobre políticas educacionais na qual é muito importante
dentro da escola. Dedicação e comprometimento são essenciais para trabalhar nessa área mais
burocrática.
A diretora da escola 2 acreditava muito no potencial da Professora 1. Ela assumiu o
cargo de coordenadora nessa escola. Nesse período, as principais características que a
Professora identificou dentro dessa função foi: observação, dedicação e comprometimento.
Professora 1: “Eu observava muito como a outra coordenadora recebia os pais na escola.
Estava ali aprendendo na prática e, nas reuniões, eu colocava muito a minha opinião sobre os
assuntos, tinha que me impor. Terminei minha faculdade trabalhando ainda nessa escola como
coordenadora”.
Pouco tempo depois apareceu um concurso na cidade, a Professora 1 disse: “Um
concurso muito difícil”. Ao fazer a prova do concurso, a professora ressaltou ter encontrado,
nos temas abordados, seus professores da graduação em Pedagogia. Sobre isso, a Professora 1
comentou: “Você estuda aquilo e não sabe quando vai utilizar esse conhecimento. Quando
você precisa dele, parece que ele se reconecta. Foi o que aconteceu no concurso, vi assuntos
que estudei no passado, que me ajudaram muito naquele momento”. Sobre a questão da
função e as influências do professor na vida do educando, Paulo Freire (1996) reflete:

O professor que pensa certo deixa transparecer aos educandos que uma das
bonitezas de nossa maneira de estar no mundo e com o mundo, como seres
históricos, é a capacidade de, intervindo no mundo, conhecer o mundo. Mas,
histórico como nós, o nosso conhecimento do mundo tem historicidade.
(FREIRE, 1996, p. 14).

Quando a educação acontece de forma compartilhada e motivadora, mesmo com muito


tempo assimilada, ela retoma em nossos pensamentos, quando o professor exerce seu trabalho
com dedicação e com amor os alunos aprendem de forma mais significativa, obtendo assim
mais importância na sua vida.
Depois de um tempo saiu o resultado e a Professora 1 passou no concurso da prefeitura
de Limoeiro do Norte/CE e começou a ensinar nas turmas de 5° ano da rede pública.
Observamos aqui que a Professora 1 teve uma vida de trabalho bastante agitada, na qual não
perdeu as oportunidades que apareceram em sua vida.
Sobre suas experiências profissionais, a Professora 2 relatou sobre seu trabalho como
agente de saúde:
73

Quando eu estava no ensino médio, eu fiz o concurso para agente de saúde. O


principal objetivo desse programa era erradicar a mortalidade infantil. Era
trabalhar com a educação e saúde e eu consegui passar. Eu me encaixei muito,
pois foi feita uma entrevista e uma das perguntas foi assim “Como eu posso
ajudar a erradicar a mortalidade infantil? Como eu posso ajudar essas crianças
e ver as dificuldades dela?” Então, como eu já estava terminando o curso
pedagógico, me vi muito nessa área de ensinar as mães a cuidarem dos seus
filhos. Então, ali, eu já me via ensinando. Foi feito uma formação, eu estudava
muito, eu ajudava as mães que não sabiam como amamentar. Era uma
educação mesmo sobre como cuidar das crianças. A gente trabalhava de casa
em casa. Trabalhei 7 anos nessa área. (Professora 2).

Foi a partir deste trabalho como agente de saúde que a Professora 2 se descobriu uma
educadora, ela ensinava tudo para aquelas mães de primeira viagem, então essa experiência foi
bastante importante em sua história de vida de formação. Brandão (1993) ressalta:
[...] ao longo da vida, cada um de nós passa por etapas sucessivas de
inculcação de tipos de categorias gerais, parciais ou especializadas de saber
e-habilidade. Elas fazem, em conjunto, o contorno da identidade, da ideologia
e do modo de vida de um grupo social. Elas fazem, também do ponto de vista
de cada um de nós, aquilo que aos poucos somos, sabemos, fazemos e
amamos. (BRANDÃO, 1993, p. 23).

A experiência profissional, vivenciada pela Professora 2 como agente de saúde lhe


mostrou como a educação é importante, como ensinar aquelas meninas era essencial. A vida
durante a nossa trajetória vai nos mostrando o caminho a se seguir, isso vai construindo nossa
identidade, isso vai nos mostrando como nossa vida é feita de etapas e que essas etapas são
muitas vezes decisivas em nossas vidas. Foi o que aconteceu com essa professora, mesmo
sendo uma área distinta da Pedagogia a educação estava ali presente e de certa forma ajudou a
professora a definir sua profissão.
Após pouco tempo que estava cursando a Pedagogia, apareceu o concurso da prefeitura
de Limoeiro do Norte/CE. A Professora 2 comentou: “Pouco tempo cursando a Pedagogia
apareceu o concurso da prefeitura de Limoeiro do Norte/CE, fiz a prova e passei”. Após passar
no concurso, a professora teve sua primeira experiência como professora.
Sobre a primeira experiência como professora em escola, Professora 2 disse:

A diretora me disse que já tinha muito tempo que não tinha professora na
escola, fiquei com uma turma de Educação Infantil Pré II. Quando cheguei lá
para ver a sala, não era uma sala, era somente um corredor com cadeiras. Então
eu assumi, mesmo não tendo experiência com a educação infantil, naquela
hora o conhecimento tinha que vir, era uma situação que você tinha que agir.
Passei um ano nesse cargo, depois disso a escola mudou e passei a trabalhar
com outras séries. (Professora 2).
74

Nessa fala, podemos perceber que mesmo sem experiência na área mais com muita
vontade e dedicação para aprender a Professora foi em frente em busca do seu objetivo,
aprendendo na prática e no curso de Pedagogia ao mesmo tempo. Tardif (2012) afirma:

[...] a perspectiva aqui defendida exige, por parte dos professores de profissão,
o esforço de se apropriarem da pesquisa e de aprenderem a reformular seus
próprios discursos, perspectivas, interesses e necessidades individuais ou
coletivos em linguagens susceptíveis de uma certa objetivação. Vinte anos de
pesquisas mostram que os saberes dos professores se baseiam, em boa parte,
em sua experiência na profissão e em suas próprias competências e habilidades
individuais. (TARDIF, 2012, p. 239).

A Professora 2, começou na educação já assumindo uma sala de aula sem ter


experiência alguma, ela já teve a percepção e força de vontade de ir atrás de conhecimento,
para poder começar a se familiarizar com a área, isso é de suma importância para o professor
na prática, quando lidar com situações complicadas ter a consciência e ir atrás de algo para
resolvê-lo.
Como a citação afirma, os saberes dos professores são também aprendidos na prática e
com certeza a Professora aprendeu muito nessa sua primeira experiência. Sobre sua
experiência na educação, Professora 2:
Eu passei por todos os processos. Primeiro, entrei na Educação Infantil meio
que na marra. Depois passei pelo Fundamental I e depois na EJA no projeto
na faculdade. Depois dessa fase, continuei trabalhando na educação de
Limoeiro, me ofereceram para trabalhar do 6° ao 9° ano. Naquele tempo, os
pedagogos podiam ensinar nas turmas de fundamental II, aí com um tempo
apareceram as portarias informando que os pedagogos só podiam atuar até o
fundamental I. Eu gostava muito de trabalhar no fundamental II com os
adolescentes, tanto é que hoje em dia se me perguntar em qual turma eu
gostaria de lecionar, eu diria que até o 9° ano eu conseguiria. Não gostaria de
ficar na Educação Infantil, porque exige muito mais energia e minha garganta
não ajuda muito. Enfim, de experiência na educação, eu passei em todas as
etapas (risos). (Professora 2).

Sua vasta experiência na área da educação possibilitou bastantes ensinamentos que ela
guarda com muito carinho e apreço. No momento desta fala, a professora se mostrou muito
orgulhosa em ter tido diversas oportunidades de mostrar o seu potencial. Josso (2007)
ressalta:

O processo de formação que caracteriza o percurso de vida de cada um permite


trazer à luz, progressivamente, o ser-sujeito da formação, vê-lo tomar forma
psicossomaticamente, psicologicamente, sociologicamente, economicamente,
culturalmente, politicamente, espiritualmente, numa sábia e singular teia,
produzindo assim um motivo único [...]. (JOSSO, 2007, p. 423).
75

Nossa história de vida de formação diz respeito a tudo aquilo vivenciado, são as
experiências que proporcionam nosso contato direto com o mundo e com as pessoas. A
Professora 2, teve muitas oportunidades que possibilitaram ela transitar por várias áreas que a
educação pode proporcionar, então essas vivências que ela conta são parte da sua própria
identidade docente.
Sobre o programa Residência Pedagógica, onde eu trabalhei com essas duas
professoras. Professora 1:

Foi um momento muito feliz, peguei uma equipe maravilhosa, aprendi muito.
Me ver como preceptora, foi algo de muita importância dentro da minha
profissão. Pensei em não aceitar, pois achava uma responsabilidade gigante.
Mas aceitei. Quando começou, me senti bastante empolgada e muito grata em
ter feito parte deste programa Foi através da Residência Pedagógica que me
acendeu a vontade de fazer o mestrado, eu agradeço sempre á todos que junto
comigo fizeram parte deste trabalho. (Professora 1).

Professora 2:

Foi muito desafiador participar da Residência Pedagógica, pois já tinha muito


trabalho dentro da escola e assumir outra função foi algo difícil no início. Mas,
com o desenrolar do trabalho, percebi o quanto grandioso era fazer parte deste
programa. Me sinto bastante grata pelos resultados obtidos e pela experiência
adquirida. Foi um trabalho que valeu a pena ser realizado. (Professora 2).

Essa experiência como preceptora acrescentou muito na vida delas, mostrou as várias
facetas que o professor possui e, poder usufruir disso tudo é algo muito prazeroso. Lógico que
elas estudaram muito para poder exercer essa função e acredito que adquiriram muito
conhecimento com esse programa, abrangeu ainda mais os conhecimentos sobre a área da
educação. Paulo Freire (1996) afirma:

Mulheres e homens, somos os únicos seres que, social e historicamente, nos


tornamos capazes de aprender. Por isso, somos os únicos em quem aprender é
uma aventura criadora, algo, por isso mesmo, muito mais rico do que
meramente repetir a lição dada. Aprender para nós é construir, reconstruir,
constatar para mudar, o que não se faz sem abertura ao risco e à aventura do
espírito. (FREIRE, 1996, p. 28).

O ser humano está sempre em constante transformação, mudamos mediante as


situações que aparecem em nossa vida e isso é algo muito bom, pois estamos em processo de
evolução e sempre é bom buscar ser uma pessoa e um profissional melhor a cada dia.
76

Durante a minha formação também tive experiências dentro da escola, o que trago de
mais valioso desses momentos é a importância que a educação tem. Quando entrava em sala
de aula para observar ou ensinar, eu sentia a necessidade de dar o meu melhor ali dentro.
Trabalhamos com pessoas que precisam dos nossos ensinamentos, devemos olhar sempre para
o futuro e imaginar esses alunos fazendo parte da sociedade de forma digna e sendo cidadãos
de bem. Acredito que a educação busca construir caminhos de desenvolvimento do ser
humano, devemos acreditar sempre nisso e continuar seguindo em frente.

Categoria Política e luta:

Ser professor é um ato de resistência, é lutar por aquilo que se acredita e nunca desistir
dos seus objetivos. Nesse sentido, as professoras são bastante críticas e politizadas em relação
ao que ocorre na sociedade e às ações que o governo toma em relação à profissão do professor.
Paulo Freire (1996) nos mostra fortemente isso:

A luta dos professores em defesa de seus direitos e de sua dignidade deve ser
entendida como um momento importante de sua prática docente, enquanto
prática ética. Não é algo que vem de fora da atividade docente, mas algo que
dela faz parte. O combate em favor da dignidade da prática docente é tão parte
dela mesma quanto dela faz parte o respeito que o professor deve ter à
identidade do educando, à sua pessoa, a seu direito de ser. Um dos piores males
que o poder público vem fazendo a nós, no Brasil, historicamente, desde que
a sociedade brasileira foi criada, é o de fazer muitos de nós correr riscos de, a
custo de tanto descaso pela educação pública, existencialmente cansados, cair
no indiferentismo fatalistamente cínico que leva ao cruzamento dos braços.
“Não há o que fazer” é o discurso acomodado que não podemos aceitar.
(FREIRE, 1996, p. 27).

Paulo Freire, desde muito tempo, faz essa crítica ao governo, e destaca que a
resistência dentro da educação, muitas vezes, é o que sustenta essa área tão significativa em
nossa sociedade, e a persistência no dia a dia dentro da escola que é uma das características
que diferenciam o professor de outro profissional. O professor não só ensina, ele luta, ele vai
às ruas, ele corre atrás dos direitos que o governo, algumas vezes, não oferece. A busca pela
valorização enfatiza o professor na luta por uma educação de qualidade, por melhores
condições de trabalho. Além disso, os profissionais da educação também podem desenvolver
um olhar para os alunos de forma mais empática, proporcionando experiências
transformativas dentro de sala de aula. A meu ver, esse deve ser o foco da educação.
Então, essa categoria nos mostra o lado da luta que nós professores precisamos ter
diante dessa sociedade capitalista e autoritária. Precisamos enfrentar com “unhas e dentes”
todos os
77

combates que nos afetam de alguma forma. Sobre temas políticos, a Professora 1 também
relatou:

Eu, de forma geral, me assumo de esquerda, mas sou aberta ao diálogo e tenho
minhas concepções, mas quando você se fecha ao diálogo, é porque você não
está querendo resolver. Quando você abre se tem oportunidades, sou uma
professora militante, vou à luta, vou pra rua, digo não, grito quando não aceito
as misérias que nos são ofertadas, busco as melhorias para o trabalhador, e não
é fácil a emancipação e a transformação para uma sociedade. (Professora 1).

Exercer um ato político é uma função indispensável para qualquer cidadão,


principalmente para a profissão de professor, na qual está sempre em debate com o governo
reivindicando melhores condições de trabalho. Ter um posicionamento é de extrema
importância dentro da sociedade, só se alcança os resultados lutando. Paulo Freire (1996)
reflete que:

A professora democrática, coerente, competente, que testemunha seu gosto de


vida, sua esperança no mundo melhor, que atesta sua capacidade de luta, seu
respeito às diferenças, sabe cada vez mais o valor que tem para a modificação
da realidade, a maneira consistente com que vive sua presença no mundo, de
que sua experiência na escola é apenas um momento, mas um momento
importante que precisa de ser autenticamente vivido. (FREIRE, 1996, p. 43).

O professor precisa ter um posicionamento, precisa reivindicar seus direitos, essa


função social tem uma importância muito grande principalmente para a área da educação, o
professor não pode ser neutro. Nossa profissão dentro da sociedade tem muito significado,
mesmo que isso não seja visto nós precisamos mostrar nosso valor e lutar por tudo que
acreditamos.
A Professora 1 é uma grande defensora dos direitos do cidadão e acredita que a
influência do capitalismo é algo bastante prejudicial para a sociedade, Professora 1:

Eu acredito em atividades emancipadoras, emancipar a sociedade. Esse


sistema capitalista não tem mais o que dar jeito, o que ele está nos dando é
doença. O modo de produção capitalista é uma das formas que hoje tem nos
dado problema. Eu acho que se a gente conseguir se reconhecer nessa classe,
a gente vai fazer mais colaborativo, mas tem que fazer uso do sentimento de
classe e colaborar. Enalteceu muito em mim, as lutas, conhecer o diferente,
ajudar as pessoas com menos oportunidades, dos que estão sempre
desfavorecidos. (Professora 1).
O capitalismo é um grande sistema na qual nos consome todos os dias, como cidadãos
devemos ter noção do que acontece em nossa volta, e principalmente não deixar que a
alienação tome conta do que nos dizem diariamente. Ter voz e resistência é uma atitude que
devemos
78

preservar, pois do jeito que o mundo está caminhando nosso único aliado é nossa persistência
e nossa luta. Karl Marx (2013) afirma que:

O capital é trabalho morto, que, como um vampiro, vive apenas da sucção de


trabalho vivo, e vive tanto mais quanto mais trabalho vivo o suga. O tempo
durante o qual o trabalhador trabalha é o tempo durante o qual o capitalista
consome a força de trabalho que comprou do trabalhador. Se este consome seu
tempo disponível para si mesmo, ele furta o capitalista. (MARX, 2013, p. 392).

Karl Marx, nos ajuda a refletir, pois nossa sociedade está enraizada historicamente pelo
capitalismo. O trabalhador é consumido ao máximo e a remuneração que ganha é uma miséria.
A força de trabalho, é totalmente consumida pelo capitalismo, as grandes empresas só querem
saber de lucro, não se importam com o ser humano, que está alienado por esse sistema que só
quer arrancar seu dinheiro. É uma realidade muito triste, o papel do educador é proporcionar
ao aluno reflexões sobre nossa sociedade, fazendo com que a conscientização aconteça e que
as estratégias de mudança também.
A Professora 2 também tem seu posicionamento. Aqui ela fala um pouco sobre o curso
de Pedagogia:

Nós pedagogos ficamos com um espaço muito limitado, podendo ensinar até
o 5° anos. Eu acho isso incorreto, nós temos uma visão bem diferente de quem
é de outras áreas, isso a gente não tem como negar. Eu fico muito feliz em ter
escolhido esse curso, pois eu consigo interpretar a situação dos meus alunos e
analisar ele de várias formas, e uma coisa que já questionei na secretaria de
educação é sobre o pessoal que fez Letras, Geografia entre outras áreas, que
podem ensinar a crianças e nós pedagogos não podemos ensinar aos
adolescentes. Essas situações me incomodam bastante. Hoje em dia estou
atuando mais nas turmas de 5°ano e gosto muito do lugar que me foi dado.
(Professora 2).

De certa forma, concordo com a professora, os pedagogos têm uma visão mais ampla
sobre a educação e principalmente sobre a relação professor-aluno, deve-se sempre conhecer o
seu aluno antes de qualquer coisa. Isso muitas vezes não acontece com professores de algumas
áreas, é importante que se conheça as dificuldades do aluno e que se intervenha positivamente.
Os professores podem ter confiança no aluno e vice-versa. Então, acredito que o pedagogo
pode sim ensinar em turmas do Fundamental II. Tenho consciência de que esta questão
precisa ser ampliada e investigada, sendo assim, indico-a como tema para futuros estudos.

O trabalho docente é parte integrante do processo educativo mais global pelo


qual os membros da sociedade são preparados para a participação na vida
social. A educação - ou seja, a prática educativa - é um fenômeno social e
79
universal, sendo uma atividade humana necessária à existência e
funcionamento de todas as sociedades. (LIBÂNEO, 1990, p. 16-17).

Como Libâneo (1990) afirma, a educação é uma atividade humana e necessária, nós
pedagogos estudamos a educação dentro da universidade, nós temos uma visão bastante ampla
sobre essa área, no meu ver ensinar no Fundamental II não haveria nenhum problema, o
professor também tem a capacidade de estudar e procurar sempre está se atualizando, em
qualquer sala de aula que um pedagogo entrar, ele vai ter a capacidade de falar sobre aquele
determinado conteúdo. Pois tem planejamento na escola para isso, para estudar e se dedicar ao
máximo quando estiver em sala de aula. Digo isso também para os profissionais que trabalham
no Fundamental II, todos têm a capacidade de trabalhar em qualquer área, basta que estudem,
se aprofundem e se dediquem, e que tenha formações adequadas e específicas.
A Professora 1 relatou sobre as avaliações externas, “Para essas provas é como se o
aluno não precisasse mais aprender, ele só precisa ser avaliado”. Essa “pequena” frase nos diz
tanto sobre a educação de nosso país. Nossos alunos não têm mais autonomia, não precisam
mais pensar, eles só precisam ser avaliados e pronto. Tudo se baseia em uma nota, eles não se
importam se aquele aluno está aprendendo ou não. Isso é inadmissível, chegamos num ponto
em que tudo se baseia em uma avaliação e isso é muito triste de se ver.
De acordo com Bonamino e Sousa (2012, p. 375) “De um modo geral, essas avaliações
divulgam seus resultados na Internet, para consulta pública, ou utilizam-se da mídia ou de
outras formas de disseminação, sem que os resultados da avaliação sejam devolvidos para as
escolas”. É uma extrema falta de bom senso realizarem uma avaliação dessas focando
somente em números e divulgação, e o foco na aprendizagem desses alunos onde fica? São
esses questionamentos que ficam e, se faz necessário repensar esse tipo de avaliação e
desenvolver outras pesquisas que possam aprofundar essas reflexões.
Finalizando este tópico ressalto a importância da luta dentro da educação, a persistência
e a busca por melhores condições de trabalho e por valorização, é algo que deve acontecer
constantemente. Eu como professor preciso ir atrás dos meus direitos, pois só assim irei
conseguir alcançar meus objetivos e assim deve ser feito, com a união de todos. Deve-se
resistir e acreditar que é possível.

Categoria Relações extrassala de aula:

O exercício do magistério é um trabalho de relações que estabelecemos com um


determinado grupo, nesse caso, os alunos, o vínculo construído é inevitável, o contato dia a dia
80

proporciona interações, pois somos seres humanos e isso se torna comum quando trabalhamos
com pessoas. Tardif (2012) ressalta que:

Ao entrar em sala de aula, o professor penetra em um ambiente de trabalho


constituído de interações humanas. As interações com os alunos não
representam, portanto, um aspecto secundário ou periférico do trabalho dos
professores: elas constituem o núcleo e, por essa razão, determinam, ao nosso
ver, a própria natureza dos procedimentos e, portanto, da pedagogia.
(TARDIF, 2012, p. 118).

A partir do contexto desta citação podemos identificar que as vivências estabelecidas


dentro de sala de aula, de certa forma, influenciam em questões fora (extra) sala de aula, pois
quando estabelecemos vínculos começamos a conhecer um pouco mais aquela pessoa e, a
partir do diálogo e das interações, adentramos em questões pessoais e nos inserimos um pouco
dentro da vida dessa pessoa. Foi o que aconteceu com a Professora 2 nesse próximo relato a
seguir.
Em relação às experiências estabelecidas extrassala de aula, a Professora 2 relatou um
caso de um aluno:

Vivenciei uma experiência bastante complicada com um aluno do 6°ano. A


mãe dele foi morta por uma pessoa. Depois que aconteceu isso, ele começou
a ficar muito estranho na escola, ele dizia assim pra mim “Tia, eu tenho uma
faca aqui para matar a pessoas que matou minha mãe”. Nós da escola,
tentávamos conversar muito com ele, a família dele não ajudava e hoje em dia,
eu vejo ele de vez em quando aqui nas ruas numa situação muito triste. Faltou
muito apoio da família para com ele. No dia a dia da escola, a gente vê muitos
casos. Nós tentamos resolver para que no futuro algo pior não aconteça e é
muito lamentável quando você vê que não deu certo. O que eu vejo muito é
que hoje em dia os pais estão mais preocupados em oferecer mais a parte
material do que o próprio apoio para com seus filhos, como: ouvir, conversas,
carinho não tem. O distanciamento da família é algo muito prejudicial para as
crianças. (Professora 2).

O professor, muitas vezes, também faz papel de pai e mãe, tentando aconselhar,
ajudando no que for possível, fazendo com que a situação daquele aluno melhore, buscando
sempre seu próprio desenvolvimento humano e profissional. Mas só o apoio do professor não
resolve tudo, a família precisa intervir de forma que ajude a mudar a situação do seu filho, por
isso digo e repito ser professor não é uma opção e sim uma necessidade. Acosta e Vitale
(2003) nos mostram que:

Nesse jogo entre o mundo exterior e o mundo subjetivo, as construções


simbólicas operam numa relação especular. Assim acontece na família. O
discurso social a seu respeito se reflete nas diferentes famílias como um
espelho. Em cada caso, entretanto, há uma tradução desse discurso, e cada uma
delas, por sua vez, devolverá ao mundo social sua imagem, filtrada pela

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