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teóricos e metodológicos

Fundamentos históricos

do serviço social II

UNOPAR FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL II


Fundamentos
históricos,
teóricos e
metodológicos
do serviço
social II

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Fundamentos
históricos,
teóricos e
metodológicos
do serviço
social II

Paulo Sérgio Aragão

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© 2014 by Editora e Distribuidora Educacional S.A.

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Aragão, Paulo Sérgio


A659f    Fundamentos históricos, teóricos e metodológicos do
serviço social II / Paulo Sérgio Aragão. – Londrina:
Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2014.
168 p.

ISBN 978-85-68075-34-0

1. JK. 2. Conservadorismo. I Título.

CDD 361.008

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Sumário

Unidade 1 — Brasília: de JK aos militares.......................1


Seção 1  O Brasil nos tempos de Juscelino Kubitschek ........................3
1.1 Nos tempos de Juscelino Kubitschek.....................................................3
Seção 2  O Governo de Jânio Quadros e a gestão de João Goulart
na Presidência do Brasil.............................................................10
2.1 O governo de Jânio Quadros...............................................................10
2.2 João Goulart na Presidência do Brasil.................................................17
Seção 3  O Golpe Militar de 1964 e os governos de Humberto
Castelo Branco e Arthur da Costa e Silva.............................27
3.1 O Golpe Militar de 1964 e os governos de Humberto Castelo
Branco e Arthur da Costa e Silva.........................................................27
3.2 O Governo de Castelo Branco e o governo de Arthur da Costa
e Silva.................................................................................................29

Unidade 2 — A erosão do serviço social tradicional.....41


Seção 1  O serviço social tradicional.................................................44
1.1 O serviço social tradicional................................................................44
Seção 2  Processo de renovação do serviço social brasileiro..............56
2.1 Processo de renovação do serviço social brasileiro.............................56

Unidade 3 — O serviço social no capitalismo..............77


Seção 1  O movimento de reconceituação do serviço social.............80
1.1 O movimento de reconceituação do serviço social.............................81
Seção 2  O movimento de reconceituação na América Latina...........94
2.1 O movimento de reconceituação na América Latina...........................94

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vi  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Seção 3  A perspectiva modernizadora..............................................99


3.1 As perspectivas do serviço social no Brasil..........................................99

Unidade 4 — A perspectiva de reatualização do


conservadorismo e os seminários do
movimento de reconceituação do
serviço social brasileiro........................115
Seção 1  A perspectiva de reatualização do conservadorismo.........119
1.1 A perspectiva de reatualização do conservadorismo.........................120
Seção 2  Os seminários de Araxá e de Teresópolis............................129
2.1 Os seminários de Araxá....................................................................129
2.2 Os seminários de Teresópolis............................................................139
Seção 3  Os seminários de Sumaré e Alto da Boa Vista ...................143
3.1 O seminário de Sumaré e seminário de Alto da Boa Vista.................143

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Apresentação

Saudações. É com grande entusiasmo que trazemos aqui os conteúdos


referentes a um momento histórico para a profissão do serviço social, no qual
se identificam intensas transformações em suas fundamentações.
Ao compreender tal ênfase, destaca-se que esse período também sina-
liza um tempo de grandes alterações nas sociedades latino-americanas,
em que há busca por um desenvolvimento deste continente, na ânsia de
romper com a subalternidade em que se inscrevia em relação aos países
capitalistas hegemônicos.
Neste livro, o discente encontrará a introdução dos conteúdos so-
bre o final da década de 1950 e o transcorrer das décadas de 1960 e
1970, momentos cruciais para compreender a emersão do Movimento
de Reconceituação.
Buscou-se, nestas poucas páginas, contextualizar a dinâmica da profissão,
revelando o desgaste do serviço social tradicional e a manifestação de outras
formas de ver, pensar, interpretar e agir sobre a profissão, até se germinar
neste o Movimento.
Como base de nossas interpretações, tomamos os estudos de José Paulo
Netto, mas também encontramos aqui as considerações de outros renomados
autores da categoria profissional, tais como Maria Ozanira da Silva e Silva,
Marilda Iamamoto, Raquel Raichelis, Vicente de Paulo Faleiros entre outros.
Aqui, mais precisamente dentro desse movimento no Brasil, abordaremos
as perspectivas modernizadora e de Reatualização do Conservadorismo,
entendendo que a perspectiva crítica dentro desse movimento no cenário
brasileiro será objeto de nossas análises no próximo semestre.

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viii  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Sugere-se ao leitor que ao se debruçar sobre estas poucas considerações


busque as fontes originais de seus defensores, entendendo que nestas encon-
trará maior grau de profundidade, visto também o objetivo deste trabalho.
Compreende-se que estas poucas linhas nada mais permitem do que abrir um
amplo debate sobre um momento específico no desenvolvimento do serviço
social e, nem de longe, pretende-se esgotar o rico arsenal de temáticas que
daqui emanam.

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Unidade 1
Brasília: de JK aos
militares
Paulo Sérgio Aragão

Objetivos de aprendizagem: Nesta unidade o discente entrará


em contato com um resgate histórico da sociedade brasileira, do
período do final do governo presidencial de Juscelino Kubitschek.
O aluno poderá constatar o cenário social e político que se instala
naquele período, tendo na gestão de JK o impulso para tentar
inverter a tonalidade econômica do Brasil, buscando ultrapassar a
vocação agrícola pela vocação industrial concebida até aquele mo-
mento como sinônimo de desenvolvimento. Não obstante, poderá
perceber que os aspectos sociais na gestão desse presidente ficaram
a desejar, sendo relegados a um segundo plano.
Também nesta unidade procura-se levar o discente a compreender
o cenário político e social do Brasil na entrada da década de 1960,
o que mais tarde se articulará com as transformações no interior da
profissão, revelando os desejos governamentais para o serviço social.
Tal percepção proporcionará ao aluno a compreensão dos processos
metodológicos que se desenvolve no serviço social e as mobiliza-
ções para a ultrapassagem do cariz conservador que acompanha a
profissão por um longo período.
Ainda buscaremos embasar o aluno com os conteúdos referenciais perti-
nentes ao início do golpe militar de 1964, para que compreenda as suas
características, bem como as características do próprio regime militar.
Espera-se que o aluno compreenda o que foi o golpe militar de 1964,
suas características autoritárias e atentados contra os direitos humanos.
Ao final, pretende-se levar o aluno a uma compreensão sobre os
principais impactos do golpe militar à sociedade brasileira, alicerçado
em um regime que irá perdurar por mais de 20 anos, bem como as
principais características relevantes para o serviço social com relação
aos governos de Humberto Castelo Branco e Arthur da Costa e Silva.

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Seção 1: O Brasil nos tempos de Juscelino
Kubitschek
Nesta seção abordaremos os principais traços de um
governo emblemático para a gestão do país, o qual
implantará um novo estágio de desenvolvimentismo,
dando maior ênfase para a indústria de base. O seu
governo é marcado por intensificação da industriali-
zação, elevação da massa operária e da vida urbana,
bem como mudança da capital do país.

Seção 2: O Governo de Jânio Quadros e a gestão


de João Goulart na Presidência do Brasil
Nesta seção abordaremos os dois governos demo-
cráticos da década de 1960, bem como as caracte-
rísticas de suas gestões, em consonância com suas
proposições mais progressistas, o que desagradava
a elite do Brasil levando ao golpe militar de 1964.

Seção 3: O Golpe Militar de 1964 e os governos


de Humberto Castelo Branco e Arthur da
Costa e Silva
Nesta seção abordaremos a instalação do golpe mi-
litar, encerrando o período dos governos populistas
na gestão nacional do país. Aqui serão descritas as
principais características da ditadura militar e dos
seus dois primeiros governos e que rebatem no pro-
cesso de intensificação das alterações da categoria
profissional.

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Introdução ao estudo
Nesta unidade, abordaremos os principais contornos da sociedade brasileira
entre os anos de 1956 e o segundo governo da ditadura militar, período de
intensas mudanças e que se configurou determinante para o perfil que o Brasil
assume perante a América Latina.
Nesse sentido, enfatizamos que o pretendido nestas primeiras páginas não
é munir o discente de um vasto conteúdo histórico concebido nas graduações
específicas ao tema, mas, sim, proporcionar um panorama sob a visão geral
da sociedade brasileira.
Assim, convida-se o leitor a mergulhar na história e visualizar os profissionais
que se dedicavam ao seu exercício, a fim de que munidos desses conteúdos
possamos avançar para a compreensão da erosão do serviço social tradicional.
Boa leitura.

Seção 1  O Brasil nos tempos de Juscelino


Kubitschek
Nesta seção abordaremos os contornos da sociedade brasileira no que diz
respeito à gestão governamental de Juscelino Kubitschek. Sua ascensão ao poder
marca a história do Brasil em um período onde se busca inverter a vocação
econômica, alicerçada sob a égide da agricultura.
Assim, observaremos que naqueles anos as transformações ocorridas nessa
gestão governamental terão um impacto decisivo para o país e principalmente
para os grandes centros urbanos.

1.1 Nos tempos de Juscelino Kubitschek


Iniciemos a nossa viagem contemplando o governo de Juscelino Kubitschek,
uma das grandes personalidades políticas de nossa história que programou um
governo desenvolvimentista, alicerçado em grandes obras de impacto para a
economia brasileira e para a dinâmica da sociedade como um todo. JK, como
era conhecido Juscelino Kubitschek de Oliveira, se lançou candidato à presi-
dência da república pelo Partido Social Democrata (PSD), e teve uma votação
tímida, ou ainda podemos dizer que foi uma eleição considerada acirrada.

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Ele alcançou cerca de 1/3 dos votos válidos, com 33% dos votos, ficando,
assim, à frente do segundo colocado, o candidato Juarez Távora da União De-
mocrática Nacional (UDN). Destaca-se que naquele período o pleito eleitoral
era disputado em turno único, não havendo, dessa forma, uma disputa entre
os dois candidatos mais votados.
JK iniciou a gestão presidencial em janeiro de 1956, encerrando-se em
1961, quando então assume a presidência da república o candidato eleito
democraticamente, o Sr. Jânio Quadros. O governo de Juscelino Kubitschek
ficou conhecido pelo grande salto no processo de industrialização do país,
lançando o seu plano de governo denominado Plano de Metas, sendo este
um programa de governo que tinha como slogan “Crescer cinquenta anos
em cinco”, realizando, assim, um projeto desenvolvimentista em nosso país,
principalmente com investimentos nas grandes indústrias de base, como as do
ramo do transporte e da mineração (RODRIGUES, 1999).
É então no governo de Juscelino que esse impulso no planejamento se faz
mais presente enquanto forma de administrar o país, o que anteriormente não se
registrava com grande relevância, não conferindo grandes méritos a ferramenta
de planejamento.
Bierrenbach (1981) destaca que o Plano de Metas pode ser considerado a
primeira tentativa de sistematização de planejamento no Brasil, e que o presi-
dente daquele período deu especial atenção a esse plano como meio de supe-
ração do subdesenvolvimento, sendo este identificado como um instrumento
coeso e consistente, características estas que não foram percebidas nos planos
anteriores nos demais governantes do país.
Podemos perceber esse impulso no processo de crescimento do campo
industrial nas palavras de Raquel Raichelis:
Um novo período no processo de crescimento industrial
inaugura-se a partir de 1956 com o governo de Juscelino
Kubitschek. Verifica-se, a partir desse momento, um novo
desempenho do Estado no que se refere ao incremento
do processo industrial, a partir das facilidades que abre
para a penetração das corporações multinacionais (RAI-
CHELIS, 1988, p. 36).

Rodrigues (1999) afirma que a intenção do “Plano de Metas”, do governo


de Kubitschek, era acelerar a acumulação de capital, elevar a produtividade
daqueles investimentos já existentes atraindo outros novos, através da indus-
trialização em um forte ritmo de crescimento industrial, gerando, assim, novas

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oportunidades de empregos e elevando a qualidade de vida da população,


dentro da lógica do capital.
O Plano de Metas do governo de Juscelino Kubitschek possuía foco de ação
em cinco setores básicos da economia brasileira e apontava metas a serem
atingidas para cada um desses setores.
Nestas poucas linhas em que contornamos a gestão de JK, já percebemos
o ímpeto em um processo de planejamento a que esse governo vinha se de-
dicando, construindo e implementando um processo de gestão alicerçado em
setores distintos da economia brasileira.
Um dado interessante nesse plano de governo é que cada um destes deveria
estar interligado entre si, a fim de que uma meta se articulasse com a outra,
sendo condição para o sucesso do plano uma visão e dedicação integral na
sua execução, e não a sua consecução em partes fragmentadas.
Destaca-se que esse documento, o qual será um dos protagonistas no pro-
cesso de planejamento enquanto ferramenta de gestão no Brasil, foi elaborado
por tecnocratas, eximindo-se, portanto, a participação popular.
A ênfase dada ao uso racional e a competência técnica das ciências con-
temporâneas na gestão pública, ignorando aspectos políticos contraditórios, é
que confere a esse documento o caráter tecnocrático a que muitos autores o
denominam. Podemos ressaltar, no entanto, que os setores de energia, trans-
porte e indústria detinham quase a totalidade dos investimentos, congregando
cerca de 93% da atenção e dedicação dos recursos, deixando setores, como
alimentação e educação relegados a segundo plano.
Somente a título de ilustração, o setor educação, contemplado no Plano de
Metas, detinha apenas 3,4% dos investimentos de governo, estando em último
lugar no volume de investimento empregado nesse programa de governo.
Tal posicionamento demonstrava que o setor econômico teria maior atenção
do então governo constituído e que os aspectos sociais, nem de longe, seriam
prioridade para a gestão de JK.
Como consequência — e não de forma isolada, os dados apontam que ao
final do governo de Juscelino Kubitschek a taxa de analfabetismo entre pessoas
com mais de 15 anos de idade era cerca de 39%, sendo considerada elevada
para um país do porte do Brasil.
Bierrenbach (1981), analisando os processos de planejamento social no
Brasil compreendidos nos anos de 1956 a 1978, acrescenta que tais processos

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de planejamento público sempre privilegiaram os aspectos econômicos em


detrimento do social.
O Plano de Metas, a rigor não evidencia nenhuma preo-
cupação social, apesar da recomendação dos organismos
internacionais, já após o término da Segunda Guerra
Mundial, com o intuito de superar os entraves ao desen-
volvimento (BIERRENBACH, 1981, p. 53).

No entanto, conforme cita Silva (2000), a taxa de crescimento do setor


industrial ao final da gestão do governo de JK era de 8,3 % de média anual,
uma média considerada expressiva para esse setor, ainda mais se comparada
a setores como o da agricultura, que atingiu um crescimento de 5,8% nesse
mesmo período e que, até aquele momento, gozava de privilégio e destaque
na economia nacional nas outras gestões dos presidentes brasileiros até então.
O autor destaca que esse vertiginoso crescimento provocou alterações nos
padrões de vida da economia brasileira, ao passo que em termos de atenção
governamental, a gestão de JK deu maior ênfase para um setor que não era
considerado o mais importante em termos econômicos. Assim, a indústria re-
ceberá maior atenção do que a agricultura naquele período.
Silva (2000) afirma ainda que no início da década de 1950, 57% da po-
pulação brasileira acima de 10 anos estava empregada na agricultura, o que
demonstra também, em termos sociais, a relevância daquele setor.
Essa inversão de prioridade econômica buscava elevar a colocação do Brasil
no rol dos países industrializados e romper com a ideia de que o Brasil deveria
se inserir no contexto global como uma economia voltada à agricultura.
Assim, o Plano de Metas mergulha o país em um tempo conhecido como
período de intensificação do desenvolvimentista, com a finalidade de moderni-
zar o Brasil, alicerçado principalmente com a indústria de base e de consumo
duráveis, por exemplo, a indústria do automóvel.
Somente como ilustração podemos citar o exemplo das indústrias de autope-
ças que chegaram a ter o número de mão de obra empregada elevado em mais
de dez vezes, no período que vai do início da gestão de JK até ao final desta,
o que destaca a relevância da atuação governamental em privilegiar tal setor.
Nesse período, as importações de bens de capital chegaram a duplicar, isto
em razão dos grandes incentivos de importações para as empresas estrangeiras.
Tais incentivos se manifestavam principalmente na isenção de impostos para
seus produtos, o que não era permitido na mesma escala para as empresas

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nacionais, dando uma tônica de crescimento industrial dependente e centra-


lizado nas empresas estrangeiras.
Segundo Rodrigues (1999), essa elevação da presença e investimento euro-
peu no país fez com que os Estados Unidos da América também reorientasse
seus investimentos e, assim, não perdesse sua influência sobre o continente.
Em termos internacionais, na segunda metade dos anos
50, o capitalismo monopolista procurava integrar as eco-
nomias dos países periféricos, cuja mão de obra barata
era cada vez mais atraente às empresas estrangeiras.
A obtenção dos recursos externos, no entanto, implica
também uma interferência dos financiadores na política
interna dos financiados (RODRIGUES, 1999, p. 62).

Mesmo diante dessa inegável influência, o período desenvolvimentista


elevava o sentimento nacionalista, na ilusória retórica de sinônimo de país de-
senvolvido é aquele país que é industrializado. Do mesmo modo apresentava
também o teor de frear o ímpeto socialista que emanava do ocidente.
Nesse esteio, além do impulso econômico, encontrava-se também uma
guerra ideológica contra o socialismo, fato este utilizado para incentivar os
investimentos estrangeiros na América Latina.
Como um dos grandes destaques do governo de Juscelino Kubitschek, po-
demos destacar a sua capacidade de negociação política, o que lhe garantiu a
sua maioria na câmara dos deputados e no Senado.
Esse apoio era fundamental para aprovação de seus projetos de governo,
levando adiante o seu plano de governo desenvolvimentista. Nesse sentido, JK
contava ainda com o apoio dos militares, sendo este estratégico para seu governo.
Também temos que a construção de Brasília era uma das metas sínteses do
Plano de Metas de JK, tendo sua construção decretada em 1956 e sua data de
entrega e mudança prevista para 21 de abril de 1960. No entanto, para tornar Bra-
sília a capital do Brasil seria necessária a sua interligação com as demais regiões.
Tais aspectos do nacional-desenvolvimentismo de JK,
e outros ainda que não cabe aqui especificar, tomaram
forma física em Brasília, o “monumento de papel crepom
e prata”, citado por Caetano Veloso em “Tropicália, ou
segundo Maria Victoria de Mesquita Benevides, a “meta
síntese” (RODRIGUES, 1999, p. 63).

A autora destaca ainda que para a construção de Brasília, a grande bandeira


de seu Plano, foi preciso o emprego de mão de obra de milhares de pessoas

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vindo de diversas regiões do país, o que aglutinou ainda mais o sentimento de


integração presente naquele período.

Para saber mais


Era época de pioneiros e desbravadores, que transformariam a
área central do país. De 1955 a 1961 foram construídos 13.169 km
de rodovias federais, e pavimentados 7.215 km. Só nos dois
primeiros anos do governo, a rede pavimentação expandiu-se
300%. A multiplicação de rodovias acompanhou o êxito da in-
dústria automobilística. Significava também uma política voltada
para a fixação das populações que emigravam desordenadamente
para os grandes centros (NOBLAT, 1980, p. 23).

Assim, Brasília começa a ser construída, buscando nos planos de JK uma


modernização do interior do país. Somente para se ter uma ideia, em 1957, a
obra já contava com mais de três mil trabalhadores vindo de todas as regiões
do Brasil. Nove meses depois do início das obras, cerca de 12.700 pessoas
já habitavam em Brasília; em 1960, o Distrito Federal teria cerca de 141.000
habitantes distribuídos em seu entorno e ao longo das diversas rodovias cons-
truídas nesse processo.

Questões para reflexão


A gestão de JK teve no Plano de Metas um importante guia para suas
ações. Qual a tônica dada às políticas sociais na sua gestão?

Podemos afirmar que na gestão de Juscelino Kubitschek, o Brasil dentro da


política desenvolvimentista moderniza seu campo industrial alicerçado pelo
capital estrangeiro, buscando inverter a vocação agrícola que acompanhou o
país até então, dando ênfase às grandes indústrias, e que em certo grau, em
consequência de um maior incentivo às indústrias estrangeiras, não atingiu na
mesma proporção o crescimento das empresas nacionais.
JK conseguia, com grande poder carismático, dar, a princípio, ares de espe-
rança a população, no entanto, ainda algumas regiões do país sofriam com a falta
de investimento e exposição a situações climáticas, como no caso do nordeste

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brasileiro, que amargurava a fome e a ausência às intervenções estruturais


estatais que pudessem transmitir melhores condições de via para a população.
Assim se deu a gestão do governo de JK, que com sua política desenvolvi-
mentista ampliou o terreno industrial, negociou interesses de diversas classes
e ideologias no poder, ampliou as relações comerciais externas, sem, contudo,
alterar profundamente as relações sociais desiguais que se submetia à grande
parcela da população brasileira, relegando a resolução ou atenuação da dívida
social a segundo plano.

Para saber mais


DESENVOLVIMENTISMO: Segundo Fonseca (2004), podemos considerar o desenvolvimentismo
como uma política típica do século XX de cunho positivista, centrando esforços na industriali-
zação, intervenção governamental em prol do crescimento econômico e a busca por certo grau
de nacionalismo, ainda que mesmo apenas no plano do discurso. Para o autor, esses elementos
considerados como núcleo duro dessa política devem estar articulados e de forma estruturada
e consciente nos planos de governo afirmando a ideologia do desenvolvimento como a meta
a ser atingida pela gestão governamental, tornando-se mesmo uma utopia.

Atividades de aprendizagem
1. O governo de JK traz um grande impacto para o Estado brasileiro, no
entanto, temos como destaque de sua gestão um processo de planeja-
mento. Relate qual a denominação atribuída a seu plano de governo
e qual a tonalidade desse processo.
2. Na gestão do governo de JK temos a busca pela inversão da vocação
econômica do país. Destaque qual a tônica que JK buscava dar a eco-
nomia brasileira e seu o impacto nesse setor?

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10  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Seção 2  O Governo de Jânio Quadros e a


gestão de João Goulart na Presidência
do Brasil
Nesta seção o aluno será levado a compreender a dinâmica histórica do
período de dois governistas entendido como populista na política brasileira. Tais
governos que sucedem a gestão de JK conferem um registro singular ao país.
Veremos que esse perfil de político se aproxima das massas e realiza alianças
que vão além do revelado em seus discursos. Veremos o processo de aproxi-
mação das massas por meio de programas de governo com tonalidades sociais
que solicitarão mudanças drásticas no Estado brasileiro.
Nesse sentido, ao analisar essas duas gestões presidenciais em um curto
espaço de tempo, visualizamos as tensões provocadas pelos impactos de suas
medidas, tendo, assim, uma renúncia presidencial e um golpe militar que en-
cerra tais mandatos.

2.1 O governo de Jânio Quadros


Tendo em vista a gestão do Estado brasileiro, em sua linha sucessória teremos
um novo presidente que seria eleito para governar o país por mais cinco anos
a partir de 1961. O presidente eleito por meio de uma coalizão de diversos
partidos políticos foi o Sr. Jânio Quadros.
O governo de Jânio Quadros é estabelecido em um cenário bem diferente
daquele que antecedeu a gestão de Juscelino Kubitschek, sendo este tencionado
por uma crise econômica que exigiria esforço dos governantes. Tal crise econô-
mica já anunciada ao final do governo de Juscelino Kubitschek já iniciaria com
uma dívida externa em torno de três bilhões de dólares herdadas pelo ímpeto
desenvolvimentista que mergulhou o país na gestão anterior.
A situação é agravada se tomarmos por base que a grande parte dos emprés-
timos, contraídos no governo de JK para dar impulso as suas medidas desenvol-
vimentistas, deveria ser saudada ainda na gestão de Jânio Quadros, conforme
podemos visualizar nessa citação do discurso de posse do então presidente.
É terrível a situação financeira do Brasil. Nos últimos
cinco anos, o meio circulante passou de 57 bilhões para
206 bilhões de cruzeiros [...] devemos ao estrangeiro 3
bilhões e 802 milhões de dólares, o que marca, só a este
título e naquele período, a elevação de 1 bilhão e 435

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milhões de dólares sobre o passivo anterior. E a situação


é tanto mais séria quando se sabe que, somente durante o
meu Governo, devemos saldar compromissos em moeda
estrangeira no total de cerca de 2 bilhões de dólares
(SILVA, 2000, p. 1).

Silva (2000) acrescenta que os sinais dessa crise podem ser confirmados, nas
várias tentativas de planejamento econômico que se sucederam desde o início
da gestão de Jânio Quadros até o ano de 1964, as quais tentaram contorná-las
no então governo de João Goulart. Nesse quadro já se considerava a inflação
como algo grave dentro do efeito da política desenvolvimentista assumida na
gestão de JK.
Destacamos que a gestão do presidente Juscelino Kubitschek conseguiu es-
truturar um parque industrial forte, como visto centrado nas grandes empresas de
base, com grande incentivo ao capital externo no entanto, debilitou em grande
parcela o empresariado nacional, que se viu atrelado as empresas estrangeiras
para poder se manter vivo na economia nacional (BIERRENBACH, 1981).
Contudo, vamos iniciar nossa reflexão sobre esse período destacando o
processo histórico que leva o candidato Jânio Quadros a ascensão à presidência
da república em janeiro do ano de 1961.
Queler (2010) destaca que Jânio Quadros nasceu no Estado do Mato Grosso,
na cidade de Campo Grande, atualmente Mato Grosso do Sul, filho do médico
Gabriel Quadros.
A família veio a residir posteriormente em São Paulo, onde Jânio Quadros
se graduou em direito. O autor destaca, ainda, que o candidato lecionava aulas
de geografia e português nos colégios Vera Cruz e Dante Alighieri, tradicionais
colégios de São Paulo e que esse ofício impulsionou sua carreira política, le-
vando a assumir o cargo de vereador de São Paulo ainda na década de 1940.
Queler (2010) afirma também que em um curto período de tempo (cerca
de 13 anos), o Sr. Jânio Quadros tem uma carreira política ascendente vertigi-
nosa, passando de vereador da cidade de São Paulo a deputado estadual e, em
seguida, assumiria a prefeitura da capital do Estado.
Não obstante, seguindo sua carreira política, o candidato conseguiria
também ganhar as eleições para governador do Estado de São Paulo e
posteriormente ganharia as eleições para ser deputado federal, até que, em
seguida, atingiria a vitória na candidatura de presidente da república.

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12  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

O autor relata que o candidato Jânio Quadros despertava grande empatia


com o eleitorado, o que lhe favoreceu imensamente nas eleições, pois sua
imagem dava ares de identificação com o povo, tanto pela sua fala que apre-
sentava sotaques típicos genuinamente dele próprio e que era permeada por
gesticulações, quanto pela aparência, quando este se apresentava com roupas
amarrotadas, barba por fazer, cabelos despenteados e gravata desalinhada.
Essa empatia com o povo também se dava na campanha eleitoral; seu
principal símbolo era uma vassoura, na qual afirmava seu perfil moralista que
deveria permear a administração pública. Esse perfil caracterizava um tipo de
política que tinha grande facilidade com as massas, “o Populismo”.

Para saber mais


Segundo Faleiros (2000), tanto o populismo quanto o corporativismo são recursos da classe
dominante no processo de luta e desenvolvimento do Capitalismo latino-americano. O autor
destaca que o populismo surge na América Latina na década de 1930.
O Populismo é movimento de integração controlada das classes
subalternas para certos benefícios sociais, mobilizando-as em torno
de consignas ambíguas e imprecisas que apelam aos seus senti-
mentos e interesses imediatos. Essa mobilização contribui para o
esvaziamento das relações de classe, transformando-as em relações
pessoais dos indivíduos com o Estado (FALEIROS, 2000, p. 99).

Jânio Quadros foi eleito presidente da república em 1960 com 5.636.623


votos, representando um total de 48% dos votos. Como vice-presidente, te-
ríamos a representação de João Goulart, que detinha grande influência junto
ao sindicalismo e movimentos populares, entre eles o movimento estudantil.
(Bierrenbach 1981) e que também havia sido vice-presidente de JK.
Queler (2010) destaca que nesse período a herança dos demais políticos
que governaram o país, grande parcela da população era analfabeta e não tinha
direito à participação direta no pleito eleitoral, relegando o processo eleitoral
apenas a uma pequena minoria.
O autor afirma que no ano de 1945 apenas 16% dos brasileiros puderam
participar das eleições, e no início da década de 1960, esta porcentagem sobe
para cerca de 20% da participação, o que resta demonstrado que a decisão
sobre os governantes do Brasil não estava nas mãos da maioria da população.

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B r a s í l i a : d e J K a o s m i l i t a r e s  13

Ao assumir a presidência da república no dia 31 de janeiro de 1961, Jânio


teria de enfrentar uma economia abalada pela dívida externa e um processo
inflacionário que corroía o poder aquisitivo dos brasileiros. Assim, o então
presidente Jânio Quadros não isentou de culpa o governo anterior de JK e teceu
suas críticas a sua gestão, principalmente em torno da moralização necessária
na administração pública e na má eficiência da máquina estatal.
Conforme cita Silva (2000), Jânio Quadros era um homem intempestivo
e imprevisível, e com medidas que nem sempre estavam alinhadas ao viés
de seus partidos aliados, se pautando mais por seus próprios critérios do que
pelas suas articulações políticas.
Assim, buscando conter a crise que vinha se aprofundando, Jânio toma
medidas econômicas em um programa anti-inflacionário, cuja medida inicial
foi à desvalorização da moeda, o fim dos subsídios de importação para alguns
produtos, o congelamento de salários e as restrições ao crédito.
Tais medidas levaram ao aumento do custo de vida para a população, que
viu os produtos dos quais faziam consumo elevar o seu preço, desencadeando
manifestações desfavoráveis de diversos setores e também dos sindicatos.
Em seu governo tentou conciliar uma política interna de
austeridade, mediante a contenção inflacionária, baseada,
principalmente na compressão salarial, e uma política
externa independente, voltada para novos mercados.
(BIERRENACH, 1981, p. 42).

Nesse sentido, com o seu plano de frear a inflação, Jânio desagradou às classes
sociais do país, tanto aqueles que dispunham de grande poder econômico ligados
à classe política e que detinham grande poder, quanto àqueles que dependiam
de seu rendimento mensal proveniente da exploração de sua força de trabalho.
Não obstante, o autor destaca que a elevação dos preços dos produtos de
consumo fez desgastar a imagem popular do então presidente, chegando a
ser acusado de antinacionalista e atrelado aos interesses do Fundo Monetário
Internacional (FMI), de quem contraía empréstimos para tentar conter a crise.
Para contornar essa crise, Silva (2000) afirma que Jânio Quadros buscou
distanciar-se do alinhamento automático ao bloco imperialista capitalista, tendo
uma posição mais independente quanto à política ideológica internacional que
opunha os blocos socialistas e capitalistas. Tal medida desagradou os Estados
Unidos da América, que buscavam a sua hegemonia ideológica na América
Latina em um tempo de guerra fria e instabilidade mundial.

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14  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Um dos episódios desta posição tempestiva, que ora se alinhava a auste-


ridade econômica ditada pelos acordos com as orientações de crédito inter-
nacional advindas do FMI, e que ora se aproximava da ideologia socialista,
foi à condecoração do líder revolucionário Ernesto Guevara, popularmente
conhecido como “Che Guevara”, com a Ordem do Cruzeiro do Sul, que signi-
ficava a maior condecoração brasileira que poderia ser conferida por cidadãos
estrangeiros.
Assim, Jânio Quadros vai se isolando no comando do país, e no bloco
político mundial, tendo sua capacidade de diálogo e negociação bem distante
de seu antecessor, não contanto mais com o apoio do Congresso Nacional
para governar o país e realizar as ações que seriam necessárias e almejadas
em seu governo.
Tal fato foi, assim, determinante para efetivação de sua renúncia em 25 de
agosto do mesmo ano, quando por meio de um simples bilhete de sete linhas
deixa o poder em meio à insatisfação das elites, das classes mais vulneráveis
e desalinhado no plano político e ideológico internacional.

Para saber mais


Bilhete de Renúncia deixado pelo então presidente da república. Excelentíssimo Sr. Jânio Qua-
dros. Revista Veja, 24 de agosto de 2011.
Ao Congresso Nacional.
Nesta data, e por este instrumento, deixando com o Ministro da Justiça, as razões de meu ato,
renuncio ao mandato de presidente da República.
Brasília, 25/8/61
Jânio Quadros

Tais pressões que levaram à medida de sua renúncia, se faziam presentes


diante do quadro de elevação do custo de vida da população e desalinhamento
político internacional, fazendo com que Jânio Quadros deixasse o governo
repentinamente, o que fez mergulhar o país em um cenário de instabilidade,
principalmente em razão da possibilidade iminente de seu vice-presidente, o
sr. João Goulart assumir o poder, conforme previa a Carta Constitucional.
Alguns autores defendem que a intenção do presidente Jânio Quadros não
era a efetivação de sua renúncia, mas, sim, o pressionamento do Congresso e
dos militares para dar carta branca a sua presidência e, assim, governar o país

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B r a s í l i a : d e J K a o s m i l i t a r e s  15

de acordo com os seus projetos e anseios. Tais argumentos estão alicerçados


em razão da manifestação de receio de entregar a presidência da república ao
vice-presidente, o sr. João Goulart, visto o seu alinhamento ao sindicalismo e
às orientações ditas de esquerda.
Um dos aspectos determinantes desse governo como serviço social é a
tônica que dava a essa profissão, colocando-a em uma posição de destaque
naquela conjuntura nacional, ressaltando esse profissional como um agente
de desenvolvimento e buscando inserir a sua operacionalização no que con-
siderava um novo estágio na sociedade brasileira.
É assim que o II Congresso Brasileiro de Serviço Social, realizado em 1961,
é retratado por Marilda Iamamoto e Raul de Carvalho no seu celebre livro
Serviço Social e Relações Sociais inscrito em 1982.
Os autores destacam que nesse período, passados 14 anos da realização
do I Congresso dessa natureza, os assistentes sociais novamente realizam um
novo evento, o qual contou com a participação de membros do auto escalão
do governo de Jânio Quadros, como o ministro do trabalho, o sr. Francisco C.
de Castro Neves.
Segundo esses autores, o governo de Jânio Quadros assimilava um discurso
de um novo estágio de desenvolvimento para a nação, criticando o então pro-
cesso de crescimento que vinha se afirmando no Brasil até aquele momento,
o qual segundo o conteúdo dos discursos afirmava que tal crescimento não
trouxera um verdadeiro desenvolvimento ao conjunto da nação, deixando
grandes parcelas à margem de seus frutos.
Daí a crítica ao tipo de crescimento econômico proposto
por seus antecessores: este desenvolvimento marginaliza
ainda mais os setores sociais atingidos pela pobreza,
aumenta as disparidades de renda e nível de vida, e as
disparidades regionais. Trata-se para a ideologia janista,
de diminuir a pobreza para que a democracia se faça
no plano econômico e a nação possa constituir um todo
harmônico e equilibrado. Pretende um desenvolvimento
integral, equilibrado e nacional (IAMAMOTO; CARVA-
LHO, 2000, p. 346).

Podemos perceber nesse trecho da bibliografia que o tipo de desenvolvi-


mento almejado pelo governo de Jânio Quadros se assentava em um processo
de crescimento harmônico.

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16  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Os autores afirmam ainda que os aspectos sociais que se destacam no go-


verno de Jânio não é apenas um discurso demagógico, mas uma proposta que
visava alcançar diversos setores, tais como: a política de saúde — elevação
do nível devida, melhora no processo de alimentação da população visando o
combate a desnutrição infantil — a política educacional — com destaque não
somete para o trabalho, mas também para “reestruturação da sociedade, de
uma redenção do país pela educação”, com vista a uma integração nacional
— política para o trabalho — buscava a eficiência, a moralização e a despoli-
tização com fins a elevar a produtividade defendendo ainda a proposta de um
sindicato mais autônomo sem as tutelas do Estado (IAMAMOTO; CARVALHO,
2000, p. 347).
O projeto do governo mantem então a linha desenvolvimentista, no entanto,
quer estabelecer um processo integrado de desenvolvimento contemplando
um crescimento harmônico e, para tal irá reivindicar uma maior relevância da
categoria profissional.
A vitória eleitoral do populismo de direita — aliado às
forças mais conservadoras — traz para o discurso do po-
der uma linguagem há tempos relegada a segundo plano.
Uma linguagem em certos momentos muito próxima
àquela tradicionalmente empregada pelo Serviço Social.
Não apenas o discurso do Poder se faz através de uma
linguagem conhecida: o próprio Serviço Social é situado
como instrumento de consecução dos objetivos nacionais.
Mais ainda, o Poder adianta a forma pela qual o Serviço
Social deverá trabalhar: diversas modalidades de atua-
ção em Desenvolvimento de Comunidade (IAMAMOTO;
CARVALHO, 2000, p. 349).

É possível identificar que com tal sintonia, a profissão deverá se adequar a


postura que o Estado e as classes dominantes irão exigir. Assim é que o tema
que assume a centralidade do Congresso é “Desenvolvimento Nacional para
o Bem-estar Social”.
A ênfase é na adequação da postura profissional que o Serviço Social deva
ter a partir de agora, o que impulsiona ainda mais para alterações no interior
da profissão, com destaque para o Desenvolvimento de Comunidade (DC) — e
Desenvolvimento e Organização de Comunidade (DOC), buscando dar maior
participação desses profissionais no processo de planejamento e proposições
de políticas sociais, almejando a alteração do seu status com as equipes
interdisciplinar.

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B r a s í l i a : d e J K a o s m i l i t a r e s  17

Iamamoto e Carvalho (2000) afirmam que nesse processo também recaí a


ênfase na formação desses profissionais, buscando dar maior especificidade
aos campos em que serão alvos da intervenção do Serviço Social, bem como
na revisão de métodos de DC e DOC. Isto implicará no reaparelhamento das
escolas de formação e a proposição de cursos de pós-graduação. É aqui que
também aparece, já naquele momento, a reivindicação da redução da jornada
de trabalho do assistente social para 30 horas, melhores níveis salariais com a
fixação de piso profissional e entidades de organização no interior da categoria.
Assim, nas justificativas dos autores, os assistentes sociais vão buscar con-
tribuir com esse novo desenvolvimentismo, com fins a uma integração aos
objetivos estatais; no entanto, apesar dos discursos e tons reformadores presente
no II Congresso Brasileiro de Serviço Social suas medidas não ultrapassam um
certo conservadorismo, sendo gestadas apenas nos níveis de reestruturação
interna de alguns órgãos e ao processo de modernização de enfrentamento
das demandas sociais.
Destacam-se, contudo, a visibilidade e o sentido atribuído ao período
desenvolvimentista, colocando-os em dicotomia entre atraso e progresso. Na
verdade, o processo de industrialização é colocado como remédio miraculoso
para os problemas do país.
Tal afirmação sustenta que não propostas alterações na base de estrutura-
ção do capitalismo e das relações sociais existentes até então; o Serviço Social
vai aderir em maior medida o receituário contido por agências internacionais
sustentada no processo de DC e DOC.

2.2 João Goulart na Presidência do Brasil


A renúncia de Jânio Quadros pegou a nação de surpresa. Intempestivo e
imprevisível lançou seu plano de renúncia com o intuito de conseguir seguir
adiante com suas intenções de governo e esperançoso em um apoio popular
governando, assim, de modo mais livre, fato este que não aconteceu.
Contudo, não contou com o apoio de forças significativas
da sociedade quando pretendeu possivelmente ampliar
seus poderes com a renúncia de 25 de agosto de 1961
(BIERRENBACH, 1981, p. 42).

A renúncia do governo de Jânio Quadros levou a uma intensa crise política


naquele período, que, por razões de não fugir ao foco da produção textual
a que se remete este livro, transcorreremos apenas em seus conteúdos mais

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18  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

expressivos, até chegar à posse de João Goulart, para, em seguida, adentrarmos


nas características do então governante “Jango”.
João Belchior Marques Goulart, nasceu na cidade de São Borja no estado
do Rio Grande do Sul em 1919. Teve a sua graduação em direito, no entanto,
não exerceu a profissão, cuidando dos negócios da família até ser introduzido
na política por Getúlio Vargas, iniciando sua carreira como deputado estadual.
O apelido de Jango já o acompanha desde sua infância, sendo este marcado
no meio popular.
Em 1956, compôs a chapa vitoriosa no pleito presidencial, sendo então
vice-presidente do Brasil na gestão de Juscelino Kubitschek, gozando ainda de
grande influência nas questões trabalhistas neste governo.
Assim, como bem destaca Silva (2000), com a renúncia de Jânio Quadros,
assumiria o poder de forma interina o presidente do Congresso Nacional o então
deputado sr. Paschoal Ranieri Mazzelli, visto que o então vice-presidente tinha
sido enviado em missão diplomática à China e também fora pego de surpresa
pelo ato de desesperado de Jânio Quadros.
No entanto, a possibilidade de o sr. João Goulart assumir o posto mais alto
do escalão político nacional, quando de seu regresso imediato do exterior, não
era bem vista pela elite política nacional.
Silva (2000) destaca que no momento em que João Goulart busca retornar ao
Brasil para assumir o posto que constitucionalmente lhe previsse a Constituição
Federal vigente, os ministros da guerra se manifestam que seria desaconselhável
o seu retorno imediato.
Tem-se, então, um período de crise política instalado no Brasil, que vai se
afirmando à medida que recebe apoio e conglomera forças em razão do seu
retorno e a sua posse efetiva, e aqueles que consideravam arriscado e inoportuno
a consolidação de João Goulart como presidente da república, visto a sua incli-
nação sindicalista e seu discurso alinhado a um posicionamento de esquerda.
Assim, havia aqueles que buscavam o impeachment de João Goulart
antes mesmo de sua posse e a consequente convocação de novas eleições,
e aqueles que consideravam que seriam necessários o retorno imediato e o
respeito à norma constitucional.
Nesse impasse, Silva (2000) destaca que a frente de apoio a João Goulart
incitava à população a resistência armada se preciso para garantir o cumpri-
mento do Texto Constitucional.

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B r a s í l i a : d e J K a o s m i l i t a r e s  19

Este processo de impasse entre forças que apoiavam a posse imediata de


Jango na presidência e aqueles que não desejavam ter uma presidência que
poderia ferir os interesses do grande capital ficou mais tenso com a manifes-
tação do III Exército. Tal manifestação vinha na direção de dar apoio à posse
do então vice-presidente, afirmando, ainda, que não obedeceria a uma ordem
contrária que não fosse a de garantir a posse de João Goulart.
Nesse sentido, acrescenta-se um elemento a mais na tensão naquele mo-
mento tendo apoio do comando do III Exército que, se preciso fosse entraria
em combate com suas armas para garantir a posse de João Goulart. Tal peso
era relevante à medida que esse exército tinha em mãos o comando das forças
armadas dos três estados do sul do país.
Silva (2000) destaca que outras forças dissidentes vão se aglutinando ao
movimento legalista, criando uma cisão com as forças armadas, que insistiam
em um discurso de união dentro das mesmas.
A solução diplomática encontrada para tal impasse, entre a possibilidade
iminente de uma guerra civil, foi a de alterar o sistema de governo brasileiro,
passando do presidencialismo para o parlamentarismo, em uma manobra de
garantir ao presidente por direito a sua cadeira, mas limitá-lo de seu poder,
que, para muitos, seria contrário aos interesses em jogo.
Assim pelo Ato Adicional, no dia dois de setembro de 1961, tem-se início
um período de parlamentarismo no Brasil, sendo acatado pelos Ministros Mi-
litares no dia quatro de setembro e garantindo a posse da presidência a João
Goulart no dia sete do mesmo mês.
No regime parlamentarista instituído, o presidente era o
chefe de Estado, mas não do governo. Não podia, assim
governar de fato, podendo indicar o primeiro ministro
chefe de governo, que deveria ser aprovado pelo legisla-
tivo (FERREIRA, 2009, p. 7).

Embasados pelo pensamento acima, temos, então, que o medo das elites
políticas nacionais sobre os rumos do governo brasileiro na presidência de João
Goulart, levou a um acordo que mudou o regime político nacional, cerceando
ao presidente os seus poderes e conferindo esse poder a um terceiro sob os
olhos atentos do Congresso Nacional. Estava, assim, instituído um regime par-
lamentarista no Brasil.

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20  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Enquanto regime político parlamentarista, a autora destaca que três primei-


ros-ministros assumiram seu posto, tendo entre eles a presença marcante de
Tancredo Neves.
Silva (2000) também oferece uma visão desse novo processo político
nacional, enfatizando que o acordo para evitar uma guerra civil e garantir a
presidência da república a João Goulart fez com que o governo brasileiro no
regime parlamentarista sofresse de certa lentidão para a tomada de medidas
que se referiam à nação.
O autor relata que diante dessa insatisfação e da morosidade, há então a
grande mobilização em torno da realização de um plebiscito que apontaria a
permanência ou não do regime parlamentar no país.
Na realização desse plebiscito, o resultado alcançado foi amplamente favo-
rável para o retorno ao regime do presidencialismo como modelo político para
o Estado brasileiro, conferindo, assim, os poderes de presidente da república
nesse regime para João Goulart ainda em primeiro de janeiro de 1963.
Assumindo o poder, conforme destaca Ferreira (2009), o então presidente
lança o Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico, que pretendia com seus
princípios, uma melhor distribuição da riqueza nacional, a redução da dívida
externa, o ataque aos latifundiários improdutivos e a contenção da inflação,
acrescida da manutenção do crescimento do país sem que isto afetasse, exclu-
sivamente, os trabalhadores.
O Plano Trienal foi elaborado por um economista, o sr. Celso Furtado, a
pedido do presidente, sr. João Goulart, ainda no ano de 1962, mesmo no re-
gime parlamentarista. Silva (2000) relata que a situação que se defrontava Celso
Furtado naquele período era preocupante.
A situação econômica com a qual se defrontara Celso
Furtado era bastante preocupante. No ano de 1962, a
taxa de crescimento do PIB reduziu-se a praticamente
metade da obtida no ano anterior, caindo de 10,3% para
5,2%. Paralelamente, a taxa de inflação saltara para além
de 50%, confirmando uma tendência de crescimento que
se apresentava desde 1958 (SILVA, 2000, p. 1).

De acordo com o autor, o Plano Trienal tem, em seu conteúdo, mais do


que apenas o planejamento econômico, mas detém o que se denominou de
Reformas de Base.

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B r a s í l i a : d e J K a o s m i l i t a r e s  21

As Chamadas Reformas de Base se constituíam em uma série de medidas


que deveriam ser viabilizadas no decorrer de sua gestão e que traziam conteúdos
nas áreas como do sistema de tributação, sistema bancário, da administração
pública e sistema universitário, mas, sem dúvida, a que mais chamava a aten-
ção era a destinada ao sistema agrário.
Bierrenbach (1981) destaca que no Plano Trienal, mesmo dado as ressalvas
de um plano alinhado ao sistema capitalista, se identifica a previsão de medidas
sociais, com destaque para a redistribuição de renda, educação primária, setor
de saúde, saneamento básico, e reforma agrária, que se constituía como um
dos oito objetivos básicos desse plano.

Para saber mais


Fragmento do Plano Trienal, segundo Furtado (1997, p. 8):
Eliminar progressivamente os entraves de ordem institucional,
responsável pelo desgaste de fatores de produção e pela lenta
assimilação de novas técnicas em determinados setores produti-
vos. Dentre esses obstáculos de ordem institucional, destaca-se
a atual estrutura agrária brasileira, cuja transformação deverá ser
promovida com eficiência e rapidez.

O Plano Trienal, composto no governo de João Goulart, ultrapassa o viés da


estabilidade econômica e de seu crescimento e dá um olhar mais genérico ao pro-
cesso de planejamento gestado até então no Brasil, conforme assinala Ianni (1986):
O Plano Trienal [...] foi o primeiro instrumento de po-
lítica econômica global e globalizante, dentre todos os
formulados até então pelos diversos Governos do Brasil.
Em comparação com os planos, programas, comissões,
institutos, departamentos e superintendências criados
pelos Governos anteriores, o Plano Trienal correspondeu
a uma fase mais avançada de elaboração conceptual e
analítica (IANNI, 1986, p. 209).

Dentre essas metas de seu planejamento, ressalta-se o combate ao processo


inflacionário, cortando os insumos para a importação de alguns produtos es-
pecíficos, como trigo e petróleo, e ainda evitando maiores despesas salariais
na administração pública.
Nas análises de Ferreira (2009), as Reformas de Base almejadas por Jango,
centravam-se na reforma agrária, na tentativa de manter o homem no campo,

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22  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

também se apresentava com relevância a reforma urbana, a qual visava à


questão das favelas e dos cortiços; não obstante também abordava a reforma
eleitoral, com um cunho principal de garantia de voto àqueles considerados
analfabetos.
A autora também afirma que seu conteúdo de reforma atingia a área educa-
cional, buscando o fim do analfabetismo e a elevação do número dos estabe-
lecimentos de ensino público em uma tentativa de democratização do ensino
brasileiro, como também contemplava as reformas tributárias, que tinha como
foco corrigir as eventuais distorções dos impostos empregados até então no Brasil.
Destacam-se, entre algumas medidas alcançadas pelo governo de João Gou-
lart ainda em 1963, a aprovação do Estatuto do Trabalhador Rural e a criação do
décimo terceiro salário. O Estatuto do Trabalhador Rural, aprovado em março
de 1963, regulava as relações trabalhista no campo, que até então tinha ficado
às margens dessas regulações, não retendo o devido tratamento para a questão.
Brumer (2002) destaca algumas medidas inclusas nesse estatuto, tal como
a criação e a legalização dos sindicatos rurais, o pressionamento para a obri-
gatoriedade da remuneração mínima regulamentada no Estado brasileiro, e a
criação do Fundo de Assistência e Previdência ao Trabalhador Rural (FAPTR)
que sofreu a falta de previsão orçamentária.
Na década de 1960 foram estabelecidas as primeiras
iniciativas para estender a cobertura previdenciária aos
trabalhadores rurais. A primeira dessas iniciativas, o
Estatuto do Trabalhador Rural, de 2 de março de 1963,
regulamentou os sindicatos rurais, instituiu obrigatorie-
dade de pagamento de salário mínimo aos trabalhadores
rurais e criou o Fundo de Assistência e Previdência do
Trabalhador Rural (FAPTR) (BRUMER, 2002, p. 5).

Nesse mesmo período, o governo de João Goulart já desagrada grande


parcela das elites, que se mobilizam no sentido de fazer frente a sua adminis-
tração, baseada em medidas de reforma que não vinham na mesma direção
almejada por elas, buscando, assim, criar um clima de instabilidade que tinha
como meta a derrubada de seu governo.
Nesse sentido, buscando essa instabilidade política, alguns grupos ligados
a organizações patronais e entidades empresariais são identificados nesse pro-
cesso, por exemplo, o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (Ipes), o Instituto
Brasileiro de Ação Democrática (Ibade), o Grupo Tradição Família e Propriedade
(FERREIRA, 2009).

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Essas organizações também não são as únicas que se apresentavam descontentes


com a direção dada na gestão do país pelo presidente Jango. Alguns governadores
de Estado, assim como alguns partidos políticos que naquele momento se encon-
trava em grande processo de fragmentação de seu sistema, e o Exército Maior das
Forças Armadas também se destacavam no intuito de derrubar o governo.
Buscando manter alguns aliados, João Goulart se aprofunda na defesa do
sindicalismo, como podemos ver no crescimento vertiginoso do número de
sindicatos no seu governo. É nessa década que temos a identificação de diver-
sas manifestações e organizações populares, sendo algumas mais alinhadas à
esquerda, somando força ao governo do então presidente.
Nesse período percebe-se também um grande fenômeno social, sendo este
identificado na existência de diversas Ligas Camponesas. Essas organizações
foram sendo percebidas em todos os Estados do nordeste e já iniciara a sua
proliferação no Estado de Minas Gerais, aglutinando milhares de trabalhadores
rurais em torno da luta pela terra e pela melhoria de vida do homem do campo,
se situando próximas às cidades para que aglutinassem o apoio de movimentos
populares urbanos como a União Nacional dos Estudantes. Essas organizações
foram determinantes para a conquista do Estatuto do Trabalhador Rural.
A União Nacional dos Estudantes (UNE) — organização de destaque na
classe estudantil, também se faz presente em suas reivindicações no início da
década impulsionada pela premissa de reforma em um sistema universitário.
Ferreira (2009), assinalando o processo de mobilização popular que passava
o país nesse período, destaca que nessa década é que também são identificadas
as Comunidades Eclesiais de Base (CEB). A autora destaca que essas comu-
nidades, que eram formadas nos diversos municípios, tinham como premissa
inicial discutir temas ligados à fé católica, tais como a simplificação dos cultos
e a aproximação da fé com a realidade do povo.
A reação de setores mais conservadores da Igreja Católica criticou a iniciativa
destas comunidades, o que levou à formação da Ação Popular (AP), um grupo
que vinculado às CEBs, que rompeu com a hierarquia presente na Igreja Católica.
O país ao final de 1963 vivia em pleno clima de instabilidade política, com
ameaças de greve geral, declarações de intenção de golpe, enfraquecimento
dos militares mais moderados e adesão de grande parcela da juventude em
assuntos políticos e a ideologias de esquerda.
Ferreira (2009) destaca que buscando apoio com as massas dos trabalha-
dores, o Presidente João Goulart conclama um comício agendado para o dia

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treze de março de 1964, na Central do Brasil no Estado do Rio de Janeiro. Nesse


comício ele solicita apoio da população para manter o seu planejamento nas
Reformas de Base.
O Comício contou com a participação de mais de 150 mil pessoas. Nele João
Goulart fez seu pronunciamento, onde destacou a ampla defesa de realizar o seu
planejamento de reforma estrutural no país, exaltando a democracia, a justiça
social, condenando a estrutura fundiária do Brasil, incentivando grupos como
camponeses, operários, estudantes, intelectuais e até mesmo militares na defesa
de suas reformas, condenando aqueles que falavam em um golpe de Estado e,
que em sua visão, não estavam comprometidos com o desenvolvimento do país.
Assim, em sua pronúncia, o presidente comunicou que nacionalizou al-
gumas refinarias de petróleo, como as de Capuava, Ipiranga, Manguinhos,
Amazonas e Destilaria Rio Grandense, exaltando o espírito que impulsionou
Getúlio Vargas na busca e nacionalização do petróleo.
Ainda no discurso da Central do Brasil, afirmou que desapropriou terras de
mais de cem hectares ao longo das rodovias, açudes públicos, ferrovias entre
outros, alegando que essas medidas não eram a Reforma Agrária desejada, mas
que se despontavam como iniciativas em direção a ela. Nesse discurso também
fala sobre reformas Constitucionais, relatando que não seria possível seguir
adiante com seu planejamento sem alterar a Constituição Federal do Brasil.
O discurso também fez alusão à reforma eleitoral pretendida, afirmando
a sua vontade de universalizar o voto a todos os cidadãos brasileiros acima
de dezoito anos, bem como reiterou o compromisso de lutar pela reforma
universitária. A questão da moradia também se fez presente em seu discurso,
afirmando que decretaria o congelamento dos abusivos preços dos alugueis.
Nesse clima de euforia com a conclamação de adesão a seu plano de
governo, João Goulart encerraria seu discurso. No entanto, esse discurso po-
tencializaria os seus opositores que também se manifestaram em direção a
demonstrar apoio popular em suas posições.
Depois desse comício, a batalha ideológica se ampliou;
no noticiário dos jornais, se intensificaram os boatos de
que Goulart — com o apoio do PCB, da CGT e das forças
políticas nacionalistas — preparava um golpe de Estado
(TOLEDO, 2004, p. 1).

Assim, ao lado de Jango estavam os sindicalistas ligados à CGT, alguns parti-


dos, como Partido Trabalhista Brasileiro, e Partido Comunista Brasileiro à UNE e

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às Ligas Camponesas. Na vertente contrária se identificavam as associações de


empresariado e patronais, a União Democrática Nacional, o partido Socialista De-
mocrático, o Estado Maior das Forças Armadas e a embaixada dos Estados Unidos.

Questões para reflexão


O que eram as Reformas de base e o que elas almejavam na gestão
de João Goulart?

Setores conservadores da Igreja católica também se posicionavam con-


tra as reformas introduzidas por Jango. Conforme Ferreira (2009), devido às
manifestações de João Goulart no comício de treze de março de 1964, esses
setores mais conservadores da Igreja Católica promoveram uma manifestação
que contou com o apoio de milhares de pessoas, e que ficou conhecida como
“Marcha da Família com Deus pela Liberdade”.
Essa marcha contou com a participação de mais de trezentas mil pessoas,
demonstrando que a oposição ao governo também gozava do apoio popular
e que o país se encontrava plenamente dividido em suas idealizações futuras.

Para saber mais


A Marcha da Família com Deus pela Liberdade tinha a finalidade de sensibilizar a opinião pública
contra as medidas tomadas por João Goulart. São identificados nesse movimento setores da
classe média que temiam uma frente e um avanço comunista e que se manifestavam favoráveis
à deposição do então presidente do Brasil.
Seus organizadores declaram que a Marcha era uma clara resposta ao Comício realizado na
Central do Brasil, se seguiram outras marchas, no entanto, sendo logo desarticuladas depois
do Golpe Militar que se sucederia em Abril de 1964.
Cerca de trinta entidades participaram do movimento, dentre elas a Campanha da Mulher pela
Democracia (Cade), a União Cívica Feminina e a Fraternidade Amizade Urbana e Rural. Contou
também com a participação do presidente do Senado, o sr. Auro Moura Andrade e Carlos
Lacerda, governador do estado da Guanabara.
A marcha percorreu as ruas de São Paulo e terminou com uma missa, em prol da “salvação da
democracia”. Nesse trajeto, foi entre um manifesto, “Manifesto ao povo do Brasil”, que con-
vocava a população a reagir contra as medidas de João Goulart.
Outra expressão desse movimento foi a Marcha realizada no Rio de Janeiro, que congregou a
participação de cerca de um milhão de pessoas no dia dois de abril de 1964, um dia após o golpe.

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26  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Diante das manifestações contrárias e a favor das medidas de Jango, a situa­


ção política estava se tornando insustentável e acabou por se agravar diante
das manifestações de um grupo de marinheiros na celebração de aniversário
de sua associação.
Esses manifestantes, compostos por soldados e suboficiais, desacataram a
ordem de seu almirante e realizaram sua manifestação nas sede dos Sindicatos
dos Metalúrgicos. A situação ficou ainda mais grave diante da adesão de um
grupo de fuzileiros que foi chamado para conter a manifestação e acabou por
aderir ao movimento.
Diante da negação de repressão da manifestação pelo governo de João
Goulart, o Ministro da Marinha, entendendo a manifestação como um motim,
se sentido deslegitimado, acabou por pedir demissão (TOLEDO, 2004).
As articulações de Jango, para frear essa crise, não se efetivaram e assim
começaram as mobilizações de seus opositores para a derrubada do governo,
o que viria a iniciar-se no dia trinta e um de março e se concretizaria no dia
primeiro de abril de 1964; sem maiores enfrentamentos das forças aliadas a João
Goulart, o seu governo acabou sendo derrubado, dando início a um período
que duraria mais de vinte longos anos de ditadura militar no país.

Atividades de aprendizagem
1. Segundo os autores que apoiam os conteúdos desta unidade, relate
sobre a relevância do serviço social no período do governo de Jânio
Quadros.
2. Com base nos pressupostos descritos nesta seção, descreva o que
foram as reformas de base.

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Seção 3  O Golpe Militar de 1964 e os governos


de Humberto Castelo Branco e
Arthur da Costa e Silva
A gestão de Jânio Quadros foi demasiadamente curta, mas determinante
para o processo histórico brasileiro. Sua personalidade forte e seu compor-
tamento intempestivo e imprevisível deixaram a marca de um dos últimos
gestores populistas. Diante da meteórica carreira política de Jânio Quadros,
que renunciou a presidência da república, João Belchior Goulart assume a
presidência da república.
Foi nesse clima de implementação das reformas de base que o país se po-
larizou entre aqueles que desejavam ultrapassar certas medidas conservadoras
e desenvolver uma administração pública, voltada aos interesses da nação com
um espírito mais nacionalista, e aqueles que viam na figura de João Goulart um
empecilho para a manutenção de seus interesses, conspirando, de forma inci-
siva, para a derrubada de seu governo.
Assim, o mês de março de 1964 se tornaria crucial para os rumos da demo-
cracia do país, sendo palco de apelos de adesão popular, ora para determina-
dos projetos de sociedade, ora em direção contrária a estes, em uma disputa
desinibida pela sensibilização da opinião pública.
Nesta seção também abordaremos o primeiro e o segundo governos da dita-
dura militar, concebendo o regime autoritário e supressor da democracia. Esse
período gestará medidas que apontam para um grande crescimento econômico,
no entanto deixará um legado de opressão e negação dos direitos sociais em
uma perspectiva mais universal.
Nesta seção estarão descritos apenas os aspectos mais relevantes para análise
deste livro, sendo necessário recorrer à ampla bibliografia especializada para
um melhor tratamento.

3.1 O Golpe Militar de 1964 e os governos de


Humberto Castelo Branco e Arthur da Costa e Silva
Temos que o não de 1964 revela uma situação de grande agitação na so-
ciedade brasileira. Provas de tais fatos são encontradas no Comício da Central
do Brasil e na Marcha da Família Com Deus pela Liberdade. E é aqui que as
forças contrárias a João Goulart se alinham decisivamente, colocando o final
de março como um divisor de águas para os rumos da sociedade.

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Assim, insatisfeita com a gestão de João Goulart, a direita conservadora inicia


sua organização para a derrubada do governo, tendo no grupo do General do
exército brasileiro, o sr. Castelo Branco, um dos que mais se destacava nessas
organizações.
No entanto, outros grupos também se empenhavam nessa tarefa, por
exemplo, o governador da Guanabara, que tinha à frente a pessoa de Carlos
Lacerda, e o governador de São Paulo, Adhemar de Barros, sendo este o apoio
de São Paulo.
O Estado de Minas Gerais era um dos mais importantes nas unidades da
federação e que contavam com uma articulação coesa entre as forças armadas
e o governo do Estado. Mesmo que se identifiquem focos de outras unidades
federativas com organizações contrárias a Jango, era em Minas Gerais o foco
mais propício para liderar o movimento contra João Goulart.
Como clima extremado entre oposicionistas e favoráveis, a gestão reformista
de João Goulart vai se adensando, criando um clima insustentável e pouco
favorável ao diálogo entre seus extremos. Nas reflexões dos grupos contrários
a Jango, não seria mais possível outra medida que contornasse a crise, a não
ser a retirada da pessoa de João Goulart do poder central do Brasil. Assim,
diante do clima de tensão na sociedade ficou determinado o dia em que as
tropas iniciariam sua marcha em direção à capital, a fim de depor o governo
de João Goulart.
O dia escolhido para tal ato foi o 31 de março de 1964. Todos esperavam
um combate, principalmente com relação às tropas do II Exército, sob o co-
mando do General Amauri Kruel, localizada em São Paulo, uma vez que esse
comando tinha determinações legalistas e se encontrava na condição de amigo
pessoal de João Goulart.
No entanto, contrariando as previsões de um combate armado e de uma
guerra civil, o II Exército aderiu ao levante ainda no dia 31 de março e enviou
também suas tropas ao Rio de Janeiro para a derrubada do governo.
Assim, caindo pouco a pouco sua resistência e apoio militar, sem que hou-
vesse combate real, João Goulart deixa o palácio no dia primeiro de abril de
1964, vagando a presidência da república. No dia dois de abril ocupa o cargo
de presidente do Brasil o deputado Ranieri Mazzili.
João Goulart e Leonel Brizola ainda acreditavam em uma resistência no Rio
Grande do Sul. Não vendo mais coesas as forças leais à legalidade, João Goulart
resolve abrir mão da resistência e deixa o Brasil no dia quatro do mês de abril.

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3.2 O Governo de Castelo Branco e o governo de


Arthur da Costa e Silva
Ferreira (2009) acrescenta que o golpe militar na justificativa de seus formu-
ladores consistia em reestabelecer a ordem e a democracia que estavam sendo
ameaçadas pelo espírito comunista que se levantava naquela gestão, no país.
Após a deposição de João Goulart, a presidência da república é assumida, mais
uma vez, pelo deputado Ranieri Mazzili, o qual permanece provisoriamente
até a posse de uma junta militar formada pelas três armas.
Essa junta que assumiu o poder interinamente, até que se estabelecesse um
governo que, ainda que provisório, pudesse ter perspectivas mais duradouras,
era composta pelo general Arthur da Costa e Silva (Guerra), pelo tenente bri-
gadeiro Francisco de Assis Correia de Melo (Aeronáutica) e o vice-almirante
Augusto Hamann Rademaker Grunewald (Marinha).
Os apoios ao golpe foram manifestados em tom de euforia na sociedade. Uma
versão da marcha Pela Família com Deus pela Liberdade foi realizada no Estado
do Rio de Janeiro no dia dois de abril, um dia após o êxito do golpe militar, e foi
denominada de “Marcha da Vitória”, concentrando quase um milhão de pessoas.
A alegria não vinha somente do afastamento do suposto comunismo que se
aproximava do país, mas também, era exaltada no sentido de alívio, em razão
da ausência de resistência armada para frear o golpe.
Verifica-se que um dos seus primeiros atos foi a decretação do Ato Insti-
tucional número um, “o AI 1”. Os Atos Institucionais, são decretos expedidos
pelo poder executivo que forneceram uma nova ordem política, administrativa,
ou jurídica, estabelecendo condições especiais acima da Constituição Federal
e colocando poderes excepcionais aos governantes (FERREIRA, 2009).
O Ato Institucional número um, AI 1, se referindo ao Golpe Militar de abril
de 1964, o intitula como um movimento civil e militar, denominando-o como
uma revolução e argumentando sobre tal perspectiva. Esse instrumento de opres-
são, arbitrado pelos militares e sendo o primeiro de muitos que se seguiram,
decretou nova data para a realização de eleições presidenciais.
Não obstante, o AI 1 também concedeu à Junta Militar plenos poderes para
cassar mandatos parlamentares e cargos públicos dos servidores. Também limitou os
parlamentares sobre matérias que exigiam elevação de gastos das despesas públicas
e concedeu poderes para decretar estado de sítio sem aprovação do congresso.
De acordo com Ferreira (2009), já no início do golpe de abril, algumas
medidas tomadas no governo de João Goulart, foram revertidas. Dentre elas

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podemos destacar a nacionalização das refinarias de petróleo, a desapropriação


de terras ao longo das rodovias, ferrovias e açudes.
Porém, a junta militar, composta interinamente, deveria ceder espaço para
outros militares. Em uma espécie de fantasia democrática, o Congresso Nacional
sem oposição em virtude das cassações operadas pelo AI 1 realizou a votação
para a escolha do novo presidente do Brasil.
Em votação em um Congresso esvaziado de oposições políticas, o nome
escolhido foi o de Castelo Branco, em uma amarração política com grupos
de direitas. Assim, eleito pelo Congresso em quinze de abril de 1964, Castelo
Branco assume a presidência do Brasil, sendo considerado, em certa medida,
como moderado, perante grupos que buscavam a ascensão ao poder.
O Governo de Castelo Branco almejava estabilizar a economia brasileira
e retomar o crescimento vivenciado na segunda metade da década de 1950;
para isso estabelece uma série de medidas que vão desde o arrocho salarial à
restrição ao crédito, passando pela alteração das remessas de lucros obtidas
no país para o exterior, na tentativa de atrair investimentos.
Essas medidas não agradavam a população, sendo identificados nesse período
protestos pela direção dada pelo governo tanto nos aspectos econômicos quanto
nas demais relações com a sociedade. É justamente nesse contexto que muitas
medidas sociais serão implementadas buscando contornar as expressões da
questão social e a mordaça antidemocrática presente na sociedade brasileira.
“Nessa medida, a ‘Política Social’ passou a ser destacada no planejamento
nacional e os serviços sociais utilizados como mecanismos de controle da
sociedade civil” (BIERRENBACH, 1981, p. 48).
É nesse governo que foram criados o Banco Central, o Banco Nacional de
Habitação (BNH), e ainda a criação do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.
O BNH tinha como missão fomentar a construção imobiliária que deveria ser
custeada com um fundo de contribuição de relações trabalhistas. Com rela-
ção ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, este vem em substituição à
estabilidade trabalhista vigente até aquele período, sendo, em grande media,
utilizado para o financiamento do BNH (BIERRENBACH, 1981).
Destacam-se nesse momento Decretos, Leis, Atos Institucionais e Emendas
Constitucionais que, na prática, deram a ele poder de cassação e suspensão
de direitos políticos de parlamentares, de professores e funcionários, além da
prisão de líderes sindicais e rurais, instalação de censura e extinção de parti-
dos políticos, em uma espécie de vigilância sobre as manifestações civis que,
porventura, poderiam ser contrárias ao golpe.

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O governo, na tentativa de “vigilância social”, incentiva a população a


realizar denúncia de todos aqueles que realizassem atos dos quais o governo
militar considerasse subversivo. Os jornalistas, por sua tonalidade mais crítica,
acabaram por se destacar entre os perseguidos. Um dos instrumentos utilizado
para apurar as denúncias de subversão ou corrupção era o Inquérito Policial
Militar, sendo utilizado no governo de Castelo Branco.
No entanto, um dos pontos que marcou o governo de Castelo Branco com
relação ao seu cerceamento das mobilizações sociais, se refere ao ato que
colocou na ilegalidade a União Nacional dos Estudantes. Assim, através da
Lei Suplicy Lacerda propunha a extinção dessa organização e colocava como
substituição a proposição dos Diretórios Nacional de Estudantes e os Diretó-
rios Centrais de Estudantes. Tal medida buscava frear uma das organizações
mais fortes e estruturadas do Brasil, que vinha exercendo pressão em prol de
adequações mais estruturais no país.
No entanto, mesmo com a ilegalidade decretada desde os primeiros anos
da ditadura militar, podemos identificar que a UNE não se cala em suas reivin-
dicações, se configurando como uma das grandes organizações que enfrenta a
truculência do regime militar, denunciando, com veemência, a mercantilização
da política de educação e a submissão dos interesses nacionais em razão dos in-
teresses privados e estrangeiros. Assim, suas mobilizações vão tomando as ruas,
com palavras de ordem e de exaltação ao reestabelecimento da democracia.
Não obstante, os trabalhadores também sofreram as pressões militares; mui-
tos de seus líderes foram presos. Também no campo, as perseguições se faziam
presentes; as Ligas Camponesas que lutavam por melhores condições de vida
no campo e ainda melhor distribuição das terras no país foram colocadas na
ilegalidade, e sua principal liderança, o sr. Francisco Julião, sendo presa, tendo
seus direitos políticos cassados.
Nesse clima de truculência elevada, a insatisfação vai crescendo; nas elei-
ções para governadores a população acaba por dar a vitória a vários políticos
de oposição que ainda se encontravam no cenário. Assim, os militares acabam
por endurecer ainda mais as relações com a sociedade, colocando em vigência
o Ato Institucional Número Dois.
O AI 2 que, entre outros aspectos, colocava que as eleições presidenciais
e para vice-presidente da república seriam realizadas de forma indireta e pelo
Congresso. Outro ponto é que o AI 2 extingue as diversas bandeiras partidárias
presentes no país até aquele momento.

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Assim, surgem dois partidos, sendo estes a Aliança Renovadora Nacional


(ARENA) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB). O primeiro congregava
aqueles favoráveis à política do governo e o segundo deveria abarcar todos os
políticos oposicionistas que a ditadura militar em sua maquiagem de mobili-
zação sócia, permitia agir, buscando dar a aparência de um jogo democrático.
Seguindo as arbitrariedades e se afastando de sua linha mais moderada,
cedendo ao ímpeto da concepção mais dura sob a hegemonia de poder militar,
Castelo Branco vai permanecendo no exercício da presidência, caracterizando
seu plano para estabilização econômica e consolidação do poder. Nesse sen-
tido, a exemplo das eleições presidenciais, o governo decreta no ano de 1966
o Ato Institucional número três, tornando também indiretas as eleições para
governadores e vice-governadores.
É no governo de Castelo Branco que se inaugura no Brasil a política de segu-
rança nacional, ao instituir a Lei de Segurança Nacional, que, na prática, repre-
sentaria uma vigilância sob os cidadãos, colocando como atentatórias à soberania
nacional várias ações que fossem opostas aos interesses do regime, não faltando
instituições para exercer a vigilância e ainda punir aqueles que se colocavam con-
trários ao regime, como é o caso do criado Sistema Nacional de Informação (SNI).
Ainda sob a influência de vigilância social e no sentido de retomar o cresci-
mento econômico e controlar a inflação, o governo estabelece, através do Ato
institucional número quatro (AI 4) a convocação do Congresso Nacional para
aprovação de um novo texto Constitucional, confeccionado pelos tecnocratas.
Essa Constituição que foi aprovada em 24 de janeiro de 1967.
O segundo governo da ditadura militar, instalada em 1964, é então presidido
pelo Marechal Arthur da Costa e Silva, que tomou posse em março de 1967,
com a tonalidade de continuar o combate à inflação e retomar o crescimento
econômico. Para tal lança o Plano Estratégico de desenvolvimento (PED).
Os elementos constituinte do conceito de desenvolvi-
mento, expressos no PED, são basicamente os seguintes:
Aumento e melhor utilização da capacidade de produção
nacional de bens e serviços por habitante; contenção da
inflação, mediante a criação de condições de relativa
estabilidade de preços; fortalecimento da empresa privada
nacional, sem qualquer discriminação à empresa estran-
geira ou ao capital externo; incremento a poupanças e
aos investimentos; reversão da tendência à estatização;
expansão das oportunidades de emprego; Fortalecimento
do mercado interno (BIERRENBACH, 1981, p. 62).

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Pode-se perceber que a visão de desenvolvimento se assenta em crescimento


econômico, não contemplando aspectos sociais e de melhoria de vida; quando
muito tais aspectos poderiam ser consequências dos objetivos descritos em
primeiro plano.
Muitos fatos marcam o governo de Costa e Silva; dentre eles destacam-se a
gestão de seu mandato sobre uma nova Constituição Federal, as manifestações
contrárias ao posicionamento da ditadura militar e a edição de instrumentos
de repressão do governo para se manter no poder.
Com relação à Constituição Federal de 1967, temos que esta se dá em um
contexto de extremo autoritarismo com busca legitimar ainda mais um Estado
não democrático. Temos que tal Constituição serviu de base para as relações
de Estado até 1988, quando é substituída pela vigente Constituição Federal de
1988.
Essa legislação confere legitimidade legal aos Atos Institucionais, estabelecia
a ampliação da concentração de forças para o poder Presidencial.
A Constituição de 1967 foi promulgada durante o regime
militar (1964-1985), que teve como características prin-
cipais a centralização do poder e a contenção das oposi-
ções políticas por meio dos Atos Institucionais (decretos
aprovados sem passar pelo Legislativo). Nesse contexto,
o texto constitucional responsabilizava diretamente o
Executivo pelas questões relativas à administração pública
e à segurança nacional.
Esta constituição ampliou o poder do Executivo, enfraque-
ceu o princípio federativo (reduziu autonomia política de
estados e municípios) e materializou o regime de exceção
dos militares por meio de medidas acessórias, estabeleceu
a pena de morte para crimes ligados à segurança nacional
e retirou o direito de greve e organização dos sindicatos
(BRASIL, 2012, p. 1).

Nesse clima de endurecimento do regime militar, dado por um espírito de


legalidade conferido pela Constituição Federal, cresce a insatisfação de setores
populares. No campo político temos a ascensão de um grupo de políticos que
instala um movimento intitulado de Frente Ampla, o qual buscava reestabelecer
o governo civil, soberania nacional, retomada do desenvolvimento econômico
e realizar algumas reformas estruturantes no Estado. No entanto, Frente Ampla
é extinta já em 1968.

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34  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Questões para reflexão


Considerando o contexto da ditadura militar, reflita sobre o que foram
os Atos Institucionais, e qual a tonalidades dos cinco primeiros Atos.

No campo das mobilizações e grupos civis, temos as manifestações da União


Nacional dos Estudantes, que mesmo na ilegalidade continuava suas ações.
Essa organização segue realizando suas manifestações de protesto. Denun-
ciava a tecnificação do ensino por meio dos acordos do governo brasileiro com
a agência americana — United States Agency for International Development
(USAID) — luta contra a privatização do ensino entre outras reivindicações
(SANFELICE, 2008).
Ferreira (2009) esclarece que o acordo firmado entre o Ministério da Educa-
ção e a USAID previa: eliminar as tonalidades políticas dos debates universitá-
rios; não desperdiçar investimentos públicos em pesquisas, uma vez que ficaria
mais barato adquirir pesquisas de países de primeiro mundo; incidir restrições
de investimentos em cursos como de ciências sociais, filosofia e história, uma
vez que estes não contribuíam para o desenvolvimento do país e formavam
intelectuais de esquerda; proporcionar investimento em cursos que pudessem
ser aproveitados pelas grandes empresas; medidas para que o ensino superior
fosse pago.
No entanto, esse processo de mobilizações e reinvindicações seria encer-
rado temporariamente na tentativa de realização de trigésimo Congresso da
UNE, o qual foi inviabilizado perante a força militar em Ibiúna em São Paulo
onde quase setecentos estudantes foram presos acusados de infrações perante
a Lei de Segurança Nacional. Contudo, a medida emblemática da repressão
da ditadura militar foi cunhada também no governo de Costa e Silva. O Ato
Institucional Número Cinco, o AI 5.
Decretado em 13 de dezembro de 1968, o AI 5 estabelecia um poder ab-
soluto ao governo federal; este poderia decretar o fechamento do Congresso e
ainda estabelecer estado de sítio, realizar intervenções em estados e municípios.
Poderia também suspender direitos políticos de qualquer cidadão.

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Brasília: de JK aos militares 35

Para saber mais


O Brasil teve, no seu último Regime da Ditadura Militar, cinco governos encerrando esse regime
em 1985 com o presidente João Batista Figueiredo, sendo realizado o processo para uma de-
mocracia em uma eleição indireta.

Atividades de aprendizagem
1. O que foi o último regime ditatorial no Brasil e o que ele interrompe
naquela conjuntura.
2. A tônica das prioridades do governo militar nesse período era conter
a inflação e retomar o crescimento. Nesse sentido, tendo os canais de
participação popular encerrados, como era pensada a política social?

Fique ligado!
Vimos nesta unidade que na década de 1950 temos um novo estágio do
desenvolvimentismo elevando o rol das indústrias de base no país.
Percebemos que o governo de JK se alicerçou em um processo de pla-
nejamento, cunhados no Plano de Metas, deslocou a capital do país
para a região central e contraiu um volume significativo de empréstimos
a ser saudado no governo de Jânio Quadros.
Vimos ascensão dos governos populistas e seu apelo para as interven-
ções nas áreas sociais, sem, contundo, romper com as classes abastadas
e mais influentes nesse processo.
Vimos que o governo de João Goulart busca implantar as Reformas de
Base no Brasil, o que gera insatisfação e das elites e corrobora para o
golpe militar.
Percebemos que o golpe militar implanta novamente um período de
autoritarismo e revela traços significativos de atentado aos direitos
humanos.

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36  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Para concluir o estudo da unidade


Nesta unidade o aluno pôde conhecer o contexto do final da década de
1950 e entrada da década de 1960, conhecendo as características gerais
do período do governo de Juscelino Kubitschek, o governo de Jânio Qua-
dros e ainda o governo de João Goulart.
Também visualizou, de forma genérica, a entrada da última ditadura
militar no Brasil, revelando suas características autoritárias e atentatórias
aos direitos humanos.
Conclui-se que não há intenção aqui de suprimir todos os contornos
dessa temática, dando apenas os conteúdos introdutórios para melhor
compreender a dinâmica que afetará o serviço social para as finalidades
deste livro.
O material que fala sobre tais aspectos é vasto e com ampla referência,
cabendo ao discente focar seus estudos naquelas características que mais
se direcionam aos seus objetivos.

Atividades de aprendizagem da unidade


1. Assinale a alternativa correta que corresponda ao cenário do final da
década de 1950 e início da década de 1960:
(  ) Temos que no governo de JK não se identificam alterações de
grande relevância na dinâmica econômica do país.
(  ) Temos que no governo de JK alterou-se com grande relevância,
a dinâmica social no país, implantando uma ampla política de
caráter social, sendo esta privilegiada nos orçamentos.
(  ) Temos que o governo de Jânio Quadros está classificado como
populista.
(  ) Temos que o governo de JK implanta em seu governo o Plano de
Metas, o qual os maiores símbolos foram as Reformas de Base.

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2. A década de 1960 traz grandes contribuições para entendermos os


contornos do serviço social; assim, nesse sentido, assinale a alternativa
correta que melhor identifica algumas de suas características.
(  ) Nessa década não se registram grandes alterações no cenário
político e social do país.
(  ) Nessa década são registradas grandes transformações no cenário
nacional, tais como renúncia de presidentes, implementação de
governos ditatoriais, efervescência da sociedade civil no início da
década, forte desempenho econômico e estabilidade inflacionária
ao final da década entre outras características.
(  ) Na década de 1960 não se registram atentados contra os direitos
humanos em grande escala no Brasil.
(  ) O governo de Castelo Branco com seu grande relevo democrático,
aprofundando as reformas de base.
3. Temos que o início da década de 1960 há a temática das Reformas
de Base. Com relação a essas reformas podemos afirmar que:
(  ) Tais reformas possuem um sentido antidemocrático, razão pela qual
o regime militar as interrompeu quando assumiu a gestão do país.
(  ) Tais reformas possuem um sentido democrático, razão pela qual
o regime militar as implantou na gestão do país.
(  ) Reforma agrária, reforma educacional, reforma tributária e reforma
eleitoral são alguns dos conteúdos propostos pelas reformas de base.
(  ) Tais reformas implantadas no regime militar contaram com o
apoio da grande maioria dos brasileiros, manifestos na Marcha
de Família Com Deus pela Liberdade.
4. Assinale a alternativa correta com relação às políticas sociais durante
o último regime militar brasileiro:
(  ) Durante o último regime militar brasileiro, podemos afirmar que
não foram propostas políticas sociais.
(  ) As políticas sociais, durante o último regime militar brasileiro, se
configuram pelo seu amplo sentido democrático e emancipador.
(  ) As políticas sociais, durante o último regime militar brasileiro,
conseguiram diminuir as disparidades sociais existentes entre as
classes no país.

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38  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

(  ) Apesar das grandes iniciativas de políticas sociais, durante o


último regime militar brasileiro, suas características foram a ex-
trema centralização na esfera federal, restrição de participação da
população na implantação e fiscalização destas, políticas sociais
utilizadas como controle do estado sob a população, fragmenta-
ção de suas iniciativas entre políticas distintas e burocratização
entre outras características.
5. Temos que no regime militar foram expedidos os Atos Institucionais.
Com relação ao Ato Institucional número cinco, assinale a alternativa
correta:
(  ) Foi lançado em 1956 no governo de JK, o qual precisava de apoio
do Congresso para implantar o Plano de Metas.
(  ) Foi uma legislação que aprofunda o processo de liberdade dentro
dos sindicatos, oferecendo maior autonomia a suas ações ainda
no governo de João Goulart.
(  ) Foi esse Ato que marcou um momento crítico no Governo de Jânio
Quadros, no qual decreta a nacionalização de algumas refinarias
de petróleo estrangeiras que atuavam no país.
(  ) Foi o Ato que ficou conhecido como o signo do autoritarismo
do regime militar, dotando o poder estatal na sua esfera federal.

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B r a s í l i a : d e J K a o s m i l i t a r e s  39

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40  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

SILVA, Ricardo. Planejamento econômico e crise política. Do esgotamento do Plano de


Desenvolvimento ao Malogro dos Programas de Estabilização. Revista de Sociologia
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Unidade 2
A erosão do serviço
social tradicional
Paulo Sérgio Aragão

Objetivos de aprendizagem: Busca-se nesta seção levar o discente


a compreender as características mais comuns que são identificadas
no início de nossa profissão no Brasil. Tais características são nomi-
nadas pelos mais expressivos intelectuais de nossa categoria como
“serviço social tradicional”.
Nesse sentido, compreender o dito serviço social tradicional é de-
terminante para que o aluno possa realizar um contraponto com
as possibilidades de ultrapassagem das medidas operacionalizadas
e compreendidas pela categoria profissional.
Deseja-se que ao final o discente tenha absorvido o tempo histórico em
que se gestam e se manifestam majoritariamente tais características,
bem como as tensões que levam a sua ultrapassagem, desembocando
no Movimento de Reconceituação do Serviço Social na década de 1960.
Nesta seção abordaremos o início da década de 1960 no Brasil, ressal-
tando os reflexos do gradativo desgaste do serviço social tradicional.
Espera-se do discente que compreenda o cenário político e social
desse período que irá lançar caminhos para alternativas profissionais
mais críticas que buscarão ao lado de setores mais progressistas es-
tabelecer um novo sentido a categoria profissional.
No entanto, entendendo que a sociedade se constituiu em um mo-
vimento histórico e dialético, ao passo que se manifesta uma crise no
interior da profissão, são identificáveis, ainda, posicionamentos profis-
sionais que, na tentativa de legitimar a profissão em um contexto de
intensas transformações e com viés desenvolvimentista, gestarão
alternativas transformistas para se inserir em um processo de desenvol-
vimento dentro dos parâmetros do capitalismo dependente do Brasil.
Assim, o discente deverá, ao final desta seção, estar dotado dos
conhecimentos desse processo histórico, que com a profissão ges-
tará posturas, compreensões e alternativas distintas apontando para
aspectos contraditórios e antagônicos, mas que em maior ou menor
medidas apontam para a superação do serviço social tradicional.

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Seção 1: O serviço social tradicional
Nesta seção será abordada a crítica ao dito serviço
social tradicional. Aqui o aluno encontrará as carac-
terísticas que acompanharam o serviço social por
longos anos, desde sua gênese até final da década
de 1950, entrando em uma erosão gradativa em que
se identifica processualmente com o Movimento de
Reconceituação.
Desse ponto em diante, o serviço social considera
que já não há mais como conter o desenvolvimento
da profissão, buscando superar o conservadorismo.
Perceberá que o contraponto com o tradicionalismo
estará presente com as perspectivas progressistas que
embasarão novas formas de intervenção na profissão.

Seção 2: Processo de renovação do serviço social


brasileiro
Aqui o aluno será levado a compreender que o pro-
cesso de erosão, do dito serviço social tradicional,
será construído gradativamente. Nesse espaço perce-
berá que a profissão antes mesmo do Movimento de
Reconceituação, não permanecerá inerte enquanto
percebe-se necessidade de mudanças, realizando
alterações com perfil mais progressista, se aproxi-
mando de outras profissões e estabelecendo um
contato mais próximo com o seu público. Percebe-se
que esse período conta com uma maior valorização
da profissão, trazendo para esta o papel de profis-
sionais ligados ao desenvolvimento.

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  43

Introdução ao estudo
Nesta unidade abordaremos as principais características do serviço social
realizado no Brasil até o final da década de 1950, destacando suas metodo-
logias cunhadas pelo perfil estrangeiro, com destaque para a influência da
Europa, que primeiramente influenciou a profissão e, em seguida, abordando
as perspectivas de influência Norte-americana com sua metodologia cunhada
pelo perfil funcionalista.
Assim, abordaremos, a priori, os aspectos débeis de metodologias rígidas
que não se adaptavam com a dinâmica sociopolítica da América Latina.
Nessa direção, ao aprofundar nessas análises, conheceremos as fragilidades
que levaram a uma crítica do serviço social tradicional, a qual se generalizou
por toda a América Latina, tanto interna, quanto externamente, levando a sua
superação ao longo da história.
Tal superação necessária para o serviço social não encontra terreno de
crítica restrito ao Brasil, mas sim, em todo continente latino-americano, com
destaque principalmente para os países do cone sul, como Argentina, Chile e
Uruguai, que, em conjunto com o Brasil, iniciam o denominado Movimento
de Reconceituação do Serviço Social.
Não obstante, também abordaremos nesta unidade as perspectivas em que se
dirigem a vanguarda da profissão, ora pendente para um viés conservador, ora
com viés mudancista, mas sempre direcionados para superação do tradicional.
No que toca às posturas que buscam a superação do serviço social tradicio-
nal, sem, contudo, realizar profundas alterações em seu sentido, veremos que a
proposta conservadora altera apenas a roupagem do serviço social tradicional,
mas não supera a essência de suas bases, pretendendo apenas se modelar às
condicionalidades que a época exigia. No entanto, tais alterações não entram
em conflito com as camadas mais conservadoras que circulam na profissão.
Na outra vertente de alterações profissionais, o que Maria Ozanira Silva e
Silva (2011) denominou de posturas mudancistas encontra-se um serviço social
questionador que não se contenta em mudar apenas sua roupagem, mas busca
um sentido mais crítico na profissão, entendendo que essa profissão deve supe-
rar o crivo das ideologias religiosas e também a fé em uma ideologia abstraída
da realidade, se vinculando, assim, com pensadores mais voltados à esquerda
e se mobilizando em favor das classes populares.

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44  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Seção 1  O serviço social tradicional


Nesta seção serão abordados as características gerais do dito serviço social
tradicional. Por essa denominação estamos nos referindo a um tipo específico
de prática profissional que se fazia presente até o final da década de 1950 e
que, gradativamente, irá perdendo força com a categoria profissional, sendo
alvo dessa superação por meio da realização do Movimento de Reconceituação.
Com isto, o aluno será levado a compreender que as transformações na
sociedade impulsionam essa profissão a um agir diferente, estabelecendo uma
crítica maior com os seus pressupostos e fundamentos teóricos.
Temos que o período onde se gestam tais transformações encontra-se imerso
por uma conjuntura de intensas mudanças, tanto nacionais como internacionais
e que vão incidir diretamente na categoria profissional, buscando ultrapassar
esse conservadorismo que está presente no serviço social tradicional.
São aspectos passíveis da crítica ao serviço social tradicional a sua vincu-
lação estreita com os aspectos confessionais que deram origem à profissão no
Brasil, bem como a frágil teoria onde se assenta, as quais não mais propicia-
vam uma maior compreensão sobre o movimento histórico e as expressões da
questão social.
Não obstante, também é encontrada a crítica à metodologia utilizada até então
pela profissão, uma vez que esta se configurava com a simples incorporação de
técnicas e transferência de metodologias de origem norte-americana, o que será
notado, ainda, em posturas mais conservadoras, que por um longo período —
mesmo com a crítica a elas — ainda serão utilizadas pelo serviço social.
A frágil produção teórica dessa profissão também é contesta, impulsionando
a categoria para oferecer maiores subsídios cunhadas pelo próprio serviço
social, que sirvam de embasamento para suas intervenções. Temos que até a
década de 1950 são poucas as produções talhadas pelos profissionais.
Com isso, entenderemos que o que está na base do Movimento de Recon-
ceituação, o qual levará a profissão a um novo estágio do seu desenvolvimento,
é o gradual desgaste desse serviço social tradicional.

1.1 O serviço social tradicional


Para compreendermos o processo com que o serviço social ultrapassa suas
metodologias e postulações alicerçadas em práticas contidas nos primórdios

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  45

dessa profissão, faz-se necessário entender a conjuntura sociopolítica que se


estabelece do final da década de 1950 em diante, dando ênfase do regime
militar que se instalou no Brasil após 1964.
A existência do Serviço Social somente pode compreender
e avaliar em seu próprio destino, localizando-o em cada
época. Essa localização no tempo como conhecimento
se chama histórica (KISNERMAN, 1980, p. 11).
Nesta última perspectiva, situamos o processo histórico
do Serviço Social, procurando um sentido efetivo para as
necessidades reais que no desenrolar do tempo produziram
seu movimento genético-dialético como processo de trans-
formação na relação homem-mundo. Não nos interessa
pois, apresentar uma cronologia de fatos nem uma soma de
documentos e datas. Interessa-nos, essencialmente, romper
mitos e analisar as ideologias com as quais seus conteúdos
foram desenvolvidos (KISNERMAN, 1980, p. 12).

Destaca-se para o autor a centralidade do processo histórico como deter-


minante para as mutações na sociedade e nesta está imbuída a profissão de
serviço social.
Para Kisnerman (1980) existem três formas de se fazer história. A primeira
se refere ao sentido de uma investigação, buscando conhecer os fatos, sem
entender o porquê das suas determinações, em um sentido puro, sem verificar a
intencionalidade dos fatos, o que aliena o processo de construção dos homens
nesse produto histórico, a sociedade.
Na segunda forma de se fazer história está a que busca alicerçar um
método com finalidades, porém sem compreender que a história muda e
que com ela as suas determinantes. Essa vertente não compreende, assim, o
movimento histórico.
Na última forma de visualizar e compreender a história está aquela que
procura um conhecimento das atitudes fundamentais do homem, buscando
compreender as causas que levam-no à ação. É nesse tipo de análise da história
que devemos focar este estudo, uma vez que assim, os fatos tomam sentido
como produção do movimento histórico dos homens no mundo.
Silva (1984), na mesma direção, argumenta que a compreensão da história
do serviço social somente pode ser apreendida se tomado o movimento histó-
rico, não apenas como uma cronologia de fatos.
Assim, ao dar ênfase ao movimento histórico da sociedade brasileira na-
quele período delineado, buscou-se dar a sustentação para correlacionar o

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46  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

movimento do serviço social nesse terreno, no qual este influi e é influenciado


como categoria profissional na divisão sociotécnica do trabalho.
Nesse sentido, parafraseando Silva (1984), o serviço social que tem sua emer-
são no Brasil nos anos de 1930 não deve ser estudado e compreendido como
um fato isolado em si mesmo, mas, sim, inserido nesse contexto histórico, na
compreensão dessas conjunturas em que se movimenta como produto histórico.
Assim, ao verificarmos a história do serviço social, identificamos traços
presentes principalmente ao longo da década de 1960 em diante, que são
determinantes para as postulações da profissão tal como a conhecemos atual-
mente, uma vez que o serviço social buscou nas exigências dessa autocracia
burguesa vigente após 1964 a sua funcionalidade dentro do regime militar,
como quem busca sustentação e justificativa para a sua legitimidade enquanto
profissão (NETTO, 2011).
[...] o Serviço Social no Brasil, até a primeira metade da
década de sessenta, não apresenta polêmicas de relevo,
mostrava uma relativa homogeneidade nas suas projeções
interventivas, sugeria uma grande unidade nas suas pro-
postas profissionais, sinalizava uma formal assepsia de
participação político-partidária, carecia de uma elaboração
teórica significativa e plasmava-se numa categoria profissio-
nal onde parecia imperar, sem disputa de vulto uma con-
sensual direção interventiva cívica (NETTO, 2011, p. 128).

Nesses termos de Netto (2011) não queremos enfatizar que o serviço social
não teria aqui conflitos anteriormente à década de 1960, porém queremos
destacar que seu período de maior processualidade de transformações se dá
a partir dessa data. É a partir de 1960 que se adensam as transformações na
profissão que são processadas por pressões intrínsecas e extrínsecas a ela, e
que se remetem ao conjunto maior das relações sociais vigentes.
Nesse sentido, temos que a gênese do processo de renovação da profissão
tem seu registro na intenção de laicização do serviço social, buscando se
afastar de seus credos religiosos que concebiam a profissão como um aperfei-
çoamento da caridade, de onde saem seus berços maquiando a questão social
das décadas de 1930 em diante (IAMAMOTO, 1982).
Essa laicização, ou seja, esse afastamento de sua vinculação com os credos
religiosos, é, sem dúvida, ponto determinante para entender o afastamento da
profissão com práticas reiterativas e ideologias que não explicavam o cenário
da época. No entanto, é necessário enfatizar que ainda que se iniciem no limite

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  47

de passagem da década de 1950 para 1960, é durante a gestão dos militares


que ela se efetiva mais veemente, ou seja, em plena década de 1960.
Netto (2011), ao abordar as transformações no interior da profissão, concebe
que a sua renovação durante a autocracia militar se faz em um processo de
globalidade em tom de pluralismo, o qual interfere em todas as partes cons-
titutivas do serviço social. Assim, não apenas pontos determinados e isolados
da profissão são contestados, mas sim, a sua globalidade, a profissão como um
todo é questionada naquele período.
Já no período anterior à autocracia militar empregada no Brasil após 1964,
percebe-se um movimento profissional diferenciado, com cunho alicerçado em
valores mais morais, veiculando-se mais pela intencionalidade do agente e com
pouca validação teórica. Nessas breves pontuações podemos perceber que as
características do serviço social tradicional apresentavam práticas reiteradas
em sua metodologia de intervenção, sem um aprofundamento teórico e com
cunhos ligados à religiosidade.
Kisnerman (1980) enfatiza como se deu a entrada do Serviço Social na Amé-
rica Latina, reafirmando que em um primeiro momento este se dá por influência
do continente Europeu, somente assumindo os contornos norte-americanos
gradativamente após a Segunda Guerra Mundial.
Na mesma direção temos a afirmativa de Silva (1984), quando esta se
dedica a analisar a formação do profissional de serviço social. A autora res-
salta que enquanto profissão, o serviço social inicia sua trajetória no Brasil
na década de 1930, sob influência do modelo franco-belga, com sua matriz
alinhada à igreja católica, sendo esta a impulsionadora do início dessa cate-
goria profissional no Brasil, buscando retomar a sua influência no Estado e
na classe trabalhadora.
Assim, foram os movimentos da ação social da Igreja que
deram origem à fundação das duas primeiras escolas de
Serviço Social no Brasil: a Escola de Serviço Social em São
Paulo, em 1936, e a Escola de Serviço Social do Rio de
Janeiro, em 1937, hoje ambas integrando universidades
católicas. Essas duas escolas lideravam a promoção do
Serviço Social no Brasil [...] (SILVA, 1984, p. 37).

Visualiza-se, assim, que o início da profissão no país vem alinhado à dou-


trina social da igreja católica que tinha naquele período a ênfase em princípios
“Tomistas”, buscando servir ao outro, tendo como centro das preocupações
a família enquanto célula de reprodução das relações sociais e embasada em

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48  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

uma prática assistencialista, com foco reduzido nas sequelas materiais e na


ótica capitalista.
No entanto, devemos conceber, que mesmo que alinhado a uma confissão
religiosa, as práticas dessa profissão deveriam dar a sustentação para as bases
do processo de industrialização que se iniciava no país, e com este a garantia
da reprodução das relações sociais.
Raichelis (1988) destaca que essa ação que se inicia no seio da Igreja Cató-
lica, como foco de influência ao operariado brasileiro, vai ganhando força com
o aparelho do Estado; os profissionais vão ser frequentemente requisitados por
esses para a reprodução das relações sociais ao proletariado.
Mesmo atrelado ao aparelho do Estado, a autora afirma que ainda que gra-
dativamente o nível de tecnificação da profissão vá se adensando, ele não se
distancia consideravelmente do benevolato e apostolado que lhe deu origem,
sempre vinculando a profissão à postura da ajuda veiculada na fé Católica.
A autora afirma que se revestindo de um instrumental técnico operativo
para que assim surtisse efeito no assistido, os profissionais daquele período vão
dirigir suas ações voltadas para o tratamento visando ao ajustamento social.
Há aqui a evidência de sua direção ideológica, dando a tonalidade técnica
para a interpretações das expressões da questão social, afastando o debate
político que o cerca e dando centralidade no tratamento para ajustamento a
uma ordem já estabelecida.
Assim, problemas de economia política são reduzidos,
muitas vezes, a questões morais e de assistência indi-
vidual, cujos os efeitos políticos são reduzidos, muitas
vezes, a questões morais e de assistência individual,
cujos efeitos políticos são revertidos para a perspectiva de
neutralizar os conflitos de classe, mistificando as causas
reais dos “problemas sociais” (RAICHELIS, 1988, p. 68).

No entanto, à medida que vai se legitimando a profissão no contexto do


capitalismo, a influência Europeia, que até aquele momento se dava como
referencia cultural global, vai gradativamente sendo substituída pela influência
norte-americana, isto a partir de 1945.
Tal postura vai se delineando, então, ao pós-guerra, à medida que o capita-
lismo vai se aprofundando no Brasil e reivindicando novos espaços e postura
de intervenção do estado.

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  49

Silva (1984), justificando a influência dessa corrente, destaca que tal pers-
pectiva se faz pela busca de influência econômica e cultural que os Estados
Unidos tentavam consolidar após a Segunda Guerra Mundial sob o continente
Latino Americano.
A partir desse período a intervenção do serviço social será cada vez mais
requisitada, uma vez que mesmo com a intensificação do processo capitalista
em nosso país, a taxa de exploração da força de trabalho somente se eleve, não
registrando ganhos reais a classe trabalhadora e tendo muitos dos sindicatos
sob os olhos e as mãos vigilantes do Estado.
Acrescenta-se aqui o adensamento das expressões da questão social também
influenciado pela imigração das zonas rurais para os centros urbanos, o que
vai agravando as expressões da questão social.

Para saber mais


Expressões da Questão Social — concepção de Marilda Iamamoto e Raul de Carvalho
A questão Social não é senão as expressões do processo de formação e desenvolvimento da
classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade exigindo seu reconhecimento
como classe por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida
social da contradição ente o proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de
intervenção mais além da caridade e da repressão (IAMAMOTO; CARVALHO, 1995, p. 77).

Raichelis (1988) afirma que, em razão dessas transformações, se faz necessá-


rio integrar a mão de obra ao processo de industrialização que vem se adensando
no Brasil, requisitando hábitos de subordinação à hierarquia que são exigidas
nas fábricas; o Estado vai se fazer presente em diversas ações que visam esse
controle, redesenhando, assim, as intervenções que vão sendo abandonadas no
campo da mera repressão nas reivindicações, sendo implementado o espírito
da colaboração entre as classes.
É aqui que se destaca a ênfase no planejamento para atingir um certo nível
de desenvolvimento defendido, tendo como ações dessa influência por meio
de programas de assistência técnica aos países subdesenvolvidos. Não obstante,
acrescenta-se a ênfase desse processo também ao retorno de assistentes sociais
que foram buscar especializações nos Estados Unidos.
Aqui essa corrente que invade gradativamente o perfil dos profissionais a
partir de 1945 se dá na construção de uma metodologia eficaz, que coloca a

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50  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

sociedade como harmônica, ausente de conflito, dando ênfase a um processo


um tanto quanto previsível de compreensão do mundo e a uma racionalidade
delineada de intervenção já determinada em seus moldes.
Esse enfoque dá o entendimento de desenvolvimento enquanto decorrência
das capacidades individuais e culturais e não de um processo mais complexo.
Nesses pressupostos, para explicação dos fenômenos sociais decorrentes,
e que incidem diretamente no Serviço Social, não se aceita uma tendência
ideológica para as ciências sociais esta deve se portar como neutra para que
seja concebida como válida, assim como o Estado é entendido como um órgão
gestor do bem comum.
Na orientação profissional de origem norte-americana, na operacionaliza-
ção do serviço social, dá-se a ênfase para os aspectos das comunidades e dos
grupos, sem, contudo, se ater para a análise macroestrutural e sua trajetória
histórica, focando-se para os comportamentos dos grupos e dos indivíduos. O
assistente social deveria possuir, essencialmente, a habilidade para a entrevista,
a observação e o questionário para que pudesse exercer a profissão dentro dos
parâmetros esperados (SILVA, 1984).
Aqui a orientação profissional vai gradativamente se deslocando do eixo
anterior delineada com os pressupostos tomistas de fundamentação católica
e passando a assumir uma linguagem instrumentalizada, com foco nos mé-
todos de trabalho e com embasamento funcionalista advindos da influência
norte-americana.
Temos que esse processo de entrada da influência norte-americana se dá
de forma gradativa, sendo registrada, ainda, até o final da década de 1950 a
grande ênfase presente com a influência franco-belga, presente nos primórdios
do serviço social no Brasil (SILVA, 1984).
Foi no âmbito da influência norte-americana que importa-
mos, progressivamente, os métodos de Serviço Social de
Caso, Serviço Social de Grupo, Organização de Comuni-
dade e, posteriormente, Desenvolvimento de Comunidade
(SILVA, 1984, p. 41).

Percebe-se, assim, a busca pelo aperfeiçoamento profissional da categoria


que se adensa com a influência norte-americana na América Latina, com ênfase
na tecnificação das intervenções profissionais, buscando suas bases científicas
a fim de superar a ênfase confessional que permeava o serviço social.

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  51

De forma genérica e abrangente, vimos as direções que embasavam a


profissão até a metade da década de 1950, com suas matizes ora tendente ao
modelo franco-belga e gradativamente se dirigindo para as influências mais
racionalizadoras e sistematizadas da prática profissional sob o peso da corrente
funcionalista e incidência norte-americana na profissão.
Assim, compreendendo que o serviço social tradicional é aquele que se efeti-
vou até o final da década de 1950, temos que as características deste se afirmavam
com foco confessional ou então tecnicista, sem inclinações políticas deflagradas
ou assumidas, não havendo grandes disputas de projeções no interior da profissão,
inclinando-se mais ao consenso, sendo seus modelos de intervenção com foco
no caso e no grupo, iniciando o trabalho comunitário sem, contudo, absorver
a crítica sob as macro estruturas do capital, sem espaço de maior legitimação
teórica de peso que sustentasse as suas práticas até então (NETTO, 2011).
O autor, se referindo ao desgaste dessas posturas profissionais conservado-
ras, destaca que esse processo de erosão do serviço social se dá por motivos
intrínsecos e extrínsecos à profissão, sendo as condicionalidades das motiva-
ções extrínsecas mais volumosas para as alterações das posturas profissionais.
Nessa direção, destaca que contribuindo para este processo de deslegiti-
mação gradativa do serviço social tradicional no Brasil, encontra-se o processo
de industrialização pesada, e suas decorrentes expressões da questão social,
as quais exigiam novas posturas profissionais, tanto pelo seu viés teórico que
os impulsionavam a iniciar uma reflexão mais macrossociais como pelo seu
viés interventivo. Em outras palavras, aquele serviço social executado até então
sob a influência franco-belga ou norte-americana não iria se sustentar frente as
expressões da questão social que surgiam naquele momento.
A incidência de inserção dos profissionais de serviço social em equipes mul-
tiprofissionais e um novo perfil iniciado pelo Estado brasileiro, se sustentando
nas intenções de planejamento para com as políticas públicas, vão contribuir
para erosão do dito serviço social tradicional.
Raichelis (1988) destaca que no início da década de 1960 registra-se um
adensamento quanto à participação popular, já deflagrado em linhas gerais na
Unidade 1 deste livro.
Netto (2011) afirma que diante dos desafios impostos pelo adensamento da
industrialização e dos seus problemas aqui extremados, gradativamente vai se
adensando as polarizações presentes na profissão.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 51 25/06/14 17:40


52  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Observa-se nessa base que há também tensões junto a ciências sociais, as-
sumindo correntes teóricas mais críticas e absorvendo o discurso da necessária
ultrapassagem do subdesenvolvimento a que estava submetido o continente
Latino Americano até aqui.
Esse processo de gradativa falência do serviço social tradicional, que no
Brasil vai se aprofundar com a ditadura militar, instaurada no final da primeira
metade da década de 1960, gesta polêmicas e conflitos no interior da profis-
são, não negando totalmente as posturas conservadoras e ao mesmo tempo
buscando inovar a profissão como um todo.
Netto (2011) destaca três elementos relevantes para entender a erosão do
Serviço Social tradicional no Brasil.
[...] despontam três elementos que são absolutamente
relevantes para detectar a erosão do serviço social tradi-
cional: primeiro, o reconhecimento de que a profissão ou
se sintoniza com “as solicitações de uma sociedade em
mudança e em crescimento” ou se arrisca a ver seu exer-
cício “relegado a um segundo plano”; em consequência,
levanta-se a necessidade “de [...] elevar o padrão técnico,
científico e cultural dos profissionais desse campo de
atividade”; e finalmente, a reivindicação de funções não
apenas executivas na programação e implementação de
projetos de desenvolvimento (NETTO, 2011, p. 139).

E é assim que forçado por aspectos internos à profissão, mas tencionado prin-
cipalmente pela conjuntura da época que o serviço social tradicional no Brasil
vem a ter suas bases de legitimidade questionadas, de onde não há mais espaços
para as práticas empíricas de cunho confessional, ou ainda de ações limitadas a
números restritos em modelos de intervenção em casos e grupos, necessitando se
reformular em diversos aspectos para ter a sua relevância profissional resguardada.
Faleiros (2005) também discorre sobre o tema:
A mobilização social e política da sociedade e a mobi-
lização interna dos assistentes sociais põem em relevo
a crise da profissão em meados dos anos de 1960: sua
desqualificação no mundo científico-acadêmico, sua
inadequação “metodológica” com a divisão em serviço
social de caso, serviço social de grupo e desenvolvimento
de comunidade e a ausência de uma teorização articu-
lada. Suas práticas mais significativas se faziam longe dos
graves problemas sociais, sem consonância com as ne-
cessidades concretas do povo. As ações de transformação
ficavam “à margem” (FALEIROS, 2005, p. 26).

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  53

Quanto ao Serviço Social Tradicional, temos a descrição de suas


características:
Este Serviço Social tradicional pode ser facilmente
caracterizado por seu desempenho profissional assis-
temático, intuitivo, carente de procedimentos técnico-
-científicos bem determinados e rigorosos, informado
por valores de cunho liberal, voltado à correção (numa
perspectiva claramente funcionalista) das chamadas
“disfunções sociais” e sustentado por uma concep-
ção (consciente ou não) idealista e/ou mecanicista do
universo social, somente compreendido enquanto uni-
verso social gerado pelo modo de produção capitalista
(NETTO, 1975, p. 1).
Mas enganam-se aqueles que pensam que esse processo de renovação
se deu apenas em território nacional. Netto (2011) afirma que esse processo se
deu em escala internacional em todos os países que detinha a profissão com
certa escala de relevância na estrutura sócio-ocupacional.
O autor destaca que com relação a essa erosão do serviço social tradicional
em escala internacional registra-se a crise de desenvolvimento do capitalismo,
que já na década de 1960 irá experimentar a interrupção das ondas de cresci-
mento que advinham do pós-guerra.
Isso posto, ocasionou uma mobilização das estruturas de classe em prol da
luta por garantia de seus direitos, sendo possível identificar demandas específicas
como as reivindicações ligadas aos direitos de negros, mulheres, jovens, defesa
de direitos emergentes como o lazer, a educação permanente, entre outros.
Netto (2011) explica que tais posicionamentos questionam a postura do
estado burguês. O autor afirma que este é o cenário mais adequado para as
contestações de ações como a do serviço social tradicional.
Ora, este é o cenário mais adequado para promover a
contestação de práticas profissionais como a do Serviço
Social “tradicional”: seu pressuposto visceral, a ordem
burguesa como limite da história é questionado; seus
media privilegiados, as instituições e organizações
governamentais e o elenco de políticas do Welfare
State, veem-se em xeque; seu universo ideal, centrali-
zado nos valores pacatos e bucólicos da integração na
“sociedade aberta”, é infirmado; sua aparente assepsia
política, formalizada “tecnicamente”, é recusada. Mais

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54  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

decisivo ainda: a sua eficácia enquanto intervenção


institucional é negada, a partir dos próprios resultados
que produz (NETTO, 2011, p. 143 ).

O mesmo autor aponta três vetores significativos para dar vazão a esse pro-
cesso de erosão do serviço social em escala internacional e que aproveitava
dessa conjuntura sociopolítica descrita anteriormente.
O primeiro se refere a uma necessária revisão crítica dentro do universo
das ciências sociais. Essa revisão afeta o embasamento científico da profissão
a qual mantinha a sua aproximação com a ciência sociais. Nesse sentido,
temos que um dos aspectos determinantes para a ultrapassagem do serviço
social tradicional é a revisão no interior das ciências sociais, buscando uma
postura a romper com as ideologias mais conservadoras.
Outro ponto destacado por Netto (2011), como vetor determinante para essa
erosão, diz respeito ao deslocamento sociopolítico de instituições que manti-
nham proximidade ao Serviço Social, dentre elas destacam-se principalmente
a Igreja Católica e algumas confissões protestantes.
Assim, essas organizações que mantinham estreito vínculo com a profissão,
se inclinavam em algumas de suas vertentes a correntes anticapitalistas e an-
tiburguesas. A Igreja, que até então mantinha laços intrínsecos com o serviço
social, identifica em seu interior, correntes que não legitimam a ordem vigente,
o que rebate diretamente no posicionamento da profissão.
E como terceiro vetor significativo para essa erosão do serviço social em
escala internacional, o autor destaca a relevância do movimento estudantil, que
dinamiza esses processos e força no campo da formação profissional a novas
bases de sustentação e intervenção.

Questões para reflexão


Reflita sobre os principais fatores que levam ao desgaste do dito serviço
social tradicional.

Como visto, o processo de erosão do serviço social tradicional não se


configura como um fenômeno singular da sociedade brasileira, mas ultrapassa
as fronteiras do território nacional, sendo este afetado por um movimento
de caráter mais global, onde essa profissão assume relevância no cenário
sócio-ocupacional.

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  55

Também é flagrante que essa renovação, a exemplo do movimento histórico,


não se dá em um patamar linear, mas assume vertentes e revela conflitos de
projetos profissionais.
Adiante entenderemos como esse processo de transformação se gestou no
Brasil precipitando a uma transformação que atinge toda a América Latina e que
foi denominado pelos estudiosos do tema como Movimento de Reconceituação.

Questões para reflexão


Com base no exposto nesta seção, e na Unidade 1, destaque as prin-
cipais características do dito serviço social tradicional.

Atividades de aprendizagem
1. O que é o serviço social tradicional?
2. Em que período histórico se dá a crise desse dito serviço social
tradicional?

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56  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Seção 2  Processo de renovação do serviço


social brasileiro
Considerando-se que o processo de alterações profundas sobre a profissão
se acentua após a década de 1960, mas que, como visto anteriormente, já
vinha se precipitando com as alterações lançadas para a laicização da profis-
são e impulsionadas por uma conjuntura favorável a mudanças até o final da
década de 1950, sinalizaremos aqui os rebatimentos de tais alterações, o que
levará a posturas distintas em cada realidade impulsionadas por um processo
de renovação que se dará na América Latina.
Evidencia-se no Brasil que a crise do dito serviço social tradicional buscará
ultrapassar a postura conservadora construída ao longo de sua história, se inse-
rindo em um cenário favorável para a profissão diante dos governos populistas
que estavam na gestão do Brasil naquele período e que irá se estender por
todo o contexto das décadas posteriores, revelando um desgaste gradativo
no modo tradicional de realizar o serviço social, ainda que a renovação em
seu primeiro momento dentro do Movimento de Reconceituação se expresse
também no limiar de uma postura conservadora.
Isto posto, o fato é que a profissão experimentará a construção de posi-
cionamentos e alterações de suas metodologias que apontam em maior ou
menor medida para a superação do tradicionalismo, ora com tonalidades e
teorias mais críticas, ora com posturas mais transformistas e teorias que apenas
alteram as molduras de suas interpretações, dependendo da configuração da
realidade de cada conjuntura, tendo tonalidades a princípio mais conservadoras
no Brasil e mais críticas nos países do cone sul da América Latina e somente
após o enfraquecimento do regime que se assiste a manifestação corrente de
uma postura crítica.

2.1 Processo de renovação do serviço social brasileiro


Assim, como afirma Raichelis (1988), esse processo de renovação do Ser-
viço Social é determinado pela conjuntura da época, que no Brasil passa pela
experiência do populismo, principalmente nas imagens de Jânio Quadros e
João Goulart, do desenvolvimentismo nacional, impulsionado por JK, e pela
relação que aqui se estabelece entre a sociedade civil e o Estado que mostrou
toda a sua tensão na década de 1960.

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  57

José Paulo Netto (2005), revelando os contornos que mostram o desgaste


do serviço social, destaca:
A segunda metade dos anos 1960 marca, na maioria dos
países em que o Serviço Social já se institucionalizara
como profissão, uma conjuntura de profunda erosão das
suas práticas tradicionais (e compreensivelmente, dos
discursos teóricos ou pseudoteóricos que as legitimavam).
No século passado, a transição da década de 1960 para
1970 foi, de fato, assinalada em todos os quadrantes por
uma forte crítica ao que se pode sumariamente, designar
como “Serviço Social tradicional”: a prática empirista,
reiterativa, paliativa e burocratizada, orientada por uma
ética liberal-burguesa, que de um ponto de vista clara-
mente funcionalista, visava enfrentar as incidências psi-
cossociais da “questão social” sobre indivíduos e grupos,
sempre pressuposta a ordenação capitalista da vida social
como um dado factual ineliminável (NETTO, 2005, p. 6).

O autor destaca que naquele período se experimenta uma efervescência


dos movimentos democráticos no país, principalmente na gestão do governo
de João Goulart, como visto na primeira unidade deste livro e que se encerrará
somente com a longa Ditadura Militar, que perdurará no Brasil por mais de 20
anos deixando marcas profundas na sociedade brasileira.
Raichelis (1988) também sinaliza que, contrariando os primórdios do serviço
social brasileiro, vê-se uma permeabilidade dentro da categoria profissional
de setores médios da sociedade que vão inserir-se nessa formação, o que se
revelou um fato novo para a profissão.
Tais contingentes apresentavam certo teor político não encontrado ante-
riormente na formação profissional, e que adivinha da ala de esquerda da
Igreja Católica. Esse fato é acentuado pelo deslocamento dessa instituição,
que naquele momento possuía orientações de alguns grupos se inclinando
para um maior contato com as classes populares, rompendo com a sistemática
hierarquia existente até então.
Esses setores viam na formação em serviço social a possibilidade de sua
manutenção financeira, o que até então não era percebido entre as principais
características dos discentes que procuravam o curso e que pertenciam, na
maioria das vezes, a classes sociais mais abastadas.
Não obstante, também é possível identificar com essa característica uma
elevação numérica nos quadros de formação profissional nessa década que
futuramente irá engrossar o contingente de profissionais.

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58  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

É possível, ainda, com essa inserção perceber uma mudança do perfil dos
seus discentes, o que, sem dúvida, contribuirá para erosão de um serviço social
tradicional que agora contará com um perfil de discente que visualizará, nessa
profissão, as possibilidades de sua manutenção, advêm de categorias mais
próximas àquelas classes com quem irá atuar diretamente, bem como terá um
maior contingente de alunos para defender seus posicionamentos.
Somente a título de exemplo, a autora destaca que em 1955 havia registrado
123 matrículas nas escolas de Serviço Social de São Paulo; já em 1960, esse nú-
mero se eleva para 200; e em 1965 são registradas 405 matrículas, isto já em um
cenário de contestação da categoria e uma recém-implantada ditadura militar.
A partir desse momento observa-se aqui, e não somente no Brasil, uma crí-
tica contundente ao dito Serviço Social Tradicional, ao qual não mais atendia
as demandas postas nessa década. No caso brasileiro, percebia-se um adensa-
mento da massa urbana e com isto a presença ainda maior das contradições
entre o capital e o trabalho.
Nesse período, já no II Congresso Nacional de Serviço Social realizado em
1961, percebem-se manifestações que impulsionam a decadência do serviço
social tradicional, conforme citação do livro de Marilda Iamamoto e Raul de
Carvalho (2000, p. 71-92).
Vejo como um imperativo categórico para nós, Assistentes
Sociais, a necessidade imediata de nos colocarmos em
sintonia com a hora que vivemos e, na atual conjuntura,
vincularmos o Serviço Social, integramos o Serviço So-
cial, corajosamente, no esforço comum pelo desenvolvi-
mento nacional, autêntico, democrático e solidário [...]

Percebem-se aqui a busca pelo desenvolvimento e a necessidade de inserir


o serviço social nesse processo. Mais adiante:
“A meu ver, é a hora do Assistente Social estar presente,
junto a outros técnicos, pondo a serviço do desenvolvi-
mento nacional — seja na comunidade local, no âmbito
de um município, de um Estado ou de uma região ou em
plano nacional — toda a sua capacidade profissional”
(Aylda Pereira Reis, O desenvolvimento e a organização
da comunidade como instrumento do desenvolvimento
nacional — 3 a Sessão Plenária).
“O Brasil inicia este ano, com dureza e aflição, mas cheio
de esperanças e de vigor físico, uma etapa histórica de
sua existência. Num instante como este, em que assume
o poder um governo tão profundamente marcado no

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  59

sentido ético e de preocupações humanas, o Serviço So-


cial precisa estar a altura de sua missão para participar
das decisões que traçam os nossos destinos” (Luís Carlos
Mancini, discurso citado) (IAMAMOTO; CARVALHO,
2000, p. 351).

Os autores ressaltam ainda que, em um Congresso de peso, as manifestações


vão no sentido de tornar imperativas as alterações na categoria profissional e
adequar o serviço social às exigências de um novo tempo. Seguindo nos relatos
contidos, vemos:
Ora, se o serviço social não quiser ser relegado a um
segundo plano, deve prepara-se para poder competir na
mesma igualdade de condições com os demais setores pro-
fissionais. As solicitações de uma sociedade em mudança e
em crescimento, como é o caso de nosso pai, são cada vez
maiores. Maiores, também, têm de ser as contribuições dos
profissionais, da técnica, da ciência. Este é o motivo pelo
qual se torna necessário de um lado aperfeiçoar o apare-
lhamento conceitual do serviço social e, de outro, elevar o
padrão técnico, científico e cultural dos profissionais desse
campo de atividade. Somente assim o elemento teórico e
os executores da política social poderão corresponder satis-
fatoriamente às exigências de uma sociedade em mudança
(IAMAMOTO; CARVALHO, 2000, p. 351).

E segue afirmando ser necessário que esse profissional seja inserido diante
de suas competências nesse estágio do desenvolvimento nacional:
Cumpre, pois, vincular estreitamente o serviço social
ao processo de desenvolvimento nacional e dar aos As-
sistentes Sociais, na área de sua estrita competência, as
atribuições que lhe são próprias e que ainda não foram
devidamente definidas. Nesse sentido, tanto o Serviço
Social como os profissionais dessa atividade devem de-
sempenhar na sociedade brasileira um papel pioneiro
e relevane no que toca ao desenvolvimento nacional”
(IAMAMOTO; CARVALHO, 2000, p. 351-352).

Destaca-se aqui uma reinvindicação para que o serviço social assuma


um ritmo de mudança e ocupe o seu lugar no processo de desenvolvimento
nacional, competindo em maior pé de igualdade com as demais categorias
profissionais nesse momento entendido por aqueles profissionais como singular.
Silva (1984) aponta que até a década de 1960, a influência da igreja Católica
sobre o serviço social continua sendo marcante, tendo ligações com sua teoria

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60  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

e com sua ideologia, bem como com algumas de suas unidades formadoras, no
entanto, não nega a permeabilidade e o deslocamento do modelo franco-belga
para o de influência norte-americana, com sua ideologia funcionalista e a ên-
fase para o desenvolvimento, isto já na década de 1940, o que vai ocasionar
um afastamento do caráter confessional e um adensamento do movimento
laico dentro do serviço social, sendo este também um dos fatores que impul-
siona a profissão para a mudança e a superação do serviço social tradicional.

Questões para reflexão


Entendendo o processo de desenvolvimento do serviço social, reflita
como se dá a influência do serviço social norte-americano no Brasil e
em que período inicia a sua influência?

A autora destaca que nesse momento o serviço social vai se alinhando ao


projeto desenvolvimentista brasileiro, atuando como foco principal de pro-
mover a participação da população nesse processo, neutralizando as tensões
decorrentes deste, utilizando-se para isto do planejamento e da coordenação
para atingir os fins que se deseja. Ou seja: levar o país a um processo de
desenvolvimento, ultrapassando a condição de país subdesenvolvido.
Examinando tais posicionamentos, não se encontra nos modelos franco-
-belga e norte-americano — até então presente na história do serviço social —
o posicionamento profissional no sentido de formular interpretações sobre a
sociedade e seus fenômenos de forma mais profunda, não oferecendo suporte
de interpretações de forma mais concisa, mas apenas dando a realidade uma
condição em busca de uma estabilidade natural a que deve se movimentar a
sociedade. Daí as afirmações de ajustamento do indivíduo ao meio, enquanto
um movimento que caminha para a normalidade.
Ao contrário de um posicionamento contestatório sobre as causas das ma-
zelas a que o serviço social intervém, tem-se nestas posturas não um conteúdo
de crítica e questionamento sobre as origens das expressões da questão social
compreendidas naquele período como problemas sociais, mas, sim, uma ação
centrada no processo de manutenção das estruturas vigentes na sociedade, como
se estas fossem naturais, cabendo ao serviço social um “ajustamento” daqueles
“desajustados”.

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Nesse sentido, e recordando-se da crise e luta ideológicas dentro das ciên-


cias sociais — as quais se constituem segundo Netto (2011) em um dos vetores
que impulsiona a erosão do serviço social tradicional — não mais encontrando
sustentação nas suas formas de atuação, e tendo a sua teoria questionada,
observa-se um questionamento geral sobre a profissão, que obviamente não
é anacrônico.
Aqui têm-se posturas diversas, mas que não negam o seu interrogar-se sobre
sua ação, que naquele período não apresentava respostas condizentes com as
reivindicações e que como vimos estava impulsionada a superação de seus
traços conservadores.
Em suma, diante de interpretações mais profundas que dessem conta de
explicar as contradições existentes, vê-se crescer na profissão uma insatisfação
com suas posturas.
A repercussão dessa nova tendência permite se questionar
a metodologia, objetivos e conteúdos da formação pro-
fissional, ocasionando certa crise ideológica no interior
de muitas escolas (SILVA, 1984, p. 43).

A autora destaca que se começa a esboçar junto a profissão, uma mobiliza-


ção da categoria dos assistentes sociais e, que será denominada posteriormente
de Movimento de Reconceituação do Serviço Social, o qual atingirá a América
Latina como um todo e não somente o Brasil, e que terá posicionamentos dis-
tintos de acordo com suas conjunturas.
Silva (1984) destaca que a realidade da América Latina, na condição de
continente subdesenvolvido, o qual terá uma revolução socialista, expressa em
Cuba, experimenta mudanças dentro das ciências sociais, se posicionando a
favor de posturas mais críticas, questionando a subalternidade imposta a esse
continente e reivindicando a ultrapassagem de tal condição.
Tais posturas irão proporcionar questionamentos que incidem diretamente
sobre as interpretações da sociedade e de suas contradições. Nesse sentido, o
continente irá ter um maior contato com correntes teóricas que veem na es-
trutura da organização da sociedade os motivos pelo atraso Latino Americano,
principalmente se alicerçando na teoria social crítica de Marx, e que possui
rebatimentos distintos para as alterações da profissão.
A autora, se referindo ao atraso manifestado nesse continente, destaca que
para conter essa insatisfação identificada nessas sociedades, os Estados Unidos,
na tentativa de manter a sua influência nesse continente, irão proporcionar uma

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62  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

elevação dos incentivos internacionais, com intensificação de campanhas de


apoio financeiro e cooperação.
Esse posicionamento se dará por meio de uma maior ênfase nos programas
de cooperação para o desenvolvimento de países subdesenvolvidos da Amé-
rica Latina. Tais programas irão buscar a ampliação da participação popular
nesse meio, aglutinando a força dos próprios usuários das ações, por meio
de programas de Desenvolvimento de Comunidade, sem, contudo, impulsio-
nar mobilizações de caráter político para tencionar alterações estruturais na
sociedade brasileira, como podemos perceber no Programa “Aliança para o
Progresso” do governo Kennedy.
Na mesma direção, Raichelis (1988) afirma que este processo de altera-
ções significativas no serviço social não pode ser interpretado somente com
as mobilizações conjunturais da sociedade brasileira, não sendo fruto apenas
de desdobramentos internos, mas deve ser compreendido no movimento da
sociedade, em um processo mais global.
Raichelis (1988) também afirma que é na antecedência do processo de crise
do populismo, com todas as suas mobilizações e efervescências da sociedade
civil, a qual, em grande medida, será encerrada em 1964, ou seja, em plena
gestão do governo de João Goulart que esse serviço social irá experimentar
posturas mais democráticas e que vão na direção de se opor ao modelo oficial
de desenvolvimento de comunidade.
Assumindo a tarefa de incorporar-se aos projetos de de-
senvolvimento experimentados nessa fase, alguns grupos
de profissionais passam a participar desse processo, prin-
cipalmente através de projetos de desenvolvimento de
comunidade (DC), denominada por Ammann (1980)
de “experiências ortodoxas de DC”.
O fato de a composição social do meio profissional alar-
gar-se de forma a incorporar contingentes oriundos das
frações médias da população parece acarretar alterações
que se relacionam não só com a busca de profissionali-
zação como meio de sobrevivência, mas também trazem
para o interior da profissão posições divergentes em rela-
ção à tendência dominante no serviço social (RAICHELIS,
1988, p. 76 e 77) .
A autora destaca que com esse processo, o serviço social irá absorver di-
versas fontes teóricas, se aproximando da proposta de Paulo Freire, sendo em
grande medidas alinhadas à postura do Movimento de Educação de Base.

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Há como já destacado, não somente a elevação quantitativa do número de


pessoas em processo de formação para essa categoria profissional, mas também,
a mudança do perfil profissional que será agora incorporado um contingente
oriundo das classes média, posição bem diferente do período da década de
1940 a 1960, uma vez que anteriormente, o número destes profissionais não se
apresentava tão expressivo, bem como a posição social ocupada pelos alunos
de serviço social era oriunda das classes mais abastadas da sociedade.
Percebe-se nesse período histórico no posicionamento do serviço social
uma tonalidade de reformismo nas propostas, a que também se propõem a
mudanças, no entanto, sem buscar alterações na essência da profissão.
Vê-se nesse momento, a partir do Comitê Brasileiro de Cooperação e In-
tercâmbio de Serviço Social (CBCISS) principalmente na realização do II Con-
gresso Brasileiro de Serviço Social, a ênfase da participação desse profissional
ao processo de desenvolvimento, buscando com esse profissional, inserir a
população nesse processo, principalmente através da recente organização de
comunidade presente no Serviço Social.
Em contraposição, também se identifica no interior da profissão outras ver-
tentes que vão se delineando posturas mais críticas com matizes de esquerda
que se alinham, de forma oposta, ao perfil de integração reformista de cunho
conservador.
Assim, seguindo essa luta por ideologias, o Serviço Social, aliando-se aos
posicionamentos das ciências sociais em suas correntes mais críticas, acaba
por descobrir a dimensão política de sua intervenção, o que até então era ne-
gada veementemente sobre o espectro de poder corromper sua dimensão de
cientificidade e assepsia junto a suas ações.
Essa consciência da dimensão política manifesta nas ações dessa profissão
que, na contemporaneidade, se apresenta com facilidade de compreensão,
custou a ser incorporada pelos profissionais, visto o receio de corromper a sua
cientificidade e colocar a profissão sobre uma militância.
É possível perceber, assim, nesse momento, emergir a concepção de questio-
namento de ideologias de embasamento da profissão do serviço social, entendo
que o seu modelo funcionalista de conservação das estruturas sociais, já não
poderia dar conta de posicionar suas intervenções com legitimidade nessa rea-
lidade, visto as expressões da questão social, o posicionamento e interpretação
do Estado e a incompatibilidade das tentativas de adaptação em uma sociedade
inadaptável com seus problemas estruturais, o que leva a identificar-se, nesse

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64  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

momento, um processo de rupturas com suas práticas conservadoras que dava


sustentação ao serviço social tradicional até então.
Está deflagrada, assim, a crise no interior da profissão, que terá o seu apro-
fundamento manifestado de forma maciça quando da inserção no Movimento
de Reconceituação na América Latina, sendo este considerado um grito de
libertação com as práticas conservadoras até então.
Silva (1984) afirma que, historicamente, o Serviço Social vem se colocando
ao lado das classes hegemônicas de poder, em direção oposta a sua clientela, em
uma relação contraditória, o que levou, ao longo da história, ao questionamento
dos objetivos e mesmo a interrogações sobre a própria natureza dessa profissão.
Isto equivale a dizer que o Serviço Social é demandado
por uma classe (a hegemônica) e, contraditoriamente,
dirige a sua ação profissional para a outra (classe subal-
terna) (SILVA, 1984, p. 36).

Aqui têm-se textualmente que o serviço social é uma profissão que, em sua
origem, é instituída por uma classe para atuar sobre outra classe, o que não
pode ocultar sua dimensão política.
Raichelis (1988) enfatiza que a profissão de serviço social não nasce de
uma reivindicação da classe trabalhadora ou de uma percepção de necessi-
dade dela, mas, sim, da iniciativa das classes dominantes, em um processo de
industrialização, onde há a necessidade de estabelecer controle social sobre
o operariado com a finalidade de inseri-lo no pensamento e modo de vida
burguês, dando suporte mínimo para a reprodução de suas relações sociais e
evitando, assim, conflitos.
É descritivo, dessa forma, o caráter contraditório da existência dessa profis-
são, colocando ao meio da década de 1960 um questionamento de sua origem
e finalidade, bem como as suas bases de sustentação, para então se projetar a
caminho de um rompimento com as velhas práticas ajustadoras.
Desde o final do governo de Juscelino Kubitschek, de 1960 a 1964, o Serviço
Social vem assumindo um papel de destaque no cenário nacional, admitindo o pro-
jeto desenvolvimentista nacional, mas vivenciando uma plena crise nesse período.
Essa tonalidade de governos desenvolvimentistas afetou também a profissão
que via na vertente da participação os mecanismos para se atingir o desenvolvi-
mento, tendo entendimentos diferenciados quanto ao conteúdo da participação.
Junta-se aqui as matrizes funcionalistas que embasam grande contingente
da profissão, onde devia-se integrar as pessoas que estavam disfuncionais ao

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  65

sistema, buscando um equilíbrio harmônico deste, próprios das teorias ajusta-


doras a que se sustentavam.
Não obstante, percebe-se também a concepção dualista de subdesenvol-
vimento que deveria ser ultrapassado pelos profissionais, em uma concepção
de antítese do moderno e do atrasado, buscando no seu interior a melhoria do
sistema, que se rebaterá na melhoria das condições da população (AGUIAR,
1985).
Assim, o serviço social vai assumindo posturas de alterações mais conserva-
doras — percebe-se que se têm, nesse momento, um processo de alteração na
categoria profissional que irá se manifestar de forma mais conservadora como
também posturas profissionais que irão se posicionar de forma mais crítica —
nessas posturas, e até aquele momento, nesse posicionamento não questiona
as relações sociais existentes em um sistema desigual e contraditório, mas, sim,
se preocupa com os efeitos que este sistema produz, apenas operacionalizando
políticas das quais sequer participou em suas formulações.
Tal posicionamento estava embutido em sua ideologia como em sua me-
todologia positivista, que vê a realidade como estática e não dinâmica. No
entanto, como bem já sinalizado, essa renovação se faz ainda em um período
de efervescência e de mobilizações políticas, que se posicionará contrária a
tais perspectivas.
A postura do Estado nesse período com seus governos populistas é determi-
nante, uma vez que este se coloca como o principal mobilizador do desenvol-
vimentismo, buscando atenuar os conflitos que possam impedir tal progresso e
confere papel de destaque ao serviço social como já sinalizado sobre a ocasião
do II Congresso Brasileiro de Serviço Social.
Percebe-se nessa visão que encharca as transformações conservadoras do
serviço social uma concepção de aceitação do Estado como árbitro neutro,
acima das classes, como um mediador imparcial, algo acima da sociedade.
Essa visão irá omitir as contradições existentes entre as classe e o próprio
Estado, e não irá considerar esse mesmo Estado como um espaço constituído
na sociedade capitalista, que, apesar de ser contraditório, é tendencioso a
atender as exigências da classe dominante, fato este exemplificado no golpe
de Estado de 1964 em que se coloca acima dos desejos da nação e impõem o
seu legado por mais de vinte anos de amarga gestão.
Assim, vamos identificando que longe de se constituir uma unidade de
posturas, os esforços para alterações visando à superação do dito serviço social

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66  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

tradicional, a profissão tomará caminhos distintos, ora sustentado por uma visão
conservadora, como acabamos de observar, ora posicionada por uma contesta-
ção nas formas de pensar e agir da profissão (SILVA, 1984).
Podemos afirmar, então, que diante dessa crise de legitimidade, a que já
descrevemos acima, em uma realidade de contextos distintos em cada país,
mas, que, porém, gozavam de uma determinante comum, — o subdesenvol-
vimento — o serviço social, em um movimento inicial, busca novas bases de
legitimação já no início da década de 1960, apresentando matizes conserva-
doras e mudancistas no Brasil.
Verifica-se, nessa conjuntura, um período de gestação
da consciência nacional-popular, com engajamento de
amplos setores sociais na luta pelas reformas estruturais e
reformas de base, com especial atenção para uma política
externa independente. Os processos de conscientização
e politização atingem operários e camponeses, estudan-
tes e intelectuais, com a presença das ligas camponesas,
sindicatos rurais, Movimento de Educação de Base (MEB),
Centros Populares de Cultura, Movimento de Cultura
Popular, Ação Popular e outros...
A repercussão desse processo sobre o Serviço Social
pode ser pensada a partir de duas vertentes mais gerais
em luta nesse período: a conservadora e a mudancista
(SILVA, 2011, p. 46).

Com relação às tendências conservadoras, temos que no espírito do desen-


volvimentismo nacionalista e da relevância assumida pela profissão naquele
período, tem a prática do serviço social tradicional negada sem, contudo, rom-
per com suas bases estruturais. Buscará nessas vertentes mudar o enfoque da
ação sem questionar as estruturas da sociedade, sendo absorvido pelo Estado.
Silva (2011) esclarece que o objeto se caracteriza nas disfunções individuais
e sociais, seus objetivos ainda se confundem com os objetivos institucionais;
no entanto, com relação aos seus embasamentos temos a substituição da
Doutrina Social da Igreja Católica pelas correntes psicológicas (positivismo e
funcionalismo), as quais, mesmo dotando o serviço social de um estatuto de
maior cientificidade, não rompem com o conservadorismo, mas irão permitir
um novo perfil profissional para a sua absorção pelo Estado.
Há uma ênfase para a sistematização dos processos de caso e grupo, ma-
nifestando mais a possibilidades de intervenções nas comunidades. Há aqui
uma grande busca pelo seu aperfeiçoamento técnico, sem, contudo, deixar as
questões relacionadas com o ajustamento.

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  67

O serviço social nessa postura conservadora centra suas ações para as dis-
funcionalidades dos indivíduos que possam ser obstáculos para o processo de
desenvolvimento, utilizando métodos isolados de acordo com a natureza de
cada intervenção, caso, grupo e desenvolvimento de comunidade.
Percebe-se, assim, que o serviço social vai buscar aprimorar os seus mé-
todos para então dar vazão à ênfase no desenvolvimento alinhado a posturas
funcionalistas requeridas nas políticas sociais daquele período.
Aqui não há mudanças profundas nesse perfil e, sim, um processo que
tende a ser ressignificado para dar sentido a essa profissão no cenário de de-
senvolvimentismo e fazer frente às demais profissões nesse momento de busca
do desenvolvimento.
O serviço social irá se inserir nos programas e políticas sociais implemen-
tadas pelo Estado e não raramente com incentivos internacionais — norte-
-americanos, como é o caso do Programa Aliança Para o Progresso.
É fato, porém, que nesse processo de renovação profissional, que não se
apresenta como uniforme, mas sim como um caleidoscópio de propostas,
percebem-se experiências mais críticas, que se apoiam na participação política
da população como meio de transformação, aliadas à prática do Movimento
de Educação de Base e às postulações de Paulo Freire (RAICHELIS, 1988).
Assim, se contrapondo à postura de renovação apenas superficiais, como se
manifestaram as formas conservadoras, na outra vertente, está uma perspectiva
mais mudancista, que busca romper com o Serviço Social conservador da ordem
vigente, se apoiando principalmente na ala de esquerda da igreja católica que
possuía seu alinhamento mais próximo às classes populares e rompendo com
a dura hierarquia da igreja naquela conjuntura.
Essa postura é identificada em menor número, porém pode ser compreen-
dida como um romper com as práticas conservadoras até então experimentadas
pelo Serviço Social.
Tivemos no período de 60 a 64 uma outra experiência de
Serviço Social. A experiência de um pequeno grupo de assis-
tentes sociais que partem de uma análise crítica da sociedade,
percebendo as contradições e a necessidade de mudanças
radicais [...] Nesse período, os assistentes sociais com-
prometidos, muitos partindo do posicionamento cristão
de esquerda, engajam-se no Movimento de Educação de
Base (MEB), organizado pela CNBB, que inicialmente em-
preende um trabalho alfabetização, passando depois para
a animação popular e para o trabalho de sindicalização;

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68  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

bem como no trabalho de Cultura Popular de Paulo Freire.


Nessa fase, exercerá também a influência marcante dos
estudantes de Serviço Social, a posição da Juventude Uni-
versitária Católica (JUC). Esse trabalho assumido por parte
dos profissionais em Serviço Social terá fim com o golpe
de 1964 (AGUIAR, 1985, p. 104).

Dentro do Movimento de Reconceituação, o qual decorrerá em um adensa-


mento de buscas de alternativas para superar o dito serviço social tradicional,
e que se iniciará no segundo terço da década de 1960, essa vertente — mu-
dancista — que a princípio se manifesta mais fortemente nos demais países da
América Latina, se apresentará no Brasil, no início da década de 1970.

Questões para reflexão


Após a leitura, reflita sobre o processo de transformações na categoria
profissional no começo da década de 1960 e busque sintetizar as carac-
terísticas das tonalidades conservadoras que se manifestaram em meio
ao processo de renovação da profissão, bem como também comente
sobre as características da vertente mudancista naquele período.

Porém, destaca-se que tal postura, que ao longo dos processos de transfor-
mação do serviço social brasileiro, irá se manifestar no Movimento de Recon-
ceituação em nosso país no início da década de 1970, onde se dá uma guinada
nos rumos profissionais no Brasil, atingirá primeiramente o campo acadêmico
e se espalhará por toda a profissão ao longo da década de 1980.

Para saber mais


Iamamoto e Carvalho (2000), destacam que na década de 1960, o serviço social estava em
destaque junto a gestão do país. Prova disto se configura no II Congresso Nacional de Serviço
Social, contando com a participação de membros do alto escalão do governo de Jânio Quadros
e exaltando a profissão nesta gestão, afirmando ser este profissional um instrumento a serviço
da democracia.

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A erosão do serviço social tradicional 69

Atividades de aprendizagem
1. Nesta seção vimos que o início da década de 1960 apresenta caracte-
rísticas que incidem diretamente na profissão de serviço social. Temos
que no início da década de 1960 identificam-se posturas mais conser-
vadoras e posturas mais mudancistas. Comente sobre estas afirmações.
2. Podemos perceber que a profissão vinha sentindo a crise do serviço
social tradicional desde o final da década de 1950. Esse processo que
se realiza antes do Movimento de Reconceituação não apresenta uma
linearidade e nem mesmo se faz de modo estanque?
3. Temos que as alterações na categoria profissional buscando superar o
conservadorismo, identificadas no Brasil no século XX, estão datadas
de um momento histórico, onde se registra também alteração do perfil
profissional. Descreva que momento elas ocorrem e qual a alteração
do perfil profissional e da formação dessa categoria que se identifica
naquela conjuntura.

Fique ligado!
Vamos retomar os temas abordados nesta seção:
Vimos nesta seção que o serviço social sente as alterações engendradas na
sociedade e acaba por ter as suas características tradicionais questionadas
em um ambiente de mudanças significativas, não podendo mais sustentar
as manifestações débeis a que se alicerçava o serviço social tradicional.
Abordamos, de forma geral, as transformações na sociedade nesse período,
concebendo o novo estágio do capitalismo nacional impulsionados pela
intensificação do desenvolvimentismo.
Percebemos ao final da década de 1960 que a sociedade estará sensível
às tonalidades populistas do governo de Jânio Quadros e João Goulart,
identificando aqui uma efervescência nas mobilizações populares e na
tonalidade democrática nas questões por elas engendradas trazendo um

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70 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

relevante papel ao serviço social veiculado em fórum de destaque da


categoria.
Identificamos que nesse processo de alterações o serviço irá tomar novas
posturas de atuação que vão na direção opostas, mas que expressam um
ambiente de intensa modificações na sociedade naquela conjuntura.
Assim abordamos a postura mais mudancista, alinhada a mobilizações
populares e posturas mais progressistas, se vinculando a novas formas
de realização do desenvolvimento de comunidade, fugindo à lógica
ortodoxa de suas intervenções e alimentando uma participação mais
democrática.
Outra forma de alterações também sentida naquele momento se refere a
uma postura mais conservadora, a qual não irá alterar significativamente
a essência do serviço social, mas apenas busca inseri-lo na lógica do
desenvolvimento requerido naquela conjuntura, reforçando seu signi-
ficado em meio a um alargamento da urbanização e do operariado.
Percebemos, ainda, que já no início da década de 1960 há uma altera-
ção do número de alunos inseridos na formação dessa categoria, bem
como há também a elevação de escolas de serviço social.
Também é identificada a alteração no perfil profissional, sendo este
agora, em grande mediada, permeável segmentos da classe média.
Vimos que essa alteração no perfil vai em direção não somente da qua-
lificação profissional para satisfações básicas de reprodução, mas irá
incidir ainda no posicionamento político da profissão, impulsionando
a categoria a romper com o conservadorismo.

Para concluir o estudo da unidade


Nesta unidade vimos o desgaste do Serviço Social diante das transformações
globais que não preserva o Brasil nem o continente Latino Americano, reve-
lando a ineficiência da profissão perante as novas expressões do capitalismo.
Assim, esse serviço social vai sendo ultrapassado e obrigado a altera-se para
evitar cair em um patamar de segundo plano, perdendo gradativamente a
sua relevância ante o processo de desenvolvimento do país. Nesta parte
do livro buscamos destacar que o processo de renovação profissional
já se inicia no começo da década de 1960, trazendo rebatimentos ao

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  71

longo dos anos para a profissão, se desdobrando em um processo de


alterações profundas na categoria a que denominamos de Movimento
de Reconceituação.
Aqui, destacaram-se as vertentes mudancistas e conservadoras, segundo
as denominação defendidas por Maria Ozanira da Silva e Silva, revelando
que, no início da década de 1960, temos contradições quanto aos rumos
das alterações da categoria profissional, destacando o momento de efer-
vescência das mobilizações populares e sua aproximação com as classes
mais subalternas, bem como revelou-se, ainda, propostas de alterações
que se sustentavam em uma modernização superficial, ressignificando o
serviço social para servir aos objetivos governamentais, sem, contundo,
alterar significativamente sua essência.
Temos que tais conteúdos aqui tratados devem ser aprofundados,
estimulando a dimensão investigativa da profissão com relação a suas
origens e desdobramentos. Com isso, indicamos algumas referências
indispensáveis no tratamento e na análise de tais temáticas, tais como o
livro de Marilda Villela Iamamoto e Raul de Carvalho — Relações sociais
e serviço social no Brasil — que se tornou um marco para todos aqueles
que desejam compreender as origens e significados de nossa profissão.
Indicamos ainda o livro de Maria Ozanira da Silva e Silva, intitulado: O
serviço social e o popular. Não obstante, outra referência de valor que nos
oferece bases para nossas análises está sustentada em Aguiar, com o livro
Serviço social e filosofia: das origens a Araxá. Trazemos ainda a referência
de Natálio Kisnerman com o livro Sete estudos sobre serviço social.

Atividades de aprendizagem da unidade


1. Considerando-se o processo de renovação profissional, temos que
o serviço social, antes mesmo de se inserir no Movimento de Re-
conceituação, irá, impulsionado pela erosão do dito serviço social
tradicional, revelar posturas profissionais distintas. Considerando-se
tal afirmativa, assinale a alternativa correta na questão.
(  ) As transformações na profissão impulsionadas pela erosão do
serviço social tradicional apresentará desde seu início apenas
posturas conservadoras e não democráticas.

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72  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

(  ) As transformações na profissão, embora não impulsionadas pela


erosão do serviço social tradicional, apresentarão desde seu início
apenas posturas progressistas e com grande apelo democrático.
(  ) As transformações na profissão impulsionadas pela erosão do
serviço social tradicional apresentarão desde seu início posturas
conservadoras e mudancistas.
(  ) As transformações na profissão impulsionadas pela erosão do
serviço social tradicional apresentarão desde seu início apenas
posturas com grande apelo democrático.
2. Com relação ao processo de alterações da profissão, é possível afirmar
que:
(  ) Embora identificado um desgaste no modo tradicional de intervenção
e concepção do serviço social, não há alterações no perfil profis-
sional, bem como propostas de ações de cunho mais democrático.
(  ) É identificado nesse processo de desgaste do serviço social
tradicional, mudanças significativas na sociedade, como por
exemplo o deslocamento da Igreja Católica para segmentos mais
populares, rompendo, em grande medida, com a hierarquia dessa
instituição, o que afeta diretamente a profissão.
(  ) As alterações do serviço social são impulsionadas apenas por
pressões em temáticas internas à profissão, tal como as necessá-
rias respostas de reforma curricular tensionadas pelos estudantes
desse curso.
(  ) As transformações na categoria profissional somente serão senti-
das ao longo da década de 1970, momento em que se percebe
o início da erosão do serviço social tradicional. Até aquele mo-
mento também não se identifica uma elevação significativa em
termos quantitativos e no perfil dos estudantes dessa formação.
3. Assinale a alternativa correta quanto a algumas características do
serviço social tradicional;
(  ) Temos que as características do serviço social tradicional se confi-
guram como práticas paliativas e reiteradas, com assepsia política,
fragilidade teórica, metodologia importada e não adaptada para
a realidade latino-americana.

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  73

(  ) Temos que as características do serviço social tradicional se confi-


guram como práticas emancipadoras, com claro posicionamento
político assumido, forte embasamento teórico, metodologia pró-
pria e em consonância com a realidade latino-americana.
(  ) Temos que as características do serviço social tradicional se confi-
guram como práticas paliativas e reiteradas, com claro posiciona-
mento político, forte produção e embasamento teórico, metodolo-
gia importada e não adaptada para a realidade latino-americana.
(  ) Temos que as características do serviço social tradicional se
configuram como práticas emancipadoras, com assepsia política,
fragilidade teórica, metodologia importada e não adaptada para
a realidade latino-americana.
4. Tendo por base o processo de intensificação na categoria profissional,
é correto afirmar que:
(  ) Este processo tem sua emersão no início da década de 1950,
absorvendo, de imediato, uma postura crítica que irá romper
definitivamente com o serviço social, inaugurando, assim, uma
nova experiência na categoria denominada de serviço social
tradicional.
(  ) Este processo tem sua emersão no início da década de 1970, absor-
vendo, de imediato, uma postura crítica com base fenomenológica
que irá romper definitivamente com o serviço social, inaugurando,
assim, uma nova experiência na categoria denominada de serviço
social crítico.
(  ) Este processo tem sua emersão no início da década de 1960, ab-
sorvendo, de imediato, uma postura crítica de raiz neotomista, a
qual, por falta de maior apropriação dessa teoria, não conseguirá
romper definitivamente com o serviço social tradicional.
(  ) Este processo tem sua emersão ao final da década de 1950 e início
da década de 1960, gestando posturas profissionais distintas sendo
essas mudancistas e conservadoras.
5. O processo de renovação profissional se adensa no século XX trazendo
novas perspectivas para a atuação profissional. Assim, com respeito
a esse tema assinale a alternativa correta:

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74  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

(  ) Neste processo percebe-se um aprofundamento da laicização do


serviço social, o que também aponta para um desgaste do dito ser-
viço social tradicional.
(  ) O serviço social tradicional não executava suas ações baseado
na trilogia caso, grupo e comunidade.
(  ) Podemos afirmar que a aproximação com a teoria neotomista
afasta o serviço social de suas características conservadoras,
impulsionando este para a implementação de um serviço social
crítico, o qual ficou conhecido como serviço social tradicional.
(  ) O serviço social tradicional possuía sua teoria alicerçada no
marxismo, contemplava práticas emancipadoras e uma ampla
literatura específica da categoria profissional, o que lhe conferia
credibilidade com as demais profissões.

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A e r o s ã o d o s e r v i ç o s o c i a l t r a d i c i o n a l  75

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Serviço Social & Sociedade, n. 84, São Paulo: Cortez, 2005.
IAMAMOTO, Marilda Vilela; CARVALHO, Raul. Relações sociais e serviço social: esboço de
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NETTO, Edméia Correia. Profissão: Assistente social [on-line]. São Paulo: Unesp; Cultura
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NETTO, José Paulo. Desafio Al Serviço Social. Buenos Aires: Humanitas, 1975.
______. O movimento de reconceituação. 40 anos depois. Revista Serviço Social &
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RAICHELIS, Raquel. Legitimidade popular e poder público. São Paulo: Cortez, 1988.
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do Projeto de Ruptura. 7. ed. São Paulo: Cortez. 2011.
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Unidade 3
O serviço social no
capitalismo
Paulo Sérgio Aragão

Objetivos de aprendizagem: Pretende-se com esta unidade


proporcionar ao discente o conhecimento sobre o adensamento
do processo de renovação, adentrando pelo continente latino-
-americano que questiona a sua histórica condição de submissão
aos ditames imperialistas que incidem sobre ele e nessa conjuntura
atinge o Brasil de modo particular.
Nesse sentido serão abordadas as razões que levam a profissão a
buscar a sua superação, bem como os contornos distintos em que
se enveredaram o Brasil e os países do eixo sul do continente, mais
especificamente, Argentina, Chile e Uruguai, tomando caminhos
distintos em conjunturas específicas.
Abordaremos nesta unidade as perspectivas que se gestaram
nesse processo de renovação da profissão no Brasil, destacando as
perspectivas modernizadoras, a reatualização do conservadorismo
e sucintamente a intenção de ruptura, visto que tal conteúdo, que
se apresenta de modo mais crítico, será objeto de nossas análises
no próximo semestre.
Assim, espera-se que ao final desta unidade o discente possa gozar
de referências sobre o processo de renovação da profissão e seus
contornos distintos, que, como já destacado, não se apresentam de
forma idêntica entre os países da América Latina, tendo em face suas
particularidades históricas, se apresentando no Brasil de modo mais
conservador se comparado aos demais países da América Latina,
visto a conjuntura de autoritarismo do Brasil.
É também nesta unidade que o aluno será convidado a apreen-
der sobre as manifestações do Movimento de Reconceituação na
realidade brasileira. Serão discorridas aqui mais detalhadamente
as perspectivas que predominaram neste processo de renovação
profissional, destacando suas características e o momento histórico

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em que se manifestam, principalmente com relação à perspectiva mo-
dernizadora, que até hoje possui influência significativa nas camadas
profissionais, conservando traços do dito serviço social tradicional.
Assim, espera-se que ao final desta unidade, o discente tenha absorvido
esse processo histórico, compreendido as características específicas de
cada perspectiva, principalmente a perspectiva modernizadora, identi-
ficando as suas contribuições para a profissão e seus retrocessos, bem
como a herança a que deixou nas suas estruturas, de modo que possa
distinguir entre posicionamentos mais conservadores e aquelas posturas
mais críticas que se direcionam para defender um estatuto profissional
alinhado aos interesses das classes subalternas.

Seção 1: O movimento de reconceituação do


serviço social
Nesta seção iremos abordar o Movimento de Re-
conceituação do Serviço Social, entendendo que
esse processo sinaliza um período singular para o
serviço social. Esse processo se caracteriza como
essencialmente latino-americano, revelando que
ao longo da década de 1960 o serviço social não
mais irá conceber um alinhamento sistemático com
as práticas orientadas pela tradição europeia e/ou
norte-americana.
Esse movimento simboliza um marco para a categoria
profissional nesse continente, apontando para prá-
ticas que irão superar, em grande medida, o conser-
vadorismo, mas que devido à conjuntura específica
de cada sociedade se manifestará de forma distinta,
apresentando no Brasil, em seu início, traços mais
conservadores diante da ditadura militar instalada
em 1964.

Seção 2: O movimento de reconceituação na


América Latina
Nesta seção o aluno será levado a reconhecer que
apesar de uma partida em comum que marcou em

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1965 o divisor de água do serviço social latino-
-americano, o qual significou um grito na categoria
profissional na direção do rompimento com práticas
conservadoras, o Movimento de Reconceituação terá
posicionamentos e desdobramentos distintos em
cada conjuntura na América Latina.
Nesse continente, principalmente nos países mais ao
sul do Brasil, sua postura será mais crítica, buscando
romper desde o início de tal movimento com as
práticas conservadoras, tendo em suas conjunturas
cenários mais libertários ao contrário do Brasil.

Seção 3: A perspectiva modernizadora


Aqui o aluno encontrará a descrição do Movimento
de Reconceituação na sua particularidade brasileira.
Nesse sentido, com base nas análises de José Paulo
Netto (2011) e demais autores, sinalizamos os traços
significativos da perspectiva modernizadora, perce-
bendo que tais traços representam a busca por uma
renovação profissional, porém sem romper definiti-
vamente com os traços do serviço social tradicional.
É perceptível nessa perspectiva a busca de altera-
ções, sem, contudo, romper definitivamente com
os traços do dito serviço social tradicional. Aqui a
profissão irá buscar se inserir dentro do processo de
desenvolvimento impulsionado pela ditadura militar,
ressignificando seus métodos, mas não revisando a
sua intencionalidade e o atrelamento ideológico.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 79 25/06/14 17:40


80  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Introdução ao estudo
Nesta unidade o discente encontrará o adensamento do processo de reno-
vação da profissão, sendo este consolidado em um movimento que se inicia
no segundo terço da década de 1960 e se expande pelo continente latino-
-americano, tomando proporções e caminhos distintos em cada país, de acordo
com as conjunturas sociopolíticas específicas, que no Brasil vivencia o pleno
autoritarismo da ditadura militar iniciada em 1964.
Assim, estaremos aprofundando os contornos do Movimento de Reconceitua-
ção do Serviço Social, que apesar de possuir o ponto de partida unívoco, assume
posturas diferenciadas no Brasil se comparado aos países do cone sul do conti-
nente latino-americano, principalmente países como Uruguai, Chile e Argentina,
que experimentarão, em seu início, um posicionamento bem mais contestador.
Passaremos a abordar as características desse movimento na América Latina,
concebendo a sua tonalidade mais crítica e com inspirações marxistas, bem como
nos dedicaremos, com maior grau de detalhamento, aos seus contornos no Brasil.
E como determinante para a compreensão das matizes que levaram adiante
a renovação do serviço social, abordaremos a perspectiva modernizadora e seu
atrelamento ideológico ao regime militar, bem como sucintamente destacare-
mos a perspectiva de Reatualização do Conservadorismo e ainda a perspectiva
de intenção de ruptura, apoiadas sobre tudo nos conhecimentos emanados
por José Paulo Netto, o qual nos oferece grande recursos para desenvolver
nossas considerações.

Seção 1  O movimento de reconceituação do


serviço social
Nesta seção abordaremos as características gerais do dito Movimento de
Reconceituação. Destaca-se que tal movimento, ao longo da história da profis-
são, se configura como um marco no desenvolvimento profissional, assumindo
posturas de renovação de diversas matizes.
Aqui será exposta a conjuntura histórica que levou ao Movimento, bem
como as determinantes que impulsionaram seu desdobramento. O aluno será
levado a compreender que esse processo não apresenta uma linearidade e nem
se faz por meio de leis e decretos que condicionam a categoria profissional a
determinados posicionamentos na história.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 80 25/06/14 17:40


O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  81

Aqui o entendimento deve se desenvolver no sentido de perceber o movi-


mento histórico, multideterminado, composto de opostos que buscam legitimi-
dade, com determinados coletivos que historicamente vão se sobrepondo, bus-
cando uma hegemonia no modo de pensar e agir junto a categoria profissional.

1.1 O movimento de reconceituação do serviço social


Faz-se necessário dizer que até aqui estudamos as condicionalidades que
levaram o Serviço Social a se metamorfosear, chegando a um movimento geral
de transformações, o Movimento de Reconceituação.
Sem esta leitura obrigatória, adensada na seção anterior, a tarefa de com-
preender as origens da profissão e seu significado histórico pode perder a sua
essência, se mostrando apenas como uma sequência de fatos esvaziados de
seus significados e, sem o qual, não nos encontraremos na tarefa de realizar o
exercício profissional de modo crítico e com o impacto social — resguardado
suas proporções — que ela pode atingir.
Não podemos esquecer também que diante do movimento histórico que
temos na profissão, seu desenvolver deixa particularmente difícil a construção
de esquemas práticos para visualização dessa renovação, o que nos impele a
fugir de representações lógicas e esforçar-nos a compreender o movimento da
sociedade e nela a profissão imersa, não sendo possível estabelecer marcos
precisos de início e fim de cada vertente que se apresenta dentro das alterações
do serviço social, mas, sim, compreendendo esse movimento multifacetado
que constitui o chão da história.
Com isto, queremos enfatizar que mesmo diante da predominância de
correntes teóricas e metodológicas em cada período, esse processo não se dá
automaticamente, sofrendo sobreposições, avanços e retrocessos ao longo de
seu desenvolver (NETTO, 2011).
Mesmo assim delimitamos correntes de renovação da profissão, algumas
referências históricas com suas delimitações de períodos, onde ecoam com
maior vigor determinadas matizes que iremos expor, sempre baseados nos au-
tores mencionados nesta obra, não podendo, no entanto, serem interpretadas
de forma estanque e com cortes de continuidade.
Assim, temos que dentro desse processo de renovação, na específica con-
juntura brasileira, que a autocracia burguesa acaba por precipitar o conteúdo de
renovação da profissão, tendo esta assumido, no processo de desenvolvimento

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82  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

econômico e controle das classes, um papel que levaria a novas respostas no


interior da profissão (NETTO, 2011).
O autor afirma que a renovação da profissão já se buscava, desde o início
da década de 1960, e que a autocracia somente fez precipitar algo que seria
inevitável, assumindo contornos específicos da conjuntura que ela impôs, que,
em razão de sua instalação, precipitou o serviço social a uma alteração inicial
penas de cunho superficial.
Assim, justifica que nessa conjuntura se precipita esse redimensionamento
no interior da profissão, para que o Serviço Social fornecesse respostas para as
questões de interesse do regime no processo de desenvolvimento, impulsio-
nando suas ações para dar base a esse processo.
Há aqui uma correlação de fatores que impulsiona as alterações no interior
da categoria; os militares, no anseio de perpetuar as formas de exploração e mo-
dernizar o capitalismo brasileiro, acabaram também por fornecer as condições
para a ultrapassagem do dito serviço social tradicional e de suas características
que não atendiam as demandas daquele período.
Temos com isso, não exaltação do regime militar como único responsável
pelas alterações na profissão, mas se faz necessário levar o aluno a compreender
que estas séries de fatores contribuem para uma nova realidade no serviço so-
cial, e que os desdobramentos das ações da ditadura militar contribuíram de
forma significativa para tal processo.
É aqui, na primeira metade da década de 1960, quando da intensificação
da erosão do dito serviço social tradicional, impulsionados pela busca de
renovação da profissão, que experimentando fontes diversas de orientação
de intervenção e interpretação do serviço social, que visualizamos também
propostas mais críticas de atuação profissional (ainda que representada por
um pequeno grupo de profissionais) destacadas na unidade anterior, sendo
estas principalmente as quais não vão resistir neste posicionamento diante do
golpe militar de 1964 (RAICHELIS, 1988).
Identifica-se nesse momento uma generalização do processo de ultrapas-
sagem das bases do serviço social tradicional, ainda que também percebemos
que há posturas distintas na ultrapassagem destes posicionamentos embrionários
do serviço social, nem sempre alinhadas a posturas críticas.
Ou seja, as vertentes de renovação mais críticas manifestadas na profissão no
início da década de 1960 irão se dispersar perante o golpe militar de 1964, uma vez
que seus posicionamentos não coadunam com as posturas autoritárias do regime.

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O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  83

No Brasil, a emergência da ruptura ocorre no momento


em que a sociedade brasileira traumatizada ainda pelos
acontecimentos de abril de 1964, assistia à constituição
de um Estado duramente autoritário e centralizador. Es-
sencialmente, a autodeterminada “revolução de 64” foi
uma operação preventiva em grande escala contra a mo-
bilização das forças populares em torno de proposições
anti-imperialistas e efetivamente democráticas (NETTO,
1975, p. 2).

Assim, entendemos que a profissão de serviço social, experimentando sua


crise de legitimidade em todo o continente latino-americano, gestando vertentes
de transformação mais ou menos críticas.
Essa mesma crise de legitimidade irá encontrar um desafio no Brasil na me-
tade da década de 1960, imposto por um governo autoritário que, ignorando os
preceitos democráticos, se coloca acima da sociedade, rompendo um processo
de efervescência da sociedade civil e retardando também junto ao serviço social
suas posturas mais críticas de renovação da categoria.

Para saber mais


Destaque as características do serviço social tradicional.
É nesse processo, de renovação global da profissão, que impulsionado pelo caminhar de falta
de legitimação de um serviço social concebido como tradicional, impulsionados pelo desloca-
mento de algumas instituições de peso ideológico e diante da força do movimento estudantil
que esta renovação atinge a América Latina.

Tal processo, mesmo sentindo os efeitos do regime militar no Brasil, se


manifestará sendo denominado no interior da profissão como Movimento de
Reconceituação, não atingindo apenas um país, mas um continente inteiro.
Nossa interpretação, portanto, atribui à autocracia bur-
guesa a função precipitadora de um processo de erosão
do Serviço Social “tradicional” que lhe é anterior — e a
cujo desfecho, como se verá, ela conferiu uma direção
particular (NETTO, 2011, p. 137).

Assim, o Movimento de Reconceituação do Serviço Social se dá no mo-


mento em que grupos organizados de profissionais iniciaram uma série de
encontros para discutir o papel do Serviço Social, questionando suas práticas,
compromissos assumidos frente as classes sociais.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 83 25/06/14 17:40


84  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

É um movimento histórico de revisão dos projetos profissionais assumido até


então, uma revisão dos conteúdos do serviço social vigente, buscando superar
a visão que vinculava-se a adaptação do homem ao meio. Esse mesmo modo
de intervenção não conseguia compreender que desde a origens de tais práticas
estava interligado à perpetuação da dominação de uma classe sobre a outra.
Assim, o serviço social até então não questionava os meios e os fins de sua
ação, mas apenas reproduzia uma postura da qual não via a sua essência, de-
senvolvendo metodologias de intervenção sobre uma classe social para atingir
os objetivos impostas por outras e, ignorando as realidades regionais específicas,
atuando apenas com metodologias importadas.
Temos que até então, esse Movimento, é, sem dúvida, um dos mais relevan-
tes que se rebate na profissão no contexto deste continente, se configurando
como uma ampla revisão da profissão e que este, tem seu papel de destaque
junto à luta por superação do subdesenvolvimento da América Latina.
Há no interior deste Movimento a tentativa por parte do Serviço Social de
inserir os países pertencentes a este continente no rol dos países desenvolvidos.
Num curto prazo de tempo, o novo “processo” profissio-
nal começou a polarizar intensamente os quadros mais
jovens da categoria profissional dos assistentes sociais.
Contribuía para isso, de um lado e fortemente, o cenário
sociopolítico brasileiro e, igualmente, um caldo de cul-
tura internacional: a temática da superação do subdesen-
volvimento dava a tônica nas ciências sociais e recursos
em programas internacionais (NETTO, 2011, p. 138).

Na base do Movimento de Reconceituação do Serviço Social destacam-se


alguns pressupostos que precipitam tal processo. Entre estes, se destacam, o
reconhecimento de dependência da América Latina com os países capitalistas
centrais; a busca para a construção de um Serviço Social genuinamente latino-
-americano; um adensamento da politização profissional em direção a endossar
a luta dos oprimidos; a busca por um estatuto científico da profissão.
Há aqui um esforço para reconceituar a profissão com a articulação da esfera
do ensino, pesquisa e prática profissional, contribuindo para a ultrapassagem de
sua subordinação enquanto profissão sem grande estatuto teórico e científico
junto às demais categorias.
É fato que esse continente vivenciava uma euforia em termos de mobilizações
populares na década de 1960, que identificam novos sujeitos populares. A exem-
plo, podemos citar sem maiores detalhes o impacto da Revolução Cubana, e os

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O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  85

poucos impactos determinantes do programa Aliança para o Progresso que não


acenavam para superação do subdesenvolvimento dos países deste continente.
Netto (1975), em uma caracterização sintética do Movimento de Recon-
ceituação, o declara como uma tentativa de romper com o Serviço Social
Tradicional, com suas bases de fundamentação e de metodologias importadas
dando um novo significado a profissão.
Reduzindo as suas expressões mais simples, o processo de
reconceituação é a tentativa de superar o Serviço Social
tradicional, típico transplante de ideológico de origem
basicamente norte-americano (NETTO, 1975, p. 1).

Delimitando esse processo, concebe o Serviço Social tradicional como frágil


de procedimentos técnico-científicos, com embasamento ideológico liberal,
buscando corrigir as disfuncionalidades do sistema capitalista para o aprimo-
ramento e conservação deste sistema, como visto ainda pouco nesta obra.
Este autor é enfático ao caracterizar que esse processo de renovação da
profissão em seu contexto geral na América Latina é erguido à medida de que
se comprova a falência de um modo de se fazer Serviço Social que não se adé-
qua as exigências conjunturais e que se manifesta mais por pressões externas
a profissão do que por seus pressupostos internos.
Neste marco, assistentes sociais inquietos e dispostos à
renovação indagaram-se sobre o papel da profissão em
face de expressões concretamente situadas da “questão
social”, sobre a adequação dos procedimentos tradi-
cionais em face das novas realidades regionais, sobre
a eficácia das ações profissionais, sobre a pertinência
de seus fundamentos pretensamente teóricos e sobre o
relacionamento da profissão com os novos protagonistas
que surgiram na cena político-social (NETTO, 2005, p. 9).

O mesmo autor, escrevendo anos antes, afirma que esse impulso a dar uma
tonalidade diferente ao serviço social, e colocá-lo como agente de mudança
junto ao processo de desenvolvimento do país é impelido pelo fracasso gradual
e inevitável daquele serviço social tradicional, tencionando a uma mudança
da qual era tão necessária ao ponto de determinar a legitimidade ou não dessa
profissão nos anos subsequentes (NETTO, 2011).
Percebe-se na origem desse Movimento de Reconceituação, uma grande
união dos assistentes sociais deste continente para superar o tradicionalismo
presente nessa profissão, buscando ultrapassar o Serviço Social Tradicional, e

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86  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

que abarca uma gama heterogênea de profissionais. É preciso reconhecer este


esforço para compreender que o Movimento de Reconceituação nada mais é
do que a busca sistemática de superação do conservadorismo (ALAYÓN, 2005).
Há aqui uma denúncia na base do Movimento de Reconceituação, por
suas diversas manifestações que apontam para a falência deste modo de fazer
Serviço Social, que este é inoperante, e mesmo que partindo de realidades
de subdesenvolvimento da América Latina — com suas diversidades de ma-
nifestações — este Movimento também se expressará de modo diversificado
de acordo com as conjunturas peculiares de cada país que lhe dá abrigo.
Tendo esse pressuposto, que apesar de um ponto de partida comum que
se dá em 1965 na realização do Seminário Latino-Americano de Porto Alegre,
de buscar encontrar qual a contribuição do Serviço Social na superação do
subdesenvolvimento desse continente, há aqui determinações e caminhos
diferenciados que se estabelecem de acordo com a conjuntura de cada país.
Assim, na base deste Movimento, já tencionados por seus pressupostos
anteriores, encontramos aqueles profissionais que viam neste Movimento uma
espécie de reformismo, que não rompia efetivamente com o tradicionalismo,
mas apenas buscavam dar uma nova roupagem a profissão, bem como também
encontramos aqueles profissionais comprometidos com uma cisão as práticas
e embasamentos conservadores da profissão defendidos e postulados na sua
base histórica (NETTO, 2005).
Os que não rompiam totalmente com as posturas conservadoras, via neste
processo um mecanismo de modernização da profissão, que poderia ser en-
quadrado frente ao período desenvolvimentista e aproveitado pelo aparelho
estatal sendo revalorizado junto as suas políticas sociais, uma vez que o serviço
social precisava se reformular para fazer frente aos desafios das expressões da
questão social naquela conjuntura. Essa postura será refuncionalizada a fim
de ser aproveitada na operacionalização das políticas sociais implementadas
pela ditadura militar.
Na outra vertente, se encontrava camadas mais jovens de profissionais
que buscavam romper a tradição profissional conservadora, trabalhando ainda
na mesma sincronia em que se buscava romper com as estruturas sociais de-
pendentes, exploratórias e de denominação a que se vinculava o continente
latino-americano naquele período.
Tais posturas vão ecoar de acordo com as condições que lhe são favorá-
veis, encontrando terreno fértil para um posicionamento de rompimento com

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O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  87

o tradicionalismo nos países de tradição hispânica mais do que na realidade


brasileira, ou seja, nos países de cone sul da América Latina, porém, chegando
a seu esgotamento também nestes países, à medida que as conjunturas especí-
ficas de cada realidade vão cerceando o processo de contestação e instalando
regimes autoritários e pouco progressistas (NETTO, 2005).
Em meados dos anos de 1970, a renovação profissional ma-
terializada na Reconceituação viu-se congelada: seu pro-
cesso não decorreu por mais de uma década. E seu ocaso
não se deveu a qualquer esgotamento ou exaurimento
imanente; antes, foi produto da bruta repressão que se
abateu sobre o pensamento crítico latino-americano —
não por acaso, muitos protagonistas da Reconceituação
experimentaram o carecer, a tortura, a clandestinidade, o
exílio e alguns engrossaram as listas dos “desaparecidos”
nas ditaduras (NETTO, 2005, p. 10).

Aqui, na realidade brasileira, o Movimento de Reconceituação vai tomar


os caminhos possíveis diante da conjuntura específica do regime militar im-
plantado em abril de 1964. É perceptível, a falta de espaço e condições para
realizar alterações no modo de realizar a profissão, se determinando a início
mais para a conservação do que para sua ruptura de seus processos e fins es-
pecíficos neste pais (YASBEC, 2009).
Com isso destacamos que o Movimento de Reconceituação do Serviço
Social no Brasil não pode em seu início acompanhar o ritmo de transformação
realizado nos demais países da América Latina, não questionando, assim, as
origens das expressões da questão social, mas apenas realizando uma postura
de olhar para dentro de suas práticas e posicionar-se de modo a dar mais
sustentabilidade para operacionalização das políticas sociais implementadas
pela ditadura militar, remodelando assim suas práticas sem contestar seus fins.
Como marco inicial deste Movimento, — Movimento de Reconceituação
— temos que ele emerge em 1965, no Primeiro Seminário Latino- Americano
de Serviço Social, realizado em Porto Alegre, seminário este que abordou “O
Serviço Social frente às mudanças sociais na América Latina”.
Como podemos ver o Movimento de Reconceituação atinge o Brasil já na
vigência amarga da ditadura militar, devendo sentir seus refluxos ao longo do
desenvolvimento desta e deste processo.
Não obstante, já sinalizamos que com a autocracia militar, as contestações
e mobilizações sociais que sinalizam a uma crise no recente regime implantado

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88  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

eram duramente perseguidas. Percebe-se claramente que a medida em que, se


amadurecia este regime, se consolidavam as amarras e as forças que sufocando
as mobilizações populares e faziam calar a voz do povo mediante ao uso da
força em todos os seus sentidos, torturando seus cidadãos, censurando suas
mobilizações e manifestações e perseguindo aqueles que se posicionavam
contrários a ideologia desse regime.
Este é o mesmo regime que ao longo de seu processo, vai se burocratizando,
intensificando uma modernização capitalista, com suas diversas instituições,
que via na esfera estatal, a operacionalização de um Serviço Social para inte-
gração das massas neste desenvolvimento.
Assim tem-se o escamotear dos conflitos advindos de um desenvolvimento
industrial que coloca o país entre as maiores economias do mundo, mas que
ignora os investimentos necessários para seu desenvolvimento social colocando-
-os a níveis quase intoleráveis. Um crescimento econômico erguido à base
da exploração do proletariado e que tem seus efeitos conservados por muitos
anos no país.
Há aqui caminhos distintos em que se seguem então o Movimento de Recon-
ceituação, que distingue o Brasil dos países de língua hispânica. Tal argumento
se remete a suas historicidades como podemos ver a diante.
Nesse sentido, ao contrário dos países da América Latina, principalmente
Argentina, Chile e Uruguai, o Movimento de Reconceituação do Serviço
Social se envereda por vertentes mais conservadoras, embasados nos rumos do
capitalismo brasileiro sustentado pelo regime ditatorial que impedia quaisquer
contestações que desse suporte a possíveis alterações nos rumos pretendidos
pelos que estavam no poder (YASBEC, 2009).
Nos seus primeiros anos, com raras exceções, o Brasil se revestiu dentro do
Movimento de Reconceituação a um modelo de modernização da profissão,
em contra ponto com uma ruptura que se operava nos países do cone sul da
América Latina.
Tais vertentes assumidas pela profissão no Brasil, verão na modernização e
na ênfase dos aspectos técnicos um canal para refuncionalizar o Serviço Social
dentro da conjuntura do regime militar (NETTO, 1975).
Buscando uma nova base que superasse o Serviço Social Tradicional, o
Movimento de Reconceituação do Serviço Social brasileiro vai assumir um rol
mais técnico das metodologias interventivas, não o negando totalmente, mas
buscando legitimar a profissão.

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O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  89

Assim, impedido de contestar a sociedade e seu modo de organização —


pelos motivos expostos principalmente na Unidade 1 deste livro — o Serviço
Social busca realizar a crítica sobre si mesmo, voltando-se para suas contradi-
ções e buscando a princípio o seu aprimoramento técnico.
Na medida exata em que se fecha o caminho para uma
efetiva crítica da vida social, o Serviço Social brasileiro
iniciou a crítica de suas próprias modalidades de interven-
ção. Em outras palavras, impossibilitado de questionar-se
socialmente, o Serviço Social brasileiro se questionou
metodologicamente. As preocupações sobre a função
social do Serviço Social, a análise dos seus valores ideo-
lógicos, o tratamento de suas implicações sociopolíticas,
tudo isto foi substituído pelo excessivo cuidado com o
instrumental que deveria ser utilizado no exercício pro-
fissional (NETTO, 1975, p. 4).

Como visto, determinado pela sua conjuntura, o processo de renovação do


serviço social brasileiro, dentro do Movimento de Reconceituação, a priori,
abandona sua vertente mais crítica, que também se gestava antes mesmo do
início — marco inicial — do Movimento de Reconceituação, e caminha para
um processo de operacionalização do processo de crescimento econômico
gestado pelo regime militar as duras penas do povo brasileiro.
Há assim, um abandono da essência que motivava a renovação profissão e
busca-se remodelar suas práticas dentro do possível neste regime.
Destaca-se, sobretudo, a realização de seminários específicos, organizados e
fomentados principalmente pelo Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de
Serviço Social (CBCISS), donde são discutidos e tonalizadas as vertentes que deli-
mitam as direções da profissão no Brasil em seu primeiro estágio deste Movimento.

Para saber mais


O Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviço Social (CBCISS) tem existência no
país a partir de 1957, tendo como entidades fundadoras o Serviço Social do Comércio e o
Serviço Social da Indústria. Seus objetivos compreendiam: Preparar e inscrever os brasileiros nas
Conferências Internacionais promovidas pelo ICSW, de dois em dois anos; Divulgar, no Brasil,
as conclusões das conferências; Incentivar, no Brasil, a cooperação e o intercâmbio entre insti-
tuições e profissionais que atuam no campo dos serviços sociais. Essa organização se empenhou
em desenvolver o aperfeiçoamento da profissão, impulsionando uma série de debates e pro-
duções sobre o agir profissional e suas finalidades, principalmente pelos seus Seminários como
o Seminário de Araxá, Teresópolis, Sumaré e Alto da Boa Vista.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 89 25/06/14 17:40


90  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Aqui, como visto, na impossibilidade de uma renovação profundamente


crítica que alteraria sua essência, as primeiras transformações do Serviço So-
cial vai centra-se na eficiência da ação profissional, nas suas possibilidades de
intervenção, sem se preocupar com análises críticas da sociedade e o estágio
em que vivenciava o Brasil. Há aqui uma modernização dos meios de se agir
profissionalmente.
Netto (1975) destaca que seduzidos por um fetiche da teoria metodológica,
vai se intensificando nos debates profissionais, um Serviço Social com viés
estrutural funcionalista, em que se percebe o formalismo de suas produções.
O autor destaca que uma das personalidades que mais se sobressaem neste
período é a de José Lucena Dantas, o qual sinaliza como o mais celebre pen-
sador da modernização conservadora da profissão.
Para Faleiros (2005), Dantas defendia um Serviço Social mais racionalizador,
muito semelhante às concepções empresariais; para ele, a profissão poderia
superar a sua crise com a ampliação do conhecimento, mais especificamente
aqueles vinculados à prática do planejamento para a otimização dos recursos
no combate as situações problemas encontradas em cada contexto.
Sem dúvida, que a princípio, no Brasil, o Movimento de Reconceituação se
concentrou em adequar a profissão as exigências do capitalismo estruturado
pelo Regime Militar, com seu aparto de um Estado burocratizado e de acordo
com os interesses as grandes empresas multinacionais, não contestando a or-
dem social vigente.
Não se percebe nenhuma crítica nesse momento do Movimento de Re-
conceituação do Serviço Social brasileiro, permeado pela presença do regime
militar imposto no Brasil. Ao contrário, o que lhe é perceptível, em grande
medida, é a adequação de seus métodos e o aprimorando sua ideologia para
dar suporte a um tipo de desenvolvimento dependente e que não sinalizava na
superação das raízes de seus problemas.
O Serviço Social tratou nesse período de realizar com primazia as exigências
a que os detentores do poder lhe imputavam, inserindo-se em seus aparatos
institucionais e dando sustentação aos encaminhamentos impostos pelo Estado.
Há dentro do Movimento de Reconceituação do Serviço Social brasileiro,
em seus primeiros momentos, uma certa confluência entre seus pressupostos,
alicerçado em sistemas burocratizados de intervenção e explicação da socie-
dade e suas contradições.

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O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  91

A modalidade brasileira expressa à modernização do Ser-


viço Social num processo heterônomo; a reboque do Estado
autoritário...o Serviço Social brasileiro reconceituali-
zado se problematiza enquanto se problematiza o Estado
autoritário (NETTO, 1975, p. 9).

Encontramos no Brasil a busca de superação da Doutrina Social da Igreja


Católica, com uma tonalidade reformadora de viés positivista e funcionalista,
sem, contudo, romper com as classes dominantes que perpetuavam a explora-
ção dos oprimidos.
Vê-se um profissional ligado aos programas sociais de desenvolvimento
de comunidade em escala micro e macrossociais, mas não se alimentando de
críticas imanentes da sociedade e de suas peculiaridades que estavam subme-
tidas pelo autoritarismo.
Como já citado, destaca-se que o processo de renovação da profissão não
pode ser entendido de forma linear e desencadeado de maneira ordenada, em
que se vislumbra exatamente o início e o fim de uma perspectiva de renova-
ção, mas sim, deve ser entendido em movimentos constantes de sobreposição,
de retrocessos e avanços em que uma perspectiva vai se opondo a outra ao
modo que não encontra na antiga corrente os pressupostos para explicar e
de certo modo oferecer suporte a soluções de seus fenômenos. É assim que
mais uma perspectiva vai se delineando no processo histórico de renovação
profissional brasileira.
Percebemos o esforço profissional para adequar-se as exigências conjun-
turais do capitalismo brasileiro, sendo que somente iniciará suas contestações
em direção diferenciada a partir do Método de BH, formulado em 1972 na
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais na cidade de Belo Horizonte.
É somente nesse período — emersão da perspectiva de intenção de ruptura
com o Método BH — que de forma um tanto quanto isolada neste período,
e em escala localizada, gesta-se uma nova forma de se pensar e de se fazer
Serviço Social no Brasil.
Este compreendido dentro do Movimento de Reconceituação brasileiro
como um rompimento com as roupagens enrustidas de conservadorismo,
apontando para um novo pensar sobre a profissão e sua funcionalidade junto
à sociedade, delineando para uma ruptura dentro da direção empregada nesse
Movimento de Reconceituação do Brasil.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 91 25/06/14 17:40


92  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Questões para reflexão


Por que o Movimento de Reconceituação no Brasil em seu primeiro
momento adotou uma postura mais conservadora do que do restante
dos países do cone sul da América Latina?

Tal episódio, ainda que interrompido por certo período de tempo, dará o
alento para que, ao final da década de 1970, se detenha o acúmulo crítico
necessário para se gestar as transformações e apontar para a construção de um
projeto profissional autêntico para esta profissão (BRANDÃO, 2006).
A profissão no Brasil passa, então, a adotar o método dialético em suas
análises da realidade, concebendo o homem não mais como um ser abstrato,
mas, sim, o enxergando nas suas relações com os outros homens, inserido em
uma sociedade que contém conflitos, que não é harmônica, que assume con-
tradições inerentes a sua estrutura, buscando adotar uma prática interventiva
que tenha no homem a concepção de sujeito histórico.
Em outras palavras, nessa vertente em sua incipiente ação, embasará a
sua intervenção para a superação da exploração das classes e da dominação
das relações sociais, assumindo na teoria marxista a matéria-prima para suas
reflexões (BRANDÃO, 2006).
Essa assimilação marxista a priori terá alguns equívocos, em razão da falta
de compreensão de elementos determinantes dessa teoria, principalmente com
relação ao método crítico-dialético, a teoria do valor-trabalho e perspectiva de
transformação social.
Tais equívocos dentro da corrente marxista caberão ao processo histórico
de transformação da profissão superar, o que foi erguido no decorrer do Mo-
vimento de Reconceituação na década de 1980.
Assim, o processo no qual decorreu o Movimento de Reconceituação no
Brasil, vai se movimentar sob a plataforma de um Estado autoritário que se ergue
na década de 1960 e terá a sua derrocada somente em 1985; no segundo terço da
década de 1970 sente a fragilidade de uma conjuntura política e econômica desfa-
vorável a seus interesses.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 92 25/06/14 17:40


O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  93

Questões para reflexão


Como a ditadura militar brasileira influência significativamente os
contornos do Movimento de Reconceituação no Brasil?

Partindo de pressupostos comuns, mas tomando caminhos distintos em razão


das conjunturas de cada realidade, passaremos a nos ater brevemente sob as
características do movimento de Reconceituação nos países de língua hispânica.

Atividades de aprendizagem
1. Diante do exposto nesta seção, faça uma síntese do que Movimento
de Reconceituação.
2. Com base no exposto, destaque os principais aspectos da conjuntura
brasileira no momento da emersão do Movimento de Reconceituação.

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94  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Seção 2  O movimento de reconceituação na


América Latina
Nesta seção abordaremos os contornos do Movimento de Reconceituação
na América Latina, dando ênfase a sua distinção com relação ao processo de
desenvolvimento no Brasil.
Compreenderemos que seguindo as conjunturas daqueles países o desen-
volvimento do processo de aprimoramento profissional gozará de maior auto-
nomia e liberdade, tendo posturas mais críticas que possibilitarão alternativas
que ultrapassam o mero formalismo e emolduramento de seus aspectos.

2.1 O movimento de reconceituação na


América Latina
Vimos que o Movimento de Reconceituação desencadeado a partir da
década de 1960, inaugura um processo global de questionamento sobre as
práticas conservadoras do Serviço Social, influenciando determinadamente a
uma nova postura profissional.
Temos que esse movimento é genuinamente latino-americano, encontrando suas
raízes mais ligadas às determinantes extrínsecas à profissão do que as determinantes
intrínsecas, encontrando nesse continente a conjuntura favorável a seu florescimento.
Contudo, apesar de ter uma origem comum e se configurar como um pro-
cesso de união dos profissionais inconformados com as posturas profissionais até
então, os rumos assumidos por cada realidade apontam para direções distintas
de acordo com a realidade vivenciada por cada país.
As determinantes que precipitaram o Movimento de Reconceituação já
foram explanados no item anterior, não cabendo aqui veiculá-los novamente,
faz-se necessário somente chamar a atenção para o momento específico de
efervescência cultural e social e política que vivenciava este continente.
Percebemos que esse Movimento assume na América Latina um tom di-
ferenciado do Movimento brasileiro, que a princípio se manifestou mais pela
via da modernização ante a autocracia burguesa instalada em abril de 1964, a
qual não permitia um posicionamento mais crítico e contestador nas iniciativas
e desdobramentos da categoria profissional nesse movimento.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 94 25/06/14 17:40


O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  95

Para saber mais


Segundo Iamamoto (2001, p. 207):
O Serviço Social Latino-Americano é sensibilizado pelos desafios
da prática social. Sua resposta mais significativa se consubstancia
na mais ampla revisão já ocorrida na trajetória dessa profissão,
que tem aproximadamente seis décadas de existência. Essa res-
posta é o movimento de reconceituação. Esse perfilou-se como
um movimento de denúncia — de autocrítica e de questionamento
societários — que tinha como contraface um processo seletivo de
busca da construção de um serviço social latino-americano [...]

Esta tonalidade de diferenciação a princípio se dá até os primeiros anos da


década de 1970, quando no Brasil é gestada uma concepção mais crítica do
Serviço Social, a exemplo dos demais países do cone sul da América Latina
(IAMAMOTO, 2011).
O tom do Movimento na América Latina tem suas raízes na crítica a orga-
nização e estrutura da sociedade capitalista, e a condição de inserção precária
deste continente diante dos blocos centrais desse sistema, perdurando nesse
processo de renovação por dez anos após o seu início no continente.
Iamamoto (2001) afirma que esse movimento apresenta certa unidade e
certa diversidade em suas manifestações, isto por conta das conjunturas viven-
ciadas. A autora destaca que no Uruguai se identificava uma característica mais
liberal que se manifestava também em uma vida universitária sem amarras no
pensamento crítico.
Já na Argentina se presenciava uma organização de massas que isolava pro-
gressivamente os contornos das ditaduras e que romperia em uma democracia
tendo na universidade um pensamento crítico que florescera dando a tonalidade
crítica deste Movimento naquele país, o que já se diferencia do Brasil, que tinha
que lidar com uma universidade sob a influência norte americana, eliminando
de seus conteúdos as tonalidades contestatórias dentro destas instituições.
No Chile era experimentada uma democracia das mais ousadas, assumindo
uma consciência nacional, não escamoteando as lutas de classe. Aqui nesse
país tem-se uma crítica da sociedade dentro do pensamento universitário, o
contrário do Brasil, que vivia a égide da segurança nacional, filtrando de sua
sociedade qualquer ideologia que fosse contrária ao posicionamento defendido
pelo regime militar instalado em 1964 (NETTO, 1975).

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96  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Netto (1975), em um estudo comparativo sobre as manifestações do Mo-


vimento de Reconceituação no Brasil e países do cone sul da América Latina,
afirma que nestes últimos o tom de crítica pode ser percebido também nos pró-
prios termos utilizados em suas produções, sendo identificados expressões como:
determinações de ideologia, colonialismo cultural, autonomia cultural e política,
consciência política, desafio existencial, relações de dependência dialética, alie-
nação, sistema deshumanizante, defesa do status quo. Há sempre a recorrência
a referências bibliográficas a autores de língua espanhola e portuguesa.

Questões para reflexão


Destaque algumas características da ditadura militar brasileira que
influenciaram no posicionamento conservador do Movimento de Re-
conceituação no Brasil.

A crítica a que nos referimos aqui tem as determinações postuladas com a


superação de práticas paliativas, que nesta conjuntura não encontra caminho
para se manifestar. Pelo contrário, a conjuntura diferenciada destes países dão
cabo para a manifestação de um posicionamento mais radical (NETTO, 1975).
Não era possível na realidade Latino-americana ter uma outra prática do
Serviço Social renovado que não rompesse com o pensamento conservador,
assim, há um questionamento mais profundo que a princípio aquele gestado
no Movimento de Reconceituação no Brasil que revelou em suas alterações,
mudanças apenas superficiais em seu primeiro momento.
Faleiros (1981), analisando o material da Escola de Trabalho Social da Uni-
versidade Católica de Valparaíso, ao se referir ao posicionamento mais crítico do
serviço social, destaca o seu embasamento com a ideologia revolucionária, sinali-
zando que seu embasamento teórico está assentado sob o materialismo histórico.
Afirma que em seu processo de erupção não contou com a formulação de
um conjunto restrito de profissionais iluminados, de uma seleta parte da cate-
goria profissional, mas, sim, que foi construída coletivamente, na luta com o
povo que é explorado.
Faleiros (1981) destaca que essa concepção de Serviço Social, reformulado
criticamente, a qual estamos ressaltando se rebate primeiramente na realidade
Latino-americana. Tal postura buscava uma aliança com aquelas classes sociais

Book_fundamentos_historicos_II.indb 96 25/06/14 17:40


O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  97

dominadas, buscando nestas os posicionamentos coletivos e protagonistas frente


as transformações sociais que lhe são favoráveis.
O mesmo autor, 40 anos após a partida do Movimento de Reconceituação,
escrevendo para a revista Serviço Social & Sociedade em 2005 destaca.
[...] a formulação de um pensamento crítico no serviço so-
cial, vinculado a luta de classes, não foi obra de nenhum
iluminado, mas resultado de um processo histórico com-
plexo de lutas, de resistência ao imperialismo e a ordem
dominante, de organização das classes subalternas e de
construção de um projeto político de aliança de intelec-
tuais com os dominados, explorados e oprimidos, na luta
por mudanças profundas [...] (FALEIROS, 2005, p. 25).

Percebemos que aqui, nestas transformações no Movimento de Recon-


ceituação Latino-americano, não há o destaque para o posicionamento de
intervenções no indivíduo, de forma isolada, ou abstrata, nem tampouco, a
delegação das necessidades de transformação a um terceiro, como percebemos
nas concepções conservadoras do Serviço Social, que a princípio se destacaram
na profissão na realidade brasileira.
Identifica-se essa ação de acordo com o concreto manifestados naquela
realidade, cercado por uma sociedade organizada em um sistema que coloca
as classes em contradição e que as divide de acordo com a posse ou não dos
meios de produção. Tal posicionamento desvela essa estrutura de classe de-
nunciando a sua ideologia e seu mascaramento, revelando uma nova visão de
sociedade para o serviço social.
Não há nessa manifestação de transformação a isenção de ideologia, pelo
contrário, ela é assumida, e o profissional é intimado a posicionar-se. Mais do
que se posicionar, a sua ação deve buscar a superação dessas explorações,
construindo com as organizações populares os meios para tal superação.

Questões para reflexão


Diferencie a tonalidade do Movimento de Reconceituação dos países de
cone sul da América Latina do Movimento de Reconceituação do Brasil.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 97 25/06/14 17:40


98  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Atividades de aprendizagem
1. Faça uma análise comparativa entre estas duas formas de realizar as
intervenções profissionais.
2. Quais as possibilidade l de um serviço social mais crítico na
contemporaneidade.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 98 25/06/14 17:40


O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  99

Seção 3  A perspectiva modernizadora


Nesta seção continuaremos a aprofundar na compreensão do que vem
a ser o Movimento de Reconceituação, entendo sua manifestação de forma
particular em cada cenário.
Assim, perceberemos que as manifestações desse Movimento no Brasil te-
rão matizes que a princípio não vão na direção contrária da postura assumida
pelos governantes. Acrescenta-se que nesse período vivíamos com um regime
de exceção, com tonalidades autoritárias e antidemocráticas sem espaço para
proposições que não confluísse com o interesse destes grupos.
Em nosso país, as posturas do Movimento de Reconceituação assumirá três
formas de manifestação, a que José Paulo Netto denominou de perspectiva mo-
dernizadora, perspectiva de reatualização do conservadorismo e perspectiva de
intenção de rupturas. Iremos agora nos dedicar ao estudo de tais perspectivas.

3.1 As perspectivas do serviço social no Brasil


Vimos a pouco, embasados por estudiosos do tema, o significado que o
Movimento de Reconceituação do Serviço Social teve junto ao processo evo-
lutivo dessa profissão.
Entendido como um movimento genuíno da América Latina, que possui a
sua unicidade de partida em torno da superação do Serviço Social tradicional
e suas práticas e embasamentos teóricos descontextualizados da realidade do
continente, este não apresenta uma uniformidade nas direções assumidas.
Bem verdade, já visualizamos esse descompasso de posicionamentos entre
as realidades vivenciadas no Brasil e nos países do cone sul da América Latina,
no entanto, mesmo nessas realidades em específicas em países distintos vai
apresentar tonalidades diferenciadas em suas manifestações nos seus momentos
históricos.
José Paulo Netto (2011), em sua obra Ditadura e Serviço Social, uma análise
do serviço social pós 64, destaca as perspectivas distintas que se apresentam
na realidade brasileira.
O autor, reafirmando o movimento histórico da sociedade, descreve que
esse processo de superação das posturas profissionais não se dão de forma
linear, em um contínuo, nem mesmo há a ultrapassagem de uma postura so-
bre a outra de forma estanque, bem definida, mas sim, em um movimento de

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100  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

superposição, onde cada conjuntura revela as direções que se sobressaem e


os argumentos que as sustentam.
Nessa mesma obra, Netto, aponta três perspectivas distintas dentro do Movi-
mento de Reconceituação do Serviço Social brasileiro, que se destaca de acordo
com a tonalidade política, econômica, cultural e social que lhe favorecem,
delimitando-as em Perspectiva Modernizadora, Perspectiva de Reatualização
do Conservadorismo e Perspectiva de Intenção de Ruptura.
Assim, ao analisarmos as peculiaridades do Movimento de Reconceituação
no Brasil, mostramos a pouco que esse processo a princípio rompia com sua
criticidade a que lhe deu origem — em face do processo da autocracia militar
— e que a princípio se ressoou um movimento que buscou renovar a profis-
são em seus aspectos mais técnicos, sem destacar as origens das contradições
sociais a que estava submetida à sociedade brasileira.
Não obstante, essas posturas de não rompimento profundo com práticas
já consagradas no serviço social obteve grande adesão dos profissionais na-
quele período.
Segundo Netto (2011), umas das justificativas deste não rompimento pro-
fundo e total com as plataformas do serviço social tradicional, se dá em razão
da própria resistência de aceitar o inédito e as facilidades de aderir as alterações
mais superficiais que lhe dava novas roupagens. Tal modo de se entender a
profissão foi denominada por esse autor de Perspectiva Modernizadora.
Já a perspectiva de Renovação do Conservadorismo, segundo Netto (2011)
irá resgatar elementos de sustentação do serviço social tradicional, em uma
postura mais psicossocial, recuperando alguns princípios das práticas tradicio-
nais do serviço social e submetendo a uma nova racionalidade.
Aqui, destaca-se a subjetividade a que estariam submetido os fenômenos
sociais em decorrência de uma compreensão e auto solução dos problemas
por meio do diálogo. Essa perspectiva terá vigência a partir da segunda metade
da década de 1970.
Com relação à perspectiva de Intenção de Ruptura, sinalizada por José
Paulo Netto (2011) como a vertente mais crítica do serviço social brasileiro, irá
experimentar três fases distintas de sua vigência como veremos mais adiante.
No entanto, vale destacar que essa matriz sustentará uma nova visão do
serviço social, rompendo com suas práticas tradicionais tanto teórica quanto
metodologicamente se sustentando em uma corrente crítica da teoria social,
ultrapassando a visão de homem e de sociedade até aqui registradas no universo

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O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  101

do serviço social. Tal postura profissional iniciada nos primórdios da década de


1970, e manifestada em sua emersão em um ambiente acadêmico irá sustentar
a projeção profissional que se delineará a partir do final dessa mesma década.
Passaremos adiante a análise de cada perspectiva em particular, sempre
enfatizando que não há linearidade no processo histórico.

3.1.1 A perspectiva modernizadora


Netto (2011) considera que essa perspectiva é a primeira que se manifesta
no Brasil. Assim, encontrará já de início, em 1965, respaldo de grande con-
tingente profissional que vislumbram nessa vertente modos de ultrapassar o
tradicional, sem contudo, entrar em conflito mais profundos com os preceitos
que embasavam suas posturas.
A primeira direção conforma uma perspectiva moderni-
zadora para as concepções profissionais — um esforço
no sentido de adequar o Serviço Social, enquanto ins-
trumento de intervenção inserido no arsenal de técnicas
sociais a ser operacionalizado no marco das estratégias
de desenvolvimento capitalista, às exigências postas pelos
processos sócio-políticos emergentes no pós-64 (NETTO,
2011, p. 154).

O autor delineia essa perspectiva como aquela que dinamizava os processos


de desenvolvimento capitalista que o regime militar necessitava, classificando-
-a como interveniente, dinamizadora e integradora, escamoteando a crise de
legitimidade democrática que esse regime era detentor e, não questionando a
ordem sociopolítica emanada de 1964, fugindo, assim, da essência transfor-
madora que originava o Movimento de Reconceituação.
Netto (2011), ao se referir a este processo do Movimento de Reconceituação,
salienta que seu cariz conservador vai além de não questionar a ordem insti-
tuída proveniente de um golpe militar de 1964, mas antes, busca manter alguns
de seus atributos sem romper definitivamente com serviço social tradicional.
Não obstante, também vai ao encontro de se sustentar uma base de funda-
mentação nova, da qual vai recorrer ao estrutural-funcionalismo ainda com a
influência norte-americana.
Este é o caráter modernizador desta perspectiva: ela aceita
como dado inquestionável a ordem sociopolítica deri-
vada de abril e procura dotar a profissão de referências
e instrumentos capazes de responder às demandas que

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102  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

se apresentam nos seus limites — donde, aliás, o cariz


tecnocrático do perfil que pretende atribuir ao Serviço
Social no país (NETTO, 2011, p. 155).

Assim, recorre aos valores profissionais que não ultrapassam as concepções


do serviço social tradicional, dando por meio de sua sustentação teórica uma
nova modelagem, da qual passa a ser compreendida como uma novidade, sem,
contudo, renovar a sua essência.
Neste sentido, processa-se um a perspectiva que muda mas conserva a sua
essência, apenas remodelando suas aparências.
Aqui, destaca-se a necessidade de dar um sentido novo a profissão, para que
esta permanecesse legitimada junto ao rol das profissões que atuam no cenário
social do país, visto desgaste do serviço social tradicional sofria, no entanto,
pesa-se o jogo político presente no território brasileiro, que acenava para um
retrocesso nos avanços democráticos até então manifestos antes do golpe mi-
litar de 1964 e que esta perspectiva é omissa permanecendo em um silêncio
perturbador quanto a tal conjuntura.
Como afirma Netto (2011), tal perspectiva buscará modernizar a profissão,
dotando esta de seus aparatos necessários para que assim fosse instrumenta-
lizada pela autocracia militar e ultrapassa-se a sua crise de legitimidade que
fora gestada já ao final da década de 1950. O serviço social necessitava busca
então se revalorizar e ultrapassar esta fronteira de legitimidade.
É fato que com tal postura, essa perspectiva irá se valer de espaços institu-
cionais até então não existentes nessas escalas.
Tais espaços são abertos pelo regime militar, que irá se valer da postura
profissional renovada por tais bases. Aqui são identificados os instrumentos
necessários e a mão de obra requerida para dar vazão ao seu projeto de socie-
dade pensada pela autocracia militar.
Assim, na perspectiva modernizadora, não se trata de alterar o fundamento,
o sentido e a direção profissional, mas, sim, dotá-la de instrumentos para que
seja refuncionalizada e aproveitada para engrossar a tonalidade do desenvolvi-
mento dependente que se almejava ao país. Os assistentes sociais, por meio de
tal perspectiva, irão se aprofundar nesses espaços abertos pelo regime militar.
Vão assim, se inserir nesses aparatos institucionais abertos pelo regime mili-
tar como canais de vazão de seus argumentos, buscando imprimir um processo
de desenvolvimento tendo no planejamento uma grande ferramenta pela qual
darão sustentação as suas posturas.

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O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  103

O Estado adensará o rol de políticas sociais com conteúdos integradores


para dar vazão ao desenvolvimento do capitalismo nacional e inserir ainda mais
o país no rol dos países industrializados e elevar a sua economia, sem levar
em consideração a grande massa que move essa economia e que sustenta os
pilares do crescimento econômico sem que estes possam visualizar os frutos
de seu trabalho.
Essas políticas sociais não possuíam caráter libertário, mas ao contrário,
constituíam-se como mecanismos de integração e escamoteamento de uma
crise social em busca de um desenvolvimento econômico.
Behring e Boschetti (2007) traçam uma síntese das políticas sociais expressas
durante a ditadura militar.
Quais são, então as características da política social no
período da ditadura militar? Para Faleiros (2000), no con-
texto da perda das liberdades democráticas, de censura,
prisão e tortura para vozes dissonantes, o bloco militar-
-tecnocrático-empresarial buscou adesão e legitimidade
por meio da expansão e modernização de políticas so-
ciais. A unificação, uniformização e centralização da
previdência social no Instituto Nacional de Previdência
Social (INPS), em 1966, retiraram definitivamente os
trabalhadores da gestão da previdência social, que passa
a ser tratada como questão técnica e atuarial. Em 1967,
os acidentes de trabalho passam também para a gestão
do INPS, apesar de certa contrariedade dos segurados
privados. Ao lado disso, a previdência foi ampliada para
os trabalhadores rurais, por meio do FUNRURAL, política
que adquiriu, neste caso, um caráter mais redistributivo,
já que não se fundava na contribuição dos trabalhadores,
mas numa pequena taxação dos produtores, apesar de
seu irrisório valor de meio salário mínimo (1971). A co-
bertura previdenciária também alcançou as empregadas
domésticas (1972), os jogadores de futebol e os autôno-
mos (1973), e os ambulantes (1978). Em 1974 cria-se a
Renda Mensal Vitalícia para os idosos pobres, no valor
de meio salário mínimo para os que tivessem contribu-
ído ao menos um ano para a previdência. O Ministério
da Previdência e Assistência Social foi criado em 1974,
incorporando a LBA, a Fundação Nacional para o Bem-
-Estar do Menor (Funabem, criada em 1965) — que veio a
substituir o antigo SAM extinto em 1964, sem necessaria-
mente alterar seu caráter punitivo, mantido no Código de
Menores de 1979 —, a Central de Medicamentos (CEME)
e a Empresa de Processamento de Dados da Previdência

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104  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Social (Dataprev). Esse complexo se transformou, com


uma ampla reforma administrativa, no Sistema Nacional
de Assistência e Previdência Social (SINPAS), em 1977, que
compreendia o INPS, o Instituto Nacional de Assistência
Médica (INAMPS) e o Instituto Nacional de Administração
da Previdência Social (Iapas), além daquelas instituições
referidas acima. Nessa associação entre previdência, as-
sistência e saúde, impôs-se uma forte medicalização da
saúde, com ênfase no atendimento curativo, individual e
especializado, em detrimento da saúde pública, em es-
treita relação com o incentivo à indústria de medicamen-
tos e equipamentos médicos-hospitalares, orientados pela
lucratividade (BEHRING; BOSCHETTI, 2007, p. 136-137).

Para isso, o Estado requeria um profissional comprometido com tal postura,


alinhado a esta perspectiva ideológica, que não questionasse a ordem insti-
tuída, mas que se voltasse ao um processo integrador e escamoteador da crise
social deflagrada, a fim de evitar conflitos que poderiam prejudicar a lógica
de acumulação.
E é assim, que por meio de tais políticas sociais com residual conteúdo
compensatórios, diante dos baixos salários e altos níveis de exploração, que o
Estado vai instrumentalizando esses trabalhadores, a fim de que com isto im-
possibilite movimentos que possam prejudicar o crescimento econômico, tais
como reivindicações de maiores salários, políticas sociais mais distributivas etc.
Nesse sentido, Netto (2011) argumenta que, em certa medida, tal perspectiva
se adiante em oferecer um tipo de profissional que os militares iriam requerer
para seus projetos, tendo por meio do CBCISS o arranque para suas iniciativas.
Faz-se necessário ressaltar que o CBCISS é uma instituição extrauniversitária
que naquele período conclamará os profissionais a essa adesão, principalmente
por meio de seus seminários, buscando caminhos para se pensar um serviço
social diferente, ou seja reformado.
Não se parte, assim, de uma organização comprometida visceralmente com
a formação profissional de novos quadros de assistentes sociais, ligada ao um
universo acadêmico de formação de novos profissionais de serviço social, mas
antes, uma organização que se insere no universo profissional e requer novas
posturas para legitimação da categoria em tempos de desenvolvimentismo.
Adiante veremos que esta diversidade de organismos
tem conexão com proposições profissionais diferentes;
por agora, basta realçar que o movimento global desses

Book_fundamentos_historicos_II.indb 104 25/06/14 17:40


O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  105

momentos parciais oferece um desenho nítido: a renova-


ção se inicia mediante a ação organizadora de uma en-
tidade que aglutina profissionais e docentes, em seguida
tem seu centro de gravitação transferido para o interior
das agências de formação e, em fim espraia-se desses
núcleos para organismos de clara funcionalidade na me-
dida da representação da categoria profissional — esta é
a evolução que leva da ação quase exclusiva do CBCISS
ao debate nas escolas [...] (NETTO, 2011, p. 153).

A adesão dos profissionais de serviço social nesta perspectiva moderniza-


dora ultrapassam as fronteiras nacionais por meio de seus aprofundamentos
fomentados pelo CBCISS.
Suas produções como o Documento de Araxá e Teresópolis — Seminários
que ocorrem no Brasil no período da ditadura militar e que vão expressar a
perspectiva modernizadora — são pilastras onde podemos visualizar um tipo de
união em torno da superação do que se denominava de tradicionalismo, sem,
contudo, romper totalmente com este serviço social tradicional. A profissão
era impelida a mudar, mas nem tanto no cenário erguido pelo regime militar.
As produções e os caminhos percorridos pela perspectiva modernizadora
são os primeiros identificados no Movimento de Reconceituação do Serviço
Social brasileiro e vão se manifestar mais veementemente no Seminário de
Araxá realizado em 1967 em Minas Gerais e seguida no Seminário de Teresó-
polis realizado em 1970 no Rio de Janeiro.
Netto (2011) destaca que esses dois documentos que foram frutos dos Semi-
nários de Araxá e Teresópolis não esgotam a perspectiva modernizadora, mas,
sem dúvida, sinalizam para a adequação renovada de um tipo de profissional
que a autocracia militar necessitaria e que seria inserido nas suas diversas or-
ganizações de implementações das políticas sociais do regime militar.
Os Documentos de Araxá, Teresópolis e Sumaré cons-
tituem “marcos históricos” do Serviço Social. São pro-
dutos do estudos de profissionais competentes reunidos
em Seminários promovidos pelo Centro Brasileiro de
Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais (CBCISS).
Espelham a situação do Serviço Social em dado momento
de sua história, e são o resultado de seu desenvolvimento
científico, embora influenciado por acontecimentos so-
ciais e políticos. De fato, desde o início, o Serviço Social
preocupou-se com determinadas questões que põem em
jogo sua própria existência ou sobrevivência (CBCISS,
1986, p. 7).

Book_fundamentos_historicos_II.indb 105 25/06/14 17:40


106  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Esses documentos — Araxá e Teresópolis — afirmavam a necessária reno-


vação do serviço social e sua vinculação com o desenvolvimento, atrelando
este processo de renovação ao estágio de desenvolvimentismo implementado
pelo regime militar. Essa tônica era sentida e perseguida por amplas camadas
da sociedade brasileira e não só pelo serviço social.

Para saber mais


O processo de renovação da profissão, adensado pelo Movimento de Reconceituação, que no
Brasil sofrerá significativamente a influência da ditadura militar, se assentará em grande medida
em seus princípios sobre a influência e iniciativa do CBCISS, o qual possui dentro dos Seminários
de Araxá e Teresópolis as expressões mais contundentes da Perspectiva Modernizadora.

Assim, cabia a renovação profissional uma faceta do processo modernizante


para levar o país ao desenvolvimento que se desejava.
Destaca-se aqui as estratégias político-sociais, com desdobramentos para
disseminar a interpretação de uma elevação gradual do nível de bem estar so-
cial, a que deveria ser induzida a sua população alvo, a fim de que, com isto,
se eliminasse qualquer foco contestador dos caminhos políticos, econômicos
e sociais que se gestava no país.
Assim, nas palavras de Netto (2011), o subdesenvolvimento e o desen-
volvimento era entendido como opostos, e a passagem de um para outro se
daria em um processo gradual onde um estágio levaria a outro. No entanto,
tal ultrapassagem — eliminada de qualquer análise política macroestrutural
— somente seria alcançado se eliminasse os entraves ou gargalos impeditivos
desse caminho. As intervenções profissionais na perspectiva modernizadora
deveriam conduzir a esta tônica de ações.
Aquelas intervenções seriam direcionadas fundamental-
mente para a superação dos estrangulamentos impeditivos
do trânsito de um polo a outro, gargalos sobre tudo, de-
rivados da inércia econômico-social dos setores arcaicos
(tradicionais) das sociedades subdesenvolvidas, donde
a necessidade de induzir mudanças conducentes à sua
compatibilização com a dinâmica dos setores modernos
(NETTO, 2011, p. 166).

Book_fundamentos_historicos_II.indb 106 25/06/14 17:40


O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  107

Assim, o desenvolvimento era perseguido através do elenco de mudanças


propostos, tanto pelos aparatos econômicos, políticos, como também pelas
mudanças necessárias nas áreas sociais no sentido de apaziguar possíveis
constatações. Havia aqui a necessidade de se fundamentar suas intervenções
buscando uma coesão nas propostas do governo a população.
O serviço social era então o profissional que deveria eliminar os focos
de contestações e assumir seu posto integrador, aglutinando as forças para
contribuir na condução do país ao desenvolvimento econômico, que aqui era
também sentido no processo de industrialização, o qual deveria ser perseguido
para alcançar tal estágio.
O pensamento que imperava é de que somente através do crescimento
econômico, levado a cabo com o sacrifico dos trabalhadores, transcritos a
base do arrocho salarial, o país poderia alcançar o desenvolvimento, e, assim,
transbordar os seus frutos a todos os cidadãos, ultrapassando em consequência
às misérias da população brasileira.
O resultado sabemos que não foi alcançado. Esse transbordamento do
crescimento econômico do país, não ocorreu, mas ao contrário, os traba-
lhadores apenas provaram as gotas salgadas de seus suores, sem, contudo,
provar dos frutos desse capital.
Nesse sentido, o autor afirma que a perspectiva modernizadora, impulsio-
nada pelo quadro de retrocesso democrático teve grande impulso por meio
de diversos trabalhos e profissionais, dentre eles destacam-se os trabalhos de
José Lucena Dantas.
Dantas parece com destaque junto a perspectiva modernizadora, principal-
mente na construção do Seminário de Teresópolis realizado no ano de 1970,
onde se encontra a solidificação desta perspectiva com seu grande enfoque
para a instrumentalidade da ação profissional. Dantas buscava, assim, dar uma
certa cientificidade à prática profissional por meio da iniciação a metodologia
do serviço social.
Com tal arcabouço, Dantas forneceu as mais adequadas
respostas a duas demandas que à época amadureciam
no processo renovador: a requisição de uma fundamen-
tação “científica” para o Serviço Social e a exigência de
alternativas para redimensionar metodologicamente as
práticas profissionais (NETTO, 2011, p. 183).

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108  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Esse autor defendia que a prática profissional nada mais era que um modo
organizado e sistemático de prestação de serviços, e que a metodologia atingia
assim a parte central da Teoria Geral do Serviço Social. Assim centra-se grande
parcela de soluções de problemas brasileiro a uma adaptação da metodologia
desse profissional (NETTO, 2011).
Vislumbra-se nessa pequena passagem que há uma redução da magnitude
das expressões da questão social, centrando foco para o problema metodológico
para a solução de tais expressões, como em uma supervalorização da profissão
e da metodologia em busca da superação de problemas que encontram suas
raízes muito além do universo profissional.
É notório que há a busca de cientificidade almejada por esse autor junto a
suas construções dentro da perspectiva modernizadora. Defende ainda dentro
do seminário de Teresópolis e, portanto, dentro da perspectiva modernizadora,
que o método profissional se constituía em duas categorias básicas, sendo estes,
o diagnóstico e a intervenção planejada.
Dantas não poupa esforços para encontrar raízes bibliográficas para susten-
tar seus argumentos, no entanto, sem o caráter contestatório presente na obra
dos autores que lhe embasavam o raciocínio, conforme afirma Netto (2011).
A longa dissertação de Dantas se desenvolve com uma
constante revisão de ampla bibliografia, mediante o que
o autor filtra elipticamente a crítica modernizadora das
formulações tradicionais. Entretanto, avaliadas as suas
conclusões, é inevitável a fortíssima impressão de que
Dantas ergue andaimes extremamente complicados para
uma arquitetura muito modesta [...] (NETTO, 2011, p. 182).

Fica clara a debilidade dos argumentos de Dantas quanto ao conteúdo de


suas formulações, ainda que sustentado por ampla bibliografia, a sustentação
das afirmações desse autor pouco avança para superar o viés tradicionalista
que permeava a profissão.
Na busca por essa cientificidade do serviço social nessa perspectiva,
reafirma-se, ainda, o seu caráter de assepsia ideológica, não questionando,
assim, a estrutura e à ordem dominante, deixando estas questões omissas, ainda
que em um terreno de atentado à democracia e aos direitos humanos como o
consolidado após o golpe militar de 1964.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 108 25/06/14 17:40


O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  109

Questões para reflexão


Reflita sobre as principais características da perspectiva Modernizadora
dentro do movimento de Reconceituação do Serviço Social brasileiro
e teça seus comentários.

Não obstante, Netto (2011) destaca que essa perspectiva que condensa,
sem sobra de dúvida, grande contingente profissional naquele período, deve
essa grande adesão principalmente por que a partir desse autor — José Lucena
Dantas — oferece respostas a duas questões centrais que naquele período
abalavam os alicerces do universo profissional: A questão da cientificidade e
do método do serviço social.
Com tal arcabouço, Dantas forneceu as mais adequadas
respostas a duas demandas que à época amadureciam
no processo renovador: a requisição de uma fundamen-
tação “científica” para o Serviço Social e as exigências
de alternativas para redimensionar metodologicamente as
práticas profissionais (NETTO, 2011, p. 183).

Quanto à questão metodológica do serviço social pode-se perceber dentro


dos argumentos de Dantas que para ele o objeto de intervenção profissional
são as situações sociais problemas. Tais situações advêm para o autor de um
processo de desenvolvimento e das necessidades sociais que daí surgem
(NETTO, 2011).
Não obstante, destaca a questão do comprometimento profissional com o
processo de desenvolvimento a qual o serviço social deve estar atrelado, em
um forte apelo ao desenvolvimentismo.
O tratamento e a concepção metodológicos elaborados e defendidos por
Dantas dentro da perspectiva modernizadora serão mais bem aprofundados
quando adentrarmos nas reflexões a cerca do Documento de Teresópolis.
O que podemos condensar dentro da perspectiva modernizadora é que ela,
no anseio de ultrapassar o tradicionalismo presente dentro da profissão, não
consegue pôr fim a limites dentro da lógica própria do serviço social tradicional.
Assim, dentro dessa perspectiva podemos visualizar um transformismo de
metodologias já consagradas dentro do serviço social — caso, grupo e comu-
nidade — o não rompimento com a assepsia ideopolítica que estava presente

Book_fundamentos_historicos_II.indb 109 25/06/14 17:40


110 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

dentro do tradicionalismo, do qual podemos destacar a não constatação da


ordem sociopolítica advinda de abril de 1964.
Nesse sentido podemos nos interrogar: Então em que foi alterado o serviço
social dentro do movimento de reconceituação na perspectiva modernizadora?
Podemos conferir uma linha de contínuo e de ruptura não profunda do ser-
viço social tradicional. Assim enquanto tentativa de ruptura se recorre a base do
estrutural funcionalista para dar sustentação teórica dessa perspectiva e dá novo
sentido a metodologias já consagradas dentro do universo do serviço social.
Percebe-se a incidência do apelo ao profissional a se inserir dentro do pro-
cesso de desenvolvimento sendo este instrumentalizado em um ambiente que
cada vez mais se burocratizará, recorrendo ao planejamento para o controle
social dando assim uma nova roupagem ao serviço social, sem, no entanto,
questionar a sua essência e posicionamento social.

Atividades de aprendizagem
1. Qual a conjuntura em que se dava a perspectiva modernizadora, bem
como suas principais características?
2. Quais as características da Perspectiva Modernizadora?

Fique ligado!
Nesta unidade você apreendeu que:
O Movimento de Reconceituação é um movimento essencialmente
latino-americano.
Este movimento simbolizou uma busca de ruptura com o dito serviço
social tradicional.
Sua emersão se dá na metade da década de 1960.
A incidência do Movimento de Reconceituação está condicionada
a uma série de fatores externos que tencionam a sociedade naquela
conjuntura em especial na realidade latino-americana.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 110 25/06/14 17:40


O serviço social no capitalismo 111

O Movimento de Reconceituação se faz distinto entre Brasil e América


Latina.
A conjuntura brasileira possibilita a princípio a formação de uma trans-
formação do conservadorismo somente de forma adjetiva, sem, contudo,
alterar profundamente as bases do serviço social.
O Brasil a princípio tem uma manifestação de alteração alinhada ao
perfil que a ditadura militar requeria naquela conjuntura.
A primeira postura profissional de alteração junto ao Movimento de
Reconceituação se apresenta na perspectiva Modernizadora.

Para concluir o estudo da unidade


Nesta unidade vimos que o Movimento de Reconceituação simbolizou
para América Latina um novo momento para o Serviço Social. Esse novo
momento serve como um divisor de águas que deixa o serviço social
tradicional em uma postura desconfortável frente as demandas e teorias
de compreensão da realidade.
Fato é, porém, que ainda, mesmo passados tantos anos de alterações
significativas junto a profissão, encontramos traços de um serviço social
conservador, não vinculado intrinsecamente as camadas mais exploradas
da sociedade, ainda que com um discurso crítico, não conseguem ultra-
passar as práticas conservadoras de adaptação aos contornos do Capital.
Tal postura remete a nós profissionais uma vigilância cotidiana a fim
de ter uma postura crítica não somente no discurso, mas coerente também
em suas intervenções. Para saber mais, indicamos ainda a leitura de alguns
livros, tais como Serviço Social em Tempo de Capital Fetiche, Capitalismo
financeiro e questão social, de Marilda Villela Iamamoto, Serviço Social
e Ética. Convite a uma nova práxis e Ditadura e Serviço Social, de José
Paulo Netto.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 111 25/06/14 17:40


112  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Atividades de aprendizagem da unidade


1. Temos que o Movimento de Reconceituação se caracteriza como
um marco para a renovação profissional, nesse sentido, podemos
afirmar que:
(  ) Este não ocorre no Brasil em razão da Ditadura Militar.
(  ) Este Movimento somente ocorreu no Brasil com uma única
corrente que se mostrou conservadora, se alicerçando no exis-
tencialismo.
(  ) Este Movimento somente ocorreu no Brasil com uma única
corrente que se mostrou conservadora, se alicerçando na feno-
menologia.
(  ) Este Movimento ocorre no Brasil e apresenta três perspectivas,
sendo duas conservadoras e uma com tonalidade crítica.
2. Compreendendo o Movimento de Reconceituação como um fenô-
meno ocorrido dentro da categoria profissional, podemos afirmar que:
(  ) A tônica estava na busca de construção de um serviço social que
contemplasse as características do continente latino-americano
e não se baseasse em perspectivas importadas.
(  ) A tônica era a consolidação da assepsia política, uma vez que
estava almejando o seu espírito científico e havia a necessidade
de neutralidade na condução de suas intervenções.
(  ) A tônica é a consolidação da teoria neotomista como espírito de
interpretação e norteamento das ações do cotidiano profissional.
(  ) A tônica era a aproximação e a clonagem de práticas de inter-
venções norte-americanas, daí a ênfase nas posturas de macroin-
tervenção ressaltadas no Documento de Araxá.
3. Com relação ao Movimento de Reconceituação podemos afirmar que:
(  ) Ocorre sem distinções de conteúdo entre o Brasil e os países de
cone sul da América Latina.
(  ) Ocorre de modo diferenciado no Brasil com relação aos países
do cone sul da América Latina.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 112 25/06/14 17:40


O s e r v i ç o s o c i a l n o c a p i t a l i s m o  113

(  ) Não é identificado Movimento de Reconceituação do Serviço


Social nos países de cone sul da América Latina.
(  ) O Movimento de Reconceituação ocorre primeiramente na Amé-
rica Latina na década de 1950 e somente em 1970 é que alcança a
realidade brasileira.
4. Temos que o Movimento de Reconceituação gesta formas distintas de
manifestação de renovação profissional. Assim, assinale a alternativa
correta que contenha as características da perspectiva modernizadora:
(  ) Possui uma teoria social crítica de raiz marxista.
(  ) Possui uma teoria estrutural funcionalista e é a primeira perspec-
tiva junto ao Movimento de Reconceituação brasileiro.
(  ) Possui sua teoria alicerçada na fenomenologia e é a terceira
perspectiva junto ao Movimento de Reconceituação brasileira.
(  ) Possui sua teoria alicerçada no neotomismo e é a segunda pers-
pectiva do Movimento de Reconceituação.
5. A perspectiva de renovação profissional que se assenta sob a base
estrutural funcionalista é?
(  ) Perspectiva de Reatualização do Conservadorismo.
(  ) Perspectiva de Intenção de Ruptura.
(  ) Perspectiva Modernizadora.
(  ) Perspectiva Tradicionalista.

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Referências
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Social & Sociedade, São Paulo: Cortez, n. 84, 2005.
BEHRING, Elaine Rossetti; BOSCHETTI Ivanete. Política Social: fundamentos e história. São
Paulo: Cortez, 2007.
BRANDÃO, Rita de Cássia Camargo: O serviço social no Brasil: a reinstrumentalização
necessária. Franca, SP: Unesp, 2006.
CBCISS — Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais. Teorização
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______. O serviço social na contemporaneidade: Trabalho e formação profissional. 5. ed.
São Paulo: Cortez, 2001.
FALEIROS, Vicente de Paula. Metodologia e ideologia do trabalho social. São Paulo:
Cortez, 1981.
______. A política social do estado capitalista. As Funções da Previdência e da Assistência
Social. São Paulo: Cortez, 2000.
______. Reconceituação do serviço social no Brasil. Uma questão em movimento? Revista
Serviço Social & Sociedade, n. 84, 2005.
IAMAMOTO, Marilda Villela. A questão social no capitalismo Revista Temporalis, n.3, jan./jun.,
2001, Brasília.
______. Serviço social em tempo de capital fetiche. Capitalismo financeiro, trabalho e
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______. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação 21. ed. São Paulo:
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NETTO, José Paulo. Desafio al serviço social. Buenos Aires: Humanitas, 1975.
______. O movimento de reconceituação. 40 anos depois. Revista Serviço Social &
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RAICHELIS, Raquel. Legitimidade popular e poder público. São Paulo: Cortez, 1988.
YASBEC, Maria Carmelita. Fundamentos históricos e teóricos metodológicos do serviço
social. Serviço Social: Direitos e Competências Profissionais. Publicação do Conselho
Federal de Serviço Social. Brasília, 2009.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 114 25/06/14 17:40


Unidade 4
A perspectiva de
reatualização do
conservadorismo
e os seminários
do movimento de
reconceituação
do serviço social
brasileiro
Paulo Sérgio Aragão

Objetivos de aprendizagem: Busca-se nesta unidade levar o aluno


a compreender o Movimento de Reconceituação e sua manifestação
no Brasil de forma dinâmica e não linear, destacando as caracterís-
ticas que se manifestam nesse Movimento em um dado momento
histórico, percebendo, assim, as matizes distintas que se destaca
ao longo da história.
Espera-se que ao final desta unidade, o aluno tenha absorvido os
principais traços da perspectiva de Reatualização do Conservado-
rismo e saiba distingui-la das demais perspectivas que compõem
o adensamento das transformações do serviço social brasileiro,
compreendendo seus elementos conservadores e a sua crítica a
outras vertentes.
A ênfase no resgate de tais desdobramentos profissionais se dá em
razão de fornecer uma compreensão crítica da história para realizar
um serviço social comprometido e alinhado ao seu projeto de ca-
tegoria, observando as considerações sob posturas e intervenções

Book_fundamentos_historicos_II.indb 115 25/06/14 17:40


que compõem a história do serviço social e se projetar na direção de
um novo posicionamento.
Busca-se nesta unidade resgatar os seminários de referência para a
profissão que se realizaram no interior do Movimento de Reconceitua­
ção do Serviço Social brasileiro e que na década de 1960 e por um
grande período da década de 1970 se revelaram significativos. Nossas
considerações vão na direção de despertar a reflexão sobre os impactos
que tais eventos tiveram no processo de renovação.
Assim, damos especial destaque para as contribuições do Centro
Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviço Social como o prin-
cipal impulsionador de tais eventos, bem como abordaremos os seus
conteúdos e matrizes ideológicas que permearam o serviço social e
influenciaram em suas intervenções sistematizadas nesses Seminários
expressos nos Documentos que mais tarde foram socializados, alcan-
çando em larga escala a categoria profissional.
Nesta unidade o leitor encontrará, ainda, os principais aspectos do
Seminário de Araxá ocorrido no ano de 1967 e, posteriormente, siste-
matizado. Inscrito dentro da Perspectiva Modernizadora esse Seminário
se configura como um ícone para a categoria profissional sinalizando os
esforços do serviço social brasileiro para se adequara realidade daquele
período, sendo considerado por muitos como uma baliza que aponta
para o início do Movimento de Reconceituação.
O aluno também terá acesso aos principais traços do evento ocorrido
no Estado do Rio de Janeiro no ano de 1970 e que também se encontra
inscrito dentro desta mesma perspectiva. O Seminário de Teresópolis,
como denominamos na categoria profissional, buscará instrumentalizar
os assistentes sociais dentro da Perspectiva Modernizadora e dotar os
profissionais dos instrumentais necessários para inserção no processo
de desenvolvimento que será impulsionado pela ditadura militar e que
verá no serviço social um profissional para a operacionalização de suas
políticas sociais.
Ao final desta seção espera-se que o discente tenha absorvido as
principais características de tais seminários e possa correlacionar essas
mesmas características ao desenvolvido nas demais unidades.
Esta seção tem por objetivo contextualizar o discente sobre a realização
dos dois últimos seminários veiculados pelo CBCISS — Sumaré e Alto
da Boa Vista. Respectivamente, esses dois seminários não gozarão do
prestígio dos eventos de 1967 e 1970.

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Busca-se nesta seção levar o aluno a compreender a existência de tais
seminários, bem como o seu desgaste, que se generaliza a medida
do desgaste institucional de seu promotor, questionamentos sobre a
perspectiva modernizadora e crise da ditadura militar.
Aqui, o leitor visualizará o deslocamento institucional do CBCIS como
instituição imbuída de impulsionar o desenvolvimento profissional no
Brasil. Sinaliza-se, nesse momento, a perspectiva de Reatualização do
Conservadorismo que, se movendo na direção contrário do que engen-
drava o Movimento de Reconceituação, afirma valores tradicionalistas
que estavam presente na gênese do serviço social enquanto profissão
no Brasil.

Seção 1: A perspectiva de reatualização do


conservadorismo
Nesta seção iremos abordar os aspectos relacionados
ao Movimento de Reconceituação do serviço social,
o que possibilitará a sua compreensão sobre o que
vem a ser esse momento ímpar para a categoria pro-
fissional, destacando que tal movimento se caracte-
rizou como essencialmente latino-americano. Nosso
foco de análise, no entanto, estará concentrado na
perspectiva de Reatualização do Conservadorismo,
como forma de renovar a profissão, sem, contudo,
alterar profundamente seus elementos tradicionais.

Seção 2: Os seminários de Araxá e de Teresópolis


Aqui o discente será levado a compreender que, na
manifestação do Movimento de Reconceituação brasi-
leiro, encontra-se ligado a esse processo de intensifica-
ção das alterações na profissão a realização de semi-
nários. Nesses espaços, os assistentes sociais debatiam
as questões relacionadas aos dilemas da categoria.
Assim Seminários, como o de Araxá e de Teresópolis,
se encontram inscritos em determinado momentos

Book_fundamentos_historicos_II.indb 117 25/06/14 17:40


desse movimento e sinalizam perspectivas que se
desdobram como modelo de superação do conser-
vadorismo profissional considerando a conjuntura e
o tempo histórico naquela ocasião.

Seção 3: Os seminários de Sumaré e Alto da Boa Vista


Neste espaço o aluno será levado a reconhecer que o
Movimento de Reconceituação que se inicia na década
de 1960 terá desdobramentos durante as décadas de
1970 e 1980. No entanto, mesmo sinalizando para
processos de tentativas de superação do conservado-
rismo do serviço social, abordaremos os desgastes de
instituições que impulsionavam tal processo, desta-
cando a realização dos seminários de Sumaré e Alto
da Boa Vista, ambos já inscritos em uma lógica diversa
do início do movimento no Brasil.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 118 25/06/14 17:40


A p e r s p e c t i v a d e r e a t u a l i z a ç ã o d o c o n s e r v a d o r i s m o . . . .  119

Introdução ao estudo
Nesta unidade o discente será levado a conhecer a segunda perspectiva do
Movimento de Reconceituação do Serviço Social Brasileiro, destacando suas
principais características e seu momento histórico.
A análise será conduzida no sentido de proporcionar ao discente a compreen­
são sobre o cenário em que se gestam as transformações do desenvolvimento
profissional no Brasil, incidindo em um momento de fragilidade da perspectiva
modernizadora. A sua emersão se dá em um período de decadência da Ditadura
Militar e questionamento.
O resultado será um retorno às bases do passado recente do serviço social,
recuperando com uma nova roupagem os traços do conservadorismo, daí a
sua denominação de Reatualização do Conservadorismo.
Também abordaremos os principais seminários que deram vazão ao pro-
cesso de renovação da profissão ao longo do Movimento de Reconceituação
brasileiro. Tal reflexão nos fornecerá as concepções ideológicas que os emba-
saram a renovação, datando-se em períodos determinados da ditadura militar.
Nesse sentido, seminários como o de Araxá e Teresópolis, serão alvos de
nossas reflexões, delineando seu conteúdo e proporcionando análises sobre
seus desdobramentos no universo da autocracia militar.
Não obstante, entraremos nos seminários de Sumaré e de Alto da Boa vista
em uma breve contextualização sobre seus conteúdos e defasagem perante a
nova proposta profissional que se apresentava.

Seção 1  A perspectiva de reatualização do


conservadorismo
Nesta seção buscaremos destacar a segunda perspectiva do Movimento de
Reconceituação no território brasileiro. Destacam-se os traços marcantes dessa
particularidade nacional permeada por governos autoritários que iniciaram sua
gestão no início da década de 1960 e se mantiveram no poder por mais de 20 anos.
O desdobramento do desenvolvimento profissional irá proporcionar uma
volta aos passado, recuperando traços do conservadorismo que o Movimento de
Reconceituação buscou ultrapassar. Assim, nesta seção o discente será levado
a compreender o cenário em que se manifesta essa perspectiva e sua crítica à
proposta modernizadora construída ainda na década de 1960.

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120  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Espera-se que ao final desta seção o discente tenha absorvido as principais


características da perspectiva de Reatualização do Conservadorismo e saiba
realizar os contra pontos necessários para a sua distinção.

1.1 A perspectiva de reatualização do conservadorismo


Podemos perceber que em meados da década de 1970, a perspectiva mo-
dernizadora até então, gozava solitária da hegemonia de renovação profissional
no Brasil, não apresentando grandes contradições profissionais até aquele mo-
mento. No entanto, a partir daquela década, o serviço social irá gestar outras
perspectivas buscando dar uma nova postura profissional.
Tal posicionamento é deflagrado também pela crise do regime militar em
seus aspectos econômicos e políticos que se fará sentir mais ao longo da década
de 1970, especialmente na segunda metade dessa década.
Assim, dentro do processo de renovação profissional que se convenia de-
nominar de Movimento de Reconceituação por seus diferentes pesquisadores
que se debruçam sobre o tema, vai se fazer sentir no Brasil outras perspectivas
de renovação profissional, que vão disputar o universo do serviço social com
o seu modo de interpretar e agir profissionalmente (NETTO, 2011).
É fato, no entanto, que mesmo não sendo mais a única perspectiva em
desfile que reivindica a renovação profissional, a perspectiva modernizadora
ainda condensa grande contingente profissional, mesmo depois da metade da
década de 1970. Tal influência junto a categoria profissional vai gradativamente
perdendo ressonância ao longo da década.

Para saber mais


Um dos grandes nomes de destaque da perspectiva modernizadora é o de José Lucena Dantas.
Foi com base em seus fundamentos que é moldada a tonalidade do Seminário de Teresópolis,
o qual cristalizará tal perspectiva. Dantas contribuiu com o texto “Teoria Metodológica do
Serviço Social”, que foi um dos documentos orientadores do tema Fundamentos da Metodologia
do Serviço Social.

Questões para reflexão


Reflita sobre as principais características atribuídas à perspectiva moder-
nizadora no Movimento de Reconceituação do Serviço Social no Brasil?

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A p e r s p e c t i v a d e r e a t u a l i z a ç ã o d o c o n s e r v a d o r i s m o . . . .  121

Esse processo de desgaste do prestígio da perspectiva modernizadora se dá


também em razão de que com essa forma de intervenção, o serviço social ainda
não dava conta de enfrentar com grande relevância os problemas sociais a que
se apresentava no país, uma vez que também, mesmo diante do crescimento
econômico percebido ao início da década de 1970, os dilemas que afetavam
parcelas significativas da população brasileira, ainda não apresentavam respos-
tas efetivas e nem mesmo gozava de legítimas interpretações.
Outra questão, que contribuiu para o descrédito da perspectiva moderni-
zadora, é que diante da fragilidade política que cercava o Regime Militar já
na metade da década de 1970, a vanguarda profissional vai buscar um novo
posicionamento para enfrentar os dilemas acima mencionados, uma vez que
nessa vertente não encontrava resposta e o peso político da mão de ferro da
ditadura militar já vinha se enfraquecendo.
Em termos cronológicos, para a análise dos processos de fundamentação
de nossa profissão, identificamos anteriormente também uma outra perspectiva
dentro do Movimento de Reconceituação do Serviço Social brasileiro, que sob
o seu conteúdo mais crítico irá se manifestar na década de 1970. Trata-se da
Perspectiva de Intenção de Ruptura.
Essa perspectiva, que como veremos mais adiante, irá romper definitiva-
mente com o dito serviço social tradicional, se assentará sob a teoria social de
Marx, reformulará uma nova metodologia de intervenção profissional, posicio-
nando os profissionais com uma postura política crítica alinhada aos interesses
da classe trabalhadora. Tal perspectiva tem a sua emersão assinalada por volta do
ano de 1972, na Pontifícia Universidade católica de Belo Horizonte (PUC/BH).
Com relação a essa perspectiva, que como já destacamos, e que tem seu
ponto de emersão em 1972, será abordada no próximo semestre do curso de
serviço social, uma vez que suas posturas, apesar de cronologicamente ser
identificada como a segunda grande corrente de renovação profissional, irá
se fazer sentir mais veementemente ao final da década de 1970 e, embasará
o posicionamento profissional daquele período em diante, dando origem e
direção ao que denominamos de Projeto Ético-político do Serviço Social.
Desse modo, entenderemos que, mesmo que identificada uma perspectiva
diferenciada dentro do Movimento de Reconceituação já no início da década
de 1970; seu posicionamento irá se fazer sentir somente ao final da mesma
década, nos atentaremos a compreender uma outra postura profissional que
também irá se manifestar nessa mesma década, a que o autor José Paulo Netto

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122  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

denominou de Reatualização do Conservadorismo. Assim, não aprofundaremos


aqui a perspectiva de Intenção de Ruptura, mas, sim, a perspectiva de Reatua-
lização do Conservadorismo.
Assim, Netto (2011) defende que na segunda metade da década de 1970,
principalmente após o Seminário de Sumaré, organizado pelo Centro Brasileiro
de Cooperação e Intercâmbio de Serviço Social, e realizado no Rio de Janeiro,
no Centro de Estudos do Sumaré, surge em pauta as postulações da perspectiva
de Reatualização do Conservadorismo que irá se fazer sentir a partir de 1978.
Na defesa dessa afirmação, o autor enfatiza que é a partir deste evento —
Seminário de Sumaré — que se incidem os contornos de uma renovação que
vai buscar se embasar com novos veios teóricos para reafirmar os preceitos de
um tipo mais conservador do serviço social, indo, assim, na contra-mão do
processo evolutivo dessa profissão que se adensaram com o Movimento de
Reconceituação na América Latina.
Isto posto, destaca-se ainda o entendimento do movimento histórico, já des-
tacado neste livro, o que nos remete a reflexão de que a renovação profissional
não pode ser compreendida se não como em sobreposições e não em recortes
rígidos de datas e período, uma vez que a perspectiva modernizadora naquele
período vai sofrendo um desgaste gradativo e perdendo o seu prestígio de início.
Nesse sentido, temos que compreender o movimento histórico que ocorre
na profissão; é a partir daquele período que novas proposições vão sendo ges-
tada. Este processo de evolução não pode ser compreendido como em fases
estanques, com nítidos contornos de começo e fim. Antes esses processos são
identificados dentro desse movimento histórico, e seus contornos de emersão
e erosão devem ser analisados detidamente.
Nesse sentido, tomando como o principal motivo da renovação profissional
o abandono ao posicionamento, embasamento teórico, e intervenções do dito
serviço social tradicional, temos que essa perspectiva também não rompe com o
seus traços de modo profundo, mas ao contrário, na busca de superação de seus
contornos, e na tentativa de oferecer respostas condizentes com as demandas
apresentadas ao serviço social, ela irá reforçá-lo ainda mais.
Assim, essa perspectiva irá de buscar renovar a profissão, sem, contudo, se
desvincular de traços tradicionais que acompanhavam o serviço social desde
seu surgimento.
Como grande expoente dessa perspectiva temos a professora Anna Augusta
de Almeida, com sua tese Possibilidades e Limites da Teoria do Serviço Social

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de 1978. Pesa-se, contudo, que, retornar a um processo ainda mais conservador


dentro do Movimento de Reconceituação lhe exigiria dar novos significados ao
próprio entendimento do serviço social, bem como aprofundar-se na busca de
cientificidade e desbancar a perspectiva dialética que já sinalizava a sua emersão
na profissão veiculada na Pontifícia Universidade Católica de Belo Horizonte.
Netto (2011) ainda destaca:
Especificamente no que concerne ao Serviço Social,
qualquer empresa restauradora haveria de colidir com
duas variáveis de monta: a laicização profissional, que
jogava contra o retorno aos velhos confessionalismos,
e a crescente ponderação de tendências católicas que,
enquanto tais, alinhavam-se numa posição receptiva em
face de projetos societários anticapitalistas e de parâme-
tros analíticos extraídos da tradição marxista [...] (NETTO,
2011, p. 202).

O autor acrescenta que, há certos núcleos da categoria profissional que se


consolidavam no enfrentamento das influências da perspectiva modernizadora,
buscando recuperar um sentido anterior do serviço social, e em que tal medida
estes núcleos auxiliaram na projeção desta perspectiva — Reatualização do
Conservadorismo —, retomando aspectos de intervenção face a face.
Pesa-se na introdução sobre tal perspectiva, que suas objetivações irão no
sentido de dar maior significado a uma individualização das intervenções pro-
fissionais, assim como enfatizar conteúdos mais psicológicos do que aqueles
até então formulados pela perspectiva modernizadora. O desafio aqui era resig-
nificar focos do serviço social tradicional que até aqui a perspectiva moderni-
zadora buscou superar, ainda que com suas debilidades já mencionadas aqui.
Percebe-se, assim, um claro apelo às características do serviço social tradi-
cional, o qual se alicerçava na subjetividade e no apelo moral para superar a
situação a que se encontrava o foco da ação.
Há um claro recorte que já diferencia a tonalidade destas perspectivas —
Modernizadora e Reatualização do Conservadorismo — com a perspectiva
modernizadora, é notável a ênfase por uma atuação mais voltada ao recorte
macrossocietário e a busca pela generalização de um método único com res-
postas ordenadas para os problemas apresentado a profissão, com recorrência
a uma metodologia científica — ainda que com fragilidades.
Também é perceptível junto a perspectiva modernizadora que esta não se
opõem a ordem instituída, vendo nesta a busca pelo desenvolvimento almejado

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124  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

pelo país, colocando o profissional como um agente impulsionador do desen-


volvimento, traços que não são acentuados na Perspectiva de Reatualização
do Conservadorismo.

Questões para reflexão


Busque sintetizar as diferenças até aqui entre a Perspectiva Moderni-
zadora e a Perspectiva de Reatualização do Conservadorismo.

Já nessa perspectiva, este polo é invertido, dando ênfase para a singulari-


dade dos indivíduos e aos aspectos mais subjetivos da ação profissional, as-
sim também como não poupa críticas as fundamentações funcionalistas, que
embasavam a perspectiva modernizadora e que não foi capaz de superar os
dilemas profissionais.
A empresa restauradora possível, portanto, deveria travar
um duplo combate: deter a erosão do ethos profissional
tradicional e todas as suas implicações sociotécnicas e, ao
mesmo tempo, configurar-se como uma alternativa capaz
de neutralizar as novas influências que provinham dos
quadros de referência próprios da inspiração marxista.
Fazê-lo, porém, supunha inovar na operação mesma da
restauração — supunha reatualizar o conservadorismo,
embutido-o numa “nova proposta” e “em construção”
(NETTO, 2011, p. 203).

Como já destacado, retomar os traços do serviço social tradicional requeria


reforçar o seu arcabouço teórico, erguendo fortes alicerces para enfrentar as
ondas modernizadoras e as influências dialéticas que se manifestavam já na
profissão. Neste ponto, destaca-se a grande dedicação pela estruturação de
um arcabouço teórico capaz de enfrentar as demais perspectivas em desfile.
Segundo Netto (2011) há um esforço em construir conhecimento dentro
dessa perspectiva, a fim de fundamentar as suas práticas profissionais nesta
direção, o que implica também afirmar a sua contrariedade com as correntes
positivistas que consolidavam o pensamento da perspectiva modernizadora
até então.
Essa crítica de busca de sustentação teórica é recorrente dentro dessa pers-
pectiva. Há aqui uma negação clara sobre os preceitos positivistas que davam
embasamento a um determinado modo de agir profissional dentro do processo

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de renovação — perspectiva modernizadora —, sendo estes mais clássicos ou


com roupagens mais atuais para sustentar um retrocesso no processo evolutivo.
Podemos visualizar essa oposição ao entendimento e embasamento na
vertente positivista que dava sustentação a perspectiva modernizadora no
documento base do Seminário de Sumaré em 1978, que como já sinalizado
inaugura a vertente de Reatualização do Conservadorismo com seu apelo a
fenomenologia.
[...] ao tratar os fatos como coisas, rejeitamos o que é
de ordem das significações, das intencionalidades, dos
valores, enfim, tudo aquilo que constitui a face interna
da ação (CBCISS, 1986, p. 117).

A perspectiva de Reatualização do Conservadorismo vai centrar sua crítica


ao ponto de vista positivista, principalmente no que tange a assepsia política
e a e a interpretação simplista da realidade (NETTO, 2011).
O recurso teórico de que se vai valer esta perspectiva — Reatualização
do Conservadorismo — é a fenomenologia. Daí ênfase na subjetividade e na
compreensão dos fatos segundo o que o indivíduo visualiza e sente. Há aqui
o apelo à subjetividade como um aminho para sair do isolamento ou pretensa
imparcialidade sustentada ainda pela perspectiva modernizadora.
Por outro lado, se a temática da subjetividade no Serviço
Social tradicional, digamos, assim, foi influenciada pelo
conservadorismo, a sua reatualização pela fenomenolo-
gia por dentro da área profissional deixou a desejar, pois
limitou-se ao chamado “vivido” da situação interna do
“cliente” (ente) sem levar em consideração a transversa-
lidade da política no trabalho profissional, reduzindo a
temática da subjetividade que estamos fazendo à crítica
nesse momento (DUARTE, 2010, p. 1)

Pesa-se que até então não há registro junto a categoria profissional da utili-
zação da fenomenologia como fonte teórica válida para a profissão, o que lhe
remete peculiarmente a algo novo para o processo de renovação profissional.
Não obstante, também não é de grande monta o acúmulo teórico de estudiosos
brasileiros sobre os fundamentos da fenomenologia em nosso país.
Se por um lado, temos consciência de que o método
fenomenológico não abarca toda a realidade do Ser-
viço Social, por outro lado, estamos convencidos de
que do ponto de vista metodológico da ação com o
cliente, e na supervisão de alunos, a única verdade está na

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126  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

possibilidade do serviço social segundo a fenomenologia


(CARVALHO, 1987, p. 84).

José Paulo Netto (2011), tecendo suas críticas a essa forma de interpretar a
sociedade e a ação profissional, esclarece que os pensadores dessa perspec-
tiva buscava enxergar o homem em sua totalidade, ultrapassando, assim, a
dualidade entre sujeito e objeto em formulações de interpretações simplistas
e com respostas pragmáticas conforme as elaborações contidas na perspectiva
modernizadora.
Quanto à questão da assepsia e dos valores que deveriam embasar a profis-
são, esta perspectiva — Reatualização do Conservadorismo — segue o recurso
aos valores Cristãos, conforme contido nas formas de agir tradicional, e ainda
visualizam que não é possível práticas ajustadoras de condutas no exercício
profissional, trazendo que a prática profissional deve levar a uma transformação
social e não a adaptação maciça em nome de um almejado desenvolvimento.
A crítica às correntes positivistas nessa perspectiva também se sustentava
na direção de que era preciso avançar na interpretação não dualista dos pro-
blemas apresentados, entre sujeito e objeto e, buscar sim, a compreensão do
sujeito como um todo.
Contudo, Netto (2011), ao analisar um de seus maiores expoentes — Al-
meida, em 1978 —, afirma que sua crítica sustenta o registro ideológico que
moveu o Movimento de Reconceituação do Serviço Social e na ausência a
crítica ao tradicionalismo, deixando este ausente de suas considerações que
possa sinalizar na direção de uma superação do tradicionalismo. O mesmo
autor ainda acrescenta que a construção de Brandão (2006) se sustenta na
fenomenologia e no personalismo cristão.
Aqui a conotação do exercício profissional vai se moldar a um tipo de
ajuda psicossocial, onde através da compreensão com auxílio do profissional,
mediando a ação com o cliente, vai se revelando as formas do fenômeno a ser
compreendido e a incidência deste mesmo cliente no processo de tomada de de-
cisão, em uma clara retomada da subjetividade de cada fenômeno em particular.
Com tal tonalidade, é passível de perceber que dentro desta perspectiva,
vai se reduzindo as possibilidades de análises e atuações macrossocietárias,
voltando se em uma ação mais micro e com foco no indivíduo.
Como podemos visualizar, cada corrente teórica irá possibilitar uma ma-
neira de compreensão do mundo e de diagnóstico dos fenômenos que incidem
sobre o serviço social. Isto posto, temos que a Perspectiva de Reatualização

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do Conservadorismo, se assentará no caráter mais “psicologizante” buscando


reconhecer as determinações internas e externas que incidem sobre o sujeito.
Busca-se, assim, auxiliar o indivíduo através da interação do profissional e do
sujeito, como o grande meio para a transformação social.
Neste modelo de prática do Serviço Social destaca-se
a sua ênfase metodológica no individualismo, uma vez
toda a análise procedida reduz os fenômenos sociais a
estados subjetivos e psicológicos dos indivíduos, grupos
ou comunidades (MACEDO, 1986, p. 22).

Nessa citação fica clara a recorrência o método compreensivo como fonte de


interpretação dos fenômenos, bem como a insistência em restringir as análises
a luz da subjetividade, privando-lhe o caráter das macroestruturas. O sujeito é
interpretado com a perspectiva de Reatualização do Conservadorismo, como
“cliente” e os fenômenos entendidos como Situações Existenciais Problemas,
dissociados de um processo mais amplo, em um entendimento de cada caso,
grupo ou comunidade deve ser interpretado de maneira isolada (MACEDO, 1986).
Nesse método destaca-se o papel do diálogo profissional com o cliente,
valorizando este significado, dando sentido por meio de suas direções em um
movimento de ajuda profissional para que este fenômeno se revele em sua to-
talidade e, assim, possa revelar os caminhos viáveis para superação da situação
problema a ser enfrentada.
Uma forte tendência, presente em segmentos específicos
do meio profissional, à psicologização das relações so-
ciais, que privilegia problemas de desintegração e desa-
daptação social e funcional, isto é, problemas relacionais
que devem ser tratados através do diálogo (IAMAMOTO,
2011, p. 34).

O apelo à fenomenologia vai estar fundamentado em autores como Hus-


serl (2000) e Heidegger (2000), buscando revelar a essência dos fenômenos,
descrevê-los, a fim de que possa estar ao alcance de todos aquela categoria
que não mais é mutável
Yasbec (2009) resume então as características dessa perspectiva:
A vertente inspirada na fenomenologia, que emerge como
metodologia dialógica, apropriando-se também da visão
de pessoa e comunidade de E. Mounier (1936) dirige-
-se ao vivido humano, aos sujeitos em suas vivências,
colocando para o serviço social a tarefa de auxiliar na
abertura desse sujeito existente, singular, em relação aos

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128  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

outros, ao mundo de pessoas (Almeida, 1980, p. 114).


Essa tendência que no serviço social brasileiro vai prio-
rizar as concepções de pessoa, diálogo e transformação
social 9dos sujeitos) é analisada por (Netto 1994, p. 201 e
s) como uma forma de reatualização do conservadorismo
presente no pensamento inicial da profissão (YASBEC,
2009, p. 149).

Atividades de aprendizagem
1. Com base no exposto, teça um resumo sobre as principais caracte-
rísticas da perspectiva de Reatualização do Conservadorismo.
2. Compreendendo as características da perspectiva modernizadora,
bem como as características da perspectiva de Reatualização do
Conservadorismo, faça um comparativo entre as duas perspectivas.

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Seção 2  Os seminários de Araxá e de


Teresópolis
Nesta seção abordaremos os dois primeiros seminários de referência para
o Movimento de Reconceituação brasileiro. Nesse sentido, temos que tais se-
minários, desenvolvidos sob a coordenação do CBCISS, estão inseridos dentro
da perspectiva Modernizadora.
Com isto, assinalamos que o desenvolvimento de tais perspectiva não
foram a priori impulsionadas por ações de cunho acadêmico, mas sim por
organizações inseridas dentro da categoria profissional. Tais seminários se
concretizaram no sentido de analisar, debater e estabelecer posicionamentos
dentro do serviço social, trabalhando como impulsionares e catalizadores das
concepções defendidas.
O primeiro seminário que nos proporemos a analisar será o Seminário de
Araxá, sendo este assumindo grande relevância na categoria profissional e
conhecido até mesmo fora do Brasil. Seguindo a mesma linha de perspectiva,
registra-se o seminário de Teresópolis, também imerso junto a perspectiva
modernizadora, sendo considerado por Netto (2011) como uma cristalização
de tal perspectiva.

2.1 Os seminários de Araxá


Iniciamos a nossa seção abordando o seminário de Araxá. Este Seminário
está inscrito dentro da Perspectiva Modernizadora junto ao Movimento de
Reconceituação do Serviço Social brasileiro. Esse evento sinaliza para uma
organização profissional junto ao processo de transformação da categoria e
em um cenário regido pela Ditadura Militar.
Esse evento assume grande relevância na renovação profissional; a con-
densação de seu conteúdo se configura como um dos primeiros documentos
neste adensamento das transformações do serviço social no Brasil e, alcança a
expressão de ser traduzido para outras línguas, tais como o Castelhano.
Primeiramente abordaremos a análise dos conteúdos constitutivos do texto
que condensa o Seminário, a que denominamos de Documento de Araxá. Isto
posto entendemos que tal documento é a síntese dos trabalhos realizados na-
quele evento, e que nossas análises nesse primeiro momento estará centrada
para os conteúdos deste, sem, contudo, aprofundar em sua crítica.

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130  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Primeiro, cabe destacar o papel do CBCISS na realização desses Seminários.


É essa organização a qual já abordamos neste livro que impulsiona neste estágio
do Movimento de Reconceituação a mobilização profissional para fazer valer
a ultrapassagem do conservadorismo.
Assim, é o CBCISS que convoca, por meio do apelo a solidificação das
transformações profissionais, os assistentes sociais representativos a se reunirem
e discutirem os rumos do Serviço Social naquela conjuntura.
Essa organização irá realizar esse seminário entre os dias 19 e 26 de março
de 1967, em Minas Gerais, na instância hidrotermal de Araxá. O Seminário
discutiu o tema de “Teorização do Serviço Social” e teve como presidente da
comissão organizadora do evento, a Professora Helena Iracy Junqueira, uma
das pioneiras de nossa profissão.
Como participante desse evento, registram-se 38 assistentes sociais, oriun-
dos principalmente das cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
A formação acadêmica desses participantes advinham de escolas católicas, o
que pode ter influenciado no seu conteúdo.
O Documento de Araxá está estruturado em três capítulos e delineado
por enumeração de parágrafos, o que facilita a análise do texto. O primeiro
capítulo, compreende os parágrafos de 17 a 41, trata da “Natureza do Serviço
Social”, dos “Objetivos do Serviço Social” e das “Funções do Serviço Social”. Já
o capítulo II, compreende os parágrafos de 42 a 104, tem como temas: a “Me-
todologia de ação do Serviço Social”, “Adequação da metodologia às funções
do Serviço Social”, “Serviço Social de caso”, “Serviço Social de Grupo”, “De-
senvolvimento de Comunidade”, “Integração do Serviço Social”, “Utilização
da administração em Serviço Social”, e finalmente no capítulo III, contêm os
parágrafos de 105 a 122 temos o tema “Serviço Social e a realidade brasileira.
O texto ainda traz uma nota final e a relação dos documentos preparatórios
para o evento (CBCISS, 1986).
Na introdução do texto, o Documento aborda a origem do Serviço Social
e a sua vinculação com a questão das disfunções do indivíduo na sociedade,
muitas vezes relacionando tais processos a estruturas sociais existentes.
O texto segue afirmando a necessidade de teorizar a profissão naquele
momento e da iniciativa do CBCISS em convocar os assistentes sociais repre-
sentativos de diversas regiões e de campos diversos de atuação, aborda neste
ponto ainda, o auxílio da UNICEF e de demais instituições governamentais e
não governamentais.

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Na introdução, se explica o caminho metodológico da realização do


seminário.
De início, pensou o CBCISS em proceder os estudos
atribuindo a cinco grupos diferentes temas que seriam,
ao final, discutidos em plenário, solicitando com esta
finalidade, a preparação antecipada de roteiros sobre
os conceitos básicos de Serviço Social de Caso, Serviço
Social de Grupo, Desenvolvimento de Comunidade e
Administração de Programas. Desde a instalação dos
trabalhos, sentiu-se maior interesse dos participantes em
discutirem, todos, o mesmo roteiro sobre conceitos bási-
cos e estudar a metodologia sob um prisma genérico, ao
invés da dinâmica dos processos. Submetidos ao plenário
os dois esquemas de trabalho, foi o último aprovado por
unanimidade, confirmando-se o vivo interesse do grupo
por um estudo da teorização do Serviço Social. Adotou-
-se o roteiro correspondente sendo os outros utilizados
no momento dos debates sobre metodologia (CBCISS,
1986, p. 20).

Percebemos, então, que o grupo de assistentes sociais que se reuniram em


Araxá abandonaram o modelo metodológico sugerido pelo CBCISS, o qual se
alicerçava sob cinco grupos com discussões diferentes entre eles e, centraram-
-se todos a discutir a questão sobre a teorização do serviço social em quatro
grupos compostos por cerca de nove ou onze profissionais; a redação final dos
trabalhos deveria ser realizada por uma comissão formada por um representante
de cada um dos quatros grupos constantes nos trabalhos.
Segue-se o capítulo I, que em suas argumentações primárias debate sobre
a natureza do serviço social. A discussão perpassa sobre o que realmente se
reveste a profissão. Há um consenso em afirmar que com a sua evolução, o
Serviço Social estaria no nível de instrumento de intervenção.
O texto segue com a argumentação sobre a história e a evolução do ser-
viço social que, em seu contexto de emersão, é coincidente com o advento
do estado paternalista, sendo este prejudicado por uma imagem construída de
assistencialismo e pragmatismo.
Há nesse capítulo a elucidação de que o Serviço Social está relacionado com
as práticas corretivas, preventivas e promocionais, não sendo estas exclusivas da
profissão, mas também presente entre outras profissões. Esclarece ainda que estas
ações se dão de forma simultânea, não sendo realizada somente de forma isolada
dependendo do meio e do contexto em que essas ações seriam executadas.

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132  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

O Documento esclarece a questão das ações corretivas que seriam foco


dos profissionais de serviço social; estas centravam-se na intervenção e na
remoção das causas que impedem ou dificultam o desenvolvimento do país.
Tais intervenções seriam dirigidas aos grupos, aos indivíduos ou ainda as co-
munidades e populações. O texto ressalta que o Serviço Social deve atuar em
nível macro e micro.
Com relação ao caráter preventivo das intervenções do profissional, estas
deveriam se colocar de modo a anteceder a um determinado fenômeno e as-
sim impedir que tal situação problema afetasse os indivíduos. O texto destaca
que o profissional deve se colocar antepondo-se às causas de desajustes do
indivíduo a sociedade.
O texto do seminário também aborda questões referentes a promoções dos
indivíduos. Já com relação a essa ação, a mesma deveria estar vinculada as inter-
venções profissionais, estabelecendo que esta se vincula ao processo de capacitação
dos usuários. Assim, promover seria capacitar para o processo de desenvolvimento,
buscando dotar os indivíduos, os grupos e as comunidades para o processo de
plena realização das potencialidades.
O profissional de Serviço social é colocado, assim, como aquele que se
utiliza dos elementos naturais e humanos para a realização integral dos homens,
mesmo que para isso deva intervir sobre o contexto social onde se vincula.
Ao se tomar porém, o contexto social como critério de
referência para se aquilatar da validade de quaisquer
dos caracteres referidos, não deve o agente do Serviço
Social colocar-se numa perspectiva puramente estática
de aceitação, mas desempenhar um papel que conduza
à modificação desse contexto (CBCISS, 1986, p. 26).

Há ainda o apelo para este profissional contribuir com o processo de de-


senvolvimento em países subdesenvolvidos como Brasil, apontando para a
superação dos processos isolados de intervenção em caso, grupo e comunidade.
Em seguida, o texto aborda as questões referentes aos objetivos do Serviço
Social, e os subdivide entre objetivos remotos e objetivos operacionais.
Nessa direção estabelece que os objetivos remotos são aqueles que vão na
direção de fornecem os recursos ao desenvolvimento, a valorização e a melho-
rias nas condições de vida dos seres humanos. Estes devem ser considerados
como uma referência de bens tangíveis e intangíveis para referendar o plano
operacional do serviço social. Tais objetivos são extraídos da declaração Uni-
versal dos Direitos do Homem, formulados pelas Nações Unidas.

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Já os objetivos operacionais são:


a) Identificar e tratar problemas ou distorções residuais
que impedem indivíduos, famílias, grupos, comunida-
des e populações de alcançarem padrões econômico-
-sociais compatíveis com a dignidade humana e esti-
mular a contínua elevação desses padrões; b) colher
elementos e elaborar dados referentes a problemas ou
disfunções que estejam a exigir reformas das estruturas
e sistemas sociais; c) criar condições para tornar efe-
tiva a participação consciente de indivíduos, grupos,
comunidades e populações, seja promovendo sua
integração nas condições decorrentes de mudanças,
seja provocando as mudanças necessárias; d) implantar
e dinamizar sistemas e equipamentos que permitam a
consecução dos objetivos (CBCISS, 1986, p. 26).

Assim, percebemos que, com relação aos objetivos do Serviço Social, temos
que a profissão se matém sob a direção de dois pressupostos, um de caráter
mais filosófico e outro de conteúdo mais operacional, estabelecendo uma
relação entre os dois.
Ainda nesse capítulo, o Documento aborda a questão das funções do Ser-
viço Social. Estabelece que essas funções são: Política Social; o Planejamento e
Administração de Serviços Sociais; e ainda os Serviços de Atendimento direto,
corretivo, preventivo, e promocional destinado a indivíduos, grupos, comuni-
dades, populações e organizações.
Com relação a Política Social, estabelece que como função da profissão esta
deve provocar o processo da formulação das políticas, bem como reformulá-
-las quando necessário, dando a perspectiva de globalidade a estas, bem como
criar canais de participação da população.
Na função de Planejamento Social, o Documento aborda que o profissional
deve contribuir com aquele conhecimento extraído do relacionamento com a
população, assim este deverá subsidiar as agências que se propõem ao processo
de planejamento social com os conhecimentos acumulados nessa relação.
Com relação a função de Administração de Serviços Sociais, o profissional
deverá participar contribuir com as pesquisas a nível institucional, bem como
participar do processo de microplano, e ainda implantar e implementar os
serviços institucionais, não desconsiderando a participação da população.
Por fim, estabelece na função de Serviços de Atendimento direto, corre-
tivo, preventivo, e promocional destinado a indivíduos, grupos, comunidades,

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134  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

populações e organizações, a intervenção direta com esses segmentos, bus-


cando estabelecer a integração social necessária os processos de desenvolvi-
mento adequando, os indivíduos, os grupos as populações e as organizações
a se adequarem a realidade.
Percebe-se neste Documento, que o Seminário foi definido uma linha de com-
preensão sobre a profissão, que a delimita enquanto natureza, objetivo e função.
Temos que se identifica em Araxá, ainda os processos de caso, grupo e desenvol-
vimento de comunidade que permeavam, até então, o serviço social tradicional.
Podemos analisar a direção da requisição de um serviço social que não se
limita apenas a execução direta dos serviços, mas é identificada a inserção de
processos de planejamento e de formulação de políticas sociais.
No Capítulo II, iniciado no parágrafo número 42, temos como temática de
suas análises a “Metodologia de Ação do Serviço Social, e aqui se refeciam a
metodologia os princípios e postulados que devem orientar a metodologia de
intervenção profissional, e que nestes encontram-se tanto questões ligadas à
metafísica como questões mais operacionais.
Assim, o Documento divide como postulados aqueles ligados a questões
éticas e metafísicas, sendo estes os postulados da dignidade humana, postulados
da sociabilidade essencial da pessoal humana e postulado da perfectibilidade
da pessoa humana.
Com relação ao postulado da dignidade humana, temos que este represen-
tava o ser humano em uma posição ontológica, em que todas as coisas a ele
devem ser referenciadas.
Já com relação ao postulado da sociabilidade essencial da pessoal humana,
admite-se que o ser humano é um ser relacional e configura-se que é na socie-
dade que este deve encontrar as respostas as suas necessidades. Com relação ao
postulado da perfectibilidade da pessoa humana, estão alicerçados os valores
de que o ser humano é um ser que se autorrealiza e se autopromove no plano
da historicidade humana.
Superada a questão de entendimento com relação aos postulados, enten-
deremos agora a questão dos princípios operacionais do serviço social a que
fazem parte constituinte do texto que se extrai do seminário de Araxá:
Dentre os princípios operacionais da metodologia do
serviço social, sem desejar esgotar a enunciação, re-
conhecendo a necessidade de reflexão e análise mais
aprofundadas a esse respeito, chegou-se a identificar os

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seguintes: a) estímulo ao exercício da livre escolha e da


responsabilidade das decisões b) respeito aos valores, pa-
drões e pautas culturais c) ensejo a mudanças no sentido
da autopromoção e do enriquecimento do indivíduo, do
grupo, da comunidade, das populações d) atuação dentro
de uma perspectiva de globalidade na realidade social
(CBCISS, 1986, p. 30).

Acrescentam-se ainda nesse Documento os elementos operacionais comuns


a todos os processos das intervenções do Serviço Social, sendo estes elencados
como: a participação do homem em todo o processo de mudança, o relacio-
namento entre profissional e indivíduo, o profissional e o grupo, o profissional
e a comunidade e o profissional e a população.
Com relação à temática de adequação a metodologia às funções do Serviço,
o texto aborda os processos já delineados nas ações da profissão e que foram
alvos das críticas ao serviço social tradicional, centrando sua metodologia ao
serviço social de caso, grupo e desenvolvimento de comunidade. No entanto,
destaca que tais metodologias não são exclusivas do serviço social, mas são
comuns a outras profissões; aquilo que é peculiar à profissão seria a sua visão
de globalidade, esta integrada ao seu sistema.
Nesse momento, o Documento abordado às funções do Serviço Social
(Política Social, o Planejamento e Administração de Serviços Sociais e ainda os
Serviços de Atendimento direto, corretivo, preventivo, e promocional destinado
a indivíduos, grupos, comunidades, populações e organizações) demonstrando
que estas estão subdivididas entre dois níveis, os de ordem macro e as de or-
dem micro.
Com relação à metodologia de ordem micro acrescenta que esta se dife-
rencia por ser de cunho estritamente operacional, sendo estas segundo suas
funções estipuladas como aqueles que estão ligadas às prestações de serviço
diretos e ainda aquelas ligadas a função de administração.
Já com relação às ações de caráter macrossocial, temos que estas devem
ser compreendidas como aquelas que apresentam impacto de maior relevân-
cia e que assumem a metodologia de ação sobre a formulação, proposição e
avaliação de políticas sociais, bem como também a participação nos processos
de macroplanejamento.
Não obstante, o Documento aborda que a ação do serviço social no que
se refere às de caráter macrossociais, esses profissionais deveriam intervir na
melhoria e na excelência da utilização das infraestruturas sociais. O texto segue

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136  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

demonstrando a necessidade de adequação das metodologias de caso, grupo e


comunidade dentro desta lógica de intervenção, buscando a integração entre
estes três processos.
Seguindo adiante, o Documento adentra no que tange a adequação desta
metodologia à realidade brasileira, dá a ênfase a necessidade de se conhecer
esta mesma realidade, sendo um pressuposto indispensável para sua atuação,
vinculando-a um processo de desenvolvimento que integre os aspectos eco-
nômicos, tecnológicos, socioculturais e político-administrativos. Em seguida,
o texto aborda um modelo de intervenção segundo essa lógica.
Enquanto Nota Final, temos que o Documento de Araxá reconhece a re-
levância do texto naquele momento histórico, bem como este deve receber
alterações e revisões ao longo do processo de renovação.
Já delineados os pontos constitutivos do Documento de Araxá, passaremos
agora a realizar uma breve análise crítica deste texto, sem, contudo, desconsiderar
a sua relevância e seu conteúdo histórico, que como já destacamos, ainda que
apontem para um horizonte mais conservador do que desejava aquelas vertentes
mais críticas, ainda assim, sinaliza traços de desenvolvimento da profissão.
Uma das grandes críticas a esse Documento pode ser referida com relação
a sua adequação a conjuntura nacional. Destaca-se aqui que tal conjuntura
estava sob a égide da Ditadura Militar, que naquele momento já delineava seus
traços de autoritarismo e silenciamento das massas populares.
Assim, o Documento não fala de alterações em tais conjunturas e de trans-
formações das estruturas sociais injustas, tal como já se refletiam alguns grupos
de assistentes sociais antes do golpe militar.
Este silêncio, aliando ao posicionamento de ser o assistente social um
impulsionador do processo de desenvolvimento, opera no sentido de reforçar
tal conjuntura e de não operar seus movimentos para rompê-las. Assim, o
profissional, novamente não reconhece o seu posicionamento político, ponto
de crítica inclusive do dito Serviço Social tradicional, e opera no sentido de
reforçar os traços que naquele momento se mantêm.
O Documento está alicerçado em uma lógica liberal, legitimando o sistema
capitalista vigente e buscando alicerçar o trabalho do assistente social para
aprimorar este sistema dentro da realidade brasileira.
Em Araxá, o qual está inscrito dentro da Perspectiva Modernizadora, não
rompe-se com os pressupostos neotomistas, como podemos perceber na temá-
tica de seus postulados, com seus aspectos ligados a metafísica — postulados

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da dignidade humana, da sociabilidade essencial da pessoa humana e da per-


fectibilidade — em outra medida temos a teoria funcionalista que buscava dar
sustentação as intervenções operacionais do Serviço Social.
Podemos perceber que o Documento parte de um aspecto consensual, o
Serviço Social trabalhava com os desajustamentos dos indivíduos ao meio, com
ações corretivas, preventivas e de promoções. Destacam-se que nessa relação
as ações em escala micro sociais assumem menor relevância das ações de
escala macrossociais.
Nesse sentido, podemos afirmar que com relação ao conteúdo inovador
desse aspecto, temos a relevância das ações macrossociais em detrimento as
ações micro, no entanto, também visualizamos que mesmo admitindo que tais
desajustamentos podem decorrer das estruturas sociais inadequadas, estas não
são interpretadas como determinantes em conteúdo máximo.
Na aparente consequência desta afirmação, podemos
perceber uma tensão de fundo, que percorre a abertura
do documento: a reposição de traços históricos da prática
profissional (atuação microssocial “junto a indivíduos
com desajustamentos familiares e sociais”, só aciden-
talmente derivados de “estruturas sociais inadequadas”)
num marco macrossocietário, o “processo de desen-
volvimento” (pensado “globalmente”, ou seja, ainda
concedendo muito ao humanismo abstrato e eticista da
“realização integral do homem”) (NETTO, 2011, p. 18).

Netto (2011) destaca que o Documento, ao fazer menção ao processo


de desenvolvimento, destaca que o serviço social não deve se ater somente
a utilização das metodologias de caso, grupo e comunidade, mas, sim, que
o serviço social nesse desenvolvimento deverá se utilizar de novas formas de
realizar estes ou outros processos. O autor afirma que não há rompimento com
o tradicionalismo, mas, sim, a reformulação do tradicional sob novas bases.
Assim, continua a crítica ao Documento de Araxá assinalando dois tópicos, a
integralidade e a globalidade a que deve ser tratada a metodologia profissional.
A integralidade a que se refere no texto, segundo Netto (2011), está ligada ao
referencial teórico do estrutural-funcionalismo, onde tudo está relacionado,
ou interligado dentro de um processo nos seus diversos complexos em que a
sociedade está estruturada.
Com relação à globalidade, temos que esta é atribuída ao profissional de
serviço social como algo a ele exclusivo, sem que contudo não se justifique o
porquê dessa exclusividade.

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138  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Com relação a estruturas sociais a que se sustenta a sociedade, temos


que o Documento reconhece as estruturas sociais como “facilidades básicas”
vinculadas a serviços de saúde, habitação, educação entre outros e, atribuiu
a sua importância equivalente com as estruturas econômicas. O que destaca
é a questão da divisão entre econômico e social, e ainda, o apelo ao desen-
volvimento integral, onde se recupera o traço determinante do profissional ser
configurado como um agente de desenvolvimento.
Assim, temos que o serviço social, desconsiderando as estruturas sociais
injustas, não compreendendo as relações conflituosas entre as classes, busca
um desenvolvimento integral de forma harmônica, ocultando os conflitos in-
conciliáveis das classes sociais. Aqui também se registra a relação significativa
que reivindica a profissão junto à macroatuação.
Ainda com relação a macro atuação profissional, Netto (2011) esclarece que
há um exagero por parte do alcance profissional pretendido no Documento,
ao passo que este coloca como um dos processo de intervenção do Serviço
Social participar de todas as etapas do macroplano:
O evidente exagero da proposta — que exigiria uma
superprofissão que, a bem da verdade, compreenderia
imodestamente uma categoria capaz de saturar a estrutura
sócio-ocupacional voltada a atender ao “social” — não
deve obscurecer o que é nuclear: a recusa em limitar-
-se às funções executivas terminais em torno das quais
historicamente cristalizou-se as prática profissional, e a
meridiana indicação dos novos papeis profissionais. A
vontade profissional, e a meridiana indicação dos novos
papeis profissionais (NETTO, 2011, p. 172).

Como podemos observar, o Seminário de Araxá, transcritos em seus relatório


final, dá a sustentação para se pensar nas análises que vimos a pouco sobre a
perspectiva modernizadora. Compreendido de modo geral tais aspectos, pas-
saremos agora a analisar o Seminário de Teresópolis.

Questões para reflexão


Busque sintetizar as informações sobre o Seminário de Araxá: Onde
e quando se realiza? Qual a sua temática? Quantos assistentes sociais
participam? Qual a sua relevância para o processo do Movimento de
Reconceituação do Serviço Social brasileiro?

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2.2 Os seminários de Teresópolis


O Seminário de Teresópolis foi realizado no Rio de Janeiro de 10 a 17 de
janeiro de 1970, na cidade de Teresópolis; seu tema versava sobre: Metodologia
do Serviço Social. Aqui já se percebe que tal seminário não irá mais debater
a teoria do serviço social, entendendo que tais aspectos já foram suprimidos
em Araxá.
Esse seminário é entendido dentro da lógica da perspectiva Modernizadora,
e através deste, que nesta perspectiva vão se gestar processos de maior ênfase
para a instrumentalidade do serviço social, sendo um recurso que cristaliza a
perspectiva modernizadora no Movimento de Reconceituação no Brasil.
Diferentemente do Documento de Araxá, não se verá em Teresópolis a análise
de um texto único, aglutinando todas as considerações relevantes extraídas da-
quele Seminário. Ao contrário, se constatará que seu corpo é constituído de dois
relatórios distintos sendo estes o relatório do grupo A e o relatório do grupo B.
O Seminário de Teresópolis contou com a participação de 33 participantes,
dentre eles se destaca a presença de José Lucena Dantas — com sua relevância
nas contribuições da perspectiva modernizadora — e Vicente de Paula Faleiros.
Os critérios para a participação no Seminário se alicerçavam em:
[...] interesse pelo estudo da Teoria do Serviço Social;
realizações ou vivência profissional; especialização; re-
gionalidade; representatividade de instituições nacionais
públicas e privadas; diversidade quanto a procedência
institucional; tempo de formatura e procedência regional
(CBCISS, 1986, p. 54).

O Seminário foi antecedido por sete encontros que versavam sobre o apro-
fundamentos do contido em Araxá, sendo que mais de setecentos profissionais
destacaram suas contribuições sobre o conteúdo formulado em 1967, sendo
que na necessidade de maior debate e aprofundamentos obre tais questões se
propôs o Seminário de Teresópolis.
A programação do Seminário foi submetida ao participantes que relataram a
dificuldade de se realizar todas as temáticas elencadas, deliberando então por
debater sobre: os fundamentos da metodologia do serviço social; concepção
científica da prática do assistente social; aplicação da metodologia do serviço
social (CBCISS, 1986, p. 54).
As escolhidas para o evento foram: Fundamentos da metodologia do serviço
social — o qual foi debatido em plenária —, concepção científica da prática

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140  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

do serviço social e aplicação da metodologia do serviço social — estes dois


últimos deveriam ser debatidos nos grupos.
Três textos serviram de base para as discussões em Teresópolis, sendo eles:
Introdução ás Questões de Metodologia — Teoria do Diagnóstico e da Inter-
venção em Serviço Social, de Suely Gomes Costa; Teoria Metodológica do
Serviço Social, uma Abordagem Sistemática, de José Lucena Dantas; e Bases
para a Reformulação da Metodologia do Serviço Social, de Tecla Machado
Soeiro. Netto (2011), destaca que dos três textos estudados, o texto de José
Lucena Dantas é o que apresentava maior pertinência em face da conjuntura
do período e das respostas que deveria fornecer a Araxá.
Sendo definidos os textos, o Seminário adotou a metodologia da divisão
dos participantes em dois grupos distintos, sendo estes o Grupo A e o Grupo B;
tais grupos deveriam debater sobre as temáticas 2 e 3, já destacadas a pouco,
no entanto, o grupo A concentrou seus esforços se sobre a temática 2; o grupo
B seguiu o roteiro proposto.
O relatório do grupo A demonstra que os trabalhos seguiram a lógica de
elencar os fenômenos significativos para o serviço social, de acordo com níveis
destacados por eles, dando seguimento com o levantamento das variáveis que
incidiam em cada fenômeno e em cada nível destacado e que eram determi-
nantes para o serviço social. Em seguida, tendo realizado o levantamento dos
fenômenos significativos para o serviço social, correspondido em seus níveis,
destacado as suas variáveis, os profissionais se dedicaram a destacar as funções
que caberiam sobre tais variáveis, descreviam, em seguida, a redução das fun-
ções identificadas e, então, a sua classificação.
Destaca-se que em Teresópolis, apesar dos fenômenos descritos de acordo
com seus níveis, os propositores desta classificação não buscavam realizar um
tratamento separado de tais fenômenos, mas pelo menos em seu campo t­ eórico
advertiam para a necessária interpelação entre estes em uma tonalidade de
globalidade.
A proposta do grupo A em Teresópolis se materializou em quadros de refe-
rência contendo os níveis destacados por estes sendo: 1) Nível Biológico e de
Equipamento Sanitário; 2) Nível Doméstico e Familiar; 3) Nível Educacional;
4) Nível Residencial; 5) Nível Cívico-Municipal; 6) Nível Sociocultural; 7) Nível
de Segurança (CBCISS, 1986).
Para cada nível se identifica os fenômenos que se apresentaram, na prática
do assistente social, e se identificava para estes fenômenos as variáveis que

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incidiam sobre tais, conforme o exemplo extraído do quadro 1 do relatório


do Grupo A em Teresópolis: Nível Biológico: Fenômeno significativo observa-
dos na prática do serviço social — Subnutrição — Variáveis significativas para
o serviço social no fenômeno observado — a) tabus alimentares; b) hábitos
alimentares inadequados; c) baixa renda; d) baixa produtividade; e) doenças
carenciais e falta de higidez.
Em seguida, destacado o nível, identificado o fenômeno, os profissionais
relatavam as possíveis funções do serviço social (as quais neste exemplo, para
esta variável exemplificada) eram: 1) introdução e/ou substituição de valores
e comportamento alimentar e higiênico; 2) substituição de hábitos alimenta-
res; 3) assistência financeira; 4) planejamento social; 5) assistência alimentar
e medicamentosa; 6) participação em pesquisas médico-sociais. E por fim a
descrição dessas funções de forma reduzida: 1) de substituição de padrões; 2)
assistencial; 3) de planejamento; 4) de pesquisa de recursos.
Assim têm-se uma dinâmica na identificação dos fenômenos e nos seus
tratamentos, de forma mais ou menos previsível e de observação de uma te-
oria positivista de observação e classificação dos fenômenos de acordo com
a sua regularidade.
Com relação ao grupo B, o tratamento dado a temática também não difere
essencialmente, mas apresenta contornos similares com diferenciações adje-
tivas, no entanto, esse grupo conseguiu seguir todo o roteiro e assim dar cabo
da proposta.
A lógica de elencar os fenômenos e as variáveis foram seguidas, no entanto
adotou-se a conceituação de Níveis de Vida e Sistema de Reações. No entanto,
também identifica-se diferenciações nas necessidade conforme descrito.
A conceituação dos níveis de vida e a delimitação dos
setores de necessidades que os compõem foi baseada no
resultado das investigações do United Nations Research
Institute for Social Development (UNRISD) — considerada
esta contribuição como hipótese de trabalho, primeira
aproximação para análise dos níveis de vida da sociedade
brasileira (CBCISS, 1986, p. 76).

Netto (2011) afirma que este grupo vai um pouco mais longe do que o grupo
A, quando se refere as atuações deste profissional, destacando que as ações
podem ser de prestação direta, administração e planejamento, o que nos remete
ao contido em Araxá. Há ainda o destaque para os conhecimentos elaborados
e que serviriam para proceder de amparo nas práticas dos assistentes sociais.

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142  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

O relatório do grupo B segue adiante, desenvolvendo ainda o restante do


roteiro, no entanto, o que deve ser destacado aqui, é o apelo à cientificidade
presente neste documento. Há um esquema lógico que se percebe junto a
essa produção, como destacado por Netto (2011), que se centra na ênfase aos
instrumentais.
Em Araxá, coroa-se uma indicação do sentido sociotécnico
do Serviço Social: Em Teresópolis cristaliza-se a operaciona-
lidade deste sentido, obtém-se a evicção de qualquer tema-
tização conducente a coloca-lo em questão, consolida-se
o seu trato como conjunto sistematizado de procedimentos
práticos imediatos suscetíveis de administração tecnoburo-
crática (NETTO, 2011, p. 190).

Para saber mais


O Seminário de Teresópolis foi realizado de 10 a 17 de janeiro de 1970, na gestão do presidente
militar Emílio Garrastazu Médici, contou com a participação de 33 participantes com a tarefa
aprofundar a metodologia do Serviço Social, aprofundando assim os estudos realizados em
Araxá. Seu conteúdo, ao contrário do seminário realizado em 1967, não condensou um docu-
mento único, mas sim dois documentos distintos sendo estes o relatório do grupo A e o relatório
do grupo B.

Atividades de aprendizagem
1. Compreendido o que foi o Seminário de Araxá, teça um breve resumo
de suas características.
2. Destaque aqui as principais características do Seminário de Teresópolis.

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A p e r s p e c t i v a d e r e a t u a l i z a ç ã o d o c o n s e r v a d o r i s m o . . . .  143

Seção 3  Os seminários de Sumaré e Alto da


Boa Vista
Nesta seção abordaremos suscintamente os dois últimos seminários do Mo-
vimento de Reconceituação no Brasil. Tais seminários são tratados aqui como
em um processo de desgastes da instituição que os promovia, tendo limites
dentro de suas interpretações e metodologias.
Destaca-se que desse ponto em diante, começa-se a gestar no interior da
categoria profissional um posicionamento mais crítico a respeito das alterações
necessária para o serviço social. Não somente o desgaste da organização pro-
motora contribui para a sua baixa repercussão como também o processo de
fragilização da ditadura militar.
O aluno encontrará aqui traços gerais e resumidos do que veio a ser tais
seminários e como estes perdem o prestígio a medida em que vai se adensando
um processo de renovação mais crítico no interior da profissão.
Temos que esse seminário também realizado pela iniciativa do CEBCISS, em
1978, aponta para o deslocamento da perspectiva modernizadora, apontando
assim para a perspectiva de Reatualização do Conservadorismo.

3.1 O seminário de Sumaré e seminário de Alto da


Boa Vista
Tal Seminário é realizado no Rio de Janeiro, no Centro de Estudos do Su-
maré. No entanto, este não assume mais a relevância que os dois primeiros
seminários formulados e impulsionados pelo Centro Brasileiro de Cooperação
e Intercâmbio de Serviço Social (CBCISS) — Araxá e Teresópolis — assumiam
na época. Pesa-se a conjuntura, o desgaste da perspectiva Modernizadora, a
qual não conseguiu enfrentar com grande relevância as expressões da questão
social, bem como o desgaste da organização que os lançava e incentivava,
além de outros processos.

Questões para reflexão


Qual o tema dos dois primeiros seminários impulsionados pelo CBCISS?

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144  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

O Seminário de Sumaré será realizado no ano de 1978, de 20 a 24 de no-


vembro, a convite do CBCISS.
De 20 a 24 de novembro de 1978, vinte e cinco assisten-
tes sociais, a convite do CBCISS, reuniram-s no Centro
de Estudos de Sumaré, no Rio de Janeiro, com o obje-
tivo principal de continuar os estudos de teorização do
Serviço Social iniciados em 1967 com o Seminário de
Araxá, cujo documento final — O Documento de Araxá
— foi considerado por muitos como um marco teórico
do Serviço Social no Brasil. Decorridos dez anos, era
desejável retomar esse Documento e possibilitar novos
questionamentos na linha da sistematização teórica por
ele iniciado (CBCISS, 1986, p. 107).

Esse Seminário foi realizado após um processo preparatório e o lançamento


de uma pesquisa que foi realizada em 1976 no II Congresso Nacional de Assis-
tentes Sociais. Como parte dessa mesma preparação temos que os organizado-
res realizaram o envio de ofícios a 276 profissionais questionando e colhendo
sugestão para alterações do Documento de Araxá.
O posicionamento dos profissionais que responderam às solicitações, foi
a de manter intacto e inalterado tal Documento, uma vez que seu conteúdo
serviria como registro histórico para os profissionais de serviço social.
As sugestões dos profissionais em que versavam os questionamentos, apon-
taram também para um outro objetivo do Seminário, que é a de “[...] ensejar
reflexões sobre novas proposições que no momento estão a exigir um esforço
de crítica e formulação teórica”.
Aqui destacam-se, então, três questionamentos, que deverão embasar os
documentos base da realização do Seminário.
Questionamento I — O Serviço Social numa perspectiva
do método científico de construção e aplicação do Ser-
viço Social.
Questionamento II — O Serviço Social a partir de uma
abordagem de compreensão, ou seja, interpretação feno-
menológica do estudo científico do Serviço Social.
Questionamento III — O Serviço Social a partir de uma
abordagem dialética, ou seja, teoria de interpretação
com base no método dialético, entendido em sentido
metodológico: a relação entre objeto construído por uma
ciência, o método empregado e o objeto real visado por
uma ciência (CBCISS, 1986, p. 108).

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Temos que a participação dos integrantes do Seminário adotou a escolha


de regiões e localidades onde houvesse a presença/existência de cursos de
mestrado em Serviço Social; naquele momento apenas três cidades possuíam
tal requisito, sendo estas, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre.
A proposta era de que cada cidade teria três grupos que elaborasse docu-
mentos base para então ser apreciado pelos seus participantes. A organização do
evento recebeu apenas 6 documentos, sendo estes enviados pelos grupos de São
Paulo e do Rio de Janeiro, não havendo nenhum envio dos grupos de Porto Alegre.
Temas-questionamentos I
A cientificidade do Serviço Social (Rio de Janeiro)
Reflexões sobre o processo histórico-científico de cons-
trução do objeto do Serviço Social (São Paulo)
Temas-questionamentos II
Reflexões sobre a construção do Serviço Social a partir de
uma abordagem de compreensão, ou seja, interpretação
fenomenológica do estudo científico do Serviço Social
(Rio de Janeiro)
Roteiro de Reflexão: Fenomenologia e Serviço Social.
Proposições a serem discutidas pelos grupos (São Paulo)
Temas-questionamentos III
Serviço Social e Cultura — uma alternativa para discussão
das relações assistente social/clientela (Rio de Janeiro)
Roteiro de reflexão: Dialética e Serviço Social (São Paulo)
(CBCISS, 1986, p. 109).

O tema central do Seminário de Sumaré é “O Serviço Social e a Cientifici-


dade”; seus objetivos iam na direção de aprofundar os estudos de Araxá, refletir
sobre as novas proposições ao serviço social em suas críticas e formulações
teóricas e a viabilidade das proposições emanadas ante a realidade brasileira.

Para saber mais


Neste momento, o Brasil vivia a política de Distensão implementada no governo militar de Er-
nesto Geisel e seguida ainda que com retrocessos pelo último governo da ditadura. Há aqui
uma nova efervescência dos movimentos populares, com destaca para o sindicalismo do ABC
paulista, onde vê surgir a imagem de Luis Inácio Lula da Silva. Mais adiante, em 1979, o Serviço
Social experimentará uma guinada nas suas direções com o a realização do III Congresso Bra-
sileiro de Assistentes Sociais que ficou conhecido como Congresso da Virada.

Book_fundamentos_historicos_II.indb 145 25/06/14 17:40


146  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

As temáticas, que foram trabalhadas no referido seminário de Sumaré, foram


desenvolvidas por meio de conferência, estudos em grupos e sessão plenária.
No seu primeiro capítulo teremos o desenvolvimento da temática do ser-
viço social e a cientificidade, com apoio de documento elaborado pelo Rio
de Janeiro. E por São Paulo. Já o segundo capítulo aborda o serviço social e a
fenomenologia com destaque de sua composição com a conferência inicial
realizada por Creusa Capalbo e com apelo ainda para os documento abordados
a pouco no tema-questionamento II. No terceiro capítulo III têm-se a discussão
sobre o serviço social e a dialética, também incluindo, em seus trabalhos, a
conferência inicial da professora Creusa Capalbo, bem como os documentos
compostos nos temas-questionamentos III destacados acima.
Assim temos que as discussões das temáticas foram mediadas por textos de
base formulados por grupos de São Paulo e Rio de Janeiro e seguidas de suas
considerações sobre a temática. No primeiro tema, têm-se por mediação dois
textos, um do grupo de São Paulo e do Rio de Janeiro que versavam sobre a
cientificidade junto ao serviço social.
O texto-base do Rio de Janeiro deixava de lado a especificidade da profissão
e as suas funções, o que era medular para a temática. Já no texto base para
temática referente a produção do grupo paulista, percebe-se a definição de que
o serviço social ainda não atingiu a sua cientificidade, e remete a discussão
para o campo da dialética, ainda que com contornos ofuscados.
Netto (2011) destaca que as postulações sobre a fenomenologia abordada no
seminário de Sumaré não davam conta da complexidade da matéria, e adverte
que a interpretação dada para esta filosofia utilizava-se de autores os quais não
eram originais de tais sustentações.
Assim, o autor vai analisando a perspectiva de Reatualização do Con-
servadorismo e realizando um debate com a apropriação um tanto quanto
equivocada desta filosofia fenomenológica, que até então se mostrava nova
ao Serviço Social, não registrando nenhuma apropriação anterior na história
da profissão. Isto posto, trouxe debilidades para a postura da Reatualização do
Conservadorismo que não passaram se críticas.
Com relação ao seminário de Alto da Boa Vista, não aprofundaremos as nos-
sas análises, apenas realizando aqui um registro histórico de seu ocorrido, visto
ainda o fato de seu deslocamento histórico e significativo nos rumos das altera-
ções da categoria profissional. Assim, compreendemos que o mesmo é realidade
em novembro de 1984, tendo a participação de 24 profissionais e cujo material
encontra-se disposto na revista Debates Sociais de 1984 (NETTO, 2010, p. 66).

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Para saber mais


Neste período o Brasil buscava a sua libertação da ditadura militar que se iniciava 20 anos antes.
Este processo terá a participação da categoria profissional pressionando o Estado para a sua
abertura democrática, solidificando as lutas das classes trabalhadoras e se inserindo pela luta
de direitos sociais e intensificando as bandeiras sindicais.

Netto (2011) afirma que no conteúdo do seminário de Alto da Boa Vista é


possível identificar um certo simplismo dos conferencista, não em razão de sua
habilidades teóricas, mas pela formatação do próprio seminário.
Percebemos então que a grande relevância atingida nos seminários iniciais a
que nos atemos com maior dedicação, denuncia que o espaço do CBCISS padecia
de uma ilegitimidade para tratar das temáticas dos desdobramentos da profissão.
Nas palavras do autor:
[...] Sem prejuízo de uma eventual e futura revalorização da-
quele espaço, o exame dos resultados do Sumaré e do Alto da
Boa Vista patenteia que o processo de renovação profissional
já transitava por outros condutos e envolvia outros protagonis-
tas. Mas foi ainda no seu marco que se explicitou a segunda
direção do processo renovador [...] (NETTO, 2011, p. 201).
Tais condutos se expressarão nas novas direções do Conselho Federal da
categoria, que após o Congresso da Virada terá uma nova direção, se alinhando
de forma crítica e assimilando as bandeiras mais progressistas da profissão.
Não obstante, já estará em voga um novo currículo profissional que mu-
dará em termos significativos o rumo da formação profissional. Não obstante,
também bate a porta um novo Código de Ética que será inaugurado em 1986
e que terá pela primeira vez na história uma nova direção profissional e uma
ruptura profunda com os elementos conservadores que compunham as relações
doas assistentes sociais, seu público, alvo e outros profissionais.

Atividades de aprendizagem
1. Teça suas análises sobre o que foi o seminário de Sumaré.
2. Com base no exposto, faça uma breve síntese do processo de desgaste
da realização dos seminários propostos pelo CBCISS.

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148 FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Fique ligado!
Nesta unidade vimos o que foi o Movimento de Reconceituação e o
que ele significou para a categoria profissional na superação do dito
serviço social tradicional.
Compreendemos que o Movimento de Reconceituação se fez a partir da
década de 1960 e apresentou desdobramentos distintos na conjuntura
brasileira e latino-americana, manifestando a perspectiva de Reatuali-
zação do Conservadorismo.
Percebeu que no Brasil, a princípio, temos a manifestação deste movimento
alinhado a realização de seminários, impulsionados por uma organização
da categoria profissional não inscrita no eixo de formação acadêmica;
Compreendemos o que foi o primeiro seminário deste movimento no
Brasil, realizado no ano de 1967.
Percebemos a relevância e as características dos seminários de Araxá,
Teresópolis, Sumaré e Alto da Boa Vista.
Identificamos que à medida que tal movimento se aprofunda no Bra-
sil, também se destaca a crise na realização de tais seminários, uma
vez que estes não apresentam caminhos radicais para a superação do
conservadorismo.
Percebemos que embora as duas perspectivas que foram abordadas neste
livro sinalizem um importante debate no inteiro da profissão, nenhuma
das duas oferece o aporte necessário para a superação do conservado-
rismo, ficando esta tarefa para a perspectiva de Intenção de Ruptura.

Para concluir o estudo da unidade


Nesta unidade você teve a oportunidade de lançar uma breve introdução
pelos caminhos de uma perspectiva de alteração da profissão, que ao
invés de lançar suas projeções para superação dos traços de uma história
um tanto quanto equivocada, busca ressignificar elementos de um serviço
social tradicional, com uma roupagem que se apresenta como nova junto
ao processo de constituição da profissão.

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Não obstante, trouxemos os elementos de Seminários que impulsio-


naram as alterações na profissão, realizados pelo CBCISS e concebido
a princípio como os principais canais de discussão e disseminação das
alterações junto ao serviço social.
Para um melhor aprofundamento dos seus conteúdos, busque maiores
conhecimentos nas análises dos Documentos de Araxá, Teresópolis e Su-
maré, os quais estão inscritos em uma coletânea de Documentos formulada
pelo CBCISS em 1986.

Atividades de aprendizagem da unidade


1. Considerando-se o processo de intensificação das alterações na profis-
são de serviço social, o qual aponta o Movimento de Reconceituação
enquanto momento impar na busca de superação do conservado-
rismo, assinale a alternativa correta com relação a esse movimento.
(  ) Caracteriza-se como um movimento brasileiro apenas, sendo
manifestado no início da década de 1950.
(  ) Caracteriza-se como um movimento latino-americano, sendo
manifestado na metade da década de 1960.
(  ) Caracteriza-se como um movimento europeu, sendo manifestado
na metade da década de 1960 e tendo grande incidência na
categoria profissional no Brasil.
(  ) Caracteriza-se como um movimento norte americano, sendo
manifestado na metade da década de 1960 e tendo na categoria
profissional no Brasil.
2. Compreendendo as transformações ocorridas na profissão junto ao
Movimento de Reconceituação, assinale a alternativa correta quanto
a perspectiva de Reatualização do Conservadorismo.
(  ) Está manifestada em uma conjuntura de fragilidade da ditadura
militar, recupera traços do serviço social tradicional e se contra-
põem ao regime autocrático imposto naquele momento.
(  ) Está manifestada em uma conjuntura de ascensão da ditadura
militar, recupera traços do serviço social tradicional e se e não se
contrapõem ao regime autocrático imposto naquele momento.

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150  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

(  ) Está manifestada em uma conjuntura de fragilidade da ditadura


militar, rompe com os traços do serviço social tradicional e se
contrapõem ao regime autocrático imposto naquele momento.
(  ) Está manifestada em uma conjuntura de fragilidade da ditadura
militar, não traços do serviço social tradicional e não se contra-
põem ao regime autocrático imposto naquele momento.
3. Assinale a alternativa correta quanto à perspectiva de Reatualização
do Conservadorismo:
(  ) É manifestada na década de 1970 no Brasil, tem fundamentação
teórica no marxismo e rompe definitivamente com o serviço
social tradicional.
(  ) É manifestada na década de 1960 na América Latina, tem fun-
damentação teórica na estrutural funcionalista e rompe definiti-
vamente com o serviço social tradicional.
(  ) É manifestada na década de 1970 no Brasil, tem fundamentação
teórica na fenomenologia e não rompe definitivamente com o
serviço social tradicional.
(  ) É manifestada na década de 1960 no Brasil, tem fundamentação
teórica na fenomenologia e rompe definitivamente com o serviço
social tradicional.
4. Temos que o seminário de Araxá é um marco para a categoria profis-
sional no Brasil. Nesse sentido, assinale a alternativa correta quanto
a esse seminário.
(  ) É realizado no ano de 1965 por iniciativa do CBCISS e está inscrito
dentro da perspectiva de Reatualização do Conservadorismo.
(  ) É realizado no ano de 1967 por iniciativa do CFESS e está inscrito
dentro da perspectiva de Modernizadora.
(  ) É realizado no ano de 1978 por iniciativa do CBCISS e está inscrito
dentro da perspectiva de Intenção de Ruptura.
(  ) É realizado no ano de 1967 por iniciativa do CBCISS e está inscrito
dentro da perspectiva de Modernizadora.
5. A realização de seminários se caracteriza como um processo de
grande relevância na busca de alternativa para superação do con-
servadorismo. Assim, assinale a alternativa correta com relação ao
seminário de Teresópolis:

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(  ) É realizado no ano de 1970, está inscrito dentro da perspectiva


Modernizadora, não rompe definitivamente com o conservado-
rismo.
(  ) É realizado no ano de 1967, está inscrito dentro da perspectiva
de Intenção de Ruptura, não rompe definitivamente com o con-
servadorismo.
(  ) É realizado no ano de 1970, está inscrito dentro da perspectiva de
Reatualização do Conservadorismo, não rompe definitivamente
com o serviço social tradicional.
(  ) É realizado no ano de 1978, está inscrito dentro da perspectiva
Mudancista e rompe definitivamente com o conservadorismo.

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152  FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS...

Referências
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necessária. Franca: Unesp, 2006.
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<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-66282010000100002>.
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HUSSERL, Edmund. L'idée de la phénoménologie. Cinq Leçons. Traduit de l'allemand par
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IAMAMOTO, Marilda Villela. Serviço social em tempo de capital fetiche. Capitalismo
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MACEDO, Myrtes de Aguiar. Reconceituação do serviço social. Formulações diagnósticas.
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YASBEC, Maria Carmelita. Fundamentos históricos e teóricos metodológicos do serviço
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teóricos e metodológicos
Fundamentos históricos

do serviço social II

UNOPAR FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DO SERVIÇO SOCIAL II

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