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A DINÂMICA DAS FEIRAS AGROECOLÓGICAS DO RECIFE: UMA ABORDAGEM DO

CONSUMIDOR E PRODUTOR

Gilmar Correia Dias – UFRPE; Rainier Emanuel Freire de Freitas Guedes – UFRPE; Ana Maria Dubeux
Gervais - UFRPE, Paulo José de Santana – UFRPE; Herivelto José da Silva - UFPE

Área: Consumo e produção sustentável

RESUMO
Este artigo contribui para a discussão sobre a dinâmica das feiras agroecológicas do Recife. Tendo o objetivo
de verificar as características dos produtores e consumidores quanto à organização das mesmas, a
confiabilidade e procedência dos produtos ofertados. Para os procedimentos metodológicos foram realizadas
pesquisa de campo nas principais feiras organizadas pelo Centro Agroecológico Sabiá. O SERTA utilizou-se
dados secundários do questionário realizado pela equipe do Projeto Pernambuco Agroecológico,
disponibilizado pelo Centro Sabiá sobre os consumidores das principais feiras agroecológicas da Região
Metropolitana do Recife. Na coleta de dados primários foram realizadas entrevistas com os representantes de
organizações não governamentais, gestores de feiras, pesquisadores e técnicos. Os resultados revelam que a
frequência da assistência técnica nas propriedades é satisfatória por parte dos gestores das feiras, com destaque
para a padronização das barracas e fardamento dos produtores realizado pela organização da feira. Os
consumidores têm bom percentual de aceitação da qualidade dos produtos ofertados, porém apenas 27,5% dos
entrevistados informaram conhecer a procedência de controle agroecológico nas feiras.
Palavras-Chaves: Agricultura Familiar; Consumidor; Feira Agroecológica.

DYNAMICS OF FAIRS OF RECIFE AGROECOLOGICAL: AN APPROACH OF CONSUMER


AND PRODUCER

ABSTRACT
This article contributes to the discussion on the dynamics of agro-ecological fairs of Recife. Since the objective
of verifying the characteristics of the consumers as to the organization of trade fairs, reliability and origin of
the products offered. For methodological procedures were carried out field research in major trade fairs
organized by the Agro-Ecological Center Sabia and the Serta, we used secondary data of the questionnaire
conducted by the Pernambuco Agroecology Project team, provided by Sabia Center on consumers of the main
agro-ecological fairs in the Metropolitan Region Recife. In primary data collection were interviews with
representatives of non-governmental organizations, trade manager, researchers and technicians. The results
show that the frequency of service on the properties is satisfactory by managers of the fairs. Emphasis on
standardization of tents and uniforms producers conducted by organizing the fair. Consumers have good
percentage of acceptance of the quality of the products consumed, but only 27.5% of respondents reported
knowing the origin of agro-ecological control of the fairs.
Keywords: Family farming; Consumer; Agroecological Fair.

1. Introdução

A sociedade mundial e governos vêm evidenciando a importância da agricultura familiar de base


agroecológica. Assim sendo, em 2014 foi dedicado aquele ano para reflexão, sobretudo sobre a erradicação da
pobreza e preservação dos recursos naturais através da valorização da Agricultura Familiar. Segundo dados da
Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura - FAO (2014), em ambos os países,
desenvolvidos e em desenvolvimento, nove em cada dez empreendimentos rurais são administrados por
famílias, produzindo 80% dos alimentos do mundo, mas também servindo de guardiões de cerca de 70% dos
terrenos agrícolas.
O mercado de produto orgânico tem se destacado como uma das alternativas de renda para os agricultores
familiares, devido à demanda mundial de alimentos mais saudáveis segundo Campanhola e Valarini (2001).
Com isso, o Instituto de Promoção do Desenvolvimento – IPD (2011) informa que os alimentos e bebidas estão
cada vez mais comuns nos mercados brasileiros, proporcionando novos canais de distribuição e
comercialização para tornar a demanda mais regular. Esse impulso é resultado de um consumidor mais
consciente, que busca uma melhor qualidade de vida através do consumo de alimentos saudáveis, ressalta
Fleury e Lima (2005).
O crescimento da produção e do consumo mundialmente verificado, segundo os especialistas, favorece o
mercado interno e cria oportunidades de aumento de renda para empresas exportadoras de produtos e alimentos
orgânicos. Apesar de não ser o maior produtor por hectare da América Latina, ficando atrás da Argentina e
Uruguai, o Brasil é destaque entre os países que mais apoiam agricultura familiar no hemisfério sul, conforme
o PORTAL BRASIL (2012).
As políticas públicas ainda encontram limitações quanto às peculiaridades dos agricultores familiares nas
diversas regiões do país. Para Rosa (1999), neste caso é preciso considerar as diferenças regionais e locais,
incentivar as atividades que geram empregos e conhecimentos, que possibilitem aumentar os recursos
disponíveis.
Com a necessidade de desenvolver canais e estabelecer formas mais justas de comercialização dos produtos
sem a intervenção de atravessadores e varejistas, as feiras agroecológicas vêm demostrando ser um espaço
adequado e estratégico, para a promoção do aumento da renda dos produtores familiares, fortalecendo a
integração cidade com campo (CARVALHO et al., 2008).
Nessa perspectiva, o artigo tem como objetivo analisar a dinâmica das feiras agroecológicas sob a percepção
da qualidade orgânica adquirida nas feiras do Recife. Para isso, foi necessário caracterizar os consumidores e
produtores das feiras; identificar os principais produtos consumidos, analisar as informações colhidas no
questionário sobre legislação orgânica, organização do ponto de venda, comercialização dos produtos e
percepção da confiabilidade dos produtos orgânicos na perspectiva de quem compra e de quem vende.
Portanto, foi necessário responder as seguintes perguntas: “qual a percepção do consumidor sobre a qualidade
dos produtos orgânicos ofertados?”, e, no caso dos produtores, “como se dá a comercialização dos produtos e
organização das feiras ?”.

2. Material e Métodos

No que se refere aos procedimentos de pesquisa, este foi um levantamento de campo (survey) procurando
informações sobre as práticas ou opiniões atuais dos envolvidos na amostra. A pesquisa associou métodos
quantitativos e qualitativos por se tratarem de informações que traduzem em números as opiniões; bem como
respostas que não podem ser quantificadas e precisam ser analisadas intuitivamente, atribuindo-lhes
significados nos dados coletados e observados no local da feira.
Foram realizados dois questionários estruturados com perguntas fechadas e abertas, sendo um para o produtor
e o outro para os consumidores. Ambos foram disponibilizados espaços para observações, sugestões e críticas
dos entrevistados, como também a observação do entrevistador in loco, com intuito de responder os objetivos
propostos deste estudo. A aplicação dos questionários ocorreu em março de 2015, no horário das feiras, entre
às 05h30min e 08h30min.
A população do estudo é formada por produtores e consumidores das Feiras Agroecológicas do Recife,
assessoradas pelo Centro Sabiá e SERTA. A amostra selecionada ocorreu em quatro feiras agroecológicas,
respectivamente, nos bairros de Boa Viagem, Graças, Dois Irmãos e no CEASA-PE com 24 produtores e de
48 consumidores de produtos agroecológicos.
Utilizou-se do método de amostragem não probabilística, onde a seleção dos elementos da população para
compor a amostra não foi aleatória e ao menos determinada pela ordem do pesquisador.

3. Resultados e Discussão

3.1 Agricultura Familiar

O agricultor familiar é definido pela Lei 11.326/2006, que estabelece as seguintes características: i) não deter
área maior que quatro módulos fiscais; ii) utilizar predominantemente a mão de obra da própria família nas
atividades econômicas do estabelecimento ou empreendimento; iii) ter renda familiar predominantemente
originada de atividades econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento e iv) dirigir
seu empreendimento com a família.
A agricultura familiar é definida por três elementos básicos a seguir: i) funcionamento, baseado
predominantemente no uso da força de trabalho da família e de seus membros; ii) persistências de barreiras
que possibilitam a subsistência de relações de trabalho não assalariadas na agricultura e iii) dependência de
reprodução social, econômica, social das formas familiares com relação ao ambiente e o espaço no qual estão
inseridos conforme (SCHNEIDER, 2009).
Vale ressaltar que a agricultura familiar possui algumas características que as diferenciam das outras formas
de agricultura. Segundo Guanziroli et al. (2001), são considerados agricultores familiares os produtores que
trabalham da seguinte maneira: “a direção dos trabalhos cumpridos no estabelecimento rural deve ser realizado
pelo produtor rural”.

3.2 Agricultura Familiar de Base Orgânica

Para ser considerado orgânico o produto não pode receber substâncias que coloquem em risco a saúde humana
e o meio ambiente. Não são utilizados fertilizantes, sintéticos solúveis, agrotóxicos e transgênicos. A produção
deve ter como base do processo produtivo os princípios agroecológicos que comtemplam e respeitam os
recursos naturais, as relações sociais e culturais, conforme o Ministério da Agricultura preceitua.
(MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, 2014).
No Brasil, a agricultura familiar apresenta-se como uma boa alternativa para o atual cenário da agricultura
orgânica certificada, como um meio para o resgate à dignidade e à cidadania no campo com a construção de
um novo padrão de produção agropecuária, segundo Stringheta e Muniz (2003).
Assis e Romeiro (2002) ressaltam que os sistemas familiares de produção estão mais bem posicionados para
implementar as práticas agroecológicas, quando levamos em consideração a estrutura de produção
diversificada, a um nível de complexidade desejado, passíveis de monitoramento e controle do processo de
trabalho.

3.3 Agriculturas de Base Ecológica

A procura de agriculturas alternativas ao modelo convencional e menos agressivas ao meio ambiente, fez com
que agricultores, pesquisadores e técnicos evoluíssem o conceito de agricultura de base ecológica para viver
em harmonia entre o meio social, econômico, ecológico, político e cultural.
O termo Agroecologia aqui discutido é esclarecido por Assis e Romeiro (2002) como “uma ciência que surge
na década de 1970 como forma de estabelecer uma base teórica para diferentes movimentos de agricultura
alternativa que então ganhavam força com os sinais de esgotamento da agricultura moderna”.
De acordo com Caporal e Costabeber (2004), várias denominações surgiram como tentativa de contraponto
aos modelos convencionais de agricultura, especialmente após a Segunda Guerra Mundial. Mas, na maioria
das vezes tais alternativas não conseguiram dar as respostas para os problemas socioambientais que foram
acumulando ao longo do tempo. Neste ambiente de busca e construção de novos conhecimentos, nasceu a
Agroecologia, com um novo enfoque científico, capaz de dar suporte à transição de estilos de agriculturas
sustentáveis.
Nesse estudo, caracteriza-se agroecologia como ciência surgida a partir da busca de base teórica para sistemas
orgânicos de produção. Entretanto, a agricultura orgânica é uma prática agrícola, cuja construção social
apresenta alguns vieses que determinam que os limites teóricos da agroecologia sejam respeitados em maior
ou menor grau, alerta Assis e Romeiro (2002).

3.4 Breve Panorama das feiras Agroecológicas

As feiras livres, assim como as feiras de orgânicos, continuam sendo um importante mercado varejista em
diversas cidades. Podem ser fixas, funcionando uma vez por semana, em local determinado, ou móveis
eventualmente, ocorrendo quando há festividades culturais da região, como exposição e festas populares
(MACHADO e SILVA, 2009, p.120).
Os autores acima ressaltam ações no sudeste brasileiro, como modernização das feiras, melhorias de
instrumentos de distribuição e da assistência técnica aos produtores para resgatar o apelo da venda direta do
produtor, que na maioria das vezes, para o consumidor representa a oportunidade de adquirir produtos mais
baratos e garantindo em termos de não utilização de agrotóxicos ou qualquer produto químico que altere as
características naturais dos produtos.
O surgimento das feiras de orgânicos acontece em meio à necessidade dos produtores encontrarem alternativas
para venda de produtos em espaços que favoreçam a exclusividade da produção, nesse caso pode ser entendido
como a agregação de valor de menor escala, evitando o modelo de produção convencional.
As feiras agroecológicas promovem aos seus frequentadores um espaço para aquisição de produtos de
qualidade, diretamente comercializados pelo agricultor familiar. Logo, nesse tipo de mercado não existe a
presença do atravessador de modo geral, assim os produtos negociados podem ser adquiridos por um preço
mais justo, tanto para o consumidor como produtor (BRASILEIRO, 2010).

3.5 Perfil do Consumidor de feiras Agroecológicas da Região Metropolitana do Recife

Dados da pesquisa realizada pelo Projeto Pernambuco Agroecológico entre os meses de maio e outubro de
2014, mostrou que os consumidores domiciliados na Região Metropolitana do Recife – RMR, nas cidades de
Recife, Olinda, Camaragibe, São Lourenço da Mata, Paulista e Jaboatão dos Guararapes revelaram que existe
predominância do público feminino nas feiras agroecológicas de 69,87% dos entrevistados. A faixa etária
predominante dos consumidores foi de 41-50 anos foi de 63%. A escolaridade observada dos consumidores
foi a de ensino superior em 87,7% das respostas. Foi constatado que a renda mensal dos consumidores das
feiras acima de dez salários corresponde a 44,23% das respostas.
A frequência de compras nas feiras agroecológicas acontece semanalmente, conforme 71% dos consumidores.
Porém, nem tudo se compra nos espaços de comercialização. Segundo dados da pesquisa, 53% informaram
complementar com alimentos de mercados, supermercados e feiras convencionais. Poucos responderam
retornar às lojas de produtos naturais. As respostas foram positivas para 78,85% dos entrevistados quando
perguntado se os consumidores confiam na qualidade dos produtos oferecidos nas feiras. Contudo, vale
destacar que mesmo com alto índice de aprovação da percepção da qualidade dos produtos na feira os
consumidores ainda têm dúvidas da procedência. Quem compra, nem sempre prepara, esse é um interessante
resultado da pesquisa mostra que 52,6% dos clientes informaram não preparar os alimentos em sua casa.
Diante o exposto, o próximo subcapítulo abordará a literatura sobre o processo de decisão de compra e as
escolhas racionais e emocionais que os clientes realizam mediante ao produto agroecológico nas feiras.

3.6 Processo de Decisão de Compra

Na literatura sobre o comportamento do consumidor o processo de decisão de compra é caracterizado em meio


às atividades mentais e emocionais realizadas na seleção, compra e uso de produto e/ou serviços para satisfazer
necessidades e desejos (RICHERS, 1984).
Fischler (1990) argumenta que a escolha quanto à alimentação está relacionada à consequência de diversos
fatores com os biológicos, sociais, econômicos, culturais e psicológicos. Nesta perspectiva, Kotler (1996)
detalha um modelo cujos fatores influenciam o comportamento de compra, como os sociais (grupos de
referência, família, papéis e posição social); fatores culturais (cultura, subcultura e classe social); fatores
pessoais (idade e estágio do ciclo de vida, ocupação, condições econômicas, estilo de vida, personalidade e
autoconceito) e fatores psicológicos (motivação, percepção, aprendizagem, crenças e atitudes).
Existem alguns autores que sintetizam a abordagem interdisciplinar dos fatores externos e internos que
influenciam o processo de tomada decisão de compra (Solomon, 2011; McDonald, 2004; Kotler e Keller,
2006).
Na tentativa de estabelecer as etapas de decisão de compra, Kotler e Keller (2006, p. 189) na figura 02 definem
a primeira etapa como o reconhecimento do problema, como a necessidade provocada por estímulos internos
(como sede e fome) ou externos (como anúncios no modo geral). A segunda etapa é conhecida como a busca
de informações que tende a ficar mais atento às informações precisas através de amigos, familiares, vizinhos
e conhecidos (fontes pessoais); em propagandas, representantes, embalagens, mostruários (fontes comerciais);
em meios de comunicação de massa, organizações de classificação de consumo (fontes públicas) e com
manuseio, exame, uso do produto (fontes experimentais).
A avaliação de alternativas é a opção que o consumidor faz em relações às opções conforme sua crença e
atitudes. Ou seja, os consumidores procuram certos benefícios na escolha do produto para satisfazer uma
necessidade preexistente. Em seguida, é conhecida a quarta etapa de decisão de compra que caracteriza a
escolha de uma das alternativas. Nesta etapa a decisão de compras envolve cinco subdivisões como a marca,
quantidade, revendedor e por forma de pagamento. E por fim, temos a quinta etapa o pós-compra que é preciso
para correções e ajustes necessários de acordo com o posicionamento dos clientes.
Figura
02 –

Processo de decisão de compras.

Fonte: Kotler e Keller (2006).

Dentre os fatores vistos anteriormente no processo de decisão de compras, o estudo voltará para os fatores
psicológicos, pelo qual Kotler (1998) define a motivação, percepção, aprendizagem e crenças e atitudes. Para
o autor, a percepção é a forma pela qual uma pessoa seleciona, organiza e interpreta as informações para criar
um quadro significativo do mundo. Neste contexto, três são os processos de percepção: i) atenção seletiva –
quando as pessoas percebem os estímulos relacionados a uma necessidade atual; ii) distorção seletiva –
tendência de as pessoas interpretarem as informações conforme suas intenções pessoais, reforçando suas
preconcepções ao invés de contrariá-las; iii) retenção seletiva – as pessoas tendem a reter as informações que
reforcem suas atitudes e crenças (KOTLER, 1998).
Para Singer (2007), embora a forma de produção, distribuição e a pressão da publicidade dos alimentos
dificultem aos consumidores escolhas conscientes, os resultados das escolhas alimentares individuais
impactam sobre os demais seres e meio ambiente. O movimento que a sociedade vem fazendo em direção à
nova consciência alimentar vem alertando sobre os maus tratos e as consequências nos processos de criação e
abates de animais, como a mobilização em prol da produção e do consumo dos produtos orgânicos.
Essa percepção sobre o alimento pressupõe que a escolha ética implica no conhecimento de como, onde e de
que modo os alimentos são produzidos e comercializados. O consumo de orgânico é um exemplo de nova
consciência que tem sido analisada, seguindo, principalmente, a preocupação com o meio ambiente, o bem-
estar e com um modo de ação política (KRISCHKE e TOMIELLO, 2009).
O consumo de orgânicos é por muitas vezes estimulados pelas pessoas que acreditam que “métodos mais
naturais de produzir alimentos têm mais chances de serem saudáveis”. Também os benefícios ambientais,
como a manutenção da qualidade do solo, promoção da biodiversidade, a redução da poluição e a redução do
consumo de energia são principais fatores que determinam a decisão de compra (escolha) relatado em Singer
e Mason (2007, p.217).

3.7 Características dos Produtores

Dentre os 24 produtores pesquisados, observaram que 33% dos entrevistados eram membros da Feira de
Orgânicos da CEASA-PE; 29% de Boa Viagem; 21% das Graças e 17% de Dois Irmãos. A maioria dos
entrevistados tem mais de 50 anos em 50% das respostas, seguido de 21% na faixa etária entre 45-49 anos;
13% entre 40-44 anos. Apenas um produtor entrevistado não estava associado e não produzia o ano todo, o
restante permanecia associado às instituições de produtores e produtoras agroecológicas dos municípios que
residem.
Foram identificadas algumas associações de produtos agroecológicos: a ASSIM da cidade de Lagoa de Itaenga,
Agroflor de Bom Jardim, Mocotó de Vitória de Santo Antão; Ama Terra de Gravatá, Terra e Vida de Igarassu,
Chico Mendes III de Paudalho, assim como associações de Glória de Goitá, Chá Grande, Feira Nova e
Palmares, localizados nas regiões do Agreste, Mata e Região Metropolitana do Recife.
A escolaridade dos produtores é majoritariamente do ensino fundamental, de acordo com dados da pesquisa,
em percentuais podemos observar: 67% fundamental; 29% médio e superior com 4%. A dimensão das
propriedades é pequena, observou-se que 60% se enquadram em áreas de até 6 hectares, confirmando assim a
característica de uma área produtiva típica da agricultura familiar.
Na média os produtores têm sua renda exclusiva da agricultura, totalizando 75% de dependentes diretos, e 25%
complementando a renda familiar com o Bolsa Família, benefícios previdenciários e a aposentadoria. Em
menor número, há os que trabalham por conta própria e utilizam o veículo próprio para realizar viagens
escolares como complemento da renda. Cada associação organiza a entrega dos produtos e deslocamento dos
produtores para feira. O deslocamento ocorre com veículos de terceiros (alugado) para transporte (meio mais
apontado pelos entrevistados), seguido do ônibus da associação e o próprio veículo do produtor.

3.7 A Produção Orgânica

Foi observado na pesquisa que poucos produtores controlam a quantidade vendas dos produtos que levam para
feira, sem controle, fica mais difícil realizar planejamento e aperfeiçoar os ganhos com a produção. Destaque
para a oferta dos FLV (Frutas, Legumes e Verduras) com 52% dos produtores; doces, bolo e goma
correspondendo a 10% cada um; frango e polpa de frutas com 6% cada um e ovos e mel com apenas 3% dos
produtores entrevistados.
Constatou-se que a sobra de alimento é destinada em grande parte para os animais (frango, boi, porco e bode)
e a outra parte doado para familiares e conhecidos. Alguns relataram que não aproveitam a sobra para os
animais e familiares, e, portanto, acabavam desperdiçando-o.
Quando perguntado sobre a importância da Agroecologia para sua produção, foi constatado que a mudança do
modo convencional para o agroecológico acarretou mudanças que influenciaram na melhoria de vida dos
produtores, sem a utilização de agrotóxicos. As famílias passaram a se alimentar de maneira mais saudável,
agregou mais valor ao produto, consequentemente a renda melhorou.
A diversificação dos produtos foi um item comentado na entrevista, os produtos passaram a ter mais
durabilidade. Houve aumento da responsabilidade sobre a sustentabilidade do empreendimento rural e
diversificação da produção.
Ainda na perspectiva do produtor, observou-se que ser associado à Associação de Produtores e Produtoras
Agroecológicos traz benefícios, dentre eles foram informados que o espaço é dedicado para discussões e como
forma de garantir acesso às políticas públicas. A participação de projetos de irrigação e a garantia de uma fonte
de uma renda fixa das feiras são exemplos dos benefícios ocorridos a esses grupos associativos.
Logo em seguida, foi perguntado o que seria feito para estabelecer a confiabilidade dos consumidores? As
respostas foram compiladas na figura 03. Dentre as informações passadas, tem destaque a resposta sobre as
visitas nas produções.
Um dos pontos comentados na manutenção da confiabilidade nos produtos ofertados foi a visita técnica à
propriedade rural para o controle do processo agroecológico. Quando perguntado sobre a assistência técnica
na propriedade, observa-se que 79% recebem assistência técnica, dentre eles a maioria recebe em média uma
vez por mês, a assistência dos organizadores das feiras, como por exemplo, o Centro Sabiá e o SERTA,
buscando orientar e monitorar os produtores. Por outro lado, os produtores relatam pouca frequência dos
técnicos do Instituto Agronômico de Pernambuco - IPA, organização responsável pela assistência técnica no
Estado. Apenas 21% respondeu não receber a assistência.

Figura 03: Critérios para manter a confiabilidade dos consumidores

Fonte: dados da pesquisa.

A falta de produtos para venda nas feiras é solucionada com trocas dos mesmos entre os produtores associados,
para 68% dos entrevistados; 11% informaram nunca terem faltado produtos; 7% alegaram vender o que têm e
não pegar com o outro associado e 14% não responderam. Há relatos de produtores que procuram dividir os
produtos para comercializar e no final o que foi vendido é subtraído a diferença do faturamento da feira.
Nas observações in loco, destacamos que as feiras visitadas possuíam padronização de barracas, os produtores
estavam com o fardamento identificando a organizadora e, ao mesmo tempo, em conformidade com a lei que
normatiza o atendimento em espaços públicos de produtos orgânicos com a identificação do produtor ou
alguém da família que participe da produção. Alguns pontos de melhorias foram apontados, como um banheiro
químico para os produtores que chegam muito cedo ao local, pois a maioria deles é do interior; maior
participação da gestão pública municipal na divulgação desses espaços de comercialização no Recife.

3.8 Características dos Consumidores

De acordo com 51 respostas auferidas no questionário das feiras agroecológicas do Recife com consumidores,
observa-se que 67% dos entrevistados são mulheres. A faixa etária mais observada foi de consumidores com
50 anos ou mais em 50% dos casos.
Os consumidores na média possuem boa escolaridade, com percentuais de 51% para graduados, 25% pós-
graduados, 18% ensino médio e 6% dizem possuir apensas o ensino fundamental. Tais dados corroboram com
o da pesquisa do Projeto Pernambuco Agroecológico citado anteriormente no referencial deste estudo.
A frequência dos consumidores de ida às feiras é semanal em 67% dos casos. Essa característica demonstra
alto grau de fidelidade na compra semanal, um exemplo disso são as ocorrências de listas pré-selecionadas
para os consumidores que ao chegar já se direcionam a barraca e retiram os pedidos já guardados, fortalecendo
o relacionamento com os produtores no local. Esta relação de confiança entre o produtor e consumidor também
é observada por Guterres (2013).
O valor médio de compras por semana ficou na faixa entre R$ 50 e R$ 80 reais, com isso o produtor pode
garantir uma renda fixa semanalmente, conseguindo pensar em outras formas para agregar valor aos produtos
vendidos.
Quando perguntado se pagaria mais pelos produtos agroecológicos, a resposta foi positiva para 92,2% dos
pesquisados, isso revela que o fator preço não é o primeiro motivo para substituir o consumo de produtos sem
agrotóxicos, pois a necessidade de consumo é na maioria das vezes a procura por uma maior qualidade de vida.
Nesta perspectiva, os produtos mais consumidos foram FLV (frutas, legumes e verduras) representando 90%
dos itens adquiridos, seguido por índices tais como: 6% para compra de queijo, 3% de frango e 1% de ovos.
Sobre as informações da produção agroecológica observou-se que 70,6% das respostas dos consumidores
expressaram não ter conhecimento sobre o assunto. Nesse contexto, a motivação dos consumidores para o
consumo de orgânicos é estabelecida na figura 04, com destaque para a questão da saúde expressa de forma
ampliada na qualidade de vida.

Figura 04: Motivação para consumo nas feiras agroecológicas

Fonte: dados da pesquisa.

Também foi observado o que mais influencia a compra é a expectativa na melhor qualidade de vida e a
influência dos amigos. Em seguida: indicação médica, reportagens, visitas aos supermercados com espaços
para produtos orgânicos. Outro dado relevante na pesquisa relata a confiança na procedência dos produtos
adquiridos, já que 98% dos entrevistados responderam positivamente. Dentre os que falaram que confiam, foi
perguntado qual a intensidade desta confiança, os resultados obtidos foram: 76% - muito; 10% - regular; 6% -
pouco; 6% - indiferente; e 2% não responderam.
Percebe-se que a relação de confiança está relacionada com o vínculo estabelecido com produtores na feira, ao
invés dessa análise ser em função do conhecimento da certificação da produção orgânica. Caracterizando
assim, o modelo de Certificação OCS estabelecido pelo documento Produtos Orgânicos: sistemas
participativos de garantia /MAPA (BRASIL, 2008). Tal argumento é ratificado tanto na pesquisa pelo
Pernambuco Agroecológico citada no referencial teórico quanto neste estudo.
A pesquisa de campo revelou que mesmo tendo muita confiança no produto, 70% dos consumidores
desconhecem como é feita a verificação da procedência agroecológica nas feiras; 8% responderam que tem
algum conhecimento e 2% não responderam. A percepção sobre a qualidade orgânica é bem aceita nas feiras
pesquisadas, o mesmo levando-se em consideração sobre a questão da qualidade nos quesitos de durabilidade,
sabor e procedência dos produtos.
Na perspectiva do consumo de produtos agroecológicos, o processo de decisão de compra, nas palavras de
Kotler e Keller (2006), é analisado empiricamente pelo consumidor, evidenciando que o reconhecimento de
compra é motivado pela importância de consumo de produtos mais saudáveis. A busca de informações é
mediante a pesquisa sobre o assunto e por indicação de amigos. A avaliação de alternativas é todo o
conhecimento adquirido nas etapas anteriores que reforça as crenças e atitudes na escolha desses produtos,
sendo acrescido de informações como localização da feira, dia e horário de comercialização, produtos
ofertados e organização da feira. A decisão de compra, geralmente parte da confiança no produtor e da
qualidade do produto (geralmente pela aparência) e preço justo. O comportamento pós-compra é caracterizado,
neste contexto, como uma fácil comunicação com os produtores, reservas de pedidos e convites de acesso à
produção rural.
Aos que responderam conhecer a verificação, não necessariamente responderam qual seria a forma correta de
monitoramento estabelecido pelos os órgãos competentes, mas aquilo que os consumidores imaginam como
seja. Dentre as respostas, destaque para a fiscalização na propriedade, de que a análise seria feita em algum
laboratório, que seria utilizado apenas adubo orgânico pela associação, que deveria haver uma associação que
escolhia os produtores para produzir; que a ADAGRO e o IPA realizavam os exames e que a associação deveria
controlar.
Quanto aos problemas mais observados foi constatado forte odor de urina em uma das feiras visitadas. Segundo
os produtores e consumidores, o fato se dava pelo motivo de pessoas que visitam a localidade na noite anterior
não utilizam os banheiros públicos, prejudicando assim as barracas que ficam próximo ao local. Outro relato
recorrente é de carros estacionados no espaço da feira prejudicando a circulação dos consumidores. Dentre as
feiras visitadas, apenas a da CEASA tem um espaço privativo com infraestrutura adequada.

4. Conclusão

1. Há uma demanda em contínuo crescimento por uma alimentação mais saudável e nutritiva nas regiões
metropolitanas;
2. As associações de funcionários(as) de empresas públicas e privadas estão se organizando na
perspectiva do consumo e da difusão da consciência ecológica e organizando feiras em espaços das empresas;
3. Há um número grande de jovens do campo e agricultores(as) familiares capacitados(as) pelas entidades
de assessoria nos diversos territórios de Pernambuco;
4. Maior espaço na mídia tradicional referente a apresentação e discussão de experiências agroecológicas
e da economia solidária;
5. A pesquisa contribui para o fortalecimento desses espaços, da conscientização do produtor sobre a
agregação de valor nutricional do alimento vendido ao consumidor;
6. A mudança da agricultura convencional para o modelo baseado nos princípios da Agroecologia, para
os produtores, trouxe bons resultados no que diz respeito à diversificação dos produtos, à participação em
feiras no Recife e à garantia de uma renda fixa semanal;
7. Constatou-se baixo índice de conhecimento por parte dos consumidores acerca da procedência de
certificação ou garantia de qualidade orgânica, também não houve interesse, a priori, do público, em procurar
saber como isso acontece;
8. Os resultados mostram uma realidade do público que frequenta esses espaços de comercialização e
podem contribuir para definição de estratégicas para fortalecer tais espaços.

6. Referências

ASSIS, Renato Linhares de; ROMEIRO, Ademar Ribeiro. Agroecologia e agricultura orgânica: controvérsias
e tendências. Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 6, p. 67-80, jul/dez. 2002. Ed. UFPR.
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CAMPANHOLA, Clayton; VALARINI, Pedro José. Agricultura Orgânica e o seu potencial para o pequeno
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