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Relativização do limite executável no âmbito dos juizados especiais

cíveis estaduais: as astreintes nesse contexto

Cristiano da Silva Sielichow1


Vagner Lino Tedesco2

Resumo: O presente estudo visa analisar a possibilidade da relativização do limite executável no


âmbito dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais, abordando questões polêmicas acerca da
possibilidade de se executar valores superiores ao estabelecido na lei. Além disso, busca estudar a
competência absoluta do microssistema de executar seus julgados, independentemente dos valores
exigíveis, enfatizando a (im)possibilidade do valor de uma astreinte, fixada no âmbito do Juizado,
ultrapassar o valor de 40 salários mínimos. Serão abordadas as discussões doutrinárias e
jurisprudenciais acerca do objeto do estudo.

Palavras-chave: Juizado Especial Cível. Limite Executável. Astreintes.

Resume: This study aims to examine the possibility of relativization limit executable under the special
courts state civic leaders, addressing controversial issues about the possibility of performing values
greater than those established by law. Therefore, the absolute powers of the microsystem to perform
its decisions, regardless of the amounts due, emphasizing the (un) possibility of the value of a
astreinte, fixed under the Juvenile Court, exceed the value of 40 minimum wages. Will discuss the
doctrinal and jurisprudential discussions about the object of study.

Keywords: Special Civil Court, Limit. Execution. Astreintes.

Introdução

Este artigo visa estudar no âmbito da execução no microssistema denominado


Juizado Especial Cível os limites do valor executável, mais especificadamente a sua
relativização acerca deste montante, trazendo também a competência absoluta para
o Juizado executar seus julgados, independente do valor que estes tenham
alcançado.

De plano, serão analisadas as origens legislativas que hoje vieram a criar os


Juizados Especiais Cíveis, regulamentados pela Lei 9.099/95, bem como, os
“princípios” basilares deste microssistema em que buscam sempre atingir a
finalidade deste procedimento.

Outrossim, este estudo visará apreciar a natureza da astreinte, o montante máximo


que esta poderá alcançar, os critérios usados pelos Magistrados para a sua fixação,
1
Mestre em Direito pela UNISC, Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela ULBRA, Professor
dos Cursos de Direito da FACOS e da UNISC, Advogado e Procurador Municipal.
2
Bacharel em Direito pela Faculdade Cenecista de Osório – FACOS/CNEC.

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bem como, a (in)competência do Juizado Especial Civil de processar a sua
execução, independentemente do valor que ela alcançar. Abre-se assim, uma
discussão, tendo em vista que a Lei 9.099/95 estabelece o máximo executável no
patamar de 40 salários mínimos, bem como, no mesmo ordenamento jurídico existe
a previsão de que o microssistema é competente para executar suas próprias
decisões.

Serão trazidos à baila, enunciados do Fórum Nacional dos Juizados Especiais,


Acórdãos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, entendimentos do Superior
Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, reconhecendo de forma unânime
a competência do Juizado Especial Cível para executar seus julgados, bem como, a
possibilidade de se executar título judicial, cujo valor ultrapasse o teto estabelecido
pela lei do Juizado Especial e declarando a incompetência da Justiça Estadual para
processar e julgar um título oriundo do Juizado Especial Cível.

Será enfatizada, a discussão acerca da possibilidade do Tribunal de Justiça de cada


Estado julgar a competência do Juizado Especial para executar determinado título,
excluindo-se assim, a discussão da jurisdição das Turmas Recursais.

Igualmente, será exposta a divergência dos Tribunais acima citados, com relação à
limitação a título de astreintes no âmbito do microssistema, bem como, qual órgão é
competente para julgar e modificar decisões dos Juizados Especiais. Além disso,
será analisado a divergência acerca da possibilidade do órgão julgador do recurso,
reduzir o valor aplicado a título de astreintes, tendo em vista o instituto da coisa
julgada com relação a decisão que arbitrou a multa. Nesse mesmo diapasão, será
trazida a fase recursal dentro do microssistema, com relação à fixação e à aplicação
das astreintes.

Para a sua realização foi utilizado pesquisa através de doutrina, jurisprudência,


legislação e resoluções, possibilitando o conhecimento na teoria e na prática de
como é a aplicação e interpretação da lei.

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A origem dos juizados especiais cíveis

Com o advento da Constituição Federal de 1967 começou a se dar iniciativa, pelo


menos em legislação, para a criação do que hoje se tornaria o Juizado Especial
Cível. No artigo 144, § 1º, alínea “b”3, da referida Carta Magna, encontra-se a
previsão legal para a criação do microssistema. No entanto, como as características
históricas que se passava o Brasil, ou seja, sobre a “jurisdição” de um governo
militar, esta previsão legal foi praticamente uma norma em desuso.

No Estado do Rio Grande do Sul houve uma revolução nesse sentido: o Poder
Judiciário, em 23 de julho de 1982, através dos revolucionários e pioneiros
Conselhos de Conciliação e Arbitramento instalados na Comarca de Rio Grande/RS
(pode-se chamar de pioneiro estes conselhos porque foram anteriores à publicação
da lei que instituía os Juizados das Pequenas Causas), elaborou e colocou em
prática os centros de conciliações, através da Associação dos Juízes do Rio Grande
do Sul - AJURIS visando a celeridade processual e a facilitação do acesso à justiça.
Felippe Borring Rocha traz em sua obra o mesmo entendimento de que o Estado do
Rio Grande do Sul foi precursor na criação e utilização dos Juizados das Pequenas
Causas:

[...] surgiu primeiro no Rio Grande do Sul um movimento de juristas que


identificavam na conciliação, mais do que um incidente processual, um
caminho para reduzir o fluxo de litígios na justiça. Para tanto, sublinhavam
esses estudiosos, era preciso romper com a tradição em nosso País, em
que, até recentemente, não havia um ambiente propício para a formação de
4
uma cultura sólida de solução dos conflitos pela via conciliatória.

No ano de 1984, foi sancionada a Lei Federal nº 7.224, que instituiu os Juizados
Especiais de Pequenas Causas, orientada pelos mesmos princípios que regem hoje
a lei 9.099/95. Com a promulgação da Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 se concretizou direitos indisponíveis, mas também ficou estabelecido

3
“Os Estados organizarão a sua Justiça, observados os artigos 113 a 117 desta Constituição e os
dispositivos seguintes: § 1º. A lei poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça: [...] b) juízes
togados com investidura limitada no tempo, os quais terão competência para julgamento de causas
de pequeno valor e poderão substituir juízes vitalícios”. BRASIL. Constituição Federal do Brasil de
1967. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc_anterior1988/emc01-69.htm.>
Acesso em: 30 abr. 2013.
4
ROCHA, Felippe Borring. Manual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais: teoria e prática. 6.
ed. São Paulo: Atlas, 2012. P. 04.

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no artigo 98, Inciso I5, a criação de Juizados Especiais, compostos por Juízes
togados ou Juízes leigos e togados, competentes para julgar causas de menor
complexidade, ficando a encargo da União e dos Estados a criação destes Juizados.

Com o advento da Constituição Federal de 1988 o Estado passou a ter determinada


responsabilidade em elaborar um procedimento que atendesse as necessidades de
uma sociedade em que cada vez mais encontrava-se dependente do Judiciário para
resolver seus litígios.

No ano de 1995, com o advento da Lei 9.099, houve a efetiva instalação deste
microssistema, denominado Juizado Especial Cível. Esta lei, além de cumprir com
as disposições da Carta Magna, vem implantar os Juizados Especiais Cíveis e
substituir de forma mais eficiente os Juizados de Pequenas Causas.

A criação do Juizado Especial Cível foi de extrema importância e ainda é para a


sociedade hodierna, pois hoje muitos dos conflitos existentes entre as pessoas
acabam sendo resolvidos pelo Poder Judiciário. Caso não existisse o microssistema,
todos os litígios de menor complexidade teriam que ser julgadas no âmbito da
Justiça Estadual, seja pelo rito sumário ou ordinário, aumentando ainda mais a
morosidade já existente no Poder Judiciário.

“Princípios” basilares do juizado especial cível

A Lei 9.099 de 1995, no seu artigo 2º6 traz os princípios norteadores do Juizado
Especial Cível, os quais são os seguintes: oralidade, simplicidade, informalidade,

5
“A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: I - juizados especiais, providos
por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução
de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante
os procedimentos oral e sumariíssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o
julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;”. BRASIL. Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 30 abr. 2013.
6
“O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia
processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou transação”. BRASIL. Lei
n° 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especial Cíveis e Criminais e dá
outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm>. Acesso
em: 30 abr. 2013.

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economia processual e celeridade. Se analisado o texto frio da lei, verifica-se que o
legislador utilizou o termo “critério”, sendo que o correto seria usar o termo princípio.

Depreende-se da leitura das obras dos principais doutrinadores acerca do assunto,


que quase na totalidade despreza a palavra “critérios” e utiliza-se o termo
“princípios”. Princípio seria o termo mais adequado, pois é muito mais grave se um
princípio for violado, do que não for atendido um critério, sendo este, apenas um
requisito exigido, ou seja, critério serve apenas de base para comparação. Para
Fernando Da Costa Tourinho Neto e Joel Dias Figueira Júnior deve ser interpretada
a palavra “critérios” no texto da lei, como verdadeiros princípios, pois estes são a
base para o processo:

Em que pese o legislador ter utilizado da expressão “critérios” orientadores


do processo nos Juizados Especiais, estamos diante de verdadeiros
princípios gerais. Princípios processuais são um complexo de todos os
7
preceitos que originam, fundamentam e orientam o processo.

No ordenamento jurídico brasileiro, existem princípios e normas gerais que devem


ser respeitados. Ao analisar a Lei 9.099/95 verifica-se um microssistema, no qual o
mesmo tem suas próprias normas e principiologia específica. É de suma
importância, ao se tratar de uma legislação especial, a mesma ser regida por suas
próprias regras e princípios. Ada Pellegrini Grinover, Candido Rangel Dinamarco e
Antônio Carlos De Araújo Cintra destacam a especificidade dos princípios em
diversos ordenamentos jurídicos, lecionando o seguinte:

Através de uma operação de síntese crítica, a ciência processual moderna


fixou os preceitos fundamentais que dão forma e caráter aos sistemas
processuais. Alguns desses princípios básicos são comuns a todos os
sistemas; outros vigem somente em determinados ordenamentos. Assim,
cada sistema processual se calca em alguns princípios que se estendem a
todos os ordenamentos e em outros que lhe são próprios e específicos. E
do exame dos princípios gerais que informam cada sistema que resultará
qualificá-lo naquilo que tem de particular e de comum com os demais, do
8
presente e do passado .

Hoje, o Brasil está sob a jurisdição de um Estado Democrático de Direito, e como


não poderia ser diferente, estão assegurados aos cidadãos direitos fundamentais e

7
NETO, Fernando da Costa Tourinho. JÚNIOR, Joel Dias Figueira. Juizados Especiais Estaduais
Cíveis e Criminais: comentários à lei 9.099/1995. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, P.
75.
8
GRINOVER, Ada Pellegrini. DINAMARCO Candido Rangel. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo.
Teoria Geral do Processo. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 1995. P. 50.

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essenciais para manter a segurança jurídica necessária. Ao se referir ao Direito
Constitucional, que é a base para os demais direitos, verifica-se a existência de
princípios constitucionais expressos que estão presentes em todos os ordenamentos
jurídicos posteriores, como, por exemplo, o direito ao contraditório e ampla defesa.
Dentro do microssistema existe o princípio da oralidade, no qual é à base de um
microssistema como o Juizado Especial Cível. Este preceito, sendo exercido no
microssistema, contribui para acelerar o ritmo do processo, bem como, faz com que
o processo num todo atinja seu fim de obter um resultado fiel a realidade. Alexandre
Freitas Câmara traz o seguinte ensinamento acerca deste princípio:

Chama-se processo oral a um certo modelo processual que se contrapõe ao


processo escrito. À toda evidência, o processo oral não é um modelo de
processo em que se prescinda por completo do uso da palavra escrita, do
mesmo modo que o processo escrito não dispensa o uso da palavra falada.
Oralidade ou escrita dizem respeito à prevalência de uma forma sobre a
9
outra .

O procedimento adotado pela Lei 9.099/95 visa à celeridade processual e tem como
características praticar a maioria dos atos processuais de forma oral, utilizando-se
assim de dispositivos descritos na legislação que contribuem para a celeridade do
processo, como por exemplo, o pedido que pode ser realizado na secretária do
Juizado. No procedimento do Juizado, a ideia é a predominância da oralidade sobre
a escrita, mas não se pode esquecer que o processo tem suas peculiaridades, que
devem ser observadas.

Outro princípio é o da simplicidade, que tem por finalidade terminar com o


formalismo exigido nos demais órgãos de jurisdição. Este princípio visa alcançar a
finalidade do ato praticado, independentemente da forma o qual é feito, sempre
devendo ser respeitados os princípios basilares do Direito.

O princípio de informalidade traz a idéia de que o processo não tenha forma, ou


seja, que a parte possa entender o que está acontecendo, motivo pelo qual a prova
pericial não é aceita no Juizado Especial Cível. José Eduardo Carreira Alvim traz o
entendimento de que os atos processuais devem se eximir da formalidade:

9
CÂMARA, Alexandre Freitas. Juizados Especiais Cíveis Estaduais, Federais e da Fazenda
Pública: Uma Abordagem crítica. 7. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012, P. 07-08.

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O critério da informalidade significa que os atos processuais (petição inicial,
contestação, arguições incidentais, requerimentos, decisões interlocutórias)
devem ser praticados informalmente, sem apego a formas e ritos que
10
possam comprometer a sua finalidade.

O princípio da economia processual visa esgotar o processo, sempre que possível


evitando maiores gastos e tempo. Este princípio também tem relação com a
desnecessidade de se recolher custas no primeiro grau de jurisdição perante os
Juizados Especiais. Ou seja, uma parte que for legítima, que preencher os requisitos
exigidos, pode propor ação sem a necessidade de recolher custas processuais no
primeiro grau de jurisdição. Os doutrinadores Marinoni e Arenhart têm o
entendimento de que este princípio é de suma importância para facilitar o acesso à
justiça e diminuir os gastos com o processo:

Minimizando-se o procedimento tendente ao fornecimento da prestação


jurisdicional, ganha-se de forma menos complicada uma resposta
jurisdicional mais barata e rápida, o que é fundamental para estimular o
11
acesso a justiça .

O último princípio intitulado na lei é o da celeridade, no qual este é a “pedra”


fundamental dos Juizados Especiais Cíveis. Este preceito tem por finalidade acelerar
o processo, torná-lo mais célere. A parte ao escolher o rito sumaríssimo abdica-se
de algumas garantias que teria se ingressasse com a ação no procedimento sumário
ou ordinário, mas de outro lado ganha na rapidez que o feito tende a se desenvolver.

Com a análise dos princípios basilares do Juizado Especial Cível, pode se notar que
se forem respeitados e cumpridos na integra há grande chance de se chegar à
finalidade da lei: a celeridade processual e a facilitação do acesso ao judiciário.

Competência dos juizados para promover seus julgados e a limitação da


execução no âmbito do juizado especial cível

O artigo 3º da Lei 9.099/9512 aborda a competência do Juizado e ao analisar o


referido dispositivo da lei para o objeto do presente estudo, verifica-se, no inciso I do

10
ALVIM, José Eduardo Carreira. Juizados Especiais Cíveis Estaduais: Lei 9.099/95. 5. ed.
Curitiba: Juruá, 2010. P. 21.
11
MARINONI, Luis Guilherme. ARENHART, Sérgio Cruz. Procedimentos Especiais. São Paulo:
Revista dos Tribunais, Ano 2009. P. 202.
12
“O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas
cíveis de menor complexidade, assim consideradas: I - as causas cujo valor não exceda a quarenta
vezes o salário mínimo; II - as enumeradas no art. 275, inciso II, do Código de Processo Civil; III- a
ação de despejo para uso próprio; IV - as ações possessórias sobre bens imóveis de valor não

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§1º, que o Juizado é competente para processar e julgar seus próprios julgados. Na
Lei 9.099/95 existe a previsibilidade, no artigo 52º,13 de se executar suas próprias
decisões, ou seja, no Direito Brasileiro, o Juízo da condenação é competente para
promover a execução, assim entende Câmara a respeito do assunto:

É competente o Juizado Especial Cível para execução das suas próprias


decisões. Acolhe-se, aqui, o sistema tradicionalmente adotado no processo
civil brasileiro, por força do qual é competente para a execução da sentença
14
o juízo da condenação .

Ou seja, o autor poderá executar o valor estabelecido na sentença,


independentemente do valor que esta alcançar. O valor condenatório sempre ficará
adstrito ao principal, no entanto este poderá ser acrescido de correção monetária,
despesas processuais, honorários advocatícios, sanções pecuniárias, dentre outros
possíveis acréscimos. Nesse sentido, entendem Neto e Júnior:

Por conseguinte, eventual consequência a incidir em sede recursal e\ou as


sanções decorrentes de litigância de má-fé (art. 55 da Lei 9.099\1995 c\c
art. 18 do CPC, prática de ato atentatório ao exercício da jurisdição (art. 14,
V, c\c parágrafo único, do CPC) ou medidas pecuniárias de caráter
coercitivo inibitório (fazer, não fazer ou entregar) (astreintes), que
superarem o valor de alçada, acrescidas ao principal, a sentença não será
15
considerada ineficaz no tocante a importância que lhe sobejar .

As Turmas Recursais do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do


Sul entendem na mesma linha de pensamento ao tratar acerca da possibilidade de
executar no âmbito do Juizado valor superior ao seu teto de 40 salários mínimos
(valor principal + acréscimos decorrentes da execução16.

excedente ao fixado no inciso I deste artigo. § 1º - Compete ao Juizado Especial promover a


execução: I - dos seus julgados; II - dos títulos executivos extrajudiciais, no valor de até quarenta
vezes o salário mínimo, observado o disposto no § 1º do art. 8º desta Lei”. BRASIL. Lei n° 9.099, de
26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especial Cíveis e Criminais e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm>. Acesso em: 30
abr. 2013.
13
“A execução da sentença processar-se-á no próprio Juizado, aplicando-se, no que couber, o
disposto no Código de Processo Civil, com as seguintes alterações”. BRASIL. Lei n° 9.099, de 26 de
setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especial Cíveis e Criminais e dá outras providências.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm>. Acesso em: 30 abr. 2013.
14
CÂMARA, Alexandre Freitas. Juizados Especiais Cíveis Estaduais, Federais e da Fazenda
Pública: Uma Abordagem crítica. 7. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012, P. 32.
15
NETO, Fernando da Costa Tourinho. JÚNIOR, Joel Dias Figueira. Juizados Especiais Estaduais
Cíveis e Criminais: comentários à lei 9.099/1995. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011 P.
292.
16
“Ementa: Embargos à execução. Valor cobrado superior ao teto do jec. Possibilidade. Multa do art.
475-j. Incide a contar do trânsito em julgado. Precedentes das turmas recursais. Sentença mantida. O
valor executado decorre de julgado do próprio JEC. Mesmo que o montante supere o limite máximo
previsto em lei (equivalente a quarenta salários mínimos, art. 3º, inciso I da Lei n.º 9.099/95), a
restrição inexiste quando se trata de execução das condenações, conforme deflui do art. 3º, § 1º, inc.

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O doutrinador Chimenti tem entendimento no mesmo sentido do já explanado, ou
seja, os acréscimos decorrentes da própria ação principal, independentemente do
valor que os mesmos alcançarem, superando o limite de alçada da lei, não exclui a
competência do Juizado Especial Cível de julgar:

A multa, que será cobrada ao valor da eventual indenização substitutiva da


obrigação (art. 633, do CPC e inciso V do art. 52 da Lei nº 9.099\95), é
devida enquanto subsistir a mora e não está restrita ao valor da obrigação.
Com isso, é perfeitamente possível que o valor efetivo devido em
decorrência de sentença condenatória, em razão de circunstância posterior
a esta, supere o limite de alçada do Sistema Especial, hipótese que não
17
afasta a competência do Juizado para a execução forçada do total devido.

O Superior Tribunal de Justiça nas suas decisões, entende que o Juizado Especial
Cível é competente para executar seus julgados, independentemente do valor ter
ultrapassado o teto estabelecido na lei18.

O limite executável estabelecido na Lei 9.099/95 de 40 salários mínimos é com


relação à execução de títulos executivos extrajudiciais. Em se tratando de título

I, mesmo diploma legal. Tampouco se pode falar em renúncia ao excedente, sob pena de
desestimular o uso do sistema do juizado, se haverá prejuízo à atualização monetária, juros ou
encargos, derivado da condenação. Desnecessária a cientificação pessoal da parte, sobretudo
quando o entendimento majoritário é no sentido de dispensa da intimação da parte, correndo o prazo
automaticamente. Precedentes da Turma Recursal (Recurso Cível Nº 71001533611, Terceira Turma
Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Afif Jorge Simões Neto, Julgado em 10/06/2008) e
(Mandado de Segurança Nº 71001657907, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais,
Relator: Maria José Schmitt Santanna, Julgado em 25/06/2008). RECURSO IMPROVIDO.” Recurso
Inominado Nº 71001665652, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Afif Jorge
Simões Neto, Julgado em 24/09/2008.
17
CHIMENTI, Ricardo Cunha. Teoria e Prática dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais e
Federais. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. P. 223.
18
“Ementa: agravo regimental. Recurso ordinário. Mandado de segurança. Juizados especiais cíveis.
Competência para executar seus próprios julgados. Agravo regimental não provido. 1. É firme a
jurisprudência dessa Corte em que os Tribunais de Justiça Estaduais não têm competência para
rever decisões de turma recursal de juizados, muito menos em sede de mandado de segurança.
Nesse sentido orienta o Enunciado n. 376 da súmula do STJ: "Compete a turma recursal processar e
julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial". 2. Nos termos do artigo 3º, § 1º, I, da
Lei 9099/2005, compete ao Juizado Especial a execução de seus julgados, inexistindo, no preceito
legal, restrições ao valor executado, desde que, por ocasião da propositura da ação, tenha sido
observado o valor de alçada, ressalvada a questão da multa (RMS 33.155/MA, Rel. Ministra MARIA
ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 28/06/2011, DJe 29/08/2011) . 3. O fato de o valor
executado ter atingido patamar superior a quarenta salários mínimos, em razão de correção
monetária e encargos, não descaracteriza a competência do Juizado Especial para a apreciação do
mandado de segurança, cabendo à turma recursal conhecer e rever sua decisão em sede de
mandado de segurança impetrado contra seus atos. 4. Assentada a competência da Turma Recursal
para julgar o mandado de segurança, nos termos da Súmula 376/STJ, nada obsta, contudo, a
utilização dos meios recursais disponíveis ao impetrante/agravante, no caso da prolação de julgado
teratológico, inclusive do uso da reclamação perante essa Superior Corte de Justiça. 5. Agravo
regimental não provido.”AgRg no Recurso em Mandado De Segurança Nº 32.489 – MT. Relator :
MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO. Brasília (DF), 16 de fevereiro de 2012.Publicado no DJe
24/02/2012.

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executivo decorrente de sentença exarada no Juizado, ou seja, título executivo
judicial, este limite não deve ser obedecido. Nesse sentido leciona Costa:

Na mesma linha de idéias, é de se observar ainda que, ao disciplinar para


os procedimentos executivos, estabeleceu-se, no § 1º, I e II do mesmo art.
3° desta lei, a competência dos Juizados Especiais para execução de seus
julgados, em que a limitação ao valor de 40 salários mínimos alcança
somente os títulos executivos extrajudiciais (art. 3º, § 1°, II). Tal limite não
19
se impõe aos julgados do Juizado Especial (art. 3°, § 1º, I).

Um dos motivos para se processar a execução dos valores secundários (multa,


honorários, juros, etc) junto com o valor principal é por que as maiorias desses
valores secundários são em decorrência de atitudes do devedor. No caso do
devedor que não cumpre voluntariamente a obrigação estipulada na sentença, se
esta condenação for pecuniária, poder-se-ia o credor pedir a aplicação da multa
prevista no artigo 475, J, do Código de Processo Civil. 20 Este entendimento de que
estes valores secundários não se incluem no valor da causa é pacifico nas Turmas
Recursais Cíveis do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul21.

No âmbito dos Juizados Especiais Cíveis existe um Fórum que elabora enunciados,
anualmente em todo o Brasil, Fórum este que é denominado Fórum Nacional dos
Juizados Especiais - FONAJE22. Este órgão tem por finalidade a criação de
enunciados com o objeto de tentar dirimir dúvidas na interpretação da Lei 9.099/95,
19
COSTA, Hélio Martins. Lei dos Juizados Especiais Cíveis: Anotada e Sua Interpretação
Jurisdicional. 4. ed. Belo Horizonte: Delrey, 2006. P. 13.
20
“Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o
efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de
dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei,
expedir-se-á mandado de penhora e avaliação”. BRASIL. Lei n° 5.689, de 11 de Janeiro de 1973.
Institui o Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869.htm>. Acesso em: 30 abr. 2013.
21
“Ementa: Embargos à execução. Excesso de execução não configurado. Valor do pedido e
condenação dentro do teto de alçada do jec. Incidência de juros de mora, correção monetária e multa
sobre a condenação. Consectários provocados pelo próprio devedor, decorrentes do descumprimento
da obrigação judicial, que não se incluem no valor de alçada. Recurso não provido.” Recurso
Inominado, Nº 71002218576, Segunda Turma Recursal Cível RS, Relatora. Leila Vani Pandolfo
Machado, 26 DE MAIO DE 2010.
22
Histórico do Projeto: O FONAJE foi instalado no ano de 1997, sob a denominação de Fórum
Permanente de Coordenadores de Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Brasil, e sua idealização
surgiu da necessidade de se aprimorar a prestação dos serviços judiciários nos Juizados Especiais,
com base na troca de informações e, sempre que possível, na padronização dos procedimentos
adotados em todo o território nacional. Objetivos: I – Congregar Magistrados do Sistema de Juizados
Especiais e suas Turmas Recursais; II – Uniformizar procedimentos, expedir enunciados,
acompanhar, analisar e estudar os projetos legislativos e promover o Sistema de Juizados Especiais;
III – Colaborar com os poderes Judiciário, Legislativo e Executivo da União, dos Estados e do Distrito
Federal, bem como com os órgãos públicos e entidades privadas, para o aprimoramento da
prestação jurisdicional. Informação extraída do Site
<http://www.fonaje.org.br/2012/?secao=exibe_secao&id_secao=1>. Acesso em 30 abr. 2013.

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uniformizando assim o entendimento em todo o Território Nacional. O enunciado, nº
97, traz à baila um dos assuntos que está sendo tratado neste estudo: a
possibilidade de se executar valor superior a 40 salários mínimos no âmbito do
Juizado Especial Cível23.

Conforme assinala Araken De Assis, “o cumprimento dos provimentos de força


mandamental ou de força executiva (efeito executivo imediato) se desenvolverá
perante a autoridade judiciária que proferiu a resolução”24. Como se pode notar,
todas as instâncias do Poder Judiciário e auxiliares têm entendimento que o Juizado
Especial Cível é competente para executar seus julgados, independentemente do
valor que o mesmo ostentar.

Tendo em vista as explanações, nas quais se verifica que o Juizado Especial Cível
tem competência para executar seus julgados, pode-se chegar a uma discussão,
tendo em vista o disposto no artigo 39 da Lei 9.099/9525, no qual estabelece que a
sentença condenatória que ultrapassar o valor do teto do juizado é ineficaz.

Para Alvim, esta ineficácia é relativa, ou seja, não é absoluta, não podendo
contaminar de vício o restante da sentença. Sendo assim, a sentença que a
condenação ultrapassar o teto do juizado não tem força coercitiva o valor
ultrapassado:

A alçada dos juizados especiais vem expressa no art. 3º da Lei 9.099/95,


correspondendo a quarenta salários mínimos, pelo que, qualquer sentença
que exceder a esse limite, por ser ineficaz na parte excedente, não pode
nessa parte ser executada. Portanto, no se trata de nulidade absoluta, a
contaminar toda a sentença, mas de ineficácia, que é a falta de força
coercitiva, no que extravasou o limite legal. 26

23
“O artigo 475, "j" do CPC – Lei 11.323/2005 – aplica-se aos Juizados Especiais, ainda que o valor
da multa somado ao da execução ultrapasse o valor de 40 salários mínimos (aprovado no XIX
Encontro – Aracaju/SE).” BRASIL. Enunciados do Fórum Nacional dos Juizados Especiais –
FONAJE. Disponível em: <http://www.fonaje.org.br/2012/?secao=exibe_secao&id_secao=6>. Acesso
em: 30 de abr. 2013.
24
ASSIS, Araken de. Cumprimento de Sentença. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. P. 137.
25
“É ineficaz a sentença condenatória na parte que exceder a alçada estabelecida nesta Lei.”
BRASIL. Lei n° 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especial Cíveis e
Criminais e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm>. Acesso em: 30 abr. 2013.
26
ALVIM, José Eduardo Carreira. Juizados Especiais Cíveis Estaduais: Lei 9.099\95. 5. ed.
. .
Curitiba: Juruá, 2010. P 130

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No Juizado Especial existe a competência em razão da matéria e do valor. Em razão
da matéria estão as hipóteses elencadas em especial no artigo 3º, II da Lei
9.099/9527, ou seja, essas ações poderão suas sentenças ultrapassar o limite do teto
do Juizado Especial, tendo a mesma validade. Em razão do valor, este limite deve
ser observado, sendo ineficaz no que sobrevier a sentença. Assim, entende Câmara:

Só pode aplicar o art. 39 da Lei 9.099/1995 aos processos das pequenas


causas. Assim sendo, naqueles casos em que a competência dos Juizados
Especiais Cíveis tenha sido determinada ratione valoris, será ineficaz o
capitulo da sentença que ultrapassar os quarenta salários mínimos. Não se
aplica o dispositivo, porem, nos casos em que a competência dos Juizados
Especiais Cíveis tenha sido determinada ratione materiae, pois nesses
casos a sentença poderá, sem qualquer problema, reconhecer a existência
de obrigações cujo o valor ultrapasse quarenta salários mínimos, não
28
havendo qualquer limite a ser observado.

O Fórum Nacional dos Juizados Especiais - FONAJE, já se manifestou no mesmo


sentido ora explanado, através do enunciado n° 5829, no qual traz a possibilidade da
condenação contida na sentença alcançar valor superior ao do teto estabelecido no
artigo 39 da Lei 9.099/95.

Mas como no direito existem sempre posicionamentos divergentes, para Chimenti,


as hipóteses de ações, em que a competência é em razão da matéria, também
devem respeitar o disposto no artigo 39 da Lei 9.099/1995:

Cremos que a interpretação sistemática da Lei n° 9.099/95, em especial a


análise conjunta dos seus arts. 3º, § 3º, 15 e 39, autoriza a conclusão de
que a sentença condenatória, mesmo nas hipóteses do inciso II do art. 275
do CPC, será ineficaz na parte que superar a alçada do sistema especial,
30
ressalvados os acréscimos supervenientes à sentença.

Apesar de haver divergências entre os doutrinadores e a jurisprudência, em um


ponto a unanimidade é superveniente: os valores acessórios não devem respeitar o
limite estabelecido pelo artigo 39 da Lei 9.099/1995, que são os encargos

27
“O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas
cíveis de menor complexidade, assim consideradas: II - as enumeradas no art. 275, inciso II, do
Código de Processo Civil”. BRASIL. Lei n° 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os
Juizados Especial Cíveis e Criminais e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9099.htm>. Acesso em: 30 abr. 2013.
28
CÂMARA, Alexandre Freitas. Juizados Especiais Cíveis Estaduais, Federais e da Fazenda
Pública: Uma Abordagem crítica. 7. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012, P. 114.
29
“As causas cíveis enumeradas no art. 275 II, do CPC admitem condenação superior a 40 salários
mínimos e sua respectiva execução, no próprio Juizado.” BRASIL. Enunciados do Fórum Nacional
dos Juizados Especiais – FONAJE. Disponível em:
<http://www.fonaje.org.br/2012/?secao=exibe_secao&id_secao=6>. Acesso em: 30 de abr. 2013.
30
CHIMENTI, Ricardo Cunha. Teoria e Prática dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais e
Federais. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. P. 223.

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decorrentes da litigância de má-fé, a correção monetária, as astreintes entre
outros31.

Da limitação da astreinte ao teto do juizado especial cível estadual

Primeiramente devem ser feitas algumas considerações acerca do instituto


denominado astreintes. A multa como também é conhecida tem por objetivo
compelir para resguardar determinado direito. No ordenamento jurídico brasileiro,
este instituto tem apenas o condão de coerção, ou seja, serve para forçar uma parte
a cumprir o determinado pelo Juízo, sob pena de ter que arcar financeiramente pela
desobediência.

Em razão da astreinte ter apenas o condão coercitivo, o valor da mesma não pode
ser elevado. Em outros ordenamentos jurídicos, existem as astreintes, mas com a
natureza punitiva, ou seja, a parte que não cumprir com a determinação do
Magistrado será punida como forma de não se repetir o erro praticado. Guilherme
Rizzo Amaral traz o seguinte entendimento acerca do conceito de astreinte:

[...] pode se aplicar o conceito de astreinte para concluir que ela constitui
técnica de tutela coercitiva e acessória, que visa a pressionar o réu para
que este cumpra mandamento judicial, sendo a expressão exercida através
de ameaça ao seu patrimônio, consubstanciada em multa periódica a incidir
32
em caso de descumprimento .

A limitação da astreinte ao teto do Juizado Especial Cível vem gerando muita


discussão jurídica e jurisprudencial a respeito. Na doutrina há varias correntes, entre
elas a que entende que não pode se limitar ao valor do teto, tendo em vista que não
se pode impor a um instrumento de coerção (astreintes), que o mesmo fique adstrito
ao valor da ação principal em que está vinculado. Assim, leciona Rocha:

A multa não existe em função do valor da causa que fixou a competência,


mas como garantia da jurisdição, em seus aspectos de efetividade. Assim,

31
ROCHA, Felippe Borring. Manual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais: teoria e prática. 6.
ed. São Paulo: Atlas, 2012. P. 179.: A despeito das divergências existentes, entendemos que a multa
(art. 52, V); os encargos decorrentes da litigância de má-fé (art. 55, primeira parte); as custas, taxas e
honorários advocatícios (art. 55, segunda parte);os juros legais (art. 293 do CPC e a Sumula 254 do
STF) e a correção monetárias (art. 1º da Lei nº 6.889/1981) são plenamente eficazes, ainda que,
somados com a obrigação, ultrapassem o valor de 40 salários mínimos. Destarte, o dispositivo
contido no art. 39 se dirige a parcela principal da sentença, não incidindo sobre seus acessórios.
32
AMARAL, Guilherme Rizzo. As Astreintes e o Processo Civil Brasileiro: multa do artigo 461 do
CPC e outras. 2. ed., rev., atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. P. 101.

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não se pode dimensionar um instrumento de coerção a partir do valor da
obrigação que ele visa tutelar, pois, com isso, estar-se-ia admitindo a
existência de decisões judiciais que teriam mais autoridade do que as
33
outras .

As Turmas Recursais Cíveis do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio


Grande do Sul entendem que não se pode estabelecer um limite máximo para
aplicação de uma penalidade pelo Juiz a uma parte que não cumpre uma
determinação judicial, tendo em vista que a matéria já foi discutida, e em sede de
Recurso Inominado, sendo assim, a mesma já estaria sobre o manto do instituto da
coisa julgada34.

Parte da doutrina entende que o valor das astreintes não pode ultrapassar o teto
estabelecido no Juizado, tendo em vista que acarretaria o enriquecimento ilícito do
exequente, bem como a tornaria inexequível, pois o valor ultrapassaria o teto. Nesse
sentido, seque entendimento de Neto e Júnior:

Em qualquer situação o valor totalizado não poderá ultrapassar muito o


limite estabelecido para a alçada dos juizados cíveis, sob pena de se tornar
inexeqüível e, o que é pior, iníqua, pois representará para o exeqüente um
enriquecimento sem causa, às custas do executado. Ora, se a multa não
consegue atingir seu escopo (compelir o executado ao cumprimento do
julgado) em determinado tempo de incidência, não poderá ser eternizar-
35
se .

O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento diverso das Turmas Recursais


Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul com relação ao

33
ROCHA, Felippe Borring. Manual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais: teoria e prática. 6.
ed. São Paulo: Atlas, 2012. P. 214-215.
34
“Ementa: Recurso inominado. Impugnação à execução. Imposição de astreintes. Preliminar de
excesso ao limite do jec afastada. Impossibilidade de reanalisar a multa diária fixada em decisão já
transitada em julgado. Pleito de redução do valor das astreintes desacolhido. 1 - Afasta-se a
preliminar, pois o teto previsto no art. 3º, I, da Lei nº 9.099/95 deve ser observado quando da
propositura da ação, não podendo limitar execução que eventualmente seja superior, quer em razão
dos acréscimos legais, quer em razão de eventuais multas aplicadas. Do contrário, estar-se-ia
estimulando o descumprimento das decisões judiciais. 2 - A recorrente pretende, em fase de
cumprimento de sentença, rediscutir matéria que se encontra acobertada pela coisa julgada. Mantém-
se, portanto, a incidência da multa na forma definida na sentença da fase de conhecimento. 3 - A
limitação do valor das astreintes dá-se apenas em função da aplicação dos princípios da pro
porcionalidade e razoabilidade, quando se veri fiquem motivos razoáveis, devidamente de
monstrados nos autos, que justifiquem o atraso no cumprimento da ordem judicial, o que não é o
caso. Recurso Desprovido Recurso Inominado Nº 71003344462, Terceira Turma Recursal Cível,
Turmas Recursais, Relator: Adriana da Silva Ribeiro, Julgado em 15/12/2011.
35
NETO, Fernando da Costa Tourinho. JÚNIOR, Joel Dias Figueira. Juizados Especiais Estaduais
Cíveis e Criminais: comentários à lei 9.099\1995. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011 P.
374.

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instituto da coisa julgada. Os Ministros entendem que o valor atribuído na multa
cominatória não se faz coisa julgada, podendo ser revisto a qualquer momento 36.

No ordenamento Jurídico Brasileiro, existem as regras da generalidade e da


especificidade, ou seja, a lei especial revoga a lei geral, e no que for omissa,
aplicam-se as regras da lei geral. No estudo em questão, evidencia-se que ao
analisar a Lei 9.099/95, existem modificações com relação a regra geral, ou seja, o
Código de Processo Civil. Com relação a questão referente à multa, verifica-se a
omissão da lei do microssistema com relação a este instituto, pelo menos com
relação as peculiaridades, sendo assim, aplicam-se as regras da legislação
processual civil. Ao analisar o Código Processual Civil, constata-se no artigo 461, §
6º37, a faculdade que o Juiz tem de modificar o valor ou a periodicidade da multa, de
acordo com as circunstancias do caso em concreto.

Este assunto, conforme explanado vem gerando muita discussão e entendimentos


diversos entre a doutrina e o entendimento jurisprudencial. A grande parte da
doutrina entende que não se pode limitar ao teto do Juizado Especial o limite
máximo aplicável a título de multa. Pois assim, estaria influenciando a parte a
descumprir uma determinada ordem judicial, tendo em vista que o máximo que será
condenado a pagar seria o valor de 40 salários mínimos. Assim, leciona Alvim:

Seja como for, havendo multa cominatória, esta não tem como teto o valor
da causa, não interferindo na competência dos Juizados Especiais. A
propósito, tenha-se presente o §2º do art. 461, que é claro ao dispor que a
multa não afasta a indenização por perdas e danos decorrentes do
descumprimento da obrigação e fazer/não fazer. Quer esse dispositivo
significar que restou inequivocadamente superado o entendimento de que a
multa teria como teto o valor da obrigação principal. Conclui-se daí que, se
tramitar no Juizado Especial ação versando o cumprimento de obrigação de
fazer\não fazer, ou entrega de coisa, e vier a ser imposta multa ao réu (o
que pode ser feito tanto liminarmente como na sentença, segundo o que se
extrai do §4º do art. 461), essa multa poderá ultrapassar o teto de 40

36
Trecho extraído do voto da Relatora do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança, nº
33155\MA, Ministra do STJ, Maria Isabel Gallotti: “O valor da multa cominatória não faz coisa julgada
material, podendo ser revisto, a qualquer momento, caso se revele insuficiente ou excessivo (CPC,
art. 461, § 6º). Redução do valor executado a título de multa ao limite de quarenta salários mínimos.
37
“Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá
a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que
assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. [ ] § 6o O juiz poderá, de ofício,
modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou
excessiva”. BRASIL. Lei n° 5.689, de 11 de Janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869.htm>. Acesso em: 30 abr. 2013.

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salários mínimos do inc I do art. 3º da Lei 9.099\95 (mesmo que a ação
38
tramite no Juizado Especial tendo em vista o valor da causa).

Analisando de forma geral o debate, e ao remeter o assunto para as origens do


Direito Brasileiro, no qual se verifica que o princípio básico do Direito, ou seja, a
regra geral é que sempre o acessório segue o principal, não podendo o cumprimento
do acessório ser mais interessante para a parte do que a efetivação do direito
principal. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que a astreinte fixada
no Juizado Especial Cível não pode o seu montante ultrapassar o valor de 40
salários mínimos, ou seja, o valor do teto do Juizado39.

O valor da multa deve ficar adstrito ao processo, tendo relevância de acordo com
cada situação em que se encontra. O magistrado deve ater-se ao valor da prestação
principal, das condições do devedor, entre outros aspectos. Assim, leciona Assis:

O valor da astreinte, caracterizado pelo exagero no algarismo, há de ser


fixado no molde a induzir o executado ao cumprimento, em quantia capaz
de constrangê-lo. Nenhum outro critério substitui o puro casuísmo. O juiz
considerará “as condições econômicas do devedor” (art. 52, V, da Lei

38
ALVIM, Eduardo Arruda. Direito Processual Civil. 3. ed. Rev. Atual. e Ampl. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2010. P. 595-596.
39
“Ementa Processo civil. Mandado de segurança. Juizado especial. Competência. Cumprimento de
sentença. Multa cominatória. Alçada. Lei 9.099/1995. Recurso provido. 1. A jurisprudência do STJ
admite a impetração de mandado de segurança para que o Tribunal de Justiça exerça o controle da
competência dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, vedada a análise do mérito do processo
subjacente. 2. Dispõe o art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei 9.099/95, que compete ao Juizado Especial
promover a "execução dos seus julgados", não fazendo o referido dispositivo legal restrição ao valor
máximo do título, o que não seria mesmo necessário, uma vez que o art. 39 da mesma lei estabelece
ser "ineficaz a sentença condenatória na parte em que exceder a alçada estabelecida nesta lei". 3. O
valor da alçada é de quarenta salários mínimos calculados na data da propositura da ação. Se,
quando da execução, o título ostentar valor superior, em decorrência de encargos posteriores ao
ajuizamento (correção monetária, juros e ônus da sucumbência), tal circunstância não alterará a
competência para a execução e nem implicará a renúncia aos acessórios e consectários da
obrigação reconhecida pelo título. 4. Tratando-se de obrigação de fazer, cujo cumprimento é imposto
sob pena de multa diária, a incidir após a intimação pessoal do devedor para o seu adimplemento, o
excesso em relação à alçada somente é verificável na fase de execução, donde a impossibilidade de
controle da competência do Juizado na fase de conhecimento, afastando-se, portanto, a alegada
preclusão. Controle passível de ser exercido, portanto, por meio de mandado de segurança perante o
Tribunal de Justiça, na fase de execução. 5. A interpretação sistemática dos dispositivos da Lei
9.099/95 conduz à limitação da competência do Juizado Especial para cominar - e executar - multas
coercitivas (art. 52, inciso V) em valores consentâneos com a alçada respectiva. Se a obrigação é tida
pelo autor, no momento da opção pela via do Juizado Especial, como de "baixa complexidade" a
demora em seu cumprimento não deve resultar em execução, a título de multa isoladamente
considerada, de valor superior ao da alçada. 6. O valor da multa cominatória não faz coisa julgada
material, podendo ser revisto, a qualquer momento, caso se revele insuficiente ou excessivo (CPC,
art. 461, § 6º). Redução do valor executado a título de multa ao limite de quarenta salários mínimos.
7. Recurso provido.” Ementa extraída do Recurso em Mandado De Segurança Nº 33.155 – MA,
Relatora Ministra do STJ, Maria Isabel Gallotti.

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9.099/1995) – quanto mais rico, maior o valor – e a grandeza da sua
provável resistência40.

O Juiz ao fixar a multa deve observar caso a caso, não se pode estabelecer um
patamar mínimo e um máximo como regra geral para todos os casos. Outrossim,
deve-se levar em conta também que a astreinte tem como objetivo compelir uma
parte da lide a cumprir determinada ordem judicial, não podendo servir como forma
de enriquecimento ilícito para a parte adversa. Assim, menciona Rocha nas duas
situações:

[...] devendo o juiz verificar em cada caso qual o valor necessário e


suficiente para compelir o devedor ao pagamento, independentemente do
valor da obrigação ou do limite de 40 salários-mínimos. [...] É preciso dizer
também que ao pode a multa se transformar num fator de enriquecimento
ilícito para a parte vencedora, nem de inércia para o poder judiciário. Em
outras palavras, não pode o credor ficar de braços cruzados, contando os
dias em que as multas se acumulam, nem pode o juiz aplicar a multa e
41
largar o processo numa prateleira .

O entendimento das Turmas Recursais do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do


Rio Grande do Sul em alguns casos é na mesma linha do entendimento do Ministro
do Superior Tribunal de Justiça caso houvesse a limitação de um teto executável no
Juizado Especial Cível, ou que se limitasse o limite máximo de 40 salários mínimos
para aplicação de multa, o descumpridor “relaxaria” e não cumpriria a determinação,
pois saberia que jamais pagaria valor superior ao teto do microssistema42.

O Fórum Nacional dos Juizados Especiais Cíveis já se manifestou através de seus


enunciados acerca desta questão em debate. No enunciado de nº 144 ficou
estabelecido que o valor de uma multa não deve ser limitada ao teto do Juizado
Especial Cível43.

40
ASSIS, Araken de. Execução Civil nos Juizados Especiais. 4. ed. Rev. Atual. e Ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2006. P. 110-111.
41
ROCHA, Felippe Borring. Manual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais: teoria e prática. 6.
ed. São Paulo: Atlas, 2012. P. 215-216.
42
Trecho extraído do voto da Relatora do Recurso Inominado nº 71003344462 das Turmas Recursais
Cíveis do TJ\RS, Desa. Adriana da Silva Ribeiro: “Com efeito, o teto previsto no art. 3º, I da Lei nº
9.099\95 deve ser observado quando da propositura da ação, não podendo limitar execução que
eventualmente seja superior, quer em razão dos acréscimos legais, quer em razão de eventuais
multas aplicadas. Do contrario, estar-se-ia, estimulando o descumprimento das decisões judiciais, já
que o devedor saberia, de antemão, que jamais pagaria mais do que 40 salários mínimos, em que
pese a incidência de juros, correção monetária e astreintes.
43
“A multa cominatória não fica limitada ao valor de 40 salários mínimos, embora deva ser
razoavelmente fixada pelo Juiz, obedecendo ao valor da obrigação principal, mais perdas e danos,
atendidas as condições econômicas do devedor. (Aprovado no XXVIII FONAJE – BA, 24 a 26 de
novembro de 2010)” BRASIL. Enunciados do Fórum Nacional dos Juizados Especiais – FONAJE.

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As Turmas Recursais Cíveis do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul quando fazem a análise das irresignações com relação ao limite
máximo fixado a título de astreinte buscam, sempre observar se o valor aplicado a
título de astreinte observou os critérios da proporcionalidade e razoabilidade44.

Um ponto interessante a ser destacado é com relação à impossibilidade do órgão


jurisdicional de diminuir ou aumentar o montante existente a título de astreinte, tendo
em vista que se estaria diante de um ato jurídico processual perfeito. Parte da
doutrina tem esse entendimento, tendo em vista que não se poderia reduzir ou
aumentar o montante já existente em razão da demora no cumprimento da
determinação, mas apenas minorar ou aumentar valor da multa. Assim, leciona
Rocha:

Um dado importante que tem passado despercebido pelos operadores do


Direito é que o juiz tem poder para alterar apenas o valor da multa e não o
montante das multas que já foram aplicadas. Assim, se o devedor quedou-
se inerte por 10 dias, sendo a multa diária fixada em R$ 50,00, são devidos
R$ 500,00 ao credor. Esse valor acumulado não pode ser reduzido ou
ampliado, pois é um ato jurídico processual perfeito (art. 5°, XXXVI, da CF).
De fato, somente o valor da multa diária a ser aplicada no futuro é que pode
ser modificado, e, mesmo assim, a alteração só produzirá efeitos quando da
45
intimação do devedor.

Feitas essas ponderações, acerca do limite fixável a título de astreinte no âmbito do


Juizado Especial Cível, bem como do que deve ser observado no momento de sua
aplicação, verifica-se que o Magistrado Presidente do Juizado Especial Cível da
comarca em que é responsável pode fixar a multa que entender pertinente ao feito,
devendo o mesmo observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Disponível em: <http://www.fonaje.org.br/2012/?secao=exibe_secao&id_secao=6>. Acesso em: 30 de


abr. 2013.
44
“Ementa: embargos á execução (impugnação ao cumprimento da sentença). Obrigação de fazer.
Imposição de multa cominatória diária. Desnecessidade de intimação pessoal. Redução do valor das
astreintes em observância aos critérios da proporcionalidade e da razoabilidade. Enunciado n. 25 do
fonaje. Apesar de não se limitar ao valor de alçada do juizado especial cível, devem as astreintes ser
fixadas com prudência e moderação pelo juízo, obedecendo-se, para o sopesamento de sua fixação,
o valor da obrigação principal. Recurso parcialmente provido.”Recurso Inominado Nº 71002384600,
Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em
08/04/2010.
45
ROCHA, Felippe Borring. Manual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais: teoria e prática. 6.
ed. São Paulo: Atlas, 2012. P. 215.

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Conflito de competência entre o juizado especial cível e a justiça estadual

Conforme mencionado anteriormente, o Juizado Especial Civil é competente para


processar e julgar seus julgados. Esse também é o entendimento da jurisprudência
do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. A grande questão levantada
é quando se tem um título executável decorrente do Juizado, tendo o mesmo valor
exigível acima de 40 salários mínimos, se o mesmo deveria ser executado no âmbito
do microssistema, ou se poderia ser intentada a ação perante a Justiça Estadual?

O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul entende que a


Justiça Estadual é incompetente para processar e julgar a demanda em subjudice,
tendo em vista que a parte tem a faculdade de escolher o procedimento
(sumaríssimo, sumário ou ordinário), no momento em que ingressa com a ação
judicial46. Após a prestação jurisdicional do Estado através do procedimento
escolhido, a mesma não pode escolher qual o Juízo será realizada a fase executiva.
Com o sincretismo processual existente hoje, esse entendimento é pacífico na
doutrina, ou seja, o órgão que julgou deve executar seu julgado. Com a reforma do
CPC, se reinventou o processo de execução, não se pode dizer que foi criado à fase
de cumprimento de sentença, apenas aconteceu uma revolução legislativa, que
visava acelerar o julgamento das demandas.

46
“Ementa: Agravo de instrumento. Execução de sentença proveniente do juizado especial cível.
Incompetência da justiça comum estadual. Reconhecida de ofício. Nos termos dos arts. 575, II, do
CPC e dos artigos 3º, § 1º, I, e 52 da Lei n. 9.099/95 é do Juizado Especial Cível a competência
para a execução de seus julgados. De fato, é faculdade da parte optar pela tramitação da ação
cognitiva no JEC (quando preenchidos os requisitos do art. 3º da Lei dos Juizados Especiais) ou na
Justiça Comum Estadual. Todavia, tal facultatividade não alcança o processamento da execução,
que fica vinculado ao órgão que constituiu o título executivo. Ademais, o fato de a execução
extrapolar o limite previsto no inciso I do art. 3º da Lei n. 9.099/95 (40 salários mínimos) não
engendra o deslocamento da competência para a Justiça Comum Estadual. Isso porque o
importante é que o pedido deduzido na ação de conhecimento esteja dentro da alçada do Juizado
Especial Cível, sendo irrelevante que a importância a ser exigida na execução da sentença tenha
ultrapassado tal valor, seja em função dos acréscimos legais (correção monetária e juros de mora),
seja em razão de multa cominatória aplicada em caso de descumprimento de mandamento judicial
(astreinte). Assim, inviável o processamento de execução de título executivo judicial
proveniente do Juizado Especial Cível na Justiça Comum Estadual. Reconheceram, de ofício,
a incompetência da justiça comum estadual, julgando extinta a execução. Prejudicado o recurso.”
Agravo de Instrumento Nº 70024086787, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Paulo Sérgio Scarparo, Julgado em 04/06/2008.

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O sistema recursal

Caso a parte fique irresignada, ela tem três caminhos: ela pode impetrar um
Mandado de Segurança junto ao Tribunal de Justiça do seu Estado, no momento em
que for executado este valor, alegando a incompetência do Juizado em razão do
elevado valor. Vale ressaltar que o Tribunal não poderá analisar o mérito da decisão,
mas em recurso ordinário junto ao Superior Tribunal de Justiça a parte poderá ter
revista está decisão no tocante ao valor da multa, conforme já colacionado no
presente estudo decisões a este respeito47. De acordo com o atual entendimento do
Superior Tribunal de Justiça cabe mandado de segurança conforme já explanado 48.
A doutrina tem o mesmo entendimento, no que se refere a possibilidade de se
intentar Mandado de Segurança perante o Tribunal de Justiça Estadual, para
questionar a competência do Juizado Especial para execução do título em questão.
Nesse sentido, segue entendimento do doutrinado Rocha:

De fato, existe na jurisprudência uma situação em que se reconhece a


atribuição do Tribunal de Justiça para julgar mandado de segurança contra
ato de Juizados: trata-se de hipóteses em que a discussão gire em torno da
definição sobre a competência para apreciar a causa. Conforme restou
assinalado por essa corrente de pensamento, da mesma forma que as
Turmas recursais não podem decidir conflitos de competência, não podem
julgar mandado de segurança onde esteja sendo impugnada a adequação
49
da causa aos parâmetros fixados pela Lei 9.099\1995.

Outro caminho é a parte irresignada, impetrar Mandado de Segurança junto as


Turmas Recursais, conforme preceitua a sumula 376 do Superior Tribunal de
Justiça, no momento da sua fixação, no qual tem chance de ser modificado em sede
deste mandado, cabendo recurso ao extraordinário ao Supremo Tribunal Federal,

47
Recurso em Mandado De Segurança Nº 33.155 – MA, Relatora : Ministra Maria Isabel Gallotti.
48
“Recurso ordinário em mandado de segurança. Controle de competência pelo tribunal de justiça.
Juizados especiais cíveis. Mandado de segurança. Cabimento. Competência dos Juizados para
executar seus próprios julgados. 1. É possível a impetração de mandado de segurança com a
finalidade de promover o controle de competência nos processos em trâmite nos juizados especiais.
2. Compete ao próprio juizado especial cível a execução de suas sentenças independentemente do
valor acrescido à condenação. 3. Recurso ordinário desprovido.” Recurso em Mandado de Segurança
Nº 27.935 – SP, Relator : Ministro João Otávio De Noronha. Data do julgamento 08 de junho de
2010
49
ROCHA, Felippe Borring. Manual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais: Teoria e Prática. 6ª
Edição. São Paulo. Atlas. 2012. P. 269.

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conforme preceitua a sumula 640 do Supremo Tribunal Federal50 e os enunciado
6351 e 12452 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Cíveis.

O último caminho menos plausível da parte é alegar o excesso da aplicação desta


multa em sede de Recurso Inominado, pois caso as Turmas Recursais não darem
provimento ao recurso não poderá ser intentado um recurso especial junto ao
Superior Tribunal de Justiça, tendo em vista o entendimento da sumula 203 53 e
dificilmente o Supremo Tribunal Federal reconhecerá do recurso extraordinário, pois
não sendo possível preencher os requisitos de admissibilidades exigidos, com a
matéria em discussão. Além do mais, não cabe Mandado de Segurança junto ao
Supremo Tribunal Federal contra decisão das Turmas recursais54.

Considerações finais

No decorrer do presente artigo, estudou-se a origem dos Juizados Especiais Cíveis,


a sua principiologia, os valores executáveis no âmbito do microssistema, bem como
os critérios utilizados e o limite máximo aplicável a titulo de astreintes.

Com isto, pode se concluir através das analises, que o microssistema é de suma
importância para a sociedade em que vivemos, pois visa resolver as lides existentes
na forma mais célere possível, bem como a importância da aplicação dos princípios
norteadores para que se alcance a finalidade do Juizado.

50
“É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por juiz de primeiro grau nas causas de
alçada, ou por turma recursal de juizado especial cível e criminal.”
51
“Contra decisões das Turmas Recursais são cabíveis somente os embargos declaratórios e o
Recurso Extraordinário.” extraído do site: http://www.fonaje.org.b
r/2012/?secao=exibesecao&idsecao=6. Acesso em 15/04/2013.
52
“Das decisões proferidas pelas Turmas Recursais em mandado de segurança não cabe recurso
ordinário. (Aprovado no XXI Encontro – Vitória/ES)”, Enunciados do Fórum Nacional dos Juizados
Especiais – FONAJE. Disponível em:
<http://www.fonaje.org.br/2012/?secao=exibe_secao&id_secao=6>. Acesso em: 30 de abr. 2013.
53
“Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados
Especiais.”
54
Respaldando o afirmado, o Ministro Joaquim Barbosa se manifesta no mesmo sentido no Agravo
Regimento no Mandado de Segurança nº 26. 427-6 Pernambuco. Julgado no dia 28/03/2007.

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Outrossim, constata-se divergências existentes na doutrina e na jurisprudência
acerca do valor máximo que uma sentença do Juizado pode alcançar, bem como da
fixação e execução das astreintes perante o microssistema.
Com o presente estudo, pode se concluir vários pontos interessantes acerca da
aplicação das astreintes no microssistema denominado Juizado Especial Cível, entre
eles pode se destacar a natureza das astreintes no Direito Brasileiro, no qual se tem
um caráter coercitivo.

Ademais, com o transcorrer do artigo, pode se verificar que há muita divergência


ainda sobre se uma astreinte fixada no Juizado Especial Cível pode alcançar um
montante superior ao teto estabelecido na lei. Tanto a jurisprudência como a
doutrina não são pacificas acerca do assunto, mas pode se concluir que a astreinte
deve atingir sua finalidade, qual seja, coercitiva, caso não atingida sua finalidade, e o
montante fixado atinja o teto do juizado, deveria o Magistrado ou a parte
interessada, buscar outros meios para que se efetivasse o cumprimento da tutela
jurisdicional buscada.

Ou seja, quando a parte opta por ajuizar a ação no Juizado Especial Cível, esta em
tese tem uma lide de menor complexidade. Sendo assim, tendo em vista a natureza
punitiva das astreinte, esta tem que respeitar o limite máximo do microssistema, pois
é um mecanismo processual para que a parte consiga sua finalidade, e não tem
natureza punitiva.

Por fim, conclui-se, que o Juizado Especial Cível é de suma importância para a
sociedade em que vivemos, e que o objeto do presente estudo, ou seja, a astreintes
tem ajudado muito na aplicação da função essencial que o juizado exerce perante a
sociedade brasileira, bem como que o valor da multa deve ser limitado ao teto do
microssistema.

Referências bibliográficas

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Ampliada. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais. 2010.

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