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Ronaldo Vainfas participou da primeira edição do fHist, em 2011

Diante da polêmica em torno da medida provisória de reforma do


ensino médio no País, o portal do fHist convidou historiadores,
jornalistas e escritores a se manifestarem sobre o ensino da
História. Autor de "Trópico dos pecados", "A heresia dos índios:
catolicismo e rebeldia no Brasil colonial", "Traição" e "Jerusalém
Colonial", entre outros livros, o historiador e professor Ronaldo
Vainfas é leitura obrigatória nos cursos de História e abre a nossa
série de artigos.
"Aprender História é essencial para formar indivíduos com senso
crítico em relação ao mundo no qual estão inseridos. Deve, por
isso, ser disciplina obrigatória desde o Ensino Fundamental. É
nesta etapa da vida escolar que os alunos constroem a base de sua
formação enquanto indivíduos, em meio à qual se transformam de
crianças em jovens adolescentes. A História talvez seja a matéria
mais vocacionada para a formação de indivíduos conscientes de seu
lugar no mundo, pois estuda as alteridades no tempo e no espaço,
quer sociedades distintas e remotas, quer as sociedades e o mundo
atuais. Mas qual História deve ser ensinada? Não uma História
exaustivamente factual, dedicada a incutir fatos, nomes e datas na
memória dos alunos, a maioria dos quais sem nenhum interesse
para eles. Tampouco deve ser uma História meramente conceitual,
dedicada a oferecer modelos de interpretação válidos para
quaisquer sociedades ou tempos históricos. O ensino da matéria
deve buscar o equilíbrio entre a informação e a interpretação, atento
às diferenças entre os valores atuais e os da sociedade estudada. A
perspectiva comparativa é a melhor operação para o conhecimento
e o ensino da História. O desafio reside em oferecer uma História
que faça sentido para o aluno. Fazer com que o estudo de
sociedades com valores estranhos dos nossos, incentive a que ele
reflita sobre si e sobre o mundo que o cerca. O caminho para tanto
é apostar na sensibilização do aprendizado. Explorar, nos materiais
didáticos e nas aulas, as experiências individuais de personagens
ou de episódios, em diferentes épocas, sejam eles célebres, sejam
comuns, desde que permitam iluminar um grupo social ou cultural.
O ensino apoiado neste conteúdo sensível, por meio de uma
linguagem livre de clichês e atenta à faixa etária do aluno, eis o que
me parece o ideal. Em termos curriculares, não convém adotar o
tradicional modelo eurocêntrico, claro, mas tampouco se deve
invertê-lo, priorizando o Brasil, a América Latina e a África. Todos
os continentes merecem atenção. Desde o tempo em que as
histórias deles eram paralelas até o processo de globalização atual,
passando pela fase em que viviam histórias conectadas - resultado
da expansão marítima europeia, queira-se ou não. Estou certo de
que este modelo de aprendizagem seria valioso para os alunos em
formação escolar, seja qual for a sua escolha futura profissional.
Estimularia uma consciência tolerante diante da alteridade.
Democrática. Cidadã. Cidadania do mundo, como diria Sócrates,
não apenas a de seu país".

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