A) Fundamentos Teóricos e metodológicos da disciplina
Pensar a História no século XXI implica, cada vez mais, um posicionamento crítico diante dos acontecimentos do passado. Não se trata, entretanto, de outro modismo acadêmico que pretendemos adotar no material didático de Ensino Médio. Tampouco, da crítica sem base, considerada um dos vícios bastante disseminados nas aulas de História. Pensar a História no século XXI requer observadores atentos para as mudanças que caracterizam a época contemporânea. Mudança é a palavra-chave que deve orientar as atividades didáticas e pedagógicas, mas que por si só não assegura a qualidade e eficácia destas. É fundamental que o professor de História no Ensino Médio compreenda a importância dos conhecimentos históricos e consiga demonstrá- la aos seus estudantes. Os acontecimentos do passado de qualquer sociedade assumem, diante de comunidades humanas contemporâneas, algum tipo de relevância, seja como respeito, seja como rechaço. Por isso, os seres humanos precisam ter consciência da existência do passado, como um componente necessário das instituições, dos valores e de outros elementos constitutivos da própria sociedade humana. Nesse sentido, os historiadores Jaime Pinsky e Carla Bassanezi Pinsky destacam que a História é referência e, enquanto tal é preciso que seja bem ensinada. Nessa perspectiva, o ensino da História assume a responsabilidade de garantir que os nossos estudantes tenham um diferencial a oferecer neste mundo contemporâneo repleto de mudanças. As transformações de caráter histórico que estamos presenciando nos dão as pistas para melhor organizarmos nossa sociedade: informação e comunicação parece ser o princípio norteador da sociedade do terceiro milênio. Em outras palavras, é imprescindível investir em educação e cultura. Diante do que já foi aqui exposto, temos a resposta, pelo menos uma, para a tão trivial pergunta que os estudantes nos fazem em sala de aula: “Professor, para que aprender História?”. Mas, a importância de se aprender História não se resume à qualificação da força de trabalho de uma determinada sociedade, apesar de que fornece meios para os estudantes progredirem no trabalho seja uma das metas estabelecidas pelas diretrizes e bases da educação nacional. As recomendações legais, portanto, não se limitam à preparação para o trabalho, abrangendo objetivos tão utópicos, como o fortalecimento dos laços de solidariedade e de tolerância recíproca; a formação de valores; o aprimoramento como ser humano; a formação ética; e o exercício da cidadania. Ao considerarmos esses objetivos como utópicos, não estamos relegando-os ao nível do irrealizável, da simples imaginação de uma sociedade ideal. Quando afirmamos que os objetivos legalmente propostos são utópicos, buscamos resgatar o papel fundamental do historiador/professor diante das dinâmicas de mudanças da sociedade contemporânea. O resgate da História, como citado anteriormente, possibilitará aos estudantes a emancipação necessária para o destaque social exigido pelas transformações das últimas décadas. Para concretizar e consolidar a empreitada emancipatória, faz-se determinante a presença de professores capacitados e em constante processo de formação e atualização. Aulas bem dadas demandam professores bem preparados, adequados a exigências reais que se apresentam cotidianamente. A aula de História bem dada se caracteriza por ser rica de conteúdo, socialmente responsável e isenta de ingenuidade ou de nostalgia. Por isso, a utopia, que deve estar presente nas práticas de ensino de História, como declaram os historiadores Jaime Pinsky e Carla Bassanezi Pinsky:“historiador/professor sem utopia é cronista e, sem conteúdo, nem cronista pode ser”. Assim, o papel do professor de História deve estar em sintonia com as mudanças, termo recorrente nesta apresentação da proposta pedagógica. Partimos do pressuposto de que a produção historiográfica é consoante com a sua própria época. As sociedades humanas são estabelecidas por um emaranhado de diversas estruturas sociais, políticas e culturais que conformam a sua consciência de mundo, o que significa dizer que “no interior de grandes períodos históricos, a forma de percepção das coletividades humanas se transforma ao mesmo tempo que seu modo de existência” Não criamos nem elegemos as circunstâncias nas quais nascemos e crescemos, mas somos por elas influenciáveis. Logo, a História e a produção historiográfica são resultado de seu próprio tempo. Um exemplo bastante esclarecedor é a tentativa de se compreender o termo Renascimento sinteticamente apresentado pelo historiador Jerry Brotton quando ele problematiza as definições mais consagradas no mundo ocidental: [...] Não é causalidade que o período que presenciou o nascimento do termo fosse também o momento no qual a Europa afirmava, com maior agressividade, seu domínio imperial sobre o mundo. O homem renascentista inventado por Michelet e Burckhardt era branco, masculino, culto e convencido de sua superioridade cultural. Diante desta perspectiva, esse homem assemelhava-se ao ideal vitoriano de aventureiro imperial ou funcionário colonial. Na realidade, estes autores não descreveram o mundo dos séculos XV e XVI, mas sim o seu próprio mundo. Se, no século XIX, a historiografia buscou, de acordo com Jerry Brotton, descrever o seu próprio tempo, que História vamos apresentar aos nossos estudantes do início do século XXI? Primeiramente, precisamos esclarecer qual é a concepção de contemporaneidade orientadora deste material didático. Somos cidadãos de uma época, determinada pelas mudanças decorrentes de um longo processo histórico, que estruturou o capitalismo industrial, cada vez mais globalizado. Trata-se de uma época, como já foi dito, em que a informação e a comunicação estão remodelando a base material da sociedade em ritmo acelerado, acentuando a interdependência global e apresentando novas formas de relação entre a economia, o Estado e a sociedade. Perceber-se como integrante deste mundo é fundamental para que os estudantes também possam se perceber como sujeitos históricos. Talvez seja este o fio de Ariadne: a prática do ensino da História revelando-se como a oportunidade de os estudantes sentirem-se integrantes de um determinado momento histórico, reconhecendo-se enquanto ser social. A História pode, dessa maneira, despertar a curiosidade, levando os estudantes a descobrirem caminhos diferentes de analisar o passado e o próprio mundo que os cerca. A partir de uma análise bem fundamentada, que pode ser alcançada com boas aulas e professores bem preparados, além, é claro, de um livro didático de qualidade, nossos estudantes têm a oportunidade de se identificarem como sujeitos históricos. Entretanto, o estudante nunca será um daqueles personagens, como um guerreiro medieval ou um faraó egípcio, pois ele é um homem do seu tempo, do século XXI, e isso é uma determinação histórica. A esse respeito, os historiadores Jaime Pinsky e Carla Bassanezi Pinsky decretam o potencial transformador do ensino de História: [...] Cabe ao professor [...] aproximar o estudante dos personagens concretos da História, sem idealização, mostrando que gente como a gente vem fazendo História. Quanto mais o estudante sentir a História como algo próximo dele, mais terá vontade de interagir com ela, não como uma coisa externa, distante, mas como uma prática que ele se sentirá qualificado e inclinado a exercer. O verdadeiro potencial transformador da História é a oportunidade que ela oferece de praticar a “inclusão histórica” [...]. De acordo com o que foi exposto, apresentamos um projeto que visa oferecer, aos estudantes e professores, condições de aprimorar as relações humanas, preparando-ospara o pleno exercício da cidadania. que só serão alcançados a partir de um posicionamento crítico, mas fundamentado em conceitos, como processo histórico, tempo e historicidade, que são essenciais para a compreensão da História e de sua importância social. B) Objetivos Gerais da Disciplina Ao privilegiarmos os conhecimentos já citados, objetivamos que os estudantes possam compreender a História como um longo processo de transformações, no qual as sociedades humanas modificaram-se de acordo com as demandas de cada época. Dessa maneira, temos por propósito capacitar os estudantes a identificarem que as mudanças históricas acabaram conferindo modelos e padrões que, invariavelmente, caracterizaram não apenas a História como também as sociedades contemporâneas. Ou seja, nosso maior objetivo é que os estudantes se percebam como parte integrante do processo histórico, que eles se reconheçam, de fato, como sujeitos históricos. D) Encaminhamentos metodológicos Para pensar criticamente a História no século XXI, levando os estudantes a se perceberem como sujeitos históricos, alguns procedimentos metodológicos são necessários: contextualizar e problematizar o conteúdo, sempre que possível, com situações mais próximas da realidade dos estudantes, possibilitando a percepção das diversidades culturais e dos conflitos inerentes à vida em sociedade; conduzir os conteúdos, que são apresentados de forma separada, como partes integrantes de um todo, ou seja, trabalhar o conceito de processo histórico para que os estudantes reconheçam a realidade histórica; alertar para que eventuais anacronismos sejam evitados, demonstrando que a interpretação do passado, apesar de ser realizada sob perspectivas do presente, deve respeitar a temporalidade do assunto estudado; apresentar e utilizar variados documentos históricos, incentivando os estudantes a se integrarem com as práticas de investigação histórica por meio da interpretação de dados e informações representados de diferentes formas; conscientizar da importância da leitura de livros, visto que representam um referencial imprescindível para a formação de cidadãos livres e independentes; sistematizar os conhecimentos trabalhados por meio de atividades de pesquisa, de reflexão e de verificação do entendimento dos estudantes. Na disciplina de História, deve-se abordar algumas legislações que conferem ações específicas no campo da educação escolar, no âmbito das relações contextuais e devem ser elencadas no Plano de Trabalho Docente: História e Cultura Afro-brasileira (Lei 10.639/03), História e Cultura dos Povos Indígenas (Lei 11.645/08); Política Nacional de Educação Ambiental - Lei Federal nº 9795/99, Lei Estadual nº. 17.505/13; Prevenção ao uso indevido de Drogas – Lei Federal nº 11343/06; Estatuto do Idoso – Lei Federal nº 10.741/03; Política de proteção ao idoso - Lei Federal nº 17858/13. Outras legislações poderão ser trabalhadas no decorrer do ano letivo, em atividades desenvolvidas pela organização do trabalho pedagógico da escola: Educação Sexual e Prevenção à AIDS e DST - Lei nº 11.733/97 e 11.734/97; Enfrentamento à Violência contra Crianças e Adolescentes – Lei nº 11.525/2007; Programa de Combate ao Bullying - Lei 17.335/2012; Educação em Direitos Humanos – Lei Federal nº 7.037/2009; Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 8069/1990; Dia Nacional de Combate ao Dengue Lei Federal nº 12.235/2010; Dia de Ação Contra a Dengue Lei Estadual nº 17675/2013; Educação para o Trânsito – Lei nº 9503/97. E) Avaliação A avaliação não deve ser entendida como o momento final de um período de atividades escolares, mas como parte integrante do processo de ensino- aprendizagem. Isso equivale a dizer que a avaliação deve ter um caráter diagnóstico e processual. Diagnóstico porque permite que o professor acompanhe o desempenho e o desenvolvimento de seus estudantes. Processual porque, dependendo das dificuldades e dos avanços detectados, o professor pode rever os procedimentos que vem utilizando e redirecionar a sua prática pedagógica. Nessa perspectiva, a avaliação representa uma prática fundamental para verificar o alcance das metas estabelecidas, as aprendizagens construídas pelos estudantes e o impacto dessas aprendizagens na vida de cada um. A prática avaliativa necessita, portanto, integrar todo o processo educativo, do início ao fim. Seu resultado precisa ser fonte de informação para nortear a aprendizagem de cada estudante ou do grupo e, ao mesmo tempo, servir como instrumento de regulação do planejamento e de verificação de sua adequação às necessidades de aprendizagem. A avaliação é uma atividade ampla e complexa. É importante que, ao exercê-la, o professor tenha em vista não um instrumento de dar nota, mas o domínio gradativo das atividades propostas. Essa expressa o caráter formativo da avaliação, para além de sua função meramente classificatória. “Ao procurar identificar e interpretar, mediante observação, diálogo e instrumentos apropriados, sinais e indícios das competências desenvolvidas pelos estudantes, o professor pode julgar se as capacidades indicadas nos objetivos estão se desenvolvendo a contento ou se é necessário reorganizar a atividade pedagógica para que isso aconteça” (PCN - BRASIL, 1998). Vista dessa forma, a prática da avaliação só vem a enriquecer o processo, pois, mais do que quantificar por meio de uma nota, a escola passa a se responsabilizar pela qualidade do ensino. Entre os vários objetivos que norteiam o processo avaliativo, é fundamental observar o reconhecimento pelos estudantes do papel das diferentes linguagens, dos diferentes agentes sociais e dos diferentes contextos históricos. Para isso, é necessário que o professor explore fontes documentais de natureza diversa, permitindo aos estudantes as tarefas de crítica, de análise e de interpretação. A utilização de fontes documentais diversas favorece a compreensão das relações entre continuidade/permanência e ruptura/transformação nos processos históricos, situando as diversas produções da cultura nos contextos históricos de sua constituição e significação. Consequentemente, também figura como objetivo o desenvolvimento da capacidade de os estudantes relativizarem as variadas concepções de tempo e formas de periodização do tempo cronológico, reconhecendo-as como construções culturais e históricas. Alcançar tais objetivos permitirá, em tese, que os estudantes consigam posicionarse diante de fatos presentes a partir da interpretação de suas relações com o passado. Embora a prova continue sendo um dos instrumentos de avaliação mais utilizados, outras atividades podem contribuir com a prática da avaliação, como trabalhos individuais ou em grupo. Nesse caso, é importante priorizar outras abordagens do conteúdo apresentado no livro didático, para reforçar a ideia de que a História é escrita por alguém que, mesmo não intencionalmente, expressa suas impressões, crenças e ideologias. O trabalho cotidiano, ou seja, a participação durante as aulas, também é um bom indicador do aproveitamento dos estudantes. O comprometimento deles em sala de aula representa um referencial significativo na avaliação. Eles também precisam prezar pela organização e pelo capricho das tarefas rotineiras, pois o caderno tem que ser uma de suas fontes de consulta mais utilizadas. Enfim, a avaliação é um processo que não se reduz à simples execução de algumas provas, verificando-se apenas o conteúdo. A recuperação de estudos se dará de forma simultânea e paralela. Assim, simultaneamente ao processo ensino e aprendizagem o professor retomará conteúdos e atividades para observar e corrigir o processo. Paralelamente, em contraturno, o estudante poderá corrigir seu processo de aprendizagem em aulas específicas para essa finalidade. F) Referências Bibliográficas ABREU, Martha (Org.). Ensino de História: conceitos, temáticas e metodologia. Rio de Janeiro:Casa da Palavra, 2003. BANN, Stephen. As invenções da história: ensaios sobre a representação do passado. São Paulo:Unesp, 1994. BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1994. BROTTON, Jerry. el bazar del renacimiento: sobre la influencia de oriente en la cultura occidental. Buenos Aires: Paidós, 2004. BURKE, Peter (Org.). A escrita da História: novas perspectivas. São Paulo: Unesp, 1992. CASTELLS, Manuel. a sociedade em rede: a era da informação: economia, sociedade e cultura. São Paulo: Paz e Terra, 1999. FURET, François. A oficina da história. 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