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A globalização e o Estado
ponto de deixar “vazar” para a mídia suas críticas à política monetária adotada
pela Grã-Bretanha.
A política econômica do Japão é definida basicamente em função da
balança comercial e da taxa de câmbio com os Estados Unidos. Quanto aos
Estados Unidos, detentores da economia mais auto-suficiente do mundo, so-
mente puderam sustentar essa posição, apesar de um déficit comercial subs-
tancial nos anos 80, mediante o financiamento das contas públicas crescentes
com empréstimos contraídos, em grande parte, a partir de fontes de recursos
externos. Ao adotar essa medida, o principal problema da política econômica
norte-americana nos anos 90 passou a ser a redução de um déficit orçamentá-
rio gigantesco que ameaçava se tornar o buraco negro da economia. À indepen-
dência econômica norte-americana revelou-se uma ilusão, que provavelmente
será dissipada no momento em que os padrões de vida refletirem a competiti-
vidade na economia global, assim que a proteção proporcionada pelos vulto-
sos empréstimos contraídos pelo Estado, e que ficaram fora de controle durante
o governo Reagan, for retirada.” Poder-se-ia argumentar que o grau de autono-
mia para a definição da política econômica dos governos tem sido drastica-
mente reduzido nos anos 90, com suas políticas orçamentárias forçosamente
vinculadas a dotações já comprometidas por decisões tomadas no passado, e à
grande mobilidade de capital vivenciada no presente, que tende a aumentar
ainda mais no futuro.
A dificuldade cada vez maior do controle exercido pelos governos sobre
a economia (tendência vista com entusiasmo por alguns economistas) é acen-
tuada pela crescente transnacionalização da produção, não apenas pelo impac-
to causado pelas empresas multinacionais, mas principalmente pelas redes
integradas de produção e comércio dessas empresas.º A conseqiiência é a ca-
pacidade cada vez mais reduzida de os governos assegurarem em seus pró-
prios territórios a base produtiva para a geração de receita. À medida que as
empresas e indivíduos com grandes fortunas vão descobrindo paraísos fiscais
em todo o mundo, e a contabilização do valor agregado em um sistema inter-
nacional de produção se torna cada vez mais onerosa, surge uma nova crise
fiscal no Estado, expressão de uma contradição crescente entre a internaciona-
lização do investimento, produção e consumo, por um lado, e a base nacional
dos sistemas tributários, por outro." Será por acaso que os países mais ricos do
mundo, em termos de renda per capita, são Luxemburgo e Suíça? É bem pro-
vável que um dos últimos bastiões do Estado-Nação esteja sendo disputado no
ciberespaço contábil entre autoridades fiscais diligentes e advogados transna-
cionais altamente qualificados.
290 Um Estado destituído de poder
Dívida externa/PIB (%) 104,2 31,8 538,5 (p) 0,0 1.066,7 -25,3
(9,8) (5,8/1992) (16,6) (p) (0,3/1990) (10,5) (5,9)
Dívida externa/reservas 20,1 44,7 325,3 (p) 9,9 674,5 -16,5
Fontes: Dados compilados e organizados por Sandra Moog a partir das seguintes fontes: Government Finance Statistics Yearbook, vol. 18 (Wa-
shington DC: EMI, 1994); International Financial Statistics Yearbook, vol. 48 (Washington DC: FMI, 1995); The Europa World Yearbook (Lon-
dres: Europa Publications, 1982, 1985, 1995); National Accounts: Detailed Tables, 1980-1992, vol. 2 (Paris: OCDE, 1994); OECD Economic
Outlook, vol. 58 (Paris: OCDE, 1995); World Tubles, 1994 (The World Bank, Baltimore: The Johns Hopkins University Press, 1994)
Tabela 5.2 Papel do governo na economia e finanças públicas: índices de variação, 1980-92 (e índices de 1992, salvo outras indicações)
Outlook, vol. 58 (Paris: OCDE, 1995); World Tables, 1994 (The World Bank, Baltimore: The Johns Hopkins University Press, 1994)
Um Estado destituído de poder 293
Bélgica EEE
Itália E*
Grécia
Canadá EE
Irlanda EEE
Japão
Suécia RESSSEASSS
Estados Unidos E&&
Alemanha EB
França EESSERNES
Grã-Bretanha
T T t
da receita tributária no PIB pode ser apontado apenas como parte da explica-
ção, complementada principalmente pela grande aceleração da taxa de cresci-
mento econômico da Índia durante a última década. Vale lembrar, contudo,
que, embora o índice de variação dos indicadores da dependência financeira
do governo na Índia tenha sido negativo no período, o grau de dependência
ainda continua bastante elevado (a dívida externa pública representa mais de
70% das exportações e quase 150% das reservas monetárias).
A exemplo do que ocorre normalmente, o caso do Japão é diferente. O
governo japonês não foi afetado pelo volume de empréstimos externos nos
anos 80. Seu déficit orçamentário sobre o PIB é, de longe, o mais baixo, apre-
sentando um decréscimo substancial durante o período 1980-93. Por outro
lado, o consumo do setor público aumentou, tendo o mesmo acontecido com a
dívida pública, e o Japão apresentou um índice bastante semelhante ao dos
EUA na relação dívida pública/PIB (mais de 50%). Esses dados indicam que
as finanças do governo japonês, ao contrário dos demais países, dependem
basicamente dos empréstimos internos. Isso também reflete a maior competi-
tividade da economia japonesa e os superávits consideráveis da balança co-
mercial e de pagamentos acumulados pelo país. Assim, o Estado japonês
tem uma autonomia bem maior que a de outros Estados em comparação ao
Um Estado destituído de poder 295
Alemanha
Suíça
Bélgica
Áustria
Japão
Holanda
França É
Estados Unidos
Itália
Grã-Bretanha
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News Comp. — (AUS)
Figura 5.3 Porte e sede de operações das 15 maiores multinacionais de mídia e de serviços de impressão gráfica (Alemanha À
Canadá, França e Austrália estão entre os maiores exportadores; EUA e Reino Unido são os maiores importadores)
Fonte: Fortune (23 de abril de 1990) e relatórios anuais das empresas; elaborado por MacDonald (1990).
Um Estado destituído de poder 301
sário, nesse ponto de minha argumentação, examinar essa tendência para me-
lhor compreensão da atual crise do Estado-Nação. À novidade não é o maior
grau de penetração do crime e seu impacto na política. À novidade é a conexão
global do crime organizado, condicionando relações internacionais, tanto eco-
nômicas como políticas, à escala e ao dinamismo da economia do crime. À
novidade é o profundo envolvimento e a desestabilização dos Estados-Nação
em uma série de contextos submetidos à influência do crime transnacional.
Embora o tráfico de drogas seja o ramo de atividade mais significativo da nova
economia do crime, todos os tipos de tráfico são praticados por esse sistema
“subterrâneo” cujo poder se estende por todo o mundo: armas, tecnologia, mate-
riais radioativos, obras de arte, seres humanos, órgãos humanos, assassinos mer-
cenários e contrabando dos mais diversos produtos de e para qualquer parte do
mundo estão todos interligados pela grande matriz de todos os atos ilícitos — a
lavagem de dinheiro. Sem ela, a economia do crime não seria global tampouco
altamente lucrativa. Por meio da lavagem de dinheiro, a economia do crime está
diretamente conectada aos mercados financeiros globais, dos quais pode ser con-
siderado um componente de porte significativo e fonte inesgotável de especula-
ção. Segundo a Conferência da ONU sobre a Economia do Crime em Escala
Global realizada em Nápoles em outubro de 1994,” estimativas razoáveis fixa-
riam o total dos recursos anuais provenientes de fontes ilegais e “lavados” no
sistema financeiro global em cerca de US$ 750 bilhões. Esses fluxos de capital
precisam ser processados com mobilidade e flexibilidade maiores que as nor-
malmente evidenciadas no processamento de recursos originados por qualquer
outro ramo de atividade, pois é justamente seu giro constante que impede o
rastreamento pelos órgãos de regulamentação competentes.
O impacto causado por essas tendências aos Estados-Nação pode ser
observado sob três principais aspectos:
1. Em muitos casos, toda a estrutura do Estado, não raro incluindo as mais
altas esferas de poder, está entremeada de vínculos criminosos, pela cor-
rupção, ameaças ou financiamento ilegal da política, causando enormes
estragos na conduta das questões públicas.
2. Para vários países, as relações internacionais entre os Estados-Nação passou
a ser condicionada, em diversos níveis, pelo sucesso ou insucesso da coope-
ração na luta contra a economia do crime. Até o momento, o caso mais notó-
rio pode ser verificado nas relações entre os Estados Unidos e alguns países
da América Latina (Colômbia, Bolívia, México, Paraguai, Panamá); contu-
do, esse tipo de fenômeno vem ocorrendo com maior freqilência à medida
que a economia do crime se diversifica (por exemplo, a preocupação da Ale-
Um Estado destituído de poder 305
“Se buscarmos uma razão concisa e objetiva para o novo ânimo insufla-
do na proposta de integração européia de meados da década de 80”, conforme
apontado por Streeck e Schmitter, “esta pode ser encontrada como o resultado
de uma combinação entre dois grandes interesses — o das empresas européias de
grande porte, esforçando-se para superar sensíveis vantagens competitivas dos
capitais japoneses e norte-americanos, e o das elites do Estado, procurando
restaurar ao menos parte de sua soberania política gradativamente perdida em
nível nacional em decorrência de uma interdependência internacional cres-
cente”.*? Em ambos os casos, em termos de interesses empresariais e políticos,
o que se buscava não era uma relação de supranacionalidade, mas sim a recons-
trução do poder do Estado com base na nação em um nível mais elevado, nível
este que viabiliza, até certo ponto, o controle dos fluxos globais de riqueza,
informações e poder. A formação da União Européia (conforme argumentarei
no volume HI) não foi um processo de construção do Estado federativo euro-
312 Um Estado destituído de poder
É de suma importância em vosso Reinado que Vossa Majestade vos torneis Rei
da Espanha; quero dizer, Majestade, que não vos deveis contentar com o título
de Rei de Portugal, Aragão, Valência e Conde de Barcelona, mas deveis arqui-
tetar em segredo um plano para submeter tais reinos dos quais a Espanha é
constituída aos costumes e às leis de Castela, sem que haja diferenciação quan-
to à forma das fronteiras, postos alfandegários, poder de convocar as Cortes de
Castela, Aragão e Portugal sempre que vos parecer desejável, e de nomear
ministros das diferentes nações, sem quaisquer restrições... E se Vossa Majes-
tade conseguir tal intento, sereis o príncipe mais poderoso do mundo.*º
A identificação do Estado
por uma crise estrutural (a exemplo de tantos outros em todo o mundo) nos
anos 90: o México e os Estados Unidos.
geral do PRI, Jose Francisco Ruiz Massieu (cuja primeira mulher era irmã do
presidente Salinas), foi assassinado, e levantaram-se suspeitas de que seu irmão,
o vice-procurador-geral da República do México, teria acobertado o assassinato
e fugido do país: Raul Salinas, irmão do então presidente Carlos Salinas, e um
dos principais parceiros de negócio do presidente, foi acusado de ter sido o man-
dante do assassinato de Ruiz Massieu, e acabou sendo preso; as ligações de Raul
Salinas com os cartéis da droga e o esquema de lavagem de centenas de milhões
de dólares vieram à tona; poucos dias depois de deixar o poder em dezembro de
1994, o presidente Carlos Salinas rejeitou todo tipo de acusação contra ele, en-
saiou uma greve de fome de 24 horas e, após haver recebido uma palavra bem-
educada de conforto de seu sucessor, Ernesto Zedillo, deixou o país; sua partida,
pela primeira vez na história do país, desencadeou uma torrente de denúncias
públicas e trocas de acusações de políticos mexicanos de todas as facções, inclu-
sive ex-presidentes, que decidiram que daquele momento em diante valia tudo.
Embora o PRI tenha saído vitorioso nas eleições presidenciais de agosto de 1994,
em um processo eleitoral relativamente honesto, os temores generalizados de
instabilidade e violência caso o PRI fosse derrotado foram fatores decisivos para
a vitória do partido. Os resultados das eleições estaduais, municipais e para o
Congresso Nacional realizadas em seguida apontaram claramente para uma ten-
dência de maior votação a favor da oposição conservadora, o Partido de Aceion
Nacional (PAN) e, em menor escala, dos opositores de esquerda organizados em
torno do Partido de la Revolucion Democratica (PRD). O presidente Zedillo
abriu mão de parte considerável do controle da máquina eleitoral, nomeou polí-
ticos independentes e membros do PAN para cargos de alto escalão em seu go-
verno e parecia estar preparado para ser o presidente responsável pelo processo de
transição para um tipo diferente de regime e, talvez, de Estado. O ponto de vista
do PRI, no entanto, era bem diferente. Em novembro de 1996, rejeitou o acordo
com os outros partidos sobre a elaboração de uma lei de reforma política.
No momento da elaboração desta obra (1996), o futuro político do Mé-
xico é incerto, com forças políticas e líderes de diversas procedências e ideo-
logias posicionando-se para a nova era política. A única certeza é que a trajetória
histórica do Estado do PRI chegou ao fim." E as perguntas são por que, e de
que forma, este importante acontecimento político está relacionado ao argu-
mento geral aqui exposto sobre a crise do Estado-Nação como resultado dos
conflitos provocados pela contradição entre globalização e identidade.
O atual processo de transformação do México, e a queda de seu Estado-
Nação, começou em 1982, quando o México não teve condições de pagar juros
sobre a dívida externa, apesar do aumento na produção de petróleo do país
326 Um Estado destituído de poder
Ss
[1
o
PRI e, embora ainda dotado de influência e recursos, arrisco dizer, que terá seu
poder cada vez mais limitado.
Do ponto de vista econômico, o México, e também o mundo, ingressa-
ram em uma nova era, da qual o México é provavelmente um dos pioneiros.
Larry Summers, renomado especialista em finanças internacionais e um dos
principais articuladores da saída para a crise mexicana, ao analisar a situação
com maior distanciamento, escreveu, no final de 1995: “A crise mexicana (de
1994) ocorreu nos moldes das inovações financeiras dos últimos anos: e os
avanços nas áreas de informática e comunicações fizeram com que ela se pro-
pagasse, de forma sem precedentes. Assim, não é de surpreender o fato de
Michel Camdessus, presidente do FMI, tê-la considerado a primeira crise do
século XXT”.*' Isso se traduziu no fato de que, no futuro, qualquer tipo de
política econômica a ser adotada pelo México terá necessariamente de ser
conduzida de forma coordenada com a política econômica dos EUA e com os
mercados financeiros internacionais.
Sob a perspectiva política, o México deve levar em conta, desde já, a
penetração das redes do crime organizado global no aparato de seu Estado, em
todos os níveis. Há dúvidas quanto ao fato de que seu próprio sistema judiciário
e policial sejam imunes a essa penetração, o que torna a recuperação da au-
tonomia plena do Estado em relação ao crime tarefa extremamente difícil. De
fato, parece que a maioria das revelações acerca das conexões entre o tráfico
de drogas e o sistema político, inclusive as referentes a Raul Salinas, provém
das investigações realizadas pelo serviço de inteligência dos EUA — o que
torna os líderes mexicanos dependentes da inteligência norte-americana.
Em termos de política interna, uma sociedade civil mais bem informada
e mobilizada está vivenciando novas formas de expressão e organização, todas
elas diretamente divergentes do Estado controlado pelo PRI, e muitas vezes
mais bem desenvolvidas em nível local. A crescente globalização e à segmen-
tação da mídia estão afrouxando os controles que o grupo Televisa, um impé-
rio das comunicações do setor privado tradicionalmente aliado do Estado do
PRI, exercia sobre o “infoentretenimento”,
E, simbolicamente, o poder da identidade, conforme manifestado por
Marcos e os zapatistas, fez mais do que simplesmente revelar a autocom-
placência ideológica do México: construiu pontes de comunicação entre os fíndi-
os de verdade, pobres de verdade, e os setores da sociedade urbana com melhor
formação educacional, em busca de novas utopias que exijam mobilização. Nesse
processo, a nação mexicana foi reunificada, desta vez contra o Estado controla-
do pelo PRI.
334 Um Estado destituído de poder
brado, visando negar uma concentração muito grande de poder nas mãos do
governo, seja ele qual for.
Por enquanto, essa forte tendência antigovernamental afeta profundamente
a política do Estado, mas não sua estrutura. Tal tendência parece estar a caminho
da transformação da base institucional e da finalidade política do governo nos
Estados Unidos. Se forem promulgadas as propostas aprovadas pelo Congresso
republicano em 1995, ou uma versão com emendas dessas políticas, a partir de
2002 o governo federal irá transferir aos governos estaduais os recursos e a respon-
sabilidade pela administração de dezenas de programas importantes, inclusive de
previdência social (welfare), Medicaid, treinamento profissional e proteção
ambiental, com um orçamento total estimado em US$ 200 bilhões anuais.* Além
disso, os recursos serão liberados “em bloco”, de modo que caberá aos Estados a
decisão final sobre a aplicação destes, desde que observadas algumas condições,
cujo conteúdo tem sido objeto de acaloradas discussões no Congresso. O go-
verno Clinton também planejava atribuir responsabilidades cada vez maiores
aos estados em muitas áreas importantes, inclusive política de transportes e
bem-estar social. Como se não bastasse, os esforços para reduzir o déficit orça-
mentário em sete anos, tanto por parte dos republicanos como pelo presidente
Clinton, resultarão em um corte substancial nos gastos públicos, em níveis
federal e estadual. Os gastos com o Medicaid podem ser reduzidos em 30%
(isto é, US$ 270 bilhões) entre 1995 e 2002. Os órgãos governamentais fede-
rais que desempenham papel importante no desenvolvimento de regulamenta-
ções governamentais, tals como a Agência de Proteção Ambiental e a Comissão
Federal das Comunicações, provavelmente terão seu poder e verbas drastica-
mente reduzidos. Na verdade, a redução do déficit orçamentário, embora base-
ado em princípios econômicos sólidos, tem sido a mais poderosa ferramenta
na redução do quadro de funcionários do governo federal, que registrou um
déficit anual de US$ 203 bilhões em 1995. O efeito combinado da restituição
de poder a estados e condados, desregulamentação, supressão de alguns direi-
tos de bem-estar social, redução drástica nos gastos públicos e nos emprésti-
mos contraídos pelo governo e cortes tributários (incluindo a possibilidade, no
futuro, de uma verdadeira revolução fiscal, conforme constatado no debate
recorrente sobre o imposto de renda de alíquota única) vêm promovendo uma
redefinição básica do poder e dos objetivos do governo federal, e consequente-
mente do Estado norte-americano.
As forças determinantes dessa transformação do papel do governo nos
Estados Unidos advêm de uma rejeição profunda e explícita ao governo fede-
336 Um Estado destituído de poder
607
501
407
27%
30 1
Governo de maior porte/mais serviços
20
1984 1988 1992 2/93 6/93 1995
ral pela grande maioria dos norte-americanos nos anos 90 (figura 5.4). Balz e
Brownstein fazem uma síntese dos dados extraídos das pesquisas de opinião
e os estudos políticos sobre este assunto, da seguinte forma:
2.
2
o
bandeira das Nações Unidas tornou-se o grito de guerra contra o muliti-
lateralismo, e contra o processo gradativo de desaparecimento dos limites da
soberania dos EUA na complexa rede de instituições internacionais que ca-
racterizam a era do pós-Guerra Fria, tais como a Organização Mundial de
Comércio.
Uma terceira vertente da opinião pública diz respeito à recusa generali-
zada ao que vem sendo considerado uma interferência do governo na privaci-
dade das pessoas, na família e nas comunidades locais. Este é o caso do
movimento “eduque seu filho em casa”, comumente associado ao fundamen-
talismo cristão, em que os pais se recusam a mandar seus filhos para a escola,
repudiando a necessidade de obtenção de diplomas e certificados. Ou dos
movimentos dos County Rights ou do Wise Use contra a legislação de proteção
ambiental, confundindo a defesa da autonomia local, particularmente no oeste
do país, com os interesses das madeireiras e mineradoras. Ou ainda o interesse
crescente e generalizado sobre as ameaças à privacidade por parte do Estado
informatizado, alimentando tendências libertárias de diversas naturezas, de-
pendendo do nível educacional e do contexto social dos indivíduos envolvidos.
Os valores da família, os movimentos anti-aborto, as campanhas anti-
gay e o fundamentalismo religioso (representado principalmente pelos bran-
cos evangélicos) constituem a base de uma corrente social vasta e diversificada,
da qual, conforme mencionado anteriormente nos capítulos | e 2, a Coalizão
Cristã é a expressão política mais poderosa e organizada, contando 1,5 milhão
de membros e 1.200 congregações nos 50 estados norte-americanos. De fato,
em meados da década de 90, a Coalizão Cristã tornou-se o mais importante
grupo homogêneo de eleitores do Partido Republicano, exercendo influência
decisiva em muitas eleições, nos âmbitos municipal, estadual e federal, e sen-
do considerado o equivalente funcional do que os sindicalistas costumavam
representar para os democratas. Em princípio, os fundamentalistas cristãos
não constituem propriamente um movimento antigovernamental, Seu verda-
deiro ideal pode ser refletido na teocracia, uma nação temente a Deus, sob um
governo capaz de acatar e cumprir as leis de Deus, como fizeram os
fundamentalistas em algumas delegacias de ensino ao assumir o poder na
Califórnia, ou durante a votação na Assembléia do Estado do Tennessee em
fevereiro de 1996 que aprovava a afixação obrigatória dos Dez Mandamentos
nos órgãos públicos e escolas. No entanto, sob o atual regime constitucional,
que prevê liberdade de religião, e a cisão entre a Igreja e o Estado, a reconstru-
ção da nação cristã requer, antes de mais nada, o desmantelamento do Estado
secularizado, tal como se constitui nos dias de hoje. O extraordinário desen-
340 Um Estado destituído de poder
: 43
Gastos com defesa
1 7 52
Subsídios aos produtores agrícolas
P (=)
rogramas de merenda escolar
Previdência social 77
Medicare (programa de saúde do governo
federal destinado aos idosos) 78
Figura 5.5" Opiniões sobre os programas promovidos pelo governo federal e redução do déficit
público, EUA, 1995 (resultados da pergunta: “Para cada um dos seguintes programas, você acha que
é mais importante reduzir o déficit público ou impedir cortes orçamentários significativos?”)
Fonte: Pesquisa realizada pelo Instituto Gallup dos EUA para a CNN/USA
Today de 24 a 26 de fevereiro de 1995
para que estes aprimorem seus controles sobre o Estado, mediante o exercício
do direito de acesso a informações armazenadas em bancos de dados de uso
público, a interação on-line com seus representantes políticos e o acompanha-
mento de sessões políticas ao vivo, eventualmente com comentários, também
ao vivo, sobre tais sessões.” Além disso, as novas tecnologias permitem aos
cidadãos filmarem eventos, podendo assim fornecer provas visuais de abusos
€ excessos, como no caso das organizações ambientalistas globais que distri-
buem equipamentos de vídeo a grupos ambientalistas locais em todo o mundo
para que crimes ambientais sejam registrados, exercendo pressões sobre os
agressores da ecologia. O que o poder da tecnologia faz é potencializar, de
forma extraodinária, as tendências já enraizadas na estrutura e instituições so-
ciais: sociedades opressoras podem aumentar seu poder de repressão por meio
de novos mecanismos de vigilância, ao passo que sociedades democráticas
participativas podem ampliar ainda mais seu grau de abertura e participação
distribuindo mais poder político pelos recursos tecnológicos. Portanto, o im-
pacto direto das novas tecnologias da informação sobre o poder e o Estado
consiste em uma questão empírica, na qual os registros são de naturezas diver-
sas. No entanto, uma tendência mais profunda vem surgindo, efetivamente
minando o poder do Estado-Nação: a difusão cada vez maior da capacidade de
vigilância e do potencial de violência externa às instituições do Estado e além
das fronteiras da nação.
A crescente ameaça à privacidade preocupa menos o Estado propria-
mente dito do que as organizações empresariais e as redes privadas de infor-
mação, ou os aparatos burocráticos que seguem uma lógica própria em vez de
atuar em prol do governo. Ao longo da História, os Estados têm coletado in-
formações sobre seus sujeitos, não raro empregando expedientes rudimentares
e brutais, porém eficazes. Sem dúvida que os computadores ampliaram quali-
tativamente a capacidade de cruzamento de dados, combinando informações
sobre previdência social, saúde, cédulas de identidade, residência e emprego.
Mas com a exceção limitada dos países anglo-saxônicos, fundamentados em
uma tradição libertária, povos de todo o mundo, desde a democrática Suíça até
a China comunista, passaram suas existências dependendo de arquivos de in-
formações sobre residência, trabalho, bem como informações referentes a to-
das as esferas de relações com o governo. Por outro lado, se for verdadeira a
idéia de que o trabalho da polícia vem sendo facilitado pelas novas tecnologias,
tornou-se também extraordinariamente complicado pela sofisticação semelhan-
te, por vezes superior, ao uso das novas tecnologias pelo crime organizado
(por exemplo, emprego de aparelhos que interferem na comunicação da polí-
350 Um Estado destituído de poder
Essa tendência se torna ainda mais evidente na nova relação entre o Es-
tado e a mídia. Dada a crescente independência jurídico-financeira da mídia,
uma capacidade tecnológica cada vez maior coloca em suas mãos a faculdade
de espionar o Estado e de fazê-lo em nome da sociedade e/ou de grupos de
interesses específicos (ver capítulo 6). Quando em 1991 uma estação de rádio
espanhola gravou a conversa pelo telefone celular de dois funcionários socia-
listas do governo, a divulgação de suas severas críticas dirigidas ao primeiro-
ministro socialista desencadeou uma crise política no país. Da mesma forma,
quando o príncipe Charles, em uma conversa com sua amante, permitiu-se
elucubrações pós-modernas sobre o absorvente Tampax e assuntos afins, a
publicação da notícia por um tablóide inglês abalou a Coroa britânica. Certa-
mente que as revelações ou as bisbilhotices da mídia sempre representaram
uma ameaça para o Estado e um mecanismo de defesa para os cidadãos. Contu-
do, as novas tecnologias e o novo sistema da mídia aumentaram, em escala
exponencial, a vulnerabilidade do Estado, não só à mídia, mas também aos ne-
gócios e à sociedade como um todo. Em termos históricos relativos, o Estado de
hoje é mais vigiado do que vigilante.
Além disso, embora o Estado-Nação mantenha sua capacidade de exercer
a violência, vem perdendo o monopólio desse poder, pois seus principais con-
correntes estão assumindo a forma de redes transnacionais de terrorismo ou
grupos comunais que recorrem ao uso de violência suicida. No primeiro caso, o
caráter global do terrorismo (político, criminoso ou ambos), e de suas redes de
fornecedores de informações, armas e recursos financeiros, exige a cooperação
sistêmica entre as forças policiais dos Estados-Nação, de modo que a unidade
operacional vem se transformando, cada vez mais, em uma polícia transnacional .”*
No segundo caso, quando grupos comunais, ou gangues locais, renunciam à sua
participação no Estado-Nação, esse Estado torna-se cada vez mais vulnerável à
violência subjacente à estrutura social da sociedade que o constitui, como se os
Estados tivessem de se manter permanentemente engajados em uma guerra de
guerrilha. Daí a contradição com que depara o Estado: se não fizer uso da
violência, desaparece como Estado; se o fizer, em base quase contínua, estará
abrindo mão de boa parte de seus recursos e de sua legitimidade, porquanto isso
implicaria a manutenção de um estado de emergência permanente. Assim, o
Estado somente poderá proceder ao uso de violência por períodos prolongados
quando e se a sobrevivência da nação, ou do Estado-Nação, estiver em jogo.
Tendo em vista a crescente relutância das sociedades em apoiar o uso prolonga-
do da violência, a não ser que o Estado o faça em casos extremos, a dificuldade
desse Estado efetivamente recorrer a esse recurso em escala suficientemente
352 Um Estado destituído de poder
grande para surtir o efeito desejado leva a uma capacidade cada vez menor de
emprego da violência com frequência, e portanto à perda gradativa de seu mono-
pólio como detentor desses meios.
Diante do exposto, conclui-se que a capacidade de vigilância está difun-
dida na sociedade, o monopólio do uso de violência está sendo contestado
pelas redes transnacionais, não vinculadas ao Estado, e o poder de sufocar
rebeliões vai sendo comprometido pelo comunalismo e tribalismo endêmicos.
Embora o Estado-Nação ainda pareça imponente em seu uniforme vistoso, e
corpos e almas de pessoas sejam ainda sistematicamente torturados em todo o
mundo, os fluxos de informação escapam ao controle do Estado, e por vezes
o superam; embates terroristas ultrapassam fronteiras nacionais; e levantes
comunais deixam exauridas as forças responsáveis pela manutenção da lei e
da ordem. O Estado ainda depende da violência e da vigilância, porém, não
detém mais seu monopólio, nem pode exercê-la de forma irrestrita em suas
fronteiras nacionais.
Embora o autor prossiga sua análise buscando oferecer sua própria alter-
nativa otimista para um novo processo de legitimação do Estado em sua reencar-
nação pós-nacional, os poderosos argumentos contra a continuidade da soberania
do Estado que expõe nas páginas anteriores explicam sua hesitante conclusão:
“Há bons motivos para adotar uma postura otimista — e também pessimista —
sobre os resultados”.” Nesse contexto, não tenho certeza quanto ao significado
dos termos “otimista” e “pessimista”. Particularmente não tenho compaixão por
Estados-Nação modernos que mobilizaram seu povo em torno de carnificinas
no século mais sangrento da história da humanidade — o século XX.” Mas isso
Tm Estado destituído de poder 353
têm saído derrotados repetidas vezes durante as duas últimas décadas por toda
a parte, exceto em Cingapura (com todas as implicações decorrentes dessa
vitória). Os Estados-Nação perdem sua soberania porque o próprio conceito
de soberania, desde Bodin, implica ser inviável perder “um pouco” de sobera-
nia: era esta precisamente a tradicional casus belli. Os Estados-Nação podem
reter seu poder de decisão, porém, uma vez parte de uma rede de poderes e
contrapoderes, tornam-se, por si mesmos, desprovidos de poder: passam a de-
pender de um sistema mais amplo de exercício de autoridade e influência, a
partir de múltiplas fontes. Tal afirmação, coerente, creio eu, com as observa-
ções e análises apresentadas neste capítulo, resulta em graves conseqiiências
para a teoria e a prática do Estado.
Durante décadas, a teoria do Estado tem sido dominada pelo debate entre
institucionalismo, pluralismo e instrumentalismo em suas diferentes versões.!º!
Dentro da tradição Weberiana, os institucionalistas atêm-se à autonomia das
instituições do Estado, segundo a lógica interna de um determinado Estado sem-
pre que os ventos da história lançam suas sementes em um território que constitui
sua base nacional. Os pluralistas, por sua vez, descrevem a estrutura e evolução do
Estado como frutos de uma série de influências sobre a infindável (re)formação
do Estado, de acordo com a dinâmica de uma sociedade civil plural, em uma
validação constante de um processo constitucional.
Já os seguidores do instrumentalismo, marxismo ou historicismo vêem o
Estado como a expressão de atores sociais que, em defesa de seus interesses,
conquistam o poder de dominação, sem que haja a contestação do Estado pro-
priamente dito (“o comitê executivo da burguesia”) ou como resultado de lutas,
alianças e transigências. Contudo, conforme sustentado por Giddens, Guehenno
e Held, em todas as escolas de pensamento, a relação entre o Estado e a socie-
dade, e portanto a teoria do Estado, está contemplada no contexto da nação,
tendo o Estado-Nação como sua estrutura de referência. O que acontece quan-
do, conforme formulado por Held, a “comunidade nacional” deixa de ser a “co-
munidade de maior destaque” como estrutura de referência?" E de que maneira
podemos pensar a respeito de interesses sociais diversificados, não nacionais,
representados no Estado, ou lutando por ele? Considerá-los como o mundo
inteiro? Mas a unidade de medida relevante para os fluxos de capital não é a
mesma que a da mão-de-obra, movimentos sociais ou identidades culturais.
De que forma conciliar os interesses e valores expressos, nos âmbitos global e
local, em uma geometria variável, na estrutura e nas políticas do Estado-Na-
ção? Portanto, do ponto de vista teórico, devemos reconstruir as categorias
para compreender as relações de poder sem pressupor a intersecção necessária
Um Estado destituído de poder 355
tl
A
=
ção efetivamente exercessem poderes de regulamentação capazes de facilitar
ou obstruir fluxos de capital, trabalho, informação e produtos, fica claro que,
nesse ponto da história, o desaparecimento do Estado-Nação é uma falácia.!**
Contudo, nos anos 90, os Estados-Nação têm-se transformado de sujeitos
soberanos em atores estratégicos, defendendo seus interesses e os interesses que
se espera que representem em um sistema global de interação, dentro de uma
soberania sistemicamente compartilhada. Eles exercem influência considerável,
mas raramente detêm poder por si, isto é, de forma isolada das macroforças
supranacionais e dos microprocessos subnacionais. Além disso, ao atuar estrategi-
camente na arena internacional, estão sujeitos a um tremendo desgaste interno.
Por um lado, para estimular a produtividade e a competitividade de suas economi-
as, precisam estabelecer uma estreita aliança com os interesses econômicos inter-
nacionais e obedecer a regras globais que favoreçam os fluxos de capital, enquanto
rogam às suas sociedades que aguardem pacientemente pelos benefícios gradativos
advindos da engenhosidade corporativa. Além disso, para serem considerados
bons “cidadãos” de uma ordem mundial multilateral, os Estados-Nação têm de
atuar em regime de cooperação mútua, aceitando a “hierarquia” da geopolítica e
contribuindo diligentemente no combate a nações renegadas e agentes possíveis
causadores de desordem, independentemente das verdadeiras aspirações de seus
próprios cidadãos, normalmente provincianos. Por outro lado, porém, os Es-
tados-Nação sobrevivem à inércia histórica pelo comunalismo defensivo das
nações e das pessoas em seus próprios territórios, recorrendo a esse último
refúgio para não serem tragados pelo redemoinho dos fluxos globais. Por-
tanto, quanto mais os Estados enfatizam o comunalismo, tanto menor é sua
eficácia participante de um sistema global de poder compartilhado. Quanto
mais triunfam no cenário internacional, em parceria direta com os agentes
da globalização, menos representam suas bases políticas nacionais. À políti-
ca do final do milênio, praticamente no mundo todo, está profundamente
marcada por esta contradição.
Em função disso, parece bastante provável que os Estados-Nação este-
jam assumindo a condição de Rei do Universo de Saint-Exupéry, com controle
absoluto sobre o nascer e o pôr-do-sol. No entanto, à medida que perdem sua
soberania, esses mesmos Estados-Nação surgem como participantes ativos de
um mundo puramente estratégico, exatamente como o descrito na Arte da
Guerra de Sun Tzu há 2.500 anos:
É mister que o general se conserve calado, para garantir o sigilo. Que seja
digno e justo, para manter a ordem. Deve imbuir-se do talento de confundir
358 Um Estado destituído de poder
seus oficiais e soldados por meio de ações e relatórios falsos, para assim
mantê-los na mais completa ignorância. Ao modificar suas táticas e alterar os
planos, deixará o inimigo desprovido de conhecimentos precisos. Com a cons-
tante mudança das bases de seu exército e a opção por caminhos tortuosos,
impedirá que o inimigo adivinhe seus verdadeiros objetivos. Nos momentos
críticos, o der de um exército age como aquele que, após ter escalado as
paredes de um forte, joga fora as escadas."
Notas
3. A análise da crise do Estado-Nação pressupõe uma definição, bem como uma teoria, do Esta-
do-Nação. Contudo, considerando que meu trabalho referente a essa questão foi realizado
com base em teorias sociológicas já bem desenvolvidas, a partir de diversas fontes, remeterei
o leitor à definição de Estado-Nação elaborada por Anthony Giddens em sua obra The Nation-
state and Violence (1985: 121): “O Estado-Nação, que existe inserido em um complexo de
outros Estados-Nação, consiste em um conjunto de formas institucionais de governo, que
mantém monopólio administrativo sobre um determinado território demarcado (por frontei-
ras), autoridade assegurada por lei, e controle direto sobre os meios de violência nos planos
externo e interno”. Entretanto, nas palavras de Giddens, “somente nos Estados-Nação moder-
nos pode o aparato do Estado reivindicar para si próprio e efetivamente obter o monopólio
dos meios de violência, e somente em Estados dessa natureza o alcance administrativo do
aparato de governo corresponde de forma direta aos limites territoriais sobre os quais tal
reivindicação é realizada” (p. 18). Com efeito, conforme argumenta o autor, “um Estado-
Nação é um repositório de poder, o principal repositório de poder da era moderna"(p. 120).
Sendo assim, o que acontece, e de que forma devemos conceitualizar esse Estado, num mo-
mento em que as fronteiras estão desaparecendo e os próprios repositórios de poder estão
sendo envolvidos por outras forças? Minha investigação começa, para efeito de continuidade
teórica, no ponto em que o Estado-Nação, segundo o conceito de Giddens, parece estar sendo
superado pelas transformações históricas.
4, Para uma definição e análise da globalização, segundo meu entendimento, ver volume |, capí-
tulo 2. Para uma crítica bastante elucidativa de visões simplistas sobre a globalização, ver
Hirst e Thompson (1996). Não raro tem-se argumentado que a globalização não é um fenô-
meno novo, tendo ocorrido em diversos períodos históricos, principalmente com a expansão
Um Estado destituído de poder 359
não esteja
do capitalismo no final do século XIX. Talvez essa idéia seja plausível, embora
tura com base na tecnologia da informação não tenha
convencido de que a nova infra-estru
sociais e econômico s ao viabilizar a realiza-
introduzido uma mudança qualitativa em termos
contesto essa linha de argumentaç ão:
ção de processos globais em tempo real. Contudo, não
analisar e explicar nossa
isso não diz respeito à minha investigação. Nesse trabalho, procuro
de contextos culturais,
sociedade no final do século XX, considerando sua enorme variedade
ser avaliada dentro de
econômicos e políticos. Assim, minha contribuição intelectual deve
observados e
seus próprios argumentos, referente aos processos contemporâneos conforme
Sem dúvida, seria extremame nte benéfica para o pensa-
teorizados nos três volumes da obra.
histórico- comparativ o que contrastass e os pro-
mento acadêmico a elaboração de um estudo
ão da economia e comunicaçõ es, política
cessos atuais de interação entre tecnologia, globalizaç
no passado. Ali-
e instituições políticas com a experiência de uma transformação semelhante
nte por historiado-
mento esperanças de que essa tarefa seja assumida por colegas, especialme
teóricas de
res, e terei enorme prazer em efetuar as devidas correções em minhas afirmações
ora, as poucas tentati-
natureza genérica, tomando por base as implicações de tal estudo. Por
de de observar não dedicam a devida atenção, creio eu, aos
vas que venho tendo a oportunida
de tecnologia, finanças, produção, comunicações e
processos radicalmente novos nas áreas
estar corretas no tocante a registros históricos,
política, porque embora tais tentativas possam
processos de mudança atuais são
não deixam inteiramente claras as razões pelas quais os
não vão além da justificativ a
realmente uma mera repetição de experiências passadas, pois
o sol.
apresentada sob a visão rasteira de que não há nada de novo sob
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